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EVANGELISMO REFORMADO
Estudo da evangelização reformada, centrada em Deus, em contraste
com evangelização arminiana, centrada no homem, como tem sido em
nossos dias.
Por
JOSÉ SANTANA DÓRIA
Mestrando em Teologia

Curso de Ministério e Teologia


Para estudantes de Licenciatura e Mestrado em Estudos Teológicos

SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE MIAMI


Brasil – Aracaju, Março de 2011

I – EMENTA
Estudo da evangelização Reformada, centrada em Deus,
em contraste com evangelização Arminiana, centrada no
homem, como tem sido em nossos dias.

II – CONTEÚDO PROGRAMÁTICO
1. O que é evangelismo?
2. Eleição, um incentivo para a evangelização;
3. Deus e os meios para a evangelização;
4. A mensagem da evangelização;
 Pregando o evangelho de arrependimento, expiação e
graça;
 Pregando o evangelho do novo nascimento;
 Pregando o evangelho do reino;
2

 Pregando um evangelho exclusivo e “ofensivo”.


5. A caricatura do evangelho de Cristo (uma crítica ao
evangelismo moderno).
 Um evangelho existencialista;
 Um evangelho de reconciliação do homem com Deus;
 Um evangelho de apelação;
 Um evangelho pragmatista;
 Um evangelho de evidência numérica;
 Um evangelho de obras;
 Um evangelho inofensivo.
6. A evangelização de Jesus Cristo.
 Pregava o caráter de Deus – Mc.10:17,18;
 Pregava a Lei de Deus – Mc.10:19-21a;
 Pregava o arrependimento – Mc.10:21b;
 Pregava a fé no filho de Deus – Mc.10:21c;
 Pregava sem uma falsa segurança de salvação –
Mc.10:22;
 Pregava dependendo de Deus – Mc.10:23-27.
7. O sistema de apelo.
 Suas implicações doutrinárias.
 Seus perigos;
8. Características da evangelização arminiana.
 Uma evangelização influenciada pela teologia de
Pelágio e Finney;
 Uma evangelização que baseia-se no pragmatismo;
9. A evangelização puritana x evangelização arminiana.
 Suas mensagens;
 Seus métodos.
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III – ANEXOS – 1 a 8
IV – BIBLIOGRAFIA
ADAMS, James E. Regeneração por Decisão. São Paulo. Ed.
FIEL: 1982.
ALLEINE, J. Um Guia Seguro para o Céu. São Paulo Ed. PES:
1987
ANGLADA, Paulo. Spurgeon e o Evangelicalismo Moderno.
São Paulo, Ed.Os Puritanos: 1996.
BEEKE, Joel R. A Tocha dos Puritanos. São Paulo Ed. PES:
1996
BLANCHARD, J. Convite para Viver. São Paulo. Ed. FIEL:
1992.
CHANTRY, Walter J. O Evangelho de Hoje. 3a Edição, São
Paulo Ed. FIEL: 1988.
KUIPER, R. B. Evangelização Teocêntrica. São Paulo Ed.
PES: 1976.
JONES, M. Lloyd, A Apresentação do Evangelho (opúsculo).
São Paulo Ed. PES: s/data.
-----------------------, A Pregação (opúsculo). São Paulo Ed. PES:
s/data
-----------------------, A Urgente Nec. de Avivamento (opúsculo).
São Paulo Ed. PES: s/data.
-----------------------, Jesus Cristo e Este Crucificado (opúsculo).
São Paulo Ed. PES: s/data
MACARTHUR, Jonh. A Procura de Algo Mais (opúsculo).
São Paulo Ed. PES: s/data.
MURRAY, Iain. O Sistema de Apelo. São Paulo Ed. PES: 1995
PACKER, J. I. Entre os Gigantes de Deus. São Paulo. Ed.
FIEL: 1996.
-----------------, O “Antigo” Evangelho. São Paulo. Ed. FIEL:
1986.
PINK, A. W. Deus É Soberano. 3a Edição, São Paulo Ed. FIEL:
1990.
4

REIDHEAD, Paris. Crentes que Precisam de Salvação. Minas


Gerais. Ed. Betânia: 1992.
REISINGER, Ernest. Existe Mesmo o Crente carnal. São
Paulo. Ed. FIEL: s/data.
VASCONCELOS, Josafá. O Outdoor de Deus. São Paulo, Ed.
Os Puritanos: 1998.
5

CAPÍTULO I

O QUE É EVANGELISMO?
(John Armstrong)

Será que existe um assunto de maior interesse do que o


evangelismo, para aqueles que estão vitalmente ligados a Jesus
Cristo? Na verdade, mesmo aqueles pertencentes às
denominações mais liberais, têm tido um interesse cada vez
maior pelo assunto nas últimas décadas, isso devido ao declínio
no número de membros de suas respectivas igrejas.

O interesse pelo evangelismo tem sido o foco das atenções


da igreja cristã desde o seu início. Jesus não ensinou aos Seus
discípulos que após a descida do Espírito Santo sobre eles:
“sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém, como em toda a
Judéia e Samaria, e até aos confins da terra”? (Atos 1:8). Nós lemos
em Atos 8:4, “os que foram dispersos iam por toda parte pregando a
Palavra”. Quando o Espírito Santo veio sobre a igreja incipiente,
a promessa de Atos 1:8 aplicava-se a todos, não somente aos
apóstolos. A obra da evangelização tem sido uma preocupação
constante para a Igreja como um todo e especialmente em
épocas de reforma e reavivamento derramadas pelo Espírito.
Embora evangelismo e reavivamento não sejam a mesma coisa -
6

o que se constitui em um erro comum cometido nos últimos 50


anos no movimento evangélico ocidental - não podemos orar
por despertamento espiritual e permanecer desobedientes à
comissão do evangelismo e das missões. Conforme escreveu
John Blanchard, “nenhuma igreja é obediente, se não for
evangelística”. Um evangelismo do tipo melhor e mais eficaz
será uma evidência de qualquer reavivamento verdadeiro que
nós possamos experimentar em nossa geração.

Mas o que é evangelismo? Por que deveríamos nos


envolver com ele? Quais são os métodos que as Escrituras nos
autorizam a usar para alcançar homens e mulheres com a
mensagem de Cristo? O que a teologia tem a ver com o
evangelismo?

Por mais de uma geração, o evangelismo no Ocidente tem


sido feito dentro de um vácuo doutrinário. Muito do que tem
sido exportado para outros campos da missão cristã, reflete a
mesma superficialidade e confusão doutrinária. Chegou o
momento de refletir seriamente sobre muito do que está sendo
feito hoje, em nome do evangelismo. Se o que estamos fazendo
é um evangelismo verdadeiro, bem estruturado, ou é somente
atividade constante, ou ainda pior do que isso, uma atividade
prejudicial, então precisamos questioná-lo com base no
princípio da “sola scriptura”.
7

O resultado desse vácuo doutrinário pode ser visto em


nossa preocupação com métodos evangelísticos, às expensas da
exclusão virtual da compreensão e concentração sobre a
questão “o que é o evangelho em si mesmo?”. Será que as
mensagens que estão sendo pregadas, os padrões de
apresentação e os livretos distribuídos são verdadeiramente
fiéis à mensagem do evangelho? As campanhas em massa, os
ministérios de longo alcance televisionados e por rádio, as
numerosas agências para-eclesiásticas têm procurado
conquistar as multidões para Cristo. Qual é o resultado de
quase um século de tais esforços bem intencionados?

O que é, portanto, o evangelismo? Respondo da seguinte


forma: “é pregar o evangelho com a intenção de conquistar
verdadeiros seguidores de Cristo”. O evangelho são as boas-
novas. A palavra grega para evangelho é a palavra da qual
obtemos a nossa expressão “boas-novas”. O verbo usado para
pregação do evangelho é o mesmo usado para designar a
atividade de evangelização. O substantivo “evangelho”, ocorre
mais de 75 vezes nos escritos do Novo Testamento. O verbo,
“evangelidzomai” ocorre mais de 50 vezes. É freqüentemente
traduzido como “pregar”. James I. Packer expande essa curta
definição de evangelismo, dizendo que evangelizar é:
“Apresentar Jesus Cristo aos pecadores, de modo a que eles
possam vir a colocar sua confiança em Deus, através d’Ele
8

recebê-lo como seu Salvador e servi-lo como seu Rei na


comunhão de Sua Igreja”.

Essa definição deixa claro que evangelismo não equivale a


apelar por decisões através de uma forma especializada ou
obter resposta aos nossos apelos. Não é tão pouco reorganizar a
vida familiar ou salvar o casamento com novas técnicas de
aconselhamento. Não, o evangelismo pode até mesmo terminar
com alguns casamentos e freqüentemente dividirá famílias, o
que se tornará cada vez mais aparente à medida que nossa
cultura se torna cada vez mais hostil às suas raízes cristãs.
Nosso Senhor não trouxe uma espada de divisão? (Mt.10:34-39;
Lc.14:25-27).

O evangelismo deve, portanto, ter um evangelho adequado.


Isso é o que chamamos de teologia prática. Essa prática
adequada é revelada nas palavras e obra dos apóstolos e do
próprio Cristo. Não somos livres para estruturarmos nossos
próprios métodos de acordo com nossos caprichos. Não é a
compreensão adequada da suficiência da Palavra escrita que
nos compele a deduzir a partir da mesma, à medida que
trabalhamos pela conversão de homens e mulheres?
Pessoalmente, estou convencido de que esse deve ser o tema
atual entre os evangélicos, os quais praticam uma postura social
e política conservadora, baseada no tipo de prática cristã
popular durante as últimas décadas. Essa prática não se parece
com nada que exista no Novo Testamento. O resultado é um
9

tipo espúrio de evangelismo que tem sido muito prejudicial em


nossa época.

Nós precisamos não somente de um reavivamento de poder


para que vejamos as conversões se multiplicando dentro da
comunidade visível da igreja, bem como na cultura de uma
forma geral, mas também necessitamos de uma reforma
completa de nossos métodos e maneiras de evangelização.

Ernest Reisinger está certo em acrescentar a tudo isso que


necessitamos de um motivo correto. Ele escreve: “Qual é o
motivo correto na evangelização centralizada em Deus? Há dois
motivos corretos: 1) Amor a Deus e preocupação com a Sua glória. 2)
Amor pelo homem e preocupação com seu bem estar... Como
glorificamos a Deus?... fazendo Sua vontade - e é Sua vontade que
tornemos conhecido Seu nome e Sua imagem de salvação...Ele nos
incumbiu da tarefa de levar Sua mensagem a todo o mundo; dessa
forma, nosso motivo inicial deve ser amor a Deus e preocupação com a
Sua glória. Isso é expresso na obediência à Sua vontade revelada.
Portanto, se formos obedientes na difusão da mensagem de Deus, Ele
será glorificado, a despeito dos resultados. Os resultados estão fora de
nosso alcance, de nossa habilidade e, graças a Deus, fora de nossa
responsabilidade.”

Em relação ao segundo motivo, John Blanchard está


certamente correto ao escrever: “o evangelismo é moralmente
correto - é o pagamento de um débito”. Um débito de amor que
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devemos a Deus e ao homem. Se amarmos nosso próximo,


então devemos nos esforçar para fazer brilhar sobre ele a luz do
evangelho, de todas as maneiras possíveis. Conforme Vance
Havner resumidamente coloca, “todo cristão é um agente postal
de Deus. Sua obrigação é transmitir as boas-novas dos céus.”
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CAPÍTULO II

ELEIÇÃO, UM INCENTIVO A EVANGELIZAÇÃO


(Pr. José Santana Dória)

INTRODUÇÃO:

Vez por outra se ouve a idéia de que a eleição torna


supérflua a ação evangelizadora. Essas pessoas sempre
perguntam: “Se o imutável decreto da eleição torna absolutamente
certa a salvação dos eleitos, que necessidade tem eles do evangelho? Os
eleitos não vão ser salvos mesmo, ouçam ou não o evangelho?”
A premissa desse argumento é inteiramente verdadeira (O
imutável decreto da eleição torna absolutamente certa a salvação dos
eleitos) Mas a conclusão dessa premissa (Os eleitos não vão ser
salvos mesmo, ouçam ou não o evangelho) revela grave
incompreensão da soberania divina como expressa no decreto
da eleição.
Ilustração: Certa vez, quando William Carey, um jovem
missionário cheio de amor pelos perdidos, propôs a criação de uma
missão para alcançar os pagãos que nunca ouviram o evangelho, um
pastor que se considerava calvinista disse: “Sente-se jovem, se Deus
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quiser salvar os pagãos não vai precisar de você ou de mim”. Ficou


claro que este pastor nunca entendeu realmente a doutrina da eleição!
Enquanto que a eleição feita na eternidade, não se pode
perder de vista a verdade de que sua concretização é um
processo que se dá no tempo, ou seja, dentro da história. Muitos
fatores tomam parte nesse processo. Um deles é a
evangelização.
No texto de (At.18:9 -11) temos o relato de como o Senhor
apareceu a Paulo numa visão, estando ele em Corinto, após a
rejeição dos judeus (At 18:5, 6). O Senhor Jesus ordenou a Paulo
que falasse e não se calasse, mesmo em face daquela oposição
(v.9). O argumento de Cristo ao apóstolo além de assegurar-lhe
sua presença, foi que “eu tenho muito povo nesta cidade”
(v.10). Em outras palavras, saber que havia muitos eleitos em
Corinto, que viriam a se converter, foi fonte de ânimo e
incentivo para Paulo permanecer naquela cidade por um ano e
meio, pregando o evangelho (v.11).
Na aula de hoje procuraremos demonstrar que, longe de ser
um obstáculo à evangelização, a doutrina da eleição se constitui um
grande incentivo, em face das seguintes razões:

I – SOMENTE A ELEIÇÃO POSSIBILITA O SER HUMANO,


TOTALMENTE DEPRAVADO, SER ALCANÇADO PELO
EVANGELHO.

Vejamos sua condição após a Queda:


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* Ele é morto espiritualmente - (Ef.2:1; Cl.2:13)


* Ele é cego para as coisas do Espírito - (2Co.4:3, 4; Ef.4:18 e
Jo.12:40);
*Ele é surdo para as coisas do Espírito - (Jo.8:47 e 1Jo.4:6).
*Ele é de mente obscurecida pelo pecado - (Tt.1:15, 16; Cl.1:3)
* Ele é de coração corrupto e mau. (Gn.6:5; 8:21; Ec.9:3;
Jr.17:9; Mc.7:21-23; Jo.3:19).
* Ele é desprovido de desejo ou temor a Deus (Rm.3:11, 18; 8:7,
8).

No homem não há nenhum desejo por Deus. Não há temor


de Deus no homem. Talvez ele tenha algum temor supersticioso
e escravizante; mas nada de um temor reverente e salvador, que
produz um desejo de honrar a Deus como Deus e caminhar
humildemente pelos caminhos de Deus, com o devido senso de
exaltação a Deus pela sua incomparável glória. O homem
despreza o Deus que é revelado nas Escrituras. Ele se recusa a
adorá-lo e amá-lo em espírito e em verdade. Recusa-se a
submeter-se diariamente à Palavra de Deus e a obedecer a
Cristo com amor e gratidão no coração. A inclinação natural do
homem é lutar contra Deus, opor-se a Deus, correr para longe
de Deus. Ele é Incapaz de se arrepender, de crer no evangelho,
ou de vir a cristo. Não há poder nem vontade dentro dele para
transformar a sua natureza ou prepará-lo para a salvação. (Jó.14:4;
Jr.13:23; Mt.7:16-18; Jo.6:44, 5:40 e 2Co.3:5).

A queda com as suas conseqüências nos mostra


claramente que, sem a eleição ninguém seria salvo. Esse é um
14

dos grandes incentivos para evangelizar, porque temos a


certeza que somente a eleição nos garante que no seu tempo
todos os eleitos serão eficazmente chamados, pelo Espírito
Santo, das trevas para a luz (2Tm. 2:10).

II- A SOBERANIA DE DEUS NÃO AFETA OU IMPEDE A


EVANGELIZAÇÃO.

Evangelizar é uma ordem de Deus claramente prescrita nas


Escrituras. Podemos não saber o número e a identidade dos
eleitos, mas isto não anula nosso dever de “pregar a toda
criatura” (Mc.16:15,16). Por conseguinte, podemos dizer:

A) A crença que Deus é soberano na graça não afeta a


necessidade de evangelismo  Não importando o que
creiamos acerca da predestinação, permanece de pé o fato que
nenhum homem pode ser salvo sem o evangelho (Rm.10:12 -
17). Na parábola da grande ceia, contada por Jesus, o método
pelo qual a festa se encheu foi pela ação dos servos do rei, que
saíram chamando a todos que estavam no caminho (Mt.22:1-4).

B) A crença na soberania de Deus não afeta a urgência


do evangelismo.  Não importando o que creiamos acerca da
predestinação, permanece de pé o fato que os homens estão
perdidos sem Cristo, e se dirigem para o inferno (Lc.13:1-5). A
necessidade deles é urgente! O fato de não podemos convertê-
los, nem mesmo sabermos se são ou não eleitos, não é da nossa
15

alçada: Cumpre-nos anunciar urgentemente o Evangelho a


todos, sem exceção.

C) A crença que Deus é soberano na salvação de


pecadores, não afeta a genuinidade dos convites do evangelho
nem a veracidade das promessas do evangelho - Não
importando o que creiamos acerca da predestinação, permanece
de pé o fato que Deus, no evangelho, oferece de verdade, a
Cristo e promete justificação a todos que crê (Rm.10:13 – secreto
conselho de Deus). A chamada ao arrependimento é universal e o
convite do Evangelho é gratuito sem limites. Ninguém é
barrado da misericórdia a não ser aqueles que não crêem
(Jo.6:37 - 40).
Aqui precisamos fazer uma diferenciação entre a Vontade
de Desejo e a Vontade de Propósito.
A Vontade de Propósito está ligada à vontade decretiva (A
vontade decretiva é aquela vontade por meio da qual Deus ordena ou
decreta tudo aquilo que decide que tem que acontecer, seja por meio da
agência direta dEle, ou através da agência irrestrita das suas criaturas
racionais – 2Cr.22:7; Is.46:9-11; 48:14; 53:10; Dn.4:35; Rm.9:19;
Ef.1:1,5,9,11; Fp.2:13Ap.4:11), enquanto que a Vontade de Desejo
está, algumas vezes, ligada à vontade preceptiva (a vontade
preceptiva diz respeito aos preceitos - é a regra de vida que Deus tem
apontado para suas criaturas morais trilharem, indicando os deveres
que elas têm que cumprir, ou que Ele impõe sobre elas. Essa vontade
16

está revelada na lei e no evangelho – Sl.40:8; 143:8-10; Mt.7:21;


12:50; Lc.12:47,48; Jo.9:31; At.13:22; Ef.6:6,7; Cl.1:9,10; 1Ts.4:3;
5:18; 1Pe.2:15; 4:1,2; 1Jo.2:17), e expressa o prazer e o deleite de
Deus em coisas que Ele gostaria que acontecesse na vida dos
homens, mas que nem sempre acontecem. Ela pode e é
desobedecida pelos homens. Nem tudo o que Deus requer de
nós como norma de vida é obedecido. Você conhece a vontade
de Deus? Sim, se você lê o que está escrito na Palavra de Deus.
Você faz exatamente todas as coisas que Deus quer de você?
Não. Esta vontade, portanto, pode e freqüentemente é resistida.
Há, portanto uma grande diferença entre o que Deus prescreve
para que façamos e o que Ele decide fazer. Esta vontade de
desejo nem sempre está relacionada diretamente com aquilo
que os homens devem fazer, mas é expressão de algo que faz
parte da natureza de Deus.
Esta vontade de desejo (que é distinta da vontade de
propósito) está relacionada intimamente com o prazer (deleite)
que Deus tem em que certas coisas aconteçam. Este desejo, que
nem sempre é satisfeito, é constitucional e não pode ser negado
nEle de forma alguma. Há vários exemplos dessa vontade
afirmada na Escritura: Observe a base bíblica dos nossos
argumentos:
Exemplo 1 - O desejo natural e espontâneo de Deus para
com todos os homens, está expresso em dois textos de Ezequiel:
17

Ez 33.11 - "Dize-lhes: Tão certo como eu vivo, diz o Senhor,


não tenho prazer na morte do perverso, mas em que o perverso se
converta do seu caminho, e viva..."
Ez 18: 23 - "Acaso tenho eu prazer na morte do perverso? diz
o Senhor Deus; não desejo eu antes que ele se converta do seus
caminhos; e viva?"
É comum, dentro de círculos calvinistas, negar em Deus
este prazer, por causa do temor da violação da doutrina da
expiação limitada. Não há fundamento para esse temor, porque
essa vontade de Deus, expressa nos versos acima, é
constitucional nele. Deus afirma de modo claro, nos versos
acima, o seu prazer de duas maneiras: uma negativa e a outra
positiva. Primeiro, Deus não tem prazer na morte do perverso;
segundo, Deus tem prazer na conversão do ímpio. Por não
fazerem essa distinção da vontade de Deus, muitos calvinistas
tentam negar o que está óbvio nas Escrituras. Faz parte da
natureza constitucional de Deus não ter prazer na condenação
do perverso e se comprazer na conversão deles. Ninguém pode,
em sã consciência, negar essas verdades que o próprio Deus diz
de si, de maneira incontestável.
Todavia, esse desejo constitucional constante em Deus nem
sempre é realizado. Esse desejo constitucional é distinto da sua
realização ou satisfação. Por razões desconhecidas de nós, Deus
determina não satisfazer ou realizar seu próprio desejo. Está em
suas mãos salvar o pecador. E ele quem efetua a regeneração
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nele e o ressuscita espiritualmente. E obra da soberania de Deus


salvar o pecador. Ele resolveu não salvar alguns (isso tem a ver
com a sua vontade de propósito, que é igual à vontade de
decreto), mas o fato dele resolver não salvar alguém não
elimina o outro, que ele tenha prazer em que o pecador se
converta e não tenha prazer que ele seja condenado. Isso não é
contradição em Deus (que possui uma mente infinita), pois é
possível esse tipo de situação em nós próprios (que possuímos
mente finita). É possível para nós termos prazer em que alguma
coisa boa aconteça a alguém e, todavia, por razões suficientes a
nós, resolvemos não fazer nada para que isso aconteça.
Algumas vezes não fazemos por incapacidade ou impotência.
Aqui está a grande diferença entre nós e Deus. Não é por
incapacidade ou falta de poder que Deus resolve não salvar,
mas é um ato de sua soberania que não anula a sua vontade de
prazer de ver ímpios convertidos ou o seu desprazer de vê-los
condenados. Afinal de contas, todos os ímpios que não são
convertidos são criaturas suas, e isso explica por que ele não
tem prazer na condenação deles. Deus lhes aplica a condenação
porque ele é justo, mas não há qualquer sugestão de que ele se
alegra na condenação deles. Pensar isso seria uma blasfêmia
contra a sua natureza e uma negação de sua vontade de prazer,
que lhe é constitucional.
Exemplo 2 - O desejo natural e espontâneo de Deus para
com todos os homens é demonstrado positivamente em:
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Lc 13:34 - "Jerusalém, Jerusalém! que matas os profetas e


apedrejas os que te foram enviados! Quantas vezes quis eu reunir teus
filhos como a galinha ajunta os do seu próprio ninho, e vós não o
quisestes. " (comparar com Lc 19.41-42)
Este quadro apresentado por Lucas é uma situação similar à
de Ezequiel, mas o personagem, expressando a sua tristeza pela
perdição do povo, é o Deus Filho encarnado. Neste verso
podemos perceber um sincero prazer na salvação dos
habitantes de Jerusalém. Jesus, o Deus encarnado, in-
questionavelmente revelou o seu prazer em que os habitantes
de Jerusalém largassem a sua incredulidade. — Isso mostra a
vontade de prazer ou do deleite de Deus. Nenhum de nós pode
negar essa vontade no Deus homem. Seria uma injustiça a
Cristo dizer que ele se alegrava na incredulidade e na perdição
de Jerusalém. As suas lágrimas indicam o seu desgosto pela
situação de incredulidade e, ao mesmo tempo, o seu prazer em
que Jerusalém se voltasse arrependida e em fé para ele.
Todavia, por razões desconhecidas de nós, Cristo resolveu
não vencer a obstinação dos judeus, pois ele poderia fazê-lo se
assim tivesse decidido, uma vez que e o autor e o consumador da
fé” (Hb 12.2). A fé sempre vem por meio de Jesus (At 3.16); a fé
é um dom de Jesus aos homens, uma graça eminentemente
divina. Essa resolução de Jesus Cristo, de não conceder fé
salvadora a todos os habitantes de Jerusalém, mostra a vontade de
propósito de Deus.
20

Exemplo 3 - O desejo natural e espontâneo de Deus é que


todos os homens sejam salvos chegando ao arrependimento e à
fé. Isto está claramente expresso em 1Tm 2:4 e 2Pe 3:9. Isto
mostra o desejo constitucional de Deus o Seu deleite.
Contudo, Ele mesmo afirma claramente em Rm 9:18 que Ele
"tem misericórdia de quem quer, e que Ele endurece a quem lhe
apraz." - Isto mostra o propósito de Deus.
OBS. - Na verdade, esses textos não devem ser usados como
exemplos similares aos dois anteriores. Há algumas observações a
serem feitas neste assunto: As expressões de 1Tm 2 “em favor de
todos os homens” (v.1), “o qual deseja que todos os homens” (v.
4). assim como resgate por todos (v. 6) podem perfeitamente se referir
a classes de pessoas indistintamente (como reis, pessoas em autoridade,
etc., como nos mostra o v. 1), não como se referindo a cada homem,
sem exceção. Todavia, se essas expressões forem entendidas com o
significado de “cada ser humano, sem exceção”, então podemos aplicar
com justeza o argumento acima como mais um exemplo para
distinguir a vontade de prazer da vontade de propósito. somente nesse
caso pode ser aplicável o exemplo, Se o entendimento é o primeiro,
então o exemplo não serve, porque todas as classes de pessoas que
Deus desejou salvar Ele salvou.
 Exemplo 4 - O desejo natural e constitucional de Deus era
que Faraó deixasse, em paz, o povo ir para fora do Egito. Várias
vezes Deus disse a Faraó: "Deixa o meu povo ir..." (Ex 7:2; 8:1, 2,
20 - O desejo de Deus era que Faraó pudesse ficar livre das
21

pragas. Isso mostra o desejo de Deus. Mas esse desejo de Deus


não foi realizado porque ele decidiu não interferir no coração
de Faraó Ex 9:14,15,16). O propósito de Deus, em distinção do
Seu desejo, está expresso em Ex 8:15 e 19: 4.
Deus desejou que Faraó espontaneamente concordasse em
deixar o povo sair do Egito Ex 9:1), mas Deus decidiu não
vencer a resistência de Faraó Ex 9:12).
Deus enviou Moisés para persuadir Faraó. Isto mostra o
desejo de Deus. Mas Deus, ao mesmo tempo, informou Moisés
de que a sua persuasão falharia Ex 7:14). Isto indica o propósito
divino, em não vencer a obstinação de Faraó.
Este exemplos não mostram contradição em Deus, pois
encontramos paralelo disso nas ações dos homens.
Por exemplo: Uma decisão de um homem (que é um
Decreto de um homem em um caso particular) é
freqüentemente contrária à sua inclinação natural. Um homem
decide sofrer dor física e emocional na amputação de sua
perna, embora ele seja constitucionalmente avesso à dor. Seu
desejo natural seria escapar da dor física e emocional, mas por
razões suficientes para ele, ele decide não escapar dela e
submeter-se à cirurgia.
Se há razões suficientes para um homem tomar decisões
dessa natureza, o mesmo deve ser válido para Deus.
22

D) A crença que Deus é soberano na salvação não afeta a


responsabilidade do pecador com respeito a sua reação para
com o evangelho  “Por todas as Escrituras há um princípio
liderante de que o homem pode perder sua própria alma, e que se vier a
perder-se afinal, será por sua própria culpa e que seu sangue estará
sobre sua cabeça” (Ryle). Veja Ez.18:31; Jo.3:19; 5:40. Segundo as
Escrituras, algumas pessoas não serão salvas, não porque
deixaram de ser eleitas, mas porque negligenciaram tão grande
salvação, ou como no caso dos pagãos, porque rejeitaram a
revelação geral (Rm.1:18 – 27).

III – A ELEIÇÃO INCLUI TANTO O FIM COMO OS MEIOS.

Talvez a melhor ilustração de como Deus predestina tanto o


fim como os meios é o caso de Paulo e seus companheiros na
tormentosa viagem a Roma (At.27:9-44).
Esta história mostra a harmonia que existe entre os decretos
de Deus e os atos humanos.
O mesmo acontece na eleição para a salvação. Para
conseguir esse fim, Deus emprega meios naturais e
sobrenaturais. A proclamação do evangelho, a leitura da Bíblia,
a celebração dos sacramentos, a audição da mensagem por
parte dos pecadores, tudo isto são meios naturais. Mas a
chamada eficaz, a regeneração, a justificação, etc. são meios
sobrenaturais. “Assim como Deus destinou os eleitos para a glória,
assim também, pelo eterno e mui livre propósito da sua vontade,
23

preordenou todos os meios conducentes a esse fim; os que, portanto,


são eleitos, achando-se caídos em Adão, são remidos por Cristo, são
eficazmente chamados para a fé em Cristo pelo seu Espírito, que opera
no tempo devido, são justificados, adotados e guardados pelo seu poder
por meio da fé salvadora” ( C.F.W., Cap. III, Nº 6.).

IV – A ELEIÇÃO ENCORAJA A IGREJA SER MAIS


CRITERIOSA NA ADMISSÃO DE SEUS MEMBROS.

A igreja só deve admitir como membros, aqueles que dão sinais


evidentes
da sua eleição (1Ts.1:4 e 2Pe.1:10). Que sinais são esses:

A) Semelhança de Cristo - santidade, fé amor... - (Rm.8:29);


B) Consciência e obediência ao chamado de Cristo (Rm.8:29,
30);
C) Consciência da sua salvação - salvos de que, para que -
(2Co.5:15).

CONCLUSÃO:

A soberania de Deus na salvação nos fornece a única


esperança de sermos bem sucedidos na evangelização, haja vista
que o homem natural é totalmente depravado (morto em seus delitos
e pecados, cego, surdo, aprisionado pelo pecado, filho do
diabo... ) e por si só não pode aceitar este evangelho. Em face dessa
gloriosa soberania devemos na evangelização ser ousados
( nenhum coração é duro demais para a graça divina ),
pacientes ( Deus salva os pecadores no tempo determinado ), e
24

acima de tudo orar, confessando a nossa impotência para


converter uma simples alma, suplicando a Deus sua operação
graciosa.
25

CAPÍTULO III

DEUS E OS MEIOS DA EVANGELIZAÇÃO


(Pr. José Santana Dória)*

A teologia cristã fala em meios de graça. A Deus apraz


empregar meios para levar os pecadores à fé, como também
emprega meios para edificar na fé os salvos. No primeiro caso
(levar pecadores à fé), o meio é a palavra de Deus; no segundo
(edificar na fé os salvos), os meios são a Palavra de Deus
(1Pe.2:2) e as ordenanças divinamente instituídos.

I – A FÉ E A PALAVRA DE DEUS

É questão de suprema importância sustentar que a Palavra


de Deus é o único meio indispensável pelo qual o Espírito Santo
produz fé no coração dos homens. Embora não signifique que a
Palavra sempre age independentemente de todos os outros
fatores, nenhum outro fator serve de substituto da Palavra.

O conteúdo substancial da grande comissão é que homens


de todas as nações sejam feitos discípulos de Cristo mediante o
ensino da Palavra de Deus.
26

Quase não é preciso demonstrar pormenorizadamente que


na era apostólica a evangelização era feita mediante o ensino e a
pregação da Palavra. Assim era invariavelmente.
Indubitavelmente, evangelização é a apresentação do
evangelho, e o evangelho é a Palavra de Deus. Romanos 10:13-
17 estabelece o caso de modo sumário. Depois de afirmar: “Todo
aquele que invocar o nome do Senhor, será salvo”, o escritor
inspirado continua: “Como, porém, invocarão aquele em que não
creram? E como crerão naquele de quem nada ouviram? E como
ouvirão, se não há quem pregue? E como pregarão, se não forem
enviados? Como está escrito: Quão formosos sãos os pés que anunciam
cousas boas!...E assim, a fé vem pela pregação e a pregação pela
palavra de Cristo”. A tarefa do evangelista é confrontar os
homens com a Palavra de Deus.

O conhecimento da Palavra de Deus é requisito da fé


salvadora. Mais que isso, é elemento constitutivo da fé
salvadora [não existe fé salvadora sem que tenha sida gerada da
Palavra de Deus. A ordem é primeiro ouvir e depois crê – cf.
Jo.3:3; 5:24,25 – At.13:48; 18:27. Aquele que crê aplica à verdade
revelada na palavra de Deus e se confia ao Filho de Deus para a
salvação, mas evidentemente ele não é capaz de fazer nenhuma
destas coisas sem conhecer o conteúdo da Escritura. Sem as
Escrituras o pecador jamais enxergará a beleza de Cristo
(Is.53:2,3). Erram dolorosamente aqueles que premiam a
ignorância sugerindo que quanto menos uma pessoa conhece a
27

Bíblia, mais simples e mais forte será a sua fé. A


antítese(oposição) de conhecimento e fé é inteiramente falsa. A
fé não é nem um salto no escuro nem um jogo. Todo aquele que
se entrega ao salvador o faz graças ao conhecimento do
Salvador, conhecimento recebido da Santa Escritura.

Costuma-se fazer distinção entre a aceitação das


proposições bíblicas concernentes a Cristo e a entrega que
alguém faz de si mesmo à pessoa de Cristo. A distinção é
válida. Presumivelmente, uma pessoa pode aceitar proposições
tais como as de que Cristo nasceu da virgem Maria, que Ele
morreu pelos pecadores na cruz do Calvário, e que ressuscitou
dos mortos, e ainda assim essa pessoa pode não se entregar à
pessoa de Cristo para salvação. Logo, tem somente a chamada
fé especulativa ou histórica, como a que Paulo atribui ao rei
Agripa quando lhe perguntou se acreditava nos profetas e logo
acrescentou: “Bem sei que acreditas”(At.26:27). É um caso de
ortodoxismo, ou ortodoxia morta. Contudo, nem por um
momento abriguemos o pensamento de que é possível crer na
pessoa de Cristo sem crer no que a Bíblia ensina a respeito dele.
Isso está inteiramente fora de questão. Portanto, sem pregação
genuína da palavra de Deus não existe fé salvadora. A palavra é
a única suficiente para levar o pecador enxergar a beleza que há
em Cristo, crendo que Ele é o Filho de Deus e, crendo tenha
vida eterna.
28

II – A PALAVRA DE DEUS E A CONDUTA EXEMPLAR

Ninguém tem direito de dizer que Deus não pode usar Sua
Palavra para a salvação dos pecadores se essa Palavra é
apresentada por uma pessoa não salva. Deus é soberano, e
também neste ponto Sua soberania deve ser respeitada. Ele
colocou uma profecia esplendidamente bela nos lábios do
ímpio Balaão (Nm.24:17-19) e fez o perverso Caifás dar
testemunho da expiação vicária de Cristo (Jo.11:49-51). Judas
Iscariotes foi um dos doze enviados por Jesus para pregar o
evangelho da verdade anunciado por um infiel ou hipócrita.

Entretanto, aquele que ensina a outros a palavra de Deus e


não a pratica, não tem direito de esperar que a bênção divina
repouse sobre o seu ensino. O que ele faz contradiz o que fala.
Os homens têm toda razão de censurá-lo, dizendo: “Médico,
cura-te a ti mesmo”, e de lhe lançar em rosto o dito vulgar: “o que
você faz fala tão alto que não posso ouvir o que diz”.

Vale observar que Deus em soberania pode usar essa


“burra” para falar a pecadores. Mas, isso não a isenta da sua
responsabilidade (Mt.7:21-23).

Doutro lado, a vida do evangelista piedoso reforçara sua


mensagem, como eloqüente testemunho de sua veracidade. No
entanto, ninguém deve concluir que vida piedosa e conduta
exemplar pode tomar o lugar do Evangelho e torna-lo
29

supérfluo. Com freqüência essa posição é tomada, e não poucas


vezes se conta piedosamente algo da vida de Francisco de Assis
em apoio dela. Um dia Francisco convidou um jovem monge
para acompanhá-lo a certa aldeia com a intenção de pregar o
Evangelho ali. Chegando na aldeia, encontraram muitas
doenças e grande pobreza. O empenho por aliviar aquela
miséria os manteve ocupados o dia inteiro. Ao entardecer, o
jovem monge virou-se para Francisco perguntando,
preocupado, quando iam começar a pregar. Francisco
respondeu: “Estivemos pregando o Evangelho o dia todo”. Se
Francisco pretendeu igualar atos de misericórdia à Palavra de
Deus como meio de graça, enganou-se.

Os que afirmam que um bom exemplo de piedade pode


substituir o Evangelho, não tem base bíblica. Quando Jesus
enviou Seus doze apóstolos às ovelhas perdidas da casa de
Israel, encarregou-os: “Pregai que está próximo o reino dos céus.
Curai enfermos”(Mt.10:7,8). Deveriam não só curar, mas também
pregar. A pregação era, de fato, a sua primeira e primordial
tarefa. Eles obedeceram: “Percorriam todas as aldeias, anunciando o
evangelho e efetuando curas por toda parte”(Lc.9:6). Quem quer que
esteja familiarizado com a carreira missionária de Paulo sabe
que ele considerava a pregação sua vocação, e que subordinava
a ela as obras de cura.

Há uma passagem da Escritura que, à primeira vista, parece


ensinar que em certos casos a Palavra de Deus pode ser
30

ignorada na evangelização, e que o comportamento exemplar


pode tomar o seu lugar. O apóstolo Pedro exortou as esposas de
incrédulos, dizendo: “Mulheres, sede vós, igualmente, submissas a
vossos próprios maridos, para que, se alguns deles ainda não obedecem
à palavra, sejam ganhos, sem palavra alguma, por meio do
procedimento de suas esposas, ao observarem o vosso honesto
comportamento cheio de temor”(1Pe.3:1,2). Pode-se observar que é
quase inconcebível que o marido não crente de uma mulher
cristã não tivesse nenhum conhecimento da Palavra de Deus.
Mas há outra consideração, ainda mais ponderável. A tradução
“sem a palavra”, que aparece em certas versões, não é correta.
No original não consta o artigo definido. Está certa a tradução
que aparece noutras versões: “sem palavra” ou, como a que
transcrevemos acima: “Sem palavra alguma”. Portanto, esta frase
não se refere à Palavra de Deus e, sim, à palavra da mulher.
Numa colocação popular, por seu andar, antes que por seu
falar, ela deve procurar ganhar seu marido descrente para
Cristo.

É evidente que, embora o evangelista tenha o sagrado dever


de reforçar sua mensagem com uma conduta cristã exemplar, a
vida piedosa não substitui o Evangelho.
31

III – A PALAVRA DE DEUS E A EXPERIÊNCIA RELIGIOSA

A experiência é da essência do cristianismo. O novo


nascimento, sem o qual ninguém pode ver o reino de Deus
(Jo.3:3), é uma experiência, embora subconsciente. A convicção
do pecado, o arrependimento para com Deus, a fé em Cristo, o
crescimento em santidade, são experiências conscientes e tão
necessárias como à regeneração.

Contudo, a substituição do evangelho pela experiência


religiosa, quer do evangelista, quer do evangelizando, é erro da
maior gravidade.

É amplamente difundida e freqüentemente expressa a


opinião de que em alguns casos os homens são introduzidos no
reino mediante alguma experiência mais ou menos
impressionante, com escassa ou nenhuma referência a Palavra
de Deus. Por exemplo, dizem de pecadores que se converteram
graças a uma grave enfermidade, ou a um acidente quase fatal,
ou à morte de um filho querido.

Conquanto devamos insistir em que o novo nascimento é


condição indispensável para o exercício da fé salvadora, não há
por que negar que Deus pode empregar dessas experiências a
fim de preparar psicologicamente os pecadores para receberem
o Evangelho. O que é preciso negar vigorosamente é que essas
experiências são outro meio de graça em acréscimo à palavra de
32

Deus ou no lugar dela (ex. Os testemunhos atuais, teatro,


louvorzão etc).

O ensino de Jesus sobre o ponto em questão é bem claro.


Na parábola do rico e Lázaro, o rico, padecendo tormentos do
inferno, viu ao longe Abraão e Lázaro no seu seio. Sendo
recusado seu pedido de que Abraão mandasse Lázaro molhar
em água a ponta do dedo e lhe refrescasse a língua, fez um
apelo de suprema urgência: “Pai, eu te imploro que o mandes `a
minha casa paterna, porque tenho cinco irmãos, para que lhes dê
testemunho a fim de não virem também para este lugar de tormento”.
Mas Abraão respondeu: “Eles tem Moisés e os profetas; ouçam-nos.
O rico insistiu: “Não, pai Abraão; se alguém dentre os mortos for ter
com eles, arrepender-se-ão. A resposta de Abraão foi categórica:
“Se não ouvem a Moisés e aos profetas, tão pouco acreditarão, ainda
que ressuscite alguém dentre os mortos”. (Lc.16:23-31). “Moisés e os
profetas” eram a Bíblia daqueles dias. É difícil imaginar
experiência mais tremenda do que a visita de alguém
ressuscitado dentre os mortos. A mais impressionante
experiência não salvará aquele que se nega a ouvir a Palavra de
Deus. Por isso, não se deve evangelizar pecadores contando o
seu passado, como referencial.
33

IV – A PALAVRA DE DEUS E A ORAÇÃO

Às vezes se fala da oração qualificando-a como meio de


graça. Pode-se pensar assim, desde que se lembre que a oração
como meio de graça não deve ser igualada – e nem mesmo
coordenada – com a Palavra de Deus. A Palavra de Deus e a
oração são meios de graça em diferentes sentidos. Deus
comunica a graça salvadora pela instrumentalidade de Sua
palavra. Com freqüência o faz em resposta à oração.

Podem-se fazer aqui duas breves afirmações que deviam


ser totalmente supérfluas, mas talvez não o sejam. Sua
veracidade parece que não é evidente para todos.

