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Direito Civil – Direito das Obrigações – Mauricio Silveira

CLASSIFICAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES

As obrigações podem ser classificadas de várias formas, dependendo do


critério adotado pelo intérprete. Conforme explica Washington de Barros Monteiro:
"... o Código Napoleão, por exemplo, nesse ponto imitado por quase todas as
Legislações que se filiaram ao sistema jurídico francês, classifica-as segundo o
modo por que se estabelece a relação, a maneira pela qual se formam as
obrigações". Distingue-as em convencionais e não convencionais, dependendo
como surgiram, convenções ou atos unilaterais (contrato, quase-contratos, delitos
e quase-delitos). O mesmo autor considera vaga tal classificação.
Já o direito Romano, distingue-as em três modalidades: Dare, Facere e
Praestare.
Dare: seriam aquelas "que tivessem por fim a entrega de uma coisa, ou de
certa quantia" (compra e venda, permuta, doação e dação em pagamento).
Facere: seriam aquelas "em que alguém se comprometia a fazer seu
trabalho ou executar determinado serviço, sem se cuidar da transferência de
qualquer direito" (locação de serviços, mandato e empreitada). "Num sentido mais
amplo, a expressão comportava igualmente o num facere, isto é, a abstenção de
determinado ato".
Praestare: para uns seriam aquelas de duplo caráter (dare e facere); para
outros, se referia "às antigas ações ex-delicto, a cerca das quais a fórmula não
podia ser precisada nem no Facere, nem muito menos no Dare"; para outros,
seriam compreensivo do ato tendente a indenizar o dano causado.
O nosso código inspirou-se visivelmente no Direito Romano. Baseando-se
no objeto da obrigação, classificou-as em três grupos:

1) obrigações de dar (coisa certa ou incerta) que por muitas vezes se mistura
com a obrigação de fazer, ou de não fazer. Por exemplo, na compra e venda, o
vendedor deve entregar o objeto (dar) e tem ainda a obrigação de responder pela
evicção e vícios redibitórios (fazer).

2) obrigações de fazer que consistem na prestação de um ato ou um serviço do


devedor, podendo ainda abranger a obrigação de dar ou a de não fazer.
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3) obrigações de não fazer, onde o devedor se compromete em abster-se da


prática de algum ato.

As obrigações de dar e de fazer são positivas; as de não fazer, negativas.


Havendo possibilidade de intervir na relação jurídica obrigacional mais de um
credor e mais de um devedor, sendo ainda possível a prestação compor-se de um
só ou de vários objetos e tendo em vista a forma de cumprimento ou de satisfação
da obrigação, esta pode apresentar várias modalidades:

 Morais - são as desprovidas de vinculo jurídico. Seu descumprimento não


acarreta qualquer sanção legal ao devedor.
 Civis - são dotadas de vinculo jurídico, o que confere ao credor o direito de
exigir a satisfação e impõem ao devedor o dever de prestá-las.
Ex: obrigações derivadas de contrato.
 Positivas - obrigam o devedor a um comportamento, ou seja, a dar ou
fazer alguma coisa.
Ex: a entrega do bem vendido.
 Negativas - impõem ao devedor uma abstenção de conduta (não fazer
alguma coisa).
Ex: o costureiro que se propõe não fazer outra peça igual.
 Líquidas - aquelas que são certas quanto à existência e determinadas
quanto ao objeto.
Ex: O pagamento de um título de crédito de X reais.
 Ilíquidas - as que são certas quanto à existência e indeterminadas quanto
ao objeto ou montante dele.
Ex: Contrato de Arrendamento em percentual da safra.
 Principais - as obrigações que existem em si e por si próprias.
Ex: Locação.
 Acessórias - aquelas que dependem das principais para existirem. Ex: A
fiança em relação ao contrato principal.
 Simples - quando a prestação se compõe de uma única coisa ou um só
objeto.
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 Conjuntas - as obrigações em que a prestação se compõe de várias
coisas ou objetos e deve ser satisfeita de uma só vez.
 Únicas - na relação jurídica obrigacional têm-se a existência um só credor
e um só devedor.
 Múltiplas - quando, ao contrário, da relação jurídica participam vários
credores e vários devedores.
 De meio - determinam ao devedor que faça alguma coisa ou pratique
algum ato, sem responsabilidade quanto ao resultado.
Ex: médico, advogado.
 De resultado - nestas obrigações o devedor não se propõe apenas a fazer
algo, pois sua responsabilidade se relaciona diretamente com o resultado.
Ex: Transporte do passageiro até o destino, são e salvo; serviço do engenheiro.
 Alternativas - São aquelas com mais de uma prestação estipulada,
podendo o devedor escolher a que mais lhe convier para desonerar-se.
Ex: No contrato de seguro, havendo o sinistro, a seguradora se obriga a consertar
o seu automóvel ou oferecer-lhe outro veículo (ou o valor dele).
 Cumulativas - São dotadas de duas ou mais prestações e o devedor
deverá oferecer todas para alcançar o cumprimento da obrigação.
 Naturais – Na obrigação natural existe o débito, mas não há
responsabilidade, sendo, portanto, inexigível, juridicamente. Os casos mais
comuns em nosso Direito são as dívidas prescritas, as dívidas de jogo e o
pagamento dos juros que não foram previamente convencionados. O
credor não tem o direito de exigir o pagamento, e o devedor não poderá
ser forçado a pagar. Se o devedor pagar, no entanto, não poderá pedir a
repetição do indébito (artigo 882 do NCC).
 Modais, Condicionais e a termo - quando a eficácia da obrigação estiver
subordinada a qualquer dos elementos acidentais dos atos jurídicos, como:
a condição (cláusula que submete a eficácia do ato ou da declaração a
evento futuro e incerto); o termo (cláusula que submete a eficácia da
declaração de vontade a evento futuro e certo); ou, o modo (encargo que
se impõe ao beneficiário de ato de liberalidade).
 Divisíveis - as obrigações que podem ser prestadas parceladamente
(quando cada um dos devedores ou credores pode pagar ou receber a sua
cota, sem depender dos demais).
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 Indivisíveis - as obrigações que devem ser prestadas de uma só vez,
ainda que seu objeto seja divisível.
 Facultativas - estas obrigações guardam semelhança com as alternativas,
mas nelas o devedor pode recusar o cumprimento pelo modo anunciado,
satisfazendo-as. Ex: O inventor (artigo 1233/1234 do novo Código Civil);
onde o "dono" poderá "abandonar" a coisa achada, eximindo-se de pagar a
"recompensa".
 Solidárias - são as obrigações que, embora havendo pluralidade de
credores ou de devedores, todos eles têm direito ou se obrigam pela
prestação por inteiro.

DAS OBRIGAÇÖES EM GERAL

No relacionamento humano surgem várias ordens de obrigação, dentre as


quais, obrigações de natureza moral, social, religiosa, política e a obrigação civil.
As primeiras, em regra, sem qualquer valor pecuniário, enquanto que a última é
regulamentada pelo legislador, em virtude da sua importância para a ordem e
equilíbrio social, portanto, havendo o seu descumprimento, existe também a
sanção.
A obrigação civil distingue-se das demais por ser dotada de vinculo jurídico,
o qual impõe ao sujeito passivo da relação, o dever de cumpri-la, e, por outro lado,
dá ao sujeito ativo, o direito de exigir a satisfação de prestação. Não sendo
satisfeita a obrigação, o devedor responderá com seus bens pela prestação
devida.
Outrora, o devedor chegou a responder com a própria vida, pelo cumprimento
da obrigação civil. Atualmente, só responde com o seu patrimônio.
Para maior compreensão, vale transcrever pequeno trecho da professora
Maria Helena Diniz, de sua obra Curso de Direito Civil Brasileiro: “... Deveras, o
homem moderno vive numa sociedade de consumo, onde os bens ou novos
produtos da tecnologia moderna lhe são apresentados mediante uma propaganda
tão bem elaborada, que o leva a sentir necessidades primárias ou voluptuárias
nunca antes experimentadas, como, p. ex., a de substituir um carro novo por um
zero km que, embora supérfluo, virá satisfazer um anseio de status. A ânsia de
atender aos mais variados requintes de bem-estar e de vaidade transforma-o num
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autômato, que age em função da ganância de novos mercados, de maiores lucros
e de satisfação de seus objetivos e ambições, justificáveis ou artificiais, fazendo-
o desenvolver uma atividade econômica intensa.
Essa intensificação da atividade econômica, provocada pela urbanização,
pelo progresso tecnológico, pela comunicação permanente, causou grande
repercussão nas relações humanas, que por isso precisaram ser controladas e
regulamentadas por normas jurídicas, que compõem o direito das obrigações.

DA OBRIGAÇÃO CIVIL - Conceitos:

Conforme Clóvis Beviláqua obrigação civil "... é o complexo de relação de


direito patrimonial, que tem por objeto fatos ou prestações de uma pessoa em
proveito de outra".
Conforme Lacerda de Almeida, Obrigação Civil "... é o núcleo jurídico pelo
qual alguém está obrigado (adstrito) a dar, fazer ou não fazer alguma coisa".
Conforme Silvio Rodrigues "... é o vinculo de direito pelo qual um sujeito
passivo fica adstrito a dar, fazer ou não fazer alguma coisa em favor de um sujeito
ativo, sob pena de, se o não fizer espontaneamente, seu patrimônio responde pelo
equivalente".
Conforme Washington de Barros Monteiro, obrigação civil "... é a relação
jurídica de caráter transitório (passageiro), estabelecido entre devedor e credor,
cujo objeto é uma prestação pessoal e econômica, positiva ou negativa (não
fazer), devida pelo primeiro ao segundo, que garante o adimplemento com seu
patrimônio".
Para Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, obrigação civil é em
sentido abrangente a “... relação jurídica pessoal por meio da qual uma parte
(devedora) fica obrigada a cumprir, espontânea ou coativamente, uma prestação
patrimonial em proveito da outra (credora)”.

CARACTERÍSTICA DA OBRIGAÇÃO CIVIL

1 - relação jurídica = relação juridicamente protegida.


2- Caráter transitório = satisfeita à obrigação extingue-se a obrigação civil.
3- Estabelecida entre partes = credor e devedor.
4- Objeto = prestação pessoal econômica, positiva ou negativa.
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5- Adimplemento = garantido pelo patrimônio do devedor.

FONTES DA OBRIGAÇÄO CIVIL

Fonte é o nascedouro - o lugar de onde emanam as obrigações. Não há


unanimidade entre os doutrinadores acerca do assunto. Mas, consoante opinião
generalizada é:
a) os contratos (Declarações bilaterais);
b) as declarações unilaterais de vontade (Ex. Testamento);
c) atos ilícitos.

Aponta-se também a lei como fonte das obrigações, como as obrigações de


pagar impostos (propter rem) e de prestar alimentos.
Para os adeptos da responsabilidade objetiva, é também fonte de
obrigações civis. Ex. Parágrafo único, do artigo 927 do Código Civil; Risco
profissional - Acidente de trabalho.
Outros dizem ser:
a) atos jurídicos;
b) lei (atos ilícitos).

Em verdade, a Lei sempre será direta ou indiretamente a fonte das


obrigações civis, tendo em vista que faz nascer o vínculo jurídico.
Com o novo Código Civil, devemos acrescentar às três fontes citadas
inicialmente, mais dois itens:

d) Responsabilidade objetiva; e,
e) Demais circunstâncias previstas em lei, que completa o raciocínio inicial sem
lacunas.

