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A CESSÃO DE CRÉDITOS: REFLEXÕES SOBRE A CAUSALIDADE

NA TRANSMISSÃO DE BENS NO DIREITO BRASILEIRO

Rodrigo Xavier Leonardo*

RESUMO: Inicia-se ente ensaio por uma reflexão do direito das obrigações em sua estrutura
e função, perspectivado a partir da lógica formal e do direito natural e, posteriormente, por
uma crítica às concepções tradicionais do direito das obrigações. Aproxima-se, a partir de
então, do tema por intermédio de uma reflexão sobre o discurso histórico e a cessão de
créditos, objetivando demonstrar como a transmissibilidade de créditos, nalguma medida,
projeta escolhas fundamentais do direito das obrigações. Neste diapasão, a seguir, analisa-se
o crédito como valor para compreender as justificativas de sua transmissibilidade nos tempos
modernos. Por fim, procura-se analisar a cessão de créditos no direito brasileiro, investigando
sua natureza jurídica e, sobretudo, questionando sobre a sua abstratividade ou causalidade.

INTRODUÇÃO que, em sua Filosofia do direito, escreveu


que “elles sont demeurées (les obligations)
O direito das obrigações até não muito
comme des colomnes inébranlables de
tempo atrás era identificado como um ramo
jurisprudence, autor de queles se railient
do direito privado cujas estruturas e funções
tout les principes”.1
seriam um tanto quanto estáticas em face da
Eugène Gaudemet evidencia essa
dinâmica da economia.
impressão de imutabilidade ou, pelo menos,
Este prejulgamento da disciplina foi
de estabilidade preponderante das relações
apontado por vários pensadores modernos
jurídicas obrigacionais, pela assimetria
do direito. Giorgi Giorgi, para representar
entre o direito das obrigações e o meio social,
esta linha de reflexão, utiliza-se de Bélime
quando o regramento correspondente é

* Professor Substituto do Departamento de


1
BÉLIME . Philosophie du droit. V.IV. Apud
Direito Civil e Processual Civil da UFPR. Bacharel
em Direito pela UFPR. Mestre e Doutorando em GIORGI, J. Teoría de las obligaciones en el derecho
Direito pela USP. Advogado. moderno. v.VI. Madrid: Hijos de Reus, 1911, p.71.

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comparado com o direito das coisas e o Ao refletirmos sobre a cessão de crédito e
direito de família.2 a assunção de dívida – considerados como
O direito das coisas seria intimamente os principais fenômenos concernentes à
vinculado à organização política e social de transmissibilidades nas obrigações –, podemos
cada sociedade; o direito de família, por sua realmente encontrar muito mais do que uma
vez, estaria vinculado diretamente aos simples técnica para circulação do crédito.
aspectos mais íntimos da constituição moral Podemos encontrar um autêntico mecanismo
de uma nação e, por essa razão, passaria quase para geração de riquezas. E aqui, talvez, seja
imediatamente a refletir as mudanças de cada possível confrontar a tese da imutabilidade
tempo, em cada lugar. do direito das obrigações mediante uma
O direito das obrigações, todavia, investigação de um dos seus principais
permaneceria cristalizado pela lógica formal institutos: a cessão de créditos.
e por princípios da justiça natural, pois, na Depara-se, neste tema, com um dos mais
expressão de Gaudemet: “Quelle influence antigos conflitos entre o conceitualismo
des conceptions de cet ordre pourraient elles jurídico e as exigências da realidade. Por essa
avoir sur les droits d’un vendeur, créancier razão, por intermédio dessa parte do direito
du prix?”.3 Isto ressaltaria, ainda, na aparente das obrigações, pode-se refletir sobre o todo
maior facilidade dos processos de unificação da disciplina e, porque não dizer, do próprio
dos princípios do direito das obrigações, direito privado.
aproximadamente proposto pelo Unidroit,
dentre outros projetos em andamento, 1 O DISCURSO HISTÓRICO E A
direcionados à uniformização e até mesmo à REFLEXÃO SOBRE A CESSÃO
unificação dos contratos. DE CRÉDITOS
É importante destacar, no entanto, que
Giorgi e Gaudemet, autores do século XX, a O tema da transmissibilidade nas
despeito de reconhecer esse prejulgamento obrigações encontra-se de tal maneira
quanto a uma imutabilidade do direito das vinculado à noção jurídica de obrigação que
obrigações, não poupam críticas a essa leitura
da realidade.4 Estariam eles certos?
obligations, p.10). Giorgi, a seu tempo, identifica no
tema da transmissibilidade nas posições jurídicas
obrigacionais um sinal de falsidade do prejulgamento
2 GAUDEMET, É. Théorie genérale des obligations. quanto a imutabilidade neste ramo do direito privado:
Paris: Sirey, 1965, p.10. “(...) cuando Bélime ensalzaba la inmutabilidad de la
teoría de las obligaciones, no pensaba, seguramente, en
3 GAUDEMET, Théorie genérale des obligations, el maravilloso desenvolvimiento que, con lento pero
p.10. incesante progreso, ha sufrido la transmisión de los
4 Para Gaudemet “(...) si le droit des obligations créditos, ni en la enorme distancia que lo mismo en el
est moins intimement lié que les autres à l’évolution orden teórico que en el práctico separa las antiguas y
politique et morale, il est intimement lié à une autre poco expeditas formas de transmisión de la sencilla y
évolution, politique et morale, il est intimement lié à expedita transmisión de los títulos á la orden y al
une autre évolution, plus lente, mais tout aussi réelle, portador, las manifestaciones más útiles del genio
et singulièrement accélérée depuis un siècle, l’evolution económico en el campo de las obligaciones (GIORGI,
commerciale ou, plus généralement, l’évolution J. Teoría de las obligaciones en el derecho moderno.
économique” ( GAUDEMET , Théorie genérale des v.VI. Madrid: Hijos de Reus, 1911, p.71).

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se mostra difícil traçar os correspondentes devedor eram essenciais para a manutenção
lineamentos históricos pertinentes a um sem do vínculo obrigacional, 8 de modo que
falar do outro. qualquer alteração desse elemento pessoal,
Para evitar adentrar à fatigosa discussão seja no pólo ativo, seja no pólo passivo, na
sobre a noção jurídica de obrigação,5 propõe-se relação jurídica, implicaria a alteração da
partir de seu elemento mais reluzente: o
própria relação jurídica.9
vínculo jurídico.
Mas por qual razão o Direito Romano –
A própria palavra “obrigação” conduziria
tão afeito às soluções práticas ao invés
à idéia de vínculo. Obrigação, atenta
do conceitualismo –, teria negado tão
Josserand,6 provém do latim ob + ligatio. Daí
veementemente as vantagens negociais
o elemento vínculo ser eternizado na clássica
definição encontrada nas Instituições de decorrentes da circulação de créditos e
Justiniano: “obligatio est juris vinculum, de dívidas?
quo necessitate adstringimur alicujus Para além da simples explicação do
solvendae rei”. fenômeno pelos efeitos dele decorrentes e
Há unissonância entre os autores romanistas, sem descuidar dalgumas precauções
partindo das fontes que lhe são acessíveis, metodológicas para a reflexão crítica por
que em direito romano essa ligação ou vínculo intermédio do discurso da história do
caracterizava-se por ser personalíssimo,
inexistindo um mecanismo de direito material
para a sucessão singular de créditos e de
conseguente transformazione dell’obligatio ancora
dívidas.7 A pessoa do credor e a pessoa do nel pensiero della giurisprudenza classica i soggetti
del rapporto obbligatorio sono immutabili, e di regola
i diritti di credito non sono transferibili da persona a
5 Procuramos desenvolver considerações sobre persona, a titolo particolare” (ASTUTI, G. Cessione
este tema noutra oportunidade, LEONARDO, R. X. (storia). In: Enciclopedia del diritto. t.VI. Milano:
Direito das obrigações: em busca de elementos Giuffrè, ano, p.806). Max Kaser, por sua vez, explica
caracterizadores para compreensão do livro I da parte que: “a transmissão do crédito por uma pessoa a
especial do Código Civil.In: CANEZIN, C. C. (Org.). outra (subsistindo a obrigação) não era permitida
Arte jurídica: Biblioteca científica do programa de aos Romanos por mudança de credor, porque em
pós-graduação em Direito Civil e Processo Civil da Roma os direitos (subjectivos), ao menos os
Universidade Estadual de Londrina. v.I. Curitiba: derivados de um crédito, estavam vinculados ao seu
Juruá, 2005, p.277. titular e não eram transmissíveis a outrem por
sucessão individual” (KASER, M. Direito privado
6 JOSSERAND , L. Cours de droit civil positif
romano. Lisboa: Calouste Gulbekian, 1999, p.304).
français. v.II. 12.ed. Pais: Sirey, 1933, p.2.
8 Para Tobeñas, “se pensaba que es de interés
7 Para Guido Astuti: “Il principio romano della
para el acreedor tener un deudor más solvente y
intransmissibilità delle obbligazioni si ricollega alla
honrado que otro, y no es indiferente al deudor
struttura tipica dell’actio in personam, e alla
tener un acreedor más compasivo, menos riguroso
concezione originaria dell’obligatio, come vincolo
que otro” (TOBEÑAS, J. C. Derecho civil español,
essenzialmente personale, caratterizzato dalla
común y foral. 8.ed. t.III. Madrid: Editorial Reus,
costrizione giuridica soggettiva del debitore per
1954, p.234).
l’adempimento della prestazione, configurato come
9GIORGI , J. Teoría de las obligaciones en el
atto volontario e direttamente incoercibile: ne
consegue che, pur dopo l’introduzione della derecho moderno. v.VI. Madrid: Hijos de Reus,
responsabilità e soddisfazione patrimoniale, e la 1911, p.71.