Orar da maneira mais fervorosa pela conversão dos não


salvos, esteja na china ou na casa vizinha, e não fazer nada para
que eles conheçam o evangelho de Jesus Cristo, é abominação.

Ser diligente como nunca em levar o Evangelho aos


perdidos, e não orar para que Deus abençoe o evangelho no
coração deles, para a salvação, é o cúmulo da loucura, pois
somente Deus o Espírito pode chamar efetivamente pela
Palavra, os pecadores ao Arrependimento.

* Adaptado do livro “Evangelização Teocêntrica” de R.B.


Kuiper
34

CAPÍTULO IV

A MENSAGEM DA EVANGELIZAÇÃO
(R.B. Kuiper)

Na verdade, a mensagem da evangelização é algo muito


amplo. Mas, de início, devemos ter sempre em mente que ela é
primordialmente cristocêntrica. Nunca em relação ao Cristo da
modernidade, o qual não revela a Deus, mas, é simplesmente
um bom homem. Um modelo a ser seguido. Mas o Jesus da
nossa evangelização deve ser “Aquele que é o resplendor da glória e
imagem da Sua substância”, (Hb 1:3).

I- EVANGELHO DE ARREPENDIMENTO

A Palavra de Deus fala muitas vezes em evangelho de


arrependimento. João Batista (Mc 1:4,15), a ordem de Jesus que
se pregasse arrependimento para remissão de pecados (Lc.
24:47).

É obrigatório que na evangelização, o apelo para o


arrependimento deve vir primeiro do que qualquer outra coisa.
35

Só o oprimido pelo pecado perceberá sua necessidade de um


salvador.

Embora alguns psiquiatras não concordem com isso, a


convicção de pecado é indispensável para que haja fé em Cristo.
Para que pecadores sejam levados ao arrependimento, a lei de
Deus, que é santa, justa e boa (Rm 7.12), como o próprio Deus é,
deve ser pregada, pois “pela lei vem o pleno conhecimento do
pecado” (Rm 3:20) Aquele que se olha nesse espelho, só pode
desprezar-se a si mesmo.

Há duas tristezas pelo pecado: remorso e arrependimento.


Calvino diz o seguinte das duas: “A tristeza do mundo é a que
os homens sentem quando se desanimam em conseqüência de
aflições terrenas e ficam dominados pelo pesar; enquanto que a
tristeza segundo Deus é a que os homens sentem quando olham
para Deus e consideram como única miséria o terem perdido o
favor de Deus.” A primeira decorre exclusivamente do amor
próprio e leva à morte; a segunda tem suas raízes na reverência
para com Deus e resulta em arrependimento para a salvação.

O arrependimento sentido no coração é indispensável para


a salvação, todavia não tem méritos para a salvação. É o próprio
dom de Deus, (At 11:18).

Frase de Augusto Toplady “Corressem sempre lágrimas de dor


por meus pecados, nunca os apagaria; só Tu me salvas, sim, só Tu,
Senhor.”
36

II - EVANGELHO DE EXPIAÇÃO

O âmago do Evangelho não tem que ver com aquilo que


Deus exige de um pecador. Isto é importante, mas não é o
centro dele. Como o próprio nome indica, o Evangelho não
consiste de mandamento, mas de notícia. São as boas novas que
Deus em Cristo fez pela salvação dos pecadores.

Por exemplo: um criminoso está em sua cela e um amigo


lhe visita dizendo: Seja bom. Que boa notícia seria essa?
Contudo, essa é exatamente a única mensagem que alguns
evangelistas têm para os pecadores. Isso não é boa notícia. Para
o pecador, a boa notícia é que fora feita provisão para que seja
libertado do pecado e do inferno.

A provisão foi feita no Calvário (Is 53:5-6). Jesus foi


traspassado pelas nossas transgressões; Ele nos resgatou da
maldição de Deus que merecíamos por não perseverarmos em
todas as coisas que estão escritas no livro da lei, fazendo-se Ele
maldição por nós (Gl 3:10,13); “Aquele que não conheceu
pecado, Deus o fez pecado por nós; para que nele fôssemos
feitos justiça de Deus”(2Co. 5:21; Rm 5:18-21).

Esse é o centro do Evangelho. Por Sua morte na cruz o Filho


de Deus satisfez plenamente a justiça penal de Deus, em favor
dos pecadores.
37

A teologia modernista torce esse significado quando tenta


ensinar que a morte de Jesus visava reconciliar o homem com Deus e
não Deus com o homem. Diz-nos então, que como Deus é amor,
não tinha necessidade de reconciliar-se como homem, nem que
o coração de Deus teria que ser abrandado com a morte do
Cordeiro com antigas lendas.

O Pr. Moisés Bezeril diz que muitos pregadores tem feito uma
exposição do plano salvador de Deus sempre apresentando o homem
como estando distante de Deus, e precisando se reconciliar. É bem
verdade que o homem está distante de Deus. Mas o problema é que
essa mensagem ensina que Jesus reconciliou o homem com Deus e não
Deus com o homem. Parece até que Deus estava implorando ao homem
que ficasse com Ele, e o homem foi embora, para bem distante de Deus,
mas Ele ficou em profunda nostalgia por causa desse fato, e ainda
assim espera por uma reconciliação por meio do sacrifício de Seu
próprio Filho que traz o homem de volta para Deus. Essa é a pregação
que também afirma que Deus ama todos os pecadores igualmente para
a salvação. Destitui-se assim o aspecto da ira de Deus sobre o pecador
sem Cristo, e prega-se um Deus-avô que faz vista grossa para com as
traquinagens dos netos. Mas a Bíblia nos ensina que na história da
salvação a parte ofendida pelo pecado não foi o homem, e sim Deus.
Logo, quem precisa ser reconciliado é Deus com o homem. Sua Palavra
nos ensina que a Sua ira está sobre todos os pecadores que não foram
amados para a salvação (Rm 5:10-11; Ef 2:3; Rm 5:9). Jesus não
morreu para satisfazer a vontade do pecador, mas sim a vontade de
38

Deus que era vingar na morte do Seu próprio Filho a hediondez do


pecado que lhe ofendeu profundamente. Jesus cumpre a Lei e sofre o
castigo da mesma para cumprir as exigências da Lei de Deus e não do
homem.

Para Bezeril o Evangelho se torna caricatura quando em vez


de apresentar um Deus que precisa ser aplacado em Sua ira
pelo sangue do Cordeiro, para que o homem seja salvo pelo
sacrifício expiatório de Jesus. Esse moderno evangelismo
apresenta o pecador cheio de razões e exigências, e até
merecendo ser reconciliado, apresentando assim a figura de um
Deus que ofendeu ao homem e que espera algum dia, por meio
de Jesus conquistá-lo novamente. Mas essa não é a verdade do
Evangelho. O Evangelho nos ensina que Deus decretou a morte
como salário pelo pecado (Gn.2:17; Rm 6:23). Desviar-se Deus
um fio de cabelo da vereda da justiça perfeita seria negar-se a Si
mesmo. Mas, se existe alguma coisa que Deus não pode fazer é
isso (2 Tm 2:13) Assim, em vez de deixar sem punição o pecado,
Ele o puniu pela morte de Seu próprio Filho. Por natureza todos
os homens são “filhos das ira” (Ef 2:3). Sobre aqueles que não
crêem em Jesus a ira de Deus permanece. Por outro lado, os
crentes em Cristo, “sendo justificados pelo Seu sangue” são
“por ele salvos da ira” (Rm 5:9).

Um aspecto muito importante do Evangelho que tem sido


muito negligenciado pelos pregadores modernos é a obediência
ativa de Cristo. Muitos salientam apenas a morte de Cristo,
39

como se Deus somente exigisse um castigo pelo pecado. Mas a


verdade é que além do castigo pelo pecado, Deus exige total e
perfeita obediência a Sua lei para recompensar com o mérito da
vida eterna. Assim, a mensagem do Evangelho não é somente a
morte de Jesus, mas a sua vida de obediência ativa à lei de
Deus. Cristo foi sem pecado. Somente ele poderia obedecer
perfeitamente à lei de Deus, (Rm 5:18,19).

III - EVANGELHO DA GRAÇA

A expressão “salvação pela graça” não significa outra coisa


a não ser “salvação por Deus”. O Evangelho ensina que a
salvação é cem por cento do Trino Deus.

Deus o Pai decreta a eleição, dos que hão de ser salvos em


Cristo, antes da fundação do mundo (Ef 1:4). Escolheu-os não
porque previu neles algum mérito ou bem, mas por Seu amor
(Ef 1:5; Rm 8:29). Esses, o Pai deu ao Filho, sendo a salvação
coisa segura, ninguém pode arrebatar da sua mão, (Jo.10:28,29).
Aqueles a quem o Pai amou, a esses predestinou para a
salvação, (Rm 8:30).

O filho obteve merecimento da salvação. Ele pagou a dívida


dos pecadores até o último centavo. Foi esmagado, abandonado
em lugar de todos os criminosos merecedores do inferno. Por
sua perfeita obediência ao Pai, mereceu para os pecadores a
justiça, a vida eterna e glória eterna. Em conseqüência, nada
40

resta que entre na conta dos méritos dos pecadores. Cada um


deve dizer “Nada trago em minhas mãos”. O Filho não obteve
somente o mérito, mas ele dá também o mérito. Cristo não
morreu potencialmente pelos pecadores. Ele morreu
efetivamente por eles. Ninguém é capaz de explicar ou
entender como pode alguém ter morrido a morte de outra
pessoa, e essa pessoa ainda assim morrer. “Espera lá! Morreu
por mim ou não morreu? (ela pergunta) E como você me diz
que eu ainda estou condenado à morte, se de fato não há
nenhuma morte mais para mim, pelo fato de alguém ter
morrido por mim?” Esta é exatamente a confusão na qual estão
todos aqueles que crêem que Jesus morreu potencialmente. O
filho morreu vicariamente, e não potencialmente.

O Espírito aplica a salvação aos pecadores, dando-lhes


coração de carne (Ez 36:23-27). Fazendo-os nascer de novo, em
conseqüência eles tomam posse de Cristo e de todos os seus
benefícios salvadores. A fé salvadora é fruto da regeneração. A
regeneração vem antes da fé.

A fé é ato do homem. Não podemos imaginar que Deus crê


no lugar dos homens. Seria isso um absurdo. No entanto,
devemos enfatizar não menos, que a fé salvadora é dom de
Deus. Quando Jesus convida em Jo 6:35 “O que vem a mim,
jamais terá fome; e o que crê em mim jamais terá sede”, logo em
seguida ele afirma “Ninguém pode vira a mim, se o Pai que me
41

enviou não o trouxer” (Jo 6:44). A fé é dom de Deus (Fp 1:29; 1 Co


12:3; Ef 2:8; At.18:27).

Devemos então dizer aos pecadores não salvos que a fé é


dom de Deus? Sim, devemos. Devemos contar-lhes toda a
verdade sobre esta questão. Deixá-los embebidos no
pensamento de que podem crer por um ato de sua própria
volição, à parte da graça regeneradora do Espírito é coisa pior
do que irresponsabilidade.

Alguns dizem que este tipo de mensagem faz com que as


pessoas fiquem revoltadas contra Deus, ou que pode
amedrontá-las com a terrível ira de Deus. Assim sendo, o
homem não creria por amor, mas por medo.

A primeira coisa que questiono nesse argumento é a falsa


idéia do homem compreender a mensagem, e em vez de ser
salvo se torne revoltado. O homem natural não compreende o
evangelho, e quando compreende ele se torna um salvo pela
graça, e não um revoltado. O homem se revolta contra Deus
não é por causa do conhecimento da mensagem, e sim porque
ele é pecador e não se submete jamais a Deus, reconhecendo
sua perdição, e recorrendo à graça salvadora. A causa da sua
revolta é o seu pecado e não o Evangelho.

O argumento de que o homem vai a Deus por medo da Sua


ira também não se encaixa no ensino do Evangelho. Não há um
só texto na Palavra de Deus que nos informe de que o medo
42

produza salvação. Nenhum homem crê em Jesus por medo da


ira de Deus. Medo não converte pecador, nem tampouco muda
seu coração ou mente, nem faz o homem andar nos estatutos do
Senhor, pois a regeneração é obra do Espírito e não do homem.

Um outro argumento que se tem geralmente levantado é o


de que a pregação dessa forma fica muito doutrinária,
especificando-se assim pontos dificílimos da doutrina cristã e
que certamente o pecador não vai entender. Tem que ser uma
mensagem simples e de fácil compreensão ao pecador.

A este argumento respondo que o Evangelho não está


disponível à capacidade intelectual do pecador. A mensagem é
uma verdade espiritual que só é entendida se o Espírito de
Deus abrir a mente. Portanto, mesmo que nossa mensagem seja
simples e de fácil compreensão, ela só será entendida se Deus
assim o quiser. Não interessa se seja ela fácil ou difícil, importa
apenas que ela contenha os elementos essenciais do Evangelho
com os quais Deus opera a regeneração que produz o
arrependimento e a fé salvadora para sua conversão.

É preciso dizer enfaticamente ao pecador que ele tem que


crer e que, se não crer, a ira de Deus permanecerá sobre ele.
Não se pode imaginar pior dilema do que aquele no qual se
acha o pecador não salvo. Ele tem que crer em Cristo. Senão
crer estará condenado. Mas ele não é capaz de crer. É preciso
cientificá-lo desse dilema tremendo. Se o Espírito Santo o tornar
43

ciente disto, o pecador dirigirá o olhar para longe de si, em


busca de salvação e se abandonará sem reserva à graça de Deus.
É esse precisamente o ato da fé salvadora.

Em João 5:1-9, o paralítico recebeu ordem para fazer


exatamente aquilo que ele não podia. Ninguém pense que ele
não estava ciente de sua incapacidade. Mas ele sabia também
que sua única esperança de ficar bom de saúde estava em fazer
justamente aquilo. Conhecendo plenamente a sua condição,
esqueceu-se de si mesmo e fixou os olhos em Jesus. Isso é fé.
Pela fé ele foi totalmente curado.

IV- EVANGELHO DO NOVO NASCIMENTO

É quase comum em nossas pregações ordenarmos às


pessoas que “nasçam de novo”. De fato, não há na Bíblia essa
ordem. Aquele momento que Jesus teve com Nicodemos nos
apresenta um indicativo, e não um imperativo. O texto de
Efésios 5:14 “Desperta, ó tu que dormes, levanta-te de entre os
mortos” refere-se à igreja e não à descrentes (vs. 8-11). A razão
porque não há na Bíblia ordem para os mortos reviverem é que
um morto não pode vivificar-se por si. Por que então ordenar-
lhes que ressuscitem? Quando Jesus ordenou à Lázaro para se
levantar e vir para fora, ele não estava ordenando-o que Lázaro
devolvesse a si mesmo a sua própria vida. Ali estava em
evidência a palavra de poder de Jesus.
44

Seria desnecessário então informar ao pecador que ele tem


que nascer de novo? Não. Não devemos dar-lhe ordem para
nascer de novo como se isso dependesse dele. Mas em nossa
mensagem devemos mostrar-lhe que há necessidade de um
novo nascimento operado pelo Espírito Santo, com o mesmo
propósito com que Jesus disse à Nicodemos: quebrar a falsa
confiança de salvação por obras. O pecador deve ser alertado de
que salvação é um nascimento espiritual operado por Deus, e
que ele jamais poderá fazer isso na sua própria vida, assim
como um morto não pode voltar à vida.

O que se tem popularmente divulgado na tradição


evangélica moderna é que o evangelho é de quem quiser. Mas o
que nos diz a Palavra de Deus e a experiência do evangelismo é
que a recusa do evangelho por parte do pecador não é apenas
uma questão do querer ou não querer do homem. Será que há
alguém nesse mundo que tendo consciência de tão terrível
condenação não queira ser salvo? A verdade é que todos
querem ser salvos, mesmo que não compreendam como podem
ser. Mas porque nem todos são salvos? Será que não querem? É
claro que querem. Mas será que entendem o significado da
salvação e como ela opera? É claro que não. Por isso poucos se
salvam. A eficácia do Evangelho não está meramente em o
homem querer, mas em Deus querer, (Rm 9:6). O fato dos
discípulos não quererem vir a Jesus em Jo 5:40 é simplesmente
45

porque a eles não lhes foi revelada a verdade salvadora, por


isso eles não criam (Jo 5:44-47).

O que também precisa ficar claro em nossas mentes é que a


prova da regeneração não está na vida de perfeição sem pecado
mas, antes, na profunda convicção de pecado que leva a pessoa
a correr para o calvário, ajoelhar-se aos pés de Jesus e bradar:
“Lava-me Senhor, senão eu morro!” Um exemplo disso era
Nicodemos. Moralmente um bom homem, mas sem salvação,
(Jo 3).

V- EVANGELHO COMPREENSIVO

O evangelho, na verdade possui muitos aspectos que não devem ser


negligenciados na pregação:

1) O Evangelho é história. A história de Jesus e seu amor, a


história de seu nascimento, morte e ressurreição.

2) O Evangelho é doutrina. A interpretação que Deus dá


dessa história, particularmente a doutrina da pessoa divina de
Cristo e de sua obra expiatória e vicária.

3) O Evangelho é convite. A oferta sincera de salvação feita


por Deus a todos os que são alcançados pelo Evangelho. E
entenda-se bem, esse convite é incondicional.
46

4) O Evangelho é promessa. A promessa de vida eterna que


Deus faz a todos os que, para a salvação confiam no Cristo
divino e em sua obra redentora.

5) O Evangelho é exigência. É exigência de Deus que os


homens creiam em Cristo. Aqui se fundem a Lei e o Evangelho.
O Evangelho se torna Lei.

6) O Evangelho é uma ordem. Dada por Deus àqueles que


confiam em Cristo, para que, com igual satisfação, também O
sirvam como o Rei de suas vidas.

VI - O EVANGELHO EXCLUSIVO

Os pregadores do Evangelho devem conservar em mente a


total exclusividade do Evangelho de Cristo. Sem o
conhecimento desse Evangelho é impossível ao homem ter
alguma chance de salvação por algum atalho.

Imaginar que pessoas sejam salvas em outras religiões sem


o conhecimento desse Evangelho é admitir que Deus tenha Se
revelado de uma outra forma que não o Evangelho. Muitos até
afirmam que têm “irmãos” na Igreja Católica, simpatizando
com alguma forma de ecumenismo cristão. Mas esse
pensamento não passa de uma conjectura teológica. Só
podemos concordar até onde se ensine que em todas as
religiões do mundo existam eleitos que ainda não foram
chamados. Estão debaixo da ira de Deus até o dia de sua
47

justificação. A ordem da salvação ensinada no Novo


Testamento é: 1) Conhecimento (uma forma de relacionamento
com o eleito), 2) Predestinação, 3) Vocação, 4) Justificação, 5)
Glorificação, (Rm 8:29-30)

Afirmar que na Igreja Católica Romana tem vocacionados


para a salvação é perverter completamente a natureza e o
caráter de Deus, e comprometer a Sua santa Lei com o pecado.
Não podemos admitir que haja vocação sem reforma. A
vocação corresponde à regeneração e conversão (fé,
arrependimento e santificação). Onde podemos encontrar tudo
isso em alguém que nem sequer crê em Jesus suficientemente
para sua salvação. Pode-se então encontrar salvação naqueles
que tentam outro caminho para a salvação que não Jesus? Pode-
se encontrar salvação naqueles que negam a eficácia da obra de
Cristo para a salvação do pecador? Pode-se imaginar um
católico salvo por si mesmo através de suas próprias obras e
obediência à Lei de Deus? O problema dos Católicos Romanos é
que eles anulam totalmente o plano evangelístico através do
qual Deus determinou salvar o homem.

Portanto, quem quer que afirme tamanha mentira, está


totalmente equivocado sobre o Evangelho, nem sequer também
conhece a Cristo, nunca teve experiência de salvação, e está
totalmente perdido porque considera válido o caminho romano
das boas obras para a salvação.
48

VII - O EVANGELHO OFENSIVO

Muitas pessoas estão mais preocupadas em não ofender o


pecador do que com a salvação do mesmo. Tenta-se então
dizer-lhes a verdade que machuca com palavras brandas. Mas
não podemos correr tal risco porque mais do que não ser
ofendido ele precisa ser salvo. E Deus escolheu salvar o homem
por meio de palavras ofensivas ao ego do homem.

Pode-se imaginar quão duro foi aquele diálogo com


Nicodemos! Naquela noite, Nicodemos esforçou-se para ir ter
com Jesus. Chegou perto do mestre com palavras bonitas de
elogio: “Rabi, sabemos que és mestre da parte de Deus, porque
ninguém pode fazer os sinais que tu fazes.” Mas Jesus deu-lhe
uma resposta que sei com certeza que poucos diriam: “Você é
um homem perdido”.

Um outro episódio do Evangelho ofensivo está em João 6.


Ali parece ser a expressão mais ofensiva do Evangelho, pois os
próprios discípulos reclamaram disso: “Duro é este discurso”
(v.60) e “já não andavam com ele”.

Por quais razões este Evangelho é ofensivo?

Primeiro é que o Evangelho anuncia a salvação do pecador


pela graça somente. Isto é muito humilhante para o homem, o
qual, amante de si mesmo, sempre tem em mente ser merecedor
de algo. E certamente, o que mais lhe fere é a questão do
49

Evangelho não reconhecer nada de bom nele, apontando-o


sempre como condenado, sem nenhuma chance de salvar-se
por si mesmo.

Segundo, é que o Evangelho de Cristo pretende ser


exclusivo na salvação do homem. Deste aspecto do Evangelho,
nem mesmo os “crentes”, dentro das igrejas evangélicas
gostam. Eles detestam a afirmativa “solus Christus”, pois
entendem que junto com Jesus é eficiente a obediência à lei para
a salvação. E até hoje, essa é uma pregação tradicional em
muitas igrejas evangélicas arminianamente históricas. Crêem os
crentes que perdem e ganham salvação dependendo da
obediência, e assim falham no “Solus Christus”, Jesus não é
suficiente para a salvação do homem.

Nenhum crente fiel à obra de evangelizar deverá fugir do


caráter ofensivo do Evangelho. A mensagem do Evangelho que
não ofende o homem por constrangê-lo em seus pecados
certamente não fala nada à mente e ao coração do pecador sem
Cristo. Nunca deveríamos estar procurando admiradores do
Evangelho (como Nicodemos), ou amigos do Evangelho. O
pregador do Evangelho sempre deverá estar procurando
inimigos do Evangelho, pois é com eles que Deus quer fazer a
reconciliação, (Rm 5:10-11; Jo 9:39-41).
50
51

CAPÍTULO V

A CARICATURA DO EVANGELHO DE CRISTO


Moisés Cavalcanti Bezerril

A avaliação que ora passo a apresentar visa tão somente


redirecionar a Igreja de Cristo ao ponto de partida da nossa
tradição apostólica quanto à evangelização do pecador. Meu
maior interesse aqui não é apresentar nenhuma disputa sobre
qual método de evangelização produziria o maior número de
convertidos para o Reino de Deus, pois isso não é a nossa
primeira preocupação.

Com que estamos preocupados afinal?

Minha maior preocupação é com o rumo que estamos


tomando a cada dia na tarefa de evangelizar o mundo. A
questão na qual eu estou mais interessado é saber se a pregação,
os meios e os métodos modernos do evangelismo hoje estão
realmente produzindo os verdadeiros crentes que devem
compor a Igreja de Cristo.
52

QUAIS SÃO AS CARACTERÍSTICAS DO EVANGELHO


MODERNO?

I - UM EVANGELHO EXISTENCIALISTA

A ordem de Jesus em Lucas 22:47 é que se pregasse o


arrependimento para a remissão dos pecados.

Em todo Novo Testamento não existe sequer uma ordem


para mudar essa prioridade.

No entanto, o evangelismo moderno tem concentrado


esforços em oferecer algo que atraia o pecador. Na verdade,
parece uma armadilha para pegar um animal por meio de algo
que lhe seja de extremo interesse.

Nos vários programas modernos de evangelismo, os


métodos e estratégias tem sido algo de maior interesse do que a
própria Palavra de Deus. Não interessa o que vai ser pregado. O
que interessa é como vai ser pregado.

Mas o que queremos enfatizar ainda não é bem esse


aspecto. O aspecto existencialista do evangelismo moderno é
que as pessoas não entendem outra coisa com os termos
“igreja” e “evangelho” além de “clínica” e “solução”. Tenho
ouvido programas evangélicos de rádio que não passa de puro
existencialismo. Todas as pessoas estão apenas interessadas em seus
53

próprios problemas durante todo tempo. Procuram o Evangelho por


causa de algum lucro, solução, ou resolução de seus próprios
problemas. Os cultos não são para glorificar a Deus, mas para
fazer um “negócio” com Deus. O Evangelho não oferece vida
eterna, mas tão somente curas e toda espécie de solução de
problemas. Assim, as igrejas que compartilham desse tipo de
evangelismo estão abarrotadas, não de verdadeiros crentes que
foram constrangidos pela verdadeira pregação do Evangelho, mas de
pessoas que estavam sufocadas com suas próprias questões existenciais
e foram atraídos pela isca do evangelho existencialista. A grande
maioria das músicas desse tipo de evangelismo geralmente tem
letras existenciais. Essas pessoas parecem viver tão somente
para com seus próprios problemas sem fim, e fazem deles o
motivo de sua religiosidade. Parece até que se não houvessem
tantas questões existenciais, dificilmente alguém teria alguma
razão para cultuar.

O Evangelho se torna caricatura quando ele é apresentado apenas


como promessa de alívio dessas questões. O resultado desse tipo de
evangelismo é que no final as pessoas não se lembram nem
porque estão na igreja. O Evangelho foi apenas a isca do anzol.

II - O EVANGELHO DA APELAÇÃO

O evangelho da apelação consiste em apresentar um Deus


sempre triste e magoado com o homem porque ele resiste-O de
54

muitas formas. E assim, muitas músicas são feitas apresentando


a Deus pedindo “pelo amor de Deus” que o homem Lhe dê
guarida em seu coração. Não é errado que dizer que Deus faz
apelo ao homem. Ele sempre o fez através dos seus santos
profetas e apóstolos. O problema é o tipo de apelo que muitos
ensinam que Deus faz. Jesus é apresentado como um pobre
bom homem que está sempre batendo no coração do pecador e
volta sempre triste e abatido porque ninguém lhe abre a porta.

O Evangelho se torna caricatura quando resulta mostrando


a figura de um Deus tão fraco, pequeno e impotente quanto
qualquer ser humano. Um Jesus de propósitos frustrados, e que
vive a maior parte do tempo triste com o homem, pois está
saturado de tanto o pecador bater-lhe a porta na cara. Nesse
pensamento, a Divindade parece ser vítima inevitável da
vontade soberana do homem.

Com certeza, esse não pode ser o Deus e o Jesus do


verdadeiro Evangelho que apresenta Deus como sendo o
Soberano em toda a obra da salvação, (Ef 1:1-14).

III- UM EVANGELHO PRAGMATISTA

Por pragmatista entenda-se aqui “estratégico”. A forma de


evangelização do pecador, por alguns movimentos modernos
tem se assemelhado tão tecnicamente a uma empresa, que hoje
é possível até mesmo contratar “técnicos” eclesiásticos para
55

fazer uma “consultoria” da igreja e após cansativos cálculos e


confecção de gráficos, o técnico chega exatamente ao âmago do
problema que impede a igreja de crescer, e a proposta da
solução para o seu crescimento.

Pensa-se o tempo todo em estratégias. Gasta-se muito


apenas com aquilo foi aprovado como sendo produtivo. O
importante é que haja produção. O aumento de pessoas dentro
da igreja é apontado como um bom sinal de crescimento. Todas
as providências quanto às estratégias a serem tomadas devem
proceder como a administração de qualquer negócio bem ou
mal-sucedido.

Tudo o que funciona deve ser aproveitado na tarefa de


fazer a igreja crescer, independente de qualquer fundamento
bíblico.

O Evangelho se torna caricatura quando os pregadores só


conseguem enxergar o aspecto físico do reino de Deus, e
passam a administrá-lo como suas empresas. Gastam muito
tempo em estratégias e metodologias, e pouco se esmeram na
Palavra de Deus. A igreja inevitavelmente, na mente desses
homens se torna uma empresa. Li uma entrevista com um
pastor neo-pentecostal que falava dos “lucros” e “prejuízos” de
sua igreja.

A visão espiritual do Evangelho é perdida quando os


pregadores não são mais profetas enviados, mas sim
56

negociantes que sempre estão interessados no retorno dos


“investimentos” feitos na “empresa”. Geralmente são os
primeiros a desanimarem, quando a pregação deles não tem
muito efeito de imediato. Só querem pregar quando há sinal
de produção. Esses pregadores esquecem-se que Deus nos
ordenou pregar o Evangelho não foi somente para a produção
de convertidos. A mensagem do Evangelho é também um
veredicto de condenação sobre o homem. Muitas eram essas
mensagens dos profetas do Velho Testamento que saíam para
pregar já sabendo que ninguém se converteria. Mas eram
enviados por Deus. A mensagem do Evangelho não visa apenas
colocar pessoas na Igreja de Cristo, mas também decretar o
justo juízo de Deus sobre toda impiedade.

Ler anexo 07 ( fidelidade na evangelização – Gilson Carlos


de S. Santos)

IV - UM EVANGELHO DE EVIDÊNCIA NUMÉRICA

Em nossos dias, parece haver uma concorrência em todas as


áreas da vida do homem. Isso porque de certa forma a
população do mundo tem aumentado, e a vida tem sido muito
disputada em todos os sentidos. A mentalidade frenética de
número, produção, lucro, e concorrência do mundo moderno
57

tem afetado demasiadamente a mentalidade dos evangelistas


do nosso tempo.

Geralmente conserva-se a idéia de que o número e a


produtividade da igreja avaliam sua natureza e sua
originalidade. Em poucas palavras: igrejas grandes é sempre
sinal êxito e de aprovação de Deus.

Nos U.S.A a igreja que atualmente está com um


crescimento espantoso é a dos homossexuais. O Espiritismo
sempre foi a religião que mais cresce no Brasil. A Igreja
Mórmon é reconhecida pela eficácia de seus missionários que
em pouco tempo fundam igrejas sempre cheias. Nunca vi um
Salão das Testemunhas de Jeová com pouca gente. Os
movimentos neo-pentecostais mais escandalosos e que caem
perfeitamente no perfil neotestamentário do falso profeta são os
movimentos que mais crescem hoje em no Brasil.

Nunca foi verdade que o crescimento numérico é o aferidor


da natureza da igreja de Cristo.

O Evangelho se torna uma caricatura quando os evangelistas


olham para o homem como mais um número, e não como mais um
pecador que carece profundamente da graça salvadora de Jesus
para ser salvo. Os olhos de tais evangelistas estão mais interessados
nos pecadores para preencherem seus relatórios, ou tirar lucro
financeiro para sua igreja, do que movidos de compaixão pela alma
perdida daquela pessoa.
58

V - UM EVANGELHO DE OBRAS

É muito comum se criticar a Igreja Católica Romana pela


sua pregação de salvação por obras. Mas o que dizer dos
evangelistas protestantes que ensinam a mesma mentira da
Igreja Romana?

A verdade é, que sem perceber, muitos evangelistas estão


ensinando um caminho de obras para os pecadores igual faz a
igreja de Roma. Geralmente eles ensinam que Jesus é suficiente
para salvar o pecador. Mas essa idéia de suficiência em sua
mente nunca se identifica com a suficiência do pensamento
reformado “Solus Christus”.

O evangelho que tem sido pregado é exatamente aquele


evangelho de obras em que o crente tem que obedecer para
manter a sua salvação, ou se pecar termina perdendo-a . O
mesmo que diz que se pecar perde a salvação, é o mesmo que diz que se
obedecer torna a ganhá-la de volta. Essa mentalidade é de obras
porque sempre imagina em fazer algo para obter de Deus
mérito de vida eterna. Crêem que Jesus sozinho não é suficiente
para salvar o pecador e mantê-lo salvo. Esses crentes imaginam
que estão ajudando a Jesus em sua mediação por nós. Nunca
descansam somente em Jesus pela fé para sua salvação. Ao
contrário, agonizam diariamente na luta com seus próprios
pecados, sempre tentando escapar de perder a salvação. Os
59

mesmos dormem salvos e acordam condenados. Não


conseguem sequer passar um só minuto convictos de vida
eterna, pois não sabem com certeza quando poderão pecar
novamente e cair do estado graça. Pobres miseráveis que estão à
mercê de suas próprias sortes!

O Evangelho torna-se uma caricatura quando ele já não


consegue mais ensinar a suficiência de Jesus para a salvação. É
absurdo alguém afirmar que Jesus é suficiente para sua
salvação, e que foi salva pela fé em Jesus, e, no entanto, admite
que o crente tanto pode perder quanto ganhar a salvação,
dependendo de sua obediência. Alguém que pensa assim
jamais conheceu o verdadeiro significado do Evangelho de
Cristo. Ou melhor, jamais conheceu a Cristo, pois o Cristo que
ele conhece é impotente para salvá-lo totalmente. É estranho
imaginar alguém que diz ser salvo pela graça e, no entanto
conserva uma mentalidade de obras.

É tremendamente difícil para eu imaginar que alguém que


diga conhecer o Jesus do Evangelho e conserve uma brecha
para suas próprias obras seja salvo.

Qualquer brecha para uma mentalidade de obras no plano


salvador de Deus declara que o pecador ainda permanece
condenado, debaixo da ira de Deus, (Gl 2:16).

VI - UM EVANGELHO INOFENSIVO
60

É um evangelho inofensivo pelas seguintes razões:

a) Porque tenta agradar o ouvinte com uma mensagem que


o cative no auditório, e não na Igreja. Geralmente oferecem-se
cargos ou qualquer outra atividade para segurar o não
convertido na igreja. É preocupante o número de pessoas que
estão na igreja, que já se batizaram e até exercem cargos
simplesmente porque um dia se agregaram à igreja por motivo
de um passeio, pic-nic, ou qualquer interesse que as cativou ali,
sem nunca terem passado por uma verdadeira conversão. A
igreja entendeu que essas pessoas eram crentes e perguntou-
lhes se não queriam se batizar. Ninguém deve perguntar se
querem se batizar, apenas deve-se instruir sobre o significado
do batismo e de sua necessidade, mas nunca forçar ou
constranger alguém a desejar os sacramentos.

b) Porque tenta agradar o pecador com uma mensagem de


obras, produzindo uma falsa segurança de salvação.
Geralmente no apelo o pregador já vai impondo as condições
de obediência dizendo-lhe sempre o que ele deve "fazer" para
se manter salvo. Geralmente, essas mensagens de obras fazem
os pecadores crer que podem perder a salvação a qualquer
pecado, e que podem retomá-la voltando à obediência
novamente. É da própria natureza do homem querer operar sua
própria salvação, pois assim ele não tem que se submeter a uma
vontade de alguém, mas fará a sua própria. A mensagem de
obras agrada a todos porque todos operam como querem e não
61

como Deus quer. Além do mais, dá poderes ao homem para ele


decidir o que fazer e como fazer para ser salvo, podendo o
mesmo operar suas obras mesmo estando em pecado. Assim, a
mensagem de obras agrada porque ela é conivente com o
pecado. Todo pecador gosta de pecado e jamais se agradará
com uma mensagem que seja contra sua vida pecaminosa.

c) Porque tenta agradar o pecador com uma mensagem


sempre de amor. A maioria dos pregadores estão mais
interessados em dizer que Deus ama aquele pecador, do que
dizer-lhe que ele está debaixo da ira, e conseqüentemente
condenado. Ninguém que não esteja em Cristo Jesus pode ter a
experiência do amor salvador de Deus. Esse amor é descrito
como estando em Cristo Jesus (Rm 8:39), e só experimentam
este amor aqueles que estão em Cristo Jesus. Para os pecadores
que não estão em Cristo Jesus, o que lhes resta é a amarga
experiência da ira de Deus sobre aqueles que ainda
permanecem em rebelião com Deus e são declaradamente Seus
inimigos, (Rm 5:10-11). Não se deve dizer logo ao pecador que
Deus o ama. Como poderá entender isso se ele nem sequer
nasceu de novo? Uma outra pergunta que sempre faço é: Que
tipo de amor pretende-se dizer quando se diz ao pecador que
Deus o ama? Certamente tal pregador deve estar falando que
Deus se importou com a humanidade perdida, não deixando-a
à mercê de seus próprios pecados. O mesmo pregador deve
pretender, com a mensagem do amor de Deus, falar a respeito
62

da misericórdia e longanimidade de Deus, mas nunca deverá


querer dizer que Deus ama o pecador e ainda assim ele
permanece perdido. O amor salvador de Deus é somente para
os Seus eleitos. Os não eleitos perecem exatamente porque não
foram amados, mas, sobre eles permanece a ira condenadora de
Deus. Além do mais, essa mensagem do amor de Deus pelo
pecador sem Cristo causa no homem um certo conforto, pois o
mesmo pensará que Deus, de certa forma, está satisfeito com
ele, pois o ama. A mensagem do Evangelho deve provocar
desconforto no homem dizendo-lhe que Deus está totalmente
insatisfeito com o pecador, e que sua posição diante de Deus
não é confortável, mas de total desconforto, pois ele, ainda
sem Cristo, é inimigo de Deus. Só Jesus desfaz essa inimizade,
estabelece a paz e torna possível o verdadeiro amor de Deus
pelo pecador.

d) Porque tenta agradar o pecador com uma mensagem que


não seja "escândalo" ou "loucura". Neste ponto, muitos
pregadores têm tentado mudar a natureza ofensiva do
Evangelho para dar certo ou com as expectativas do ouvinte, ou
com suas necessidades racionais. Assim, muitos pontos do
Evangelho tem sido racionalizados e contextualizados às
necessidades dos pecadores, comprometendo profundamente a
natureza do Evangelho. Quando Paulo afirma em I Co 1:23 que
o Evangelho é loucura para os gentios e escândalo para os
judeus, é porque o Evangelho frustra as expectativas próprias
63

daqueles dois povos que queriam adornar o Evangelho de


Cristo de conformidade com suas próprias vontades. Mas o
Evangelho de Cristo é ofensivo em sua natureza porque sua
mensagem é contrária a vontade humana. "Os quais não
nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do
homem, mas de Deus." (Jo 1:13)

Todo pregador do Evangelho não deve estar preocupado


em não ofender o pecador com o Evangelho. Devemos nos
lembrar que a mensagem do evangelho não visa fazer "amigos"
do Evangelho, mas sim inimigos, pois é com eles que Deus quer
fazer a reconciliação (Rm 5:1-11).

O que temos hoje?

Uma igreja que busca a aprovação do mundo – Ler anexo


05 (apascentando ovelha ou entretendo bode - Spurgeon)
64

CAPÍTULO VI

A EVANGELIZAÇÃO DE JESUS CRISTO (Mc.10:17-27)


Pr. Dória*

I- PREGAVA O CARÁTER DE DEUS – Mc. 10:17, 18

O jovem descrito neste texto merece nossa admiração! Porque?

a. Era religioso e preocupado com sua vida espiritual. Ajoelhou-


se diante de Jesus e queria se assegurar da sua “vida eterna”.
(v.17). O seu desejo era tal que nem aguardou por um encontro
a sós com Cristo, mas diante de todos pergunta o que deve
fazer para herdar a vida eterna.

b. Era moralmente correto. “Tudo isso tenho observado desde a


minha juventude” (v..20). Sua vida era pura, casta, era honesto
com seus negócios, respeitava aos pais, não mentia, desde a
infância tinha aprendido todas estas coisas e as praticava (v.19)

c. Era rico. Era bem sucedido no mundo dos negócios e “era


dono de muitas propriedades” (v..22). Era um homem de posição
(Lc.18:18), possuía muitas propriedades (Mc.10:22)
65

Não seria extraordinário ganhá-lo para Cristo? Qualquer


evangelista não ficaria sonhando com sua conversão e iria
divulgar isso como tendo ganho um grande troféu? Não é isso
que os pregadores sentem quando uma personagem importante
se converte com sua pregação? O que nós faríamos nesta
circunstância? Penso que faríamos o que a maioria dos
evangelistas de hoje fariam: Perguntaríamos: Você acredita que
é um pecador? Que Cristo morreu por você? Você não aceita
Jesus como Seu Salvador? Você não quer receber segurança de
salvação agora, neste momento? Ore comigo...faça sua decisão
agora... e é bem provável que ele respondesse afirmativamente.
Seria uma “decisão” rápida. Faria parte da estatística dos
convertidos da Igreja e logo estaríamos espalhando isso por
todo canto onde fôssemos.

Mas o que Jesus fez? Tratou-o rispidamente, começou a


reprová-lo e exigiu um esforço imenso ao recomendar que
cumprisse os mandamentos e por fim “perdeu o peixe”. Será
que Jesus não era um bom evangelista?

A resposta de Cristo inicialmente foi dirigida, não à


pergunta do jovem, mas ao tratamento que ele dispensou-Lhe:
“Bom mestre”. Jesus recusou aceitar o cumprimento. Seria
apenas um bom mestre? Ele ignorava que Jesus fosse de fato
Deus, pois só Ele é de fato bom, essencialmente bom. Por que
Jesus insiste neste ponto aparentemente sem valor? Era apenas
um cumprimento respeitoso. A verdade é que Jesus aproveitou
66

esta oportunidade para repreendê-lo, como repreende, ainda


hoje, aqueles que estão prontos a elogiar homens e não
possuírem reverência e temor em relação a Deus.

Aqui vemos o assunto que queremos tratar nesta primeira


aula. Jesus queria honrar a Deus e estabelecer o respeito devido
por Seu caráter. Jesus queria chamar a atenção do jovem para os
atributos de Deus: Santidade e Bondade. Um Deus Santo!!

Jesus amava aquele jovem (v..21). Jesus chorou por


Jerusalém, mesmo que não fosse um amor especial que ele tem
por seus eleitos. Mas ela amou o jovem! Isso é uma condição
essencial para todo evangelista: amar o pecador.