ELEMENTOS CONSTITUTIVOS

Sem os elementos constitutivos não se vislumbra a obrigação civil. De tal


sorte, a falta de qualquer deles torna insustentável a sua existência; são eles:
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a) vinculo Jurídico - chama-se jurídico porque a lei confere ao credor o direito de
buscar a tutela do estado, através do poder judiciário, para vê-la satisfeita,
impondo ao devedor o dever de prestá-la sob pena de sanção.
Procurando caminhos para melhor compreender este elemento, a doutrina
desenvolveu várias teorias. Num primeiro momento entendeu-se que o vínculo
jurídico era uno, ou seja, tem-se a obrigação, e em virtude disso, surge o dever
imposto pela lei, tendo como contrapartida o direito do credor de utilizar a lei para
sua satisfação (teoria monista). Posteriormente, surgiu no direito alemão a teoria
dualista que aponta dois elementos para explicar o vinculo jurídico: o débito ( shuld
- debitum) e a responsabilidade (haftung - obligatio), entendendo que num
primeiro momento, o devedor pode satisfazer a obrigação, apenas por
reconhecer o débito, sem precisar o credor invocar a lei (através da
responsabilidade) para ver a obrigação satisfeita. Caso tal fato não ocorra, pode
o credor através da Lei, invocar a responsabilidade do devedor, que desta forma
responde com o seu patrimônio até o cumprimento.
Verificando tais posições, torna-se mais compreensível a obrigação Natural
(verificar classificação inicial). Nestas obrigações aparece o "shuld" (débito), mas
não existe a "haftung" (responsabilidade). Ex. Dívida de Jogo. Existe o débito, mas
é impossível cobrá-lo judicialmente (artigo 814 do NCC), portanto, não existe a
responsabilidade. Ocorre que havendo o reconhecimento do débito pelo devedor
e, conseqüentemente, havendo o pagamento, a própria lei empresta-lhe validade,
não permitindo a repetição do indébito.

b) As partes na relação obrigatória - Sempre haverá o sujeito ativo (credor) e o


sujeito passivo (devedor), sejam eles determinados ou determináveis, isto porque,
se forem indetermináveis, nula será a obrigação civil.

c) Prestação - Consistente em dar, fazer ou não fazer alguma coisa. Da mesma


forma que as partes, o objeto da prestação pode ser indeterminado, desde que
determinável; caso contrário, não se poderia chegar ao cumprimento da
obrigação.

DIREITO REAL E DIREITO PESSOAL


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Falando de direito das obrigações, estamos no campo dos direitos
patrimoniais. Estes se dividem em Direitos Reais e Direitos Pessoais ou
obrigacionais.
"Diz-se real o direito que recai diretamente sobre a coisa; pessoal, o que
depende de uma prestação do devedor, isto é, o que implica, necessariamente, a
colaboração de um sujeito passivo".
Nos direitos reais a relação se estabelece entre a pessoa e a coisa, no
sentido de poder a primeira extrair da segunda tudo que lhe seja proveitoso.
No relacionamento obrigacional (Direito Pessoal), apenas se sujeita aos seus
efeitos, os que participaram da relação jurídica, ou seja, credor e devedor. Já os
direitos reais atingem a todos.
Os Direitos pessoais são os mais amplos possíveis, enquanto os direitos
reais se restringem a propriedade e seus desmembramentos (posse - uso -
desfruto - gozo).
Os Direitos reais tendem a eternizar-se, ao passo que os direitos pessoais
são passageiros.
O prazo de prescrição dos direitos reais é menor do que o previsto para os
direitos pessoais, sendo o primeiro de 10 anos entre os presentes ou 15 anos
entre ausentes e o segundo de 20 anos (CC de 1916).
Por algumas vezes o Direito Real só nasce depois de registrado.
O Direito Pessoal muitas vezes é "toma lá da cá" (compro, recebo, pago e
acaba a relação jurídica sem necessidade de maiores formalidades).
O professor Pablo Stolze Gagliano, em sua obra Novo Curso de Direito Civil,
Saraiva, Volume II, aponta as seguintes características do direito real que o
diferencia do direito pessoal:
a) legalidade ou tipicidade – os direitos reais somente existem se a respectiva
figura estiver prevista em lei (art. 1.225 do CC-02 e art. 524 e 674 do CC-16);
b) taxatividade – a enumeração legal dos direitos reais é taxativa (numerus
clausus), ou seja, não admite ampliação pela simples vontade das partes;’’.
c) publicidade – primordialmente para os bens imóveis, por se submeterem a um
sistema formal de registro, que lhes imprime essa característica;
d) eficácia erga omnes – os direitos reais são oponíveis a todas as pessoas,
indistintamente. Essa característica não impede, em uma perspectiva mais
imediata, o reconhecimento da relação jurídica real entre um homem e uma coisa.
Essa eficácia erga omnes deve ser entendida com ressalva, apenas no aspecto de
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sua oponibilidade, uma vez que o exercício do direito real – até mesmo o de
propriedade, mais abrangente de todos – deverá ser sempre condicionado
(relativizado) pela ordem jurídica positiva e pelo interesse social, uma vez que não
vivemos mais a era da ditadura dos direitos1;
e) inerência ou aderência – o direito real adere à coisa, acompanhando-a em
todas as suas mutações. Essa característica é nítida nos direitos reais de garantia
(penhor, anticrese, hipoteca), uma vez que o credor (pignoratício, anticrético,
hipotecário), gozando de um direito real vinculado (aderido) à coisa, prefere outros
credores desprovidos dessa prerrogativa;
f) seqüela – como conseqüência da característica anterior, o titular de um direito
real poderá perseguir a coisa afetada, para buscá-la onde se encontre, e em mãos
de quem quer que seja. É aspecto privativo dos direitos reais, não tendo o direito
de seqüela o titular de direitos pessoais ou obrigacionais.
Por tudo isso, o poder atribuído ao titular de um direito real é juridicamente
muito mais expressivo do que aquele conferido ao titular de um direito de natureza
pessoal ou obrigacional.
Os direitos pessoais, por sua vez, identificados com os direitos de crédito
(de conteúdo patrimonial), têm por objeto a atividade do devedor, contra o qual é
exercido. Assim, ao transferir a propriedade da coisa vendida, o vendedor passa a
ter um direito pessoal de crédito contra o comprador (devedor), a quem incumbe
cumprir a prestação de dar a quantia pactuada (dinheiro). Note-se que o objeto do
crédito (ou, sob o aspecto passivo, da obrigação) é a própria atividade do devedor.
Nesse contexto, fica fácil notar que ao Direito das Obrigações interessa
apenas o estudo das relações jurídicas obrigacionais (pessoais) entre um credor
(titular do direito de crédito) e um devedor (incumbido do dever de prestar),
deixando-se para o Direito das Coisas as relações e direitos de natureza real. 2

TRADIÇÃO

Conforme J.M. de Carvalho Santos "A tradição não é se não a transferência


da posse, por mútuo acordo, havendo de uma parte a intenção de entregar e da
outra a intenção de receber a coisa".

1
Nesse sentido, já advertia Duguit: “A propriedade não é mais o direito subjetivo do proprietário; é função
social do detentor da riqueza” (Leon Duguit, Las Transformaciones Generales Del Derecho Privado, Madrid:
Ed. Posada, 1931, p. 37).
2
Op. cit. p. 7/8.
10
"Para se integrar à tradição, capaz de transferir o domínio, é preciso mais:
que a intenção recíproca de transferir e adquirir verse sobre o domínio. Podendo-
se, portanto, definir a tradição como sendo a entrega, que o dono da coisa faz a
outra, com a intenção recíproca de transferir e adquirir o domínio".
"A tradição, desacompanhada daquela situação recíproca de transferir e
adquirir o domínio, também é conhecida pelo nome de tradição nua (nuda traditio),
consistindo apenas na mera entrega da coisa, como ocorre no comodato, no
penhor, na locação, no depósito".
Existem exceções à regra, pois existem casos em que se transfere o domínio
sem haver tradição. Exemplo: Na abertura de sucessão legítima aos herdeiros e
legatários da coisa certa; no casamento. Importante frisar, que não se transfere,
conforme nosso código civil, o domínio do bem através do contrato, "o contrato de
compra e venda não torna o adquirente dono da coisa comprada, mas apenas
titular da prerrogativa de reclamar sua entrega". Assim a tradição ocorre no
momento da entrega (artigo 1.267 do Código Civil).
Para a transferência dos bens imóveis, necessário se faz o registro do título
aquisitivo junto ao cartório de imóveis (artigo 1.245, §§ primeiro e segundo do
Código Civil), que corresponde à tradição solene.

DO PERECIMENTO OU DETERIORAÇÄO DA COISA

Estudamos a tradição porque, legalmente, quando da ocorrência de


perecimento ou deterioração da coisa (bem), quem sofre o prejuízo é o dono. Da
mesma forma, quando ocorre melhoramento ou acréscimo, o dono é quem deve
ganhar.
Existindo a obrigação (obrigação civil) de entregar algo, ou de restituir, existe
a possibilidade da deterioração ou perecimento do bem. Havendo culpa do
devedor, este sempre será responsabilizado (deverá indenizar), garantindo a
obrigação com seus bens.
Se a coisa perecer por culpa do devedor, responderá este pelo seu valor,
acrescido das perdas e danos (artigos 234 e 239 do Código Civil), seja a
obrigação de dar ou de restituir, respectivamente.
Se a coisa deteriorar por culpa do devedor, poderá o credor optar pela
solução acima, ou aceitar o bem da forma em que se encontra, reclamando ainda
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a diferença relativa ao prejuízo suportado, através da indenização pelas perdas e
danos (artigos 236 e 240 "in fine" do Código Civil).
Havendo deterioração ou perecimento sem culpa do devedor, a obrigação se
resolverá e sofrerá a perda, o dono da coisa.
Por outro lado, no mesmo sentido, havendo melhoramentos sem esforço do
devedor, estes também serão experimentados pelo dono.
Como se percebe, é importante verificar quem tem o domínio do bem para
verificarmos quem experimenta prejuízo ou ganho quando a coisa
"deteriorar/perecer" ou "melhorar\acrescer" sem culpa ou contribuição do devedor
ou de terceiros.

DAS OBRIGAÇÕES DE DAR

A obrigação de dar consiste na entrega, pelo devedor ao credor, de alguma


coisa, envolvendo a tradição. A obrigação de dar pode envolver a entrega de
coisa certa ou incerta. Ainda pode se desdobrar em obrigação de dar
propriamente dita e obrigação de restituir (Ex: depositário, locatário).
A obrigação de dar coisa certa obriga o devedor entregar ou restituir objeto
determinado e individualizado (escolhido).
A obrigação de dar coisa incerta consiste na entrega, pelo devedor ao credor,
de coisa não individualizada (não escolhida), "mas no gênero a que pertence".
Nesse caso, o bem será mencionado, ao menos, quanto ao gênero e quantidade
(art. 243 do CC), pois em se tratando desse tipo de obrigação, em tese, para o
credor pouco importa se a coisa é de uma ou outra partida, pois tanto de um
quanto de outra seriam iguais, sendo o bem do gênero pactuado e sendo entregue
a quantidade avançada, terá o mesmo valor pecuniário ou satisfativo.
Se a obrigação for de dar coisa certa, o intuito do credor é receber aquela
coisa, assim, através do artigo 313 do Código Civil, o legislador garante ao credor
o direito de reclamar a coisa individualizada (objeto do contrato). Sendo assim, o
devedor só se liberta da obrigação assumida se entregar o objeto ajustado; pré-
individualizado. Se o credor não é obrigado a receber outra coisa, a não ser a
pactuada, também não poderá exigir do devedor coisa diferente ou diversa,
mesmo que de menor valia.
Essa afirmação também se tira da interpretação do artigo 313 do Código
Civil. Embora haja a distinção entre a obrigação de dar coisa certa e incerta,
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quando se tratar da segunda (coisa incerta), sempre terá duração limitada, uma
vez que no momento da satisfação da obrigação à coisa incerta se transforma em
certa (art. 245 do Código Civil). Eis aqui o marco legal da distinção entre uma e
outra modalidade da obrigação de dar (coisa certa e incerta); feita a escolha e
noticiada ao devedor, passa a vigorar o regulamento inerente à coisa certa.
Entendeu o legislador que a coisa certa está "escolhida" (individualizada) e a
incerta não.

