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Direito das Obrigações

Professor: Nilson Disconzi da Silva

Considerações Iniciais

O Direito civil comporta uma gama de conhecimentos especializados, abrangendo todas as


relações jurídicas, mesmo antes do nascimento até a extinção da pessoa com a morte.
Fez-se necessário pela doutrina, para fins de estudo a divisão didática da matéria.
O direito civil foi dividido em Parte geral e parte especial. Na parte geral é estudado pessoas,
bens e negócios jurídicos e na parte especial estuda-se obrigações, contratos, coisas, família e
sucessões.
Neste semestre será estudado o DIREITO DAS OBRIGAÇÕES.

Direito das Obrigações

Conceito: Conjunto de normas e princípios jurídicos reguladores das relações patrimoniais


entre um credor (sujeito ativo) e um devedor (sujeito passivo) a quem incumbe o dever de cumprir,
espontânea ou coativamente, uma prestação de dar, fazer ou não fazer.

É o menos sujeito a mudanças entre os ramos do direito.


O desenvolvimento desse instituto jurídico liga-se mais proximamente às relações
econômicas, não sofrendo, normalmente, influências locais, valendo destacar que é por meio das
“relações obrigacionais que se estrutura o regime econômico, sob formas defi nidas de atividade
produtiva e permuta de bens”, como já salientou ORLANDO GOMES.

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES

Na Grécia antiga, não havia, propriamente, uma definição de “obrigação”, embora já


houvesse uma certa noção dessa figura jurídica.
Aristóteles dividiu as relações obrigatórias em dois tipos, a saber, as voluntárias (decorrentes
de um acordo entre as partes) e as involuntárias (resultantes de um fato do qual nasce uma
obrigação), subdividindo essas últimas em dois outros subtipos, tomando-se como parâmetro se o
ato ilícito era cometido às escondidas ou se era praticado com violência.
No Direito Romano, por sua vez, também não se conhecia a expressão obrigação, mas o seu
equivalente histórico teria sido a figura do nexum (espécie de empréstimo), que conferia ao credor o
poder de exigir do devedor o cumprimento de determinada prestação, sob pena de responder com
seu próprio corpo, podendo ser reduzido, inclusive, à condição de escravo, o que se realizava por
meio da actio per manus iniectionem (ação pela qual o credor podia vender o devedor como
escravo, além do Rio Tibre).
Como preleciona SÍLVIO DE SALVO VENOSA, com seu habitual brilhantismo,
“no tocante à execução das obrigações, como o vínculo incidia sobre a pessoa do devedor, a
substituição para fazer recair a execução sobre os bens parece ter sido lenta e ditada pelas
necessidades da evolução da própria sociedade romana. A princípio, a sanção do nexum, velho
contrato do direito quiritário, era a manus iniectio, que, pela falta de adimplemento, outorgava ao
tradens o direito de lançar mão do devedor. A lei Papiria Poetelia do século IV a. C. suprimiu essa
forma de execução, a qual, tudo indica, já estava em desuso na época”.
Dessa forma, podemos concluir que, do ponto de vista formal, o grande diferencial do
conceito moderno de obrigação para seus antecedentes históricos está no seu conteúdo econômico,
deslocando-se a sua garantia da pessoa do devedor para o seu patrimônio.
Tal modificação valoriza a dignidade humana ao mesmo tempo em que retira a importância
central da obrigação do indivíduo no polo passivo, o que possibilitou, inclusive, a transmissibilidade
das obrigações, não admitida entre os romanos.
O Código de Napoleão, de 1804 consagrou expressamente tal conquista do Direito Romano,
prevendo, em seu art. 2.093, dentre outras disposições, que os bens do devedor são a garantia
comum de seus credores.