Mas esta não é a motivação suprema do evangelista, como


não era de Jesus. Ele queria glorificar o Pai! Essa era a Sua
vontade demonstrada em todas as Suas ações: demonstrar a
glória do Pai aos homens. “Eu te glorifiquei na terra, consumando a
obra que me confiaste para fazer” (Jo.17:4). Este é o maior
compromisso do evangelista: a glorificação de Deus! Não temos
visto isso na nossa vida, temos de confessar. Antes de amarmos
aos pecadores, temos de amar a Deus e por isso sermos
movidos a amar os pecadores. Só assim podemos amar e ter
paixão pelos pecadores.

Qual foi a mensagem de Jesus?

O rapaz estava preocupado consigo mesmo mas Jesus


“virou a mesa”. O jovem fez uma pergunta e antes de
67

respondê-la, Jesus queria esclarecer um ponto crucial: Ele viera


para exaltar o Pai antes de salvar pecadores.

Isso fica demonstrado no evangelismo de Jesus e deve estar


presente em todo evangelista: pregar os atributos de Deus.
Jesus fez isso com a mulher samaritana quando disse que Deus
é Espírito (Jo.4), e o mesmo fez Paulo no Areópago, quando
começou dizendo que Deus é o Criador e mantenedor da vida,
o Todo Poderoso que ressuscitou a Jesus dos mortos. Dessa
forma Deus será honrado na nossa pregação. Isso é muito
diferente da pregação de hoje que se centraliza na capacidade
do homem. A pregação centrada em Deus mostra o estado
decaído do homem e que a única esperança de salvação está no
poder de Deus que não deixa o pecado do homem em branco,
mas exige que os homens clamem por perdão aos pés do Deus
Santo. O Deus com quem lidamos é triplamente Santo. Por isso
tiremos os olhos de nós mesmos os fixemos no Deus Santo das
Escrituras e assim nos veremos como realmente somos:
miseráveis pecadores. É assim que devemos proceder ao
evangelizar.

Sem saber quem é Deus o pecador não saberá a quem


ofendeu e que sobre ele está a ira deste Deus Santo que não tem
por inocente o culpado. Dessa forma faremos com que o pecador
se sinta como Isaías no cap.6:5 - “Ai de mim que estou perecendo”.
Aquele jovem rico precisava saber quem era Deus e Seus
68

atributos. Ele era religioso, mas isso não é o suficiente, ele


precisava se confrontar com a glória de Deus.

Isto está encoberto dos nossos evangelistas hoje quando


apenas falam do “bem estar eterno”, mas se esquecem da
pergunta crucial: “Quem é Deus?” A quem o pecador está
ofendendo, a quem você está ofendendo? Os pecadores
precisam saber que este Deus Santo é JUIZ! Hoje o que ouvimos
é esta expressão: “Deus o ama e tem um plano maravilhoso
para você, para sua vida!” Porém a Bíblia fala com muito maior
freqüência da santidade de Deus do que do Seu amor. Por que?
Porque os homens têm a tendência de primeiro se lembrarem
dos atributos que lhe favorecem do que aqueles que podem lhes
trazer ameaça.

Os liberais pregam só o amor de Deus e isso é apenas parte


da verdade. É bom lembrar que uma verdade parcial,
apresentada como sendo o total, torna-se uma mentira! É isso
que vemos na pregação do século vinte, um Deus meloso que
jamais feriria uma pessoa. Dizer que Deus está com a espada
afiada da Sua ira santa apontada para os pecadores depravados
e corruptos, e contra eles já armou o Seu arco com setas
inflamadas (Sl.7:12-13), é algo ausente da pregação
evangelística de hoje e até abominada.

Deus é amor, mas na conversa de Jesus com o jovem rico


Ele não o confortou na sua ignorância a respeito de Deus, mas
69

despertou-lhe temor ao afirmar que só Deus é essencialmente


bom, e Santo. O problema é que os pecadores imaginam um
Deus tão flexível que não punirá de forma alguma os homens.
Quando você, na sua evangelização, pede que pecadores
venham à frente, depois de lhes dar três ou quatro “regrinhas”
de como ir para o céu, está enganando estas pessoas e a você
mesmo. Você pode levá-las orar a Deus, repetindo sua oração,
mas quando elas repetem a palavra “Deus”, elas estão orando a
um Deus desconhecido, um Deus que elas não sabem quem é.

Por isso Paulo pergunta; “Como crerão naquele de quem não


ouviram?” (Rm.10:14). Os pecadores têm de conhecer este Deus
a quem têm de clamar por salvação, pois a “salvação pertence ao
Senhor” (Jonas 2:9) . Não podemos eliminar a doutrina da
pessoa de Deus, do Seu poder e glória no nosso evangelismo.

“Que farei para herdar a vida eterna?”, perguntou o jovem


rico. Você tem de clamar a Deus, mas antes de entrar em Sua
corte deve saber que Ele é Santo, Santíssimo, e que apenas um
raio de Sua glória o consumiria para sempre. A Bíblia diz que
“...nosso Deus é fogo consumidor” (Hb.12:29). Você tem de clamar
por misericórdia e não pense que está fazendo um favor por
“aceitar a Jesus” quando lhe pedem que dê uma “chance a
Jesus”.

Por isso, a pregação “açucarada” de hoje não é


evangelismo! Mas o que temos de fazer é apresentar todo
70

conselho de Deus, e que Deus é criador, sábio e santo e que faz


exigências ao homem: que morra para si mesmo, que clame por
misericórdia, que entre pela porta estreita. Este foi o Evangelho
que Cristo pregou, que Paulo pregou, que Agostinho pregou,
que Calvino pregou, que John Knox pregou e que nós devemos
pregar nos nossos dias.

Pregar os atributos de Deus é de relevância hoje para


quebrarmos com este tradicionalismo moderno que insiste
numa pregação de cinco minutos; num apelo por decisão e uma
conversão imediata; que esconde a santidade de Deus e a Sua
lei, necessária para mostrar a verdade do coração do homem,
depravado, corrupto e totalmente impossibilitado de se salvar
diante de um Deus que não perdoa o culpado, a menos que ele
se dobre diante da Sua soberania e clame como o publicano: “Ó
Deus, sê propício a mim, pecador”. Aprendamos com Jesus
quando evangelizava este jovem rico. O seu método deve ser o
nosso método. Não tenhamos receio de “perder o peixe”, mas
sejamos antes fiéis a Sua Palavra. Mostre o caráter de Deus:
Deus Santo.

II - PREGAVA A LEI DE DEUS – Mc. 10:19-21a

Aqui Jesus começa a responder a pergunta do jovem rico.


Também começa a ficar mais marcante a diferença do
evangelismo de Jesus com o evangelismo moderno.
71

Depois de falar sobre o caráter santo de Deus, Jesus passa


a falar sobre a Lei, os Dez Mandamentos, a lei moral. Esta
revela o caráter de Deus. Jesus usa a lei para levar o jovem a
refletir sobre o seu pecado - ele “quebrava” os primeiros
mandamentos.

Mas Jesus começa responder ao jovem citando os


mandamentos da segunda tábua, os cinco mandamentos
seguintes. Ele havia, num certo sentido, apresentado os quatro
primeiros quando o adverte quanto ao caráter de Deus, que é
santo e por isso não devemos adorar outros deuses e de como
devemos adorar o verdadeiro Deus. É a relação do homem para
com Deus. É claro que Jesus não estava afirmando que ele
poderia ser salvo pelas obras. Não é o que diz Gálatas 2:16.
Então, porque esta atenção com a Lei?

Jesus era um grande evangelista e sabia que a Lei é um


elemento essencial na pregação do Evangelho, porque é por ela
que “vem o conhecimento do pecado” (Rm.3:20). Pregar a lei não
tem sido comum nos nossos dias.

Enquanto Jesus recomendava a obediência à Lei, o jovem


devia esta se auto-absolvendo, pois não era adúltero, não
matava não roubava etc... Isso muita gente pensa. Mas Jesus
continuou pressionando até que no final os olhos do jovem são
abertos, e pela Lei pode ver que era um terrível pecador.
72

O que é pecado? É qualquer transgressão da Lei de Deus. É


o que João diz em I Jo.3:4 - Iniqüidade é uma palavra grega que
significa transgressão. É necessário se pregar a Lei e se expor
com isso a gravidade do pecado. Hoje no nosso evangelismo
temos a tendência de ir o mais depressa possível à cruz. Mas a
cruz fora do contexto da lei não tem significado. Por que? Sem a
Lei o sacrifício de Jesus não é nada mais do que alguma coisa
trágica (apenas) e não se percebe que sua obra expiatória na
cruz é exatamente a justiça divina sendo satisfeita, quando o Pai
derrama Sua ira contra a quebra da Sua lei. E fez isso, não sobre
nós, como merecíamos, mas sobre o Filho. A quebra da Lei nos
levaria a morte eterna como “salário”. Mas Cristo foi colocado
como substituto nosso, como propiciação, porque quebramos a
Lei e nada podíamos fazer para desviar a ira de Deus.

Para o jovem moralista era necessário perceber quem de


fato era. Isso a Lei lhe mostraria, não de uma forma superficial
como é comum hoje em dia. O pecador precisa entender o quão
grave é o pecado, o quão grave é transgredir a Lei a ponto de
levar Cristo, o Filho de Deus a ser cravado em uma cruz. E isso
Ele fez para poder salvar pecadores depravados e sem qualquer
possibilidade de salvação. Tudo isso desperta no pecador o
desejo pela misericórdia e graça de Deus.

Paulo afirma que “não conheci o pecado senão pela Lei”


(Rm.7:7). A Lei faz o pecador clamar por misericórdia, pois vê
que está perdido. Mas os púlpitos estão ignorantes do capítulo
73

20 de Êxodo. O diabo tem conseguido convencer os pregadores


de que a LEI é incompatível com a graça, incompatível com o
AMOR. Mas a Bíblia nos ensina o oposto, pois há afinidade
entre os dois: Leia Mt.22:37, 39,40. A Lei elucida as exigências
do amor. “Se me amardes guardareis os meus mandamentos”
(Jo.14:15), “Aquele que tem os Meus mandamentos e os guarda, esse é
o que me ama” (Jo.14:21).

É verdade que a salvação é pela graça, por meio da fé, mas


a Lei deve ser apresentada “para que toda boca esteja fechada e todo
mundo seja condenável diante de Deus... Porque pela Lei vem o
conhecimento do pecado” (Rm.3:19, 20). A Lei traz ao pecador a
convicção de pecado. Um puritano (Samuel Bolton), disse que
quando nós notarmos os homens feridos pela lei, então está na
hora entregar o bálsamo do Evangelho.

O jovem precisava aprender que a Lei é “espiritual”, e que


assim nos leva a exigências mais profundas em relação aos
pensamentos e intenções do coração, por isso Jesus usa-a para
ferir a alma dos pecadores. Ele não dá explicações da Lei como
fez no sermão do monte, mas quando diz ao jovem: “... vende
tudo que tens e dá-os aos pobres”, Jesus pregava o décimo
mandamento - “Não cobiçarás”. Este pecado estava encoberto
aos olhos daquele jovem. Quando o Senhor Jesus faz essa
exigência, a Lei de Deus, como um dardo, perfurou a
consciência daquele príncipe pela primeira vez.
74

Perceba a sabedoria de Jesus. Se Ele tivesse dito: “Não


cobiçarás”, o jovem responderia que nunca desejou a riqueza de
ninguém, que estava satisfeito com o que tinha. O que Jesus faz
é traduzir de forma prática, através desse teste, o décimo
mandamento ao exigir que o mesmo se desfizesse das suas
riquezas. Aqui vem o grande problema: o jovem amava mais
suas riquezas do que a Deus e a Seu Filho. Por isso se foi triste,
mas completamente sabedor de que era um pecador cobiçoso,
pois amou mais as riquezas do que a Deus.

É necessário que os pregadores saibam como declarar a Lei


espiritual de Deus para ferir as consciências e depois passar o
bálsamo do Evangelho. Temos de ferir os pecadores com a Lei e
não ficar satisfeitos em pregar apenas o amor de forma
superficial. Temos de pregar o caráter de Deus que é santo e
temos de pregar a Lei santa aplicando-a aos corações, às
consciências, ao homem interior. Dessa forma o nosso
evangelismo vai gerar pecadores convictos de seus pecados e
clamando por misericórdia ao verem sua miserável condição de
perdidos. Preguem a lei de Deus! Mostrem um Deus santo
ofendido pelo pecado. Jesus fez isso. (Vide cap. IV, inciso II – O
Evangelho da Expiação).
75

III - PREGAVA O ARREPENDIMENTO. - Mc.10:21a

O jovem rico ouviu de Jesus qual era o caráter de Deus: só


Ele é bom e santo. Que é necessário observar a Lei para se
perceber de fato quem é o homem: corrupto e pecador.

Dessa forma o jovem estava sendo preparado para receber


o apelo do Evangelho. Jesus insistiu na Lei ao determinar que
ele vendesse tudo o que tinha e desse aos pobres. Com isso a
Lei revelava que ele era cobiçoso e que necessitava esquecer as
riquezas dando preferência ao Senhor. Se o jovem assim fizesse
daria mostras de que estava arrependido.

“Arrependimento”, no grego, significa uma “mudança de


pensar”. O homem precisa mudar de pensamento. Por isso
Paulo disse que considerava todas as coisas como esterco para
poder ganhar a Cristo (Fp. 3:8). Ele teve de desprezar aquilo
que antes dava valor, teve de mudar de pensamento. Jesus
queria isso do jovem, que ele revertesse suas prioridades. Se
voltasse do ídolo (as riquezas) para Deus.

Quando o jovem rico correu para Jesus, não sabia das


exigências do Evangelho. Temos nos acostumado a ouvir os
pregadores convidarem pessoas a aceitarem Jesus como seu
salvador pessoal (coisa que não vemos nas Escrituras), mas não
mostram a exigência fundamental que é o arrependimento.
Jesus é amor, mas exige arrependimento: “Arrependei-vos e
crede no Evangelho” (Mc.1:15). Exigiu isso de Zaqueu, da
76

mulher samaritana e agora estava, da mesma forma, exigindo


deste jovem.

Os apóstolos exigiram arrependimento. (Mc.6:12; Atos 2:38;


Atos 3:19; Lucas 24:46,47). Em Atenas Paulo pregou: “Deus...
anuncia agora a todos os homens e em todo lugar que se
arrependam” (At.17:30).

O jovem tinha de esquecer seu apego às coisas do mundo e


não apenas reconhecer que era pecador. “Ninguém pode servir a
dois senhores...Não podeis servir Deus e às riquezas” (Mt.6:24). A
pessoa que confessar os seus pecados e os deixar, alcançará
misericórdia de Deus (Pv.28:13).

Agora podemos entender porque devemos evangelizar


como Jesus. Como uma pessoa pode se converter a um Deus
que ela não conhece? Por isso devemos falar do caráter de Deus:
santo. Como uma pessoa pode se converter dos seus pecados se
ela não consegue enxergá-los se não lhes falarmos da Lei de
Deus. A Lei aponta-lhe os pecados cometidos.

Podemos, na nossa pregação, levar pecadores a ficarem


cheios de remorso ou temerosos da condenação eterna e
prepará-los para “se decidirem a aceitar Jesus como salvador
pessoal”. Mas quando lhes falamos que precisam se
arrepender, eles perguntam: de que? Por isso precisamos falar
da Lei de Deus que lhes mostra exatamente o que eles
“quebraram” e do que têm de se arrepender. Com isso saberão
77

que ofenderam a um Deus santo que não tem por inocente o


culpado e chegam a conclusão que são criaturas condenadas e
não podem ajudar a si próprios. Com isso prantearão e
chorarão suas misérias. Dessa forma saberão que necessitam de
mudar de vida e verão que é impossível realizarem esta
mudança. Por isso clamarão a Deus: “Sê propício a mim pecador”.

Se não fosse assim, sem a exigência de arrependimento, o


jovem rico teria “aceito a Jesus” para receber a garantia do céu.
Ele veio correndo para Jesus mas não estava disposto a
esquecer as suas riquezas.

É triste dizer, mas as Igrejas estão cheias de pessoas que


“aceitaram a Cristo”, mas nunca nasceram de novo, nunca se
converteram e continuam mundanas, cheias de amor aos
prazeres carnais. O lazer e as riquezas são seus objetivos de
vida. São “crentes carnais”. Muitos pensam que estes “carnais”
são crentes verdadeiros, mas estão enganados pois “crente
carnal” não é crente! “Aquele que diz: Eu conheço-o, e não guarda
seus mandamentos, é mentiroso e nele não está a verdade” (I Jo.2:4).
O jovem rico poderia ser um crente carnal, mas Jesus não aceita
isso. Ele disse: “Qualquer de vós que não renunciar a tudo quanto
tem, não pode ser meu discípulo” (Lc.14:33). O jovem rico, ou se
convertia das suas riquezas terrestres para as celestiais, ou se
apegaria às terrestres, para sua perdição.
78

Não temos hoje um Evangelho diferente? Não é triste ver


mensagens, pregações e literaturas que não enfatizam o
arrependimento? Aí está a fragilidade da pregação de hoje.
Vamos confrontar os pecadores com o ultimato de Jesus:
arrependei-vos ou perecereis nas mãos de um Deus santo cuja
Lei vós desprezaste criminosamente.

O filho pródigo não podia voltar enquanto estava nos


braços das meretrizes, nem pode você entrar nos céus enquanto
se apega ao mundo e suas riquezas.

IV- PREGAVA A FÉ NO FILHO DE DEUS - Mc. 10:21


O arrependimento e a fé caminham juntos. No nosso
evangelismo devemos fazer como Cristo. Exigir fé (em Cristo) e
arrependimento do pecado.

O jovem estava com o pensamento fixo nas riquezas, seu


livre arbítrio estava inclinado a escolher as coisas do mundo.
Jesus exigiu que ele se arrependesse abandonando esta
prioridade de vida, ou nunca teria “um tesouro nos céus”. A
conversão envolve fé ou será apenas um desvio para uma
situação grave.

Jesus chamou graciosamente o jovem: “vem, segue-me”. É


um convite feito a um pecador preso às suas concupiscências. A
sua situação é descrita por Paulo a Timóteo (I) no capítulo 6:10
- “Porque o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males”. Quando
79

Jesus exigia que O seguisse, estava exigindo que cresse nEle.


Não basta apenas chamar Jesus de mestre, como fez o jovem,
temos de segui-lo, de obedecê-lo. “Por que me chamais Senhor,
Senhor, e não fazeis o que Eu digo?” (Lc.6:46).

No evangelismo moderno, os sermões dão uma idéia de


que Jesus é apenas um salvador pessoal para ajudar as pessoas
a se livrarem das dificuldades e perigos. Não se enfatiza que Ele
deve ser seguido e obedecido. A porta da vida eterna é estreita
e é necessário entrar por ela para que Jesus seja o “socorro bem
presente nas tribulações” (Sl.46:1). As pessoas precisam saber que
Jesus não será o Salvador de homem algum que se recusa a
dobrar-se a Ele como Senhor. Não é uma questão de opção,
como se percebe no evangelismo moderno. O apelo de Jesus é
uma exigência: “Vem, segue-me”. Seguir a Jesus é
demonstração da nossa fé de que Ele é o Senhor da nossa vida.
“Se com a tua boca confessares a Jesus como Senhor, e em teu
coração creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo”
(Rm.10:9).

Crer e obedecer são palavras tão intercambiáveis e paralelas


que o Novo Testamento não faz distinção entre elas. Aqui há
algo importante em relação ao significado das palavras no
original grego. “Aquele que crê no Filho tem a vida eterna”
(Jo.3:36). Crê, aqui, é, no grego, a palavra pisteô. Mas na
segunda parte do versículo lemos: “... mas aquele que não crê no
Filho não verá a vida”. Crê, aqui, no grego é apeitheô, que significa
80

desobedecer. (Rm.2:8; 11:30-31; 15:31). Portanto, na Bíblia, crê é


obedecer. Sem obediência é impossível se chegar ao céu.

O jovem queria a vida eterna, mas Jesus lhe exige: Se você


me seguir, eu lhe darei a vida eterna. Você precisa se tornar
meu servo e submeta-se aos meus ensinos pois eu sou o Grande
Profeta. Dobre-se aos meus mandamentos, Eu sou o rei e
somente assim você será salvo! A Bíblia seria um livro diferente
se Jesus aceitasse pessoas que fazem uma confissão intelectual
apenas. Se Jesus oferecesse ao jovem tesouros no céu sem a
exigências de segui-lo, João não teria escrito: “Aquele que diz:
Eu conheço-O, e não guarda os seus mandamentos, é mentiroso
e nele não está a verdade” (I Jo.2:4). A fé não é apenas um
balançar de cabeça à uma série de fatos, mas é obediência,
libertação dos pecados, evidenciados no seguir a Jesus.

Esta forma de pregar soa estranha nos dias de hoje. Ouvi de


certo pastor, que ao ouvir uma mensagem como essa, dizer ao
pregador: “Você está pregando salvação pelas obras”. Muitos
pensam que ao se pregar isso, virá a cisão, a divisão e é melhor
amordaçar o Evangelho em prol da unidade. Será que estamos
dispostos a adocicar a doutrina da fé apenas para manter o
tradicionalismo evangélico e a unidade, passando por cima da
verdade?

Esta é uma questão muito importante. O Evangelho de hoje


com a prática de convidar a ir à frente ou levantar a mão e fazer
81

uma oração de confissão, considerando este pecador como


convertido e afirmando que ele basta crer em Jesus e será salvo,
é o que Dietrich Bonhoeffer chamou de “graça barata”. Ele
dizia: “Graça barata é a pregação do perdão sem a exigência do
arrependimento, batismo sem disciplina na igreja, comunhão sem
confissão, absolvição sem confissão pessoal. Graça barata é graça sem
discipulado, graça sem cruz...” É deixar que o “cristão viva como o
resto do mundo, deixe que se amolde aos padrões do mundo em todas
as esferas da vida, e não tenha a presunção de aspirar viver uma vida
diferente... da sua antiga vida debaixo do pecado”. Em outras
palavras é querer Jesus como Salvador mas sem querer segui-lo
nas suas exigências. Sem isso não haverá vida eterna. Por isso
Jesus disse: “Segue-me”. Seguir é ter fé! Eu creio, por isso O
sigo incondicionalmente.

“Graça barata” também é pregar o evangelho convidando


pessoas com problemas para virem a Jesus para solução dos
seus problemas, dizendo que “sua vida vai mudar”. É
apresentar Jesus como um super-psicólogo que irá colocar
sorriso nos lábios dos necessitados. Mas ninguém apresenta o
seguir a Jesus e muito menos o quanto isso custa, e quanto é
doloroso. (Vide cap. V, inciso II – O Evangelho da Apelação).

“Graça barata” é “Fé fácil”! Sem exigências! E não é de se


estranhar que muitos “convertidos” logo abandonam o
Evangelho, voltando ao mundo como a porca volta à lama. Eles
constatam que foram iludidos. Dessa forma, as igrejas que
82

receberam estas pessoas, entram em triste confusão e


frustração. O que precisamos é apresentar o Evangelho como
Cristo apresentou. Que os ouvintes devem carregar a cruz, que
meçam o preço de ser crente, que “sentem-se e considerem o
ato de seguir a Cristo”, em vez de “levantem-se e venham à
frente”. (Lc.14:25-33)

Não existe evidência de que o jovem tenha chegado a


confiar em Cristo arrependendo-se dos seus pecados. Mas Jesus
o confrontou com o verdadeiro Evangelho e suas implicações.
O jovem não foi enganado com técnicas de apelos psicológicos.
Quando o jovem se retirou ele sabia claramente da resposta à
sua pergunta inicial: Segue-me, creia, arrependa-se, renuncie,
mude de vida, tome sua cruz, entre pela porta estreita!

É esse o Evangelho que devemos pregar hoje:


arrependimento e fé.

A salvação é de graça, mas o discipulado custa tudo quanto


temos – Ler anexo 06 ( o custo de seguir a Cristo – J. C.
Ryle)

V- PREGAVA SEM UMA FALSA SEGURANÇA DA


SALVAÇÃO – Mc.10.22
Muitos evangelistas procuram, na sua pregação moderna,
levar segurança de salvação às pessoas. Isso está implícito
quando eles convidam os pecadores a “virem à frente” para
aceitar Jesus ou quando a pessoa repete uma oração de
83

confissão de pecados e súplica de perdão. Esta idéia está


também presente quando o pregador pede que o penitente
agradeça a Deus por “Jesus ter entrado em sua vida”.

Além disso, o obreiro ou conselheiro, neste momento


afirma ao “decidido” que ele agora está salvo e que nunca
duvide disso, pois seria chamar Deus de mentiroso, pois Ele
prometeu tudo aquilo ao que crer.

Este estilo evangelístico nunca foi usado por Cristo, muito


menos com este jovem rico. Na verdade, é uma forma anômala
de evangelizar, pois não leva em conta a santidade de Deus,
não prega a Sua Lei, não exige arrependimento e a fé é colocada
como uma mera “aceitação de Cristo”. Além disso, garantem
que agora o pecador já tem segurança de salvação.

Outra forma de se cometer este equívoco é achar que não se


deve duvidar da salvação das pessoas que fizeram à classe de
catecúmenos e professaram a sua fé, a não ser que tenham
cometido algum pecado escandaloso. E se o professo estiver
com alguma dúvida, isso é considerado apenas pobreza de
entendimento doutrinário. Em outras palavras, o mero
entendimento intelectual da doutrina garante a salvação, sem
uma fé experimental de mudança de vida.

Jesus amou aquele jovem rico, mas, não agiu como os


evangelistas modernos, pois exigiu mudança radical,
arrependimento e fé. Não temos dúvida de que o jovem “viria à
84

frente” se lhe fosse feito um convite de aceitar a Jesus e seria


considerado como nascido de novo. O jovem creu e se
entristeceu, mas continuou perdido. Assim é com o diabo, que
crê na verdade, na sã doutrina e até treme, mas está condenado
(Tg. 2.19).

Na verdade o jovem “foi à frente”, publicamente, pediu por


vida eterna, mas não recebeu esta dádiva. Ele se comoveu com
a mensagem de Cristo, mas não se converteu e se estivesse
numa classe de catecúmenos teria se saído muito bem. Estas
coisas não dão segurança de salvação. Essa falsa paz, essa falsa
segurança é pregada no evangelismo moderno e é isso que os
missionários, pastores e evangelistas estão fazendo hoje.

Vemos isso de forma clara em Jeremias 6:13-14, em relação


aos falsos profetas. Eles curam superficialmente a ferida do
povo ao dizerem que está tudo bem. Que há “paz, paz, quando
não há paz”. Quem coloca segurança nos corações é o Espírito de
Deus. Os métodos de hoje nunca foram usados pelos grandes
pregadores e evangelistas do passado. Tenho visto uma
tendência em ser criativo na evangelização, mas sem base
Bíblica para este métodos criativos. São inovações, acréscimos
que Lloyd-Jones chamava de “volta ao catolicismo”.

Cremos que a Confissão de Fé de Westminster tem algo


muito importante a nos dizer no capítulo XVIII. (vide anexo Nº
01)
85

Muitas vezes é mais honesto que as pessoas retornem às


suas casas entristecidos, mas perfeitamente conscientes das suas
condições, a voltarem com uma falsa certeza de salvação por
terem “vindo à frente”, ou respondido a orações de confissão.
Estes são atos externos apenas. O que ele necessita é de
conversão verdadeira reconhecendo o senhorio de Cristo em
Sua vida.

É o Espírito Santo que deve dar esta segurança ao crente:


Romanos 8.16 e I João 3:24. Ele dá a certeza de pecados
perdoados aos que se examinam à luz da Palavra (II Co.13.5 e
João 14.23). Jesus exige, purificação, santificação, mudança
completa ao dizer “vende tudo que tens e dá-o aos pobres... vem e
segue-me”. A recusa do jovem o impediu de ter “um tesouro nos
céus”.

É claro que não devemos olhar para os sinais externos de


moralidade como demonstração de que uma pessoa possui a
vida eterna. O jovem era moralmente correto. O que precisamos
é penetrar na intimidade da nossa alma e ver se estamos alegres
à submissão à Palavra de Deus e que Ele dirige agora nossas
vontades; que Deus é o objeto supremo de nosso amor e o
espírito da lei é guardado.

O entusiasmo religioso não é prova de nossa aceitação por


parte de Deus. O jovem rico era assim, e creio que sua vida
exemplar envergonharia muitos crentes, mas não era
86

convertido. Jesus não recebeu dele lealdade completa e por isso


não podia ser seu discípulo.

Ao chegar ao fim da conversa este jovem tinha ouvido tudo


que necessitava. Cremos que ele aceitou o que Cristo disse:
“Deus é santo e eu cobiçoso; tenho de negar o meu dinheiro
para ganhar a vida eterna; devo seguir a Jesus totalmente se
quiser um tesouro no céu”. Mas a compreensão intelectual não
é suficiente, mas é necessário devoção, aprovação íntima,
alegria íntima no Evangelho que se manifestaria numa
transformação exterior.

Ter certa dúvida se preenchemos as condições para nos


considerarmos herdeiros das promessas é compreensível por
termos corações enganosos (Jr.17:9). Mas, sem dúvida
percebemos que ir “à frente”, o levantar a mão e a repetição de
uma oração não é garantia de fé salvadora.

Quantas pessoas já foram levadas a uma confiança vã por


fórmulas evangelísticas feitas por pregadores equivocados?
Muitos são enviados de volta para casa iludidos; muitas
crianças, na Escola Dominical, recebem a segurança daquilo que
não possuem. O jovem rico foi para casa em pecado, mas pelo
menos existia uma consciência ferida que tirava seu conforto e
isso poderia um dia ser importante para uma volta a Cristo em
arrependimento. Ele não foi iludido por Jesus. Mas o
evangelismo moderno mata precocemente a convicção de
87

pecado, pois oferece ao pecador a segurança de salvação de


forma prematura e manipulada pelo homem.

Nos lembramos do atalho escolhido por Abraão, o caminho


carnal para conseguir um herdeiro. Ele produziu Ismael, um
“jumento selvagem” (Gn.16:12). Em Romanos 9:8, lemos:
“...estes filhos de Deus não são propriamente os da carne...”. Abraão
poderia dizer que era seu filho amado, mas Deus o
desconsiderou como filho da promessa. O evangelho moderno
está enchendo as igrejas de “Ismaéis” ao produzirem
“convertidos” por causa de sua pressa em chamá-los filhos de
Deus. Mas Deus procura por “Isaques”, que podem demorar e
vir, mas virão de forma irresistível, pois estes é que são os filhos
da promessa.

Jesus é nosso mestre em evangelismo e Ele sem dúvida


condena estas práticas modernas de evangelização. Ele deixou o
jovem rico ir-se triste, mas não enganado.

O problema dos nossos dias é que no intuito de se pregar essa


falsa segurança de salvação, prega-se uma mensagem
inofensiva (Vide Cap. V, inciso VI – O Evangelho Inofensivo).

VI – PREGAVA DEPENDENDO DE DEUS – Mc.10-23-27.


Quando os evangelistas vão embora após uma “campanha”
em que pessoas fizeram sua “decisão” por Cristo, os pastores
locais se deparam com a triste realidade de que os “decididos”,
88

não estão convertidos e aos poucos abandonam a igreja. Temos


de mudar esta prática evangelística e quebrar com este
tradicionalismo do evangelicalismo moderno.

Creio que Jesus ao dizer que era difícil um rico entrar no


reino de Deus, estava dizendo que era, também, difícil um
adúltero, ou um ladrão, ou um desobediente entrar no céu.
Jesus usou um pecado específico (a cobiça) para exemplificar
uma verdade de cunho geral.

Quando Jesus afirmou que era “mais fácil um camelo


passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no
reino de Deus”, ele estava dizendo que é impossível ao homem
ser salvo por seus esforços. Os discípulos compreenderam isso,
tanto é que disseram: “Quem poderá salvar-se?”. Podemos até
imaginar Jesus balançando a cabeça e dizendo: “É verdade,
vocês entenderam o que Eu quis dizer - para os homens é
impossível!”. Quão diferente é o que dizem os evangelistas
modernos: “É fácil, só depende de vocês... creiam!”.

Jesus estava dizendo aos discípulos que o que Ele pedia ao


jovem rico era o impossível. Ele não podia se desfazer de tudo
que tinha, pois para isso era necessário se arrepender e crer.
Mas o jovem estava escravo de Satanás, a sua vontade estava
presa, pois sua natureza, como a de todos os homens, é
corrompida e oposta às exigências do Evangelho. Por isso
Jeremias (13:23) pergunta: “Pode o Etíope mudar a sua pele, ou o
89

leopardo as sua manchas? Nesse caso também vós podereis fazer o


bem, sendo ensinados a fazer o mal?”. A resposta a esta indagação
é: Nenhum pecador tem a capacidade de se converter, se
arrepender e crer no Senhor Jesus.

Este encontro de Jesus com o jovem rico nos mostra esta


verdade. Jesus exigiu arrependimento e fé, mas ele tinha o
coração corrompido (Gn.6:5) e era um “morto em delitos e
pecados” (Ef.2:1). Ele não obedeceu porque não podia, mas isso
não o fazia inocente!! Quando Jesus disse: “segue-me”, Ele sabia
que “Ninguém pode vir a mim se o Pai que me enviou não o trouxer”
(Jo.6:44). Este jovem estava tão incapacitado de vir, que por
estar morto, necessitava NASCER DE NOVO. A Bíblia diz
claramente que todos os que crêem em Jesus, não nasceram
“nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus”
(Jo.1:13). De fato para o homem “é impossível!!”.

O evangelismo moderno tem sido apresentado como se


Deus já tivesse feito tudo que podia para salvar o homem e
agora está de braços cruzados esperando que o homem faça
alguma coisa, use seu livre arbítrio para ir em busca de Deus,
em direção a Jesus, como se a salvação dependesse agora
exclusivamente dele. Esquecem os evangelistas modernos de
que é o Espírito Santo que trabalha no coração dos homens,
convencendo-os do pecado, da justiça e do juízo; que lhes
revela Jesus e regenera os pecadores para que possam crer e se
arrepender.
90

Ora, como pode o homem caído, corrupto, cego e


entenebrecido no entendimento, com uma natureza que o leva a
se afastar de Deus, que odeia a este Deus, agora, por sua
espontânea vontade, ir em busca de Jesus? Como pode uma
pessoa vender tudo que tem, dar aos pobres para depois querer
seguir a Jesus? Não, isto é impossível!! Seu livre arbítrio o leva
para longe de Deus, o leva para o inferno naturalmente
(Whitefield). O evangelismo moderno insiste cegamente que o
homem possui a habilidade de seguir a Cristo. Esta habilidade
estaria apenas adormecida, e que basta a persuasão do apelo
para despertar esta habilidade e levá-lo ao arrependimento e à
fé. Mas Jesus concordou com os discípulos que isso é
“IMPOSSÍVEL”!

“Quem poderá, pois, salvar-se?”, perguntam os discípulos.


Jesus responde de forma bem clara dizendo que ao homem é
impossível, mas a Deus tudo é possível. É Deus que age, Ele
não está parado esperando que o homem tenha capacidade de
fazer esta obra, mas Ele atua mudando o coração do homem
fazendo com que ele venda tudo que tem e siga a Cristo. Só
Deus pode dar ao homem um novo coração: “E vos darei um
coração novo e porei dentro de vós um espírito novo” (Ez:36:26). Só
assim, regenerado e transformado pode o homem crer e se
arrepender. Lembre-se que fé é um ato de um coração que foi
vivificado pelo poder soberano de Deus (Ef.2:8-10). Fé é o
91

resultado da regeneração operada pelo Espírito. Por isso Jesus


disse a Nicodemos: “Necessário vos é nascer de novo”.

O mesmo se diz para o arrependimento: é uma dádiva de


Deus (Atos 5:31; 11:18; II Tm.2:25). Para um pecador se
arrepender, Deus tem de quebrar-lhe o coração de pedra e dar-
lhe um coração de carne. Pedir a um homem não regenerado
que se arrependa e a um coração cobiçoso que venda tudo e dê
aos pobres, é pedir o impossível. E foi isso que Jesus exigiu. Só
Ele pode fazer esta obra no coração dos homens. Se é assim, o
que o homem tem de fazer é clamar a Deus para que Ele faça o
que os homens não podem fazer por si mesmos.

Pregar o evangelho a descrentes é pregar a mortos e exigir


que eles saiam dos túmulos; é pregar a ossos secos. Quando
evangelizamos, temos de lembrar que as pessoas estão em total
incapacidade de atender ao chamado e às exortações
apresentadas. Nossa esperança reside apenas e exclusivamente
em Deus e não na vontade humana ou no seu livre arbítrio.
Porém a Bíblia diz que Deus se alegra em ressuscitar pecadores
mortos em seus delitos e pecados pela “loucura da pregação”.
O método é a pregação.

Quando Jesus mandou que Lázaro saísse do túmulo, Ele


estava mostrando que a doutrina do livre arbítrio é absurda.
Como pode um morto, um cadáver que cheira mal, obedecer e
desejar sair. É verdade que Lázaro obedeceu e exercitou sua
92

vontade, mas só após Jesus tê-lo ressuscitado, após receber vida


nova que lhe foi dada pela soberania de Deus. Somos chamados
a pregar a “ossos secos”. Em Ezequiel lemos que Deus mandou
o profeta profetizar sobre eles. Aqueles ossos não tinham
vontade, não tinham livre arbítrio. Mas quando Deus soprou
sobre eles, receberam vida e se tornaram um grande exército. Só
assim esses “ossos secos” podem se levantar e seguir ao
Cordeiro louvando a glória de Sua graça soberana e poderosa.
O jovem rico tinha sua vontade morta, seu livre arbítrio escravo
do pecado e por isso ele não atendeu ao mandado de Cristo.
(Vide Cap. IV, inciso III – O Evangelho da Graça).

Assim, temos de nos voltar em humildade para Deus. Só


Ele pode nos assistir e não podemos depositar nossa esperança
em técnicas psicológicas, em entretenimento, em sabedoria
humana. Não são três ou quatro passos que os pecadores
devem tomar, exigidos pelos pregadores modernos, que os
farão convertidos, mas só Deus, pelo Seu Espírito, pode
converter, dar nova vida. É isso que vemos em 2Tm.2:24-26. Só
“se” Deus lhes conceder arrependimento... Esta é a nossa
esperança! Por isso, quando pregamos, temos de exigir com
amor, que os pecadores clamem, peçam, implorem, orem,
dizendo : “Senhor, tem misericórdia de mim. Converte-me, dá-me fé,
salva-me por Tua graça”. (Vide Cap. IV, inciso IV e VI – O
Evangelho da Apelação e o Evangelho Exclusivo).
93

CONCLUSÕES:

1. Na nossa evangelização o importante é o âmago da


mensagem. Ele deve mostrar claramente os atributos de Deus, a
Sua Lei, arrependimento, fé, reconhecimento de Cristo como
Senhor, que a salvação pertence a Ele, que a vida cristã é uma
batalha até o fim e que o reino de Deus é conseguido com
esforço. Não devemos iludir as pessoas com promessas de falsa
segurança de salvação.

2. Observe com cuidado o quanto estamos longe desta


evangelização que Cristo praticou.
3. A maioria, esta baseada nos seus resultados pragmáticos,
não quer voltar à mensagem pura do Evangelho, presumindo
que a tradição evangélica está correta.
4. A nossa evangelização deve estar repleta de doutrina e
ensino. O método bíblico de evangelizar é explicativo e
aplicativo. O Evangelho deve entrar pela mente e descer ao
coração. Por isso devemos pregar todo conselho de Deus sem
receio de que estejamos “afugentando” os pecadores. “As
minhas ovelhas ouvem a minha voz e me seguem”, disse Jesus. Não
há o que temer, temos de ser fiéis na evangelização.

5. Vamos evangelizar com as verdades bíblicas e


“batalhando pela fé que uma vez foi dada aos santos” (Judas 3).

*Adaptado do livro “O Evangelho de Hoje” de Walter


Chantry
94
95

CAPÍTULO VII

O SISTEMA DE APELO SUAS IMPLICAÇÕES


DOUTRINÁRIAS E SEUS PERIGOS
(Pb. Manoel Canuto)

Quando surgiu esta prática? Por que é tão comum nos


nossos dias? Qual a base bíblica para o apelo? Creio que você já
ouviu expressões como esta: “Se o senhor tivesse feito um apelo
teria havido muitas decisões”. Outros chegam ao ponto de
afirmar que o sermão não foi completo por não ter sido feito um
apelo por decisões. Certa vez um presbitério (da Igreja
Presbiteriana do Brasil) convidou certo pastor para ser o
pregador em uma cruzada evangelística, mas ela foi suspensa
em virtude de o pregador afirmar que não fazia apelo para que
pessoas se decidissem. Além de ser suspensa a cruzada, o
pastor contrário à prática do apelo foi chamado de radical. Na
verdade, sejamos sinceros, quem neste caso, foi o radical? O
apelo por decisões seria uma prática apenas “cultural”, sem
nenhum fundamento doutrinário?
96

O Dr. Martin Lloyd-Jones nos conta em seu livro “Pregação e


Pregadores”, que certo pregador foi convidado para falar em um
programa que seria transmitido pelo rádio e onde haveria um
intervalo de meia hora para que alguns hinos fossem cantados.
No final da mensagem, este pregador fez seu tradicional apelo.
Como não conseguira muitas “decisões”, sua explicação foi:
“Os hinos atrapalharam as conversões”.
Conta-nos, ainda, o Dr. Lloyd-Jones, que certo dia,
enquanto pregava, um homem, que era alcoólatra inveterado,
parecia muito tocado pela mensagem, pois chorava
copiosamente. No final do sermão o “doutor” apenas se
despediu dele apesar de vê-lo chorando. Na noite seguinte,
quando Lloyd-Jones se dirigia à igreja para o culto de oração,
aquele homem se aproxima e diz: “Pastor, sabe de uma coisa, se o
senhor tivesse me convidado na noite passada, eu teria atendido” (ele
se referia ao apelo). O “doutor”, então, o convidou para ir com
ele à igreja. Porém o homem argumentou que infelizmente a
ocasião havia passado, mas se tudo tivesse sido feito naquela
noite, ele teria se convertido. Lloyd-Jones respondeu: “Meu caro
amigo, se aquilo que aconteceu na noite passada não perdurou por 24
horas, então não me interessa. Se você não está preparado para vir
comigo agora como estava na noite passada, então você não tem a coisa
verdadeira...você, de fato, não percebeu ainda sua necessidade de
Cristo”.
97

Temos de voltar à história e observar quando isso começou.


