Você está na página 1de 5

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Editora Vozes. 42º edição. 2018.

Michel Focault, escritor, filósofo, historiador de ideias e teórico social, nasceu


em Poitiers, cidade francesa, em 15 de outubro de 1926 e faleceu em 25 de junho
de 1984, em um país, na capital francesa, Paris, aos 57 anos. Sua obra, vigiar e
punir, conta com a retrospectiva histórica das reações sociais diante dos delitos,
realiza reflexões à respeito do poder e sua forma de manifestação, desenvolve-se
uma ponte entre a evolução do Direito Penal mediante o estudo social, formas de
punição e métodos de justiça ao passar dos anos.

Foucault foi um notável ativista político, fazendo campanha incansavelmente


pelos diretos dos oprimidos, transpassando a tortura retrógrada, e por maior
tolerância das minorias, com destaque para os homossexuais como ele. Rejeitou a
ideia de que o conhecimento humanas do universo baseou-se somente na
observação e apoiou a construção do homem com um animal pensante, vivendo em
um mundo que só lhe é inteligível porque impõe sua ordem ao que vivência,
sintetizando a evolução intelectual, principalmente as transformações ocorridas na
sociedade francesa entre os séculos XVII e XIX, indagando os motivos da
execuções públicas e suplícios terem perdido espaço para prisões que “corrigiam”
os detentos.

A relação entre os seres humanos, segundo ele, é uma busca constante pelo
poder e direcionada pelo desejo de dominar. Criações da linguagem e da
manipulação, onde não existe benevolência e caridade; em seus lugar, os homens
constroem hospitais, criam escolas, prisões e meios de controle social não para
educar ou reformar, mas sim para controlar e subjugar. Dai temos uma breve origem
sobre o nome da obra , resumindo isso em vigiar e punir.

Percebe-se, no início da obra, o desejo e a normalidade de punição severas e


desumanas. O objetivo central dos métodos coercitivos da Idade Media ou, como
denominado por alguns, Idade das Trevas, era maltratar o corpo terreno e
posteriormente a crença da sanção divina seria aplicada ao pecador. A narração
inicial da cena apresenta o condenado diante dos cavalos, e em cada membro uma
corda é amarrada , que, pela tração, o corpo do réu acaba dilacerado. Conforme
Folcault (2018, p. 51) a ideia era

Se são necessárias penas severas, é porque o exemplo deve ficar


profundamente inscrito no coração dos homens [...], Desfiles, paradas nos
cruzamentos, permanecia à porta das igrejas, leitura pública da sentença,
ajoelhar-se, declarações em voz alta de arrependimento pela ofensa feita a
Deus e ao reino.

enfatizando a repressão social materializada em temor físico, no caso da tortura e a


heresia perante o símbolo religioso, um triunfo soberano sem olhos para punição e
posteriormente reinserção.

Mas as dores deste mundo podem valer também como pendência para
aliviar os castigos do além, um martírio desses, se é suportando como
resignação, Deus não deixará de levar em conta. A crueldade da punição
terrestre é considerada como dedução da pena futura, nela se esboça a
promessa do perdão.

As noções de Justiça Restaurativa não tinham amplitude, aplica-se apenas a


Justiça Retributiva, um vingança pública imposta com severidade e supostamente
recompensada no plano espiritual. O líder estatal e o religioso formavam um
“estado” repressor da violência com o seu próprio uso compunha o funcionamento
político da penalidade.

Em contra partida, na era iluminista, ou Século das Luzes, nome aludido a


passagem da idade obscura para inovadora, o Direito Penal ganha particularidades
semelhantes com o atual. Entretanto, Foucault declarou que o Iluminismo e o seu
racionalismo mascarou a malevolência social, alegou que o termo “loucura” foi
usado para categorizar não apenas as doenças mentais, mas os pobres, doentes,
sem-teto e, na realidade qualquer um que parecesse perturbar o estado absolutista.
Freud, com sua psicanálise deu à organização dominante uma arma mais poderosa.
Controlar a mente é muito mais eficaz que o controle físico, a manifestação do poder
não ocorre somente por imposição vertical, de cima para baixo; é inerente às
ligações coletivas. A manutenção da hierarquia, lei e ordem ganha outra versão, a
qual o estado tem a validação do controle por intermédio da economia de mercado
(fator industrial), escolas (fator educacional) e por prisões.

