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UNIVERSIDADE LUSÍADA

Departamento de Direito
INTRODUÇÃO À ECONOMIA
Cursos de Direito, de Solicitadoria e de Relações Internacionais
(1.º Ano - 1.º Semestre)
Ano 2017-2018.
Sumários desenvolvidos

Regente: Guilherme d'Oliveira Martins

NOTA - Os sumários que se seguem constituem apenas e fundamentalmente um roteiro


de estudo. Não se trata de uma exposição exaustiva da matéria. São, assim, um instrumento
importante mas nunca exclusivo, designadamente para o acompanhamento tutorial. De
modo sintético, indica-se os temas, as referências fundamentais e, no final de cada capítulo,
a bibliografia. O método usado obriga, assim, a uma preparação e acompanhamento
permanentes das aulas e a um contacto constante com os elementos de estudo (sumários,
notas sobre as aulas, bibliografia fundamental, trabalhos práticos). Só considerando os
sumários como um roteiro ou guião poderemos retirar deles a sua plena utilidade. G.O.M.

Capítulo VI
Procura nos mercados concorrenciais

6.1 A escolha do consumidor, indiferença e restrição orçamental.


6.2 Utilidade, eficiência e bem-estar.
6.3 Utilidade marginal.
6.4 As leis de Gossen.
6.5 Consumo, poupança e rendimento.
6.6 Consumo, investimento e despesa.

CAPÍTULO VI - A procura nos mercados concorrenciais

6.1. A escolha do consumidor e curvas de indiferença.

As escolhas dos consumidores têm em consideração os axiomas das preferências, que


pressupõem a permanente realização de escolhas, a partir de comparações entre bens ou
conjuntos de bens. O consumidor vê-se, assim, sempre confrontado com a necessidade de
verificar qual a fronteira do seu rendimento para efeito da realização de escolhas e dentro
dessa fronteira, também já analisada, poderá encontrar os recursos ou as combinações de
recursos indispensáveis para uma satisfação equilibrada das suas necessidades.

Vilfredo Pareto (1848-1923) estudou as condições em que o equilíbrio económico acaba


por se estabelecer. Dentro dessa preocupação chegou à elaboração das curvas de
indiferença - expressão gráfica das combinações de bens que proporcionam aos
indivíduos satisfações idênticas. Nesse sentido, a vida económica representar-se-ia como a
ascensão de uma colina em que as curvas de indiferença apareceriam como se fossem as
curvas de nível - unindo os pontos que correspondem a uma satisfação idêntica de
necessidades. Os sujeitos económicos procuram, assim, entre os vários caminhos que lhes
estão facultados, aquele que vai permitir dentro dos rendimentos de que dispõem atingir a
curva de nível que corresponda a uma melhor satisfação das necessidades. Procura-se, deste
modo, encontrar uma base matemática rigorosa, para evitar o subjetivismo de algumas
construções marginalistas e para responder à dificuldade que existe em medir a utilidade.

Por definição, a curva de indiferença mais elevada será aquela que é tangente à fronteira
de escolhas, também designada como reta da restrição orçamental, isto é, a que num
determinado ponto coincide com o valor mais elevado que é consentido pela limitação
orçamental. Nesse ponto, a curva de indiferença coincide com a inclinação da reta de
fronteira de escolhas, coincidindo os valores que ambas exprimem. E uma vez que estamos
a comparar dois tipos de bens (bens alimentares e bebidas, livros e discos) temos que a
taxa marginal de substituição coincide com o seu preço relativo.

Importa aqui relembrar o que se disse sobre os conceitos de efeito de rendimento e efeito
de substituição. Aqui os reencontramos. Se o rendimento aumenta as curvas de indiferença
deslocam-se para a direita. Perante bens sucedâneos e perante escolhas alternativas o preço
e a quantidade são decisivamente influenciados pelo efeito da substituição.

6.2. Utilidade, eficiência e bem-estar.

A utilidade, tal como tem sido analisada pela Ciência Económica, corresponde à
suscetibilidade de um bem ou serviço satisfazer necessidades humanas. Quando um
comprador se dispõe a trocar um bem por outro fá-lo tendo em consideração as
necessidades que este visa satisfazer. A utilidade esperada de um bem ou serviço vai pesar
decisivamente na concretização da troca e na atribuição de um valor ao bem ou serviço que
se pretende adquirir. O consumidor e o produtor partem, porém, de considerações
diferentes. Enquanto o produtor visa ressarcir o custo de produção e obter um lucro, o
consumidor visa obter nas melhores condições de quantidade e preço o bem ou serviço
que procura. De um lado, o produtor deseja poder vender mais, a um preço mais elevado,
do outro, o comprador anseia por poder comprar mais quantidade a um preço mais baixo.
Por força do mercado, ambos resignam-se à situação de equilíbrio.