Não precisamos dizer que o apelo nunca foi uma prática dos
apóstolos, nem da igreja primitiva, nem dos grandes
pregadores que o mundo conheceu como George Whitefield,
John Wesley, Spurgeon, Asahel Nettleton, os puritanos, etc.
Esta prática foi “inventada” na década de 1820 pelo pelagiano
Charles Finney, quando deu início ao chamado “assento dos
ansiosos” e apelava às pessoas a que se decidissem naquele
instante por Cristo.
Há uma questão teológica por trás de tudo isso. Finney, seu
inventor, tinha uma visão distorcida e limitada da soberania de
Deus. Ele afirmava: “É inútil falar da onipotência de Deus para
impedir o pecado”. Dizia que Deus era soberano no mundo
físico mas não no reino moral e que Ele se encontra limitado
pelo livre-arbítrio do homem, de tal forma que Seu poder sobre
o homem fica reduzido apenas à persuasão. Defendia que a
graça torna possível a salvação para todos os homens, mas não
é eficaz para ninguém. O Espírito Santo tem a função de
“cativar a mente” sendo que não existe uma obra direta e
imediata do Espírito sobre ela. Seria sempre uma ação externa.
O Espírito estaria sempre mantendo o impacto da verdade para
afastar as más intenções e os pecadores seriam persuadidos a
aceitarem a verdade. A mesma técnica de lavagem cerebral
usada pelos comunistas no passado. Finney defendia que a obra
do Espírito Santo era apenas externa e que nossa mente é neutra
98

e os desejos somente são pecaminosos quando são


transformados em ação. Negava que a natureza do homem
precisasse de regeneração, mas somente as escolhas por ela
efetuadas é que necessitavam. Não aceitava o pecado original,
pois o homem nasce inocente e se torna pecador devido o
ambiente em que vive que corrompe a sua inocência original.
Dessa forma o novo nascimento não é uma regeneração
interior do coração, mas simplesmente uma mudança de
escolha. O pecador regenera-se a si mesmo, porém a palavra de
Deus mostra-lhe como fazê-lo; o pecador converte-se a si
mesmo, mas o Espírito o persuade a fazê-lo. Sua opinião de que
o homem é capaz de fazer aquilo que Deus ordena
(“arrependei-vos e crede”), levou Finney a criticar as orações
que pediam a Deus que fizesse com que os pecadores se
arrependessem e cressem no Evangelho. Segundo Finney, fazer
isso seria um insulto a Deus. Para ele, o homem é perfeitamente
capaz de, sem a ajuda de Deus, criar um novo coração para si
mesmo.
Podemos ver claramente porque Finney fazia apelo: porque
o homem pode responder ao chamado de Deus por sua livre
iniciativa, por seu livre-arbítrio. Ou seja, o apelo está
fundamentado num conceito teológico e não cultural. Ele era
Pelagiano (seguidor de Pelágio) que defendia a vontade
humana desassistida como a base da salvação e tudo depende
da vontade do homem. Pelágio foi um herege!
99

Quais os perigos do apelo por decisões? Lloyd-Jones responde mais ou


menos assim:

1) Incentivar algo que não é incentivado na Bíblia.


Os evangelistas usam muito o texto “Qualquer que me
confessar diante dos homens, Eu o confessarei diante do meu Pai que
está nos céus”, para concluir que Jesus fez apelo para se vir à
frente. Isso não é ser honesto com o texto. Jesus conclamou
homens a que viessem para Ele (mesmo sabendo que os
homens não podem vir se o Pai não trouxer estas pessoas), mas
nunca quis apelar a que viessem à frente como uma forma de
decisão por Ele, ou como forma de aceitá-lo. Muitos ficam
revoltados quando dizemos que o homem não pode vir à Cristo
pelo seu livre arbítrio. Mas lembro que esta foi a mesma reação
dos judeus, quando Jesus pronunciou estas palavras: “Por causa
disto, é que vos tenho dito: ninguém poderá vir a mim, se pelo Pai, não
lhe for concedido”. À vista disso, muitos dos seus discípulos o
abandonaram e já não andavam com ele” (Jo 6:65-66).
O sistema de apelo institui uma condição para a salvação que
Cristo nunca mencionou. Ele dá a aparência de uma ordem divina,
algo louvável para Deus. Quanto que o inverso parece ser uma
desobediência a Deus e um entristecer do Espírito Santo. (o texto em
itálico é acréscimo meu).
100

2) O perigo de provocar uma resposta emocional baseada


na personalidade do evangelista ou na persuasão do apelo.
Há um elemento psicológico no apelo. Todos os ouvintes
são convocados a orar, baixarem suas cabeças e uma palavra
auto-sugestiva é dita para que as pessoas vão à frente em busca
de paz, felicidade e amor .... Os conselheiros espalhados por
toda a audiência procuram incentivar os presentes a saírem dos
seus lugares e a tensão aumenta a ponto de as pessoas não
suportarem e vão. O pior é que, saem dali informados de que
agora são cristãos, mesmo sabendo que não mudaram nada.
Isso pode gerar ceticismo ou falso cristianismo. Há o perigo de
um pregador usar a sua personalidade, o seu poder e sua
capacidade para exercer domínio sobre os outros. Dessa forma
seu apelo poderá ser respondido sob a força da personalidade
do pregador que pode levar as pessoas a desejarem ser como
ele. Isso é cobiça !

Aqui é necessário que se fale das formas de usar o


emocional para se produzir decisão e resposta ao apelo: Usar
histórias comoventes e a música. Tudo isso pode ser lícito como
ilustração e louvor, porém nunca como motivador para gerar
decisões. Isso tem sido usado com muita freqüência no
evangelismo moderno.
101

Ilust. – Há uma enorme confusão entre “vir a Cristo” e “vir a


frente”. (o texto em itálico é acréscimo meu) - Ler anexo 08 (quanto
ao vir a Cristo – Ernest Reisinger)

3) O risco de apenas mencionar o Evangelho e não pregá-lo


e esperar que algo “mágico” aconteça.
Alguma reunião musical ou mesmo uma cantata ou uma
pregação “telegráfica”, não explicativa, pode ficar dissociada do
apelo e o pregador e os crentes esperarem uma resposta
positiva e sincera (“mágica e espúria”) dos “decididos”. Creio
que é necessário lembrar que é muito freqüente se fazer apelo
após uma mensagem que em si está totalmente desvinculada do
apelo. São dois momentos distintos no culto. É comum se vê
pastores que não sabem terminar o sermão se não fizerem um
apelo.

4) O risco de esperar que os pecadores tenham poder


inerente de “fazer uma decisão por Cristo”.
O versículo em I Co. 2:14 desfaz esta pretensão condenável.
“...o homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus,
porque lhe são loucura; e não pode entendê-las, porque elas se
discernem espiritualmente”. Não há poder inerente nas pessoas
para fazerem “decisão por Cristo”, elas estão obscurecidas no
entendimento.
102

5) O risco do evangelista manipular uma obra que é


reservada ao Espírito Santo.
Hoje estamos vendo os organizadores de eventos
evangelísticos preverem os resultados, algo que pertence só a
Deus. Isso é grave. Há até alvos de se plantarem tantas igrejas
até o fim do século, ou até o ano tal... O mesmo vemos nas
cruzadas evangelísticas. Já ouvi alguém dizer: “Com a pregação
deste pastor, todo este lugar aqui na frente vai ficar tomado de
decididos”.

6) Este método tende a produzir uma superficial convicção


de pecado (se é que produz).
As pessoas respondem positivamente quando lhes são
oferecidos certos benefícios. Certo homem foi à frente no apelo
quando o pastor disse: “Se alguém não quiser “perder o barco”,
venha à frente. Este homem foi à frente e considerado como
convertido. O próprio Wesley, que era arminiano, mas não fazia
apelo, não se interessava por resultados imediatos e visíveis e
sim na obra regeneradora do Espírito Santo. Os reformados e
puritanos pensavam assim, e, dessa forma queriam ver
primeiro os frutos para depois afirmar que a pessoa estava
convertida (“produzi, pois, frutos dignos de arrependimento” Mt
3:8).

Às vezes sou inclinado a pensar que uma grande parte do


avivalismo moderno tem sido mais uma maldição do que uma bênção,
103

porque tem conduzido milhares a um tipo de paz antes que conheçam a


sua miséria. Buscam restaurar o pródigo à casa do Pai sem antes fazer
com que ele afirme “Pai pequei!”. Você acha que um fazendeiro obterá
uma colheita de sem antes ter limpado, gradeado e arado a terra?
Assim é a alma convertida...não vem sem convicção de pecado. (o texto
em itálico é acréscimo meu).

7) O risco de encorajar as pessoas a pensar que o ato de vir


à frente ou levantar a mão as salvará.
Isso aconteceu com aquele homem que agora estava “no
barco”. Não parece tudo isso uma desconfiança na ação do
Espírito Santo como se Ele precisa de ajuda ? Isso é muito grave
! A obra do Espírito é completa e eficaz. A regeneração, a
convicção de pecado, a fé, e o arrependimento estão nas mãos
do Espírito Santo. Não é necessário que alguém se identifique
indo à frente para que a salvação torne-se visível e sim pelo que
acontecerá na vida das pessoas: novo nascimento não depende
ou se ver num levantar de mão. Certo pregador do Congo fazia
todo tipo de apelo para que as pessoas se convertessem, mas
nada acontecia. Quando viajou e outro pastor pregava em seu
lugar, irrompeu um grande avivamento. Ele não gostou quando
sua esposa o escreveu sobre o fato, pois ele não estava ali, tudo
não havia sido feito por ele. Havia orgulho e disso somos
tentados. Quando voltou, e ao começar a expor as Escrituras, as
pessoas se quebrantaram em profunda convicção de pecado.
104

Ele tentara isso por 20 anos e não conseguia. Por que? Porque é
obra exclusiva do Espírito Santo. Não podemos pisar em
terreno que é dEle. Infelizmente essa é a mentalidade de Billy
Grahan. Ele diz nas suas campanhas: “Eu vou pedir que você
venha a frente. Lá em cima e aqui em baixo, vou pedir que você
venha. Deve vir agora, rapidamente. Não permita que a distância
o separe de Cristo. O caminho é longo, mas Cristo percorreu todo
o caminho até a cruz porque amou você. Certamente você deve
dar esses poucos passos e entregar sua vida a Cristo...”
Uma disposição do não convertido para vir à frente pode ser
motivada por várias razões: 1) Amor próprio natural buscando
felicidade; 2) Uma consciência perturbada buscando alívio por meio de
um ato religioso; 3) A influência condicionadora de uma grande
reunião onde outros respondem, e assim por diante, não passa de uma
questão psicológica - a multidão sempre nos atrai. Pergunto: em que o
apelo beneficia as pessoas? Aqueles chamados eficazmente não
perderiam nada se o apelo fosse omitido. (o texto em itálico é acréscimo
meu).
8) O pelo incentiva a pessoa a pensar que pode se
“decidir por Cristo”.
O pecador não “se decide por Cristo”, mas ele “foge” para
Cristo em total desamparo e desespero, clamando por
misericórdia : “...Converte-me e serei convertido, porque tu és o
Senhor meu Deus” (Jr. 31:18). É como alguém que está se
afogando e não simplesmente se “decide” a pegar a corda que o
105

salvará, mas agarra-se a ela pois é a única escapatória, a única


esperança . “Se decidir por Cristo” é uma expressão imprópria.
Trata-se de uma idéia perniciosa pensar que qualquer homem pode
ser salvo se ele reconhecer a Cristo de uma forma genérica, tipo
Rm.10:9 (falar sobre o contexto dessa afirmação) ou At.2:21. Observe
que em Atos o texto diz “todo aquele que invocar o nome do senhor
será salvo”. O texto não diz: “Aquele que invocar o Senhor...”. Mas
sim, “Aquele que invocar o nome do Senhor”. Por “nome do Senhor”
entende-se tudo aquilo que nos é revelado nas Escrituras sobre o
Senhor Jesus. Significa que, qualquer que receber, reconhecer e adorar
a Cristo de acordo com o que as Escrituras revelam e testificam acerca
dele, será salvo. Spurgeon diz que você pode crer que Jesus Cristo
morreu por você e ao mesmo tempo acreditar naquilo que não é
verdadeiro. (o texto em itálico é acréscimo meu).

8) Risco de dar segurança àqueles que permanecem sem


se converter.
Muitos podem ficar com a impressão de que agora
“acertaram as coisas com Deus”, mesmo que continuem na
prática de pecados grosseiros e nunca nasceram de novo. No
dia do juízo ouvirão as duras palavras de Jesus : “...Nunca vos
conheci...” (Mt.7:23).
Sempre que condenamos este método estranho às
Escrituras, as pessoas nos apresentam o argumento
“pragmático”: ... mas, e os resultados, esse método não tem
106

dado certo? Se fosse pelos resultados, teríamos de concordar


com as trapaças de Jacó, a desobediência de Moisés ao ferir a
rocha por duas vezes (jorrou água que matou a sede do povo),
com Abraão e Isaque que mentiram a respeito de suas
mulheres. Os resultados não são sinal de aprovação e para isso
é só ler Mateus 7, quando Jesus condena aqueles que pregaram
em Seu nome, expulsaram demônios em Seu nome e realizaram
milagres em Seu nome. Eles mostraram resultados e isso não
era garantia de que tudo estava certo. Jesus dirá para eles que
eles praticaram a iniqüidade (Mt 7).
Lloyd - Jones diz que este é um argumento dos jesuítas de
que os fins justificamos meios. Ele disse que esta prática criou
“uma nova espécie de mentalidade, uma carnalidade que se
expressa na forma de um doentio interesse pelos números. Isso
também tem criado um desejo pelo que é emocionante, uma
quase impaciência diante da mensagem, porquanto todos estão
esperando pelo “convite”, após a pregação, para que vejam os
resultados”.

O QUE FAZER ENTÃO ?


1.Precisamos confiar no poder da Palavra para convencer e
mudar vidas. Ela “é o poder de Deus...”
2.Precisamos chamar urgentemente a todos os homens para
virem a Cristo.
107

MAS COMO ?

Lloyd-Jones nos responde: “O apelo deve fazer parte integrante da


própria Verdade, da própria mensagem. ... O apelo deve estar implícito
ao longo de todo o corpo do sermão, bem como em tudo quanto o
pregador faz.”
Ele diz que a exposição e aplicação do sermão é um apelo e
que se sentir do Espírito o desejo de fazer um apelo distinto do
sermão, nunca será convidando pessoas à frente, mas se
dispondo a conversar no final da reunião ou em qualquer outra
ocasião. Disse ele: “Confesso que já vi casos de pessoas que, depois de
estarem a meio caminho de casa, voltaram para conversar comigo na
igreja, por não poderem tolerar o senso de convicção de pecado e de
infelicidade; a agonia delas era grande demais”.
Spurgeon, o grande pastor batista calvinista, e que
condenava esta prática do apelo para vir à frente, sendo que, na
sua época esta prática ainda estava tão comum como hoje, dizia
que um animal ferido (em convicção de pecado) longe de se
expor, procurava um lugar solitário para sofrer suas dores.
Esta prática do apelo tem sido muito comum nos nossos
dias, inclusive nas igrejas de confissão reformada (pelo menos
nominalmente). Também, o apelo aos crentes para orar, para se
consagrar, para chorar, para clamar... é fruto de uma
mentalidade “Finneyana” e tem os mesmos riscos e equívocos
doutrinários do apelo aos não convertidos.
108

Precisamos ter a coragem de quebrar este tradicionalismo e


romper com estes “paradigmas” que descansam em bases
doutrinárias equivocadas e sermos verdadeiros evangélicos
como foram, Knox, Calvino, Lutero e os Puritanos, que
defendiam com todo vigor SOLA SCRIPTURA e por isso foram
às últimas conseqüências para serem fiéis a Palavra.
Deus nos dê da Sua força !! Amém.
109

CAPÍTULO VIII

A EVANGELIZAÇÃO ARMINIANA
(Michael Horton)

I – UMA EVANGELIZAÇÃO INFLUÊNCIADA POR


PELÁGIO E FINNEY

Jerry Falwell denomina-o de “um dos meus heróis e um


herói para muitos evangélicos, inclusive Billy Graham”.
Lembro-me passeando pelo Billy Graham Center alguns anos
atrás, observando o lugar de honra dado a Finney na tradição
evangélica, reforçado pela primeira aula de teologia que tive
numa faculdade evangélica, onde exigia-se a leitura da obra de
Finney. O reavivalista nova-iorquino era o celebrado e sempre
citado campeão do cantor evangélico e líder da JOCUM (Jovens
Com Uma Missão), Keith Green. Finney é especialmente
estimado tanto pela Direita como pela Esquerda evangélica,
tanto por Jerry Falwell quanto por Jim Wallis (revista
Sojourner’s); as suas marcas podem ser vistas em movimentos
aparentemente opostos, mas que, na verdade, são herdeiros do
seu legado. Desde os movimentos da Videira (Vineyard) e
110

Crescimento de Igrejas até às cruzadas sociais e políticas, tele-


evangelismo, e Guardadores da Promessa. Como aclamava
entusiasticamente um ex-presidente do Wheaton College:
“Finney continua vivo!”.

Isto deve-se ao impulso moralista de Finney que visionava


uma igreja que era, em grande parte, uma agência da reforma
social e pessoal em vez de uma instituição na qual os meios de
graça, Palavra e Sacramentos, são colocados à disposição dos
crentes que então levam o evangelho ao mundo. No século
dezenove o movimento evangélico tornou-se crescentemente
identificado com causas políticas — da abolição da escravatura
e leis sobre o trabalho infantil aos direitos da mulher e
proibição de bebidas alcoólicas. Na virada do século, com uma
afluência de imigrantes católicos que já deixava pouco a
vontade os evangélicos americanos, o secularismo começou a
arrancar das mãos dos protestantes as instituições (faculdades,
hospitais, instituições de caridade) que estes haviam criado e
mantido. Num esforço desesperado para recuperar este poder
institucional e a glória da “América Evangélica” (uma visão
que sempre é poderosa na imaginação, mas é ilusória após a
desintegração da Nova Inglaterra puritana) o establishment
protestante da virada do século lançou campanhas morais para
“americanizar” os imigrantes, reforçar a instrução moral e a
“educação do caráter”. Os evangelistas conduziam seu
111

evangelho americano nos termos da sua utilidade prática para o


indivíduo e para a nação.

É por isso que Finney é tão popular. Ele é o ponto mais alto
na mudança da ortodoxia reformada, evidente no Grande
Despertamento (sob Edwards e Whitefield), para o evangelismo
Arminiano (na verdade pelagiano), evidente no Segundo
Grande Despertamento até aos dias presentes. Para demonstrar
o débito do evangelicalismo moderno a Finney, temos que
observar primeiro seus princípios teológicos. Por causa deles
Finney tornou-se o pai dos pressupostos de alguns dos maiores
desafios no meio das igrejas evangélicas, nominalmente: o
movimento de Crescimento de Igrejas, o Pentecostalismo e o
reavivamento político.

A) QUEM É FINNEY?

Numa reação contra o penetrante calvinismo do Grande


Despertamento, os sucessores daquele grande movimento do
Espírito de Deus, volveram-se de Deus para os homens;
volveram da pregação de conteúdo objetivo (i.e. Cristo e Ele
crucificado) para a ênfase em levar uma pessoa a “fazer uma
decisão”.

Charles Finney (1792-1875) ministrou no surgimento do


“Segundo Despertamento”, como fora chamado. Finney, um
advogado presbiteriano, um dia experimentou “um poderoso
112

batismo do “Espírito Santo” que “como uma corrente elétrica


traspassando-me repetidamente... parecia vir em ondas de
amor líquido”. Na manhã seguinte ele informou ao primeiro
cliente do dia: “recebi um adiantamento do Senhor Jesus Cristo
para advogar a Sua causa, e não posso aceitar a sua”.
Recusando-se freqüentar o Seminário de Princeton (ou qualquer
outro), Finney começou a promover avivamentos no interior do
estado de Nova York. Um de seus sermões mais populares foi
“Pecadores Compelidos a Mudarem Seus Próprios Corações”.

A pergunta de Finney para qualquer ensinamento era: “é


útil para converter pecadores?”. Um dos resultados do
reavivalismo de Finney foi a divisão dos presbiterianos da
Filadélfia e Nova York nas facções Arminiana e Calvinista. Sua
“Novas Medidas” incluíam o “banco do aflito” (precursor da
Chamada do Altar, de hoje), táticas emocionais que levavam ao
desmaio e ao choro, e outros “estímulos” como os chamava
Finney e seus seguidores. Finney tornou-se paulatinamente
hostil ao presbiterianismo, referindo-se, na introdução de sua
Teologia Sistemática, muito criticamente à Confissão de
Westminster e aos seus elaboradores, como se eles tivessem
criado um “papa de papel”, e tivessem “elevado a Confissão de
Fé e o Catecismo deles ao trono papal no lugar do Espírito
Santo”. Finney demonstra, notavelmente, quão perto o
reavivalismo Arminiano, em seus sentimentos naturalistas,
tende para um liberalismo teológico menos refinado, pois
113

ambos escondem-se no Iluminismo e em sua veneração pela


razão humana e pela moralidade: “Que o instrumento elaborado
por aquela assembléia no século dezenove deveria ser reconhecido como
padrão da igreja, ou de uma ala de sua inteligência, não é apenas
surpreendente, mas devo dizer que é altamente ridículo. É tão absurdo
em Teologia quanto seria em qualquer outro ramo da ciência. É melhor
ter um Papa vivo que um morto”.

B) O QUE HÁ DE TÃO ERRADO COM A TEOLOGIA DE


FINNEY?

Primeiro, não é necessário ir além do índice de sua Teologia


Sistemática para entender que toda teologia de Finney girava em
torno da moralidade humana. Os capítulos de um a cinco são
sobre governo moral, obrigação, e unidade da ação moral;
capítulos seis e sete são “Obediência Total”, assim como os
capítulos de oito a quatorze discutem os atributos do amor,
egoísmo, e virtudes e vício em geral. Não é senão no capítulo
vinte e um que se lê algo de interesse especialmente evangélico:
expiação. A isto segue-se uma discussão sobre regeneração,
arrependimento e fé. Há um capítulo sobre justificação seguido
de seis sobre santificação. Noutras palavras: Finney na verdade
não escreveu uma Teologia Sistemática, mas uma coletânea de
ensaios sobre ética.
114

Mas isso não significa que a Teologia Sistemática de Finney


não possua declarações teologicamente significativas.

Primeiro, em resposta à pergunta: “Um crente deixa de ser


crente, sempre que cometer um pecado?”, Finney responde:
“Sempre que pecar ele deixa, por enquanto, de ser santo. Isto é
evidente. Sempre que pecar, ele tem que ser condenado; tem que
incorrer na penalidade da Lei de Deus... Se se diz que o preceito ainda
prevalece sobre ele, mas que, quanto ao cristianismo, a penalidade é
posta de lado para sempre, ou ab-rogada, replico pois que ab-rogar a
penalidade é rejeitar o preceito, porque um preceito sem penalidade
não é lei, é conselho ou advertência. Portanto o crente não é mais
justificado pelo que obedece, e deve ser condenado quando desobedece;
ou o Atinominianismo é verdade… Neste aspecto, então, o crente
pecador e o pecador não convertido estão precisamente no mesmo
terreno. (pág.46)

Finney acreditava que Deus exigia perfeição absoluta, mas


em vez disso levá-lo à sua perfeita justificação em Cristo, ele
concluiu que “…obediência total é uma condição de justificação. Mas
novamente, quanto à questão, o homem pode ser justificado enquanto
nele permanece o pecado? Certamente que não, nem pelos princípios
legais nem pelo evangelho, a menos que a lei seja rejeitada… Mas ele
pode ser perdoado e aceito, e justificado, no sentido do evangelho,
enquanto o pecado, qualquer grau de pecado, permanece nele?
Certamente que não”. (pág.57)
115

Tendo em vista a Confissão de Westminster, Finney


declara, quanto à fórmula da Reforma “simultaneamente
justificado e pecador”: “Temo que este erro tenha morto mais almas
do que todo o universalismo que já amaldiçoou o mundo”. Pois,
“sempre que um crente peca ele está sob condenação, e tem que
arrepender-se e fazer suas primeiras obras, ou estará perdido”.
(pág.60).

Retornaremos à doutrina da justificação de Finney, mas


deve-se notar que ela repousa sobre a negação da doutrina do
pecado original. Este ensinamento bíblico, sustentado tanto
pelos católicos romanos quanto pelos protestantes, assevera que
todos nascemos neste mundo herdeiros da culpa e corrupção de
Adão. Estamos, portanto, presos à uma natureza pecaminosa.
Como disse alguém: “Pecamos porque somos pecadores”; a
condição do pecado determina os atos do pecado, e não ao
contrário. Mas Finney seguia Pelágio, herege do quinto século,
que foi condenado por mais concílios da igreja do que qualquer
outro na história, por negar esta doutrina.

Em vez disso, Finney cria que os seres humanos eram


capazes de escolher se seriam ou não de natureza corrompida
ou redimidos, referindo-se ao pecado original como um “dogma
antibíblico e sem sentido” (pág.179). Finney negava, claramente, a
noção de que os seres humanos possuíam uma natureza
pecadora (ibid.). Portanto se Adão nos introduz no pecado, não
por herdarmos sua culpa e corrupção, mas por seguirmos seu
116

mau exemplo, isto leva logicamente à visão de Cristo, o


segundo Adão, salvando pelo exemplo. É precisamente daí que
Finney tira sua explicação sobre a expiação.

A primeira coisa que devemos notar sobre a expiação, diz


Finney, é que Cristo não podia ter morrido pelos pecados de
ninguém senão pelos seus próprios. Sua obediência à Lei e sua
perfeita retidão eram suficientes para salvá-Lo, mas não
poderiam ser legalmente aceitas em benefício de outros. Vê-se
ver neste ponto que toda a teologia de Finney era levada por
uma paixão pelo aperfeiçoamento moral: “Se Ele [Cristo] tivesse
obedecido à Lei como nosso substituto, por que deveria nossa própria
obediência pessoal ser uma condição sine qua non para nossa
salvação?” (pág.206). Em outras palavras, por que Deus insistiria
que nos salvamos por nossa obediência se a obra de Cristo foi
suficiente? O leitor deve lembrar-se das palavra de São Paulo
quanto a isso: “Não anulo a graça de Deus; pois, se a justiça é
mediante a lei, segue-se que Cristo morreu em vão” (Gal.2:21).
Pareceria que a réplica de Finney é de concordância. A
diferença é que ele não tinha dificuldade em crer nestas duas
premissas.

Isto não é totalmente razoável, é claro, porque Finney cria


que Cristo morreu por algo — não por alguém, mas por alguma
coisa. Noutras palavras: Ele morreu por um propósito, mas não
por pessoas. O propósito daquela morte era restabelecer o
governo moral de Deus e conduzir-nos à vida eterna pelo
117

exemplo, assim como o exemplo de Adão nos motivou a pecar.


Por que Cristo morreu? Deus sabia que “A expiação apresentaria
às criaturas os maiores motivos possíveis para a virtude. O exemplo é
a maior influência moral que pode ser exercida… Se a benevolência
manifestada na expiação não subjugar o egoísmo dos pecadores, o caso
deles é desesperado” (pág.209). Não somos, portanto, pecadores
que precisam ser redimidos, mas pecadores caprichosos que
necessitam de uma demonstração de abnegação tão comovente
que nos motive a abandonar o egoísmo. Finney não somente
acreditava que a teoria da “influência moral” da expiação era o
meio principal para compreendermos a cruz, mas negava
explicitamente a expiação substitutiva que “…assume a expiação
como um pagamento literal de um débito que não é consistente com a
natureza da expiação… É verdade que a expiação, nela mesma, não
assegura a salvação de ninguém” (pág.217).

Há, então, o tema relativo à redenção. Jogando fora a


ortodoxia calvinista dos antigos Presbiterianos e
Congregacionais, Finney contendia energicamente contra a
crença de que o novo nascimento é uma dádiva divina,
afirmando que “a regeneração consiste em o pecador mudar
sua escolha suprema, intenção, preferência; ou em mudar do
egoísmo para a bondade”, levado pela influência moral do
exemplo comovedor de Cristo (pág.224). “Regeneração física,
pecaminosidade original ou constitucional, e todos os dogmas
118

resultantes e similares, são igualmente subversões do evangelho, e


repulsivos à inteligência humana”(pág.236).

Nada tendo a fazer com o pecado original, a expiação


substitutiva, e o caráter sobrenatural do novo nascimento,
Finney continua atacando “o artigo pelo qual a igreja fica de pé
ou cai” — justificação só pela graça e através da fé somente.

Os reformadores protestantes insistiam, com base em textos


bíblicos claros, que justificação (na língua grega “declarar
justo”, e não, “tornar justo”) era um veredicto forense (i.e.
“legal”). Noutras palavras, enquanto os católicos romanos
mantinham que a justificação era o processo de melhorar uma
pessoa má, os Reformadores argumentavam que era uma
declaração ou sentença que tinha a justiça de outro (i.e., a de
Cristo) como sua base. Era, portanto, um veredicto, perfeito e
definitivo, de justificação no começo da vida cristã, não no meio
ou no fim dela.

As palavras chave da doutrina evangélica são “forense”


(significando “legal”) e “imputação” (debitar na conta de
alguém, em oposição à idéia da “infusão” de uma justiça dentro
da alma de uma pessoa). Conhecendo tudo isto, Finney declara:
“Mas pronunciar pecadores como judicialmente justos, é impossível e
absurdo… Como veremos, há muitas condições, mas apenas um
fundamento, para justificação de pecadores… Como já foi dito, não
pode haver justificação no sentido legal ou jurídico, exceto no âmbito
119

da universal, perfeita e ininterrupta obediência à Lei. Isto, é claro, é


negado por aqueles que sustentam que a justificação do evangelho, ou
a justificação do pecador penitente, é da natureza de uma justificação
judicial ou forense. Firmam-se na máxima legal de que aquilo que um
homem faz por outro ele o faz por si mesmo, e portanto a Lei considera
a obediência de Cristo como nossa obediência, pela razão de que Ele
obedeceu por nós”.

A isso Finney replica: “A doutrina de uma justiça imputada, ou


de que a obediência de Cristo à Lei foi tida como nossa obediência, está
fundamentada numa disparatada e falsa suposição”. Além de que, a
justiça de Cristo, “não podia fazer mais do que justificar a Ele mesmo.
Jamais ser-nos imputada… era naturalmente impossível, então, que
Ele obedecesse em nosso lugar”. Esta “representação da expiação como
fundamento para a justificação de pecadores tem sido a triste causa do
tropeço de muitos” (pág.320-322).

Finney afirma que a visão de que a fé é a única condição


para a justificação é a “visão antinominiana”. “Temos que ver
que a perseverança na obediência até o fim da vida é também
uma condição de justificação”. Além de que “a presente
santificação, no sentido da presente consagração total a Deus, é
um outra condição… de justificação. Alguns teólogos fizeram
da justificação uma condição de santificação, em vez de fazerem
da santificação uma condição de justificação. Mas veremos que
esta é uma visão errada sobre este assunto” (pag.326-327). Cada
ato de pecado requer “uma nova justificação” (pág.331).
120

Referindo-se aos “elaboradores da Confissão de Fé de


Westminster”, e à posição deles quanto a uma justiça imputada,
Finney admira-se, “Se isto não for antinominianismo, eu não sei o
que é” (pág.332). Este negócio legal não é razoável para Finney
e portanto ele conclui: “considero estes dogmas tão fantasiosos
que mais se adequam a um romance que a um sistema
teológico” (pág. 333). Assim conclui nesta seção contra a
Assembléia de Westminster: “São obvias as relações entre a
justificação e a depravação, dos pontos de vista da velha escola. Eles
sustentam, como vimos, que toda parte e faculdade da constituição
humana é pecaminosa. Claro, um retorno a uma santidade pessoal
presente, no sentido de total conformidade com a lei, não pode ser,
juntamente com isso, uma condição de justificação. Eles precisam ter
uma justificação mesmo estando ainda em algum nível de pecado. Isto
só pode ser produzido pela justiça imputada. O intelecto revolta-se
ante uma justificação em pecado. Portanto é inventado um plano para
tirar os olhos da Lei, e dAquele que dá a Lei, de sobre o pecador para o
seu substituto, que obedeceu perfeitamente à Lei”. (pág.339)

Ele chama isso de “outro evangelho”. Insistindo que o


relato realista de Paulo sobre a vida cristã em Romanos 7
referia-se, na verdade, à vida do apóstolo antes de experimentar
a “inteira santificação”. Finney supera Wesley quando teima na
possibilidade de um crente alcançar santificação nesta vida.
John Wesley sustentava que era possível ao crente alcançar
completa santificação, mas quando reconhecia que o mais santo
121

dos crentes peca, ele acomodou sua teologia a este fato empírico
singelo. Fez isso ao dizer que a experiência da “santificação
cristã” é um assunto do coração, não de ações. Em outras
palavras: um crente pode ser aperfeiçoado em amor, de modo
que o amor seja agora a única motivação de suas atitudes,
embora cometa erros ocasionalmente. Finney rejeita esta
posição e insiste que a justificação é condicionada à completa e
total perfeição, isto é: “conformidade com toda a Lei de Deus”,
e o crente não é capaz apenas disso; quando ele ou ela
transgride em qualquer ponto requer-se uma nova justificação.

Como assinalou tão eloqüentemente o teólogo B. B.


Warfield, de Princeton: ao longo de toda a história existem
apenas duas religiões: o paganismo — do qual o pelagianismo é
uma expressão religiosa — e a redenção sobrenatural.
Juntamente com Warfield, e com aqueles que com tanta
seriedade advertem seus irmãos e irmãs destes erros de Finney
e de seus sucessores, nós também precisamos reconhecer e
saber lidar com a feroz pressão heterodoxa do protestantismo
americano. Com raízes no reavivalismo de Finney, talvez o
liberalismo evangélico e protestante não sejam tão distantes
apesar de tudo. As “Novas Medidas” de Finney, assim como o
movimento de Crescimento de Igrejas dos dias presentes,
fizeram das emoções e da escolha humana o centro do
ministério da igreja, ridicularizaram a teologia, e substituíram a
pregação de Cristo pela pregação da conversão.
122

É sobre o moralismo naturalista de Finney que as cruzadas


políticas e sociais cristãs edificam sua fé na humanidade e nos
seus recursos da auto-salvação. Sem parecer nem um
pouquinho deísta Finney declarou: “Na religião não há nada além
dos poderes ordinários da natureza. Ela consiste inteiramente no
correto exercício dos poderes da natureza. É apenas isto e nada mais.
Quando os homens tornam-se verdadeiramente religiosos, eles não são
habilitados a exercitarem aquilo que não eram capazes antes. Eles
apenas exercem faculdades que possuíam anteriormente, de uma forma
diferente, e as usam para a glória de Deus”.

Portanto, assim como o novo nascimento é um fenômeno


natural, o reavivamento também o é: “Um reavivamento não é um
milagre, nem depende de um milagre, em nenhum sentido. É apenas
um resultado puramente filosófico do uso correto dos meios
constituídos — tanto quanto qualquer outro efeito produzido pela
aplicação de métodos”. É pernicioso crer que novo nascimento e
reavivamento dependem necessariamente da ação divina. “Nenhuma
doutrina”, diz ele, “é mais perigosa do que esta para o crescimento da
igreja, e nada é mais absurdo” (Reavivamentos da Religião pág.4-
5).

Quando os líderes do movimento de Crescimento de Igrejas


proclamam que a teologia entrava o caminho do crescimento e
insistem que não importa o que uma igreja em particular creia:
o crescimento é uma questão da aplicação de princípios
apropriados, e estão demonstrando seu débito a Finney.
123

Quando os membros do Movimento da Videira louvam este


empreendimento sub-cristão e latir, rugir, gritar, gargalhar, e
outros fenômenos estranhos com o argumento de que
“funciona” e que deve-se julgar sua verdade pelos seus frutos,
eles estão seguindo a Finney além do pai do pragmatismo
americano, William James, que declarou que a verdade tem de
ser julgada na base “de sua contabilidade em termos de
experiências”.

Portanto, na teologia de Finney, Deus não é soberano; o


homem não é pecador por natureza; a expiação não é o
verdadeiro pagamento pelo pecado; justificação imputada é um
insulto à razão e à moralidade; o novo nascimento é
simplesmente o efeito de técnicas bem sucedidas, e o
reavivamento é um resultado natural de campanhas
inteligentes. Em sua recente introdução à edição do
bicentenário da Teologia Sistemática de Finney, Harry Conn
recomenda o pragmatismo de Finney: “Muitos servos de nosso
Senhor devem estar procurando diligentemente por um
evangelho que “funcione”, e estou feliz em dizer que eles
podem achá-lo neste volume”. Como documentou
cuidadosamente Whitney R. Cross em O Distrito de Burned-
Over: A História Intelectual e Social da Religião Entusiástica na
Nova York Ocidental, 1800-1850 (The Burned-Over District: The
Social and Intellectual History of Enthusiastic Religion in
Western New York 1800-1850 — Cornell University Press,
124

1950), a região na qual os reavivamentos de Finney foram mais


constantes foi também o berço dos cultos perfeccionistas que
empestaram aquele século. Um evangelho que, por um
momento, “funciona” para perfeccionistas zelosos cria
meramente os super-santos desgastados e desiludidos de
amanhã.

É desnecessário dizer que a mensagem de Finney é


radicalmente diferente da fé evangélica, assim como a
orientação básica dos movimentos que vemos hoje ao nosso
redor que trazem a sua marca: reavivalismo (ou seu rótulo
moderno: “movimento de crescimento de igrejas”),
emocionalismo e perfeccionismo pentecostal, triunfalismo
político baseado no ideal da “América Cristã”, as tendências
anti-intelectuais e anti-dotrinárias do evangelicalismo e
fundamentalismo americanos. Foi através do “Movimento da
Vida Superior” (Higher Life Movement) do final do século
dezenove e começo do século vinte que o perfeccionismo de
Finney veio a dominar o nascente movimento
dispensasionalista sob os auspícios de Lewis Sperry Chafer,
fundador do Seminário de Dallas e autor de Aquele Que é
Espiritual. É claro que Finney não é tão-somente responsável,
ele é mais causa que causador. Contudo, é penetrante a
influência que exerceu e ainda exerce até hoje.

O reavivalista não abandonou apenas o princípio material


da Reforma (a justificação), fazendo-se um renegado do
125

cristianismo evangélico; ele repudiou doutrinas, tais como a do


pecado original e da expiação vicária, igualmente aceitas por
protestantes e católicos romanos. Portanto Finney não é
meramente um Arminiano, mas um Pelagiano. Ele não é apenas
um inimigo do Protestantismo evangélico, mas do Cristianismo
histórico do mais amplo tipo.

Não é com prazer que aponto estas coisas, como para


denunciar alegremente os heróis dos evangélicos americanos.
Entretanto, é sempre melhor, quando alguém perde algo de
valor, voltar pelo caminho para determinar quando e onde pela
última vez o teve em sua posse. É este o propósito deste
exercício, encarar honestamente o sério distanciamento do
cristianismo bíblico que ocorreu através do reavivalismo
americano. Se não encararmos esta mudança, perpetuaremos
um curso distorcido e perigoso.

De uma coisa Finney estava absolutamente certo: o


Evangelho sustentado pelos teólogos de Westminster, a quem
atacou diretamente, e verdadeiramente mantido por todo os
evangélicos, é um “outro evangelho” distinto daquele
proclamado por Charles Finney. A pergunta agora é: ficaremos
do lado de qual evangelho?

II – UMA EVANGELIZAÇÃO QUE BASEIA-SE NO


PRAGMATISMO RELIGIOSO
126

A Inglaterra, que uma vez já foi conhecida pela sua


vitalidade espiritual, agora está mergulhada numa letargia
espiritual e a visão missionária dos Estados Unidos está
substituindo aquilo que a Inglaterra deixou de lado. Além
disso, muita coisa do que Deus está fazendo hoje está
acontecendo fora desses dois países. Eu espero que a Igreja no
Brasil esteja em constante oração para que, a partir do Brasil,
uma outra reforma e um grande despertamento venha e tome
conta do mundo.

Não sabemos o que Deus vai fazer no mundo, mas seria


muito emocionante se pudéssemos fazer parte daquilo que Ele
deseja fazer no Brasil. É maravilhoso ser um cristão e saber que
Deus tem todas as coisas debaixo do Seu controle. Todos nós
sabemos da necessidade de um grande avivamento, mas ao
mesmo tempo existe uma grande polêmica nesses dias sobre a
questão. Sem sombra de dúvidas, se convidássemos as pessoas
para uma reunião de avivamento, muitas delas viriam com
conceitos diferentes do que é avivamento. Assim sendo, faz-se
necessário ter uma definição clara em nossa mente do
significado desse termo. Qual a diferença entre avivamento e
avivalismo, se assim podemos chamar?

Avivalismo e Pragmatismo - Avivalismo, especialmente


na tradição deixada por Carlos Finney, é, na realidade, um
fenômeno americano e queremos tratar de parte desse
fenômeno. Não somente porque é um produto feito na
127

América, mas porque muitos dos movimentos que estão vindo


dos Estados Unidos para outras partes do mundo têm essa
visão característica de entender avivamento segundo o modelo
de Carlos Finney.

Esse modelo tem como base o que nós chamamos de


pragmatismo. Se você for abrir um negócio você tem que ser
pragmático e se você vai criar uma família, existe uma série de
considerações práticas que você precisa sempre ter em mente;
e, certamente, o mesmo se aplica quando nós estamos fundando
uma Igreja e queremos desenvolvê-la.

Todos sabemos que há preocupações práticas que devemos


considerar, mas o pragmatismo é uma filosofia que empurra
para a periferia uma série de princípios fundamentais e elege,
como único fator relevante, a questão: “Isso funciona?”