DAS OBRIGAÇÕES DE FAZER E NÃO FAZER

Na obrigação de fazer o devedor se compromete a praticar um ato, ou


realizar uma tarefa que, em regra, oferece vantagem pecuniária ao credor.
Exemplo: O pedreiro que se compromete a edificar um muro; ou, o indivíduo que
se obrigou em promessa irretratável de contra e venda que posteriormente, deverá
firmar a escritura definitiva (obrigação de fazer).
No que pese o fato de alguém fazer alguma coisa envolva até certo ponto
uma obrigação de dar, "pois quem promete a entrega de determinada prestação
está, em rigor, vinculando-se a fazer referida entrega", estas obrigações se
distinguem ao serem observadas por outros ângulos, principalmente se
analisarmos que na obrigação de dar existe a entrega de um bem, enquanto na
obrigação de fazer há a entrega de uma prestação que inicialmente deve ser
confeccionada, dependendo de um ato ou serviço do devedor.
Na obrigação de dar "é sempre possível à execução compulsória, na de fazer
isso inocorre", isto porque, exigir do devedor a prestação de serviço ou ato, seria
ofender-lhe gravemente a liberdade. Como mostra Silvio Rodrigues, "impossível
ao juiz mandar que um oficial obrigue o devedor a pintar a tela", e continua
explicando que tal procedimento somente seria possível diante de uma legislação
que reconheça a escravidão. Portanto, o inadimplemento da obrigação de fazer só
legitima o credor ao ressarcimento por perdas e danos.
Somente será possível a execução específica nos casos em que a obrigação
de fazer tratar-se de obrigação de prestar declaração de vontade (artigo 641 do
Código de Processo Civil).
Ex. Quando o credor se recuara a dar a quitação da dívida para o devedor,
existindo nesse caso possibilidade de se conseguir a "quitação" judicialmente; ou,
conforme o exemplo citado se houver a promessa irretratável de compra e venda,
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se o vendedor se recusar em firmar o instrumento definitivo, pode o comprador
(credor da obrigação de fazer), conseguir que o juiz substitua a pessoa do devedor
da obrigação de fazer, produzindo a sentença final os mesmos efeitos da
declaração não emitida.
Baseado na impossibilidade de ferir a liberdade do devedor, o nosso
legislador encontrou outros caminhos para pressionar o devedor a cumprir sua
obrigação de fazer. Além de conferir ao credor o direito de requerer a condenação
do devedor nas perdas e danos derivados do inadimplemento, lhe dá, também, o
direito de requerer a execução da obrigação por terceiro e por conta do
devedor, conforme a regra do artigo 249 do Código Civil, não devendo deixar de
observar as regras processuais para o procedimento, conforme artigo 815 e
seguintes do Código de Processo Civil.
Não se pode deixar de observar que o novo Código Civil inovou no
parágrafo único do artigo 249, quando permite, independente de autorização
judicial, a contratação de terceiro para o cumprimento da obrigação nos casos de
urgência; trata-se da aplicação da auto tutela, procedimento adotado pelo
legislador quando há risco de dano grave; no nosso entender, referido direito só
deve ser exercido pelo credor nos casos em que o dano maior será inevitável já
que é sempre possível valer-se de ações cautelares, ou pedido de liminar ou tutela
antecipada, quando a contratação de terceiro pode ser autorizada rapidamente
pelo magistrado.
Por outro lado, é possível ainda, diante do inadimplemento do devedor, que o
credor, através de ação com preceito cominatório (astreintes), consiga ver o
devedor condenado a uma multa diária, até que cumpra a obrigação (ART.
536/537 do Código de Processo Civil).
Em se tratando de obrigação de fazer, a doutrina lança mão de uma
classificação para melhor fazer compreender o assunto, ou seja, a obrigação de
fazer pode ser fungível e infungível:
 Fungível - Sempre que a obrigação possa ser cumprida por qualquer
pessoa. Ex. Do credor que quer ver o seu automóvel limpo – pouco importa
se a limpeza foi efetuada pela pessoa do devedor – limpo, a obrigação foi
cumprida.
 Infungível - A obrigação de fazer deve ser cumprida pela pessoa do
devedor, não serve quando cumprida por qualquer pessoa. Ex. Do credor
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que contrata um pintor de telas para desenhar o seu retrato. Interessa ao
credor as qualificações pessoais do devedor para desempenhar tal mister -
A obrigação não satisfaz sendo cumprida por qualquer pessoa.
É lógico que a satisfação é pessoal, de maneira que, se o credor não quiser
ver cumprida a obrigação por terceiros, não irá invocar esse direito (execução por
terceiro). Da mesma forma, se o cumprimento tardio da obrigação não mais lhe
interessa também não se utilizará a ação com preceito cominatório, restando-lhe
apenas a indenização pelo inadimplemento (perdas e danos).
O nosso legislador, sempre preocupado em não ofender a liberdade do
devedor, tenta possibilitar a execução específica da obrigação fazer, oferecendo
mecanismos legais capazes de coagir o devedor, uma espécie de sanção legal,
conforme o meio eleito pelo próprio credor da obrigação de fazer. Vale lembrar,
que é importante para o Estado o cumprimento da obrigação da forma que foi
pactuada (Execução Específica).
Sob o mesmo prisma está a obrigação de não fazer. Enquanto na obrigação
de fazer o devedor deve prestar um ato, ou realizar uma tarefa, na obrigação de
não fazer, o devedor deve se abster da prática de um ato, o que leva a doutrina
tratar o assunto conjuntamente, eis que, uma com caráter positivo e outra com
caráter negativo. Ocorre, que na obrigação de não fazer é mais freqüente a
possibilidade de levar a cabo a execução específica da obrigação, sendo possível,
exigir o desfazimento, sem ofender a liberdade do devedor, sempre que possível
(artigo 251). Vale acrescentar o raciocínio do prof. Silvio Rodrigues, quando em
anotações de rodapé, prega o bom-senso. Ora, se alguém pactuou não edificar
em seu terreno, de maneira a não esconder a casa do credor. Feita a edificação,
seria antieconômico o seu desfazimento. Nesse caso, é mais sensata a
indenização por perdas e danos. Não se esqueça da norma emanada do artigo 5º
da LINDB.
Não sendo possível o desfazimento, a solução será idêntica, ou seja,
converte-se em perdas e danos, podendo inclusive, quando as circunstâncias
autorizarem, que se utilize a ação com preceito cominatório.

DAS OBRIGAÇÕES ALTERNATIVAS


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A obrigação civil pode ser simples ou complexa, considerada a possibilidade
de aparecer na relação jurídica: um ou mais de um credor; um ou mais de um
devedor; e, um ou mais de um objeto na obrigação.
Observadas as obrigações complexas, considerando a multiplicidade de
objetos, podemos classificar as obrigações em cumulativas, alternativas e,
conforme Silvio Rodrigues, facultativas. Não concordamos com esta classificação,
já que entendemos que as obrigações facultativas são simples, porque não se
apresentam desde o início com multiplicidade de prestações.

A obrigação cumulativa é aquela constituída de várias prestações e todas


devem ser cumpridas para que o devedor se exonere da obrigação.

A obrigação alternativa é caracterizada pelo fato de haver mais de uma


obrigação a cumprir, e o devedor a satisfaz entregando ou cumprindo apenas uma
delas. Exemplo: O devedor se compromete a dar um automóvel ou construir o
alicerce da casa do credor. Este devedor estará livre do vinculo obrigacional
entregando o veículo ou executando o fato.
Os doutrinadores discutem diferenças entre a obrigação alternativa, a
obrigação de dar coisa incerta e a obrigação com cláusula penal. Podemos
perceber que as diferenças são marcantes.
Enquanto na obrigação de dar coisa incerta há o dever de cumprir uma
prestação entregando coisa considerada ao menos no gênero a que pertence,
podendo portanto tratar-se de objeto indeterminado mas determinável, pois
somente ainda não se individualizou o bem, na obrigação alternativa tem-se
várias prestações de objetos determinados, e cumprindo-se somente uma delas,
extinta estará a obrigação civil, ou seja, enquanto na obrigação de dar coisa
incerta a escolha é com relação ao objeto da prestação, na obrigação alternativa,
a escolha é do objeto da obrigação.
Exemplo: João vende a José, um dos quatro cavalos que tem em seu haras.
Temos quatro prestações, porque os objetos das prestações estão
individualizados (escolhidos/separados). Se por outro lado, João tivesse vendido
um cavalo de determinada raça, com tantos anos de idade, estaríamos falando em
obrigação de dar coisa incerta, pois, desta forma, não temos o objeto da prestação
separado-individualizado. Conseqüentemente, se os quatro cavalos do seu haras
morrerem, não há meio de cumprir a obrigação. No entanto, para não cumprir a
16
obrigação no segundo exemplo, necessário se faz que desapareçam todos os
cavalos daquela raça, hipótese improvável (gênero não perece - art. 246 do
Código Civil).
A obrigação alternativa se distingue da obrigação com cláusula penal porque,
enquanto na primeira existe a possibilidade da escolha, a segunda só é devida em
caso de inadimplemento.
É de suma importância, nas obrigações alternativas, a escolha, tal qual
ocorre na obrigação de dar coisa incerta.
Diferente não foi o legislador quando tratou da obrigação alternativa.
Conforme o artigo 252 do CC, havendo omissão das partes, a escolha caberá ao
devedor. Por outro lado, cabendo ao devedor a escolha, este não poderá obrigar o
credor receber parte em uma obrigação e parte em outra (parágrafo 1º do artigo
252 do CC).
As partes poderão pactuar sobre quem fará a escolha, devedor ou credor,
podendo ser feita até por terceiro estranho à relação jurídica (parágrafo 4º do
artigo 252 CC). Aquele que detiver este direito e não o exercer no tempo devido,
poderá perder o direito de escolher por decisão judicial (art. 342, quando a escolha
pertencer ao credor e art. 800 do CPC, quando pertencer ao devedor).
Tal qual nas obrigações de dar, nas obrigações alternativas existe o risco de
perecimento ou deterioração da coisa, ou por outro lado, independente de
perecimento ou deterioração, pode a prestação tornar-se impossível. Assim, é
de suma importância, em ocorrendo o fato malsinado, saber a quem compete à
escolha, ou se a impossibilidade se deu por culpa das partes, ou por motivo de
caso fortuito ou força maior.
O legislador, considerando tais circunstâncias, trouxe soluções diferentes
para resolver os casos de impossibilidade de cumprimento da obrigação. Senão
vejamos:
Havendo a impossibilidade de uma das prestações a obrigação irá se
concentrar nas prestações remanescentes (art. 253 do CC). Neste caso, se a
obrigação era composta de apenas duas prestações, deixa de ser complexa, para
ser simples.
Se houver a impossibilidade de uma das prestações, cabendo a escolha ao
devedor, havendo, ainda, sua culpa, será aplicada a mesma regra.
No entanto, no mesmo caso, se a escolha couber ao credor e a prestação se
impossibilitar por culpa do devedor, este terá a faculdade de exigir a
17
remanescente ou o valor daquela que se impossibilitou, acrescida das perdas e
danos (art. 255 do CC).
Pode ocorrer ainda, a impossibilidade de todas as prestações:
Se a culpa foi do devedor, não competindo ao credor à escolha, ficará ele
obrigado a pagar o valor da prestação que por último se impossibilitou acrescida
de perdas e danos (art. 254).
Contrariamente não havendo culpa do devedor, a obrigação se extingue,
voltando as partes na situação que se encontravam anteriormente (art. 256).
Se a culpa foi do devedor, e a escolha cabia ao credor, pode este, reclamar o
valor de qualquer uma das prestações, acrescida de indenização por perdas e
danos (art. 255, 2ª parte). Por derradeiro, não podemos deixar de considerar a
regra do parágrafo 2º do artigo 252, onde o legislador, considerando a obrigação
alternativa com prestação periódica, regulou que a escolha será feita no final de
cada período, modificando assim, a regra estabelecida no Código de 1916, onde a
escolha poderia ser feita a cada período se tratasse de período superior a um ano,
caso contrário, se as prestações tivessem vencimentos cujo lapso entre uma e
outra fosse inferior a um ano, estariam vinculados ao primeiro pagamento todos os
demais.
Se houver pacto contrário, será respeitada a vontade das partes, pois o
contrato, desde que válido é lei entre as partes.

DAS OBRIGAÇÕES DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEIS

Já tratamos das obrigações civis cujo objeto da obrigação civil é múltiplo.