A eficiência no mercado corresponde ao equilíbrio global obtido no conjunto das trocas


realizadas, ao bem-estar obtido pela comunidade, considerando os interesses conjugados
dos produtores e dos consumidores bem como a coesão social, à sustentabilidade da
atividade produtiva, enquanto criadora de riqueza, e ao nível de satisfação das necessidades
por parte da procura. Nesse sentido, o mercado deve constituir o instrumento regra de
regulação da economia - enquanto for o melhor fator de eficiência.

A análise do bem-estar revela-se fundamental na Ciência Económica moderna, uma vez


que é indispensável saber-se qual a repercussão prática para os sujeitos económicos
individualmente considerados e para a comunidade da atividade económica, do
funcionamento do mercado e do modo como as necessidades são satisfeitas. Como já
vimos, o comprador só adquirirá o bem que deseja se entender que a troca em causa vale a
pena. Se aquele que tiver de dar for mais do que compensado pelo benefício que lhe vem
da aquisição e se o sacrifício efetivo ficar aquém do sacrifício que o sujeito admitiria fazer
para ter acesso ao bem, então a transação pode realizar-se. A curva descendente da procura
é definida pelos diversos pontos correspondentes a uma utilidade decrescente e à
correspondente disposição para pagar.

O excedente do consumidor é, assim, a diferença entre a disposição de pagar o valor


atribuído pelo consumidor a um bem, e aquilo que é efetivamente pago - é, pois, o
montante líquido que corresponde ao acréscimo de bem-estar que o comprador obtém
através das trocas. Para compreendermos melhor este conceito, importa, porém, atermo-
nos ao conceito de utilidade marginal.

6.3. Utilidade marginal. As leis de Gossen.

Em 1730, já Johann Bernoulli (1667-1748) tinha notado que o apreço dado por um sujeito
económico a uma unidade de moeda era inversamente proporcional ao número das
unidades de que dispunha. Só em meados do século XIX, porém, é que o conceito de
utilidade marginal surgiu como fundamento de valor económico e como critério de
apreciação da atividade económica em geral.

Hermann Heinrich Gossen (1810-1858) escreveu a obra “Exposição das leis nas relações
humanas e das regras que delas derivam para as ações do Homem”, que não foi bem
recebida na sua época, na qual afirmava que seria preciso desfrutar da vida de tal modo que
a soma das satisfações obtidas no decurso da existência atingisse o máximo. Esse seu credo
utilitarista assenta na ideia de que desse modo se cumpriria a vontade do Criador. Para H.
Gossen:

(a) A intensidade de uma dada satisfação, à medida que se prolonga no tempo, vai
diminuindo até à saciedade;

(b) O sujeito económico pode escolher entre várias satisfações, mas não tem a
possibilidade de as alcançar todas de uma maneira completa; por isso, ainda que possa
haver grandes diferenças absolutas, para alcançar o máximo possível de satisfação, tem
de as desfrutar a todas parcialmente e de tal maneira que a intensidade de cada uma
seja, no momento em que cessa, igual às demais.

Por outro lado, quando a satisfação se renova, verifica-se a repetição da tendência para a
diminuição de intensidade até à satisfação - mas no primeiro momento da segunda
satisfação a intensidade é menor do que em correspondente momento da primeira, pelo
que a saciedade se atinge mais rapidamente; estas diferenças são tanto maiores quanto mais
frequente se torna a satisfação.

Para Gossen, o sujeito económico só pode, assim, aumentar a sua satisfação total na
medida em que o prazer provocado pelas coisas produzidas for maior do que o sacrifício
imposto pelo esforço de trabalho necessário a essa criação. E foi assim que H. Gossen
formulou, pela primeira vez, o conceito de desutilidade - o sacrifício feito para além da
satisfação de uma necessidade.
Stanley Jevons (1835-1882), Carl Menger (1840-1923) e Léon Walras (1834-1910), autores
da chamada escola marginalista, vieram a desenvolver com critérios científicos a teoria
lançada por Gossen. Jevons defendeu que o valor de um bem dependeria da utilidade
combinada com a raridade. O valor das coisas dependeria, assim, do grau final de
satisfação que permitiriam obter. Uma vez que as diversas unidades de uma coisa não
podem deixar de ter todas o mesmo valor, é esse grau final que o determina.

Partindo das leis de Gossen, Carl Menger demonstrou como a apreciação individual das
coisas ou valor de uso (por contraponto ao valor de troca) dependeria da raridade e não
da utilidade stricto sensu. Nessa perspetiva, a utilidade final determina o valor dado a todas
as outras unidades do mesmo bem, uma vez que será sacrificada se o sujeito económico se
vir privado de qualquer delas.