Quais os perigos do pragmatismo? Voltando para o texto de


2Tm.3:1-9, consideraremos primeiramente os aspectos relativos
à nossa chamada para o ministério. Vejamos, então, o contexto
do nosso ministério. Paulo se refere a esse contexto como sendo
o dos “últimos dias”. Sabemos que os “últimos dias”
começaram com o tempo dos apóstolos, e terminarão com a
segunda vinda do nosso Senhor. Portanto, estamos vivendo nos
“últimos dias”, como, também, Timóteo estava vivendo nos
“últimos dias”. Qual é o contexto, então, do ministério nesse
período entre as duas vindas de Cristo? Paulo diz, em primeiro
128

lugar, que nos últimos dias os homens serão amantes de si


mesmos.

Narcisimo e Auto-Estima - Christen Lash, um sociólogo


americano bastante conhecido, escreveu um livro sobre a
cultura americana cujo título é: “O culto do Narcisismo”. Essa é
uma acusação difícil de se fazer, porque o que ela implica é que
a cultura americana é uma cultura onde as pessoas se
endeusam. E como vocês se lembram “Narciso” é o nome
daquele jovem da lenda grega que costumava admirar o seu
próprio reflexo no espelho das águas. Mas isso não somente é
parte da nossa cultura, como também se tornou parte das
nossas igrejas. Muitos dos movimentos que se entitulam
“avivados”, em nossos dias, simplesmente estão reavivando o
narcisismo, ou seja: a adoração do “eu”. Isso pode ser visto na
declaração de um desses pastores que afirmou: “A Reforma
errou porque foi centralizada em Deus e não no homem, como
devia ser”. Esse pastor escreveu um livro cujo título é:
“Crendo no Deus Que Crê em Você”. Uma certa ocasião,
trouxemos esse cidadão para falar no nosso programa de rádio.
Então eu li essa passagem, onde Paulo diz que as pessoas serão
amantes de si mesmas, e perguntei-lhe: “Como você pode dizer
às pessoas que a salvação começa com o amor próprio, quando
Paulo diz que nos últimos dias as pessoas serão amantes de si
mesmas? Não estaria ele dizendo que isso é uma coisa errada, e
129

que nós não devíamos ser amantes de nós mesmos? E como


Deus vai nos fazer felizes com esse falso evangelho narcisista?”

O que está acontecendo é que a piedade e a santidade


deixaram de ser os referenciais pelos quais julgamos se um
movimento é ou não é do Espírito. Assim, o critério que tem
sido adotado é: “Funciona? Vai me fazer feliz? Vai me ajudar a
criar minha família? Vai consertar o meu casamento?”. Todas
essas questões são importantes, à luz das Escrituras, mas não
são as mais importantes.

Em segundo lugar, Paulo diz que eles serão amantes do


dinheiro. Porque as pessoas amam excessivamente a si
mesmas, elas criam o evangelho da auto-estima; e porque as
pessoas amam excessivamente o dinheiro, elas criam o
evangelho da prosperidade.

Rebeldia, desprezo pelo passado e busca do prazer - Paulo


diz ainda que haverá muito orgulho e revolta contra as
autoridades. Haverá pessoas desobedientes aos pais. Uma
geração não se preocupará com a geração anterior. O cantor
Bob Marley escreveu uma música sobre a cultura americana
dizendo: “Povo do futuro, onde está o teu passado? Povo do
futuro, quanto tempo vocês vão durar?” O povo que não tem
passado também não tem futuro. Não sei se Bob Marley era
crente, mas com certeza esses versos refletem um ponto de vista
bíblico ao tentar se segurar naquilo que pede o seu passado.
130

Eu quero lhes garantir que se levarem a doutrina bíblica a


sério, muitos irmãos e irmãs vão lhes dizer que vocês não estão
andando nos passos do Espírito; vão lhes dizer que o Espírito
Santo hoje quer fazer uma coisa inteiramente nova, tal como
nunca fez no passado. E o que vocês vão falar? Vão falar sobre
os grandes avivamentos do passado, sobre a Reforma? Qual o
valor disso para os amantes de si mesmos e materialistas? Eles
responderão que Deus está fazendo algo completamente
diferente nos dias de hoje. Mais uma vez eu quero lembrar que
isso faz parte do narcisismo que diz o seguinte: - “eu é que sou
importante e aqueles da minha geração é que são importantes e
não os que vieram antes de nós”.

E ele diz também que as pessoas serão hedonistas, amantes


do prazer, nos últimos dias; como ele diz no verso 4, serão mais
“amigos dos prazeres que amigos de Deus”. Mais uma vez
queremos enfatizar: Se você perguntar em uma Igreja: “Vocês
concordam com o hedonismo?” Creio que ninguém vai
responder sim a essa pergunta. Mas se você entrar numa
livraria evangélica, se ouvir uma emissora de rádio evangélica,
se prestar atenção a muitos sermões evangélicos, você ouvirá
mensagens afirmando que o Cristianismo é a melhor maneira
para você se auto-realizar. Quantos testemunhos temos visto
que funcionam como comerciais de televisão? Nos Estados
Unidos, temos aquelas propagandas de dieta que mostram uma
pessoa antes e depois da dieta. Muitas vezes, os testemunhos
131

dos crentes são assim: “Antes eu era triste, agora sou feliz; antes
eu era deprimido, mas agora eu estou extremamente motivado
para viver”. Esses são benefícios maravilhosos, mas, por vezes,
a verdade é que nós, como cristãos, nos tornamos tristes.
Algumas vezes, o caminho da cruz é o caminho do sofrimento,
e nem sempre estamos tão entusiasmados a respeito disso.
Apesar de tudo isso, a perspectiva que predomina nos nossos
dias é que temos que viver para satisfazer a nós mesmos.

Moralidade sem piedade - No verso 5 do texto destacado,


Paulo diz: “tendo forma de piedade, negando-lhe, entretanto, o
poder”. Veja bem! O que Paulo está dizendo é que pode haver
uma moralidade sem Deus. Existem pagãos que tem uma vida
moral excelente, e há ímpios que acreditam ser errado você trair
sua esposa. Há pessoas não cristãs que têm famílias muito boas.
Mas será que este é o propósito do cristianismo? Consertar tudo
aquilo que está moralmente errado no mundo, ou será que o
foco está em Deus, nos Seus mandamentos justos, e no
Evangelho pelo qual nós devemos viver?

É esse o contexto do nosso ministério. Então respondamos à


pergunta: Qual o nosso chamado para o ministério? O exemplo
de Paulo é alguma coisa que temos de imitar nesse sentido. Mas
agora perguntamos: Como, historicamente, essa filosofia do
pragmatismo dominou o pensamento moderno? A figura mais
destacada no cenário evangélico, neste sentido, é a de Carlos
Finney. Quantos de vocês já ouviram falar de Carlos Finney?
132

Quase todo mundo. Isso é significante porque Finney é uma


pessoa muito importante para aqueles que são proponentes do
movimento de crescimento da Igreja e do movimento de sinais
e prodígios.

Evangelho ou Pragmatismo? - Carlos Finney era


presbiteriano, mas atacou a Confissão de Fé de Westminster
que ele próprio subscrevera. Ele a chamou de: “um papa de
papel”. Ele dizia, no século XIX em que viveu: “Nós já somos
pessoas muito ilustradas e racionais para acreditar em todas
essas coisas aí que a Confissão de Fé está dizendo”. Vejam
algumas das coisas que Carlos Finney escreveu: “Quando o
homem se torna religioso - disse Finney - ele não recebe um poder que
não tinha antes, ele simplesmente muda a sua vontade, e resolve
seguir, agora, numa direção moral. Religião é obra do homem, não é
um milagre e nem depende de um milagre em qualquer sentido; é
simplesmente um resultado filosófico do uso correto de técnicas. O
homem já possui, por natureza, toda a habilidade necessária para
prestar perfeita obediência a Deus, portanto o objetivo do ministro é
emocionar as pessoas até que se disponham a tomar essas decisões.”

Foi dessa filosofia que nasceu o que ficou chamado naquela


época de “novas medidas introduzidas por Finney”. Por
exemplo: O sistema de apelo para que as pessoas se manifestem
fisicamente e caminhem até à frente em resposta à pregação
nasceu com Carlos Finney, nesse período. Em sua Teologia
Sistemática, Finney nega explicitamente a doutrina do pecado
133

original. Ele diz ainda que a doutrina da substituição vicária de


Cristo é uma ficção, e que a justificação pela graça, por meio da
fé somente, é “outro evangelho”. Com certeza, é um evangelho
diferente daquele que Finney estava pregando.

É isso que Paulo diz a Timóteo, quando fala de pessoas que


têm forma de piedade mas negam, entretanto, o seu poder.
Afinal de contas, onde reside o poder da piedade? É o poder de
Deus para a salvação! E que poder é esse? É o evangelho de
Jesus Cristo! Somente o Evangelho pode nos capacitar a viver a
vida cristã. Portanto, é possível ter moralidade sem piedade; e
esse é o resultado do pragmatismo.

Mais tarde, tornou-se conhecida a idéia de D.L. Moody. Ele


disse no século XIX que não faz nenhuma diferença como você
leva alguém a Deus; se você conseguir fazer isso, não importa o
meio. O importante é levar, de qualquer maneira, a Deus.

Uma vez perguntaram a Moody: Qual é a sua teologia? Ele


disse: “Minha teologia? nem sei se eu tenho uma!”. Vejam bem!
Moody era um vendedor de sapatos, e um dia ele disse que ao
se tornar evangelista não mudou de profissão, o que ele havia
feito era trocado de produto.

Como abordamos o pragmatismo corporativo da nossa


cultura? Alguns dizem que a contribuição distinta da América
para a história da filosofia foi a criação do pragmatismo. Um
dos grandes pais do pragmatismo e quem o transferiu da esfera
134

religiosa para a esfera secular foi William James. Ele era filho de
pastor; pastor, ele próprio, e também professor da Universidade
de Harward. Ele disse: “Faça a seguinte pergunta: Como é que
você define que determinada verdade é o que você deve crer?”
E acrescentou: “A resposta é que você tem que determinar o seu
valor em termos de experiência e resultado”. Então, com
princípios pragmáticos, analisou a doutrina de Deus dizendo o
seguinte: “Se a doutrina de Deus funciona, então é verdade. O
pragmatismo tem que adiar questões dogmáticas porque no
começo nós não sabemos qual reivindicação doutrinária vai
produzir resultado”.

Acredito que quase ninguém iria marcar essas coisas num


exame tipo teste dizendo que acredita nelas, mas, na prática, o
que acontece é que esse é o credo do evangelicalismo mundial
hoje. Um evangelista americano famoso disse: “Não tente
entender, simplesmente comece a desfrutar, porque funciona;
eu já tentei”. Ele estava falando a respeito da meditação
transcendental da Nova Era. Na década de 50 do nosso século,
esse pragmatismo se desenvolveu em termos de pensamento
positivo. Foi então publicado um livro chamado “A Mágica do
Crer”. Esse livro propõe que há uma certa qualidade mágica no
simples ato de crer. Porém, a verdade é outra. No cristianismo,
o que salva não é o ato da fé, mas sim o objeto da fé. Nós não
somos salvos pela fé, não somos justificados pela fé; nós somos
justificados pela justiça de Cristo que nos é imputada. Mas hoje
135

em dia, desenvolveram essa equação de que fé é igual a


pensamento positivo. Na realidade, essa última frase que
mencionei foi uma citação de Peter Wagner. Ler anexo 03 (o
pensamento jesuíta – “os fins justificam os meios” – Pb.
Manoel Canuto)

Deus como objeto de consumo - Muito bem! Esses


conceitos funcionam numa sociedade materialista, que está
satisfeita e centralizada no ego; pode funcionar muito bem na
América do final do século XX, pode ser até que funcione em
São Paulo também, e pode funcionar em Londres. Mas imagine
o seguinte quadro: Você vai a um cristão do século I e diz a ele
que a razão principal pela qual ele está indo para a boca dos
leões é porque o Cristianismo funcionou melhor do que as
outras religiões!

Os testemunhos que temos no Novo Testamento são muito


diferentes dos testemunhos que nós vemos hoje em dia. No
Novo Testamento temos a palavra de testemunhas oculares,
que é muito mais importante que o nosso próprio testemunho.
O que é que Paulo disse em I Cor. 15? Ele disse: “E, se Cristo
não ressuscitou, é vã a nossa pregação e é vã a vossa fé... Se a
nossa esperança em Cristo se limita apenas a esta vida, somos
os mais infelizes de todos os homens”. Ele não diz “pelo menos
vocês têm uma vida feliz e saudável!”. E ele também não está
dizendo “Bem! o que é que você pode perder?” Por que Paulo
não fez isso? porque ele não era um pragmático. Paulo
136

fundamentava todas as reivindicações da fé cristã no Evangelho


verdadeiro.

Temos que nos perguntar: “Será que não estamos usando a


Deus? Será que, finalmente, não embarcamos nesse
consumismo da nossa sociedade? Será que não estamos
tratando a Deus como tratamos um produto?” São perguntas
muito importantes que devem ser feitas a nós mesmos. “Será
que Deus está nos usando ou nós estamos usando a Deus?”

Reavivamento e Reforma não virão à Igreja até que a


mentalidade dos crentes seja desviada desse egoísmo humano,
da centralização no homem que Paulo descreve, para o
verdadeiro Evangelho e para Deus.

Nos Estados Unidos, temos um adesivo que diz: “Jesus é a


resposta”. Os incrédulos fizeram um outro adesivo para
retrucar a esse: “Qual é a pergunta?” Considere, agora, o que
diz o pragmatismo: “Eu não sei qual é o seu problema, mas
qualquer que seja, Deus pode resolver. O seu carro está
enguiçado? A sua vida familiar não está progredindo como
devia? Deus pode consertar em um piscar de olhos!”. Assim,
passamos a consumir a Deus. Nós usamos a Deus, ao invés de
amá-Lo, servi-Lo e honrá-Lo. Ler anexo 04 ( discípulos ou
consumidores – Augusto Nicodemos)

Muito bem! Então qual é o propósito do nosso ministério?


Vejamos o que diz Paulo: “Tu, porém, tens seguido de perto o meu
137

ensino, procedimento, propósito, fé longanimidade, amor,


perseverança, as minhas perseguições e os meus sofrimentos, quais me
aconteceram em Antioquia, Icônio e Listra, - que variadas
perseguições tenho suportado! De todas, entretanto, me livrou o
Senhor. Ora todos quantos querem viver piedosamente em Cristo
Jesus serão perseguidos. Mas os homens perversos e impostores irão de
mal a pior, enganando e sendo enganados. Tu, porém, permanece
naquilo que aprendeste, e de que foste inteirado, sabendo de quem o
aprendeste. E que desde a infância sabes as sagradas letras que podem
tornar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus. Toda Escritura
é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a
correção para a educação na justiça. a fim de que o homem de Deus
seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra. Conjuro-te,
perante Deus e Cristo Jesus que há de julgar vivos e mortos, pela sua
manifestação e pelo seu reino: prega a palavra, insta, quer seja
oportuno, que não, corrige, repreende, exorta com toda a
longanimidade e doutrina. Pois haverá tempo em que não suportarão
a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mestres, segundo as suas
próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos; e se
recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às fábulas. Tu,
porém, sê sóbrio em todas as cousas, suporta as aflições, faze o trabalho
de evangelista, cumpre cabalmente o teu ministério (II Tim. 3:10-4:5)

O modelo apostólico - Em primeiro lugar, o propósito do


nosso ministério é seguir o modelo apostólico. Paulo menciona
aqui o seu ensino, a sua maneira de viver, o seu propósito, a sua
138

fé, a sua paciência, o seu amor, e a sua perseverança diante das


tribulações. Perseguições? Sim! É o que ele diz no verso 12.
Todos quantos querem viver piedosamente em Cristo Jesus
serão perseguidos. Será que é isso o que estamos ouvindo hoje?
Ou será que estamos ouvindo outra mensagem? Algumas vezes
você vai pensar que não está dando certo, que as coisas não
estão funcionando como deveriam, como lemos em Romanos,
capítulo 7. Nós sofreremos como cristãos, e ainda vamos sofrer
com os nossos pecados.

A proclamação da Lei e do Evangelho - Além de seguir o


seu exemplo, Paulo quer que Timóteo também se firme
naquelas verdades que aprendeu quando era jovem. Veja que
Paulo, ao invés de nos levar à questão do pragmatismo: “Será
que funciona?”, ele nos conduz para as Escrituras. Ele diz:
“prega a Palavra”, com muita paciência instruindo as pessoas.
Porque haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina. Ao
contrário, cercar-se-ão de mestres, segundo as suas próprias
cobiças, como quem sente coceira nos ouvidos (4:3).

Vejam! sempre temos coceira nos ouvidos. Pragmatismo


não é uma coisa nova. Na realidade já foi praticado desde o
jardim do Éden. Quando Eva viu que a árvore era agradável
para se ver, para descobrir o conhecimento e desejável para
trazer entendimento; então ela tomou do fruto e comeu. O que
significa para nós “pregar a Palavra”? O que Paulo quer dizer
no verso 5 “Tu, porém, sê sóbrio em todas as coisas, suporta as
139

aflições, faze o trabalho de evangelista”?. O que ele quer dizer


com isso, “pregar a Palavra”? Vez após vez, Paulo e os demais
escritores bíblicos nos dizem que isso é a proclamação da lei.
Na verdade, é pela proclamação da lei santa de Deus que nós
somos tocados e feridos. A lei de Deus vem até nós e ela não
vem dizendo assim: “Eu vou transformar a tua vida numa vida
feliz!”, ela não vem dizendo: “Vou te dar prosperidade!”. Na
realidade, a lei vem para nos dizer exatamente aquilo que Deus
tem dito que requer de nós. A lei nos confronta com a glória de
Deus e a nossa pecaminosidade torna isso aterrorizante!

Finalmente, o Evangelho vem e causa também impressão


em nós. Há uma Igreja no Estado do Arizona, cujo pastor,
numa entrevista que foi publicada na revista Newsweek, disse:
“As pessoas hoje em dia não estão preocupadas com doutrinas
como justificação, salvação ou expiação. Nos dias de hoje,
ninguém entende esses termos. O que nós precisamos fazer é
atender as necessidades das pessoas!”

Imaginem um professor! Vocês não acham que seria muito


estranho se o professor chegasse dizendo assim: “Não posso
ensinar o alfabeto para esta criança porque ela ainda não sabe
português”. Esse é o tipo de argumento que esse pastor estava
apresentando. Tanto que o que hoje se passa com o nome de
pregação, na realidade, não é pregação da Palavra. Porque não
apresenta nem a Lei nem o Evangelho. Esses pastores começam
decidindo o que é que as pessoas de sua igreja desejam ouvir.
140

Quais são os pontos que estão em moda hoje? Quais são as


necessidades das pessoas dos dias de hoje? E aí, então, eles vão
às Escrituras e procuram e acham passagens que podem ser
usadas para apoiar essa necessidade, ao invés de, indo ao texto,
perguntarem primeiro como a santidade de Deus nos convence
do nosso pecado e como o Evangelho de Cristo pode ser tão
claro que até pecadores como nós podem se arrepender e crer.

Mas vocês, irmãos e irmãs ouçam o que Paulo diz, sejam


sóbrios em todas essas coisas, preguem a palavra, suportem as
aflições, façam o trabalho de evangelista, e cumpram
cabalmente o ministério. Ler anexo 02 ( tentando agradar a
homens uma prática cheia de perigos – George M. Bowman)
141

CAPÍTULO IX

A EVANGELIZAÇÃO PURITANA x EVANGELIZAÇÃO


ARMINIANA
(Pr. José Santana Dória)

INTRODUÇÃO:
Dois conceitos e tipos distintos de evangelismo tem sido
desenvolvidos durante o curso da história protestante.
Podemos chamá-los de Evangelismo Puritano e Evangelismo
Moderno. – Estamos tão acostumado com o Tipo moderno, que
olvidamos o Evangelismo Puritano. A fim de apreender mais
sobre o Evangelismo Puritano, quero pô-lo aqui em contraste
com o Evangelismo Tipo Moderno. Que em nossa era
predomina.

I – O EVANGELISMO MODERNO E SUAS IMPLICAÇÕES


PRÁTICAS -DEFICIÊNCIAS

Comecemos caracterizando o evangelismo Tipo Moderno:


142

Um evangelismo que tem o caráter de uma campanha


periódica de recrutamento – Trata-se de uma atividade
extraordinária e ocasional (reuniões especiais com pregadores
especiais), adicional e complementar ao funcionamento regular
de uma congregação local. ( Reuniões vistas como uma ação
separada e distinta da adoração a Deus). São encontros, que
fazem de tudo para garantir, da parte dos perdidos um ato de
fé imediato, consciente e decisivo em Jesus Cristo. No fim das
reuniões...Solicitados virem a frente, levantar a mão,
preencherem um ficha, aconselhadas e arroladas como novos
decididos e brevemente como membros comungantes. Esse tipo
de evangelismo foi criado por Charles G. Finney, durante a
década de 1820 ( Advogado e Pastor Presbiteriano). Finney
criou novas medidas como o assento dos ansiosos (reuniões
com muita emoção), gabinete de aconselhamento e no fim dos
seus sermões costumava dizer “Aqui está o assento dos ansiosos;
venha à frente e tome a resolução de passar para o Senhor”
A evangelização dos nossos dias é o prolongamento das
medidas criadas por Finney – Sequer percebemos que este tipo
de evangelização é uma inovação na história da Igreja Cristã. –
e como ela esta distante da realidade bíblica. Tanto Finney,
quanto a evangelização moderna, cometeram alguns erros
básicos em diferentes aspectos das Escrituras. Citarei apenas
quatro áreas em que eles se afastaram dos princípios bíblicos.
143

1 – Aceitação do pelagianismo – Finney era


confessadamente um pelagiano ( Pelágio foi um herege do
século IV que sofreu dura oposição de Agostinho). Ele negava
que o homem caído fosse incapaz de se arrepender, de crer ou
de fazer qualquer coisa espiritualmente boa sem o concurso da
graça renovadora. – Negava a influência do pecado original na
vida humana. Assim como, negava os Cinco pontos Calvinistas.
Dizia que cada pessoa tem a liberdade e a vontade livre de
arrepender-se e voltar-se para Deus.
Que cada pecador pode resistir ao chama do Espírito
Santo, e que este espírito apenas apresenta-lhe razões pelas
quais ele deve ir a Deus. Entretanto ele é livre para aceitar ou
rejeitar as razões apresentadas.
O Espírito Santo apenas persuadia moralmente – O
homem teria sempre essa liberdade para rejeitar a persuasão
“os pecadores podem ir para o inferno apesar de Deus”.
Quanto maior a persuasão, maior possibilidade de
aceitação – Razões porque o clima emocional teria que
prevalecer – Quanto mais o sistema nervoso fosse solicitado...

2 – Colocação de pressão indevida sobre a vontade humana


– Se a vontade humana, pecadora, é livre... A pregação deve ser
reduzida simplesmente a uma batalha entre a vontade dos
ouvintes e a vontade do pregador. – Todos os meios que o
144

pregador usar para persuadir torna-se lícitos – mesmo que seja


baseado no excesso de emocionalismo do auditório – O que
importa é a decisão imediata – Inverso Jo.1:13.

3 - Reduzem o processo de conversão a um espaço de curto


tempo - A Bíblia apresenta a conversão como sendo por vezes
demorado – Perderam o conceito de conversão como uma obra
miraculosa Jo.3:8 – Passou essa responsabilidade para o
homem.

4 - Grande parte dos resultados da evangelização moderna


é questionável. Se a doutrina de Finney sobre o estado natural
do homem pecaminoso está certa, então seus métodos de
evangelização também precisam ser considerados corretos – Da
mesma forma o inverso...
A maioria dos convertidos de Finney desviou-se e
apostatou – o que não é diferente daqueles que foram
conseguidos (nos dias atuais) utilizando-se dos métodos de
Finney
Esses métodos tem uma tendência natural de produzir
uma colheita de falsos convertidos, o que, inegavelmente, tem
acontecido na realidade.

A Bíblia diz que Deus pode fazer com que uma vara torta se
torne reta. Entretanto, esse fato não nos isenta da responsabilidade em
145

apresentar aos nossos ouvintes uma evangelização bíblica, saudável e


teocêntrica. É isso que descobrimos quando nos voltamos para o
método puritano.

II – O EVANGELISMO PURITANO E SUAS IMPLICAÇÕES


PRÁTICAS.
O evangelismo puritano, era e continua sendo uma
expressão coerente, das convicção puritana que a conversão de
um pecador é uma obra soberana e graciosa do poder divino.
Quero esclarecer.
Os puritanos usavam as palavras “conversão”, “novo
nascimento” e “regeneração” como sinônimo do termo técnico
chamada eficaz – Rm.8:30; 2Ts.2:14; 2Tm.1:9. O adjetivo
“eficaz” foi adicionado para distinguir da chamada externa e
ineficaz, mencionada em Mt. 22:14
A Confissão de Fé de Westminster no Capítulo X, Item I. Diz
o seguinte: “Todos aqueles que Deus predestinou para a vida,
somente a esses Ele se agrada, no tempo por Ele determinado e aceito,
chamá-los eficazmente, por meio de Sua Palavra e Espírito, tirando-os
daquele estado de pecado e morte no qual se acham por natureza, para
a graça e a salvação por meio de Jesus Cristo.”
O Breve Catecismo de Westminster, em sua resposta 31,
oferece a seguinte análise: “A chamada eficaz é aquela obra do
Espírito de Deus mediante a qual, convencendo-nos do nosso pecado e
146

miséria, iluminando-nos a mente quanto ao conhecimento de Cristo e


renovando a nossa vontade, Ele nos persuade e nos capacita a aceitar a
Jesus Cristo, o qual nos é gratuitamente oferecido no evangelho.”
Acerca dessa chamada eficaz, três coisas precisam ser
ditas, se tivermos de entender o ponto de vista puritano.
a) Ela é uma obra da graça divina. Não se trata de algo
que o indivíduo possa fazer por si mesmo ou por outrem. – é
uma obra da Trindade. O PAI elege incondicionalmente, O
FILHO redime objetivamente os eleitos e O ESPÍRITO SANTO
aplica eficazmente a redenção ao coração daqueles por quem
Cristo morreu.
b) Ela é uma obra do poder divino. Ela é efetuada pelo
Espírito Santo, o qual age na mente e no coração do pecador
restaurando-lhe todas as suas faculdades... fazendo-o capaz e
disposto a responder positivamente ao convite do evangelho.
John Owen diz o seguinte: “O ato de regeneração do Espírito é
infalível, vitorioso, irresistível, ou seja, sempre eficaz, esse ato remove
todos os obstáculos, vence toda oposição e produz de forma infalível, o
efeito tencionado”
Thomas Watson diz o seguinte: “Os ministros batem à porta
dos corações dos homens, o Espírito Chega com uma chave e abre a
porta.”
Michael Horton: “Nosso papel é colocara isca no anzol, fisgar
depende do Senhor.”
147

A razão pela qual os puritanos magnificavam o poder


vivificante de Deus é que eles entendiam a situação do homem
depois da queda: Morto espiritualmente, escravizado pelo pecado,
espiritualmente impotente... O pecado exerce um poder tal,
afirmavam eles, que somente o autor da vida pode ressuscitar
mortos. (2Co.4: 6, 7; Is.55:11). A incapacidade total requer total
soberania para que seja vencida.
c) Ela é uma obra da liberdade divina . Só Deus pode torná-
la realidade (Rm.9:16 “Assim, pois, não depende do que quer, ou
de quem corre, mas de Deus usar a sua misericórdia”). Há mais
dois textos, que expressam bem esta verdade. Vejamos Mt.11:20 – 24
e At.16:9
O evangelho é enviado a alguns, mas não a outros.
No primeiro Texto Mt.11 – Vimos que aquelas pessoas
poderiam se arrepender...
No segundo Texto At. 16 - O Senhor restringe que o
evangelho seja pregado na Ásia ou Bitínia – Assim, como ainda
hoje continua restringindo em várias regiões do mundo.
Pergunto? Por que essa discriminação? Por que somente
alguns ouvem o evangelho? E quando o evangelho é ouvido,
por que somente uns poucos crêem. João e não Judas. Simão
Pedro e não Simão Mago.
Porque quem determina quando um pecador eleito será
salvo, nunca é o homem, e sim, Deus.
148

2.1 – PRINCÍPAIS CARACTERÍSTICAS EVANGELÍSTICAS


DOS PURITANOS
1 - Apresentavam sermões evangelísticos (aliás todos os
seus sermões eram evangelísticos e doutrinários...)
extensamente baseado nas Escrituras. Para o pregador puritano
o texto não estava no sermão, mas o sermão estava no texto. Por
isso um membros de uma igreja puritana podia dizer: “Ouvir
um sermão, para mim, é como estar dentro da Bíblia.” O sermão
puritano era dentro do contexto, permanecendo de acordo com
a doutrina que estava sendo ensinada. Eles eram
profundamente bíblicos, seus sermões eram textual, expositivo,
prático e aplicativo. Os sermões evangelísticos de hoje Citam as
Escrituras, mas, superficialmente e repetidamente. O resto do
tempo passam manipulando as consciências; usam os textos
bíblicos intercalados com anedotas; Pregações egocêntricas (eu,
eu, eu...).

2- A pregação evangelística tinha cunho doutrinário


a) O pregador puritano não temia pregar todo o conselho de Deus
para o povo.
b) Pregavam sem medo, a doutrina do pecado – Chamavam
pecado de pecado. Mostravam todas as conseqüências do
pecado original. Hoje há muita pouca convicção de pecado
entre os não salvos – Temos muitos membros de igrejas, fruto
149

do evangelismo moderno, que nunca se arrependeram de seus


pecados.
A evangelização moderna – tem uma visão superficial do
pecado; fala tão pouco de um assunto que a Bíblia tanto
menciona.
A evangelização moderna – tem medo de falar às pessoas
as verdades a respeito delas mesmas; tem medo de perdê-las.
Ensina que não devemos ofender as pessoas, e sim, sempre
conquistá-las.
A evangelização moderna – não nega algumas doutrinas
básicas: Ef.2:1; Rm.8:7; 1Co.2:14 – porém não as aplica – “como
poderemos ganhar pessoas se dissermos que elas não podem
salvar-se a si próprio.”A razão humana diz que não vamos
ganhar pessoas se falarmos do pecado.
c) Pregavam a Doutrina de Deus – Mostravam que todas as
coisas são preparadas, iniciadas, projetadas e feitas para glória
de Deus. Os puritanos achavam que não podia contar uma
história qualquer, sem que esta tivesse doutrina. Pregavam a
verdade de Deus como um homem que estava morrendo a
outros que estão morrendo.
O evangelista puritano mostrava aos seus ouvintes, não
salvos, Que eles precisavam se arrepender, precisavam parar de
fazer o mal, precisavam ser santo como Deus é, precisavam
amar a Deus de todo o coração, precisavam entrar pela porta
estreita. Eles mostravam claramente a incapacidade do homem
150

para salvar-se a si mesmo. Em primeiro lugar eles mostravam


as suas necessidades (ser salvo) mostrava a sua impossibilidade
(eu não posso ser salvo).
Como foi que Jesus evangelizou Nicodemos ( você precisa
nascer de novo), Como Ele evangelizou o Jovem Rico ( você
precisa guardar os mandamentos) – NÃO POSSO!
Os puritanos pregavam a lei para que os pecadores se
sentissem culpado – depois pregavam a Cristo na Sua
plenitude, mostrando que Ele é o fim da lei.
d) Proclamavam de forma completa e plena a doutrina de Jesus
Cristo – Recusavam separar os benefícios que advêm de Cristo,
da própria Pessoa de Cristo. Eles entendiam que os verdadeiros
convertidos não aceitam apenas as recompensas de Cristo, mas
a própria obra de Cristo. Não amam apenas os benefícios de
Cristo, e sim também o “fardo” de Cristo. São participantes do
pão e do cálice. Eles rejeitavam a graça barata – Um Cristo que
tira os nossos pecados, mas não exige negação do “EU” - Um pé
no céu outro no inferno. Os puritanos nunca deixou de
apresentar Jesus como Senhor e Salvador. Eles diziam assim: “O
pregador que é seu melhor amigo, é aquele que vai dizer mais verdade
sobre você mesmo.”
e) Pregavam com detalhes a doutrina da Santificação – A vida
inteira do crente era para ser colocada aos pés de Deus. Isso nos
traz a terceira característica.
151

3) A pregação evangelística puritana, era


experimentalmente prática. A ausência de uma pregação
experimental e prática é uma das grandes falhas no culto e na
evangelização de hoje. O que significa uma pregação
experimental? – A palavra experimental vem da palavra
experiência. Em termos de cristianismo, a religião experimental
significa que a palavra de Deus e suas doutrinas precisam ser
recebidas não apenas na mente, mas também precisam ser
experimentadas e vividas no coração Pv.4:23. Para os puritanos
os pensamentos precisam fluir das Escrituras e as experiências
do coração, fluem do ensino da doutrina e das Escrituras. Dessa
forma a experiência não é alguma coisa mística, separada da
Bíblia. De sorte que os puritanos acreditavam que, o ouvinte
deveria trazer suas experiências as Escrituras. Para os puritanos
a doutrina seria algo vazio sem a experiência (ortodoxia sem
ortopraxia). Toda experiência verdadeira leva a uma
experiência pessoal com Cristo. Por isso é necessário a pregação
da pessoa de Cristo e esta pregação será honrada pelo Espírito
santo, porque Ele toma estas coisas e aplica aos pecadores.
Os puritanos na sua pregação incluíam o que chamavam de
“marcas de um auto exame”, eram sinais que distinguiam a
igreja do mundo. Distinguiam os verdadeiros crentes daqueles
que eram nominais.
 Os puritanos faziam distinção entre fé salvadora e fé
temporária. Eles não estavam preocupados em criar crentes nominais.
152

 Fé e Arrependimento são dons de Deus operados na alma


através da obra regeneradora do Espírito Santo. (At.13:48; Ef.2:8, 9;
At.5:31; 11:18; 16:14; 18:27; Fl.1:29; 2tm.2:25, 26 ).
 Interferir neste campo é usurpar a obra do Espírito Santo.

CONCLUSÃO:
Concluindo, diríamos que só existe um meio de
evangelizar – É aquele que prega e esclarece o evangelho de
Cristo em sua totalidade, trazendo dEle (Cristo) total explicação
e aplicação, glorificando a Deus, reconhecendo-o como o
Senhor Soberano. E dando ao homem o seu devido lugar (com a
boca no pó), em busca do favor e da graça divina. Clamando
desesperadamente por Misericórdia.

ANEXOS

ANEXO Nº 01

CAPÍTULO XVIII DA CONFISSÃO DE FÉ DE


WESTMINSTER
DA CERTEZA DA GRAÇA E DA SALVAÇÃO
153

I. Ainda que os hipócritas e os outros não regenerados


podem iludir-se vãmente com falsas esperanças e carnal
presunção de se acharem no favor de Deus e em estado de
Salvação, esperança essa que perecerá, contudo, os que
verdadeiramente crêem no Senhor Jesus e o amam com
sinceridade, procurando andar diante dele em toda a boa
consciência, podem, nesta vida, certificar-se de se acharem em
estado de graça e podem regozijar-se na esperança da glória de
Deus, nessa esperança que nunca os envergonhará.

Ref. Deut. 29:19; Miq. 3:11; João 5:41; Mat. 8:22-23; I João 2:3 e 5:
13; Rom. 5:2, S; II Tim. 4:7-8.

II.Esta certeza não é uma mera persuasão conjectural e


provável, fundada numa falsa esperança, mas uma infalível
segurança da fé, fundada na divina verdade das promessas de
salvação, na evidência interna daquelas graças a que são feitas
essas promessas, no testemunho do Espírito de adoção que
testifica com os nossos espíritos sermos nós filhos de Deus, no
testemunho desse Espírito que é o penhor de nossa herança e
por quem somos selados para o dia da redenção.

Ref. Heb. 6:11, 17-19; I Ped. 1:4-5, 10-11; I João 3:14; Rom.8:15-16;
Ef.1: 13-14, e 4:30; II Cor.1:21-22.

III.Esta segurança infalível não pertence de tal modo à essência


da fé, que um verdadeiro crente, antes de possuí-la, não tenha
de esperar muito e lutar com muitas dificuldades; contudo,
sendo pelo Espírito habilitado a conhecer as coisas que lhe são
livremente dadas por Deus, ele pode alcançá-la sem revelação
extraordinária, no devido uso dos meios ordinários. É, pois,
dever de todo o fiel fazer toda a diligência para tornar certas a
sua vocação e eleição, a fim de que por esse modo seja o seu
154

coração no Espírito Santo confirmado em paz e gozo, em amor e


gratidão para com Deus, em firmeza e alegria nos deveres da
obediência que são os frutos próprios desta segurança. Este
privilégio está, pois, muito longe de predispor os homens à
negligência.

Ref. I João 5:13; I Cor. 2:12; I João 4:13; Heb. 6:11-12; II Ped. 1:10;
Rom. 5:1-2, 5. 14:17, e 15:13; Sal. 119:32; Rom. 6:1-2; Tito 2:11-12,
14; II Cor. 7: 1; Rom. 8: 1; 12; I João 1:6-7, e 3:2-3.

IV.Por diversos modos podem os crentes ter a sua segurança de


salvação abalada, diminuída e interrompida negligenciando a
conservação dela, caindo em algum pecado especial que fira a
consciência e entristeça o Espírito Santo, cedendo a fortes e
repentinas tentações, retirando Deus a luz do seu rosto e
permitindo que andem em trevas e não tenham luz mesmo os
que temem; contudo, eles nunca ficam inteiramente privados
daquela semente de Deus e da vida da fé, daquele amor a Cristo
e aos irmãos, daquela sinceridade de coração e consciência do
dever; dessas bênçãos a certeza de salvação poderá, no tempo
próprio, ser restaurada pela operação do Espírito, e por meio
delas eles são, no entanto, suportados para não caírem no
desespero absoluto.

Ref. Sal. 51: 8, 12, 14; Ef. 4:30; Sal. 77: 1-10, e 31:32; I João 3:9;
Luc. 22:32; Miq. 7:7-9; Jer. 32:40; II Cor. 4:8-10.
155

ANEXO Nº 02

TENTANDO AGRADAR A HOMENS UMA PRÁTICA


CHEIA DE PERIGOS
(George M. Bowman)

Aqueles que estão no Ministério logo descobrem que


podem conseguir grandes e amigáveis respostas as suas
pregações, quando tentam agradar aos homens e mulheres de
suas congregações. A. W. Tozer disse: "Nós que testemunhamos e
proclamamos o Evangelho, não podemos pensar de nós mesmos como
relações públicas enviados para estabelecer a boa vontade entre Cristo
e o mundo".

O número de pregadores, evangelistas, e missionários que


falam prioritariamente para agradar as pessoas tem aumentado
diariamente. Esta prática, no entanto, está cheia de perigos. O
perigo vem quando este esforço de agradar a homens e
mulheres os leva a fazerem uma escolha errada: amando "a
aprovação dos homens ao invés da aprovação de Deus"
(Jo.12:43).

E quando fazem esta escolha errada, correm o risco de


desagradarem a Deus.
156

Em meu julgamento, isto acontece porque eles acreditam


que, fazendo assim, irão conseguir encher suas Igrejas mais
rápido. Mas, norteando-se pelo que suas audiências desejam
ouvir, eles serão obrigados a fazer mudanças que certamente
hão de devastar seus ministérios.

A Bíblia sempre adverte os ministros com relação a agradar


a homens, e os perigos que envolvem os que assim fazem. Você
pode prevenir ou vencer estes problemas em seu ministério,
identificando e evitando estes perigos. .

Esteja alerta em não estabelecer objetivos errados.

1. Buscando respeito - Freqüentemente o desejo do pastor


de ganhar o respeito e a amizade do povo de sua Igreja ou
comunidade é o começo de um ministério que pode desagradar
a Deus. Tendo estabelecido estes objetivos, ele terá que diluir a
sã doutrina que sustenta a verdade bíblica em equilíbrio.

Por exemplo, para agradar aos incrédulos, ele terá que ter
em consideração o que eles gostam e o que não gostam. Isto é
perigoso porque a Bíblia diz que eles amam o pecado e odeiam
a justiça. Eles não têm interesse em um Deus que os chamará a
prestar contas do que têm feito com a vida que Ele Lhes deu.

A fim de ganhar o respeito deles e sua amizade, o pastor


terá que apelar à razão humana, emoções e experiência. Isto
significa que ele terá de dar um "bypass" na autoridade da
Bíblia. O pecador deseja um Deus que ele possa manipular e
157

com o qual possa sentir-se confortável. A fim de agradá-los, o


pastor não poderá pregar sobre o infinito, imutável e santo
Deus da Bíblia.

Esta é a razão por que muitas Igrejas e missões cujas


doutrinas são centradas no homem, têm mudado o conceito
bíblico de Deus num deus limitado, mutável e imperfeito. Deus,
dizem eles, está caminhando para uma maturação ou em
processo de crescimento da mesma forma como os homens
estão. Esta visão, logicamente, leva a condenar a doutrina do
pecado original, a necessidade de expiação, justiça imputada e a
credibilidade de Deus e Sua Palavra.

Em seu livro Batalha dos Deuses, Dr. Robert A. Morey


transcreve Alan Gomes, instrutor de teologia histórica do
Talbot Schoolof Theology, quando diz que estes falsos conceitos
tem penetrado em grupos como Jovens Com uma Missão. Diz
Morey, "Gomes cuidadosamente documenta que líderes da
JOCUM, tais como Roy Elseth e Gordon Olson ensinam que
Deus pode pecar, que não conhece o futuro, não está operando
Seu plano no mundo, que Ele não guarda a Sua Palavra e nem
cumpre as Suas promessas" (pp. 13-14).

É evidente, que os crentes modernos são como muitos


descrentes. Não estão dispostos a ficar para ouvir sermões
sobre todo o conselho de Deus. O seu estilo de vida superficial
os faz sentirem-se desconfortáveis diante do ensino que expõe
158

seus deslizes e hipocrisias, além de mostrar suas tagarelices


como tão malignas como fornicação e assassinato. Eles não
podem tolerar um Evangelho que ordena a crentes, salvos pela
Graça, a negarem-se a si mesmos, tomarem a cruz e a seguirem
a Cristo por um caminho estreito.

Para ganhar o respeito e a amizade deles, o pastor tem que


adocicar a doutrina do Evangelho de Cristo. Ele tem que
transformá-lo num evangelho centrado no homem de
"milagres, curas e riquezas" do "poder do pensamento positivo"
e da "mente que domina a matéria".