Agora trataremos daquelas, cujo sujeito ativo ou passivo, ou ambos são múltiplos.
Ainda estamos considerando as obrigações complexas, mas agora só nos
interessa aquelas que são complexas, em virtude da multiplicidade de sujeitos
(devedor e/ou credor).
Ao classificar as obrigações civis em divisíveis e indivisíveis, o legislador não
teve a intenção de possibilitar ao devedor o cumprimento da obrigação civil,
através de prestações periódicas. Vencida a obrigação, deverá ser cumprida por
inteiro. Mas, houve a intenção de possibilitar que cada devedor pague sua parte
do débito a cada credor, conforme o seu crédito e no momento do vencimento. Na
obrigação divisível cada credor tem direito a uma quota, bem como cada devedor
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só é responsável pelo pagamento da sua parte no débito, imperando assim a
regra "concursu partes fiunt" (concurso das partes feitas).
Havendo multiplicidade de partes, existem tantas obrigações independentes
quantas forem as partes envolvidas na relação jurídica obrigacional (art. 257).
Isto, se a obrigação civil for divisível, o que significa que as prestações podem ser
oferecidas separadamente.
Conforme Sílvio Rodrigues, a regra citada sofre duas exceções: no caso de
indivisibilidade e no de solidariedade.
Assim sendo, embora o credor só tenha o direito a uma fração da prestação,
pode reclamá-la por inteiro, de qualquer dos devedores.
A indivisibilidade, ordinariamente, resulta da prestação, podendo
excepcionalmente, resultar da própria lei ou da vontade das partes. Conforme o
prof. Sílvio Rodrigues pode-se chamar indivisível a obrigação quando o
fracionamento do objeto devido não só altera sua substância, como também
representa sensível diminuição de seu valor.
É indivisível a obrigação quando o fracionamento da prestação resulta em
diminuição do seu valor pecuniário. Isto sempre ocorrerá quando for alterada a
sua substância.
Ex: um avião, um veículo, uma bicicleta, etc.
A divisibilidade não é encarada pelo legislador no sentido de se parcelar o
cumprimento da obrigação, podendo o devedor entre uma parcela e outra obter
prazo, mas sim, para resolver a quem deve aproveitar o cumprimento da
obrigação, isto é, uma vez vencida a obrigação civil, no dia do vencimento o
devedor deverá entregar a prestação a apenas um credor, ou pode entregar uma
parcela a cada um, se divisível a prestação. Bem como, se houver multiplicidade
de devedores, sendo indivisível a obrigação civil, um só dos sujeitos passivos,
pode ser obrigado a entregar a prestação por inteiro; sendo divisível, cada
devedor responde pelo cumprimento de sua parte.
Conforme Washington de Barros Monteiro, sendo divisível a obrigação civil,
teremos as seguintes conseqüências jurídicas:
a) Cada um dos credores só tem direito de exigir sua fração no crédito;
b) Cada um dos devedores só tem de pagar a própria quota no débito (Ex.: art.
1.380 do CC);
c) Se o devedor solver integralmente a dívida a um só dos vários credores, não se
desobrigará com relação aos demais cocredores;
19
d) O credor que recusar o recebimento de sua quota, por pretender solução
integral, pode ser constituído em mora;
e) A insolvência de um dos codevedores não aumentará a quota dos demais;
f) A suspensão da prescrição, especial a um dos devedores, não aproveita aos
demais (art. 201 do CC);
g) A interrupção da prescrição por um dos credores não traz beneficio aos outros,
operada contra um dos devedores não prejudica os demais (art. 204 do CC).
Sendo indivisível a obrigação, advirão estas conseqüências:
a) Cada um dos credores pode exigir a dívida por inteiro;
b) Cada um dos devedores responde integralmente pela dívida;
c) O devedor que pago integralmente o débito a um dos vários credores
desonerar-se-á em relação aos demais;
d) O credor não pode recusar o pagamento por inteiro, sob pena de ser constituído
em mora;
e) A prescrição aproveita a todos os devedores, desde que em favor de um venha
a ser reconhecida;
f) Sua suspensão ou interrupção aproveita ou prejudica todos;
g) A nulidade, quanto a um dos interessados, se estende a todos.
Registre-se pequena crítica àqueles que pregam a possibilidade de se
pactuar a indivisibilidade com o fito de proteção ao credor contra o risco da
insolvência. Tal corrente sustenta que a indivisibilidade pode ser pactuada entre
as partes, pois assim, o credor teria maior segurança em relação ao cumprimento
da obrigação. Isto é lógico, mas, para se alcançar maior segurança para o credor,
de maneira a afastar o risco da insolvência, melhor pactuar a solidariedade
passiva. Veja que a indivisibilidade foi prevista em função da natureza da
prestação.

DAS OBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS

A obrigação solidária pode se caracterizar quando houver multiplicidade de


credores, de devedores, ou de ambos, havendo unidade de prestação e
corresponsabilidade dos envolvidos na obrigação civil (artigo 264 do NCC).
Pode a solidariedade resultar da lei ou da vontade das partes, tendo o
legislador impedido sua presunção (artigo 265 do NCC). É possível haver a
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solidariedade em qualquer gênero de obrigação civil, ou seja, nas obrigações
positivas ou negativas (dar, fazer e não fazer, respectivamente).
A solidariedade pode existir tanto no pólo ativo, como no pólo passivo da
obrigação civil, promovendo a reunião, em uma só, de relações jurídicas
autônomas.
Com a existência da solidariedade no pólo ativo, qualquer dos credores é
parte legítima para receber a prestação por inteiro, liberando o devedor da
obrigação civil em virtude do adimplemento, independente de ratificação dos
demais credores. Conforme Sílvio Rodrigues, tal instituto caiu em desuso, uma
vez que os cocredores ficam a mercê de um só dentre eles, já que um só pode
receber e dar total quitação ao devedor. Logicamente, se um dos credores
percebe totalmente a prestação, os demais têm o direito de perceber a sua quota.
No entanto, se aquele que recebeu se tornar insolvente, os demais credores
experimentam prejuízo, pois não poderão acionar o devedor originário.
Ocorrendo a morte de um dos credores, seus herdeiros não gozam dos privilégios
inerentes à solidariedade ativa, não podendo exigir a totalidade da prestação,
salvo se houver apenas um herdeiro, ou se a prestação for indivisível (art. 270 do
CC). Como ensina Beviláqua, isso não significa ter desaparecido a solidariedade
com o falecimento de um dos credores. Apenas os herdeiros do falecido não
podem exigir a totalidade da dívida, porque esta se transmitiu por quotas-partes.
Não somos adeptos desse raciocínio, tendo em vista o respeito à
presunção não permitida legalmente e à intenção das partes. Ora, se não foi
pactuada a solidariedade ativa com eventuais herdeiros, como podemos obrigar
aos cocredores do de cujus aceitarem novo credor solidário que não seja do seu
agrado? Apreciando o mecanismo legal é possível afirmar que a confiança é um
dos elementos essenciais para a existência da solidariedade ativa.
Havendo a solidariedade passiva, o credor tem o direito de exigir de um ou
alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum (art. 275 do NCC).
Tem, portanto, a prerrogativa de cobrar daquele que lhe convier, podendo até
cobrar parcialmente, continuando credor dos outros. Não se permite depois de
criada a relação jurídica, que um dos devedores agrave a posição dos outros, sem
o consentimento destes (art. 278 do CC).
Verifica-se na solidariedade passiva o conjunto de devedores como se fosse
um só, independente da proporção do débito de cada um. Assim, se um só dos
21
devedores for obrigado a satisfazer totalmente a prestação, tem o direito de ser
reembolsado no valor devido pelos demais.
Pode ocorrer que um dos devedores tenha experimentado a insolvência e
aquele que cumpriu a obrigação, terá direito de exigir dos demais devedores
solventes, a quota do insolvente, respondendo todos em partes iguais (art. 283 do
CC), não deixando de observar a regra contida no art. 284, onde o legislador
determina que do rateio, deverão participar até mesmo os exonerados da
solidariedade pelo credor.
É de suma importância a regra contida no art. 285. O referido artigo
determina que o devedor solidário que pagar totalmente o débito que interessava
somente a um dos devedores, terá o direito de ser reembolsado do total da
prestação. Exemplo: do fiador em contrato de aluguel, quando assume a
obrigação na qualidade de devedor solidário; efetuando o pagamento total, tem o
direito de cobrar tudo o que pagou do locatário.
Anteriormente já se falou sobre o vínculo jurídico, mostrando as discussões
existentes acerca dos elementos que o compõe, ou seja, "Posteriormente, surgiu
no direito alemão à teoria dualista que aponta dois elementos para explicar o
vinculo jurídico: o débito (shuld - debitum) e a responsabilidade (haftung -
obligatio), entendendo que num primeiro momento, o devedor pode satisfazer a
obrigação, apenas por reconhecer o débito, sem precisar o credor invocar a lei
(através da responsabilidade) para ver a obrigação satisfeita". Vimos que na
obrigação Natural temos "o débito (shuld - debitum) e não temos a
responsabilidade (haftung - obligatio)". Na obrigação Solidária ocorre o contrário,
ou seja, OS DEVEDORES SOLIDÁRIOS TÊM RESPONSABILIDADE em relação
ao cumprimento da obrigação, mas podem não ser devedores de toda a
prestação, e por algumas vezes não têm qualquer participação no débito (Ex.
Avalista), mas têm RESPONSABILIDADE, podendo ser obrigados ao
cumprimento de toda a obrigação.
Tendo o credor cobrado parcialmente de um ou alguns devedores, só terá
direito ao saldo remanescente com relação aos demais devedores solidários (art.
277 do CC).
Existe a possibilidade da renúncia à solidariedade, podendo esta se referir a
um, a alguns, ou a todos os obrigados.
Se for total, desaparece a solidariedade, dividindo-se a obrigação em tantas
obrigações quantos forem os devedores.
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Se parcial a renúncia, o devedor favorecido, será considerado sujeito passivo
de obrigação simples, podendo persistir a solidariedade com relação aos demais.
Nesta hipótese, o credor deverá diminuir do débito a importância devida por
aquele que foi exonerado da solidariedade (art. 282 do NCC).
Pode a prestação se impossibilitar em virtude de culpa de um ou alguns dos
obrigados, ou em virtude de força maior. Sendo em virtude de culpa, o valor da
prestação será por todos devido, mas pelas perdas e danos, só responde o
culpado, interpretando a regra do art. 279. Se a impossibilidade se der em virtude
de força maior, extingue-se o liame jurídico. Tratando-se de prestação pecuniária,
pode ocorrer a mora. Conforme Sílvio Rodrigues, o legislador foi injusto nestes
casos, pois, embora deferindo aos demais credores a prerrogativa de pleitearem
do culpado o reembolso, sujeita-os ao pagamento de juros, juros estes devidos
por uma demora que não se originou de sua negligência". (art. 280 do CC).

CONCEITOS IMPORTANTES PARA MELHOR COMPEENSÃO DOS TEMAS

NOVAÇÄO = "Diz-se que há novação quando as partes criam obrigação nova


para extinguir uma antiga". (S.R., Vol. II, p. 209). Esta nova obrigação pode
aparecer com a alteração do objeto da obrigação (novação Objetiva), com a
substituição da pessoa do devedor (novação Subjetiva Passiva), ou com a
substituição da pessoa do credor (novação Subjetiva Ativa).
Conforme Silvio Rodrigues para que ocorra a novação são necessários os
seguintes pressupostos:

A) Existência de uma obrigação anterior;

B) Criação de uma obrigação nova;

C) O elemento novo - é necessária uma inovação que recaia sobre o objeto ou o


sujeito (ativo ou passivo), criando uma obrigação nova.

D) O animus novandi - “Para que haja novação é mister que as partes,


conscientemente, além de desejarem extinguir uma obrigação e criar outra,
queiram também que a criação desta última seja a causa da extinção da primeira”.
23
E) A capacidade e legitimação - Além das partes serem capazes, necessário
que tenham poderes para tanto, ou seja, o procurador tem que ter "mandado
expresso do credor" (S.R. p. 217)

COMPENSAÇÃO = Conforme Planiol e Ripert é "um modo de extinção especial


recíprocas, pelos quais duas obrigações existentes, em sentido inverso entre as
mesmas pessoas, extinguem-se até o montante da menor." (S.R., p. 220). Se
alguém lhe deve R$ 100,00 e você lhe deve R$ 150,00, fica apenas o seu débito
de R$ 50,00.

