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VÁRIOS SENTIDOS DA “OBRIGAÇÃO”

O termo obrigação é utilizado tanto na linguagem corrente, como pelo direito, em sentidos
diversos:

 Dever jurídico – imposição pela ordem jurídica a uma pessoa de observar determinado
comportamento (ex. comprador pagar o preço).
Quando a ordem jurídica confere às pessoas o interesse e o poder de disporem de
meios coercivos que o protegem, diz-se que ao dever corresponde um direito
subjectivo.

 Estado de sujeição – consiste na sujeição inelutável de uma pessoa ter de suportar na sua
esfera jurídica a modificação operada com o poder conferido a uma outra pessoa –
direitos potestativos (ex. direito a requerer o divórcio).

 Ónus jurídico – consiste na necessidade de observância de certo comportamento ou de
manutenção de uma vantagem para o próprio onerado (ex. denúncia dos defeitos sob
pena de caducidade).

“OBRIGAÇÃO” EM SENTIDO TÉCNICO-JURÍDICO

Nos termos do disposto no art.º 397º CC “obrigação é o vínculo jurídico por virtude do qual
uma pessoa fica adstrita para com outra à realização de uma prestação”.

O vínculo obrigacional compreende a simples realização de uma prestação (positiva ou


negativa). O direito das obrigações é também designado, muitas das vezes, como direitos de
crédito.

CARACTERÍSTICAS DA “OBRIGAÇÃO”

 Autonomia – obrigações autónomas são aquelas que se constituem directamente,


originariamente, entre dois sujeitos jurídicos sem que entre estes preexista qualquer
outra relação jurídica conexa com a obrigação. As obrigações autónomas são, por
exemplo, as nascidas de contratos.

 Disponibilidade – É uma característica própria da maioria das obrigações (tendencial),


mas há casos em que as obrigações são indisponíveis ou irrenunciáveis. P. ex.: artº 809º
cc (renúncia antecipada do credor aos seus direitos) ou 2009º cc (obrigação de prestação
de alimentos).

 Patrimonialidade – Pode ser vista sob um duplo entendimento:


– Por um lado, alude-se à exigência de que a prestação debitória revista
necessariamente natureza económica, isto é, que se mostre susceptível de avaliação
pecuniária;
– Por outro lado, no direito moderno, o inadimplemento (não cumprimento) confere
ao credor a possibilidade de agir contra o património do devedor e não contra a sua
pessoa (art.º 601º e 807ºCC).
ELEMENTOS ESSENCIAIS DA RELAÇÃO JURIDICA OBRIGACIONAL

SUJEITOS

O vínculo obrigacional estabelece-se entre pessoas em sentido jurídico:

 Sujeito activo ou credor - corresponde à pessoa em proveito de quem terá de se


efectuar a prestação e que pode exigir o seu cumprimento;
 Sujeito passivo ou devedor - é a pessoa sobre quem recai o dever de realizá-la.

De cada um dos lados da relação obrigacional podemos encontrar um ou mais sujeitos


(pessoas singulares e pessoas colectivas).

OBJECTO

Objecto é tudo aquilo sobre que incidem os poderes do seu titular activo.

 Objecto imediato (prestação em si) - consiste na prestação devida, isto é na actividade


ou conduta a que o devedor se acha adstrito com vista à satisfação do credor;
 Objecto mediato (objecto em si) - consiste na coisa ou facto que deve ser prestado.

Importa salientar que o credor não tem um direito sobre a coisa devida, mas apenas um
direito à respectiva prestação.

As prestações podem ser de factos ou de coisas; as prestações de facto podem ser negativas
(consistindo numa omissão ou abstenção) ou positivas (acção).

FACTO JURÍDICO

Para que uma relação jurídica obrigacional se transforme de abstracta em concreta é sempre
indispensável a existência de um facto jurídico que lhe dê origem.

Regra geral trata-se de factos jurídicos voluntários, que podem ser lícitos ou ilícitos.

Dentro dos lícitos assumem especial importância os negócios jurídicos, em particular os


contratos.

GARANTIA

Em qualquer relação jurídica a garantia consiste no conjunto de providências coercivas que o


direito predispõe para tutelada posição do sujeito activo.

Traduz-se na possibilidade de o sujeito activo utilizar medidas judiciárias em caso de


incumprimento das obrigações. Se o devedor não cumpre a prestação a que se acha adstrito, o
credor pode agir, por intermédio dos tribunais, contra o seu património (artº 817º cc).

A execução tem por base a apreensão de bens do devedor: em primeiro lugar da própria coisa
devida; mas apreender-se-ão outros valores se aquela não for encontrada ou se não for
suficiente para liquidar a dívida (porque foi pedida indemnização, porque sofreu uma
desvalorização, etc…).