Desde o fim do século XVII, nota-se uma diminuição considerável dos crimes
sanguinárias e de um modo geral, das agressões físicas, os crimes contra o bem
jurídico da propriedade parecem prevalecer diante dos atentados contra o corpo e
da violência física. Não significa punir menos, mas alterar o método coercitivo,
Foucault (1975, p. 106),

Se há incorrigíveis, temos que nos resolver a eliminá-


los. Mas para todos os outros as penas só podem funcionar
se terminam. Análise aceita pelos Constituintes: o Código
de 1971 prevê a morte para os traidores e os assassinos;
todas as outras penas devem ter um termo (máximo é de
vinte anos)

neste trecho, percebemos um viés de reinserção social, é do interesse coletivo a


pena não ser perpétua; alterações da noção punitiva tem reflexos legislativos e as
prisões ganham protagonismo. Vigiar significa o poder dominante, a disciplina
condiciona, adestrada o ser (panóptico), fica nítida a dinâmica do poder das prisões,
não se máscara mas se torna análoga á sociedade, em que punir, para o autor, é
restaurar a liberdade

A essência do Panoptismo reside na centralidade da situação de inspeção, ou


na construção ficcional de uma espécie do “inspetor central”, onipotente, onipresente
e onisciente. O projeto era de uma prisão modelo, com finalidade de reformar os
encarcerados, mas por vontade de Foucault, foi também um plano para todas as
instituições educacionais, de assistência e de trabalho, o esboço de uma siri-da-
areia racional. Ao estudar a sociedade disciplinar, ele constata que a sua
singularidade reside na existência do desvio da norma, noção de tipificação da
conduta e subsunção jurídica é encontrada. Não se restringindo a conduta do
indivíduo, no subtítulo “O exame”, um controle normalizar-me, uma vigilância que
permite qualificar, classificar e punir, estabelece uma visibilidade da qual as pessoas
são diferenciadas e sancionadas, técnicas de hierarquização. Afirma que a aplicação
do modelo é útil ao se tratar de uma multiplicidade de pessoas que serão
designadas para realizar uma tarefa ou seguir um comportamento, assegurando sua
eficácia por seu funcionamento cautelar e continuou, uma maneira de obter poder. E
assim, para “normalizar”o indivíduo, mecanismos e dispositivos de vigilância foram
desenvolvidos, capazes de interiorizar a culpa é causar remorso pelos seus atos,
para o auto, p. 121,

Ao princípio do trabalho, o modelo inglês acrescenta, como condição


essencial para a correção, o isolamento [...] Entre o crime é a volta do direito e
à virtude, a prisão constituirá um espaço entre dois mundos, um lugar para
transformação individuais que devolverão ao Estado os indivíduos que este
perdera

Para Jeremy Bentham, dominar era distribuir os corpos; em diferenciadas


superfícies (prisões, manicômios, escolas, por exemplo), por exemplo, na oficina, na
escola ou no exército, tudo funciona como um repressor e tem uma
micropenalidade, os atrasos, ausências, desatenção, negligência e a maneira de se
implicar um controle que é maximizado em regimes prisionais.

Além disso, na ideia de Panoptismo, cada dela da a concomitantemente para


o interior e exterior, o panorama do vigilante e seu olhar podia atravessar toda a
cela, não havia pontos cegos ou sombras, era classificada como uma jaula cruel e
ao mesmo tempo sábia. Tudo o que a pessoa fazia estava sendo acompanhado
visualmente pelo vigia que observava pelas persianas, de pequenas aberturas de
maneira a poder ver tudo sem ser visto, é possível metaforizar com o “Big Brother”.
A ideia correspondente à observação total e o poder de disciplinar a vida do
paciente, garantia de ordem. A vigilância torna-se permanente nos seus efeitos,
ainda que possuísse restrição quanto sai ação, a “profilaxia” era mais importante que
a punição, de modo que as pessoas não fossem punidas mas que não existisse
oportunidade para cometer o mal, uma vez que se sentiria imersas num campo de
visibilidade. O panóptico desfaz a necessidade de combater a violência física, com
mecanismos de ordem psicológica, inclusive serviu de base para variações e
projetos durante dois séculos devido à intensidade imaginária e gama de aplicações
que não se restringia ao sistema carcerário.

Foucault expõe a tese de que o poder se manisfestante pela capacidade e


exercer a força. Há tempos, inúmeros cientistas políticos e escritores tentam exercer
definir aonde se localiza a fonte de poder e controle social. A maioria das obras
imaginava um Estado poderoso, no centro da autoridade política. Maquiavel em “O
Príncipe”, via a expressão crua do poder como justificativa para os interesses do
governo. Hobbes, em “O leviatã”, enxergava um monarca poderoso como o antídoto
ao espírito corrupto da humanidade, outorgando o poder popular a ele, para que
exercesse o controle. Tais obras serviam para estudo e aprofundamento das teorias
políticas. Para Foucault, a dominação, aplicada pelo poder, não se encontrava no
centro do ente estatal, mas sim difundido em minutos microlugares por todas esferas
coletivas. No capítulo em que ele aborda a disciplina, uma comparação é feita entre
uma peste e as medidas cabíveis e adotadas pelas autoridades, que fiscalizavam
cada casa (unidade) e como este arbítrio era feito, o isolamento dos
anormais/doentes, através da organização imposta.