2. Buscando decisões fáceis - Um pastor irá tentar


procurar agradar homens e mulheres, quando pensa que seu
poder de persuasão pode produzir um regular crescimento de
novos convertidos. Isto é como usurpar a ação divina que envia
o Seu Espirito para operar, por meio de um avivamento, o
aumento expressivo dos crentes através de genuínas conversões
a Cristo. Se um pastor não pode esperar pelo tempo de Deus em
matéria de avivamento, e deseja obter muitas "decisões fáceis
para Cristo", ele terá que apresentar conversões a Cristo através
de processos espúrios, que não requerem nada mais que uma
mera decisão, sem contemplar as verdadeiras implicações do
que significa seguir a Jesus.

Assim, se ele quer estas decisões fáceis, não poderá


enfatizar todas as verdades do Evangelho bíblico. Não terá
159

coragem de dizer que Deus chama crentes para sofrer, que fé


sem verdadeiro arrependimento não é fé, que um pecador não
poderá ser salvo a menos que confesse Jesus Cristo como seu
Senhor, que fé sem obediência é uma fé fingida. Você não
encontrará "decisionismo" entre pessoas que sabem que Deus
ordena a todos os crentes a "seguirem a santificação sem a qual
ninguém verá ao Senhor" (Heb. 12:l4).

O pastor que desejar conversões fáceis terá que fazer o


Evangelho atrativo para o homem natural, algo que ele possa
gostar neste mundo. Muitos que professam sua fé em Jesus
Cristo hoje não mostram nenhuma mudança na sua maneira de
viver, porque pregadores, evangelistas e missionários, querem
diluir a mensagem a fim de alcançar resultados. Ávidos por
registrarem uma estatística de muitas decisões por Cristo, eles
têm-se afastado do que requer a Palavra de Deus.

3. Buscando grandes audiências - Um dos maiores


problemas do Cristianismo hoje é o grande número de pessoas
não convertidas figurando como membros de Igreja. Se um
pastor busca o aumento do número de membros de sua Igreja
como seu alvo principal, ele terá que utilizar algumas das
técnicas de promooção que os grandes centros de
entretenimentos usam, a fim de atrair pessoas. Alguns fazem
disputas de Escolas Dominicais entre Igrejas. Outros oferecem
prêmios para que as pessoas venham aos cultos. Eu ouvi de
uma Igreja que escondia notas de dez dólares debaixo do
160

assento do ônibus da Igreja, a fim de atrair as crianças e


estimulá-las a virem à Igreja. Usam ainda jantares especiais,
shows modernos, e outras formas de entretenimento. Eu não
encontro esse tipo de "esperteza" no Novo Testamento. As
pessoas que acorriam às reuniões da Igreja primitiva, não
esperavam outra coisa exceto perseguição. Crer em Cristo, no
tempo apostólico, eqüivalia a assinar sua própria sentença de
morte.

Com a diluição da sã doutrina, e a acomodação do


Evangelho ao que as pessoas querem, não é de admirar que
muitas Igrejas estejam cheias de crentes não salvos.

4. Buscando fugir da controvérsia - Os ministros tentam


agradar a homens, procurando fugir da controvérsia. Numa
conversa que eu tive com um líder batista canadense, ele
descreveu um pastor amigo como um "causador de problemas".
Quando eu pedi que me explicasse como um homem de Deus
podia ser classificado como um causador de problemas, ele
disse.. "ele sempre trás à tona questões de controvérsia".

Como alguém pode pregar o Evangelho e evitar questões


de controvérsia? Há um grande conflito entre Deus e os
homens, entre a verdade e o erro, entre o bem e o mal. Se um
pastor deseja evitar toda controvérsia, ele precisa jogar fora sua
Bíblia e dar ao povo uma dieta de sermões adocicados,
designados a agradar ao homem natural.
161

"Eu prego um evangelho positivo!" disse um pastor e


"procuro ficar longe de assuntos polêmicos". Quando
perguntado que assuntos polêmicos ele evitava, então
respondeu: soberania de Deus, eleição incondicional, expiação
limitada e aquelas doutrinas que fazem diferença entre as
denominações.

Um ministro evangélico disse que, para evitar controvérsia,


ele estava disposto a aceitar em sua Igreja pessoas batizadas e
doutrinadas na Igreja Católica Romana.

Cuidado para não perder a aceitação do Senhor

Alguns pastores vêem o agradar aos homens como o


aspecto mais importante de seus ministérios. Um pastor
costumava ir constantemente aos membros de sua igreja, para
perguntar o que eles estavam achando de sua pregação. Ele
estava tão ansioso em agradar as pessoas, que ele queria saber
se eles estavam gostando de seus sermões. Quando alguém,
com sinceridade, mostrava falhas na sua pregação, ele não
podia suportar. Então resignado, deixava o local do culto sem
sequer dar uma palavra de despedida aos membros. Há muita
imaturidade emocional entre aqueles que fazem do agradar a
homens e mulheres a prioridade em seus ministérios.

1. Critério exclusivo - Eu duvido que essa espécie de


pregador seja aceito diante de Deus. Paulo disse que tinha por
162

muita pouca coisa o ser julgado em seu ministério pelo homens.


"O único que me examina" disse ele, "é o Senhor" (l Cor. 4..4).
Devemos usar como meio de avaliação do ministério e conduta
dos homens somente a Palavra de Deus. De outra forma como
saberemos que um pastor tem a aprovação de Deus quanto ao
seu ministério? Não é da aprovação dos homens que o pastor
necessita, mas sim da aprovação de Deus.

2. Trabalhando em vão - Aqueles que fazem como seu alvo


principal agradar a homens enveredam pelo caminho de fazer
com que seus cultos agradem a todos. As pessoas acorrem para
as suas reuniões a fim de serem entretidas pelo humor dos
púlpitos e estórias engraçadas. Eles vêm porque esperam ver
diversão, apresentações dramáticas, ventríloquos, celebridades,
heróis esportistas, personalidades da televisão e as últimas
novidades da música "gospel".

A congregação do pastor que guia seu ministério por tais


métodos de entretenimento, pode vê-los como ministros
poderosos e populares. Porém, tendo assumido esta posição de
tentar agradar as pessoas, eles estarão inevitavelmente na
condição de não aceitos por Deus.

O primeiro objetivo deles deveria ser agradar a Deus,


manifestando a Sua glória. E a não ser que Deus os aceite com o
servos, todo o seu trabalho terá sido em vão. Tudo que eles
fazem, como orações, estudo bíblico, preparação de sermões,
163

pregação, visitação, testemunho e aconselhamento, será vazio


da presença, do poder e da bênção do Senhor.

Fico pensando quantos pastores e ministros têm sempre na


mente que terão que prestar contas diante do trono de Cristo?
Quantos deles estão realmente apercebidos do alto nível de
responsabilidade que têm, não diante dos homens, mas diante
de Deus? Quantos se sentiriam confortáveis com a declaração
que o apóstolo faz: "E por isso que também nos esforçamos quer
presentes, quer ausentes, para lhe ser agradáveis. Porque
importa que todos nós compareçamos perante o tribunal de
Cristo para que cada um receba segundo o bem ou o mal que
tiver feito por meio do corpo" (2 Cor. 5:9-10).

3. Consciência de Deus - Quando um pastor tenta agradar


a homens, ele pode deixar de Ter consciência de Deus. É muito
fácil num ministério popular, procurando agradar as pessoas,
alcançar tal sucesso quer resulte num esquecimento da
onipresença de Deus. A não ser que um pastor esteja
acuradamente cônscio da presença de Deus e O coloca sempre
em primeiro lugar em todos os aspectos do seu ministério e
vida, ele acabará adotando um estilo fútil de raciocínio e
procedimento.

Por exemplo, ele poderá pensar que é mais importante


obter direção da parte dos homens que ele está tentando
agradar do que da parte de Deus e Sua Palavra. Eu não
164

mencionaria isto se não tivesse visto e ouvido ministros


colocarem a opinião de homens a frente da Palavra de Deus.
Como é diferente esse tipo de raciocínio dos apóstolos!

Confrontados por homens que tentaram forçá-los a fazer


sua vontade no ministério, os apóstolos não pensaram, "qual é a
melhor coisa a fazer então?" ou "quais serão as conseqüências se
nos opuser-mos à vontade deles? "Ao contrário, eles
responderam e disseram-lhes: "Julgai se é justo diante de Deus
ouvir-vos antes a vós outros do que a Deus" (At. 4:19). Pouco
depois, quando foram ordenados pelos mesmos homens e
autoridades a pararem de pregar, eles de novo os enfrentaram:
"importa antes obedecer a Deus que aos homens" (At. 5:29).

4. Os testes de Deus - Quando alguém estabelece um


ministério que desagrada a Deus por tentar agradar a homens,
certamente ele se esqueceu que Deus testa seus servos. Não há
parte em nosso ministério ou vida onde possamos deixar de
lado os interesses de Deus e escaparmos impunes. Deus testa as
razões que o Seu povo dá em fazerem o que estão fazendo.
Especialmente isso é verdade para aqueles que estão no
ministério de Sua Igreja. Paulo, o apóstolo, disse que ele e seus
companheiros apóstolos firmaram o propósito de falar ao
homens e mulheres, não para lhes agradar, mas para agradar a
Deus. E a razão que ele dá é que ele sabia que Deus estava
constantemente checando suas motivações. "Nós falamos" dizia
165

ele, "não como quem agrada a homens, mas a Deus que


examina nossos corações" (1 Ts. 2:4).

5. Abandonados por Deus - Curvando-se aos gostos e


desprazeres dos homens; pode um pastor tornar-se um
abandonado de Deus. Se ele se esforça por agradar a homens e
mulheres do mundo; por exemplo; ele pode achar-se, ele
mesmo, tão amigo e identificado com eles que chega a ser um
com eles. O homem de Deus não pode ter esse tipo, de mistura
com as pessoas do mundo, porque a separação do mundo é a
marca do verdadeiro ministro de Cristo. "Não sabeis" pergunta
Tiago, "que a amizade com o mundo se constitui em inimizade
contra Deus?" (Tg. 4:4).

Cuidado para não esquecer que você está numa posição


de confiança

Buscando popularidade com as pessoas, pode o pastor


esquecer-se que Deus lhe confiou um grande tesouro, o Seu
Evangelho da Graça. Em seu ministério apostólico, Paulo nunca
se esqueceu de seu senso pessoal de mordomia. Ele repreendeu
aqueles cristãos que procuravam seus líderes de acordo com
sua popularidade. As pessoas deveriam julgar um ministro, ele
disse, pela sua consciência de despenseiro, que vê como sua
principal responsabilidade o ser fiel a Deus e Sua Palavra. (I
Cor. 4:1-2) Ele também disse que Deus foi condescendente com
166

os homens em permitir que fossem ministros. "Nós fomos


aprovados por Deus, a ponto de nos confiar Ele o Evangelho... "
(1 Ts. 2:4).

1. Hipocrisia e falta de sinceridade - Os ministros de Deus


deveriam ser como Moisés que "permaneceu firme como quem
vê aquele que é invisível"(Heb. 11:27). Seus olhos da fé
deveriam estar sobre o invisível, o reino espiritual de Deus, não
no reino deste mundo. Quando eles rejeitam esta forma de
visão espiritual e começam a olhar para o que é aprazível ao
homem, eles caem no mal contra o qual Paulo os adverte na sua
carta aos Efésios.

Após falar sobre obediência aos pais e mestres, ele diz que
tal obediência deve ser prestada "Não servindo à vista, como
para agradar a homens, mas como servos de Cristo, fazendo de
coração a vontade de Deus" (Ef.6:6). Isto também se aplica ao
ministro. Um pastor não deveria buscar o olhar de aprovação
do povo a quem serve. Isto é tentar fazer seu trabalho "servindo
a vista, como para agradar a homens".

Sua motivação nunca deveria ser o "ser visto" ou o "agradar


a homens". Como servo de Cristo, ele deveria buscar com
sinceridade fazer "de coração a vontade de Deus".

2. Edificação e Lucro - As epístolas do Novo Testamento


têm muito que ensinar sobre a construção do caráter. Os
apóstolos fazem do cultivo do caráter interior do homem ou a
167

construção do caráter cristão a coisa mais importante, e é nisso


que eles gastam a maior parte de suas pregações e escritos. As
únicas razões legítimas e permitidas por eles para agradar aos
homens eram a salvação de pecadores, o cultivo da alma e o
desenvolvimento da personalidade de Cristo neles. Quando um
pastor busca agradar a homens por qualquer outro propósito,
ele trai sua confiança e falha em alimentar e guardar o rebanho
de Deus.

"Portanto cada um de nós agrade ao próximo no que é bom


para a edificação"(Rom.15 :2).

Em seu trabalho evangelístico, os apóstolos também


procuraram agradar aos homens para que os mesmos fossem
beneficiados e, se possível até se convertessem a Cristo. Em
outras palavras no intento de lhes fazer o bem é que se pode
compreender essa atitude deles. Eles não faziam nada para
alimentar os desejos mundanos dos incrédulos. Ao contrário, os
apóstolos procuraram o proveito de todas as pessoas, sem
prejuízo de quem quer que fosse, quer judeus, pagãos ou
cristãos. Paulo explica isto desta maneira:

"Assim como também eu procurei em tudo ser agradável a


todos, não buscando o meu próprio interesse mas o de muitos
para que sejam salvos" (1 Cor.10:33). Mais tarde ele escreve, "Há
muito pensais que nos estamos desculpando convosco. Falamos
168

em Cristo perante Deus, e tudo, ó amados, para vossa


edificação " (2 Co: 12:19).

Cuidado para não perder o senso bíblico dos valores

Os ministros do Novo Testamento sentiam que, se eles


tentassem agradar a homens, eles não poderiam mais ser
considerados servos de Cristo. Um pastor não pode esperar a
sustentação divina em seu ministério, se ele não estiver mais
qualificado como servo do Senhor Jesus Cristo. Como Esaú, ele
trocou uma grande herança por um ganho temporário. Ele
vendeu o dia por causa de uma hora.

1. Cristo, o Modelo - Tão logo um pastor começa a agradar


às pessoas, ele perde sua ligação com o ministério de Cristo. Ele
esquece que o Filho de Deus é o modelo para o seu ministério e
falha em seguir o Seu exemplo. Mateus diz que mesmo os
inimigos de Cristo, embora falassem com sarcasmo, sabiam que
Ele não procurava agradar a homens, mas ensinava as verdades
de Deus, arcando com as conseqüências.

"E enviaram-Ihe discípulos juntamente com os herodianos


para dizer-lhe: Mestre, sabemos que és verdadeiro e que
ensinas o caminho de Deus, de acordo com a verdade, sem te
importares com , quem quer que seja, porque não olhas a
aparência dos homens " (Mat. 22:16).
169

2. Perder a Visão - Quando um pastor desagrada a Deus


por tentar agradar a homens, ele pode se esquecer de que não
pertence a si mesmo, pois foi comprado com preço. Pregando
um Evangelho voltado para resultados e centrado no homem,
pode ser levado para longe de Deus e Sua Verdade Eterna, e
pode ainda diminuir sua percepção do valor de sua própria
redenção. Como o homem que falha em acrescentar elementos
do caráter cristão à sua fé, ele irá perder tanto sua visão
escatológica como histórica.

Tal homem, diz Pedro, "...é cego, vendo só o que está perto
(isto é cegueira escatológica), esquecido da purificação dos seus
pecados de outrora (isto é cegueira histórica) " (2 Pedro 1:9).

3. Comparação de Valores - Agradar aos homens


constantemente pode alterar a habilidade de um ministro de
fazer de um modo correto uma comparação de valores. Paulo
apresenta a redenção como uma grande razão para que nós a
apresentemos diante dos homens.

"Por preço fostes comprados; não s vos torneis escravos dos


homens " (1 Cor.7:23).

4. Alterando a Mensagem - Satisfazendo o interesse dos


homens e mulheres, muitos ministros tem mudado a
mensagem que Cristo lhes ordenou que pregassem. Receosos
de receberem a desaprovação dos incrédulos e cristãos
170

mundanos, eles dizem, com efeito, "Nós não nos atrevemos a


dizer nada que lhes desagrade".

Que diferença dos apóstolos! Diante do mais alto tribunal


de Jerusalém, enfrentando a ameaça de punição e mesmo a
morte, eles confrontaram seus opositores com coragem e
disseram, "Pois não podemos deixar de falar do que temos visto
e ouvido " (At.4:20).
171

ANEXO Nº 03

O PENSAMENTO JESUÍTA: “OS FINS JUSTIFICAM OS


MEIOS”
(Pb. Manoel Canuto)

O Dr. Martin Lloyd-Jones afirma em uma de suas palestras


nas Conferências Puritanas que os jesuítas sempre agiam com
uma filosofia pragmática de que os fins justificam os meios.
Aliás este tem sido o enfoque de Roma há séculos e de fato é
uma tendência do homem natural.

Quando olhamos para o contexto das igrejas evangélicas


hoje, percebemos que isto é algo também vivido e enfocado
implícita ou explicitamente no nosso meio.

Tudo isto é muito grave, pois, com esta prática, subornamos


e nos deixamos subornar por estratégias condenáveis nas
Escrituras as quais Deus considera abomináveis. Isso é aplicável
a algumas igrejas ou lideranças que, no intuito de conseguirem
seus objetivos, usam de artifícios e fecham os olhos a
determinados recursos ilícitos.

Lembro-me que, quando o rei Josafá constituiu juizes sobre


Judá, recomendou que eles julgassem não da parte dos homens,
172

mas de Deus. E disse: “...seja o temor do Senhor convosco; tomai


cuidado, e fazei-o; porque não há no Senhor nosso Deus injustiça, nem
parcialidade, nem aceita suborno” (2 Cr. 19:7). Muitas vezes se
“aceita suborno” para se atingir os fins que se quer. Até
verdades confessionais são omitidas para que se ordenem
pastores para comunidades ditas reformadas.

Tenho conhecimento de igrejas que elegeram presbíteros


que não aceitam a doutrina da predestinação, da expiação
limitada, da depravação total do homem, da cessação dos dons
extraordinários (dom de apóstolo, dom de profetas, dom de
variedade e línguas, dons de realizar milagres), a suficiência
das Escrituras, que não aceitam batismo de criança, apenas por
necessitarem de elementos para compor o número de
presbíteros. Presbíteros que não são presbiterianos. O mesmo se
aplica para pastores. Sei de igrejas que ordenaram pastores
batistas (não reformados) e pentecostais para assumirem o
pastorado de igrejas presbiterianas. O que eles vão ensinar ao
rebanho? O que a igreja aprenderá com estes pastores? Qual a
coerência nesta atitude? Infelizmente está caracterizada o
pragmatismo jesuíta, a falta de zelo pelas verdades bíblicas e o
amor pelo rebanho. Está em jogo os “fins” sem importar os
“meios”.

Estive conversando com determinado ministro reformado


sobre o fato de que alguns pastores que se dizem
presbiterianos, afirmarem categoricamente com um “sim”
173

público, no dia da sua ordenação, ao serem confrontados com a


pergunta constitucional: “Recebeis e adotais sinceramente a
Confissão de Fé e os Catecismos desta Igreja (Westminster), como fiel
exposição do sistema de doutrina, ensinado nas Escrituras?” Eles
respondem: “Recebo, sim, senhor”! E quando dizem “SIM”,
estão apoiando afirmações como estas. “Isto torna a Escritura
Sagrada indispensável, tendo cessado aqueles antigos modos de
Deus revelar a sua vontade ao seu povo“...Todo conselho de Deus
concernente a todas as coisas necessárias para a glória dele e para a
salvação, fé e vida do homem, ou é expressamente declarado na
Escritura ou pode ser lógica e claramente deduzido dela. À Escritura
nada se acrescentará em tempo algum nem por novas
revelações do Espírito, nem por tradições dos homens”.
(Confissão de Fé de Westminster cap.I.I.VI)

Mas, na prática, por posições pragmáticas, interesses


pessoais ou certas ofertas (“suborno”), negam o que
“sinceramente” e positivamente responderam. O pior é que,
antes de serem feitas as perguntas constitucionais, na ocasião
da ordenação, algumas instruções são dadas aos ordenandos e
que são incluídas como algo a ser aceito (é bom dizer que estas
instruções são baseadas na própria Confissão de Fé de
Westminster) e por isso, devem também receber o “sim” do
candidato: “...Ele que é Rei e Cabeça da Igreja, havendo subido ao
alto e recebido dons para os homens, dotou a Igreja com oficiais
extraordinários e permanentes, para reuni-la e edificá-la. Os apóstolos,
174

os profetas e os que possuíam o dom de línguas, de curar e fazer


milagres, foram oficiais extraordinários empregados a princípio por
nosso Senhor e Salvador para reunir seu povo de entre as nações,
conduzindo-o à família da fé. Esses oficiais e dotes miraculosos
cessaram há muito tempo”.

Reconheço que muitos pastores não se enquadram neste


raciocínio. Quero ser honesto com estes. Quando são ordenados
dizendo “sim” à Confissão de Fé de Westminster e Catecismos
e às instruções de ordenação de ministros, que afirmam
explicitamente a cessação dos dons extraordinários, o fazem
sem atentar para as implicações da sua afirmação. Outros
acham que a existência de uma Confissão de Fé é irrelevante e
assim fazem afirmações insinceras e contraditórias como o
“sim” que pronunciaram na ocasião da ordenação. É verdade
que alguns, depois do ato de ordenação, mudam de
pensamento e convicções. Isso é possível, mas não menos
estranho. No entanto a situação continuará sempre
contraditória, pois estes pastores labutam em uma igreja
confessional mas sem concordarem com a Confissão de Fé que
a igreja considera ser baseada na própria Palavra e uma fiel
exposição escriturística. Alguns mais arrojados e pretensiosos
(mas coerentes por discordarem da mesma) defendem
mudanças na Confissão de Fé de Westminster e nos
Catecismos. Diante disso, as perguntas obrigatórias são: O que
mudar? Quem irá mudar? Como mudar sem ferir as Escrituras?
175

Como mudar certas afirmações sem ter de mudar outros pontos


que a elas estão entrelaçados? Isto me faz lembrar um
pensamento puritano que dizia: “É fácil dizer uma mentira;
difícil é dizer só uma mentira”. Diria eu: “É fácil mudar uma
afirmação da Confissão de Fé de Westminster (seria?), difícil é
fazer só uma mudança”.

Pessoalmente creio que este é um tempo em que a


Confissão de Fé de Westminster é de extrema necessidade para
a Igreja Presbiteriana do Brasil porque:

1) Há uma necessidade de Unidade doutrinária baseada


na Verdade.

2) Para termos uma forte defesa contra outros


paradigmas baseados em tradições religiosas humanas.

3) Para termos armas para defesa contra inimigos


teológicos.

4) Vivemos uma época de indefinição doutrinária na


Igreja Presbiteriana.

5) Muitos pastores e líderes estão trilhando o caminho


pragmático do experencialismo. As experiências é que ditam as
doutrinas e não o inverso. A experiência é que tem sido “a regra
de fé e prática”. Certo professor, ao ensinar a cessação do dom
de “variedade de línguas” (1 Co 12:10; 1 Co 13), defendido pela
Confissão de Fé (“tendo cessado aqueles antigos modos de Deus
revelar sua vontade...nada se acrescentará em tempo algum, nem por
176

novas revelações do Espírito”) e nas instruções no Manual de


Culto Presbiteriano, na página 70, ouviu de um aluno a
seguinte argumentação: “Não professor, o dom de falar línguas
não cessou porque minha noiva fala” (É bom que se diga que o
que ela emitia era sons ininteligíveis que não têm interpretação,
nem podem ter).

6) O pluralismo religioso invadiu nosso “arraial


presbiteriano”. Não mais há uma verdade a ser aceita e
ensinada. Todos são donos da verdade, ou seja, todos têm a sua
verdade. Aliás, ouço com freqüência pastores dizerem:
“Ninguém é dono da verdade”! Acham que estão dizendo uma
grande coisa. Indago destes “humildes sábios”: Você quando
sobe ao púlpito diz ao seu rebanho: “Irmãos, o que vou dizer
aqui é apenas o que acho ser a verdade. Mas talvez esteja
errado e até acho que existem outras verdades. Depende da
forma como cada um faz sua interpretação ou depende de
certas culturas onde se vive. De modo que, vocês façam suas
apreciações e decidam o que aceitar, porque não sou dono da
verdade, apenas pode ser que seja verdade”; teria coragem de
dizer isso?.

7) Não temos pureza doutrinária. A influência


arminiana, dispensacionalista, pentecostal, mística, tem trazido
impurezas ao nosso meio. Um dos meios de se defender a fé (Fl.
1:27) é pela Confissão de Fé. Nossa fé deve ser confessada.
177

8) A idéia de que só a Bíblia deve ser regra de fé e


prática. Isto é verdade, e é exatamente o que a Confissão de Fé
exige e afirma. Mas muitos têm feito esta afirmação dizendo
combater uma “ortodoxia morta” e doutrinas que não têm base
bíblica. Nada mais equivocado, pois os que formularam a
Confissão de Fé foram homens de extremada piedade
(puritanos) e profundo conhecimento bíblico. O problema é que
muitos são influenciados pelo pós-modernismo que afirma que
as crenças do passado foram condicionadas pela cultura da
época que as produziu e por isso não serve para nós hoje.
Assim, surgiu a idéia falsa de que se pode ser piedoso e sincero
sem doutrina, sem um corpo teológico formulado
sistematicamente. Chegam a pensar que doutrina são meras
palavras e que servem apenas para dividir ou não têm aplicação
prática. Já ouvi de pastores afirmações como esta:
“Agradecemos muito a Calvino e todos os reformadores; as
doutrinas da Reforma foram importantes para aquela época,
mas temos de ficar é com a Bíblia” (Como se a “batalha” da
Reforma não fosse fundamentada na Bíblia). Se é assim, não
podemos fugir daquele ensino que a Reforma mais resgatou;
temos de ficar com o princípio Reformado: Sola Scriptura. O
problema destes líderes é que não querem ficar só com as
Escrituras. Querem novas revelações (profecias, mesmo que
falhas, e línguas, mesmo que ininteligíveis, que em nada
edificam - e não podem edificar). O nosso problema hoje é um
178

problema de falta de fé, não de falta de fé em Cristo, mas de fé


nas Escrituras, elas não são mais suficientes. Isso acaba sendo
um insulto a Cristo.

Se você não concorda com a Confissão de Fé em todas as


suas partes, quero dar duas sugestões, uma grave e radical,
apesar de coerente e outra menos radical mas não menos
coerente.

1. Primeira sugestão: Abandonar a Igreja Presbiteriana


do Brasil e não semear revolta contra nossa posição oficial,
contra um documento que tem trazido tantos benefícios à Igreja
(Não quero ser divisionista; estou falando de coerência e espero
que isso nunca aconteça e sim que retroceda às verdades
confessionais e bíblicas).

2. Segunda sugestão: Não ensinar nada contrário


àqueles pontos doutrinários em que tem dificuldade de
aceitação ou que discorda frontalmente. Falo de não ensinar
coisas contrárias à Confissão de Fé, nem de púlpito, nem de
forma particular, nem por qualquer material escrito. Mesmo
sabendo que agindo assim roubará do rebanho o ensino de todo
desígnio de Deus, o que Paulo não fez (Atos 20:27). Saiba que as
ovelhas sempre estarão famintas por não se oferecer o seu
alimento de que carecem para crescer. Deve também revelar
esta sua dificuldade com a Confissão de Fé no seu presbitério e
aceitar o julgamento dos membros conciliares e qualquer
179

penalidade que porventura seja aplicada em vista de suas


discordâncias. Seja ético, coerente e corajoso.

Digo tudo isso em virtude dos problemas que vejo na Igreja


Presbiteriana do Brasil e ratifico minha posição de que a
Unidade na Igreja e a necessidade de um grande despertamento
espiritual, passam pela verdade da Palavra, doutra sorte poderá
ser apenas uma caricatura de unidade e avivamento.

O argumento de que precisamos ver a intenção destes


ordenandos, que é boa e necessária para a igreja, não justifica
ou isenta do erro. Deus não quer apenas bem intencionados,
mas pessoas que vivam a verdade e sejam obedientes à Palavra
a todo custo, caso contrário, Jesus teria aprovado o jovem rico.
Mas isso não ocorreu!

A verdade é que estes “ordenandos” nem concordam com a


Confissão de Fé de Westminster e muito menos com a cessação
dos dons extraordinários (bem explicitada nesta instrução do
Manual de Culto e na própria Confissão de Fé). Dessa forma o
pragmatismo e os interesses pessoais, a ordenação (os fins) têm
justificado os meios (“o suborno”). Algumas vezes é feito o que
se fez com Finney quando o seu presbitério o examinou para
que recebesse licença para pregar. Duas coisas ocorreram:
Primeiro os examinadores evitaram fazer perguntas que
colidissem com os pensamentos teológicos de Finney. Segundo,
um dos examinadores teve a coragem de perguntar se Finney
180

aceitava a Confissão de Fé de Westminster. A resposta de


Finney foi positiva sem nunca ter lido tal Confissão. Quando a
leu, posteriormente, disse que aquela Confissão era “um Papa
de papel”. Finney, em seus pensamentos teológicos chegava a
ser, em determinados pontos (era contra a doutrina do pecado
original), mais falho do que os ensinos de Roma.

Finney parece ter sido o primeiro evangelista, pelo menos


de grande influência, a sugerir que, de fato, os fins justificam os
meios. Finney justificava as suas “novas medidas” pelo número
de pessoas que o ouviam e “vinham à frente” (foi o inventor do
apelo para decisão) nas suas campanhas evangelísticas. Finney
encorajou os jovens pregadores a “serem improvisadores,
anedóticos...menos doutrinários” e defendia que toda forma de
emoção deveria ser usada para despertar os valores morais
adormecidos do homem e assim se “decidirem” por Cristo.

O aparente sucesso de Finney afinal se revelou como um


grande desastre. Um de seus obreiros vendo o resultado dos
seus “avivamentos” disse: “Qual a situação dessas regiões três
meses após sairmos dali? ...voltei gemendo em meu espírito ao
contemplar o estado triste, frígido, carnal e contencioso em que
as igrejas caíram e mergulharam logo após nossa primeira saída
do meio deles”.

Finney ficou muito desanimado com o fracasso dos seus


métodos e chegou a dizer: “Os convertidos do meu avivamento
181

são uma desgraça para o cristianismo”. Disse mais: “Com


freqüência fui instrumento para trazer cristãos a uma profunda
convicção e a um estado temporário de arrependimento e fé...
[mas] deixei de instar-lhes a se tornarem familiarizados com
Cristo, e assim permanecerem nEle; por isso, logo recaíam ao
seu estado anterior”.

O legado de Finney trouxe inumeráveis e grande males


práticos que estão invadindo a igreja em todos os lugares. Seus
pensamentos e ensinos foram um desastre para a teologia
evangélica de hoje. Hoje a igreja ainda sofre dos males
advindos do pragmatismo de Finney e dos jesuítas: os fins
justificam os meios.

Deus nos socorra nesta hora difícil que vive a igreja


brasileira.
182

ANEXO Nº 04

DISCÍPULOS OU CONSUMIDORES?
(Augustus Nicodemus Lopes)

A palavra "evangélicos" tem se tomado tão inclusiva que corre o


perigo,
de se tornar totalmente vazia de significado - R. C. Sproul.

Em certa ocasião o Senhor Jesus teve de fazer uma escolha


entre ter cinco mil pessoas que o seguiam por causa dos
benefícios que poderiam obter dele, ou ter doze seguidores
leais, que o seguiam pelo motivo certo. Uma decisão entre
muitos consumidores e poucos fiéis discípulos. Refiro-me à
multiplicação dos pães narrada em João, 6. Lemos que a
multidão, extasiada com o milagre, quis proclamar Jesus como
rei, mas Ele recusou-se (João 6.15). No dia seguinte, Jesus
também se recusa a fazer mais milagres diante da multidão pois
percebe que o estão seguindo por causa dos pães que comeram
(Jo 6.26,30). Sua palavra acerca do pão da vida afugenta quase
todos da multidão (Jo 6.60,66), à exceção dos doze discípulos,
183

que afirmam segui-lo por saber que Ele é o Salvador, o que tem
as palavras de vida eterna (Jo 6.67-69).

Jesus poderia ter satisfeito as necessidades da multidão e


saciado o desejo dela de ter mais milagres, sinais e pão. Teria
sido feito rei e teria o povo ao seu lado. Mas o Senhor preferiu
ter um punhado de pessoas que o seguiam pelos motivos certos
a ter uma vasta multidão que o fazia por motivos errados.
Preferiu discípulos a consumidores.

Síndrome da porta giratória

Infelizmente, parece prevalecer entre os evangélicos em


nossos dias uma mentalidade bem semelhante à da multidão
nos dias de Jesus. Muitos, influenciados pela febre de consumir
(inclusive coisas supérfluas), que vem crescendo nas sociedades
capitalistas, tem assumido uma postura de consumidores
quando se trata das coisas do Reino de Deus. O consumismo
encontrou a porta da igreja evangélica. Tem entrado com toda a
força, e parece ter vindo para ficar.

Por consumismo quero dizer o impulso de satisfazer as


necessidades, reais ou não, pelo uso de bens ou serviços
prestados por outrem. No consumismo, as necessidades
individuais são o centro; e a "escolha" das pessoas, o mais
respeitado de seus direitos. Tudo gira em torno do indivíduo, e
184

tudo existe para satisfazer as suas necessidades. As coisas


ganham importância, validade e relevância à medida em que
são capazes de atender estas necessidades.

Esta mentalidade tem permeado, em grande medida, as


programações das igrejas, a forma e o conteúdo das pregações,
a escolha das músicas, o tipo de liturgia, e as estratégias para
crescimento de comunidades locais. Tudo é feito com o objetivo
de satisfazer as necessidades emocionais, físicas e materiais das
pessoas. E, neste afã, prevalece o fim sobre os meios. Métodos
são justificados à medida em que se prestam para atrair mais
freqüentadores, e torná-los mais felizes, mais alegres, mais
satisfeitos, e dispostos a continuar freqüentando as igrejas.

Numa pesquisa recente feita Instituto Gallup nos Estados


constatou-se que quatro a cada dez americanos estão
envolvidos em pequenos grupos que se reúnem semanalmente,
buscando saída para o envolvimento com drogas, problemas
familiares, solidão e isolacionismo. Embora evidente muitos
estarão em busca de uma oportunidade para aprofundar a
experiência cristã e crescer no conhecimento de Deus, a maioria,
segundo Gallup, busca satisfazer suas necessidades pessoais.
De acordo com a revista Newsweek, um em cada cinco
americanos sofre de alguma forma de doença mental (incluindo
ansiedade, depressão clínica, esquizofrenia( etc) durante o
curso de um ano. Discordo que todas estas coisas sejam
185

problemas mentais; muita coisa tem a ver com os efeitos do


pecado na consciência. De qualquer forma, os espertos se
aproveitam de estatísticas assim. Uma denúncia contra a
indústria evangélica de saúde mental foi feita no ano passado
por Steve Rabey em Christianity Today.

Cada vez mais cresce o Marketing nas igrejas na área de


aconselhamento, com um número alarmante de profissionais
cristãos oferecendo ajuda psicológica através de métodos
seculares. A indústria de música cristã tem crescido
assustadoramente, abandonando por vez seu propósito inicial
de difundir o Evangelho e tornando-se cada vez mais um
mercado rentável como outro qualquer. A maioria das
gravadoras evangélicas nos estados Unidos pertence a
corporações seculares de entretenimento. As estrelas do gospel
music cobram caches altíssimos para suas apresentações. Num
recente artigo em Strategies for Today’s Leader, Gary McIntosh
defende abertamente que "o negócio das igrejas é servir ao
povo". Ele defende que a igreja deve ter uma mentalidade
voltada para o "cliente", e traçar seus planos e estratégias
visando suas necessidades básicas, e especialmente fazelos
sentir-se bem.

Um efeito da mentalidade consumista das igrejas é o que


tem sido chamado de "a síndrome da porta giratória". As igrejas
estão repletas de pessoas buscando sentido para a vida, alívio
186

para suas ansiedades e preocupações, ou simplesmente


diversão e entretenimento evangélicos; muitas delas estão
simplesmente passeando pelas igrejas, como quem passeia
pelas lojas de um shopping center, escolhendo produtos que lhe
agradem. Assim, elas escolhem igrejas como escolhem
refrigerantes. Tão logo a igreja que freqüentam deixa de
satisfazer as suas necessidades, elas saem pela porta tão,
facilmente quanto entraram. As pessoas escolhem igrejas onde
se sintam confortáveis, e se esquecem de que precisam na
verdade de uma igreja que as faça crescer em Cristo e no amor
para com os outros.

Finney e a mentalidade consumista

Ao meu ver, um dos mais decisivos fatores para o


surgimento da mentalidade consumista na igreja evangélica é a
influência da teologia e dos métodos de Charles G. Finney.
Houve uma profunda mudança no conceito de evangelização
ocorrida no século passado, devido ao trabalho de Charles
Finney. Mais do que a teologia do próprio Karl Barth, a teologia
e os métodos de Finney tem, moldado o moderno
evangelicalismo. Ele é o herói de Bill Bright e de Billy Graham;
é o celebrado campeão de Keith Green, do "movimento de
sinais e prodígios", do movimento neopentecostal e do
movimento de crescimento da igreja.
187

Para muitos no Brasil seria uma surpresa tomar


conhecimento do pensamento teológico de Finney. Ele é tido
como um dos grandes evangelistas da Igreja Crista, estimado e
venerado como modelo de fé e vida. E não poderia ser
diferente, visto que se tem publicado no Brasil apenas obras que
exaltam Finney, sem qualquer crítica à sua teologia e à sua
metodologia. Meu alvo, neste artigo, não é escrever
extensamente sobre o assunto, mas mostrar a relação de causa e
efeito que existe entre o ensino e métodos de Finney e a
mentalidade consumista dos evangélicos hoje.

Em sua obra de teologia sistemática (Sistematic Teology


[Bethany, 1976]), escrita no final de seu ministério, quando era
professor do seminário de Oberlin, Finney abraça ensinos
estranhos ao Cristianismo histórico. Ele ensina que a perfeição
moral é condição para justificação, e que ninguém poderá ser
justificado de seus pecados enquanto tiver pecado em si (p. 57);
afirma que o verdadeiro cristão perde sua justificação (e
consequentemente, a salvação) toda vez que peca (p. 46);
demonstra que não acredita em pecado original e nem na
depravação inerente ao ser humano (p. 179); afirma que o
homem é perfeitamente capaz de aceitar por si mesmo, sem a
ajuda do Espírito Santo, a oferta do Evangelho. Mais
surpreendente ainda, Finney nega que Cristo morreu para
pagar os pecados de alguém; ele havia morrido com um
propósito, o de reafirmar o governo moral de Deus, e nos dar o
188

exemplo de como agradar a Deus (pp. 206-217). Finney nega


ainda, de forma veemente, a imputação dos méritos de Cristo
ao pecador, e rejeita a idéia da justificação com base na obra de
Cristo cm lugar dos pecadores (pp. 320-333). Quanto à aplicação
da redenção, Finney nega a idéia de que o novo nascimento é
um milagre operado sobrenaturalmente por Deus na alma
humana. Para ele, "regeneração consiste em o pecador mudar
sua escolha última, sua intenção e suas preferências; ou ainda,
mudar do egoísmo para o amor e a benevolência", e tudo isto
movido pela influência moral do exemplo de Cristo ao morrer
na cruz (p. 224).

Finney, reagindo contra a influência calvinista que


predominava no Grande Avivamento ocorrido na Nova
Inglaterra do século passado, trocou a ênfase que havia à
pregação doutrinária pela ênfase em fazer com que as pessoas
"tomassem uma decisão", ou que fizessem uma escolha. No
prefácio da sua Systematic Theology, ele declara a base da sua
metodologia: "Um reavivamento não é um milagre ou não
depende de um milagre, em qualquer sentido. É meramente o
resultado filosófico da aplicação correta dos métodos."

Finney não estava descobrindo uma nova verdade, mas


abraçando um erro antigo, defendido por Pelágio no Século IV,
que foi condenado como herético pela Igreja. Ele tem sido
corretamente descrito por estudiosos evangélicos como sendo
189

semi-pelagiano (ou mesmo, pelagiano) em sua doutrina, e um


dos maiores responsáveis pela disseminação deste erro antigo
entre as igrejas modernas.

Na teologia de Finney, Deus não é soberano, o homem não


é um pecador por natureza, a expiação de Cristo não é um
pagamento válido pelo pecado, a doutrina da justificação pela
imputação é insultante à razão e à moralidade, o novo
nascimento e produzido simplesmente por técnicas bem
sucedidas, e o avivamento é resultado de campanhas bem
planejadas com os métodos conceitos.

Antes de Finney, os evangelistas reformados aguardavam


sinais ou evidências da operação do Espírito Santo nos
pecadores, trazendo-os debaixo de convicção de pecado, para
então guiá-los a Cristo. Não colocavam pressão sobre a vontade
dos pecadores por meios psicológicos, com receio de produzir
falsas conversões. Finney, porém, seguiu caminho oposto, e seu
caminho prevaleceu. Já que acreditava na capacidade inerente
da vontade humana de tomar decisões espirituais quando o
desejasse, suas campanhas de evangelismo e de reavivamento
passaram a girar em torno de um simples propósito: levar os
pecadores a fazer uma escolha imediata de seguir a Cristo. Com
isso, introduziu novos métodos nos seus cultos, como o "banco
dos ansiosos" (de onde veio a prática moderna de se fazer
apelos por uma decisão imediata ao final da mensagem), o uso
190

de quaisquer medidas que provocassem um estado emocional


propício ao pecador para escolher a Deus, o que incluía apelos
emocionais e denúncias terríveis de pecado e do juízo.

O impacto dos métodos reavivalistas de Finney no


evangelicalismo moderno são tremendos. Seus sucessores têm
perpetuado esses métodos e mantido as características do
fundador: o apelo por decisões imediatas, baseadas na vontade
humana; o estímulo das emoções como alvo do culto; o
desprezo pela doutrina; e a ênfase que se dá na pregação a se
fazer uma escolha, em vez da ênfase às grandes doutrinas da
graça. As igrejas evangélicas de hoje, influenciadas pela
teologia e pelos métodos de Finney, têm adotado táticas e
práticas em que as pessoas são vistas como clientes,
promovendo a mentalidade consumista.

