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Dos pacientes adultos hospitalizados, 25% têm diabetes. Hiperglicemia no paciente internado
está associado a maior tempo de internação e mais complicações. O documento trata
exclusivamente do manejo de glicemia fora da UTI.
Tabela 1
Insulinas rápidas e basais
A nomenclatura dos esquemas de insulina não é consensual. A diretriz aborda esse problema
trazendo uma sessão com definições:
Esquema móvel (sliding scale): abordagem reativa baseada nos níveis de glicemia.
Costumeiramente, as glicemias são medidas em horários fixos (6 em 6 ou 4 em 4 horas)
e não são sincronizadas com a alimentação. Doses progressivas de insulina rápida são
administradas a depender do valor da glicemia, sem individualizar para a sensibilidade
de cada paciente à insulina. Exemplo: glicemia entre 150 e 200 - administrar 01 unidade
de insulina; glicemia entre 200 e 250 - administrar 02 unidades de insulina e assim
sucessivamente.
Insulina de correção (correction insulin therapy): similar ao esquema móvel, porém
necessariamente vinculada a glicemias pré-prandiais. Se for necessária, a insulina
rápida é administrada sempre antes da refeição.
Insulina de horário (scheduled insulin therapy): combinação de insulina basal (ação
intermediária ou longa) com insulina prandial pré-refeição (rápida ou ultra-rápida).
Esquema basal bolus (BB): o esquema BB é um tipo de insulina de horário. A insulina
basal é administrada uma a duas vezes por dia. A insulina rápida é feita pré-refeição e a
dose tem dois componentes: prandial e correção. O componente prandial corrige o
incremento de glicemia que a própria refeição vai causar. A correção atua na glicemia
que já está elevada antes da refeição. Exemplo:
o O paciente tem um esquema de correção da seguinte forma: "glicemia entre 150
e 200 - administrar 01 unidade de insulina; glicemia entre 200 e 250 -
administrar 02 unidades de insulina". Para ilustrar, suponhamos que antes do
almoço a glicemia é de 223 mg/dL e que para cobrir essa refeição serão
necessárias 3 unidades de insulina. A dose de insulina rápida antes do almoço
será de 5 unidades: 3 unidades para atuar na carga glicêmica da refeição
(componente prandial) e 2 unidades para corrigir a glicemia pré-refeição que já
está elevada (componente de correção).
Monitorização da glicemia
A recomendação 1 é sobre monitorização da glicemia: "em pacientes hospitalizados com
diabetes tratados com insulina e em risco de hipoglicemia, nós sugerimos monitorização
contínua da glicemia (MCG)". Para ajustes na dose de insulina, deve-se confirmar os valores
com glicemia capilar na beira do leito.
A MCG é feita com um aparelho fixado na pele que faz leituras de glicose a cada 5 a 15
minutos. Parece detectar mais eventos de hipoglicemia e melhorar o controle. A equipe deve ser
treinada antes da implementação dessa medida.
Hiperglicemia induzida por corticóides
A recomendação 2 aborda hiperglicemia induzida por corticóides: "em pacientes hospitalizados
que desenvolvem hiperglicemia enquanto recebem corticóides, nós sugerimos manejo de
glicemia com um esquema baseado em NPH ou BB".
As evidências não são claras se existe uma estratégia melhor nesse contexto. O documento
enfatiza que o mais importante é abordar a hiperglicemia induzida por corticóides do que saber
o esquema de insulina ideal.
É necessário cuidado quando a terapia com corticoides for reduzida ou suspensa, pela chance de
hipoglicemia. Especialistas sugerem escolher a insulina baseada no perfil farmacodinâmico do
corticoide. Apesar do sentido teórico, essa estratégia precisa de mais estudos. Aqui uma diretriz
sobre o tema com detalhes de doses e titulação da insulina.
Bomba de insulina e educação em diabetes
Tabela 3
Conversão de infusão de insulina subcutânea contínua para insulina basal-bolus
A recomendação 3 é sobre manter a bomba de infusão subcutânea de insulina no hospital. Se a
equipe for treinada para esse manejo, a orientação é manter. Se não houver treino, sugere-se
mudar para esquema BB se a previsão é de uma internação de mais do que 1 a 2 dias. Para fazer
a transição da bomba de infusão para o esquema BB, as configurações da bomba precisam ser
consultadas. A diretriz traz uma sugestão conforme a Tabela 3.
A recomendação 4 trata de educação em diabetes. Deve-se fornecer capacitação em
diabetes para o paciente antes da alta. Um programa de educação bem feito é capaz de
melhorar a hemoglobina glicada (HbA1C) e reduzir novas admissões.
Todo programa de educação tem que tocar no mínimo nos seguintes pontos:
Como administrar as medicações
Como monitorizar a glicemia
Plano alimentar básico
Prevenção, identificação e tratamento de hiper e hipoglicemia
A quem recorrer em casos de emergência, preocupações ou dúvidas
A glicemia entre 100 a 180 mg/dL deve ser atingida em 1 a 4 horas antes da cirurgia. Se não for
possível HbA1C na meta, pelo menos a glicemia pré procedimento deve estar no intervalo
sugerido.