ÂMBITO DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES

A relação jurídica obrigacional não é integrada por qualquer espécie de direito subjetivo.
Então, quais direitos subjetivos integram as relações jurídicas obrigacionais?
Somente aqueles de conteúdo econômico (direitos de crédito), passíveis de circulação
jurídica, poderão participar de relações obrigacionais, o que descarta, de plano, os direitos da
personalidade.
É bom que se diga, nesse ponto, que o direito de crédito, a que corresponde o dever de
prestar, é de natureza essencialmente pessoal, não se confundindo, portanto, com os direitos reais
em geral.
Assim, se dois sujeitos celebram um contrato, por força do qual um dos contraentes passa a
ser credor do outro, deve-se salientar que, em verdade, o contraente credor passou a ser, em virtude
do negócio jurídico, titular de um direito pessoal exercitável contra o devedor, a quem se impõe o
dever de prestar (dar, fazer ou não fazer). Não existe, pois, uma pretensão de natureza real no
crédito formado. O credor não tem poderes de proprietário em relação à coisa ou à atividade objeto
da prestação. Não exerce, pois, poder real sobre a atividade do devedor, nem, muito menos, sobre a
sua pessoa. Trata-se, portanto, de um direito eminentemente pessoal, cuja correlata obrigação (dever
de prestar) é a própria atividade do devedor de dar, fazer ou não fazer.
De tal forma, quando por força de um contrato de prestação de serviços, o sujeito realiza a
atividade contratada, tornando-se credor da quantia de 100, esse direito não traduz um poder real
incidente sobre a quantia em si (100), mas, sim, a pretensão, juridicamente tutelada, de se exigir,
inclusive pela via judicial, o cumprimento da prestação devida pelo devedor.
Vejamos um exemplo:

A x B -------------- celebram um contrato


A é credor de B
A é titular de um direito pessoal exercitável contra B
B tem o dever de prestar uma obrigação (dar, fazer ou não fazer)
A não tem poderes de proprietário em relação a coisa ou atividade objeto da prestação.
A não exerce direito real sobre a atividade do devedor
se B tem a obrigação por exemplo de dar R$ 100,00 para A, A tem somente a pretensão de exigir de
B, o pagamento(que é a prestação)
Desta forma percebe-se que o cumprimento da prestação (atividade de B) e não a coisa em si
(os R$100,00), constitui o objeto imediato da prestação.
De acordo com a linha de intelecção do grande Mestre, conclui-se que o cumprimento da
prestação (atividade do devedor), e não a coisa em si (o dinheiro, o imóvel etc.), constitui o objeto
imediato da obrigação, e, por conseguinte, do próprio direito de crédito.
Nessa linha de raciocínio, é correto dizer que, enquanto os direitos reais são tratados pelo
Direito das Coisas, os direitos de crédito (pessoais) integram o estudo do Direito das Obrigações,
objeto do presente tomo.

DISTINÇÕES FUNDAMENTAIS ENTRE DIREITOS PESSOAIS E REAIS

O direito real é o poder jurídico direto de uma pessoa sobre uma coisa, submetendo-a sobre
o seu domínio, pleno ou limitado. Quando pleno é o direito de propriedade ou limitado em alguns
de seus aspectos como usufruto, servidão, superfície . Para o seu exercício, portanto, não necessita
de outro sujeito.
O direito pessoal ou obrigacional como foi visto é o direito contra outra pessoa.
O direito real possui duas correntes, a realista e a personalista.
Características dos direitos reais que o diferem do direito obrigacional:
a) legalidade
b) taxatividade
c) publicidade
d) eficácia erga omnes
e) aderência
f) sequela

Relação Jurídica Obrigacional:


Sujeito Ativo (credor) --------- relação jurídica obrigacional ----------Sujeito Passivo (devedor)
(crédito) (débito)

Relação Jurídica Real:

Titular do Direito Real ----------- relação jurídica real ----------- Bem/Coisa

Figuras híbridas entre Direitos Pessoais e Reais


De fato, existem obrigações, em sentido estrito, que decorrem de um direito real sobre
determinada coisa, aderindo a essa e, por isso, acompanhando-a nas modificações do seu titular. São
as chamadas obrigações in rem, ob rem ou propter rem, também conhecidas como obrigações reais
ou mistas.
Ao contrário das obrigações em geral, que se referem ao indivíduo que as contraiu, as
obrigações propter rem se transmitem automaticamente para o novo titular da coisa a que se
relacionam.
É o caso, por exemplo, da obrigação do condômino de contribuir para a conservação da coisa
comum (art. 1.315 do C-02 e art. 624 do C-16) ou a dos vizinhos de proceder à demarcação das
divisas de seus prédios (art. 1.297 do C-02 e art. 569 do C-16), em que a obrigação decorre do
direito real, transmitindo-se com a transferência da titularidade do bem. Também era a hipótese,
prevista no art. 678 do C-16 (sem correspondência no C-02), da obrigação do enfiteuta de pagar o
foro.