A totalidade do património do devedor corresponde à garantia geral.

À garantia geral acrescem, ainda:


 Garantias reais - incidem sobre bens;
 Garantias pessoais -incidem sobre o património de terceiras pessoas.

Pessoais: fiança (627º cc) e o aval.

 Reais: consignação de rendimentos (656ºcc), penhor (666º cc) hipoteca (686º cc),
privilégios creditórios (733º e 736º cc) e direito de retenção (754º cc).

OBRIGAÇÕES NATURAIS

As obrigações naturais são aquelas que se fundam num mero dever de ordem moral ou social,
cujo cumprimento não é judicialmente exigível, mas corresponde a um dever de justiça –
artº402º cc.

Também são designadas de obrigações imperfeitas (para as distinguir das obrigações civis).

Têm de estar preenchidos três requisitos:

1. Que a prestação em causa não seja judicialmente exigível;


2. Que a respectiva obrigação se baseie num dever moral ou social;
3. Que o seu cumprimento corresponda a um dever de justiça.

As obrigações naturais constituem, assim, casos intermédios entre os puros deveres de ordem
moral ou social e os deveres jurídicos.

São exemplos de obrigações naturais previstas pelo legislador: as dívidas prescritas, dívidas de
alimentos que não constituam obrigações civis, dívidas provenientes de certos contratos de
jogo ou aposta não feridos de ilicitude (artº 1245º cc).

O jogo e a aposta não são contratos válidos nem constituem fonte de obrigações civis; porém,
quando lícitos, são fonte de obrigações naturais, excepto se neles concorrer qualquer outro
motivo de nulidade ou anulabilidade, nos termos gerais de direito, ou se houver fraude do
credor na sua execução.

O legislador, no artº 1247º, salvaguarda a possibilidade de existirem jogos, devidamente


autorizados pela tutela, com regime jurídico próprio e que, sendo contratos válidos, são fonte
de obrigações civis (totoloto, euromilhões, joker, lotaria, etc… são juridicamente considerados
como modalidades afins de jogo de fortuna e azar).

Ao contrário da obrigação civil, a obrigação natural não detém a chamada garantia jurídica,
através da qual o credor pode exigir o cumprimento da prestação, responsabilizando
judicialmente, em caso de inadimplemento, o património do devedor.

Assim sendo, na obrigação natural existe o “debitum”, mas não existe a “obligation”, uma vez
que não há a chamada protecção jurídica.

Uma das características das obrigações naturais é a não repetição do indevido, isto é, se o
devedor efectuar de livre vontade o pagamento, não goza do direito de repetição, ou seja, dito
por outras palavras, não pode exigir a devolução do que pagou.

Assim, se o devedor tiver capacidade para realizar a prestação e a efectuar espontaneamente


– isto é, sem qualquer coacção – já não pode pedir a restituição do que prestou, mesmo que
estivesse convencido, por erro, da coercibilidade do vínculo.
A Lei limita-se a reconhecer valor jurídico à prestação realizada espontaneamente, excluindo
que quem presta possa vir a recorrer à repetição do indevido.

A lei manda aplicar às obrigações naturais o regime das obrigações civis em tudo o que não se
relacione com a realização coactiva da prestação, salvas as excepções previstas na lei – artº
404º.

MODALIDADES DAS OBRIGAÇÕES

Várias são as modalidades que as obrigações podem revestir. Dentro delas, importa distinguir
entre obrigações singulares e plurais.

 Singulares - obrigações em que há um único sujeito activo (credor) e um único sujeito


passivo (devedor);

 Plurais – obrigações em que há vários sujeitos activos ou passivos ou simultaneamente


vários sujeitos activos e vários sujeitos passivos.

Dentro das obrigações plurais devemos distinguir entre obrigações conjuntas ou solidárias.

 Obrigação conjunta é aquela em que à pluralidade de sujeitos corresponde uma igual


pluralidade de vínculos.
 As obrigações conjuntas constituem o regime regra da nossa lei civil - significa isto
que, no caso de vários devedores, cada um deles responde proporcionalmente, no
caso de vários credores, exigindo um deles o cumprimento da prestação por parte
do devedor, o mesmo aproveita aos outros.
 Cada um dos devedores responde ao que se comprometeu.
 Credor tem que exigir a cada um dos devedores de forma igual.
 Obrigações solidárias são aquelas que se caracterizam por à pluralidade de sujeitos
corresponder um cumprimento unitário da prestação.
 Diz o artº 512º CC: “A obrigação é solidária, quando cada um dos devedores
responde pela prestação integral e esta a todos libera, ou quando cada um dos
credores tem a faculdade de exigir, por si só, a prestação integral e esta libera o
devedor para com todos eles”.
 Nos termos do artº 513º CC a solidariedade de devedores ou credores só existe
quando resulte da lei ou da vontade das partes.