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direito,10 enumeram-se algumas razões para A explicação parece encontrar fundamentos
esse personalismo obrigacional. Em primeiro antropológicos numa lógica de reciprocidade
lugar, as próprias origens mais primitivas do verificável, segundo Rodolfo Sacco, nas
vínculo obrigacional seriam mágico- sociedades mais primitivas.12
religiosas, justificando-se o vínculo entre Em direito romano, a noção de vínculo
pessoas por uma concepção mística, tal como implicava atamento material da pessoa do
a idéia de punição divina contra aqueles que devedor, que poderia sofrer a execução
não respeitassem os efeitos próprios aos ritos pessoal, mediante a sujeição à escravidão
de ligação verbalizados sob os olhos da ou até a própria morte, nos casos de
divindade protetora e castigadora.11 descumprimento.13 Por essa razão, do lado
passivo, não parecia possível substituir a
pessoa do devedor, permitindo-se que uma
10 Parte-se, aqui, da advertência metodológia de
Ricardo Marcelo Fonseca que critica a re-construção
dos institutos de direito privado pela história do
direito mediante uma seqüência linear: “De fato, o mystérieux d’assujettissement serait d’abbord
estudo linear da história (e de modo particular da apparu. Ce qu’il était, on l’ignore. Puis serait intervenue
história do direito), que amontoa tudo o que já passou l’idée d’une vengeance divine contre celui qui ne
numa superposição harmônica e coerente de institutos respectait pas son engagement. Ici encore les formes
jurídicos através do tempo, acaba impondo uma de cette vengeance, ses manifestations restent dans
lógica ao passado que em verdade lhe é estranha, ao l’obscurité. Finalement, on serait passé du lien
mesmo tempo em que lança sobre a época pretérita magico-religieux au lien juridique” (GAUDEMET, J.
as questões, preocupações, valorações e ansiedades Naissance d’une notion juridique. Les débuts de l’
que pertencem ao presente (e ao cientista que produz <obligation> dans le droit de la Rome antique. In:
tal tipo de conhecimento)” ( FONSECA , R. M. Archives de philosophie du droit: L’Obbligation.
Modernidade e contrato de trabalho: do sujeito de Paris: Dalloz, 2000, p.27).
direito à sujeição jurídica. São Paulo: Editora LTr, 12 “L’home sacrifie au Dieu, Dieu assure sa
2002, p.26). Neste sentido, também Sérgio Said Staut
protection à l’homme. Le survivant rend le culte au
critica o historicismo no direito: “Essa maneira
mort, le mort donne son assistance au survivant. L’
‘tradicional’ e ‘positivista’ de entender o passado e
agriculteur exécute ses prestations en faveur de la
a História do Direito, chamada de historiciosmo,
terre, celle-ci lui donnera ses fruits. Dans les sociétés
causam geralmente duas graves distorções (...) o
africaines subsahariennes traditionnelles, la prestation
passado é utilizado simplesmente para justificar o
tributaire est spontanée, mais elle se croise avec
presente. É a lógica do presente que preside e se
l’attribution de terres faite par le chef. L’analyse
apropria de toda a investigação do passado; são
anthropologique nous fait voir une réciprocité
estabelecidas conexões diretas entre presente e
semblable dans la vengeance et jusque dans la guerre”
passado que não permitem visualizar as suas
( SACCO , R. À la recherche de l’origine de
descontinuidades” (STAUT, S. S. Algumas precauções
l’obligation. In: Archives de philosophie du droit:
metodológicas para o estudo do direito civil. Arte
L’Obbligation. Paris: Dalloz, 2000, p.36).
jurídica: Biblioteca científica do programa de pós-
13 “Según el derecho antiguo el deudor
graduação em Direito Civil e Processo Civil da
Universidade Estadual de Londrina. v.I. Curitiba: respondía del cumplimiento de sus obligaciones en
Juruá, 2005, p.306). primer lugar con su persona, aunque no fuera
11
exclusivamente. Si no podía satisfacer al acreedor la
“L’une met en avant des considérations
cantidad por la que hubiera sido condenado y no se
magico-religieuses, qui auraient joué un grand rôle
le eximía de la obligación de pagar, su suerte era el
dans une société encore <primitive> où régneraient
ser vendido como esclavo, y quizá la muerte, que
la violence et la peur. C’est ainsi que P. Huvelin
podía darle el acreedor” ( JÖRS , P.; KUNKEL , W.
suggérait, pour expliquer l’origine d l’obligation,
Derecho privado romano. Trad. L. Pietro Castro.
une première phase magico-religieuse. Un procédé
Barcelona: Labor, 1937, p.329).

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terceira pessoa, alheia à relação, ficasse afinal uma actio, este pudesse acionar o crédito,
exposta a tão graves males no caso de satisfazendo-se com o produto da cobrança.17
descumprimento; tampouco se mostrava A solução também comportava graves
conveniente a facilidade na substituição do incovenientes, pois, pelo menos até a
credor, que poderia resultar na troca de uma conclusão da litis contestatio, o outorgante
pessoa mais clemente por outra mais rigorosa. tinha possibilidade de revogar o mandato e,
Ademais, conforme explicação de Menezes credor que era, podia até mesmo extinguir o
Leitão, o formalismo na constituição das crédito transigir ou remitir a dívida, tudo isso
obrigações resultava na necessidade da sem contar com a possibilidade de buscar a
repetição de fórmulas rituais solenes pré- condenação do devedor. Se o outorgante
fixadas para qualquer alteração subjetiva na falecia, por sua vez, ou se falecia o outorgado,
relação obrigacional.14 extinguia-se o mandato.18
Para superar estas limitações, entre o
Sob essas circunstâncias, duas soluções
período clássico e pós-clássico do direito
surgiram para se alcançar o efeito prático da
romano, conferiu-se ao outorgado a chamada
transmissão de créditos e de dívidas em
direito romano: em primeiro lugar a novação
e, posteriormente, a transposição processual 17 Astuti esclarece que “Secondo le norme della
mediante mandatum in rem suam .15 procedura formulare, il cessionario-mandatario
Ambas apresentavam muitos inconvenientes. agiva alieno nomine, assumendo l’intentio dalla
persona del titolare del diritto, e chiedendo la
A novação, por intermédio da extinção da condemnatio a proprio favore (Gai. 4, 86 ) (ASTUTI,
relação jurídico-obrigacional originária pela Cessione (storia), p.807. Menezes Leitão, por sua
constituição de uma nova, conduzia a uma vez, explica que “No direito romano, a solicitação
de representação processual como cognitor ou
desfavorável e inevitável extinção das procurator tinha natureza abstracta, ainda que a ela
garantias, sem contar a limitação prática estivesse naturalmente subjacente uma relação de
mandato. O cedente poderia assim, para efeitos da
concernente à exigência do consentimento
cobrança do crédito, transmitir ao cessionários os
da contraparte que, invariavelmente, poderia meios processuais que lhe cabiam contra o devedor,
“negociar”, em benefício próprio e exclusivo, sob a forma de uma actio mandata, referindo os
romanos que neste caso o credor praestabat,
essa aceitação.16 mandabat ou cedebat actionem ao seu substituto.
O mandatum in rem suam surge como uma Este esquema permitia ao cedente (como mandante)
encarregar o cessionário (como mandatário) de cobrar
solução processual adaptada ao processo
o crédito pessoalmente (mandatum ad agendum),
formular. O titular do crédito outorgava a caso em que este intentartia a acção nomine alieno,
um terceiro poderes de representação em assumindo a intentio do cedente, mas obteria uma
condenação a seu próprio favor, enquanto representante
causa própria para, mediante o exercício de
processual. Nesse caso, normalmente o cedente teria
contra o cessionário, enquanto seu mandatário, uma
actio mandati para obter a entrega do valor da
14 MENEZES LEITÃO, L. M. T. Cessão de créditos. cobrança. No entanto, o cedente perderia essa acção,
caso autorizasse o mandatário a guardar para si o
Coimbra: Almedina, 2005, p.25.
resultado da cobrança (mandatum in rem suam)”
15PONTES DE MIRANDA . Tratado de Direito (MENEZES LEITÃO, Cessão de créditos, p.26-27).
Privado. t.XXIII. Rio de Janeiro: Borsoi, 1958, p.248. 18 PONTES DE MIRANDA , Tratado de Direito
16 MENEZES LEITÃO, Cessão de créditos, p.26. Privado. t.XXIII, p.248.