CONSIDERAÇÕES TERMINOLÓGICAS

Nos Códigos do mundo em geral, e no nosso em particular, consagrou-se a denominação


Direito das Obrigações, dando-se destaque ao aspecto passivo (a obrigação), e não ao ativo (o
crédito) da relação jurídica obrigacional.

Obrigação, segundo difundida definição, significa a própria relação jurídica pessoal que
vincula duas pessoas, credor e devedor, em razão da qual uma fica “obrigada” a cumprir uma
prestação patrimonial de interesse da outra.
Nesse sentido é o pensamento de WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO:
“A obrigação é a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida entre devedor
e credor, e cujo objeto consiste numa prestação pessoal econômica, positiva ou
negativa, devida pelo primeiro ao segundo, garantindo-lhe o adimplemento através
de seu patrimônio”.
Em perspectiva mais restrita, por outro lado, a palavra obrigação significaria o próprio dever
de prestação imposto ao devedor. Todavia, não raramente a expressão dever jurídico transcende os
limites do direito, invadindo a esfera da moral (fala-se, nesse caso, em dever ou obrigação religiosa,
sentimental etc.).
Em nosso entendimento, é mais adequado empregarmos a expressão obrigação para
referirmos à própria relação jurídica obrigacional vinculativa do credor e do devedor, sem que se
possa apontar atecnia na adoção da palavra para significar apenas o dever de prestar, por se tratar de
expressão plurissignificativa.
Conceitos correlatos
Não se deve confundir, ainda, obrigação (debitum) e responsabilidade (obligatio), por
somente se configurar esta última quando a prestação pactuada não é adimplida pelo devedor. A
primeira corresponde, em sentido estrito, ao dever do sujeito passivo de satisfazer a prestação
positiva ou negativa em benefício do credor, enquanto a outra se refere à autorização, dada pela lei,
ao credor que não foi satisfeito, de acionar o devedor, alcançando seu patrimônio, que responderá
pela prestação.
Em geral, toda obrigação descumprida permite a responsabilização patrimonial do devedor,
não obstante existam obrigações sem responsabilidade (obrigações naturais — debitum sem
obligatio), como as dívidas de jogo e as pretensões prescritas. Por outro lado, poderá haver
responsabilidade sem obrigação (obligatio sem debitum), a exemplo do que ocorre com o fiador,
que poderá ser responsabilizado pelo inadimplemento de devedor, sem que a obrigação seja sua.
Interessa, ainda, em respeito à técnica, a fixação de dois outros importantes conceitos
correlatos ao de obrigação: o estado de sujeição e o ônus jurídico .
O estado de sujeição consiste na situação da pessoa que tem de suportar, sem que nada possa
fazer, na sua própria esfera jurídica, o poder jurídico conferido a uma outra pessoa. Ao exercício de
um direito potestativo corresponde o estado de sujeição da pessoa, que deverá suportá-lo
resignadamente (ex.: o locador, no contrato por tempo indeterminado, denuncia o negócio jurídico,
resilindo-o, sem que o locatário nada possa fazer). Esse estado de sujeição, por tudo que se disse,
não traduz uma relação jurídica obrigacional, por ser inexistente o dever de prestar.
O ônus jurídico, por sua vez, caracteriza-se pelo comportamento que a pessoa deve observar,
com o propósito de obter um benefício maior. O onerado, pois, suporta um prejuízo em troca de
uma vantagem. É o caso do donatário, beneficiado por uma fazenda, a quem se impõe, por exemplo,
o pagamento de uma pensão mensal vitalícia à tia idosa do doador (doação com encargo). Não se
trata, pois, de um dever de prestar, correlato à satisfação de um crédito, mas, sim, de um encargo
que deve ser cumprido em prol de uma vantagem consideravelmente maior. O ônus não é imposto
por lei, e só se torna exigível se o onerado aceita a estipulação contratual.

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