TRANSAÇÃO = "... é o negócio jurídico bilateral através do qual as partes


previnem ou extinguem relações jurídicas duvidosas ou litigiosas, por meio de
concessões recíprocas, ou ainda em troca de determinadas vantagens
pecuniárias". (S.R., p. 233)

CONFUSÃO = "A confusão é a reunião, em uma única pessoa e na mesma


relação jurídica, da qualidade de credor e devedor." (S.R., p. 253).
Ex. O único herdeiro que devia ao falecido.

REMISSÃO = "Remissão é a liberalidade do credor, consistente em dispensar o


devedor de pagar a dívida". (S.R., p. 259).

DA CLAUSULA PENAL

As regras de direito têm por finalidade primordial manter a ordem social.


Dentro do campo do direito das obrigações, torna-se necessário assegurar a
circulação de riquezas, para que exista maior tranqüilidade social. Assim, é
importante proteger o credor, ou os credores contra os riscos da insolvência e do
inadimplemento.
Com relação ao risco da insolvência, o nosso direito permite ao credor exigir
garantias reais (hipoteca, penhor) ou fidejussórias (avalista, fiador), evitando
assim, a insolvência do devedor.
Com o intuito de permitir que o credor possa afastar o risco do
inadimplemento, o nosso legislador criou a cláusula penal, que conforme a opinião
dominante na doutrina, em princípio, tem duas finalidades:
24

a) serve como um reforço da obrigação principal, na medida em que impõe ao


devedor uma pena, caso não cumpra a obrigação da forma pactuada; e,

b) serve como cálculo pré-determinado das perdas e danos.

Trata-se de pena pré-estabelecida, e por consenso das partes, que deverá


ser prestada por aquele que der causa ao descumprimento parcial ou total da
obrigação.
Conforme Sílvio Rodrigues, embora nossa legislação não tenha conceituado
a cláusula penal, o código Napoleônico, "a despeito das suas imperfeições",
oferece uma idéia deste instituto:

"A cláusula penal é aquela pela qual uma pessoa, para assegurar a execução
de uma convenção, se compromete a dar alguma coisa, em caso de inexecução".

A cláusula penal tem caráter acessório, não podendo existir anteriormente ao


surgimento da obrigação principal, conforme se depreende do artigo 409 do
Código Civil Brasileiro. Assim, sendo nula a obrigação principal, também será
nula a cláusula penal. Existe, no entanto, a possibilidade de ser nula a cláusula
penal, o que não implica também na nulidade da obrigação principal.
Por ser acessória pode ser pactuada no momento do nascimento da
obrigação principal ou posteriormente.
O código traz duas espécies de cláusula penal: a compensatória e a
moratória. A cláusula penal compensatória é pactuada para proteger o credor da
inexecução completa da obrigação, enquanto a cláusula penal moratória protege
o credor do descumprimento de alguma cláusula especial ou do simples atraso no
cumprimento da obrigação.
É de fundamental importância a distinção apontada, vez que, o legislador às
regulamenta de maneira diferente, principalmente porque se for compensatória,
não pode ser cumulada com o cumprimento da prestação, já se for moratória, a lei
permite o pedido de pagamento da multa, com o da prestação principal.
Importante destacar que o novo Código Civil manifesta-se sobre problema muito
discutido da doutrina e no parágrafo único, do artigo 416, estabelece que, sendo o
valor da cláusula penal inferior ao valor do prejuízo causado pelo inadimplemento,
25
caso as partes tenham pactuado, a possibilidade de modificação da pena, cabe ao
credor provar o prejuízo excedente.
Conforme o artigo 410, a cláusula penal compensatória, trata-se de uma
alternativa para o credor. Não se trata de obrigação alternativa, isto porque, a
pena só poderá ser exigida no caso de inadimplemento, quando o credor poderá
optar pela cláusula penal ou pelo cumprimento da obrigação acrescida de perdas
e danos. De tal sorte, afirma-se categoricamente, que o devedor nunca terá o
direito de escolher entre o cumprimento da obrigação ou o pagamento da cláusula
penal.
Na prática, pode o interprete se deparar com dificuldades para identificar a
espécie da cláusula penal. Diante disso, a doutrina preocupa-se na solução de tal
inconveniente e prega que é possível identificar a espécie, através do valor
imposto como pena; “se é de valor elevado, aproximando-se do valor principal, há
que se considerá-la compensatória, pois é provável que as partes a tenham
estipulado antevendo a possibilidade de inadimplemento absoluto. Por outro lado,
se o valor é muito inferior ao da obrigação principal seria moratória”.
É importante ainda, a regra do artigo 412, que limita o valor da cláusula penal
ao da obrigação principal. Tal dispositivo serve para equilibrar a relação jurídica,
impossibilitando que o credor obrigue o devedor de forma excessiva. Com esse
intuito o legislador no artigo 413, ainda impõe ao juiz, em caso de pagamento
parcial, a redução proporcional da pena estipulada tanto na mora quanto no
inadimplemento.
O teto estipulado no artigo 412 é a regra geral, mas existem legislações
específicas que o colocam a nível inferior para determinadas transações, como é
o caso da Lei da Usura (Decreto nº 22.626, de 07.04.33), que limita a cláusula
penal em 10% do valor da dívida, nos casos de contrato de mútuo; do Artigo 11,
"f", do Decreto-Lei nº 58 de 10/12/1937, que "Dispõe sobre o Loteamento e a
Venda de Terrenos Para Pagamento em prestações" e limita a cláusula penal a
10% do débito, podendo ser exigida somente "no caso de intervenção judicial",
e Decreto 3.079 de 15/09/1938 no mesmo sentido; do inciso V, do artigo 18, da Lei
nº 6.766, de 19/12/1979, que dispõe sobre "o Parcelamento de Solo Urbano" e
limita a cláusula penal a 10% do débito e "só exigível nos casos de intervenção
judicial ou de mora superior a 3 (três) meses".
26
DOS EFEITOS DA OBRIGAÇÃO CIVIL

Inicialmente verificamos o surgimento da obrigação civil, suas fontes, seus


elementos essenciais; posteriormente, vimos como ela se apresenta, ou seja, suas
modalidades. Neste momento, seguindo o raciocínio do legislador temos seus
efeitos.
Doutrinariamente, podemos dividir a matéria tratada neste título do Código
Civil, em dois grandes grupos:
1 – o primeiro compreendendo a extinção das obrigações
1.1 – MEIO DIRETO – PAGAMENTO (304/333)
1.2 – MEIO INDIRETO - Do pagamento por consignação (334/345); Do
pagamento com sub-rogação (346/351); Da imputação do pagamento (352/355);
Da dação em pagamento (356/359); Da novação (360/367); Da compensação
(368/380); Da confusão (381/384); Da transação (840/850); Do compromisso
(851/853); Da confusão (381/384); e, Da remissão das dívidas (385/388)

2 – o segundo compreendendo a inexecução das obrigações.

DO PAGAMENTO

Tal qual a doutrina e a própria lei, usaremos o termo pagamento, como


sinônimo de adimplemento, cumprimento, etc., em virtude do nosso legislador
assim ter considerado.
Atualmente é manso o entendimento doutrinário ao considerar o pagamento
como efeito das obrigações. Houve período em que a doutrina discutiu se o
pagamento era um Negócio Jurídico em si mesmo considerado ou não. Hoje
domina o entendimento no sentido de ser um efeito da obrigação, portanto,
poderíamos dizer tratar-se de um Negócio Jurídico, mas não, em si mesmo
considerado, ou seja, não é válido por si, depende de uma obrigação anterior que
o justifique.
Conforme Sílvio Rodrigues para existência do pagamento válido, são
indispensáveis três elementos:

1 - Um vínculo obrigacional que o justifique;


2 - A presença de uma pessoa que paga, o solvens; e,
27
3 - A presença de uma pessoa que recebe, o accipiens.

O primeiro elemento é de fundamental importância quando consideramos o


pagamento como efeito da obrigação. Portanto, tratando-se de um efeito não pode
existir sem uma causa ordinária e conforme justifica o autor, se não houver um
vínculo obrigacional, não existiria o porquê do pagamento, dando ensejo ao
surgimento do Pagamento Indevido. Em outras palavras não há como justificar o
pagamento sem um vínculo obrigacional anterior que o possibilite.
Quanto à figura do solvens e do accipiens, podemos verificar ser impossível a
existência do ato sem as partes interessadas, pois se não houver o pagador, não
haverá quem possa efetuá-lo, e se não houver o recebedor, não haverá quem se
aproveita do pagamento.
Outros doutrinadores pregam a existência de outros requisitos, que seriam
essenciais para a validade do pagamento, tais como a intenção de solvê-lo
(animus solvend); cumprimento da prestação; débito.
O pagador (solvens), em regra é o próprio devedor. No entanto, o nosso
legislador autoriza qualquer pessoa efetuar o pagamento, ou seja, a Terceira
Pessoa Juridicamente interessada, ou Terceira Pessoa Sem Interesse Jurídico,
que paga em seu próprio nome, ou em nome do próprio devedor.
É importante esta classificação legal, porque conforme efetuado o
pagamento, por terceiro interessado, ou por terceiro não interessado, que pode
pagar no próprio nome ou em nome do devedor, haverá conseqüências jurídicas
diversas:
- Quando o pagamento é efetuado por terceiro interessado, por força de lei (art.
346I) se sub-roga nos direitos do credor, permanecendo o sub-rogado na posição
do antigo credor em relação ao devedor (art. 349).
- quando o pagamento é efetuado por terceiro não interessado em nome do
devedor, podemos considerar que houve a intenção de socorro ao devedor,
caracterizado como ato de liberalidade, a ponto do pagador nada receber em
troca, salvo o prazer de ter ajudado o devedor, sendo assim, a única
conseqüência jurídica é a própria exoneração do devedor.
- Quando o pagamento é efetuado por terceiro não interessado em próprio
nome, verifica-se que o pagador teve o intuito de ajudar o devedor, mas não a
ponto de doar a prestação ao devedor. Assim sendo, o legislador dá ao terceiro
não interessado que pagou em próprio nome o direito do Reembolso (art. 305).
28
É interessante observar, que se o credor não aceitar o pagamento do
Terceiro Não Interessado em seu Próprio Nome, este não tem respaldo legal para
efetuar o pagamento, isto porque, o legislador não deu a ele expressamente o
direito de usar dos meios que teria o devedor para efetuar o pagamento. Esta
permissão só foi dada ao Terceiro Interessado (art. 304) e ao Terceiro não
interessado que paga em nome, e por conta do devedor (parágrafo único do art.
304).
O devedor pode se opor ao pagamento efetuado por terceiro, quando tem
justo motivo; se ocorrer o pagamento, só valerá até o valor que for aproveitado
pelo devedor (art. 306). O accipiens (quem recebe), não pode ser qualquer um,
como acontece com o Solvens. O Recebedor só pode ser o próprio credor, ou
quem de direito o represente, só tendo validade o pagamento que não foi feito a
estas pessoas, se posteriormente o credor o ratificar, confirmando validade ao
pagamento ou se o próprio devedor puder provar que a prestação foi revertida em
proveito do credor (art. 308).
Conforme o artigo 309 do Código Civil, a lei ainda dá validade ao pagamento
efetuado ao credor putativo. Isto ocorre quando determinada pessoa, que não é o
credor e nem o representa, passa aos olhos de todos como se o credor fosse ou o
representasse, e sendo assim, cremos que, para proteger o pagador de boa fé, o
legislador validou o pagamento efetuado nestas circunstâncias, exonerando o
devedor da obrigação.
A quitação é o instrumento hábil para fazer prova do pagamento (art. 320),
mas podem existir casos em que haja a quitação dada pelo credor e o pagamento
não é válido contra o próprio credor, ou contra terceiros determinados. Assim
ocorre quando o credor não é capaz de quitar (menor, interditado) e CIENTE de tal
fato, procede ao pagamento. Nestas circunstâncias, o pagamento só será válido,
se o devedor comprovar que em benefício do próprio credor, o pagamento se
reverteu. Ora, não seria justo, que se aproveitando do pagamento, o credor
incapaz de quitar, pudesse tornar nulo aquele pagamento, recebendo novamente.
O legislador teve o interesse de proteger o incapaz de quitar, não de beneficiá-lo
injustamente (art. 310). Convêm salientar que a regra citada pode ter sido
construída com um erro técnico, isto porque à luz do artigo 166, I, do Código Civil,
o pagamento (ato jurídico), praticado por agente absolutamente incapaz é nulo.
Sendo assim, a regra do artigo 310, destina-se ao relativamente incapaz, como
ensina Washington de Barros Monteiro. Por outro lado, existe a possibilidade de
29
descartarmos a regra geral, se houver o entendimento que, sem prejuízo da
menoridade, já houve o cumprimento e o recebimento da prestação, caso seja
necessário o cumprimento novamente, mesmo sendo menor, experimentaria o
enriquecimento sem causa. Vale lembrar ainda, que aqui a regra é mais
específica.
O pagamento não vale contra terceiros, quando, tendo sido
intimados da penhora feita sobre o crédito, ou tendo impugnado o pagamento, o
devedor o executa sem observar as formalidades legais, este pagamento não será
válido contra aqueles, que poderão obrigar o devedor a pagar de novo.
Ex. Efetuada a penhora sobre o crédito e providenciada a intimação do devedor,
deve efetuar o pagamento mediante depósito em juízo para se exonerar da
obrigação; se efetuar o pagamento diretamente ao seu credor (devedor da outra
obrigação), e este sumir com a prestação, o terceiro que impugnou ou intimou da
penhora pode obrigá-lo pagar novamente (art. 312). Finalmente, podemos dizer
que a quitação é direito do devedor e recusando-se o credor a fornecê-la, o
devedor pode reter o pagamento até que o credor a forneça, podendo inclusive,
citar o credor para esse fim. Ocorre que não é aconselhável a retenção do
pagamento. Caso o credor se recuse a dar a quitação, aconselha a melhor
doutrina, que o devedor faça a consignação em juízo, para que não seja
posteriormente considerado devedor moroso (culpado pelo atraso).
Nem sempre será necessária a quitação formal (art. 320) para comprovar o
cumprimento da obrigação. O artigo 321 do Código Civil admite a quitação pela
entrega do título, mostrando ainda, como devem proceder as partes no caso de
extravio, ou seja, deverá o credor firmar declaração que o inutilize.
Em regra, se as partes não tiverem convencionado, o pagamento deverá ser
efetuado no domicílio do devedor (quérable), salvo quando a natureza da
obrigação ou eventualmente a lei dispuser o contrário. Exemplo: A compra de
sacas de sal para a alimentação do gado deve ser entregue na propriedade rural
em que estiver o gado; o material de construção, geralmente é entregue no local
da obra. Isto deriva da natureza da obrigação, só será diferente se houver pacto
entre as partes (artigo 327).
Quando as partes convencionam a data do vencimento, o pagamento deverá
ser feito no momento pactuado. Se, porém, não houver vencimento, o pagamento
poderá ser exigido imediatamente (art. 331). Se a obrigação for condicional (sendo
seu vencimento vinculado a um acontecimento futuro e incerto), esta obrigação
30
deverá ser cumprida na ocorrência da condição, sendo incumbido ao credor à
prova de que o devedor teve ciência do implemento da condição, só assim poderá
exigir o pagamento (art. 332).
Por fim, o artigo 333 do Código Civil trás algumas circunstâncias, onde a
obrigação civil poderá ser cobrada antes do vencimento, ou seja:

I – Se for aberto "concurso creditório contra o devedor";


Esta circunstância ocorre quando se verifica a insolvência civil ou falência do
devedor. Se o julgador entender que o devedor está insolvente deverá abrir o
concurso creditório (para cada um de acordo com o seu crédito). Assim o
legislador autoriza o vencimento antecipado porque pode ocorrer da dívida se
vencer após o término do período para a habilitação dos créditos, hipótese que em
tese, impediria o credor de perceber seu crédito.

II – Se os bens, hipotecados ou empenhados, forem penhorados em execução por


outro credor;
OBS. No código anterior, também se falava em anticrese:
* anticrese - prevista no artigo 805 do Código Civil de 1916 - "pode o devedor, ou
outrem por ele, entregando ao credor um imóvel, ceder-lhe o direito de perceber,
em compensação da dívida, os frutos e rendimentos". Esse instituto foi retirado do
Novo Código Civil.

Neste inciso, permite o legislador o vencimento antecipado da dívida sempre


que outro credor penhora as garantias oferecidas para assegurar o cumprimento
da obrigação. Logicamente, mesmo que o outro credor faça a penhora judicial
anteriormente, o credor garantido recebe antes.
III - Se cessarem, ou se tornarem insuficientes as garantias da obrigação, sejam
elas reais ou fidejussórias, e tendo sido intimado o devedor, este se negar a
reforçá-las.
* Fidejussória - "na técnica jurídica equivalente à fiança, ou caução pessoal". (De
Plácido e Silva).

Por todas as vezes que as garantias oferecidas não tiverem mais a mesma
força que tinham no momento do seu oferecimento, o legislador, deu ao credor o
direito de exigir reforço, através da intimação do devedor. Caso o devedor não
31
reforce as garantias ofertadas, poderá o credor exigir o cumprimento da obrigação
antecipadamente.
É importante frisar, que ocorrendo as circunstâncias que autorizam o
vencimento antecipado da obrigação (incisos I, II e III), se houver a solidariedade
passiva, o vencimento não se antecipa com relação aos demais devedores
solventes (Parágrafo Único do art. 333).

DO PAGAMENTO COM SUB-ROGAÇÃO

A sub-rogação está prevista nos artigos 346 a 351 do Código Civil. Em suma,
consiste na substituição da pessoa que efetua o pagamento pela pessoa do
credor. Sendo assim, fica com "todos os direitos, ações, privilégios e garantias do
primitivo, em relação à dívida, contra o devedor principal e fiadores", esta é a regra
do artigo 349 do Código Civil.
Conforme Sílvio Rodrigues "a sub-rogação representa enorme vantagem,
pois transfere ao sub-rogados esses mesmos acessórios, sem haver mister de
constituí-lo de novo, pois é a própria relação jurídica original, em sua
integralidade, que lhe é transmitida", assim podemos dizer que o pagamento
com sub-rogação gera os efeitos relativos ao cumprimento da obrigação
contra o credor originário. Por outro lado, podemos considerar que o sub-rogado,
passa a ocupar a posição do antigo credor na obrigação originária.
O nosso legislador classifica a sub-rogação em: LEGAL E CONVENCIONAL.
A sub-rogação legal ocorre por força de lei, conforme prevê os incisos do
artigo 346 do Código Civil, ou seja, naquelas situações onde o sub-rogado trata-se
de uma terceira pessoa que pode sofrer consequências jurídicas, em virtude do
inadimplemento da obrigação (fiador, avalista, credor hipotecário, etc.).
A sub-rogação legal não tem a finalidade de permitir o enriquecimento do
sub-rogado. Este raciocínio é tirado do artigo 350 do Código Civil, onde o
legislador só permite o reembolso, até o valor "desembolsado para desobrigar o
devedor".
A sub-rogação convencional ocorre através de pacto entre as partes. Pode
ser procurada e concedida pelo credor (art. 347, inciso I), ou pelo devedor (art.
347, inciso II). Quando concedida pelo credor, o próprio legislador a equipara à
cessão de créditos, tanto que é regulada pelos artigos 286 a 303 do Código Civil,
conforme o artigo 348. Se existir concedida pelo devedor, necessário se faz
32
que o sub-rogado empreste a este a quantia precisa para solver a dívida, sob a
condição expressa de ficar o mutuante sub-rogado nos direitos do credor
satisfeito. Assim, é possível que a sub-rogação seja procurada e concedida pelo
próprio devedor, desde que o pretenso sub-rogado "empreste" o equivalente para
solver a obrigação.
A sub-rogação parcial pode ocorrer quando um terceiro paga parcialmente a
dívida, assim se sub-roga, ficando com os mesmos direitos do credor em parte da
dívida. Neste caso, a obrigação continua a mesma, mas teremos duas pessoas
ocupando o pólo ativo. Se o patrimônio do devedor não for suficiente para o
pagamento total do seu débito, ou seja, se não for suficiente para pagar o total dos
créditos (credor e sub-rogado), respeitando a regra do artigo 351 do Código Civil,
terá o credito do credor originário, preferência sobre o crédito do sub-rogado,
assim, o credor originário percebe primeiro a parcela faltante para o cumprimento
total da obrigação, depois é que será satisfeito o crédito do
sub-rogado.
Ex: Imaginemos uma dívida no valor de R$ 10.000,00, onde um terceiro se sub-
roga parcialmente, pelo equivalente a 40% do crédito. Os bens que perfazem o
patrimônio do devedor valem R$ 8.000,00. Temos neste caso o credor originário
com um crédito de R$ 6.000,00 e o sub-rogado com um crédito de R$ 4.000,00.
Primeiro, receberá o credor originário (R$ 6.000,00) e o sub-rogado fica com os
outros R$ 2.000,00, além de ficar também, com o direito de perceber mais R$
2.000,00, quando o devedor amealhar bens suficientes para garantir o restante do
crédito do sub-rogado.
No exemplo citado, pouco importa se a sub-rogação é Legal ou
Convencional, será resolvido da mesma forma, ou seja, o credor originário sempre
terá preferência sobre o sub-rogado. Esta regra é condenada por Sílvio Rodrigues,
pois desestimula a sub-rogação parcial, já que o credor originário tem preferência.
33
DO PAGAMENTO INDEVIDO (obs; não faz mais parte da nossa matéria, mas
é importante o conceito - leiam)

No Código Civil de 2002, enfim, a nossa legislação regula o Enriquecimento


Sem Causa. Na vigência do Código anterior a doutrina sempre reclamou o
instituto, sendo que nossos mestres, apesar de admitirem que o legislador de
1916 sempre afastou a possibilidade de enriquecimento sem uma causa que o
justificasse, como havia feito outras legislações modernas, dentre elas a suíça.
Não obstante, aquele diploma legal havia regulamentado o pagamento indevido,
ou seja, aquele efetuado sem uma causa que o justificasse.
Veja como comentávamos o assunto na vigência do Código Civil anterior: A
doutrina considerou o pagamento indevido, espécie, do gênero enriquecimento
sem causa. Mas, verificamos que, por todas as vezes que o legislador verificou o
enriquecimento sem causa, o afasta. Assim acontece no artigo 936, há pouco
estudado. Duas correntes se firmaram quanto ao fato de se afastar sempre o
enriquecimento sem causa. A primeira "negativista esposada por Clóvis
Beviláqua" "Parte do ponto de vista de que o legislador, ciente de regra idêntica
em outros sistemas, não a incluem no nosso. De modo que, fora do pagamento
indevido e dos demais casos especificamente antevistos pelo legislador, o
enriquecimento sem causa é tolerado." A segunda sustenta que o legislador, por
todas as vezes que previu o enriquecimento sem causa, o afastou. Entendem,
portanto, ser uma "lacuna", que pode ser suprida pela analogia. Ademais, se
usarmos o bom-senso, aliado aos princípios gerais do direito, da ética, da moral,
no intuito de propiciar maior equidade, impossível deixar de afastar o
enriquecimento sem causa, mesmo quando não estiver previsto pelo legislador.
Conforme Sílvio Rodrigues "A tese, hoje, proferida pela doutrina brasileira é a
da admissão do princípio genérico de repulsa ao enriquecimento indevido. Essa a
opinião de que participo".
Salienta que a doutrina é quase pacífica, com relação aos pressupostos
indispensáveis para o cabimento da ação "in rem verso" ou Ação de Repetição do
Indébito. São eles:
1. Um enriquecimento por parte do réu;
2. Um empobrecimento por parte do autor;
3. A existência de uma relação de causalidade entre os dois fatos;
4. A ausência de causa que os justifique; e,
34
5. A inexistência de qualquer outra ação para socorrer a vítima.
Tratando especificamente do Pagamento Indevido, podemos verificar que o
artigo 876, impõe àquele que recebeu o que não lhe era devido à obrigação de
restituir, bem como, aquele que recebeu obrigação condicional, antes do
implemento da condição. Isto porque, tratando-se de obrigação, cujo efeito só
gerará, na dependência de acontecimento futuro e incerto, este pode nunca
ocorrer. Ao mesmo tempo, no artigo 877, impõe ao que "voluntariamente pagou",
a incumbência de demonstrar, que o fez por erro. Isto não significa que ficaram
desprotegidos os pagamentos involuntários, quando o agente o pratica sem a
manifestação livre da vontade, tal qual, mediante coação ou simulação.
Importante frisar, que o legislador não permitiu repetir, ou isentou de
restituição, o pagamento efetuado nas hipóteses previstas nos artigos 880, 881,
882 e 883 do Código Civil, de maneira que, na verdade, ocorrendo às
circunstâncias do artigo 880, considerou o pagador, mais culpado que o accipiens,
não permitindo assim, que por descuido do pagador o outro experimentasse o
prejuízo. Considerou válido o pagamento de dívida prescrita ou obrigação natural,
no novo texto legal chamou de “obrigação judicialmente inexigível” (artigo 882),
talvez em virtude de ter considerado a vontade do pagador, no momento da
prática do ato (pagamento), se tencionava pagar e o fez, porque colocar o credor
em posição vulnerável depois de praticado o ato. E finalmente, no artigo 971, não
permite a repetição a quem pretendia obter fim ilícito, imoral ou proibido por lei.
Seria o mesmo que permitir ao pagador, alegar a própria torpeza.