Carl Menger apresentava, assim, um quadro modelo das utilidades decrescentes, que a
seguir apresentamos. Cada número romano representa uma necessidade a satisfazer e os
algarismos árabes exprimem a intensidade da satisfação ou o grau de utilidade que o
sujeito económico vai atribuindo a cada unidade do bem em causa.

Os sujeitos procuram ordenar a aplicação dos recursos de que dispõem de forma a


conseguirem graus de satisfação marginais idênticos em relação a todas as necessidades.
Este entendimento da utilidade final, a que Friedrich von Wieser (1851-1926) chamou
utilidade marginal, explica o chamado paradoxo do valor, já formulado por Adam
Smith e pelos clássicos.

O diamante vale mais do que um bem alimentar para os que têm possibilidade de satisfazer
amplamente todas as suas necessidades, mas já não para os que não têm as suas
necessidades básicas satisfeitas. Correspondendo a linha V às necessidades satisfeitas pelos
diamantes, verifica-se que estes só entrariam em concorrência com os bens alimentares, da
linha I, a partir do valor 5, mas não antes.

O paradoxo do valor esclarece a distinção entre valor de uso e o valor de troca. Com o
princípio da utilidade marginal é possível explicar a formação do valor de troca em direta
correspondência com o conceito económico de utilidade. O valor de troca representa as
proporções nas diversas quantidades de bens quando se realizam permutas para que se
proceda ao nivelamento das utilidades dos diferentes bens afetos à satisfação das diversas
necessidades.
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10 9 8 7 6 5 4 3 2 1
9 8 7 6 5 4 3 2 1 0
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Partindo da utilidade marginal - base do valor como apreciação subjetiva dos bens – F.
von Wieser chegou aos conceitos de utilidade total e de valor total. Utilidade total será a
soma das utilidades potenciais de cada unidade, ou seja, daquelas que a cada uma caberiam
se fossem as últimas. E o valor total é o resultado da multiplicação da utilidade marginal
pelo número de utilidades disponíveis de um bem. Assim, enquanto a utilidade marginal
decresce à medida que aumenta o número de unidades disponíveis, a utilidade total
aumenta à medida que aumenta o número de unidades disponíveis, mas em proporção
decrescente. Já o valor total aumenta com o número de unidades até ao ponto em que o
decréscimo da utilidade marginal compense, no produto, aquele aumento - mas o valor
reduz, até poder chegar a zero, quando os bens se tornem livres, por deixarem de ser raros.

O conceito de utilidade total é relevante para se saber qual a diferença entre a utilidade
efetivamente recebida e a utilidade subjetiva dos bens - enquanto o conceito de valor total
permite explicar como a troca pode ser vantajosa para todos os intervenientes no mercado
e como se estabelecem os valores relativos dos diversos bens dos mercados.

Quanto ao valor de mercado, F. von Wieser distinguia valor efetivo e valor natural. O
valor efetivo é aquele que se estabelece de facto, correspondendo ao nivelamento das
satisfações marginais no grau que cada sujeito pode obter, com o poder de compra que
tem. O valor natural é o que viria a estabelecer-se se o poder de compra se encontrasse
igualmente distribuído, assegurando um nivelamento geral das utilidades marginais.

Podemos deste modo compreender melhor a importância do conceito de excedente do


consumidor, que procura fornecer uma base objetiva de avaliação dos efeitos das opções
económicas sobre o bem-estar. Não se trata de considerar apenas o peso das preferências
dos consumidores, mas de ter em consideração o funcionamento concreto do mercado e o
acréscimo de bem-estar daí resultante. Veremos, por isso, adiante os conceitos de ótimo e
de equilíbrio - para apurar se um acréscimo de bem-estar se faz ou não à custa do
sacrifício da satisfação das necessidades de algum ou alguns sujeitos económicos.

6.4. Consumo, poupança e rendimento.

Reportando-nos ao conceito de rendimento, que se refere aos recursos económicos


auferidos pelos sujeitos em resultado do desenvolvimento da vida económica, temos a
distinguir duas componentes fundamentais, o consumo e a poupança. O rendimento
refere-se, assim, a essas duas realidades – ou realizamos atividades que correspondem ao
consumo ou reservamos uma parte do rendimento para o aforro, adiando o ato de
consumo ou prevenindo a cobertura de um risco futuro (velhice ou doença). Daí que uma
unidade marginal de rendimento seja divisível, no tocante à tendência para consumir ou
poupar, respetivamente, entre propensão marginal para consumir e propensão marginal
para poupar, que adiante estudaremos.