O Senhor Jesus preferiu doze seguidores genuínos a uma


multidão de consumidores. É preciso reconhecer que as
tendências modernas em alguns quartéis evangélicos é a de
produzir consumidores, muito mais que reais discípulos de
Cristo, pela forma de culto, liturgias, atrações, e eventos que
promovem. Um retorno às antigas doutrinas da graça, pregadas
pelos apóstolos e pelos reformadores, enfatizando a busca da
glória de Deus como alvo maior do homem, poderá melhorar
esse estado de coisas.
191

ANEXO Nº 05

APASCENTANDO OVELHA OU ENTRETENDO BODE


(C.H. Spurgeon)

Um mal acontece no arraial professo do Senhor, tão


flagrante na sua impudência, que até o menos perspicaz
dificilmente falharia em notá-lo. Este mal evoluiu numa
proporção anormal, mesmo para o erro, no decurso de alguns
anos. Ele tem agido como fermento até que a massa toda
levede.

O demônio raramente fez algo tão engenhoso, quanto


insinuar à Igreja que parte da sua missão é prover
entretenimento para o povo, visando alcançá-los. De anunciar
em alta voz, como fizeram os puritanos, a Igreja, gradualmente,
baixou o tom do seu testemunho e também tolerou e desculpou
as leviandades da época. Depois, ela as consentiu em suas
fronteiras. Agora, ela as adota sob o pretexto de alcançar as
massas.

Meu primeiro argumento é que prover entretenimento ao


povo, em nenhum lugar das Escrituras, é mencionado como
192

uma função da Igreja. Se fosse obrigação da Igreja, porque


Cristo não falaria dele? "Ide por todo o mundo e pregai o
evangelho a toda criatura" (Lc.16:15). Isto é suficientemente
claro. Assim também seria, se Ele adicionasse "e provejam
divertimento para aqueles que não tem prazer no evangelho".
Tais palavras, entretanto, não são encontradas. Nem parecem
ocorrer-Lhe.

Em outra passagem encontramos: "E Ele mesmo concedeu


uns para apóstolos, outros para profetas, outros para
evangelistas e outros para pastores e mestres"(Ef.4:11). Onde
entram os animadores? O Espírito Santo silencia, no que se
refere a eles. Os profetas foram perseguidos por agradar as
pessoas ou por oporem-se a elas?

Em segundo lugar, prover distração está em direto


antagonismo ao ensino e vida de Cristo e seus apóstolos. Qual
era a posição da Igreja para com o mundo? "Vós sois o sal da
terra" (Mt.5:13), não o doce açúcar – algo que o mundo irá
cuspir, não engolir. Curta e pungente foi a expressão: "Deixa
aos mortos o sepultar os seus próprios mortos"(Mt.8:22). Que
seriedade impressionante!

Cristo poderia ter sido mais popular, se tivesse introduzido


mais brilho e elementos agradáveis a sua missão, quando as
pessoas O deixaram por causa da natureza inquiridora do seu
ensino. Porém, eu não O escuto dizer: "Corre atrás deste povo
193

Pedro, e diga-lhes que teremos um estilo diferente de culto


amanhã; algo curto e atrativo, com uma pregação bem pequena.
Teremos uma noite agradável para eles. Diga-lhes que, por
certo, gostarão. Seja rápido, Pedro, nós devemos alcançá-los de
qualquer jeito!".

Jesus compadeceu-se dos pecadores, lamentou e chorou por


eles, mas nunca pretendeu entretê-los.

Em vão as epístolas serão examinadas com o objetivo de


achar nelas qualquer traço do evangelho do deleite. A
mensagem que elas contêm é: "Saia, afaste-se, mantenha-se
afastado!"

Eles tinham enorme confiança no evangelho e não


empregavam outra arma.

Depois que Pedro e João foram presos por pregar o


evangelho, a Igreja reuniu-se em oração, mas não oraram:
"Senhor, permite-nos que pelo sábio e judicioso uso da
recreação inocente, possamos mostrar a este povo quão felizes
nós somos". Dispersados pela perseguição, eles iam por todo
mundo pregando o evangelho. Eles "viraram o mundo de
cabeça para baixo". Esta é a única diferença! Senhor, limpe a tua
Igreja de toda futilidade e entulho que o diabo impôs sobre ela
e traze-a de volta aos métodos apostólicos.

Por fim, a missão do entretenimento falha em realizar o


objetivo a que se propõe. Ela produz destruição entre os jovens
194

convertidos. Permite aos negligentes e zombadores, que


agradecem a Deus porque a Igreja os recebeu no meio do
caminho, falar e testificar! Permite que os sobrecarregados, que
encontraram "paz" através de um concerto, não fiquem calados!
Permite que o bêbado, para quem o entretenimento comovente
tenha sido o elo de Deus no encadeamento de sua conversão,
fique em pé! Não há contestação. A missão de entretenimento
não produz convertidos.

O que os pastores precisam hoje, é crer no conhecimento


aliado a espiritualidade sincera; um jorrando do outro, como
fruto da raiz. Necessitam de doutrina bíblica, de tal forma
entendida e experimentada que ponham os homens em chamas.
195

ANEXO Nº 06

O CUSTO DE SEGUIR A CRISTO


(J.C.Ryle)
Pois qual de vós, pretendendo construir uma torre, não se assenta
primeiro para calcular a despesa e verificar se tem os meios para
concluir? Lc 14: 28
 

INTRODUÇÃO:
Já se falou muito sobre a necessidade do cristão de ser
santo. É uma verdade indiscutível que o genuíno cristão deve
buscar a santidade, sem a qual não verá o Senhor (Hb 12: 14b).
Aliás, as palavras "santo" e "santidade" são ditas com tanta
freqüência e displicência no seio da Igreja que chegaram ao
ponto de ser um chavão, pertencente ao "evangeliquês" que
domina as igrejas cristã-evangélicas de nosso dias. Já passam
desapercebidas.

Mesmo o fraco apelo para a busca da santidade já não surte


tanto efeito, pois o "ser santo" ganhou contornos vagos, quase
esotéricos, um ideal que contemplamos à distância, pertencente
ao passado. Não é a toa que as igrejas estão cada vez mais
cheias de pessoas e menos de cristãos genuínos. A santidade
deixou de ser uma realidade, passou a ser uma fantasia. Não é
196

mais um objetivo a ser atingido, mas um ideal a ser


contemplado passivamente. Não é a norma que pauta a
conduta moral e espiritual do cristão, mas apenas um título que
lhe é outorgado no momento que passa a ser membro de uma
igreja.

Há muito tempo atrás o Bp. Ryle, em seu livro "Santidade",-


e muito do que vou falar hoje aprendi com este homem de
Deus, e está melhor escrito em seu livro - escreveu que "Vivemos
em uma época de intensa profissão religiosa,... . No entanto, nada é
mais comum do que ver as pessoas receberem a Palavra de Deus com
satisfação, para então, depois de algum tempo, retornarem ao mundo e
aos seus pecados". Hoje eu diria que as pessoas não retornam
mais ao mundo com seus pecados, mas permanecem na igreja
com eles, sem terem experimentado a verdadeira transformação
espiritual, o novo nascimento.

Por que? Por que tantos buscam no cristianismo uma


resposta para seus anseios e não as encontram? E se as
encontram, por que não perseveram? Uma parte da resposta
pode ser encontrada no versículo acima (Lc 14:28): as pessoas
que lotam templos evangélicos simplesmente não param para
calcular o preço que custa assumir com coerência a vida cristã.

É muito bom encontrarmos cristãos cujo desejo do coração é


uma vida santa aos olhos de Deus. Melhor ainda é quando os
encontramos calculando o devido preço que deverão arcar ao
197

buscarem este estilo de vida (que por sinal não é estilo, é uma
necessidade para o cristão genuíno). Cristo nos assegurou que,
se O seguíssemos teríamos nossas necessidades básicas
satisfeitas (Mt 6:33) e no mundo porvir a vida eterna (Mc 10:30),
mas também nos alertou que o caminho é apertado e estreita a
porta que conduz a salvação (Mt 7:13,14). É insensatez fazer de
conta que estas palavras não são dirigidas a nós cristãos. Se
desejamos a coroa da vida (Ap 2:10) devemos estar prontos
para a cruz. Não há coroa sem cruz.

No texto de Lucas, a ilustração do homem que, antes de


construir se assenta primeiro a calcular os custos para ver se
poderá terminar a obra, foi proferida, por Jesus, a uma
multidão que O acompanhavam, provavelmente a mesma que
ouviu a parábola da ceia (vs 15-24) (onde o Senhor deixou claro
que muitos foram convidados, e recusaram. Todavia alguns
realmente se dispuseram a aceitar o convite e esses provaram
da ceia do Senhor). No vs. 26, ao voltar-se para a multidão,
Jesus ensina que ninguém poderá de fato segui-lO se seu
coração estiver voltado primeiramente para outros objetivos.
Até mesmo a família deve estar em posição secundária no que
diz respeito a devoção. No vs. 27 o discípulo é aquele que
tomou a sua cruz e foi atrás de Jesus. E logo em seguida, Ele os
animou a calcular o preço de seguí-lO.
198

Jesus não considerou aquelas pessoas como seus discípulos


meramente porque elas o acompanhavam. Também não baixou
as exigências para a entrada no Reino simplesmente porque
aquelas pessoas aparentavam devoção. Antes reafirmou que o
discípulo é aquele que renuncia a tudo quanto tem e O segue
(vs. 33). Em outras palavras, Jesus estava ensinando que há um
custo em ser discípulo, e que devemos refletir se estamos
dispostos a arcar com esta obra.

Vejamos quanto custa ao cristão ser santo, e depois


reflitamos se estamos dispostos a arcar com os custos ou apenas
nos enganando a nós mesmos.

I. Quanto Custa Ser um Cristão Verdadeiro e Coerente com


sua Fé?

Antes de mais nada, quero deixar claro que não estou


ensinando que devemos pagar pela nossa salvação. Nada
podemos dar em troca que possa pagar os nossos pecados
perante Deus. Esse preço já foi pago, e custou nada menos que
o sangue do próprio Filho de Deus (I Co 6:20). A pergunta não
é o que devo pagar para obter a salvação, mas sim o que vai me
custar o fato de ser um salvo verdadeiro. A primeira indagação
está centrada na causa da salvação, e esta já foi provida por
Cristo, a segunda nas conseqüências da salvação, ou seja, o que
199

o salvo deve estar disposto a abandonar caso realmente queira


seguir a Jesus. Há um custo, qual? Eis uma das questões
importantes que devem ser respondidas por toda criatura que
sinceramente deseja seguir a Jesus.

Outro fato que merece explicação antecipada é sobre a


aparência. Aquela multidão que acompanhava a Jesus não era
composta somente de discípulos verdadeiros, ainda que um
observador externo pudesse assim o achar. Aparentavam
serem, mas não eram. Custa muito pouco para alguém manter a
aparência de cristão: basta um palavreado um pouco diferente,
duas ou três idas na igreja durante a semana, e uma atitude
moral externa que levante a aprovação das pessoas mais
próximas, em especial as da igreja em que freqüenta, e pronto!
Temos um membro aprovadíssimo no quesito "ser crente". Não
obstante... Tal atitude é fácil e pouco nos custará. Muitos
membros de seitas cristãs e de religiões pagãs mantêm o mesmo
padrão de comportamento e às vezes com mais eficiência.
Convém lembrar mais uma vez que estreita é a porta.

Irmãos, custa muito ser um cristão coerente com sua fé. Nas
palavras do Bp. Ryle "custa bastante ser um crente verdadeiro, se os
padrões da Bíblia tiverem que ser seguidos. Há inimigos que terão de
ser vencidos, batalhas que terão de ser travadas, sacrifícios que terão
de ser feitos, um Egito que precisará ser esquecido, um deserto que
precisará ser atravessado, uma cruz que deverá ser carregada, uma
200

carreira que terá de ser corrida". Há um preço a pagar, um custo a


arcar se desejamos ardentemente seguir ao Senhor. E estarei
sendo desonesto senão vos alertar para estas verdades. vejamos
esse custo:

a) Custará a Sua Justiça Própria

Que difícil! aquele que deseja seguir a Cristo deverá se


desvencilhar de todo o orgulho, dos pensamentos altivos e de
toda a presunção acerca de si mesmo. Como é fácil e agradável
ao homem lhe parecer bom a seus próprios olhos. É uma das
facetas do homem decaído das mais difíceis de ser renunciada.
Que ser humano não luta com unhas e dentes quando seu
orgulho, sua justiça própria é ferida? Mesmo na fé cristã, lá no
fundo de seus corações, muitos imaginam que vão para o céu
por causa de sua bondade, misericórdia, ministério exercido,
sua paciência ou mesmo seu grande sacrifício em deixar a TV
de lado para vir assistir a um culto.

Não! Ninguém entrará nas Bodas do Cordeiro enquanto


não estiver convencido na presença de Deus de seu pecado e de
sua pecaminosidade. Enquanto o homem não aceitar de
verdade que merece ir para o inferno, ele não estará pronto
para o Céu. Ao adentrarmos nos átrios eternos será porque a
justiça de Outro nos redimiu. Nossa justiça própria, obras,
cultos, promessas, de nada valerão, apenas a Justiça, a Graça e
as Misericórdias de Deus Pai por meio de seu Filho Jesus. Mas
201

alguém pode estar pensando neste momento: "Espere! se é tudo


obra de Cristo, eu não tenho que fazer nada!". Ledo engano! Você
está trocando a causa pela conseqüência. A causa de nossa
salvação é unicamente o amor e a Graça por meio de Jesus, não
nossa justiça própria. Contudo convém calcular o preço de
nossa decisão de seguir a Cristo, pois as conseqüências desta
decisão passam por nossa vontade.

Na verdade as conseqüências demonstram se a salvação nos


foi outorgada por Cristo ou não. Aquele que não busca arcar
com as conseqüências de sua decisão em vir a Cristo para ser
salvo, deixa claro que nunca foi salvo. O homem que ainda se
apóia em seus direitos para ir ao Céu, nunca lá pisará. Para que
alguém seja realmente um crente verdadeiro deverá estar
disposto a abrir mão de sua justiça própria. O cristão genuíno
não mais se importa com as injustiças que são infligidas contra
o seu amor-próprio, pois ele mesmo já está convencido que não
possui justiça própria alguma. E como tal não está a mercê de
seu ego.

b) Custará o Seu Apego ao Pecado

Um segundo item que deverá ser considerado no custo ao


se buscar uma vida cristã coerente com os ensinos bíblicos é o
apego a pecado. O homem que quer seguir a Cristo deve estar
202

disposto a abrir mão de seus pecados, do mundanismo.


Quando me refiro a abrir mão, não estou usando uma figura de
retórica ou uma metáfora inaplicável à realidade, me refiro ao
homem estar realmente disposto a desistir de seus pecados,
custe o que custar. O que antes lhe agradava, e que estava
contra a vontade de Deus, deverá ser realmente lançado fora.

O desapego ao pecado é uma luta renhida, e esta luta não


deve ter tréguas. Deverá ser diária. Às vezes intimamente,
outras com a ajuda de irmãos. Por vezes o cristão poderá ser
derrotado por algum pecado, secreto ou não, mas não deverá
permanecer caído. O justo, que espera em Deus, ainda que caia
sete vezes, buscará levantar-se (Pv 24:16). Enquanto não
tivermos um ódio declarado contra o pecado que tenazmente
nos assedia, jamais experimentaremos o peso de nossas faltas.
A Palavra nos exorta em Ez 18:31,32 a lançarmos fora toda
iniquidade:

"Lançai de vós todas as vossas transgressões com que


transgredistes, e criai em vós coração novo e espírito novo; pois, por
que morreríeis, ó casa de Israel? Porque não tenho prazer na morte de
ninguém, diz o Senhor Deus. Portanto convertei-vos e vivei"

Já foi dito que o pecado é como um saco de lixo que o


homem leva pendurado por onde quer que vá. Também já foi
dito que os homens possuem para com o pecado uma relação
filial, pois os tratam como filhos mui queridos. A própria idéia
203

de se desvencilhar do pecado já é dolorosa ao homem. É como


se estivesse matando um animal de estimação muito querido, e
do qual não encontra forças de se separar.

Ainda que para alguns isso soe desagradável aos ouvidos, o


fato é que o cristão que se apega displicentemente aos seus
pecados, está por eles apaixonado, e seu apego poderá custar-
lhe a sua alma eterna. Não é a toa que Jesus ensina que é
preferível lançar fora um olho ou braço que nos leve a pecar do
que os tendo ser lançado no inferno (Mt 5:29,30; 18:8,9). Aliás,
lançar fora um pecado querido é o mesmo arrancar um braço,
dói e bastante, mas deve ser feito se quisermos servir ao Mestre.

Estamos dispostos a arcar com mais este custo? Ser cristão


custará ao homem os seus pecados.

c) Custará o Seu Amor ao Conforto

O ser humano é interessante. Quando o assunto é de


natureza material trabalha feito um condenado às galés para
atingir certo grau de conforto. Se esforça ainda mais para subir
na vida, quando vislumbra a possibilidade de uma recompensa
por seus esforços. Todavia quando o assunto é espiritual
raramente vemos esse esforço produtivo. Todos querem ir para
o céu, contanto que isso não lhes custe mais do que algumas
horas por semana em algum culto ou mesmo um estudo bíblico,
e não lhe diminua as horas de lazer pessoal. São como
204

criancinhas que, estando doentes, querem brincar mas não


estão dispostas a tomarem o remédio que lhes parece amargo.

Conforto em si mesmo não é mau, é algo até desejável e


necessário dentro de certas circunstâncias, todavia ser cristão
genuíno implicará em esforço, e este por sua vez implicará em
um menor tempo para as delícias do lazer pessoal. O apego ao
conforto pessoal ou lazer deverá ser levado em conta por
aqueles que manifestam desejo de serem discípulos de Cristo.

Como discípulos não terão muito tempo e nem deverão se


dedicar com muito afinco ao conforto pessoal. Seguir a Jesus
implicará em menos tempo pra o lazer (Mt 8:19,20). Jesus, em
Mt 11:12, deixou claro que todos os que desejam entrar no
Reino de Deus devem se esforçar. Esse esforço, de maneira
resumida, implicará na prática, em:

 Vigiar para não cair em tentação (Mt 26:41)

 Orar sem cessar (I Ts 5:17)

 Cuidar de sua conduta, em todo lugar e em toda


companhia (Sl 1:1; Rm 12:16-18)

 Meditar constantemente na Palavra de Deus (Sl 1:2; 119:17)

 Aproveitar de maneira sábia e proveitosa o seu tempo (Ef


5:15,16)

 Refrear sua língua (Tg 1:26; 3:1-12)

 Buscar estar na companhia dos irmãos (Hb 10:25)


205

 Apresentar seu corpo por sacrifício vivo, santo e agradável


(Rm 6:12-13; 12:1; I Co 6:20)

 Estar atento a seus pensamentos, temperamento, desejos,


imaginação, etc (Rm 12:2)

Todos estes itens acima demandam tempo e esforço, e o


crente zeloso deverá estar disposto a abrir mão de seu conforto
e lazer para mostrar-se diligente em todos os afazeres do ofício
cristão. Ser crente custará ao homem não só o seu conforto,
como por tabela a sua preguiça (Pv 6:6).

Hoje em dia, muitos líderes e denominações se esforçam


por ensinar que o crente não tem que fazer nada, tudo já foi
feito por Cristo. Você só tem que aproveitar e relaxar. É muito
cômodo viver uma religião onde outra pessoa faz todo o serviço
pesado e apenas temos de desfrutar de bênçãos e de nossos
direitos adquiridos, amarrando, exigindo, ordenando, a nosso
bel prazer. É verdade que Cristo morreu em nosso lugar e
ressuscitou para nos dar vida nova com Deus, mas também é
verdade que ninguém conseguirá crescer na Graça de Deus se
não se empenhar por desenvolvê-la. Quando a Palavra diz que
o caminho é apertado, é porque é mesmo apertado. Nesta vida
sempre estaremos numa posição desconfortável em relação ao
mundo, a carne e o diabo. Sempre estaremos ralando as costas
no muro do pecado, da tentação e da sedução. Não haverá
206

muito descanso. É como o Peregrino de Bunyan: volta e meia


encontraremos um banco aprazível para descansarmos
brevemente na encosta do Morro da Dificuldade, mas não nos
será permitido ali armar a nossa cama, sob pena de perdermos
a alegria da salvação.

Irmãos, se queremos ser cristãos verdadeiros, que estão


destinados ao Céu, devemos levar em conta o custo. Estamos
realmente dispostos a arcar com mais este custo? Ser cristão
custará ao homem o amor ao conforto pessoal.

d) Custará a Aprovação do Mundo

Em II Tm 3:12 está escrito: "Ora, todos quantos querem viver


piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos"

E em Tg 4:4 "Infiéis, não compreendeis que a amizade do mundo


é inimiga de Deus? Aquele, pois, que quiser ser amigo do mundo
constitui-se inimigo de Deus"

E assim temos o último e grande custo: a aprovação do


mundo. Se um cristão busca sinceramente agradar a Deus deve
esperar o desagrado dos homens. Não deverá temer a calúnia, a
difamação, o desprezo, a incompreensão, pois elas virão
naturalmente. Terá de aceitar que os homens o tenham por
insensato, louco, fanático ou em quem fizeram lavagem
cerebral. Pedro dissertou longamente sobre a desaprovação do
cristão pelo mundo em I Pe 4:12-19, e nos exortou a nos
207

alegrarmos "na medida em que sois co-participantes dos sofrimentos


de Cristo". O Senhor Jesus disse algo semelhante em Jo 15:20:

"Lembrai-vos da palavra que eu vos disse: Não é o servo maior do


que seu senhor. Se me perseguiram a mim, também perseguirão a vós
outros; se guardaram a minha palavra, também guardarão a vossa"

A aprovação do mundo está diretamente ligada a noção de


justiça própria. Quando o mundo nos aplaude nossa justiça
própria infla e nosso ego se contorce de prazer. O inverso
também é verdadeiro. Quando encontramos a desaprovação
e/ou calúnia de nossos semelhantes, nos sentimos desprezados,
inferiorizados ou injustiçados. Para muitos cristãos, receber esse
tipo de tratamento lhe é demasiado caro, a ponto de
dissimularem quando na presença de incrédulos. Ainda não
calcularam o preço, não fizeram as contas se podem concluir a
torre que começaram a construir. Têm medo de perderem a
honra, a dignidade, o respeito próprio, seus direitos. São
aqueles cuja semente caíram em solo rochoso, e em chegando a
angústia ou perseguição por causa da Palavra logo se
escandalizam (Mt 13:5,6,21).

Meus amados, assim como Jesus foi tratado tratarão os seus


discípulos. Estamos dispostos a pagar semelhante preço? Ser
cristão custará ao homem a sua aprovação perante o mundo.

 II – Conclusão: A Importância de Calcular o Preço


208

Os tópicos acima listados (justiça própria, pecados,


conforto, aprovação pública) são, de modo resumido, o custo
que o cristão dever estar disposto a pagar se realmente quiser
ser coerente com sua fé e com sua disposição de seguir ao
Senhor Jesus. São itens pesados, custam caro, mas ninguém
poderá viver na presença do Senhor e ainda manter um amor
próprio exacerbado, um conduta pecaminosa desenfreada, uma
atitude preguiçosa e ainda por cima a aprovação do mundo.

Custa muito ser um cristão verdadeiro. Mas vale a pena o


preço a pagar. O resultado é a comunhão eterna com o Senhor
Deus, na presença dos irmãos em Cristo, a salvação de sua
alma. O que o homem de juízo daria em troca de sua alma?
Acredito que tudo, inclusive seus tesouros mais preciosos. O
cristão deve estar disposto a desistir de toda e qualquer coisa
que se interponha entre ele e Deus. Como dizia o Bp. Ryle:
"uma religião que nada custa, nada vale". Um cristianismo barato,
sem nenhuma cruz , será um cristianismo inútil, que não
poderá salvar a ninguém.

Hoje é comum nas igrejas oferecerem às pessoas Cristo,


como se fosse um produto miraculoso, onde a única
preocupação do fiel é a de se certificar que já o adquiriu, na
esperança que todos os problemas irão simplesmente porque
um dia tomou a decisão de levantar o braço. estas pessoas ficam
alegres em poderem ser considerados salvos. Não lhes é
209

apresentado nenhum custo, nenhuma renúncia, nenhum


arrependimento pelos pecados. Não calculam o preço, e vindo a
provação logo se escandalizam.

Tomemos cuidado para que não sejamos nós os que vivem


nesta triste situação. É verdade que a salvação dada por Deus é
instantânea e de graça, mas também é verdade que devemos
nos arrepender de nossas práticas mundanas para que
possamos receber a vida nova em Cristo. É necessário saber o
que se deve esperar ao ingressar no discipulado de Jesus Cristo.

No texto-base deste estudo, vemos Jesus deixando bem


claro para a multidão que O acompanhava o custo que seria
seguí-lO (vs.26). Ele não os incentivou a se tornarem discípulos
sem antes terem idéia do estava em jogo. em outra situação
muitos daqueles que se diziam seus discípulos o abandonaram
quando perceberam o custo que seria seguí-lO (Jo 6:66).

Estamos dispostos a pagar o preço exigido? Temos real


idéia do que nos custará seguir ao Senhor? Já paramos para
calcular os custos? Temos condições de erguer a torre, e
estamos dispostos?

Irmãos, convicção de pecados (sem arrependimento) não é


conversão. Sentimentos não é fé. Sensações experiências não é
Graça. E flor nem sempre é promessa de fruto. Consideremos os
nosso caminhos. Olhemos para os dois lados do cristianismo,
210

para o Céu e para a Cruz, e esta última vem primeiro, e sem ela
não pode vir a primeira.

Calculemos o preço!!
211

ANEXO Nº 07

FIDELIDADE NA EVANGELIZAÇÃO

Gilson Carlos de S. Santos

"A palavra do Senhor, porém, permanece eternamente. Ora, esta é


a palavra que vos foi evangelizada" (1 Pe 1.25).

Não há outra entrada para o céu, exceto a estreita passagem


do novo nascimento; sem santidade, ninguém jamais verá a
Deus (Hb 12.14). Deus uniu a fé e o arrependimento para serem
as duas facetas de nossa resposta ao chamado do Salvador,
deixando bem claro que vir a Cristo é abandonar o pecado e
renegar a impiedade. "Se falharmos em manter unidas estas
coisas que Deus juntou, nosso cristianismo será distorcido." 1 A
fé salvadora, o arrependimento, o compromisso e a obediência
são todas operações divinas, realizadas pelo Espírito Santo no
coração daquele que é salvo. Não há obras humanas no ato da
salvação. A salvação vem unicamente pela graça, mediante a fé
(Ef 2.8). Sola Gratia e Sola Fide são dois dos pilares da Reforma.
Entretanto, a verdadeira salvação não pode nem deixará de
produzir obras de justiça na vida do verdadeiro crente. A obra
de Deus na salvação inclui uma mudança de intenção, vontade,
212

desejos e atitudes que produz inevitavelmente o fruto do


Espírito.

Por que existem atualmente igrejas tão fracas? Por que


tantas conversões são anunciadas e tantos membros arrolados
às igrejas, e estas têm causado cada vez menos impacto sobre a
sociedade? Por que não se pode distinguir muitos crentes dos
incrédulos? Não é porque muitos chamam de crentes pessoas
que na verdade não são regeneradas? Não será que muitos
estão tomando "forma de piedade, negando-lhe, entretanto, o
poder" (2 Tm 3.5)?

Nem todo aquele que afirma ser crente o é na verdade.


Jesus declarou em solenes palavras: "Nem todo o que me diz:
Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a
vontade de meu Pai, que está nos céus" (Mt 7.21). Incrédulos fazem
falsas profissões de fé em Cristo, e aqueles que não são crentes
verdadeiros podem iludir-se, pensando que estão salvos. O
diabo tem produzido muitas imitações de conversão,
enganando as pessoas, ora com isto, ora com aquilo. Ele possui
tamanha habilidade e astúcia que, se possível, enganaria os
próprios eleitos.

Este fato teria sido considerado como ponto pacífico, há


algumas décadas; hoje, não mais. O barateamento da graça e a
fé fácil em um evangelho distorcido estão arruinando a pureza
da igreja. O abrandamento da mensagem do Novo Testamento
213

trouxe consigo um inclusivismo putrefato que, com efeito, vê


qualquer tipo de resposta positiva a Jesus como um equivalente
para a fé salvadora. Os crentes de hoje estão dispostos a aceitar
qualquer coisa, que não seja a rejeição aberta, como a autêntica
fé em Cristo. O evangelicalismo moderno desenvolveu um
território largo e notável, que abriga até aqueles cuja doutrina é
suspeita ou cujo comportamento denuncia corações rebeldes
contra as coisas de Deus.

O evangelicalismo moderno desenvolveu um território


largo e notável, que abriga até aqueles cuja doutrina é suspeita
ou cujo comportamento denuncia corações rebeldes contra as
coisas de Deus.

O evangelho que Jesus pregou não fomentava esse tipo


de credulidade. Desde o início de seu ministério público,
nosso Senhor evitou adesões rápidas, fáceis ou superficiais.
Sua mensagem resultou em mais rejeição do que em
aceitação entre os seus ouvintes, pois recusava-se a
proclamar palavras que dessem a qualquer pessoa uma falsa
esperança. Suas palavras, voltadas sempre para as
necessidades do indivíduo, nunca deixaram de fazer
murchar a autojustiça dos que O procuravam, ou de pôr à
mostra segundas intenções, ou de alertar quanto a uma fé
falsa ou a um compromisso superficial.2
214

Nas décadas recentes, tem surgido uma geração de cristãos


professos cujo comportamento raramente se distingue da
rebeldia em que vive o não-regenerado. Um desdobramento do
Congresso Internacional de Evangelização Mundial (realizado em
1974, em Lausanne, Suíça) já apontava para esta realidade:

Da parcela de aproximadamente um bilhão de pessoas


que compõe a população cristã do mundo, sabe-se que
muitos ainda precisam ser evangelizados. São os "cristãos
nominais", que não se comprometeram com Jesus Cristo e
não Lhe reconhecem as reivindicações sobre suas vidas...

Talvez haja centenas de milhões de cristãos nominais


entre os protestantes de todo o mundo. É impossível obter
dados precisos... Ao examinarmos a nossa tarefa, duas
coisas se tornaram claras. Primeiro, estamos tratando de
uma importante tarefa na evangelização do mundo.
Segundo, estamos sendo desafiados pelo nosso próprio
incipiente nominalismo e compelidos a examinar o nível de
nosso próprio compromisso cristão.3

Este relatório demonstrava que nem tudo estava bem nas


igrejas e denominações evangélicas. Por trás das fachadas dos
brilhantes relatórios de crescimento e das estatísticas
impressionantes, existia uma convicção de que a igreja carecia
de poder em seu evangelismo. Ao mesmo tempo, nunca
existiram tantas novas igrejas, tantas campanhas evangelísticas
215

e tantos crentes estudando para o trabalho de evangelismo


pessoal. Nunca se realizou tantas conferências e seminários em
uma tentativa de exame sério das causas e curas no ministério
do evangelho. Organizações denominacionais e
interdenominacionais também se lançavam em campanhas
procurando transcender as barreiras das denominações em
esforços evangelísticos. A verdade, porém, é que estes esforços
limitavam-se também por outras barreiras:

Tendo aceito a teoria de que unidade é uma máxima


para o evangelismo em larga escala, tanto a igreja quanto o
indivíduo são forçados a rebaixar o seu conceito do valor da
verdade. Não podendo insistir em verdades bíblicas que
venham a ofender outro irmão evangélico, temos de
procurar o menor denominador comum a todos os crentes.
Rotula-se, então, o resto da Bíblia como "não essencial" à
evangelização, pois, afinal de contas, estima-se que a
unidade entre os crentes é mais importante do que a
exatidão doutrinária.

As sociedades interdenominacionais nunca param a


fim de perguntar: "O que é na realidade o evangelho de
Cristo?"; isto poderia trazer respostas incômodas, que
feririam a outros; poderia condenar a maior parte de suas
próprias mensagens e metodologia e trazer à baila uma
gama de opiniões diferentes. Adotar a posição de uma igreja
216

significaria perder o apoio de cinco outras, e então todo o


sistema construído sobre a premissa de unidade
desmoronaria.

A igreja local também se encontra impedida de


especificar bem a verdade. Isto pode afetar a sua harmonia
com a denominação ou com a associação. Definir o
evangelho cuidadosamente (como apresentado na Bíblia)
traria conflito com a organização de mocidade; ou talvez
demonstre que as lições de escola dominical presentemente
em utilização devam ser descartadas; ou mesmo que aquela
campanha tenha de ser abandonada. Dar atenção ao
conteúdo do evangelho pode significar atrito com outros
evangélicos, e a premissa é que a unidade é chave de
sucesso.4

Uma igreja sadia necessita ter entre suas características uma


compreensão bíblica do evangelismo. Em todas as épocas e
lugares, os servos de Cristo estão sob a ordem de evangelizar,
ou seja, proclamar o evangelho. Nas páginas da Bíblia, a
evangelização é algo que centraliza-se em Deus. A Escritura
Sagrada exige que a evangelização seja da parte de Deus, "por
meio dEle e para Ele" (Rm 11.36). É triste dizer, mas grande parte
da evangelização contemporânea é antropocêntrica — centralizada no
homem.5 Com excessiva freqüência, as luzes da ribalta focalizam
o evangelista — sua personalidade, eloqüência, a arte com que
217

ele dispõe os argumentos, a história de sua conversão, as


dificuldades pelas quais passou, o número de pessoas que se
converteram pelo trabalho dele e, em alguns casos, os milagres
que alguns dizem que ele realizou. Às vezes, a atenção é posta
nos que estão sendo evangelizados. Ressalta-se o grande
número deles, o triste estado em que se encontram —
exemplificado na pobreza, doença e imoralidade — sua suposta
ansiedade pelo evangelho da salvação e, pior de tudo, fala-se
do bem que existe neles e os capacita a exercitarem a fé
salvadora, por sua livre vontade, embora não regenerada. E
quantas vezes o bem-estar do homem — bem-estar terreno ou
eterno — é a única finalidade da evangelização!

Uma igreja sadia necessita ter entre suas características uma


compreensão bíblica do evangelismo. Para todos os membros
da igreja, mais particularmente para os líderes que têm o
privilégio e responsabilidade de ensinar, uma compreensão
bíblica do evangelismo é crucial. Naturalmente, isso precisa
estar intimamente relacionado a outras compreensões bíblicas,
como, por exemplo, a do evangelho e a da conversão. É óbvio
que a maneira como alguém compartilha o evangelho está
intimamente relacionada ao modo como ele o compreende.
Quando o evangelho é redefinido como algo que significa
pouco mais do que uma mensagem de auto-ajuda espiritual, e a
conversão degenera-se de um ato de Deus para uma mera
resolução humana, a compreensão e prática da evangelização
218

terão suas conseqüências lógicas. Por outro lado, se a mente for


moldada pela Bíblia no que concerne a Deus, ao evangelho, à
necessidade humana e à conversão, uma correta compreensão
do evangelismo fluirá naturalmente.

Quando alguém herda práticas e ensinamentos que


presume serem corretos na prática da evangelização, talvez
nunca pense em questionar a metodologia e a mensagem com a
qual está acostumado. Entretanto, este assunto é sério e afeta
cada um de nós. Essas coisas devem preocupar-nos.

Lembro-me bem de quando li Evangelização e Soberania de


Deus, de J. I. Packer.6 Ele foi um instrumento usado por Deus
para auxiliar-me no equilíbrio do conceito bíblico de
evangelização. Eu havia assumido a Cadeira de Evangelismo
em um seminário batista e deparava-me com o desafio de
fornecer aos alunos um conceito adequado e, portanto, bíblico
de evangelização. À época, eu pensava que os cristãos
evangélicos não precisavam gastar tempo em discutir este
assunto. Em vista da ênfase que os evangélicos sempre deram à
primazia da evangelização, seria natural imaginar que todos
fossem perfeitamente unânimes sobre o que ela significa. Eu
estava errado! Logo entendi que reinava grande confusão
acerca deste ponto. A raiz da confusão pode ser dita numa
sentença. "Trata-se de nosso generalizado e persistente hábito de
definir a evangelização não em termos de uma mensagem anunciada,
219

mas de um efeito produzido em nossos ouvintes." 7 Isto significa


dizer que a essência da evangelização é produzir convertidos.

Isso, entretanto, não pode ser correto. A evangelização


é uma obra do homem, mas a dádiva da fé pertence a Deus.
É verdade, realmente, que cada evangelista tem por alvo
converter os pecadores e que nossa definição expressa
perfeitamente o ideal que ele deseja ver cumprido em seu
próprio ministério; porém, a questão de ele estar ou não
evangelizando não pode ser resolvida simplesmente pela
pergunta: "Meu ministério tem produzido conversões?"
Missionários entre os muçulmanos têm labutado durante a
vida inteira sem ver qualquer convertido; deveríamos
concluir que não estão evangelizando? Tem havido
pregadores não-evangélicos através de cujas palavras (nem
sempre compreendidas no sentido pretendido) algumas
pessoas foram saudavelmente convertidas; deveríamos
concluir que esses pregadores estavam evangelizando?
Certamente a resposta é negativa em ambos os casos. Os
resultados da pregação dependem não das vontades e
intenções dos homens, mas da vontade do Deus todo-
poderoso. Essa consideração não quer dizer que devamos
ser indiferentes quanto a ver ou não os frutos de nosso
testemunho em favor de Cristo; se não estiverem
aparecendo os frutos, devemos buscar a face de Deus para
descobrir o motivo. Essa consideração, todavia, significa
220

que não devemos definir a evangelização em termos dos


resultados obtidos.

Como, pois, deveria ser definida a evangelização? A


resposta dada pelo Novo Testamento é muito simples. De
acordo com o Novo Testamento, a evangelização consiste
apenas na pregação do evangelho, as boas novas. É uma
obra de comunicação na qual os crentes se tornam porta-
vozes da mensagem sobre a misericórdia de Deus para os
pecadores. Todos quantos anunciam fielmente essa
mensagem, sob quaisquer circunstâncias, tanto em
numerosa como em pequena reunião, em um púlpito ou em
conversa particular, estão evangelizando. Visto que a
mensagem divina tem por clímax o apelo da parte do
Criador a um mundo rebelde, para que este se volte e
deposite fé em Cristo, a entrega da mensagem envolve a
chamada dos ouvintes à conversão. Se não estamos
procurando obter conversões nesse sentido, não estamos
evangelizando. Porém, a maneira de saber se alguém está
evangelizando de fato não é perguntar se o testemunho está
produzindo conversões. Pelo contrário, é perguntar se o
pregador está proclamando fielmente a mensagem
evangélica.8

Assim, pois, de acordo com a Bíblia, evangelismo consiste


em apresentar as boas novas livremente, confiando a Deus a
221

conversão das pessoas (At 16.14). "Ao Senhor pertence a


salvação" (Jn 2.9). Qualquer meio que utilizemos para forçar
nascimentos espirituais será tão eficaz quanto Ezequiel
tentando costurar os ossos secos ou Nicodemos procurando dar
a si próprio um novo nascimento. E o resultado será
semelhante. Se o número de membros de nossa igreja é
notavelmente maior do que o número de presentes aos cultos, o
que se entende por conversão? Que tipo de evangelismo tem
sido praticado que resulta em tão grande número de pessoas
com baixíssimo nível de envolvimento na vida da igreja e sem
qualquer distinção dos incrédulos?

O pragmatismo tem afetado sensivelmente nossos conceitos,


metodologias e práticas na evangelização. 9 "Pragmatismo é a noção de
que o significado ou valor é determinado pelas conseqüências práticas.
É muito similar ao utilitarismo, a crença de que a utilidade estabelece
o padrão para aquilo que é bom. Para um pragmatista/utilitarista, se
determinada técnica ou curso de ação resulta no efeito desejado, sua
utilização é válida. Se parece não produzir resultados, então não tem
valor".10 Algo é bom desde que funcione. Os pragmáticos,
portanto, definem a verdade como aquilo que é útil,
significativo e benéfico.