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actio utilis19 para que esse pudesse acionar que, segundo Biondo Biondi, se por um lado
o crédito em nome próprio. a actio utilis afastou a operação de cessão da
Mantinha-se, todavia, uma fragilidade: figura da representação, por outros, foram
o credor originário não perdia a ação direta criados para ela uma série de outras restrições
para satisfação do mesmo crédito. visando proibir especulações ilícitas por
Esta possibilidade foi afastada apenas intermédio da cessão.21
quando se admitiu a denuntiatio do devedor, A transmissibilidade das obrigações tomou
mediante a qual este deixaria de obter a diferentes caminhos no direito bizantino e no
liberação na hipótese de pagamento ao credor direito romano vulgar do Ocidente. Enquanto
originário (cedente).20 É interessante notar no primeiro, com a extinção do conceito de
actio utilis, mediante a simples denuntiatio
já se operaria a cessão de crédito,22 na parte
19 Guido Astuti elucida que “Un ulteriore e
decisivo passo vene compiuto col riconoscimento
di un’actio utilis al cessionario, che in tal guisa fu
né che l’actio utilis contine (come già sostienne
legittimato ad agire non più come mandatario del
l’Eisele), una finta delegazione: nel sistema
cedente, ma a nome proprio: così finalmente la
giustinianeo non v’é ormai difficoltà ad ammettere
cessione poté acquistare efficacia diretta ed autonoma
<che perduri una obbligazione nonostante lo scambio
fisionomia, sottraendo l’qacquirente di un credito
dei soggetti, in forza di successione a titolo singolare>
all’incertezza che prima gli derivava dalla posizione
(Ferrini)” (ASTUTI , Cessione (storia), p.808). Em
di procuratos in rem suam. È controverso entro quali
sentido contrário, Pontes de Miranda assevera que:
limiti questo rimedio sia stato attuato nell’età classica”
“A ação não era a do outorgante, que se transferisse.
(ASTUTI, Cessione (storia), p.807).
Era ação atribuída ao outorgado, em lugar do objeto
20 MENEZES LEITÃO, Cessão de créditos, p.30. da obrigação; e não por transferência da obrigação,
Explica Pontes de Miranda que: “ (...) o outorgado ou do débito. Às vezes os textos parecem permitir
podia impedir que o devedor pagasse, com eficácia que até aí se vá, mas em verdade só se trata de maneiras
liberatória, ao outorgante, desde que houvesse a inexatas de expressão” ( PONTES DE MIRANDA,
denuntiatio do que se passou. Chegou-se quase à Tratado de Direito Privado, t.XXIII, p.249).
concepção da cessão de crédito, que é construção 21 Nas palavras de Biondo Biondi: “Quando si
do direito comum. A ‘notificação’ segundo o art.
1.069 do Código Civil tem raízes na denuntiatio dos generalizza il sistema dell’actio utilis e la cessione si
textos de Alexandre Severo e de Gordiano, mas a stacca dalla rappresentanza, per ragioni politico-
eficácia, hoje, é eficácia da cessão, estendida ao sociali si vieta la cessione di taluni crediti o a favore
terceiro; no direito romano pós-clássico, apenas era di talune persone Costantino (CI. 8,36,2) e Giustiniano
eficácia do mandato em causa própria, ou do (CI. 2,13,2) vietano la cessione in potentiorem, cioè a
exercício da ação útil” ( PONTES DE MIRANDA , persone di rango sociale più elevato e potenti, per
Tratado de Direito Privado. t. XXIII., p.249). Para escludere ogni possibile vessazione verso il debitore.
alguns autores, com a actio utilis, teria ocorrido uma Giustiniano (Nov. 75,5) proibisce la cessione al tutore
verdadeira aceitação indireta da cessão de crédito. dei crediti verso il pupillo” (BIONDI, Biondo, Diritto
Nesse sentido, cf. GIORGI, Teoría de las obligaciones Romano, p.346).
en el derecho moderno, p.73). Segundo Astuti, no 22
direito justinianeo, com a introdução da actio utilis Diz o autor: “Efectivamente, a sucessiva
“l’istituto acquista una fisionomia nuova: mentre concessão das actiones utiles ao adquirente do crédito
nel diritto classico è ignorato il transferimento delle leva a que, após a extinção daquele conceito, a
obbligazioni, e il cessionario acquista solo la facoltà situação do cessionário pudesse ser vista como titular
di esercitare un credito altrui, nel diritto giustianeo de um verdadeiro direito sobre o devedor, ocorrendo
l’antico principio è sostanzialmente travolto, e assim uma efectiva transmissão do crédito, de que a
sostituito da quello della transferibilità dei crediti. denuntiatio passa a ser considerada como um simples
Non sembra esatto dire che l’obbligazione sussiste anúncio, que produzia que o devedor deixasse de ficar
nei confronti del creditore originario, mentre il liberado com o pagamento do cedente” (MENEZES
cessionario acquista solo un’azione contro il debitore, LEITÃO, Cessão de créditos, p.31).

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ocidental do Império, manteve-se a solução Neste período, todavia, adiciona-se mais
processual de transmissão mediante o mandato um argumento à intransmissibilidade: o fato
in rem suam, sem nem mesmo contar com a dos créditos não serem susceptíveis de posse,
actio utilis. impossibilitando-se, por esta razão, a traditio,
Tampouco se verifica alguma sofisticação considerada como o negócio necessário para
da transmissão de créditos no direito antigo a transmissão de bens corpóreos.25
dos povos germânicos. Pode-se dizer que, Os primeiros sinais de uma verdadeira
pelo contrário, até pelo menos o fim da transmissão de crédito surgem a partir
Idade Média, a transmissão de crédito foi do século XIII, em decorrência de construções
dificultada, voltando a prevalecer a idéia do direito costumeiro francês e das
de intransmissibilidade.23 concepções humanistas.
A escola dos glosadores e dos comentaristas Ao que tudo indica, tomando por base a
ou pós-glosadores fixou-se nos traços de reflexão crítica de alguns historiadores do
intransmissibilidade das obrigações em direito direito, a verdadeira alteração nessa matéria
romano, surgindo neste período brocados não se deu por intermédio de construções
como o de que os créditos aderem aos ossos doutrinárias, mas pelas necessidades
(nomina ossibus inhaerent) comparando sua concretas advindas do desenvolvimento das
relação como a da lepra ao próprio corpo (ejus trocas comerciais ao longo da expansão do
ossibus adhaeret ut lepra cuti).24 império romano e mesmo após a sua cisão.26
Por mais que uma determinada concepção
de obrigação personalíssima eventualmente
23 Menezes Leitão sintetiza que “a posição que
actualmente parece prevalecer é, no entanto, a de que
o antigo Direito Germânico não admitiria a transmissão
dos créditos, tendo esta apenas surgido no fim da os medievaes a comparal-a á lepra adherente ao
Idade Média nos Direitos das cidades alemãs, como corpo do leproso e que se lhe não pode arrancar
Magdeburg e Breslau, apresentando-se vários nem tirar sem o proprio corpo: ejus ossibus adhaeret
fundamentos para essa posição. Para Mitteis/ ut lepra cuti” (LARCEDA DE ALMEIDA. Dos effeitos
Lieberich, os créditos seriam vistos no antigo direito das obrigações. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1934,
germânico como tendo fonte delitual, o que levava p.361).
a que não pudessem ser transmitidos, já que apenas 25 MENEZES LEITÃO, Cessão de créditos, p.47.
o lesado poderia reclamar do lesante a indemnização
26 Neste sentido, Astuti, partindo de Ferrini,
que à sua pessoa era devida (...) Apenas numa fase
posterior, em que o crédito passou a ser reconhecido observa que a consagração da actio utilis tem origem
como elemento activo do patrimônio é que se passou em práticas comerciais anteriores a Justiniano: “Il
a admitir a faculdade de o credor o transmitir, Ferrini, pur rilevando queste alterazioni, ritenne
inicialmente com o consentimento do devedor, para tuttavia che esse confermassero una prassi preesistente,
depois no fim da Idade Média, os direitos das cidades per cui l’actio utilis sarebbe stata accordata, già prima
passaram a reconhecer a transmissão, normalmente di Giustiniano, in alcune ipotesi di cessione di crediti”
mediante o registro no livro da cidade” (MENEZES (ASTUTI, Cessione (storia), p.808). Max Kaser, por
LEITÃO, Cessão de créditos, p.31). sua vez, aponta que mesmo no direito romano pós
clássico, no período do dito ‘direito romano vulgar’,
24 Nas palavras de Lacerda de Almeida: “a par a matéria da cessão de créditos teria progredido: “Só
da transformação do conceito fundamental da muito esporadicamente a vulgarização alcançou
obrigação em Direito Romano, uma escravidão do progressos materiais (como na representação através
devedor é á divida, divida tão ligada com elle, tão de pessoas livres e na cessão de direitos de crédito)”
pessoal, tão inseparavel delle devedor, que chegaram (KASER, Direito Privado Romano, p.27).