DO PAGAMENTO POR CONSIGNAÇÃO

O pagamento por consignação é um depósito judicial efetuado em


pagamento de uma dívida. É um direito do solvens, que tem a finalidade de liberar
o devedor do vínculo obrigacional nos casos previstos nos incisos do artigo 335 do
Código Civil, sem prejuízo de previsão em leis especiais, como ocorre na Lei do
Inquilinato, quando prevê a consignação para o aluguel e outros encargos (Lei nº
8.245/91). Por outro lado, Washington de Barros Monteiro, em sua obra Curso de
Direito Civil, 4º Vol., 27ª edição, Saraiva, pág. 274, acerca das previsões legais,
das circunstâncias que possibilitam o pagamento por consignação, pregava o
seguinte:
35
Que o artigo 973, atual 335 do Código Civil não traz uma enumeração
taxativa. "O Próprio Código Civil contempla outros casos de consignação. Em
outras leis avulsas, deparamos ainda novas hipóteses de depósito judicial (Dec.-lei
nº 58, de 10-12-1937, artigo 17, parágrafo único; Lei nº 492, de 30-8-1937, art. 19
e 21, nº III; Dec.-lei nº 1.134, de 13-6-1939, art. 47), inclusive no Código Comercial
e no Código de Processo Civil. Saliente-se, todavia, que o pagamento por
consignação só se legitima nos casos expressos e previstos em lei."
Antes de tudo, vale dizer que se trata de um direito do devedor, que ao ver-se
ameaçado, de injustamente experimentar a pecha de inadimplente, procura a
tutela do Estado, no intuito de satisfazer sua obrigação da forma pactuada.
Nem todas as dívidas admitem o pagamento por consignação. Não se pode
consignar uma prestação que consiste em fazer, salvo, se acompanhada da
obrigação de dar. Ex: A obrigação consistente em pintar uma tela (fazer). É
necessário que seja entregue ao credor (dar); é possível ser consignada.
Impossível ainda o depósito judicial de uma obrigação de não fazer.
Se "FÍSICAMENTE", a prestação, comportar o depósito judicial, para que
tenha força de pagamento devem ser respeitados todos os requisitos, sem os
quais o pagamento não teria força liberatória, ou seja, deve concorrer em relação
às pessoas, ao objeto, ao modo e tempo, conforme determina a regra do artigo
336 do Código Civil.
Por outro lado, a partir de dezembro de 1994, as dívidas cuja prestação é
dinheiro, começaram a fazer parte de uma tentativa de um depósito bancário,
através de um procedimento estabelecido nos parágrafos, acrescentados ao art.
890 do antigo Código de Processo Civil, atualmente artigos 539 e seguintes do
Novo CPC. Em suma, oferece um procedimento, pelo qual, tratando de dívida
em dinheiro, o devedor poderá efetuar um depósito bancário, em conta
remunerada, dando ciência ao credor que a prestação encontra-se à sua
disposição em determinado banco, assinando-lhe um prazo de 10 dias para
que manifeste sua recusa, que deve ser feita por escrito ao
estabelecimento bancário.
Caso não haja a recusa do credor do dito prazo, "reputar-se-á o devedor
liberado da obrigação, ficando à disposição do credor a quantia depositada."
Caso contrário, se houver a recusa escrita, terá ainda, o devedor, o prazo um
mês, para pleitear o depósito em juízo.
36
Tal procedimento, embora regulado pelo Código de Processo Civil,
inicialmente, independe do judiciário, e sem sombra de dúvidas é mais célere que
o andamento de um processo. No entanto, não significa que o devedor esteja
obrigado, quando se tratar de obrigação em dinheiro, primeiro, efetuar o depósito
bancário. Pode ingressar, diretamente, com a Ação de consignação em
Pagamento, independente de proceder da maneira acima exposta. Mas nestas
obrigações, quando o credor se recusa a receber, melhor será a tentativa do
pagamento via depósito bancário, caso seja recusado, tem ainda o devedor o
prazo de trinta dias para ingressar com a ação de consignação.
Caio Mario da Silva Pereira, em sua obra Instituições de Direito Civil, Volume
II, 15ª edição, editora Forense, pg. 142, leciona o seguinte:
"A questão das despesas com a consignação exige esclarecimento. Depois
de efetuado o depósito, as custas caberão ao credor se o juiz o julga procedente,
e ao devedor se improcedente. Mas, na primeira fase da ação, antes de efetuado
o depósito, já existem as despesas com o ingresso em juízo, emolumentos do
oficial de justiça encarregado da diligência de citação, taxas etc. Cabe, neste caso,
indagar quem por elas responde. Pelo jogo dos princípios, tem o devedor de arcar
com este ônus: primeiro, porque ainda não há uma ação em sentido próprio,
porém um oferecimento, e ainda não se positivou a recusa do credor, que é até
possível esteja sendo molestado por um capricho do devedor; segundo, porque
tem o credor o direito de receber o que lhe é devido por inteiro, e, se ficarem a seu
cargo as despesas, a prestação será desfalcada do montante delas; e terceiro,
porque as despesas com o pagamento e quitação se presumem a cargo do
devedor, salvo se o credor mudar de domicílio ou morrer, deixando herdeiros em
lugares diferentes. O oferecimento da coisa ou soma devida há de ser, então, feito
por inteiro, sem o desfalque das custas..."
Pode ocorrer de a prestação ser indeterminada e a escolha competir ao
credor. Tal fato, em regra, ocorrerá nas obrigações de dar coisa incerta, e
também nas obrigações alternativas. Na primeira porque deve ser escolhido um
"indivíduo" dentre vários de um mesmo gênero e na segunda porque deve ser
escolhida uma, dentre várias prestações. Assim, deve o "solvens", primeiro citar o
credor para exercer o seu direito de escolha, se não comparecer, aplica-se a regra
do artigo 342, do Código Civil, sendo depositada "a coisa que o devedor escolher".
Finalmente, verifica-se que o legislador, através do artigo 345 do Código
Civil, também dá aos credores o direito de reclamar o depósito em juízo, "quando
37
a dívida se vencer, pendendo litígio entre credores que se pretendam mutuamente
excluir".
Dessa forma, utilizando um critério lógico, o legislador concede aos credores,
dentro das circunstâncias constantes da regra, uma forma de proteger o seu
direito. Referido artigo está intimamente ligado ao 344, que regulamenta o
pagamento feito de maneira irresponsável, ou seja, caso haja uma "obrigação
litigiosa", e o solvens, "tendo conhecimento do litígio", efetua o pagamento àquele
que acha conveniente, se na solução do litígio, o julgador considerar "perdedor"
aquele que recebeu, pode o devedor ser obrigado à pagar novamente. O artigo
345 dá aos credores o direito de requerer o pagamento por consignação, e assim
no momento do pagamento, o devedor terá conhecimento do litígio, ficando
obrigado na forma do artigo 344 do Código Civil.

DA MORA e DO INADIMPLEMENTO ABSOLUTO

O interesse do Estado, é que a obrigação seja cumprida perfeitamente, no


intuito de proteger a sociedade e consequentemente assegurar a harmonia no
mundo dos negócios.
O inadimplemento da obrigação pode ser relativo ou absoluto. O
inadimplemento relativo, também tratado por "Mora", é o cumprimento imperfeito
da obrigação civil. Embora a expressão. Mora seja utilizada como sinônimo de
atraso vale ressaltar que pode existir a Mora e o atraso não ser a causa direta do
inadimplemento. O artigo 394 do Código Civil diz que se considera em mora o
devedor que não efetuar o pagamento e o credor que não quiser receber "no
tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer". Assim, está em mora
o devedor ou o credor que se negar ao cumprimento perfeito da obrigação, seja
porque não se oferece a fazer o pagamento da maneira convencionada, seja
porque se nega a receber conforme o que pactuou. Logicamente, se a obrigação
não estiver sendo cumprida da forma pactuada, as partes poderão não aceitar o
cumprimento naquele momento, e, indiretamente, falaríamos em "atraso".
No inadimplemento relativo (mora), a obrigação não foi cumprida em tempo,
lugar e forma devida, mas ainda poderá haver o cumprimento de maneira a trazer
benefícios ao credor, ou seja, ainda pode a prestação ser proveitosa ao credor. Já
no inadimplemento absoluto, a prestação devida, não mais beneficia o credor. Ex:
Contrato uma empresa para que ofereça uma festa a meus convidados no dia do
38
casamento. A empresa não oferece sua prestação no momento pactuado.
Dificilmente referida festa numa outra oportunidade será proveitosa. Os
salgadinhos poderiam até ser aproveitados, mas a festa em outra oportunidade,
fatalmente, será inconveniente. Dessa forma, caracterizaria o inadimplemento
absoluto.
A mora pode ser do devedor, "MORA solvendI", ou do credor, "MORA
ACCIPIENDI”, conforme quem tenha dado causa ao inadimplemento.
Vale lembrar que além de ter o dever de cumprir a obrigação, o devedor tem
o direito de cumpri-la, de maneira a escapar da pecha de moroso, o que lhe
acarretaria o dever de entregar a prestação, além de indenizar os prejuízos que
sua mora deu causa. Assim, caso o credor não lhe ofereça meios para se
exonerar da obrigação, pode ficar caracterizada a mora do credor, sofrendo este,
consequência jurídica relevante.
Quando se fala em mora, inicialmente, só imaginamos que o "devedor não
cumpriu a obrigação" (mora solvendi), mas podemos ter a mora do credor, que se
verifica, nos moldes do artigo 394 do código civil, "in fine", ou seja: quando "não
quiser receber no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer"
(mora accipiendi).
Tal fato levou Silvio Rodrigues a defender que para a caracterização da mora
do devedor a "culpa é elementar", enquanto que para a caracterização da mora
do credor, basta que este não apareça para receber e estará em mora, mesmo
que não tenha culpa, devendo sofrer as consequências elencadas no artigo 400
do Código Civil; já para a caracterização da mora do devedor, o legislador, no
artigo 396, exigiu "fato ou omissão imputável" ao devedor, ou seja, a culpa do
devedor.
Normalmente quem experimenta os riscos de deterioração ou perecimento da
coisa é o dono. Imaginemos que o devedor esteja disposto a cumprir sua
obrigação, e estando pronto para oferecer a prestação ao seu credor, este não
aparece para recebê-la. Não seria justo continuar respondendo pela conservação
do objeto da prestação. Dessa forma queremos imaginar que o legislador,
independente de ter culpa o credor, achou por bem constitui-lo em mora.
Estando em mora o credor advirão as seguintes consequências jurídicas:

1. Tira do devedor isento de dolo a responsabilidade pela conservação do objeto,


ou seja, caso o objeto da prestação venha deteriorar ou perecer, desde que o
39
devedor não tenha agido com dolo, não responde pelo prejuízo. Isso significa que,
se estiver em mora o credor e por "culpa" do devedor houver deterioração ou
perecimento, experimenta o credor o prejuízo, em virtude de estar em mora;

2. Obriga o credor a ressarcir o devedor das despesas efetuadas com a


conservação da coisa, ou seja, mesmo não tendo responsabilidade com a
conservação da coisa, se foi cuidadoso e efetuou gastos com a conservação do
objeto, o credor em mora terá obrigação de ressarcir tais despesas; e, finalmente,

3. Sujeita o credor a receber a coisa pelo seu maior preço, se este oscilou entre o
tempo do contrato e o do efetivo cumprimento da obrigação.