O pragmatismo como filosofia foi desenvolvido e


popularizado no final do século passado. Conquistou a alma
norte-americana e espalhou-se por toda a cultura ocidental. O
222

mais alarmante, entretanto, é que um surto irresistível de


pragmatismo veio a permear o evangelicalismo. E, arrastados
na torrente pragmática avassaladora, as igrejas e seus líderes
retiram a teologia do seu lugar de honra e, em lugar desta,
entronizam a metodologia. "Quando o pragmatismo se torna a
filosofia norteadora da vida, da teologia e do ministério, acaba,
inevitavelmente, colidindo com as Escrituras".11

Livros e manuais que falam sobre Crescimento de Igreja hoje


são best-sellers. Pastores e líderes estão famintos por livros que,
de forma simples e prática, narrem o testemunho de líderes e
outras igrejas que têm experimentado assombrosos
crescimentos numéricos. Porém, de modo geral, nestes livros
(bem como nos modelos e projetos por eles apresentados),
sente-se falta de uma avaliação teológica dos modelos de
planejamento estratégico empregados por essas igrejas e
líderes. Atualmente, estão em voga as técnicas de crescimento
de igreja que acriticamente absorvem a perspectiva
antropológica moderna. Um exemplo: a antropologia adotada
pelas correntes de planejamento estratégico está fundamentada
na perspectiva de Rosseau, da bondade intrínseca do homem,
levando-nos a acreditar que tudo se resolve com o método;
homens bons com um método de desenvolvimento adequado
significa sucesso garantido.
223

Sucesso genuíno é fazer a vontade de Deus apesar das


conseqüências

É sob essa luz que podemos entender a rejeição e o


menosprezo da metodologia tradicional — especialmente, da
pregação — em favor de novos métodos. Estes, supostamente,
são mais "eficazes", ou seja, atraem grandes multidões. O
pragmatismo encara a pregação (particularmente, a expositiva)
como antiquada. Proclamar de modo claro e simples a verdade
da Palavra de Deus é visto como ingênuo, ofensivo e ineficaz.
Além disso, grandes mudanças revolucionaram o culto de
adoração das igrejas. Os cultos agora são planejados no sentido
de serem mais "divertidos", adicionados de grande dose de
entretenimento. "O entretenimento está rapidamente se tornando a
liturgia da igreja pragmática".12 A aceitação acrítica e a celebração
efusiva de psicologia popular, técnicas de aconselhamento,
exagerada ênfase em contextualização, receitas de auto-ajuda,
princípios de propaganda e marketing, correntes de
administração e controle de qualidade, teorias de crescimento
de igreja e outras tendências indicam o crescente
comprometimento da igreja com o pragmatismo. Sutilmente,
em vez de uma vida transformada, a aceitação por parte do
mundo e a quantidade de pessoas alcançadas ou presentes aos
cultos vêm se tornando o alvo maior da igreja contemporânea.
224

A nova filosofia é objetiva: a igreja está competindo


com o mundo. O mundo é hábil em captar a atenção e os
sentimentos das pessoas. A igreja, por outro lado, tende a
ser muito pobre na "venda" de seu produto. Portanto, o
evangelismo deve ser visto como um desafio de marketing,
e a igreja deveria colocar o evangelho no mercado da mesma
forma que todas as empresas modernas colocam os seus
produtos. Isso requer mudanças fundamentais. O objetivo
de todo marketing é "deixar o produtor e o consumidor
satisfeitos"; então, tudo o que tende a deixar o
"consumidor" insatisfeito precisa ser jogado fora. A
pregação, especialmente a que fala sobre o pecado, a justiça
e o juízo, é confrontadora demais para ser verdadeiramente
satisfatória. A igreja necessita aprender a "divulgar" a
verdade de forma a divertir e entreter.13

Em suma, de forma indisfarçada, o que a nova filosofia está


dizendo é o seguinte: a igreja tem sido muito antipática. A
igreja pode e deve omitir, ou ministrar em doses homeopáticas,
os elementos da mensagem bíblica que não se encaixam no
plano promocional. O "bom senso" de marketing exige que o
escândalo da cruz seja minimizado.

No final, o que realmente será levado em conta não é o


nosso sucesso, e sim a nossa fidelidade
225

A filosofia contemporânea de ministério está


apaixonada pelos padrões mundanos de sucesso... qualquer
um que conhece as Escrituras [sabe que] critérios exteriores
tais como afluência, números, dinheiro ou reações positivas
jamais foram a medida bíblica de sucesso no ministério.
Fidelidade, piedade e compromisso espiritual são as
virtudes que Deus estima; e tais qualidades deveriam ser os
tijolos com os quais se constrói uma filosofia de ministério.
Isto é verdadeiro tanto para as igrejas grandes como para as
pequenas. Tamanho não é sinônimo da bênção de Deus;
popularidade não é barômetro de sucesso... Nas Escrituras,
o sucesso exterior jamais é um objetivo digno de ser
perseguido.

[Sucesso] não decorre de obtermos resultados a


qualquer preço. O verdadeiro sucesso não é prosperidade,
poder, proeminência, popularidade ou qualquer outro
conceito mundano de sucesso. Sucesso genuíno é fazer a
vontade de Deus apesar das conseqüências.14

Precisamos retornar à enfase sobre a necessidade de sermos


fiéis. Isso é de importância vital em nossos dias. Acima do
sucesso, devemos almejar a fidelidade. Lembremo-nos de Noé.
Ele é descrito no Novo Testamento como “pregoeiro da justiça”.
Que tipo de sucesso ele teve? Se o avaliarmos pelos critérios das
correntes pragmatistas contemporâneas, concluiremos que ele
226

foi um evangelista antipático, repetitivo e fracassado. Quanto às


conversões, exceto os de sua própria casa, ele não obteve
qualquer sucesso. Porém, quando o Senhor voltar, nao dirá:
“Muito bem, servo bom e bem-sucedido”. Ele dirá: “Muito bem,
servo bom e fiel”. Como alguém muito acertadamente já
afirmou, no final, o que realmente será levado em conta não é o
nosso sucesso, e sim a nossa fidelidade.

_______________

1 J. I. Packer, na apresentação do livro O Evangelho Segundo


Jesus, John F. MacArthur, Jr., Editora Fiel, 1991, Sao José dos
Campos (SP), p. 5.

2 John F. MacArthur, Jr., O Evangelho Segundo Jesus, p. 41.

3 Chamam-se Cristãos, a evangelização dos povos


tradicionalmente cristãos — relatório da consulta sobre a
evangelização mundial (Miniconsulta sobre a Evangelização de
Cristaos Nominais entre Católicos e Protestantes), realizado em
Pattaya, Tailândia, em junho de 1980, sob o patrocínio da
Comissão de Lausanne para a Evangelização Mundial. ABU
Editora e Visão Mundial, 1984, pp. 9 e 53.

4 Walter J. Chantry, O Evangelho de Hoje: Autentico ou


Sintético?, Editora Fiel, 1986, São José dos Campos (SP), pp.
10,11.
227

5 R. B. Kuiper, Evangelização Teocêntrica, Publicações


Evangélicas Selecionadas, 1976, Sao Paulo (SP), p. 221.

6 J. I. Packer, Evangelizaçao e Soberania de Deus, Edições Vida


Nova, 1990, Sao Paulo (SP), p. 85.

7 Idem, p. 28.

8 Ibid., pp. 30,31.

9 Recomendo a leitura de Com Vergonha do Evangelho.


228

QUANTO AO VIR A CRISTO


— Parte 1 —
Ernest Reisinger
    "Ah! Todos vós, os que tendes sede, vinde às águas; e vós, os que
não tendes dinheiro, vinde, comprai e comei; sim, vinde e comprai, sem
dinheiro e sem preço, vinho e leite. Por que gastais o dinheiro naquilo
que não é pão, e o vosso suor, naquilo que não satisfaz? Ouvi-me
atentamente, comei o que é bom e vos deleitareis com finos manjares.
Inclinai os ouvidos e vinde a mim; ouvi, e a vossa alma viverá; porque
convosco farei uma aliança perpétua, que consiste nas fiéis
misericórdias prometidas a Davi" (Is 55.1-3).
Vir é Comer — Crer é Beber
"Declarou-lhes, pois, Jesus: Eu sou o pão da vida; o que vem a
mim jamais terá fome; e o que crê em mim jamais terá sede" (Jo 6.35).
Um comentário acerca de João 6.35: "Respondeu-lhes Jesus:
Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne do Filho do
homem e não beberdes o seu sangue, não tendes vida em vós mesmos"
(Jo 6.53).
"No último dia, o grande dia da festa, levantou-se Jesus e
exclamou: Se alguém tem sede, venha a mim e beba" (Jo 7.37).
O primeiro convite de nosso Senhor encontra-se em Mateus
11.28-30: "Vinde a mim, todos os que estais cansados e
sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e
aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis
descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo
é leve".
229

O último convite dEle encontra-se em Apocalipse 22.17: "O


Espírito e a noiva dizem: Vem! Aquele que ouve, diga: Vem! Aquele
que tem sede venha, e quem quiser receba de graça a água da vida".
A expressão "vir a Cristo" é boa, mas está rodeada por
muita ignorância e confusão, quando se torna parte de métodos
errados de evangelismo. O que esta expressão significa para os
ouvintes? Com certeza, é necessário que pecadores venham a
Cristo para serem salvos. Mas, quando um pregador chama os
pecadores à frente da igreja, enquanto a congregação cria o
ambiente com um "hino de apelo", é bem provável que a
maioria dos ouvintes considerará iguais o "vir a Cristo" e o "vir
à frente".
Se for questionado acerca do "vir à frente", o pregador dirá
que isto não salva. Contudo, ao mesmo tempo, por sua
linguagem e métodos, ele está equiparando o "vir à frente" ao
"vir a Cristo", e, portanto, muitas pobres almas são enganadas.
Vir a Cristo é uma expressão boa, uma expressão bíblica.
Ela é usada para descrever um ato da alma. Vir a Cristo inclui
abandonar toda a auto-justiça e o pecado; envolve receber a
justiça de Cristo para ser nossa justiça e o sangue dEle para
nossa expiação. Vir a Cristo inclui arrependimento para com
Deus e fé no Senhor Jesus Cristo. Vir a Cristo é o primeiro efeito
da regeneração.
Quando o pregador diz: "Venha a Cristo", ao final do culto,
para muitos isso significa vir à frente da igreja. O que as
230

crianças pensam quando o pregador diz: "Venha a Cristo" e, ao


mesmo tempo, as convida a virem à frente da igreja? Todo
verdadeiro pregador e evangelista sabe que o vir à frente de
uma igreja não equivale a vir a Cristo. Alguns podem até dizer
"vir à frente não salvará você", mas continuam e "fazem o
apelo", como se os ouvintes achassem que tal apelo equivale a
vir a Cristo.

A expressão "vir a Cristo" é boa, mas está rodeada por muita


ignorância e confusão, quando se torna parte de métodos
errados de evangelismo.

Alguns pregadores não se mostram sensatos em seu


suposto convite, e o resultado é que muitos dentre o nosso
povo, talvez a maioria, considera como iguais o ato físico de ir à
frente e o vir a Cristo. Novamente, afirmo que todo verdadeiro
pregador está consciente de que não há um único caso na Bíblia,
ou sequer uma linha das Escrituras, que dê apoio a essa
concepção errada (o igualar o vir a Cristo e o ir à frente, ao final
de um culto na igreja). Isto não apenas não se encontra na
Bíblia, mas também jamais foi praticado pelo Senhor ou pelos
apóstolos. Aliás, jamais foi praticado na igreja até uns 150 ou
200 anos atrás. O famoso avivalista Charles G. Finney
introduziu e popularizou o uso da "sala dos decididos" e do
231

"banco dos ansiosos". Mas ele jamais considerou iguais o "vir à


sala dos decididos" e o "vir a Cristo".
O Sistema de Apelo
Por que me preocupo tanto com este assunto? Porque
muitos são enganados; e ser enganado acerca da salvação é o
pior engano que pode sobrevir a uma pessoa. Muitos pastores
estão enganados exatamente neste ponto.
Dois textos bíblicos costumam ser usados para dar
sustentação ao sistema de apelo, Marcos 1.17 e Mateus 10.32-33.
Observe que eu não disse convite, mas sistema de apelo.
Marcos 1.17: "Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de
homens". Os discípulos largaram suas redes e seguiram a Jesus.
Ele estava ali fisicamente, e eles O seguiram fisicamente.
Suponha que hoje eu fosse a uma praia repleta de
pescadores e dissesse: "Vinde após Jesus, e Ele vos fará
pescadores de homens". Eu estaria querendo dizer que os
pescadores deveriam abandonar suas redes, no sentido físico?
Ou seguir a Jesus, em termos físicos? Não. Isto seria impossível,
porque Jesus já não está aqui fisicamente.
O que significa seguir a Jesus hoje? Seguir a Jesus significa
aprender de seus ensinos; viver sob a influência desses ensinos,
aplicando-os ao nosso dia-a-dia.
Nos dias em que Jesus estava aqui, em carne e osso, segui-
Lo fisicamente seria possível. Os pescadores O seguiram
literalmente. Zaqueu desceu da árvore, de maneira física e
232

literal, e seguiu a Jesus. Mas, mesmo nos dias da presença


visível de Jesus, o sentido fundamental das palavras "Vinde após
mim" e "Vinde a mim" era claramente uma identificação de
arrependimento e fé. Portanto, Marcos 1.17 não é um texto
adequado para dar sustentação a qualquer ato físico ou sistema
de apelo.
O segundo texto usado para amparar esse sistema é Mateus
10.32-33: "Portanto, todo aquele que me confessar diante dos homens,
também eu o confessarei diante de meu Pai, que está nos céus; mas
aquele que me negar diante dos homens, também eu o negarei diante
de meu Pai, que está nos céus".
Analisemos com cuidado o que nosso Senhor estava
dizendo. Estaria Ele afirmando que pelo ato de confessar, ou
por meio de algum ato físico, nos tornamos cristãos? Ou estaria
Ele ensinando que uma das marcas indispensáveis dos
verdadeiros cristãos é que estes O confessam e vivem uma vida
que, publicamente, O reconhece? Não deve haver qualquer
dúvida quanto à resposta. Confessar a Cristo é um dever
espiritual dos cristãos. Confessá-Lo não se refere a como se
tornar um cristão.
Nesta passagem, Jesus não estava dizendo aos pecadores
como fazerem uma decisão, não estava descrevendo a forma
como ocorre o novo nascimento. Estava ensinando que
confessá-Lo é um dever espiritual do cristão. Confessar a Cristo
é um dever cristão. Quanto a isso, o Novo Testamento é
233

bastante claro. Mas, pergunto eu, como isso era feito? Qual era
a confissão pública?

Mesmo nos dias da presença visível de Jesus, o sentido


fundamental das palavras "Vinde após mim" e "Vinde a mim"
era claramente uma identificação de arrependimento e fé.

No livro de Atos (o manual sagrado de evangelismo),


encontramos, em sua maior pureza, exemplos dos apóstolos
envolvidos no evangelismo. Ao ler o livro de Atos, pergunte-se:
"Como as pessoas faziam esta confissão?". A resposta clara e
simples é através do batismo.
O Que o Vir a Cristo Não Significa
Voltemos à pergunta: o que significa vir a Cristo? O melhor
que posso fazer com essa pergunta é, primeiramente, dizer-lhe
o que vir a Cristo não significa e, depois, o que está envolvido
em vir a Cristo.
Primeiro, o que não significa. Vir a Cristo não é um ato
físico evidente. Cristo não está aqui presente de maneira fisica;
portanto, ninguém pode vir a Ele no sentido físico. Ele não está
à frente do púlpito, pairando como um fantasma. Ninguém
pode vir a Cristo utilizando-se dos pés.
Consideremos um versículo muito surpreendente, um
versículo ofensivo à mente natural e confuso para muitos
cristãos.
234

"Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer;


e eu o ressuscitarei no último dia" (Jo 6.44).
Alguns descrevem o vir a Cristo como a coisa mais fácil do
mundo, e, em certo sentido, isto é verdade — se você vier, será
bem-vindo. Mas esse versículo nos mostra que vir a Cristo por
vontade própria é impos-sível. Embora esse texto seja ofensivo
à mente carnal, precisamos lembrar que ofender a mente carnal
é, quase sempre, o passo inicial para vir a Cristo, num
relacionamento salvífico. Tal pessoa precisa ver sua condição de
perdida, antes que tenha o desejo de ser salva.
Revisemos uma pequena lição de boa educação. Um velho
amigo costumava ensinar seus filhos a dizer: "O senhor
permite...?". Se uma das crianças dissesse: "Posso ir lá fora, para
brincar?", ele responderia: "Não sei; será que você pode?" Ele
estava, obviamente, ensinando os filhos a dizer: "O senhor me
permite ir lá fora para brincar?"
Observe que o versículo afirma: "Ninguém pode"; isto
significa que nenhum de nós possui a capacidade. Alguém
pode receber permissão para fazer algo, mas, por si mesmo, não
é capaz. Esse texto ensina claramente a incapacidade humana;
porém, ao mesmo tempo, ensina de maneira cristalina o atrair
gracioso do Pai. O texto nos apresenta uma doce consolação —
esperança no Pai.

Onde Está a Incapacidade Humana?


235

1. Não está em qualquer defeito físico. Não significa que o


homem é incapaz de movimentar seu corpo físico, de andar
com seus próprios pés. O pecador consegue fazer isso — ele é
capaz de caminhar até a frente, na igreja, pois ele tem pernas. Se
a questão é proferir algumas palavras numa oração — ele
também pode fazer isso. Muitas pessoas não-regeneradas oram.
Não há falta de poder físico no vir a Cristo.
2. A incapacidade não está na mente, no intelecto. O não-
convertido é capaz de aprender intelectualmente a Bíblia, assim
como pode aprender matemática, história, física, música, etc.
Sim, ele pode crer que a Bíblia é verdadeira. Há muitos livros
verdadeiros que foram escritos por pessoas não-convertidas. É
possível alguém crer em cada afirmativa de Cristo, assim como
poderia crer em qualquer outra pessoa. Não deveríamos dizer
aos homens que eles não podem crer. Isso não é verdade — eles
podem crer em cada palavra da Bíblia e ainda estarem "tão
perdidos quanto um porco em dia de feijoada". A incapacidade
não está no intelecto ou no corpo.
Então, onde está a incapacidade humana? Ela se encontra
arraigada profundamente na natureza do homem. Através da
queda e de nosso próprio pecado, a natureza do homem se
tornou tão pervertida, depravada e corrupta, que é impossível
ao homem vir a Cristo sem a poderosa obra de Deus, o Espírito
Santo.
236

Vemos isso no mundo animal. Os animais agem de acordo


com sua natureza. As ovelhas não comem lavagem, assim como
um porco não se alimenta de grama. Não há qualquer problema
físico — ambos possuem boca, dentes, orelhas e pernas. A razão
pela qual a ovelha não come lavagem é sua natureza. A
natureza do homem impede-o de vir a Cristo.
Dê uma faca a uma mãe e diga-lhe: "Crave-a em seu bebê".
Se ela for normal, dirá: "Não posso fazer isso, não posso!" Isto
significa que ela não possui força física ou capacidade para
fazê-lo? Não, de modo nenhum! A natureza da mãe torna
aquilo impossível.
Novamente, onde está a incapacidade de alguém vir a
Cristo? Na obstinação da vontade humana. Oh! sim, os homens
podem ser salvos, se quiserem. Creio que todo pecador que
ainda está do lado de fora do inferno pode ser salvo, se quiser.
Esta é exatamente a raiz do problema — se ele quiser.
B. B. Warfield disse: "Qual a utilidade de argumentar a
respeito de quem quiser em um mundo tão repleto de ‘eu não
quero’? Estamos pregando e testemunhando a um mundo de
‘eu não quero’ ".
O versículo mais pessimista da Bíblia é João 5.40: "Contudo,
não quereis vir a mim para terdes vida". Por esse motivo, João 6.44
é o versículo mais otimista da Bíblia. Você sabia que este é um
dos mais agradáveis versículos da Palavra de Deus? Não
houvesse aquela palavrinha "se" em João 6.44, todas as pessoas
237

iriam para o inferno. Ninguém seria salvo. Abençoado "se"! "Se


o Pai" — graças a Deus pelo que Ele faz. O que estou dizendo é
que os pecadores precisam de um novo "querer". Onde o novo
querer é outorgado, o desejo e o poder surgem como
conseqüência.

O Pai Traz Pecadores a Cristo


De que maneira o Pai traz pecadores a Cristo? Todos
certamente concordarão que a pregação do evangelho é o
instrumento de trazer os homens. Mas a pregação sozinha não
traz ninguém. A pregação de nosso Senhor, por si mesma, não
trouxe nenhum pecador.
3. Vir a Cristo não é alguma experiência mística que não se
fundamenta na verdade, uma experiência divorciada da
verdade das Escrituras.
4. Vir a Cristo não é meramente um ato da vontade e
volição, ou seja, um ato de querer, um ato de escolha.
Certamente inclui um exercício da vontade, mas não é
semelhante a votar em alguém, ou seja, "eu voto em Jesus", "eu
me decido por Jesus"; amanhã você poderá tomar uma decisão
diferente.
Vir a Cristo não é algo físico ou puramente intelectual; vir a
Cristo não é algo místico sem fundamentos na Verdade ou algo
meramente volitivo
238

QUANTO AO VIR A CRISTO


- Parte 2 -
Ernest Reisinger

No estudo anterior, comecei a falar sobre a expressão "vir a


Cristo". O que um pregador tem em mente quando ele diz "vir a
Cristo"?
Salientei quatro coisas que "vir a Cristo" não significa:
Não é um ato físico.
Não é um ato puramente mental.
Não é um ato místico não alicerçado na verdade bíblica.
Não é meramente um ato volitivo, tal como votar
em alguém. Jesus não precisa de quaisquer votos, Ele
já está no trono.

O Que Significa "vir a Cristo"?


Então, o que significa "vir a Cristo"? A melhor maneira de
responder a essa pergunta é afirmar o que está envolvido no
"vir a Cristo".
A primeira coisa envolvida é o reconhecimento da necessidade
espiritual. Isso é claramente visto em alguns dos convites
graciosos contidos na Bíblia:
Mateus 11.28-29: "Vinde a mim, todos os que estais
cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós
239

o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de


coração; e achareis descanso para a vossa alma".
Observe: o convite é feito àqueles que estão cansados e
sobrecarregados, indicando que eles têm uma necessidade.
Jesus não está oferecendo um jugo no sentido literal; está
oferecendo descanso para a alma — "E achareis descanso para a
vossa alma" — uma necessidade espiritual.
Isaías 55.1: "Ah! Todos vós, os que tendes sede, vinde às
águas; e vós, os que não tendes dinheiro, vinde, comprai e
comei, vinde e comprai, sem dinheiro e sem preço, vinho e
leite".
Nesta passagem, Ele oferece um convite a almas sedentas
— o que indica o reconhecimento de uma necessidade
espiritual.
A primeira coisa envolvida no "vir a Cristo" é o
reconhecimento da necessidade espiritual.
Apocalipse 22.17: "O Espírito e a noiva dizem: Vem! Aquele
que ouve, diga: Vem! Aquele que tem sede venha, e quem
quiser receba de graça a água da vida".
O último convite da Bíblia é feito àqueles que desejam água,
ou seja, pessoas sedentas — pessoas que reconhecem sua
necessidade espiritual.
Uma segunda coisa presente no "vir a Cristo" é a revelação de
Cristo ao coração, como sendo o Único adequado para suprir a
240

necessidade. Ele precisa ser revelado ao coração, pelo Espírito


Santo.
Diversas vezes me perguntaram: "Qual o maior problema
no cristianismo dominical?" Minha resposta é a seguinte: "Uma
multidão de pessoas que se reúne na igreja tentando adorar um
Cristo não revelado". Cristo precisa ser revelado ao coração, por
intermédio da Palavra e do Espírito.
Deixe-me salientar essa verdade com alguns textos bíblicos:
Mateus 16.13-17: "Indo Jesus para os lados de Cesaréia de
Filipe, perguntou a seus discípulos: Quem diz o povo ser o
Filho do Homem? E eles responderam: Uns dizem: João Batista;
outros: Elias; e outros: Jeremias ou algum dos profetas. Mas
vós, continuou ele, quem dizeis que eu sou? Respondendo
Simão Pedro, disse: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo. Então,
Jesus lhe afirmou: Bem-aventurado és, Simão Barjonas, porque
não foi carne e sangue que to revelaram, mas meu Pai, que está
nos céus". Cristo teve de ser revelado de maneira sobrenatural a
Pedro.
Gálatas 1.15-16: "Quando, porém, ao que me separou antes
de eu nascer e me chamou pela sua graça, aprouve revelar seu
Filho em mim, para que eu o pregasse entre os gentios, sem
detença, não consultei carne e sangue". Cristo foi revelado a
Paulo.
Mateus 2.11: "Entrando na casa, viram o menino com Maria,
sua mãe. Prostrando-se, o adoraram". Aquele bebê, aos olhos
241

humanos, tinha a aparência de Deus, para ser adorado? Cristo


precisou ser revelado ao coração dos sábios, pelo Espírito.
Então, uma segunda coisa presente no "vir a Cristo" é: Ele
precisa ser revelado pelo Espírito Santo. Uma revelação
sobrenatural: o cristianismo é uma religião sobrenatural.
Uma terceira coisa envolvida no "vir a Cristo" é um
compromisso com Ele, sem reservas, como o Único que pode satisfazer
essa necessidade da alma. Qualquer coisa menos do que isso torna
uma pessoa estranha a Cristo e à verdadeira religião salvadora.
Ah! Quando alguém reconhece sua necessidade espiritual, e
Cristo é revelado ao coração como o Único que pode satisfazer
essa necessidade, resultando em um irrestrito compromisso
com Ele, tal pessoa terá (1) algo a confessar, (2) um desejo de
confessá-Lo e (3) alegria ao confessá-Lo. Essa verdade deveria
explicar porque não equiparamos o "vir à frente" em um culto
de domingo à noite com o "vir a Cristo".

Perigos e Erros do Sistema de Apelo


O "Sistema de Apelo" está cheio de erros e perigos. A ênfase
desta expressão se encontra na palavra "sistema". Não falei
"convite". Se os pregadores não convidam os pecadores a virem
a Cristo, deveriam abandonar o ministério. Existe uma
tremenda diferença entre o convite bíblico e o "Sistema de
Apelo".
242

1. Por não esclarecerem o convite, os pregadores


inadvertidamente instituíram um sistema ou uma condição
para a salvação que, além de não ser encontrada na Bíblia,
jamais foi praticada ou aprovada por Cristo e seus apóstolos. A
confissão pública não é uma condição para a salvação; pelo
contrário, é um resultado da salvação. Existe uma tremenda
diferença entre o convite bíblico e o "Sistema de Apelo".
2. A chamada para "vir à frente" (ou "levantar uma das
mãos") não é um mandamento divino, e sim um mandamento
criado pelo homem. Muitas vezes, aqueles que vão à frente são
levados a crer que fizeram algo recomendável diante de Deus.
Vir à frente não é algo que Deus ordenou. Já ouvi pessoas sendo
agradecidas por virem à frente, enquanto falsamente imagina-
se estarem desobedecendo a Deus aqueles que não vieram à
frente. Contudo, Ele jamais ordenou tal coisa; tampouco existe
qualquer relato disso em toda a Bíblia — ou na igreja, em seus
primórdios.
O sistema produz falsa segurança. "Agora que eu fui à
frente, estou salvo." Quantas vezes já ouvi isso! Mas esta não é a
base bíblica da segurança. Esse sistema também produz,
freqüentemente, uma culpa falsa naqueles que não vão à frente.
3. Existe o terceiro perigo de igualar o "vir a Cristo" com o
"vir à frente" da igreja. Isso tende a enganar as pessoas. É
comum ouvirmos expressões do tipo "ele foi à frente para ser
salvo", ou "se eles tivessem cantado mais uma estrofe, eu teria
243

respondido ao apelo", ou "eu não pude esperar até o próximo


culto, na noite seguinte, para ser salvo". Já ouvi isso inúmeras
vezes. É um comentário acerca daquilo que está sendo ensinado
às pessoas. Existe o perigo de igualar o "vir a Cristo" com o "vir
à frente'' da igreja.
Em certa ocasião, um diácono me disse que os pecadores
viriam a Cristo, se eu escolhesse outro hino na hora do apelo.
O Espírito Santo ausenta-se do culto quando a última
estrofe do hino é cantada? Espero que não! Se for, desisto de
pregar e do próprio cristianismo.
1 João 2.23 assevera: "Todo aquele que nega o Filho, esse
não tem o Pai; aquele que confessa o Filho tem igualmente o
Pai". Isso não é um ato físico. Você pode fazê-lo em seu lugar,
não movendo sequer os olhos.
4. O quarto perigo do sistema de apelo é a inevitável
confusão na consciência daqueles que não foram à frente,
quando convidados pelo pregador. Em geral, eles ficam com a
impressão de que se rebelaram contra Deus, quando a verdade
é que não se rebelaram de maneira alguma.
Esta falsa idéia de igualar o "vir a frente" com o "vir a
Cristo" tem produzido o maior recorde de estatísticas já
computado na igreja ou nos negócios! O sistema é responsável
por estatísticas enganosas. Falsifica o papel do pregador ou do
evangelista. "Ele tem conseguido decisões?" "Quantas foram as
decisões naquela reunião?"
244

5. Outro erro produzido por esse sistema é uma errônea


apresentação da fé. A fé é representada como algo a ser feito,
para se obter salvação. Sou zeloso pela expressão "somente pela
graça", e não por um ato físico. Quero cantar "Maravilhosa
Graça", e não "Maravilhosa Decisão" (ir à frente)!
Em que consiste a fé? Explicá-la não é a tarefa do pregador.
O alvo do pregador é deixar claro o objeto da fé, Jesus Cristo. O
pregador não é chamado por Deus para explicar o ato da fé.
O Exemplo de Jesus Cristo
Consideremos o primeiro convite feito por nosso Senhor
(suplico a Deus que todos os pregadores evangelistas sigam o
exemplo dEle).
Mateus 11.28-30 "Vinde a mim, todos os que estais cansados
e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu
jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de
coração; e achareis descanso para a vossa alma. Porque o meu
jugo é suave, e o meu fardo é leve".
Preciso destacar o contexto desse convite em particular.
Jesus estava dirigindo estas palavras a pessoas de Cafarnaum,
onde Ele havia pregado com freqüência e realizado poderosas
obras - onde havia proferido os pesarosos "ais" da lei, assim
como em Mateus 11.23: "Tu, Cafarnaum, elevar-te-ás,
porventura, até ao céu? Descerás até ao inferno; porque, se em
Sodoma se tivessem operado os milagres que em ti se fizeram,
teria ela permanecido até ao dia de hoje". Jesus estava falando
245

claramente de um lugar em que Ele e sua pregação haviam sido


rejeitados (Mt 11.22, ss.). O que Ele fez neste lugar, sob essas
circunstâncias? Observe três coisas:
1. Ele orou (v. 25): "Por aquele tempo, exclamou Jesus:
Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste
estas cousas aos sábios e instruídos e as revelaste aos
pequeninos." Veja novamente a ênfase sobre a Palavra revelada.
O relato de Lucas afirma: "Naquela hora, exultou Jesus no
Espírito Santo".
2. Ele fez uma tremenda reivindicação a respeito da soberania de
Deus (v. 27): "Tudo me foi entregue por meu Pai. Ninguém
conhece o Filho senão o Pai; e ninguém conhece o Pai senão o
Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar".
3. Ele fez um convite (vv. 28-30): "Vinde a mim, todos os que
estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai
sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e
humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma.
Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve". Ele não
estava procurando uma decisão física. Por favor, observe as
palavras "aprendei de mim".
O evangelho é freqüentemente retratado como algo a ser
aprendido. Portanto, os pecadores precisam ser ensinados. Em
seu convite, Jesus Cristo (Mt 11.28-29), nosso grande Senhor-
Mestre, disse: "Aprendei de mim".
246

Nosso Senhor deixou isso muito claro na Grande Comissão.


Aprendemos a mesma coisa de seu exemplo, encontrado no
evangelho e nas instruções dEle — "Ide, portanto fazei
discípulos de todas as nações" (Mt 28.19); e, novamente:
"Ensinando-os..." (Mt 28.20). Ele não afirmou: "Ajudando-os a
fazerem decisões", mas: "Ensinando-os". Jesus "percorria as
aldeias circunvizinhas, a ensinar" (Mc 6.6). "Ao desembarcar,
viu Jesus uma grande multidão e compadeceu-se deles, porque
eram como ovelhas que não têm pastor" (Mc 6.34). O que Ele
fez? Apelou por decisões? Não! De forma alguma! Começou a
ensiná-los. "Percorria Jesus toda a Galiléia, ensinando nas
sinagogas, pregando" (Mt 4.23).
Pense em nosso Senhor, depois da ressurreição, no caminho
de Emaús (Lc 24). O que Ele fez? Abriu as Escrituras (Lc 24.25-
27) e o entendimento dos discípulos (Lc 24.16,31,45). Desde o
primeiro versículo do livro de Atos, aprendemos o método de
evangelização de nosso Senhor — "Todas as coisas que Jesus
começou a fazer e a ensinar" (At 1.1).
Ele jamais fez um apelo direto às emoções ou à vontade das
pessoas, sem antes haver instruído as suas mentes.
Esta é uma lição que muitos pregadores e evangelistas
precisam aprender. Antes de qualquer outra coisa, um apelo
direto precisa ser feito à mente e à compreensão. Então, através
destas, apelamos às afeições e à vontade. O evangelho é uma
mensagem que contém informação; portanto, precisa ser
247

comunicado por palavras definíveis. O evangelho contém


informação e tem de ser explanado e aplicado pela Palavra, com
poder. "Porque o nosso evangelho não chegou até vós tão-
somente em palavra, mas, sobretudo, em poder, no Espírito
Santo e em plena convicção" (1 Ts 1.5).
O Manual Sagrado de Evangelismo
Consideremos agora o livro de Atos, o manual sagrado de
evangelismo, onde encontramos os apóstolos utilizando o
mesmo método.
"Logo ao romper do dia, entraram no templo e ensinavam"
(5.21).
Nós os encontramos no templo evangelizando. Qual foi o
método deles? "Ensinando o povo" (5.25).
De que maneira evangelizavam em Jerusalém? "Enchestes
Jerusalém de vossa doutrina" (5.28).
Paulo e Barnabé estiveram evangelizando em Antioquia
durante um ano todo. Qual o método que utilizaram? "E, por
todo um ano, se reuniram naquela igreja e ensinaram numerosa
multidão" (11.26). Por favor, observe: não há uma menção
sequer de pessoas se decidindo aqui ou em qualquer outra
parte do livro de Atos.
Em Derbe, eles usaram o mesmo método — pregando e
ensinando (14.21) — fazer discípulos. Fazemos discípulos, ao
ensiná-los.
248

Em 15.35, novamente eles utilizaram o mesmo método:


ensinando e pregando.
Paulo trabalhou em Corinto durante um ano e seis meses,
evangelizando. Como? "E ali permaneceu um ano e seis meses,
ensinando entre eles a palavra de Deus" (18.11).
Em Atos 8, temos um exemplo de evangelismo pessoal.
Felipe estava evangelizando o tesoureiro etíope. Observe, por
favor, o método de Felipe e a total ausência de "decisionismo".
Sim, houve uma decisão, mas não "decisionismo". Felipe explicou
as Escrituras! Esse foi o método que nosso Senhor, Pedro e
Paulo utilizaram — ensinando, instruindo a mente. Em seguida,
veio a decisão de confessar através do batismo o que havia
acontecido no coração. A mente do tesoureiro etíope fora
instruída, suas afeições moveram-se em direção a Cristo, e sua
vontade respondeu à verdade que lhe veio à mente e ao
coração.
Paulo ensinou Timóteo a utilizar o método centralizado em
Deus. O grande apóstolo disse ao jovem Timóteo: "Faze o
trabalho de um evangelista" (2 Tm 4.5). De que maneira Paulo
instruiu que ele o fizesse? Não saindo por aí e levando pessoas
a decidirem algo que não entendem bem. Sim, existe uma
decisão envolvida no processo de fazer discípulos. Mas Paulo
ensinou Timóteo a utilizar o método centralizado em Deus —
"E o que de minha parte ouviste através de muitas testemunhas,
249

isso mesmo transmite a homens fiéis e também idôneos para


instruir a outros" (2 Tm 2.2).
Timóteo sabia como ele mesmo havia chegado à salvação:
"E que, desde a infância, sabes as sagradas letras, que podem
tornar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus" (2 Tm
3.15). Ele recebeu o ensino das Sagradas Escrituras.
Aprendemos nossos métodos a partir da Grande Comissão:
"Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações" (Mt 28.19). A
expressão fazer discípulos é mais uma referência ao produto do
que ao método de produzir. Entretanto, o método de produzir
discípulos é ensinar. Um homem sincero, com sua Bíblia
aberta, descobrirá algumas coisas referentes ao modo como os
apóstolos apresentaram Jesus Cristo aos homens
pecaminosos.
Apelo continuamente ao método do Senhor e dos apóstolos,
conforme o encontramos nos evangelhos e no livro de Atos.
Seria maravilhoso para todos os que se engajam no
evangelismo, se abrissem suas Bíblias no livro de Atos e o
estudassem tendo em mente algumas das questões importantes
a respeito de seu conteúdo.
1. Qual foi a mensagem dos apóstolos? (Estude os sermões
e as conversas que eles tiveram com os não-convertidos para
obter a resposta.)
2. Que método eles utilizaram ao lidar com o não-
convertido?
250

Um homem sincero, com sua Bíblia aberta, descobrirá


algumas coisas referentes ao modo como os apóstolos
apresentaram Jesus Cristo aos homens pecaminosos. Eles
anunciavam a Cristo de tal maneira que, através do poder do
Espírito Santo, os pecadores eram reconciliados com Deus, por
intermédio de Cristo. Os apóstolos ensinavam o evangelho de
modo que os pecadores recebessem a Cristo como seu Salvador
— libertando-os do pecado e suas conseqüências — e servi-Lo
na comunhão da igreja.
Os Convites do Evangelho são Estendidos a Todos
Os convites do evangelho, embora dirigidos a todos, são
variados:
1. Homens que são inimigos de Deus são convidados:
"Rogamos que vos reconcilieis com Deus" (2 Co 5.20).
2. Homens de corações empedernidos são convidados —
Deus haverá de lhes tirar "o coração de pedra" e lhes dar um
"coração de carne" (Ez 36.26).
3. Homens que vivem deleitando-se alegremente ou
correndo loucamente para o caminho que conduz à morte são
convidados — Deus os chama a converterem-se: "Convertei-
vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos; pois por que
haveis de morrer?" (Ez 33.11)
4. Homens que estão dormindo o sono da morte são
convidados. Deus os chama: "Desperta, ó tu que dormes,
levanta-te de entre os mortos, e Cristo te iluminará" (Ef 5.14).
251

5. Homens que estão famintos são convidados. Deus lhes


fala acerca do pão que veio do céu. "Vinde… e comei" (Is 55.1).
6. Homens que estão sedentos também são convidados.
Deus os chama à água da vida, para que jamais tenham sede.
"Vem" é uma palavra de expectativa graciosa. Parece afirmar:
"Estou esperando por você. Eu me assento no trono de
misericórdia, esperando que você venha. Espero para ser
gracioso. Portanto, venha a mim".
"Vinde a mim" — onde Ele está? Não em algum lugar
geográfico. Onde Ele está? Mais próximo de você do que o
púlpito à frente de uma igreja. Mais próximo do que a ponta de
seus dedos. Ele está à porta de seu coração — seu ser mais
interior. Ele está onde quer que haja uma lágrima de
arrependimento, um soluço de tristeza produzido por Deus. Ali
Ele se encontra.
Onde quer que exista uma oração sincera — ali Ele está.
Onde houver um desejo sincero de orar — ali estará Jesus. Ele
está onde você está — pronto, capaz e disposto a dizer:
"Perdoados são os teus pecados".
A Necessidade de Vir a Cristo Agora
Venham, como a pobre mulher siro-fenícia — em
humildade. Tudo que ela desejava eram as migalhas que caíam
da mesa — um quadro de humildade. Ele está ali.
Venham clamando como o pobre cego Bartimeu - "Jesus,
filho de Davi tem compaixão de mim!" A multidão lhe disse:
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"Tem bom ânimo; levanta-te, ele te chama". Bartimeu lançou


fora a sua capa, para que nada pudesse impedi-lo — tudo que
ele queria era receber a visão. E ele ouviu Jesus dizer: "Vai, tua
fé te salvou".
Desejo convidar todos que ouvem essas palavras a virem.
Sim, se você está fora do caminho — convido-o a vir. Venha a
Cristo.
Gosto muito da palavra "vinde". Para mim, ela parece cheia
de graça, misericórdia e encorajamento. "Vinde, pois, agora",
diz o Senhor através do profeta, "e arrazoemos… ainda que os
vossos pecados sejam como a escarlata, eles se tornarão brancos
como a neve" (Is 1.18). "Vem" é uma palavra de encorajamento
bondoso. Ela parece dizer: "Tenho tesouros para dar-lhe, se
você simplesmente quiser recebê-los. Então, venha a mim".
"Vem" é a última palavra da Bíblia dirigida aos pecadores
— "O Espírito e a noiva dizem: Vem!" Vem é a palavra de
convite misericordioso. Ela parece dizer: "Eu quero que você
escape da ira vindoura. Estou disposto a ajudar, para que
ninguém pereça. Não tenho prazer na morte do ímpio. Então,
venha a Mim".
"Vem" é uma palavra de expectativa graciosa. Parece
afirmar: "Estou esperando por você. Eu me assento no trono de
misericórdia, esperando que você venha. Espero para ser
gracioso. Portanto, venha a mim".
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"Vem" é uma palavra de encorajamento bondoso. Ela


parece dizer: "Tenho tesouros para dar-lhe, se você
simplesmente quiser recebê-los. Então, venha a mim".
Meu querido amigo, peço-lhe que ouça essas palavras e
guarde-as em seu coração. Imploro em nome do Mestre. Estou
escrevendo como um embaixador. Rogo-lhe que venha e seja
reconciliado com Deus.
Peço-lhe que venha com todos os seus pecados, não
importa quantos sejam. Se vier a Jesus, Ele os removerá. Se
esperar, a oportunidade passará, a porta de misericórdia será
fechada, e você morrerá em seus pecados. Venha agora. Venha
a Jesus Cristo agora.
Você pode freqüentar à igreja, participar da ceia do Senhor,
dirigir-se ao pastor e, assim mesmo, não estar salvo. Vir ao
Salvador é realmente necessário — vir à Fonte e lavar-se no
sangue da expiação. A menos que você faça isto, morrerá em
seus pecados. E, como Joseph Hart o afirmou corretamente em
seu hino:
Vem, pecador pobre e infeliz,
Fraco e machucado, doente e entristecido;
Para te salvar, Jesus espera, amoroso,
Cheio de misericórdia, bondade e perdão;
Para te salvar, Ele é todo-poderoso.
Vem, necessitado, e sê bem recebido.
Com verdadeira fé e arrependimento,
glorifica o dom gratuito de Deus;
Sem dinheiro, vem a Jesus e compra
as graças dEle para aproximar-Se dos seus.
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Vem, cansado e sobrecarregado,


pela Queda ferido e arruinado.
Se demoras, até que melhor te tornes,
a Jesus nunca virás.
Não aos justos, não aos justos,
E sim aos pecadores veio Jesus chamar.
Não te faça retardar a consciência,
nem os teus sonhos sem fundamentos.
Ele exige que percebas: dEle tu precisas tanto.
E para isto Ele provê o meio:
O brilho esclarecedor do Espírito Santo.
Oh! O Deus encarnado, que subiu aos céus,
pleiteia os méritos de seu sangue.
Entrega-te totalmente a Ele e a nenhum outro Senhor
Pois somente Jesus e tão-somente Ele
pode tornar bom o mau e pobre pecador.
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A verdade vem de Deus, onde quer que a encontremos, e é nossa, é
da igreja... Richard Sibbes

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