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tivesse predominância e resistência (pelo consistem em direitos. Entre esses direitos
incluir-se-ia o direito de crédito, estabelecendo
menos até o século XIII!) isto não impedia
GROTIUS uma distinção entre o direito sobre
que mecanismos de transmissão de crédito a coisa (beheering, jus in re) e o direito à coisa
não fossem criados pelas necessidades (inschuld, jus ad rem) que identifica com o
práticas de cada época. direito de crédito (...) Assim, GROTIUS, prevê
expressamente que as res incorporales podem
ser objecto de compra e venda, fazendo
2 O CRÉDITO COMO VALOR E referência expressa à venda de direitos de
SUA TRANSMISSIBILIDADE NOS crédito, mas não a solvência do devedor.28
TEMPOS MODERNOS O posicionamento do crédito como um
A sustentação teórica para a cessão de elemento do patrimônio importou numa
créditos vem a se estabelecer com os aproximação entre crédito e propriedade
pensadores jusnaturalistas que reconhecem enquanto bens passíveis de livre disposição.
no crédito um bem integrante do patrimônio O fato dessa recomposição conceitual ocorrer
do credor passível de circulação como as no pensamento jusracionalista não é
outras riquezas que ao seu lado figuram. aleatório. Trata-se de mais um sinal da cisão
Menezes Leitão explica que entre pessoas e bens, tal como observou José
Antônio Peres Gediel, com a ampliação
A doutrina jusnaturalista trouxe uma concepção
da noção de bens para além daquilo que
diferente da cessão de créditos, na medida em
que, ao representar a obrigação como uma é material: “Segundo já preconizava o
alienação da liberdade do devedor em benefício jusracionalismo cristão, no final da Idade
do credor, veio simultaneamente qualificar o Média, o homem, por sua descendência
direito de crédito como um direito de domínio
divina, gozava de autonomia terrena e
sobre uma acção de outrem. Esta concepção
levou ao reconhecimento de que o direito respondia, individualmente, perante o
de crédito constituiria, à semelhança da Criador, não se confundindo, assim, com o
propriedade sobre coisas corpóreas, um mundo da physis, o qual poderia, inclusive,
elemento do patrimônio do credor, que poderia
ingressar na esfera do poder humano, sob a
ser assim transmissível como qualquer outra
componente patrimonial.27 forma de propriedade”.29

A percepção do crédito como um


elemento integrante do patrimônio do 28 MENEZES LEITÃO, Cessão de créditos, p.131.
indivíduo promove o suporte necessário para 29 GEDIEL, J. A. P. Tecnociência, dissociação e
a justificação da livre cedibilidade: patrimonialização jurídica do corpo humano. In:
FACHIN , L. E. (Coord.). Repensando fundamentos
GROTIUS, apesar de, inspirado nas Institutas
do Direito Civil Basileio contemporâneo. 2.ª tiragem.
de GAIUS, classificar os direitos em direitos Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p.61. Sobre este
das pessoas (Livro I), direitos reais (Livro II) e momento histórico, esclarece Adriana Espíndola
direitos pessoais (Livro III), vem admitir que Corrêa: “No nominalismo, o domínio que a pessoa
os direitos reais possam ter por objecto coisas exerce sobre si e sobre as coisas do mundo, ao
incorpóreas, as quais define como as que contrário do pensamento tomista, não tem sua
origem em uma ordem racional divina, mas na
voluntas. Para Guilherme D’Occam, a natureza
divina age livremente, com base na voluntas divina,
27 MENEZES LEITÃO, Cessão de créditos, p.129. independentemente da razão. O homem, sendo

140
Nestas circunstâncias, faltava apenas transmissão, sendo dispensável a tradição, salvo
para quem integre a posse no conceito de
relativizar a eficácia multicentenária da tradio
propriedade. PUFENDORF chega assim à
na transmissão da propriedade para se alcançar conclusão de que a transmissão da propriedade
a livre disposição deste elemento patrimonial. tanto abrange coisas como direitos (translatio
Segundo Menezes Leitão, o salto foi iurium atque rerum), admitindo assim uma
sucessão singular nos créditos, na medida em
dado por Pufendorf:
que estes, como objecto de propriedade,
A doutrina de GROTIUS vem a ser seguida poderiam ser transmitidos por contrato.30
por Pufendorf (1632-1694) para quem a
propriedade, consistindo na atribuição de um Estava lançada a base para a fixação
bem a outra pessoa com exclusão de todas as da cessão de crédito na etapa da primeira
outras, pode ter por objecto não apenas as coisas codificação. Pelo menos dois aspectos
corpóreas, mas antes qualquer bem que por si no pensamento de Pufendorf merecem
ou justamente com outro possa ser de utilidade
atenção especial.
para o ser humano. Essencial é apenas que o
bem possa ser colocado na esfera de uma Em primeiro lugar, sobressai o
pessoa e subtraído à propriedade e conseqüente redimensionamento da relação entre posse
esfera de vontade de outrem (...). e propriedade e a importância dessa
Assim, PUFENDORF refere-se no capítulo
nova construção para uma mitigação da
relativo à transmissão da propriedade em termos
idênticos à transmissão de coisas e de direitos, importância da tradição para a transmissão
sustentando igualmente que, ao contrário do que de riquezas. Encontra-se neste ponto a
sucedia no Direito Civil, no jusnaturalismo a justificação filosófica para a posterior
entrega material da coisa (tradição) não é
construção conceitual no direito francês de
necessária à transmissão da propriedade, uma
vez que esta seria uma qualitas moralis, uma que o contrato, em linha de princípio, por si
pura categoria jurídica, que deve ser separada do só é apto a transferir a propriedade.
domínio fáctico sobre o objecto. A posse seria Ora, a propriedade como qualitas moralis
assim em relação à propriedade apenas um independe da relação fática com a coisa. Esta
complemento, uma pura execução empírica de
concepção, por sua vez, acaba sendo
uma qualitas moralis já existente, a propriedade.
Mas, dado que a propriedade como qualitas projetada na concepção subjetivista da posse
moralis não poderia depender de circunstâncias como pressuposto indispensável para a
físicas, produzindo efeitos de direito erga eficácia real do contrato em ordenamentos
omnes, apenas o contrato, sendo também
jurídicos como o francês, o italiano, o
uma qualitas moralis, poderia operar a sua
português, dentre outros.
Verifica-se também, neste momento
imagem e semelhança de Deus, reproduz a voluntas histórico, uma alteração de perspectiva sobre
divina na sua vontade e exerce no mundo sua o fenômeno obrigacional, que deixa de ser
potestas absoluta. Esses poderes e a liberdade de preso aos ossos da pessoa para ser expressado
agir decorrem do dominium que a pessoa tem sobre
si e sobre as coisas do mundo, do que se extrai uma mediante um componente patrimonial.
vinculação entre a liberdade e a relação de dominium Deixa-se o ser para resolver o problema no ter,
entre a persona e a res” (CORRÊA, A. E. Consentimento
do paciente e dever de informar do médico: os limites
da autonomia corporal. Dissertação de Mestrado
orientada pelo Prof. Dr. José Antônio Peres Gediel, 30 MENEZES LEITÃO, Cessão de créditos,
2002, p.41-42). p.132-134.

141
numa questão meramente de titularidade, por uma rígida separação entre os planos
disponibilidade e responsabilidade patrimonial. obrigacional e real 33 postulando, por
O crédito é absorvido pelo discurso abstrato e conseqüência, soluções diferentes para a
generalizante da propriedade, conforme transmissão das coisas e direitos.
reflexão crítica de Erolths Cortiano Jr., Christoph Krampe entende que,
apontando para uma potencialização extrema substancialmente, neste ponto resplandece
das possibilidades de circulação. Neste a diferença da noção de bem jurídico no
sentido, o crédito torna-se uma mercadoria.31 ordenamento francês em face do alemão, pois,
Esta transposição conceitual fica clara em enquanto para os franceses bem jurídico “ne
Collin & Capitant que definem o crédito como signifie pas seulement l’objet, mais aussi le
droit sur cet objet”, o pensamento jurídico
um valor, tornando a pessoalidade do credor
alemão “ne connaît pas de propriété d’une
e do devedor dispensável na relação jurídica.32
créance. Il n’y a propriété qu’envers des
Na era ‘segunda codificação’, mormente
choses, et ce qu’est une chose se trouve défini
com o Código Civil alemão, adota-se uma
dans le code civil allemand (article 90),
solução diversa. O direito alemão é marcado
comme suit: <Par chose, dans le sens de la
loi, on n’entend que les objets corporels>”.34
31
Esta diferença essencial na teoria dos
“Na abstração do modelo proprietário, o objeto
do direito de propriedade também não se concretiza. bens e de sua transmissibilidade no direito
Ou, por outras palavras, o sistema conceitual não francês perante o direito alemão terá
permite que a noema faça referência e especificação
a determinado e conceto bem. O modelo proprietário
reflexos profundos. No que diz respeito ao
deve ser universal e atemporal; deve permitir que a direito alemão, vigora a estrita separação de
apopriação de todo e qualquer bem se subsuma ao planos, de modo que o negócio jurídico de
preceito fundamentador do direito de propriedade.
A abstração do objeto da propriedade é imprescindível constituição da relação jurídica obrigacional
em um sistema baseado na lógica do mercado, onde é diverso e incomunicável com o negócio
tudo tem de ser passível de entrar em circulação.
jurídico de transmissão.
Todas as coisas devem reduzir-se então a um mínimo
comum, que é a mercadoria. Onde importa o valor Sobre o sistema alemão, falou suscintamente
de troca e não o valor de uso, tudo se equivale. Para em aula Alcides Tomasetti Jr.:
fazer tudo se equivaler, a norma abre mão de conceituar
a propriedade a partir da coisa apropriada” Na Alemanha, há um procedimento negocial que
(CORTIANO JR, E. O discurso jurídico da propriedade tem de ser rigorosamente seguido para que ocorra
e suas rupturas. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p.124). a aquisição inter vivos da propriedade imobiliária
32 pelo registro. Todo este procedimento foi um
“La personnalité du débiteur et celle du
créancier se sont de plus en plus éliminées du rapport tanto artificialmente criado por ocasião da
de droit. L’obligation, soit au point de vue actif, soit elaboração do BGB, cuja artificiosidade foi
au point de vue passif, n’a plus été considérée que
par son résultat, c’est-à-dire comme un élément de
l’actif ou du passif du patrimoine, comme une valeur, 33Sobre o assunto, no Brasil, cf. COUTO E SILVA,
aussi rationnellement transmissible que les autres
C. V. A obrigação como processo. São Paulo:
valeurs, que les droits réels et, notamment, que
Bushatsky, 1976
la propriété” ( COLLIN , A.; CAPITANT , H. Cous
34 KRAMPE , C. Obligation comme bien: Droit
élémentaire de Droit Civil Français. avec le concours
de M. Julliot de la Morandière. t.II. 8.ed. Paris: français et allemand. In: Archives de philosophie du
Dalloz, 1935, p.355). droit: L’obbligation. Paris: Dalloz, 2000, p.206.