Níveis mais altos desses parâmetros se relacionam com maior tempo de internação e
infecção de sítio cirúrgico.
Nutrição enteral e glicemia
A recomendação 6 toca no manejo de hiperglicemia no paciente em alimentação enteral. Os
autores sugerem que tanto pode ser o esquema BB como um baseado em NPH. Não parece
haver diferenças importantes.
A escolha da estratégia é influenciada pela maneira que a dieta é administrada. Quando a
dieta é feita em bolus, o paciente recebe uma insulina basal e uma rápida com componente
prandial e correção antes de cada bolus de dieta. Se a dieta é contínua, a insulina lenta pode ser
feita para atender a 50% da demanda diária de insulina e a insulina rápida de correção baseada
em glicemias de horário (4 em 4 ou 6 em 6 horas) [1].
Antidiabéticos orais no hospital
A recomendação 7 traz o tópico bastante debatido de uso de antidiabéticos no hospital: "na
maioria dos pacientes, nós sugerimos utilizar insulina ao invés de terapias não insulínicas".
São poucas as evidências nesse tema. Alguns estudos encontraram incidência alta de náuseas e
vômitos com análogos da GLP-1 (os glutides) e aumento do risco de hipoglicemia com
sulfoniluréias. Em pacientes estáveis antes da alta, é razoável começar terapias não insulínicas.
Os autores colocam que, se o quadro for leve em pacientes selecionados, os inibidores de
DPP4 (as gliptinas) são uma opção. Esses pacientes são os que possuem HbA1C < 7,5;
glicemia < 180 mg/dL e dose total de insulina antes da internação menor que 0,6 UI/kg. Se a
glicemia se mantiver acima de 180 mg/dL, deve-se iniciar insulina.
Bebidas com carboidratos e contagem de carboidratos
Na recomendação 8, a diretriz orienta não administrar bebidas com carboidratos antes de
cirurgias em pacientes com diabetes. Essa medida faz parte do protocolo Enhanced Recovery
After Surgery (ERAS). A ideia dessa intervenção é que o carboidrato seria capaz de minimizar a
resistência insulínica e catabolismo induzidos pelo estresse cirúrgico. Esse benefício é teórico e
a intervenção pode ter malefícios, assim não deve ser feita.
A recomendação 9 é sobre contagem de carboidratos (CC). A CC é um método para calcular a
dose de insulina prandial. A dose de insulina varia em função da carga glicêmica da refeição. Se
o paciente não precisava de insulina antes da internação, o documento sugere não utilizar CC.
Se o paciente utilizava insulina antes, a diretriz sugere que tanto faz utilizar CC ou realizar uma
dose fixa.
Esquema de insulina no paciente internado
A recomendação 10 é a mais aguardada e trata sobre o esquema ideal de insulina para manejo
da hiperglicemia dentro do hospital. A diretriz divide a recomendação em três:
Em pacientes sem diabetes com glicemia > 140 mg/dL, sugere-se terapia inicial com
insulina de correção. Se o paciente tiver dois ou mais episódios de glicemia > 180
mg/dL no período de 24 horas, deve-se acrescentar insulina de horário.
Em pacientes com diabetes tratados com terapias não insulínicas, sugere-se tanto
insulina de correção ou insulina de horário. Se a glicemia da admissão for > 180 mg/dL,
sugere-se iniciar insulina de horário. Se o paciente tiver dois ou mais episódios de
glicemia > 180 mg/dL no período de 24 horas apenas com insulina de correção, deve-se
acrescentar insulina de horário.
Em pacientes que já usavam insulina previamente à internação, recomenda-se
manter o esquema de insulina de casa ajustado para o estado nutricional e gravidade da
doença.
Redução na dose de insulina basal em 10 a 20% podem ser necessárias em pacientes que
usavam uma dose de insulina basal > 0,6 UI/kg.
A meta é deixar a glicemia entre 100 e 180 mg/dL.
Um dos estudos que norteia a meta de glicemia é o NICE-SUGAR, publicado no New England
Journal of Medicine em 2009. Realizado no ambiente de terapia intensiva, esse trabalho
comparou uma meta de glicemia entre 81 e 108 mg/dL contra menor que 180 mg/dL. A meta
menor que 180 mg/dL teve menor mortalidade.
O esquema de correção não é suficiente para controlar a glicemia em muitos pacientes. Várias
evidências concordam nesse sentido, entre elas o estudo RABBIT 2 publicado em 2007.
Comparando esquema móvel com BB, esse artigo encontrou que o BB melhorou o controle
glicêmico.
Contudo, parece existir espaço para a insulina de correção isoladamente em alguns pacientes.
Esse estudo observacional publicado em 2021 encontrou que pacientes com hiperglicemia leve (
< 180 mg/dL) podem ter bom controle com insulina de correção apenas. Esse estudo foi
repercutido no nosso especial de melhores artigos de 2021.