Estando em mora o devedor, ou o credor, o legislador possibilitou o conserto


da situação de inadimplência, através da Purgação da Mora.
Purgar significa "purificar", e conforme Silvio Rodrigues, "é o procedimento
espontâneo do contratante moroso, através do qual ele se prontifica a remediar ou
a consertar a situação a que deu causa, sujeitando-se aos efeitos dela
decorrentes."
O artigo 401, I e II, determina como poderão proceder, o devedor e o credor
para "purgar sua mora". Basta que se sujeitem aos efeitos do inadimplemento.
Para que se possa estabelecer o início do retardamento, será necessário
distinguir as obrigações que possuem data certa de vencimento daquelas que não
têm. Nas obrigações que não se fixou a época do cumprimento, a "constituição em
mora" (termo inicial do retardamento), "desde a interpelação, notificação ou
protesto" (artigo 397). É a chamada MORA "EX PERSONA", explicada por De
Plácido e Silva da seguinte maneira:

"Assim se diz da mora que é fixada pela interpelação judicial.


"Em regra, ocorre quando não há prazo designado para o cumprimento da
obrigação. E a interpelação é o meio hábil, juridicamente, para que seja o devedor
posto em mora, em virtude do termo, que a interpelação lhe assina.
"Assim, a mora ex persona é a que se funda na interpelação judicial, quando,
sendo as obrigações puras e simples, têm o termo determinado pela interpelação.
"Por esta razão, é assente o princípio que as obrigações sem prazo fixado ou
termo, somente podem mostrar o inadimplemento quando este mesmo termo é
40
fixado pela interpelação judicial Vocabulário Jurídico, Ed. Forense, Vol. III, 12ª
edição, p. 210.
Por outro lado, sendo a obrigação "positiva e líquida", independente de
notificação, interpelação ou protesto, "no seu termo", o devedor é constituído "de
pleno direito em mora", conforme o artigo 397 do Código Civil.
Sílvio Rodrigues traz uma curiosidade interessante: "Já vimos que a
orientação do legislador é uma no Direito Civil e outra no Direito Comercial.
Enquanto neste campo a mora do devedor só terá início após a interpelação
(CCom, art. 138), no Direito Civil ela se enceta desde logo, com o mero advento
do termo desacompanhado do cumprimento da obrigação, pois, em tal
terreno, dies interpellat pro homine. É o que deflui do art. 397 do Código Civil."
Conforme o professor Ricardo Gama, em sua obra Manual Prático da Advocacia,
1ª edição, 1995, ed. edipro, pag. 299, a expressão dies interpellat pro homine,
significa "o termo (prazo, data certa) interpela pela parte."
Também chamada de MORA "EX RE", explicada por De Plácido e Silva da
seguinte maneira:
"É aquela em que o devedor é incurso em mora pela falta de cumprimento da
obrigação no dia de seu vencimento. Está constituído em mora pleno jure (de
pleno direito), sem que seja necessário qualquer aprazamento.
"Na mora ex re, domina o princípio do dies interpellat pro homine, visto que
nela tem o devedor dia sabido para cumprir a obrigação.
"Quando se trata de mora solvendi ex re, ela se constitui pela apresentação
ao devedor do título ou da obrigação e a falta de pagamento deles.
"Mas, se títulos cambiais, pelo protesto é que se prova a falta de pagamento,
que vem colocar o devedor em mora. (CCom, art. 138). Vocabulário Jurídico, Ed.
Forense, Vol. III, 12ª ed., p. 210.
Não sendo possível a caracterização da mora, ou seja, caso a prestação não
tenha mais utilidade ao credor, devem ser respeitadas as regras do artigo 389 e
seg. do Código Civil.
Em se tratando de contratos unilaterais, atualmente chamado de BENÉFICO,
isto é, aquele que traz proveito apenas uma das partes, a parte beneficiada
responde por simples culpa, enquanto que a parte não favorecida responderá
somente por dolo (artigo 392).
Nota-se no artigo 393 que o caso fortuito ou de força maior funciona como
excludente de responsabilidade com relação ao inadimplemento. O parágrafo
41
único, do artigo 393, só encara como excludente de responsabilidade o Caso
Fortuito ou de Força Maior, cujos efeitos, o inadimplente não tivesse meios de
evitar, caso contrário, se os efeitos pudessem ser evitados, mas o inadimplente
não se preocupou, sua responsabilidade existe.
O art. 402 define em que consistem as perdas e danos, ou seja, "as perdas e
danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que
razoavelmente deixou de lucrar", mas isto não significa que o credor ou
prejudicado deva obter lucros na indenização. Não se deve falar em indenização
se não houve prejuízo, mas havendo, deve ser a mais completa possível,
computando-se o DANO EMERGENTE e o LUCRO CESSANTE. Em se tratando
de Dano emergente, o credor deverá mostrar o dano que efetivamente sofreu.
Com relação aos lucros cessantes, não se pode falar em circunstâncias
imaginárias, devendo ser cabalmente comprovados e previstos já na data do
contrato.
Tratando ainda da indenização, o artigo 403, somente a autoriza, quando
ocorreu por "efeito direto e imediato" da inexecução. Assim só serão indenizados
os prejuízos sofridos e os lucros cessantes que estejam diretamente ligados à
inexecução, podendo ser imediatamente verificados, caso contrário, não poderá a
parte "sonhar com a indenização".
Finalmente, trata o legislador, dos juros. Doutrinariamente podemos dizer que
o juro é o lucro do capital, ou seja, "o preço do uso do capital". Podem ser:

MORATÓRIOS: quando constituem a indenização pelo retardamento; e,

COMPENSATÓRIOS: quando são os frutos do capital empregado.

Por outro lado, ainda podem ser:

CONVENCIONAIS: quando convencionados pelas partes; e,

LEGAIS: impostos pela lei.

DA CLAUSULA PENAL
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As regras de direito têm por finalidade primordial manter a ordem social.
Dentro do campo do direito das obrigações, torna-se necessário assegurar a
circulação de riquezas, para que exista maior tranqüilidade social. Assim, é
importante proteger o credor, ou os credores contra os riscos da insolvência e do
inadimplemento.
Com relação ao risco da insolvência, o nosso direito permite ao credor exigir
garantias reais (hipoteca, penhor) ou fidejussórias (avalista, fiador), evitando
assim, a insolvência do devedor.
Com o intuito de permitir que o credor possa afastar o risco do
inadimplemento, o nosso legislador criou a cláusula penal, que conforme a opinião
dominante na doutrina, em princípio, tem duas finalidades:

a) serve como um reforço da obrigação principal, na medida em que impõe ao


devedor uma pena, caso não cumpra a obrigação da forma pactuada; e,

b) serve como cálculo pré-determinado das perdas e danos.

Trata-se de pena pré-estabelecida, e por consenso das partes, que deverá


ser prestada por aquele que der causa ao descumprimento parcial ou total da
obrigação.
Conforme Sílvio Rodrigues, embora nossa legislação não tenha conceituado
a cláusula penal, o código Napoleônico, "a despeito das suas imperfeições",
oferece uma idéia deste instituto:

"A cláusula penal é aquela pela qual uma pessoa, para assegurar a execução
de uma convenção, se compromete a dar alguma coisa, em caso de inexecução".

A cláusula penal tem caráter acessório, não podendo existir anteriormente ao


surgimento da obrigação principal, conforme se depreende do artigo 409 do
Código Civil Brasileiro. Assim, sendo nula a obrigação principal, também será
nula a cláusula penal. Existe, no entanto, a possibilidade de ser nula a cláusula
penal, o que não implica também na nulidade da obrigação principal.
Por ser acessória pode ser pactuada no momento do nascimento da
obrigação principal ou posteriormente.
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O código traz duas espécies de cláusula penal: a compensatória e a
moratória. A cláusula penal compensatória é pactuada para proteger o credor da
inexecução completa da obrigação, enquanto a cláusula penal moratória protege
o credor do descumprimento de alguma cláusula especial ou do simples atraso no
cumprimento da obrigação.
É de fundamental importância a distinção apontada, vez que, o legislador às
regulamenta de maneira diferente, principalmente porque se for compensatória,
não pode ser cumulada com o cumprimento da prestação, já se for moratória, a lei
permite o pedido de pagamento da multa, com o da prestação principal.
Importante destacar que o novo Código Civil manifesta-se sobre problema muito
discutido da doutrina e no parágrafo único, do artigo 416, estabelece que, sendo o
valor da cláusula penal inferior ao valor do prejuízo causado pelo inadimplemento,
caso as partes tenham pactuado, a possibilidade de modificação da pena, cabe ao
credor provar o prejuízo excedente.
Conforme o artigo 410, a cláusula penal compensatória, trata-se de uma
alternativa para o credor. Não se trata de obrigação alternativa, isto porque, a
pena só poderá ser exigida no caso de inadimplemento, quando o credor poderá
optar pela cláusula penal ou pelo cumprimento da obrigação acrescida de perdas
e danos. De tal sorte, afirma-se categoricamente, que o devedor nunca terá o
direito de escolher entre o cumprimento da obrigação ou o pagamento da cláusula
penal.
Na prática, pode o interprete se deparar com dificuldades para identificar a
espécie da cláusula penal. Diante disso, a doutrina preocupa-se na solução de tal
inconveniente e prega que é possível identificar a espécie, através do valor
imposto como pena; “se é de valor elevado, aproximando-se do valor principal, há
que se considerá-la compensatória, pois é provável que as partes a tenham
estipulado antevendo a possibilidade de inadimplemento absoluto. Por outro lado
se o valor é muito inferior ao da obrigação principal seria moratória”.
É importante ainda, a regra do artigo 412, que limita o valor da cláusula penal
ao da obrigação principal. Tal dispositivo, conforme a doutrina, serve para
equilibrar a relação jurídica, impossibilitando que o credor obrigue o devedor de
forma excessiva. Com esse intuito o legislador no artigo 413, ainda impõe ao juiz,
em caso de pagamento parcial, a redução proporcional da pena estipulada tanto
na mora quanto no inadimplemento.
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O teto estipulado no artigo 412 é a regra geral, mas existem legislações
específicas que o colocam a nível inferior para determinadas transações, como é
o caso da Lei da Usura (Decreto nº 22.626, de 07.04.33), que limita a cláusula
penal em 10% do valor da dívida, nos casos de contrato de mútuo; do Artigo 11,
"f", do Decreto-Lei nº 58 de 10/12/1937, que "Dispõe sobre o Loteamento e a
Venda de Terrenos Para Pagamento em prestações" e limita a cláusula penal a
10% do débito, podendo ser exigida somente "no caso de intervenção judicial",
e Decreto 3.079 de 15/09/1938 no mesmo sentido; do inciso V, do artigo 18, da Lei
nº 6.766, de 19/12/1979, que dispõe sobre "o Parcelamento de Solo Urbano" e
limita a cláusula penal a 10% do débito e "só exigível nos casos de intervenção
judicial ou de mora superior a 3 (três) meses".

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