142
motivo de polêmica e de tentativas de reforma, sido acordada a transmissão da coisa vendida;
vez que o leigo não conseguiria penetrar na Eintragungsbeweillung (inserção, na tradução
complexidade do sistema alemão de transmissão literal; do consentimento para o registro):
da propriedade imobiliária. É negócio jurídico unilateral, que opera
Para o leigo, tanto no Brasil, quanto na exclusivamente no campo do direito das coisas
Alemanha, “quem compra é dono”. e, cujo conteúdo vem dado pelo consentimento
Imaginemos o contrato de compra e venda no para uma nova aquisição constituída mediante
campo das obrigações. Sua eficácia típica é a o registro. Assim, na Alemanha, pode-se
criação da relação jurídica de compra e venda, comprar e vender, e não acordar sobre a
na qual incumbe ao vendedor transferir a transmissão; pode-se acordar para comprar e
propriedade da coisa (frise-se, não transfere, vender, e desde logo vender e transmitir, em
promete transfeir), contra o dever do comprador momento simultâneo ou posterior, mas sempre
de efetuar a prestação do preço. Este é o núcleo pelo intermédio de dois diversos negócios
do contrato de compra e venda. jurídicos de formação bilateral, isto é, o contrato
Após o contrato obrigacional, os alemães falam de venda e compra e o acordo de transmissão.
em “acordo de transmissão” (Einigung) e não Eintragung: Esta palavra desgina o ato de
“contrato de direito das coisas”. O significado registro, semelhante ao exercício da chamada
de “Einigung” é “acordo de transmissão”. ‘jurisdição voluntária’;
Seguindo as explicações de Alcides A transmissão imobiliária na Alemanha,
portanto, envolve três negócios jurídicos de
Tomasetti Jr o sistema alemão de transmissão
direito privado (os três primeiros) e um ato
da propriedade e, com ele, a rígida separação jurídico de direito público estatal.35
entre o plano obrigacional e real poderia ser
A mesma abstratividade que se interpôe
sinteticamente descrito da seguinte maneira:
entre o Grundgeschäft e a Einigung (negócio
Na Alemanha distinguem-se quatro fases jurídico bilateral ou verdadeiro contrato de
para a transmissão da propriedade imobiliária
direito das coisas: Dinglichervertrag), que
(Auflassung):
O negócio jurídico contratual (Grundgeschäft) marcaria a separação entre o plano obrigacional
é negócio basal e opera apenas no campo do e o plano real seria verificável, em direito
direito das obrigações, cuja sua eficácia alemão, na cessão de crédito, pela diferença
predominante, mas não esgotante, está na criação
funcional (e abstratividade) entre o negócio
da relação jurídica de compra e venda, gerando
para o vendedor o dever em sentido estrito (isto
jurídico de base – que é causal e propicia o
é, um dever comportamental) de transferir a fundamento da disposição patrimonial
coisa, e para o comprador, o dever em sentido efetuada mediante o negócio transmissivo
estrito de transferir o numerário. Havendo subseqüente ou contemporâneo – e o negócio
consentimento sobre a troca da coisa pelo preço,
de transmissão do crédito.
temos o negócio devidamente aperfeiçoado no
plano obrigacional. Esta duplicidade de negócios, em direito
Acordo de transmissão. (Einigung, que Pontes alemão, encontra, dentre outros autores, esta
de Miranda traduz como negócio juri-real). explicação de Karl Larenz:
Os alemães, sob a influência de Savigny,
perceberam contratos cujos efeitos não se
expandiam somente no campo do direito das 35 TOMASETTI JR. , A. Fundamentos do direito
obrigações mas também no campo do direito
dos contratos. São Paulo, 1999, 130p. (Anotações
das coisas. A Einigung está no campo do direito brevemente revistas pelo docente no decurso de
das coisas, de modo que na Alemanha pode disciplina ministrada em nível de pós-graduação na
haver compra e venda perfeita, sem que tenha Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo).

143
Los denominados negocios dispositivos de Nestas circunstâncias, cabe investigar
créditos tienem carácter abstracto según el
qual o modelo mais apropriado para
sistema del BGB, es decir, su validez en derecho
es independiente de su ‘causa juridica’. Esta compreender a transmissibilidade de créditos
última radica, generalmente, en un negocio e débitos no direito positivo brasileiro.
obligacional – que precede al acto dispositivo o
coincide con él –. Un crédito puede, p.ej., ser
cedido por medio de un contrato de compraventa
créditos não constitui entre nós uma forma de
(...) o de donación, y también como medio de
transmissão abstracta do crédito” (MENEZES LEITÃO,
cumplimiento de una obligación o en concepto
Cessão de créditos, p.132-134) e Antunes Varela:
de dación en pago. Por consiguiente, la cesión “(...) fácil é verificar que nenhuma razão existe, em
como negocio dispositivo ha de diferenciarse face do sistema jurídico português, para se considerar
conceptualmente del negocio básico obligacional a cessão de créditos como um negócio abstracto”
y de otras estipulaciones jurídicas causales, (VARELA, A. Das obrigações em geral. t.II. 7.ed.
aunque ambos, como casi siempre suele ocurrir, Coimbra: Almedina, 1999, p.299). No direito
coincidan temporalmente y en la conciencia de espanhol, lê-se em nota de rodapé na obra de Castán
los interessados.36 Tobeñas que “(...) como quiera que la traditio debe
tener una iusta causa, también la cesión debe basarse
Esta diferenciação e, sobretudo, a en una causa, ya que sin ella sería estéril, y como la
abstratificação do negócio jurídico de cesión puede ser voluntaria y necesaria, según derive
de una convención libre de las partes o sea
transmissão do crédito em face do negócio coactivamente impuesta por la ley, su causa será en
jurídico básico e causal entre o negócio jurídico esta última el precepto legal mismo y en aquélla un
negocio jurídico que podrá ser ya un acto a título
de base e o negócio jurídico de transmissão
gratuito (donación), ya un acto a título oneroso
não é reconhecida noutros ordenamentos (compraventa, permuta), tanto la constitución de
jurídicos ainda quando a transmissão da una relación obligatoria cuanto la resolución de una
relación preexistente (pago)” ( TOBEÑAS, Derecho
propriedade se opera por efeito do contrato.37
civil español, común y foral, p.243). Em direito
italiano, Panuccio adverte que “Vi sono dei casi (e la
cessione è fra questi) in cui lo schema negoziale e
36 contrattuale in sé considerato non è sufficiente a
LARENZ, K. Derecho de obligaciones. t.I. trad.
determinare gli effetti e deve essere integrato in uno
Jaime Santos Briz. Madrid: Editorial Revista de
schema più ampio che dia rilievo al sistema di interessi
Derecho Privado, 1958, p.447. No mesmo sentido, a
giuridici, cioè alla causa poer cui l`atto si compie.
explicação de Ennecerus-Lehman: “el contenido de
Perché la cessione possa operare giuridicamente la
este contrato es la transmisión del derecho de credito.
legge richiede espressamente (art. 1260 c.c) un titolo
Por tanto, la cesión no ha de confundirse con el
oneroso o gratuito capace di fondare il transferimento.
contrato por el cual se asume una obligación de ceder,
Per ciò la cessione in quanto tale è uno schema
por ejemplo, la venta del crédito. Verdad es que con
incompleto di negozio che va integrato per operare
frecuencia la cesión va unida externamente a este
giuridicamente con un titolo oneroso o gratuito”
negocio básico (e incluso en la venta del crédito va
(PANUCCIO, V. Cessione dei crediti. In: Enciclopedia
implícito, por regla general, un contrato tácito de
del diritto. t.VI. Milano: Giuffrè, p.850). No mesmo
cesión), pero, aunque así sea, la cesión es un contrato
sentido, Umberto Breccia: Per orientarsi tra le
abstracto; el convenio sobre el fin no forma parte, en
divergenti teorie, è opportuno precisare che la
modo alguno, del contrato de cesión” (ENNECCERUS-
cessione resta ‘neutra’, con riguardo al fondamento
LEHMANN. Derecho de obligaciones. In: ENNECCERUS-
giustificativo, soltanto in quanto effetto legale, ma il
KIPP-WOLFF. Tratado de derecho civil. trad. Blas Pérez
singolo accordo rivolto alla cessione, una volta
González y José Alguer. t.II. Barcelona: Bosch,
stipulato, è valido purchè abbia una ‘causa’, per
1954, p.382).
qunto quest’ultima possa assumere caratteri diversi
37 No direito português, cite-se Menezes Leitão: in relazione al contenuto della singola operazione
“No nosso sistema jurídico, o negócio que serve de contrattuale” (BRECCIA, U. Le obbligazioni. Milano:
base à cessão é sempre causal, pelo que a cessão de Giuffrè, 1991, p.779).