Pode surgir o Direito


de Regresso (Art.º
524 CC)

MODALIDADE QUANTO AOS TIPOS DE PRESTAÇÕES

Prestação – Obrigação que cada uma das partes se vinculou.

Prestações de coisas e prestações de facto

 Prestações de coisas - aquelas em que a prestação consiste na entrega de uma coisa


(entrega do bem na compra e venda);
 Prestações de facto - aquelas que consistem em realizar uma conduta de outra ordem
(prestar trabalho).

Prestações fungíveis e prestações infungíveis

 Fungíveis - aquelas em que as prestações podem ser realizadas por outrem que não o
devedor, podendo assim este fazer se substituir; (O devedor pode-se fazer substituir
art.º 207 CC)
 Infungíveis - aquelas em que só o devedor pode realizar a prestação (prestação de
trabalho).

Prestações instantâneas e prestações duradouras

 Prestações instantâneas - aquelas cuja execução ocorre num único momento (entrega
da coisa na compra e venda);
 Prestações duradouras - aquelas cuja execução se prolonga no tempo (pagamento das
rendas no contrato de locação).

Prestações de resultado e prestações de meios

 Nas prestações de resultado - o devedor vincula-se a obter um resultado determinado,


respondendo por incumprimento se esse resultado não for alcançado (a obrigação de
entrega de uma coisa num determinado lugar pelo transportador);
 Nas prestações de meios - o devedor não estaria obrigado à obtenção de um resultado
mas apenas a actuar com a diligência necessária para que o resultado fosse obtido (o
médico apenas está obrigado a diligenciar os melhores esforços para que a cura do
doente seja obtida).
Prestações determinadas e prestações indeterminadas

 Prestações determinadas - aquelas em que a prestação se encontra completamente


determinada no momento da constituição da obrigação; (Por exemplo: Casa numa
compra e venda)
 Prestações indeterminadas - aquelas em que a determinação da prestação ainda não se
encontra realizada, pelo que a determinação terá de ocorrer no momento do
cumprimento. (Por exemplo: Compra de uma colheita de laranjas).

Resulta do disposto nos artºs 280º e 400º que a prestação não necessita de se encontrar
determinada no momento da conclusão do negócio.

FONTES DAS OBRIGAÇÕES

São fontes das obrigações os factos jurídicos que lhes podem dar origem, de onde elas
derivam.

No caso do CC Português, no capítulo dedicado às fontes das obrigações, encontram-se


autonomizados:

 Os contratos (405º a 456º);


 Os negócios unilaterais (457º a 463º);
 A gestão de negócios (464º a 472º);
 O enriquecimento sem causa (473º a 482º);
 A responsabilidade civil: por factos ilícitos (483º a 498º) e pelo risco (499º a 510º).

CONTRATOS

Diz-se contrato o acordo vinculativo (quem se obrigou tem que cumprir) assente sobre duas ou
mais declarações de vontade (oferta ou proposta, de um lado; aceitação, do outro),
contrapostas mas perfeitamente harmonizáveis entre si, que visam estabelecer uma
composição unitária de interesses.

O Contrato apare quando alguém tem um interesse.

 Aceitar
A proposta tem 3 opções:  Não Aceitar
 Contraproposta (Se fizer, anulo automaticamente a anterior proposta)

O Código Civil português vigente não define expressamente a figura do contrato. Além de
admitir a constituição de obrigações com prestação de carácter não patrimonial (art. 398º/2
CC), considera expressamente como contratos o casamento (art. 1577º CC), do qual brotam
relações essencialmente pessoais, bem como o pacto sucessório (art.s1701º, 2026º, 2028º CC),
que é fonte de relações mortis causa.

O contrato pode ser hoje, por conseguinte, não só fonte de obrigações (da sua constituição,
transferência, modificação ou extinção), mas de direitos reais, familiares e sucessórios.
Os contratos podem ser:

 Quanto à forma: consoante a validade da declaração negocial dependam de uma


determinada forma de celebração, prevista na lei
 Formais - oral, escrito, escritura pública ou DPA
 Não formais - de qualquer forma.

 Quanto ao modo de formação:


 Contratos reais quod constitutionem - aqueles para cuja celebração se exige a
tradição ou entrega da coisa.
 Contratos consensuais: aqueles em que a entrega é dispensada.

 Quanto aos efeitos: (art.º 879º CC) – Contratos Reais ou Obrigacionais - consoante a
situação jurídica se reconduza a um direito real sobre uma coisa ou apenas dê origem a
direitos de crédito ou obrigações.