Na vida económica o consumidor vê as suas atitudes e comportamentos serem


influenciados não apenas pelas suas preferências, mas pelas repercussões dos fenómenos
que constituem a criação de bens e serviços aptos a satisfazerem necessidades. O que
vimos sobre as decisões do consumo também serve para analisarmos a escolha de um
ponto de equilíbrio entre o trabalho e o lazer. O que cada um dispõe para consumir
depende do trabalho e da remuneração auferida. Assim, as decisões no mercado de bens e
serviços são influenciadas pelas decisões no mercado de fatores produtivos, a começar no
trabalho.
Se recordarmos o quadro referente ao circuito económico, verificamos que entre as
empresas e as famílias, estas não se limitam a comprar bens e serviços e a pagá-los, uma vez
que também prestam trabalho nas referidas empresas, recebendo salários por essa
atividade. Um mesmo aumento da remuneração por hora pode ter em dois trabalhadores
efeitos diferentes. A pode trabalhar mais para conseguir obter um rendimento maior, que
lhe permita melhorar o bem-estar, adquirindo, por exemplo, uma casa própria. B pode
trabalhar o mesmo, limitando-se a obter o ganho correspondente ao acréscimo da hora de
trabalho, e satisfazendo-se desse modo. C pode trabalhar menos, limitando-se a manter o
rendimento auferido anteriormente e dedicando-se mais ao lazer.

A teoria da escolha do consumidor aplica-se também à poupança. Quem poupa


voluntariamente faz uma escolha entre um consumo presente e um consumo futuro. Este
consumo futuro pode significar segurança na velhice ou reunião de meios para adquirir
algo de que necessita (casa, automóvel). As taxas de juro, através das quais o sistema
bancário remunera o capital, podem ter uma importância grande aqui. Mas a simples subida
da taxa de juro não garante aumento do nível de poupança. Tudo vai depender dos efeitos
de substituição e do efeito de rendimento. A poupança pode aumentar se forem
encontrados bens sucedâneos que permitam manter os níveis de bem-estar. Mas poderá
diminuir se o efeito de rendimento funcionar induzindo um aumento de consumo, já que a
tendência para consumir será superior nos rendimentos mais baixos do que nos
rendimentos mais elevados.

E se falamos de poupança, teremos também de falar de investimento, uma vez que a


diminuição do consumo pode traduzir-se não só em crescimento da poupança, mas
também em incremento do investimento e da criação de riqueza. Os particulares têm à sua
disposição diversas opções quanto a investimento, p. ex. depósitos bancários, habitação
própria, ações, obrigações, fundos de investimento.

6.5. Consumo, investimento e despesa.

Se nos reportarmos ao conceito de despesa, que se refere aos recursos económicos pagos
pelos sujeitos em resultado do desenvolvimento da vida económica, temos a distinguir duas
componentes fundamentais, o consumo e o investimento. A despesa refere-se, assim, a
essas duas realidades – ou realizamos atividades que correspondem ao consumo (e aqui há
um elemento comum ao rendimento – Despesa igual a Consumo mais Investimento;
Rendimento igual a Consumo mais Poupança) ou reservamos uma parte da despesa para o
investimento, procurando criar nova riqueza. Como veremos mais adiante, esse
investimento tem um carácter reprodutivo, articulando os diferentes fatores de produção e
criando nova riqueza. Verifica-se, deste modo, que uma relação tendencial de
correspondência entre os conceitos de Despesa e de Rendimento e entre a Poupança e o
Investimento. No entanto, como veremos noutro passo, essa identidade é tendencial,
registando normalmente desajustamentos, que permitem compreender que a vida
económica oscila permanentemente entre o equilíbrio e o desequilíbrio. De facto, o
equilíbrio, ao contrário do que pensava a escola clássica, não é uma constante, mas uma
situação transitória – tal como acontece numa balança de pratos, em que há uma
instabilidade permanente, que não põe em causa uma tendência estrutural. Os agregados
macroeconómicos são, assim, alvo de políticas de estabilização, que visam corrigir os
fatores que ponham em causa a referida tendência estrutural para o equilíbrio.
BIBLIOGRAFIA:

PEDRO SOARES MARTÍNEZ, Economia Política, Almedina, 1996 (Cap. III, pp. 105-126; Cap.
XI, pp. 758-790)
PAUL SAMUELSON, WILLIAM NORDHAUS Economia, MacGraw Hill, Queluz, 2005 (pp. 84-
106).
JOÃO CÉSAR DAS NEVES, Introdução à Economia, Verbo, Lisboa, Reimp. 2005 (Parte 2, pp.
103-136).
FERNANDO ARAÚJO, Introdução à Economia, Almedina, Coimbra, 2005 (Cap. 6).
ALEXIS DE JACQUEMIN, H. TULKENS, P. MERCIER, Fondements d'Économie Politique, De
Boek, 2001 (Cap. 3, 7, 8).

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