144
3 A CESSÃO DE CRÉDITOS NO jurisconsulto, ela simpatiza com todos os
DIREITO BRASILEIRO meios de transmissão da propriedade”.41
Carvalho Santos, do mesmo modo, notou
Lacerda de Almeida, tomando por base
bem que “A cessão dos créditos é, pela
o direito civil brasileiro anterior à nossa
sua índole, um instituto que serve para
primeira codificação, escreveu: “o pensamento fins diversos” .42
moderno no intuito da mobilização das Antes destes autores, Lacerda de Almeida
riquezas, tende a materializar, a corporificar expressara o entendimento de que no fenômeno
os direitos e obrigações equiparando-os no da cessão de crédito seria possível identificar
modo de transferência às cousas mobiliarias”.38 dois atos distintos: (a) a transferência do crédito
Com efeito, no direito brasileiro, desde (cessão propriamente dita) e (b) o contrato
o Código Civil de 1916, a cessão de crédito que lhe dá causa:
é expressamente prevista e, mesmo antes
Cessão é a transferência que o credor faz a
dele, reconhecida pela doutrina e pela terceiro de seu direito contra o devedor. Nada
jurisprudência.39 mais é além disso. Mas esta transferência,
A doutrina brasileira, com raras porém como a tradição, nada significa, é um acto
vasio: nunquam nuda traditio trasnfert
honrosas exceções, pouco problematizou a
dominium sed ita si aliqua causa precedat per
cessão de crédito, chegando, quando muito, quam dominium transferatur.
a afirmar que se trataria, simplesmente, de (...) como a tradição a cessão de creditos
mais um tipo contratual.40 suppõe um contracto que a explique e esse
contracto é, em regra, o de compra e venda.43
J.M. Carvalho de Mendonça intuiu a
impossibilidade de limitar a cessão de crédito A explicação rigorosa dessa duplicação
a um contrato típico, ao escrever que: “A cessão de negócios (negócio jurídico de base e negócio
pode ter por causa qualquer dos meios de jurídico de transmissão) foi apresentada, em
transmitir a propriedade; na frase de um direito brasileiro, originalmente por Pontes
de Miranda:
A cessão de crédito é negócio jurídico bilateral
38 LACERDA DE ALMEIDA, F. P. Obrigações. de transmissão de crédito entre o credor e
Rio de Janeiro: Ribeiro dos Santos, 1897, p.452. outrem. À base dêle pode haver negócio
39
jurídico, porém a cessão de crédito independe
Clóvis Bevilaqua, ao tratar do art. 1.065 do
dêle, ou da sua existência. A manifestação de
Código Civil de 1916 diz sobre o direito anterior à
codificação: “Semelhante a norma, ainda que não
devidamente expresso o preceito” (BEVILAQUA, C.
Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. 10.ed. 41 CARVALHO DE MENDONÇA, M. I. Doutrina
v.IV. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1955, p.181).
e prática das obrigações. 4.ed. aumentada e
40 Sobre a cessão de créditos como contrato, atualizada por José de Aguiar Dias. Rio de Janeiro:
posiciona-se Silvio de Salvo Venosa: “a natureza Forense, 1956, p.97.
contratual do negócio é patente. É um contrato 42 CARVALHO SANTOS , J. M. Código civil
simplesmente consensual, mas por vezes a necessidade
brasileiro interpretado. 3.ed. v.XIV. Rio de Janeiro:
obrigará o escrito particular ou a forma pública”
Freitas Bastos, 1945, p.320.
( VENOSA , S. S. Direito Civil: teoria geral das
obrigações e teoria geral dos contratos. v.II. 3.ed. 43 LARCEDA DE ALMEIDA , Dos effeitos das
São Paulo: Atlas, 2002, p.334). obrigações, p.364-365.

145
vontade é elemento de acordo de transmissão, e v.g., na Lei do SFI, Lei n.º 9.514/97), ou um
esse acordo semelhante ao acordo de transmissão
contrato de cessão de um conjunto de créditos
da propriedade imobiliária ou mobiliária, opera
a transmissão sem precisar de qualquer outro futuros, internacionalmente conhecido como
elemento (e.g., na transferência da propriedade contrato de factoring.
imobiliária, o registro; na transferência da Para que a cessão de crédito possa ser
propriedade mobiliária, a tradição, ou outro ato, realizada enquanto adimplemento de tão
inclusive registro.).44
diferentes negócios de base é que o legislador
A percepção da dualidade entre o negócio enunciou um tipo geral, sem todavia fixar
jurídico que dá base à cessão (que pode ser uma causa típica correspectiva. Lê-se no art.
um negócio jurídico ou outro ato jurídico) e 286 do CC 2002, pura e simplesmente, que
o efeito de transmissão (o negócio jurídico “O credor pode ceder o seu crédito, se a isso
de cessão de crédito propriamente dito) como não se opuser a natureza da obrigação, a
adimplemento do negócio jurídico basal é lei, ou a convenção com o devedor”, sem
absolutamente indispensável para que este qualquer remissão ao negócio de base que
instituto possa servir aos fins diversos, tem de dar causa à transmissão.
outrora simplesmente percebidos por No âmbito do direito positivo português,
Carvalho Santos, sem mais reflexões. Antunes Varela expõe um esclarecimento
Daí o equívoco grave e crasso de limitar que se aplica integralmente ao direito
brasileiro: “A cessão tem, por conseguinte, a
a cessão de crédito a um mero tipo contratual,
sua causa, variável de caso para caso, que o
sobretudo em um tipo contratual fechado.
artigo 577 intencionalmente omite ao definir
A cessão de crédito pode ter por base um
a figura, por querer introduzir na noção legal
contrato oneroso, sendo que, neste caso,
apenas as notas comuns a todas as espécies
efetivamente existe uma proximidade com o
geradoras do fenómeno da transmissão
contrato de compra e venda.
de crédito”.45
A base, todavia, pode ser diversa da
Cabe investigar a relação que se estabelece
compra e venda. É possível ceder um crédito
entre o negócio jurídico de base e o negócio
por intermédio de um contrato de doação jurídico de cessão de créditos, em sentido
(cujo adimplemento importe na transferência próprio e estrito, perquirindo a abstratividade
gratuita de crédito, art. 295, in fine, CC 2002). ou causalidade dessa relação.
Do mesmo modo, a cessáo de crédito
pode ter por base um negócio jurídico de 4 ABSTRATIVIDADE E CAUSALIDADE
adimplemento, como a dação em pagamento NA CESSÃO DE CRÉDITO
(art.358, CC 2002), ou um negócio jurídico
unilateral como a promessa de recompensa O debate a respeito da abstratividade ou
(art. 854, CC 2002); um contrato de cessão da causalidade no negócio de cessão de crédito
fiduciária de créditos em garantia (como, é enfrentado pela quase totalidade da doutrina
estrangeira pesquisada a respeito.

44 PONTES DE MIRANDA, Tratado de Direito


Privado t.XXIII, p.268. 45 VARELA, Das obrigações em geral, p.299.

146
Em perspectiva interna, os dados são os vícios ligados à relação fundamental
alarmantes. Poucos autores brasileiros (compra, doação, troca, constituição de
sociedade, etc.) podem obrigar o adquirente
chegam sequer a mencionar o problema,
a restituir, nas relações entre as partes, mas
muito provavelmente desatentos por causa
não dão lugar ao efeito real próprio da
da restrição da cessão de créditos a um mero nulidade ou da anulação.47
contrato obrigacional ao lado dos demais.
Ao se falar em abstratividade da cessão
O problema coloca-se nos seguintes termos.
de créditos, portanto, há que se fixar, em
No tópico precedente fixou-se o entendimento
de que a cessão de crédito, entendida como primeiro lugar, em que sentido se utiliza a
negócio jurídico de transmissão, tem causa, expressão: se ‘abstrato’ por causas variáveis
subjacente ou sobrejacente, variável. Daí (insuscetível de ser limitado a uma causa
Pontes de Miranda referir-se a ela como um eficente) ou ‘abstrato’ no sentido de descolado
acordo de transferência.46 quanto a sua existência, validade e eficácia
Cabe responder se entre o negócio jurídico em face do negócio que lhe é “subjacente,
basal (compra e venda, doação, dação em sobrejacente, ou justajacente” segundo a
pagamento, factoring, por exemplo) e a cessão terminologia de Pontes de Miranda.
de crédito, como acordo de transferência, há A questão aqui proposta diz respeito ao
causalidade ou verdadeira abstração causal. segundo sentido.
Antunes Varelas destrinça o problema nos Como foi visto, em direito comparado
seguintes termos: existem basicamente duas correntes: a
Diz-se abstracto o negócio cuja validade não corrente alemã, que defende a abstratividade
é prejudicada pelas faltas ou defeitos inerentes da cessão de crédito em relação ao negócio
à relação jurídica fundamental que lhe serve
“subjacente, sobrejacente ou justajacente” e
de base. Na fixação do seu regime jurídico
abstrai-se da causa negotti. as demais correntes européias que sustentam
A emissão e o endosso da letra de câmbio (ou a causalidade entre o negócio de base e o
dos títulos à ordem, no geral) constituem
negócio de transmissão.
negócios abstractos, no domínio das chamadas
relações mediatas, porque nem o aceitante, nem Na pequena e seleta parcela da doutrina
o endossado, podem opor ao portador (mediato) nacional que enfrentou o assunto encontram-se
do título os vícios inerentes ao contrato (relação os dois posicionamentos.
substancial) que serviu de base ao aceite ou ao
endosso. Certos negócios de transmissão de
Pontes de Miranda defende a abstratividade
direitos reais são considerados no direito da cessão de créditos:
germânico como negócios abstractos, porque
Trata-se de negócio jurídico abstrato, porém
não contrato de direito das coisas (juri-real,
dinglicher Verträg). É válida e eficaz a cessão,
46 “O acordo de transferência do crédito tem ainda que a causa não exista, seja ilícita, ou não
completo o seu suporte fáctico com as manifestações se realize. Se houve cessão, sem causa, e o
de vontade do credor e do terceiro. A notificação é cessionário se enriqueceu injustificadamente,
apenas para a eficácia no que toca ao devedor, que
se supôe não conhecer o que se passou a respeito da
sua dívida” ( PONTES DE MIRANDA , Tratado de
47 VARELA, Das obrigações em geral, p.299.
Direito Privado t.XXIII, p.268).

