Você está na página 1de 4

Universidade Save Maxixe

Curso: Gestão de Recursos Humano


Cadeira: Método de estudo
Docente: Dinis Cláudio Nhampossa
Discente: Ana Megan David Rafael

Primeiro caderno de Kindzu – O tempo em que o mundo tinha a nossa idade

Kindzu narra sua vida desde a sua infância. Seu nome é o mesmo dado às palmeiras
com as quais seu pai, Taímo, fazia aguardente. Pescador solitário, não tinha qualquer
ambição e, pelo contrário, orgulhava-se de viver com pouco. Taímo ainda era
sonâmbulo e acreditava que seus sonhos eram verdades reveladas a ele, às quais
compartilhava com sua família, que não podia duvidar de suas palavras.

Kindzu lembra-se do dia em que seu pai, todo arrumado, anunciou com orgulho que o
país havia conquistado a independência. Em homenagem o seu próximo filho se
chamaria Vinticinco de Junho – acabou recebendo o nome de Junho, ou Junhito apenas.

Tempos depois veio a guerra, primeiro na forma de notícias distantes, depois em


tiroteios cada vez mais próximos. A mãe de Kindzu já não podia cultivar a terra em
nenhum lugar, a família tornava-se cada vez mais miserável. Taímo acreditava que a
pobreza era a melhor forma de defender-se contra os roubos.

Em um de seus delírios, o pai de Kindzu declarou que alguém da família iria morrer:
seria o filho mais novo, o Junhito. Para defendê-lo ordenou que o menino fosse morar
junto às galinhas, coberto de penas e imitando seus cantos. Isolado dos humanos,
Junhito já nem sabia mais falar, até que desapareceu misteriosamente: os vizinhos
diziam que Taímo, bêbado, o havia confundido com uma galinha torceu seu pescoço;
outros acreditavam que ele havia sido roubado junto a outras aves; Kindzu suspeita que
sua própria mãe possa tê-lo libertado às escondidas.

O sumiço de Junhito transtornou ainda mais a família de Kindzu: seu pai passava o
tempo todo embriagado, deitado em seu barco em meio às dunas. Certo dia encontraram
seu corpo com uma espuma vermelha borbulhando pela boca, nariz e ouvidos. O
defunto foi lançado ao mar.

A mãe de Kindzu consultou um feiticeiro para saber mais sobre a morte de Taímo e foi
orientada a construir uma casa e que guardasse lá dentro o barco de seu finado marido,
que poderia retornar da morte. Além disso, todas as noites ela preparava uma panela de
comida que Kindzu levava ao local. No dia seguinte a panela estava sempre vazia.

Um dia Kindzu viu um homem vestindo roupas vermelhas e pulseiras de feitiços entrar
na casa após ele servir a comida. Ao avisar sua mãe sobre a aparição do estranho, ela
disse que se tratava de seu pai. Kindzu não acreditava nessa história, mas não podia
contrariá-la: solitária, a mulher ainda reclamava que ele era o único filho que havia lhe
sobrado a esta altura, o pior de todos.
A guerra esvaziava as vilas da região, casas ficavam destruídas e o mato tomava conta
das construções. Somente um comerciante permanecera no local Surendra Valá, um
indiano que sofria perseguição devido a sua raça. Kindzu, entretanto, tinha amizade com
o homem, passando todos os dias em seu estabelecimento – e isso preocupava a sua
família, com medo que ele se afastasse de sua cultura. Surendra brincava que eles eram
de uma mesma raça, a raça dos índicos, já que suas terras compartilhavam do mesmo
oceano.

Certa vez o indiano discutia com um freguês que tentava roubar seu estabelecimento
quando entrou um homem com roupas vermelhas, igual ao que Kindzu havia visto
entrar na casa de seu pai. O ladrão saiu do local o homem pediu a Surendra alguns
panos. Depois o comerciante explicou a Kindzu que aquele era um naparama, um
guerreiro abençoado por feitiços que o protegiam das balas.

Uma noite o comércio de Surendra foi invadido e incendiado, Kindzu foi o único a
consolar o indiano, que decidiu sair daquela região. Ele dizia que não gostava de pretos,
nem de branco, nem mesmo de indianos: ele gostava de pessoas que não tinham raça,
como Kindzu.

O garoto também tinha vontade de fugir daquele lugar e procurou o pastor Afonso, seu
antigo professor, para ter alguma orientação. Chegando em sua casa, encontrou todos
em luto: ele havia sido assassinado e suas mãos foram cortadas e penduradas na mesma
árvore sob a qual ele insistia em dar aulas, mesmo após sua escola ter sido queimada.

Desesperado por estes acontecimentos, Kindzu decidiu que queria tornar-se também um
naparama. Uma parte dele, no entanto, desejava encontrar um canto sossegado para
viver. De qualquer forma, ele não deveria continuar vivendo ali.

Durante um sonho Kindzu recebeu a visita de seu pai, que ameaçava persegui-lo caso
deixasse sua terra. Atormentado por esta visão, o menino procurou os velhos da aldeia e
perguntou-lhes sobre como tornar-se um guerreiro: eles o orientaram a não se envolver
com a guerra e, além disso, os naparamas eram competência dos feiticeiros do norte. Já
sobre um lugar tranquilo em que Kindzu pudesse viver, sugeriram que ele procurasse
nganga, o adivinho do local.

Kindzu procurou o tal homem, que lhe contou que o seu sonhado refúgio era muito
distante e que havia duas formas de partir: indo embora, ou enlouquecendo, como seu
pai havia feito. Em sua viagem o nganga aconselhou que seguisse pelo mar, depois
andasse pela areia que não guardava pegadas, para despistar o espírito de Taímo, até
encontrar o lugar onde ninguém o conhecesse.

Ao despedir-se de sua mãe, ela mal falou. Delirava que estava grávida.
Síntese-Primeiro capitulo: A Estrada Morta (que inclui o “Primeiro caderno de
Kindzu”: O Tempo em que o Mundo tinha a nossa idade)

"Terra Sonâmbula" é um romance do autor moçambicano Mia Couto, publicado em


1992. O primeiro capítulo começa com um incêndio em um machimbombo que
transportava vários passageiros em Moçambique, durante uma guerra civil que devastou
o país na década de 1980. Dois sobreviventes, um velho e um menino, escapam do
ônibus em chamas e fogem para o mato. O velho, que é analfabeto, carrega consigo um
caderno escrito por sua esposa, que foi morto durante a guerra, com a esperança de que
algum dia ele possa encontrar alguém para lê-lo.
O capítulo apresenta temas como a sobrevivência em situações extremas, a perda de
entes queridos, a importância da escrita e da memória, e a destruição causada pela
guerra civil.
Referências
COUTO, Mia. Terra Sonâmbula. São Paulo: Cia. das Letras, 2007.

Você também pode gostar