Mas houve também um sonho político da peste, que era exatamente o


contrário: não a festa coletiva, mas as diversões estritas; não as leis
transgredidas, mas a penetração do regulamento até nos mais finos detalhes e
por meio de uma hierarquia que realiza o funcionamento capilar do poder [...] O
leproso é visto dentro de uma prática de rejeição, do exílio-cerca; deixa-se que
se perca lá dentro como numa massa que não tem muita importância
diferenciar.

O leproso seria o habitante simbólico das pessoas periféricas, não doutrinadas pelos
ditames sociais, mendigos, vagabundos, loucos, violentos e outros que não seguiam
o conceito de cidadão de bem. Ele criticava a filosofia política dominante por se
basear nas noções de autoridade formal e insistir em analisar uma entidade
chamada de estado. Este era a expressão das estruturas e da configuração do
poder na sociedade, em vez de uma entidade que exerce total poder sobre os
indivíduos, na verdade, as unidades integrativas que influenciavam a construção
geral. Essa visão do componente estatal como uma “prática” em vez de uma “uma
coisa em si mesma” significava um verdadeiro entendimento da estrutura e
distribuição do poder na sociedade que ocorria de forma difusa e não concentrada.

Ao compará-lo com autores anteriores, tanto Maquiavel quanto a visão


hobessiana não são as maneiras mais adequadas de governar e exercer a
soberania. O poder absolutista ilimitado remonta a punição retrógrada amparada em
suplícios, os súditos submetidos às leis impostas pelo superior. Similarmente, na
obra maquiavélica, formulando uma série de conselhos ao príncipe, o autor expôs o
cunho autoritário, com interesse estatal. Originado o modelo liberal de Locke, no
qual o ente fictício deve existir para organização coletiva, limitando o poder,
positivando a liberdade da vida, propriedade e direitos básicos dos cidadãos.
Rosseau demonstra um panorama social, no qual a cidadania é expandida.
Refletindo a construção da sociedade que cada autor expõe, interligamos com
Foucault em sua obra é perceptível a transgressão dos modelos formais e mais
concentrados para a autossuficiência das bases de reproduzir e influenciar o seu
meio. A perpetuação do poder não se encontra em modelos absolutistas; pela
imposição violenta ou liberais, pela impressão de autonomia, na p. 201, o autor
enfatiza

O Panóptico, ao contrário, tem um papel de amplificação organiza-se o


poder, não é pelo próprio poder, nem pela salvação imediata de uma sociedade
ameaçada: o que importa é tornar mais fortes as forças sociais [...] a
majoração produtiva do poder só pode ser assegurada se por um lado ele tem
possibilidade de se exercer de maneira contínua nos alicerces da sociedade,
até em seu mais fino grão e, por outro lado, funciona fora daquelas formas
súbitas violentas, descontínuas que estão ligadas ao exercício da soberania.

Batizar as unidades integrantes da máquina pública deve agir o alvéolo do


sistema por instituições disciplinares e processos de vigilância.
Além da observação e punição, Foucault sugere passos para a reclusão ter
seu objetivo alcançado. A detenção deve ter função essencial a transformação dos
hábitos do indivíduo, eles deveriam ser separados de acordo com os seus delitos,
fatores como idade. A progressão da pena computada de acordo com o progresso,
resultados positivos ou negativos e que o trabalho é fundamental nessa
transformação. Educação proporcionada pelo poder público e uma espécie de
assessoria para acompanhar todos estes elementos. De tal modo, castigos deixados
de lado e a visão social é resgatada, para que a sociedade ganhe com a reclusão, e
o discurso de mergulhar o presidiário no ódio carcerário não seja reproduzido, pois
acarreta danos à coletividade.

Sua obra é um marco do Direito Penal, é possível abandonar o senso comum


e se elevar a um panorama, que antes era de violência e atualmente tende a ser
reconfigurado. Abordava os regimes autoritários em que não havia lei expressa
tipificando o crime, a justiça era o sentimento do rei e do representante religioso,
interpretavam como crimes de heresias o que bem entendiam. Diante dos suplícios,
outros homens “aprendiam a lição”, através do exemplo dado em praças públicas. A
justiça retributiva era o pilar central, não se preocupavam em consertar o mal
causado, reparar os danos não era o objetivo. Não dimensionavam velocidades
penais, garantias eram ceifadas, haviam interrogatório e um julgamento baseado em
achismo, autores de furtos sentenciados à morte, uma dificuldade em enxergar os
bens jurídicos. A vingança criminal tinha viés estatal e divino. Aos poucos o autor
caminha pela história das punições e aborda a prevenção do crime, com o
panoptismo ele explica que caso os indivíduos estivessem sendo vigiado, a
tendência era diminuição das condutas proibidas. A reinserção deveria ter olhos não
isonomos, pois cada caso deve ser acompanhado, a variedade de pessoas não
permite a padronização total. Vemos traços da sua obra refletidos tanto nas leis
quanto na doutrina de tal ramo do direito, explicações sobre princípios e métodos,
que, se bem aplicados no Brasil, tem e teriam, impactos profundos na construção
nacional.

Você também pode gostar