147
pode o cedente pedir a repetição: o crédito volta; de sua opinião.49 Serpa Lopes identifica a
mas, enquanto não passa em julgado a sentença,
duplicidade entre o negócio jurídico de base
o crédito pertence ao cessionário.
A cessão de crédito é negócio jurídico abstrato. e o negócio jurídico de transmissão sem
Porque a cessão é abstrata, em si, não pode ser explicar, todavia, se há causalidade ou
nula por ilicitude de objeto. Se o negócio jurídico abstratividade entre eles.50
subjacente é nulo, cabe a repetição.
Para encontrar uma solução apropriada
(...) O negócio jurídico de cessão é bilateral,
abstrato, acôrdo de transmissão, que independe ao direito brasileiro, mostra-se necessário ir
do negócio jurídico subjacente, ou sobrejacente além dos lindes das regras específicas sobre
(cessão de crédito para servir de garantia a a cessão de crédito. Isto porque a abstratividade
negócio jurídico de outrem, ou do próprio
ou a causalidade entre o negócio de base e o
cedente). O efeito translativo, a imediata
transferência do crédito ao cessionário, é negócio de transmissão diz respeito ao sistema
independente do fim que se colimou, cedendo- de transmissão de riquezas como um todo.
se o crédito. Vale, e é eficaz, a transferência, Não se verifica no direito privado brasileiro
ainda que se venha a decretar a nulidade, ou a
anulação ou a ineifcácia do negócio jurídico
uma rígida separação entre o plano das
subjacente, ou sobrejacente.48 obrigações e o plano do direito das coisas.
Tampouco é justificável uma rígida separação
Outros juristas pátrios defendem uma
entre o negócio jurídico de base e o negócio
inafastável relação de causalidade entre o
jurídico de transmissão de crédito o que logo
negócio jurídico de base e o acordo de
se verifica pela ponderação genérica
transmissão do crédito, ainda que sem a clareza
dalgumas estruturas insertas no Código Civil.
observada em Pontes de Miranda.
Orlando Gomes, v.g., posiciona-se
expressamente pela causalidade, ainda que 49 “No direito alemão, a cessão de crédito é
não ofereça ao leitor explicação sobre o porquê contrato abstrato. Não se confunde com o negócio
básico, que pode ser, por exemplo, uma venda, ou
uma doação. Conseqüentemente, a validade da
48
cessão não está condicionada à desse negócio, visto
PONTES DE MIRANDA, Tratado de Direito
como lhe não serve de causa. Entre nós é negócio
Privado t. XXIII , p.269-270. Caio Mario da Silva
causal” (GOMES, O. Obrigações. 8.ed. Rio de Janeiro:
Pereira, ainda que não explicitamente, parece adotar
Forense, 1986, p.246). Noutra oportunidade, o autor
a tese da abstratividade mediante remissão ao direito
destacou que “Como se sabe, a cessão de crédito
alemão: “Segundo o conceito hodierno, a cessão
pode ter diversas causas, dentre as quais são mais
de crédito é tratada como negócio jurídico abstrato
comuns: a venditionis causa, a donandi causa e a
(Larenz, von Tuhr), que se completa independentemente
solvendi causa” ( GOMES , O. Cessão de crédito:
da indagação de sua causa. Pode-se, entre nós, defini-
caracterização. In: Novíssimas questões de Direito
la como negócio jurídico em virtude do qual o credor
Civil. São Paulo: Saraiva, 1984, p.88).
transfere a outrem a sua qualidade creditória, com
50 “(...) a cessão de crédito é um negócio
todos os acessórios e garantias, salvo disposição em
contrário. Tanto pode ser esta a venda como a doação. jurídico não criador de obrigações, senão de
Até mesmo a deixa testamentária. Em qualquer caso, transmissão. Por essa transmissão o credor originário
é sempre distinta do negócio jurídico que a originou” é substituído pelo adquirente do crédito, enquanto
(SILVA PEREIRA, C. M. Instituições de Direito Civil. este permanece objetivamente inalterado, como
v.II. 20.ed. Revista e atualizada por Luiz Roldão de inalterada, subjetivamente, a posição do devedor
Freitas Gomes. Rio de Janeiro: Forense, 2003, como tal” (SERPA LOPES, M. M. Curso de Direito
p.363-64). Civil. v.II. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1955, p.519).

148
Para tanto, chama-se a atenção para os Propugnar pela abstratividade da cessão
seguintes argumentos. Ao tratar das regras de créditos conduziria a soluções insustentáveis
gerais do cumprimento das obrigações, o sob a perspectiva do direito brasileiro.
Código Civil, no art. 307 enuncia que “só Suponhamos uma doação de créditos do
terá eficácia o pagamento que importar cônjuge adúltero ao seu cúmplice (negócio
transmissão da propriedade quando feito de base), seguido da efetiva cessão
por quem possa alienar o objeto em que (normalmente feita em momento simultâneo,
ele consistiu”. mas não necessariamente).
No mesmo Código, a disciplina da dação Pela tese da abstratividade, a despeito do
em pagamento, segundo o art. 358, assim negócio de doação ser anulável (art. 550 do
estabelece: “Se for título de crédito a coisa Código Civil), a transmissão do crédito seria
dada em pagamento, a transferência importará perfeita e inatingível, dada a incomunicabilidade
em cessão”. O artigo seguinte determina: “Se entre as causas.
o credor for evicto da coisa recebida em Do mesmo modo, a dação em pagamento,
pagamento, restabelecer-se-á a obrigação seguida da transferência do crédito, mesmo
primitiva, ficando sem efeito a quitação dada, quando feita por pessoa absoluta incapaz,
ressalvados os direitos de terceiros”. propiciaria o pagamento eficaz do cessionário
Ao tratar do pagamento indevido, por sua e a inatacabilidade da operação negocial de
vez, o art. 880 prescreve “fica isento de adimplemento por parte do representante do
restituir pagamento indevido aquele que, devedor cedido.
recebendo-o como parte de dívida verdadeira, Por fim, o cessionário de créditos de um
inutilizou o título, deixou prescrever a insolvente poderia receber o pagamento do
pretensão ou abriu mão das garantias que devedor cedido, sem que esta operação de
asseguravam seu direito; mas aquele que transferência pudesse ser anulada por fraude
pagou dispõe de ação regressiva contra o contra credores.
Mas por qual razão a abstratividade da
verdadeiro devedor e seu fiador”.
cessão de crédito conduz a essas situações?
Ainda que não exista regra específica
A cessão de crédito não gera efeitos
sobre a abstratificação ou a causalidade da
simplesmente obrigacionais. Trata-se de
transmissão de crédito em relação ao negócio
negócio jurídico dispositivo, justificado pelo
que lhe dá base e, mesmo considerando que
exercício eficaz do poder de disposição que,
as regras citadas mencionam coisas e não
créditos, pode-se perceber que, em geral, os
negócios jurídicos transmissivos são causais
falsa causa, o generaliter ex omni causa ex qua
no direito brasileiro. Esta é uma firme titulus quo facta fuit annullatur, vel ex simulatione,
tendência do sistema.51 ex metu, ex defectu insinuationis, ecc. Analogamente
alla tradizionale concezione dell’acquisto derivativo
della proprietà, legata alla distinzione tra la causa (o
titolo), e il modo di acquisto, anche rispetto alla
51 Cite-se, neste sentido, reflexão análoga feita cessione si era affermata fin dal tempo dei glossatori
no direito italiano: “Era principio tradizionale che la bolognesi, come abbiamo visto, l’esigenza di
cessione dovesse avere una iusta causa, e che identificare, oltre alla causa, un atto di cessione”
pertanto fosse nula una cessio facta sine causa, o ex (ASTUTI, Cessione (storia), p.820).