 Sinalagmáticos ou não sinalagmáticos - consoante originem obrigações recíprocas para


ambas as partes, ficando assim ambas na posição de credores e devedores, ou só para
uma das partes.
 Sinalagmáticos – Bilateral (contrato de compra e venda).
 Não sinalagmáticos - Contrato doação, pois apenas um constitui vinculo
perante o outro.

 Onerosos ou gratuitos: consoante implique atribuições patrimoniais para ambas as


partes ou apenas para uma delas.
 Onerosos - se existe ou não um sacrifício patrimonial para ambos.
 Gratuitos - Doação, uma vez que só um sofre sacrifício patrimonial.

 Nominados ou inominados: consoante a lei os reconheça como categoria através de


umnomen iuris, ou não.
 Nominados - conhecidos pela doutrina.
 Inominados – Não têm nome e não são previstos na lei. Apenas utilizados por
quem celebra um contrato.

 Típicos ou atípicos: consoante tenha um regime que se encontra previsto na lei, sendo
atípico quando tal não acontece (a franquia, por exemplo).
 Típicos – Regime jurídico previsto na lei.
 Atípicos – Não têm regulamentação jurídica própria.

 Contratos mistos: aquele que reúne em si regras de dois contratos total ou parcialmente
típicos, assumindo-se dessa forma como um contrato atípico, por não corresponder
integralmente a nenhum tipo contratual regulado por lei.
A propósito dos contratos, devemos ter em conta o princípio da liberdade contratual
(autonomia da vontade):

1.º Liberdade de celebração (ou vinculação) – celebrar, ou não, um contrato;


 Cabe a nossa vontade se celebramos um contrato ou não.
2.º Liberdade de criação – escolher um dos contratos previstos na lei ou uma figura nova;
 Nasce a partir do momento em que celebramos um contrato, escolhendo o tipo de
contrato.
3.º Liberdade de estipulação – fixar livremente o conteúdo dos negócios.
 Ao escolher o tipo de contrato podemos estipular (criar) as cláusulas que
quisermos.

NEGÓCIO JURÍDICO UNILATERAL

São aqueles em que há, somente, a manifestação de uma vontade, ou havendo várias
declarações de vontade, todas elas têm o mesmo conteúdo.

A -----------------------> B (não manifesta vontade)


Não se confundem com a simples proposta contratual prevista no artº 228º e ss. São
verdadeiros negócios jurídicos.

Também não se confundem com o contrato unilateral (aquele que sendo um negócio bilateral
apenas contem obrigações para uma das partes – p.e. a doação)

Os negócios jurídicos unilaterais podem ser:

 Receptícios – (precisam de ser conhecidos) - a vontade tem de ser dirigida e comunicada


a certa pessoa (promessa pública ou a denúncia de um contrato);
 Não receptícios – (não precisam de ser conhecidos) - vale independentemente dessa
exigência (testamento).

Nos negócios jurídicos unilaterais não vigora o princípio equivalente aos contratos liberdade
negocial; vigora o princípio do numerus clausus – art.º 457º.
- Ou tipicidade (tipo de negocio fechado “são aqueles”).

- Só produz efeitos jurídicos nos negócios jurídicos previsto na lei;

No negócio jurídico unilateral não há prestações recíprocas.

São negócios jurídicos unilaterais:

 O testamento;
 O contrato a favor de terceiro;
 A promessa pública;
 Os concursos públicos;
 O pacto de preferência (apenas em determinadas situações).
Testamento

 É o negócio jurídico unilateral em que alguém, para depois da sua morte, dispõe,
livremente, de parte ou da totalidade do seu património.

Quota Quota Se não houver herdeiros


Disponível Indisponível legitimários.

Testamento Herdeiros
legitimários
(Art.º 2157)

 Não obstante o artº 2179º referir que o “testamento é o acto unilateral e revogável …”, a
sua natureza jurídica é de um negócio jurídico unilateral.
 Havendo herdeiros legais, apenas se pode dispor livremente da quota disponível.
 É um negócio mortis causa, só produz efeitos quando o testador morre.
 O regime jurídico do testamento encontra-se regulado nos artºs 2179º e ss

Contrato a favor de terceiro

 É o negócio em que uma das partes assume perante outra a obrigação de efectuar uma
prestação a favor de terceiro estranho ao negócio – artº 443º.
 É um negócio bilateral, mas perante o terceiro beneficiário apresenta-se como um
negócio unilateral.
 São exemplos os contratos de seguros de acidentes pessoais ou de vida.

Estranho ao negócio
(não tem intervenção)

Se A morrer, B
indemniza C

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