149
como regra geral (salvo expressas previsões exige. Daí, porque, quando alguém vende algo,
demonstra, também, nesse preciso momento,
restritivas), diz respeito à disponibilidade
vontade de adimplir o prometido.
de todos atinge dos os bens integrantes Essa vontade de adimplir é inseparável, no plano
do patrimônio.52 psicológico, da vontade de criar obrigações.
Nos negócios jurídicos de disposição, a Faltaria seriedade à vontade criadora do dever,
se, ao mesmo tempo, não se desejasse adimplir
causalidade mostra-se elemento indispensável
o prometido. Esta inseparabilidade de vontades,
para a tutela da segurança do trânsito de entretanto, só existe, como tal, no plano
riquezas. Ainda que se verifique uma separação psicológico. No palno jurídico, bifurca-se essa
entre o negócio jurídico (causal) e o negócio vontade unitária, a fim de encher negócios
jurídicos de dimensões diferentes: o obrigacional
jurídico de adimplemento (abstratificado, de
e o de adimplemento, ou de direito das coisas.53
transmissão, de disposição), esta separação
A causalidade aqui defendida, portanto,
há que ser necessariamente relativizada pelo
apresenta-se como uma decorrência do princípio
princípio jurídico da causalidade segundo
ético de que os vínculos obrigacionais devem
o qual está norteada a transferência de bens
ser dotados de seriedade. Não é necessário
(latissimo sensu) no direito privado positivo.
recorrer ao voluntarismo – tal como expresso
Ainda que a propósito da relação entre o
no pensamento de Couto e Silva –, mas aos
negócio jurídico obrigacional e o negócio
jurídico de direito das coisas em matéria de valores que, objetivamente, iluminam o

transmissão de bens imóveis, parece oportuna sistema de disposição.

a citação do pensamento de Clóvis do Couto Na medida em que o negócio jurídico de


e Silva: disposição é voltado diretamente à diminuição
do ativo patrimonial de quem dispõe para
Em sistema de separação relativa, a declaração
de vontade que dá conteúdo ao negócio
propiciar o aumento patrimonial de quem
dispositivo pode ser considerada como co- recebe, a causalidade deve ser a regra e não a
declarada no negócio obrigacional antecedente. exceção, sobretudo pela razão de que o
É que na vontade de criar obrigações, insere-se
Código em vigor explicita no sistema uma
naturalmente a vontade de adimplir o prometido.
Não fora, assim, o negócio jurídico não teria as linha geral de vedação ao enriquecimento
condições mínimas de seriedade que o Direito sem causa, nos termos do art. 884: “Aquele
que, sem justa causa, se enriquecer à custa
de outrem, será obrigado a restituir o
52 Neste sentido, conforme explicação de Karl indevidamente auferido, feita a atualização
Larenz “Por disposición entendemos aquí todo
dos valores monetários”.
negocio jurídico por el que el titular de un derecho
modifica la extensión del mismo o su contenido, o – Procura-se justificar a abstratividade
como ocurre en los gravámenes – ambos a la vez. El da cessão de crédito, por fim, pela razão de
poder de disposición se ofrece a la doctrina jurídica
actual como una parte integrante normal de todo que o devedor não cientificado da cessão,
derecho patrimonial que siempre corresponde al que paga ao cedente em vez de pagar ao
titular del derecho, salvo que excepcionalmente esté
privado de él por un precepto legal o por disposición
judicial, p.ej., en la apertura de un concurso de
acreedores” ( LARENZ, Derecho de obligaciones, 53 COUTO E SILVA, A obrigação como processo,
p.445). p.57.

150
cessionário obtém a liberação, nos termos do ao regime do pagamento feito ao cedente
antes da notificação ou aceitação da cessão,
art. 292 do Código Civil Brasileiro.
é que se trata apenas de proteger o pagamento
O argumento não convence. O que se (do devedor de boa fé) ao credor aparente
tutela, neste caso, é a boa-fé do devedor e não de considerar a cessão como um
cedido, o qual ,segundo as circunstâncias negócio abstracto.54
concretas do caso, efetua um pagamento Anote-se, como argumento final pela
putativo que, em geral, nos termos do art. causalidade, o artigo 182 do Código Civil:
309 do Código Civil é eficaz. “Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão
Mesmo sem se concordar com um certo as partes ao estado em que antes dele se
exagero ao indicar deveres de conduta achavam, e, não sendo possível restituí-las,
especialíssimos ao devedor cedido, a reflexão serão indenizadas com o equivalente”.
de Antunes Varela parece muito bem ajustada: Se o negócio jurídico dispositivo (subjacente,
Tem-se dito, no entanto, que são irrelevantes sobrejacente ou justajacente) vier a ser
para o devedor (debitor cessus) os vícios do anulado ou nulificado a regra é a restituição
contrato de cessão: se for notificado da cessão,
ao estado em que antes dele se achavam, o
ou dela tiver conhecimento por outra via, e pagar
a dívida ao cessionário, o pagamento efectuado que aponta decisivamente para a causalidade
pelo debitor cessus conservará a sua validade e da operação.
eficácia, ainda que a cessão venha
posteriormente a ser declarada nula ou anulada.
Duas observações cumpre, no entanto, registrar
CONSIDERAÇÕES FINAIS
a propósito do tratamento concedido nesse
Dentre os diversos temas do direito
aspecto à situação do devedor.
Em primeiro lugar, não é o simples facto de o das obrigações, a cessão de crédito conjuga
crédito ter sido cedido a terceiro que isenta o uma série de escolhas, provenientes de
debitor cessus do dever (de agir de boa fé) que políticas legislativas consolidadas, que
o n.2 do artigo 762 impõe a ambos os sujeitos
permitem refletir sobre todo o sistema de
da obrigação. E no recto cumprimento desse
dever incumbe-lhe averiguar da existência e da direito privado, mormente no que pertine à
validade da cessão, não aceitando como boa disposição patrimonial.
qualquer informação irresponsável que Esta via, no entanto, é de mão dupla.
acidentalmente chegue ao seu conhecimento ou
A compreensão da cessão de crédito não
a afirmação de qualquer pretenso cessionário
(do crédito). De contrário, arriscar-se-á a ter pode ser minimamente alcançada pela
mesmo que cumprir segunda vez. simples reflexão sobre os doze artigos (art.
Se, depois de se ter devidamente esclarecido, 286-298) que tratam da matéria no Código
sobretudo junto do cedente, acerca da existência
Civil. É preciso partir do sistema para se
e da validade da cessão, o devedor cumprir
junto do cessionário, o pagamento não perderá, compreender esta “parte” do direito civil
na verdade, a sua validade e eficácia, pelo facto que, por sua vez, conforme pretendemos
de o contrato de cessão vir mais tarde a ser demonstrar, encontra-se impregnada por uma
declarado nulo ou anulado.
determinada e específica lógica de disposição
Porém, conjugando esta solução com as
soluções aplicáveis aos dois aspectos da
cessão primeiramente analisados, a conclusão
lógica a extrair dessa apreciação global, quanto 54 VARELA, Das obrigações em geral, p.301-302.

151
patrimonial. Daí ser altamente injustificável Se, na história do direito, pode-se perceber
tratar a cessão de créditos, pura e simplesmente, um penoso movimento de impessoalização
a partir das escolhas encontradas em direito das relações obrigacionais e reificação do
comparado, ignorando as graves diferenças crédito como pressupostos para construção
que existem entre os sistemas. teórica da cessão de crédito (ao que tudo
O Código Civil de 2002 trata da cessão indicada, nascida das práticas comerciais
de crédito, ao lado da assunção de dívidas, à revelia da conceituação pessoalista da
no título II do Livro “Do Direito das
relação obrigacional), contemporaneamente,
Obrigações”. Trata-se de escolha acertada que
outro movimento firma-se cada vez mais.
aponta para a diferença entre o negócio
A cessão de créditos, contemporaneamente,
jurídico basal e a cessão de créditos como
passa a representar muito mais do que um
negócio jurídico de adimplemento. 55
sofisticado mecanismo de “transmissão de
Ademais, o posicionamento sistemático da
riquezas”. Pode-se identificar muitas vezes, por
transmissão de créditos ao lado da matéria
intermédio da cessão de créditos (bem como
tratada no título III, concernente ao
da assunção de dívidas e da cessão da posição
adimplemento e extinção das obrigações,
promove uma facilitação para compreensão contratual), autênticas operações de ‘criação
da transmissão das obrigações segundo a de riquezas’ ampliando consideravelmente
metodologia da relação jurídica obrigacional a função prático-social deste tradicional
como processo, propugnada, em direito instituto. 57 As operações de factoring
nacional, por Clóvis do Couto e Silva.56 representam um exemplo eloqüente.
Tudo isto justifica uma que este tradicional
tema do direito das obrigações seja revisitado.
55 Segundo Orlando Gomes: “os alemães
O presente estudo, nessa perspectiva,
distinguem, na cessão de crédito, dois aspectos, o
fato e o efeito, ensinando que, conforme o ângulo propõe-se servir como provocação para tanto.
visual do observador, ela se apresenta ou como o
antecedente jurídico da transferência do direito do
credor ou como a conseqüência do ato translativo.
O direito brasileiro considerou a cessão de crédito
sob o aspecto dos efeitos, colocando-a coerentemente
na parte geral das obrigações e não no título dos
contratos (...)” ( GOMES, Novíssimas questões de mesmo porque o fenômeno obrigacional é
Direito Civil, p.82). inaugurado no Código Civil 2002 a partir das
56 modalidades das obrigações, mantendo sinais de uma
Judith Martins-Costa vai mais longe. Para esta
perspectiva estrutural estática da relação obrigacional
autora, a noção de obrigação como processo teria
diversa da perspectiva dinâmica proposta por Clóvis
sido reconhecida pelo direito legislado, referindo-se
do Couto e Silva.
ao Código Civil de 2002, sobretudo no que diz respeito
à sua estrutura (MARTINS-COSTA, J. Comentários ao 57 Neste sentido, Judith Martins-Costa esclarece
novo código civil. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p.1. que: “No âmbito das relações obrigacionais avultam,
Com o devido respeito a esse posicionamento, não como exemplos deste crescente fenômeno, certos
acreditamos que a ressistematização da mobilidade contratos que ‘não servem mais apenas para fazer
nas obrigações e das demais matérias seja suficiente circular as coisas, mas, tout court, para fazê-las, e em
para se concluir por uma adoção legislativa da noção especial para criar produtos financeiros’” (MARTINS-
de relação jurídica obrigacional como processo, até COSTA, Comentários ao novo código civil, p.5).

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