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Sebeca

- Direito das Obrigações C -

Regente: Mestre João Tiago Morais Antunes

Rebeca Louro - 2018 1


Parte Geral – Conceito de Obrigação

Conceito de Obrigação

è Dever de prestar – não é uma definição rigorosa e exigida pelo Direito, mas ainda assim
é correta.
è Vínculo jurídico, de natureza relativa, que une dois sujeitos, sendo um deles o
devedor, que se encontra na parte passiva dessa relação, e o outro, no polo oposto, o
credor, que se encontra na parte ativa; por força do qual uma pessoa, o credor, tem
o direito de exigir que outrem, o devedor, preste – sentido técnico.
è Obrigação em Sentido Amplo: é uma situação jurídica passiva (situações em que uma
ou várias pessoas se encontram adstritas a certa conduta):
o Dever jurídico:
§ Universal: oponível erga omnes, do lado ativo há um direito absoluto. Não é
uma obrigação, porque não é uma relação relativa, não há um ou mais
devedores e um ou mais credores, pois é oponível a todos os homens,
havendo ou não relações relativas (ex.: todos têm o dever de respeitar a
propriedade alheia).
§ Especial (relativa): é uma verdadeira obrigação, um determinado dever
titulado por uma determinada pessoa que, se vier a ser cumprido,
permite a realização de um interesse de uma outra pessoa. Do lado ativo
corresponde a um direito de crédito, nada mais é do que um direito subjetivo.
o Estado de Sujeição: uma determinada pessoa está inelutavelmente obrigado a
suportar na sua esfera jurídica as consequências típicas da atuação de uma pessoa
que é titular de um direito potestativo. Não é uma obrigação, pois o devedor não se
encontra num estado de sujeição, o devedor tem de prestar, há uma conduta
positiva de dare (entregar algo), facere (fazer algo) ou non facere (omitir algo).
o Ónus: para auferir determinada vantagem ou para não sofrer determinada
desvantagem, deve praticar determinada conduta, mas se não o fizer não há nada
que suceda para essa pessoa, para além de não alcançar a vantagem ou de não
evitar o mal da sua esfera jurídica (ex.: os estudantes estão onerados a participar
nas aulas e fazer os testes para ter ou não avaliação contínua, não é obrigatório, se
não o fizerem, simplesmente, não têm avaliação contínua para servir de
paraquedas no exame final) – não há uma imposição de conduta.

è A obrigação é um determinado dever jurídico especial e isso retira-se dos artigos:


o 397º: especial e relativo, pois é de uma pessoa para outra, há um credor e um
devedor, um jogo com jogadores determinados. É um vínculo jurídico relativo, a
pessoa ou pessoas no lugar do credor e do devedor têm que ser determinadas
(tem que haver um polo passivo e um polo ativo, o número de pessoas é
irrelevante).
o 398º nº1: autonomia privada das partes, há liberdade dentro dos limites da lei.
o 398º nº2: para ser validamente constituída não tem que ter valor pecuniário,
pode-se contrair um dever de prestação não avaliável em dinheiro (ex.: alguém que

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se compromete a mandar rezar uma missa em nome de alguém próximo do credor;
alguém que se compromete a prestar auxilio moral ou espiritual). Contudo, tem que
ser um interesse do credor digno de ser tutelado pelo direito, de proteção legal
(ex.: dois amigos nos copos, um deles diz que se o Sporting for campeão pinta o
nariz de vermelho – o dever concretamente assumido não corresponde a nenhum
interesse digno do credor, leia-se, digno de proteção jurídica).
è O dever de prestar tem que ser livremente constituido, não tem que constituir um valor
pecuniário, desde que o interesse do credor seja digno de proteção legal. O credor tem
o direito de exigir o cumprimento ao devedor, quando o direito nasce.
è Numa obrigação perfeita (civil) o credor pode recorrer ao Tribunal e às autoridades
públicas para fazer cumprir o dever coercitivamente – direito de exigir o cumprimento.
è Há obrigações imperfeitas (naturais) em que, quando nascem, o credor não tem o
direito de exigir coercitivamente o cumprimento ao devedor. O credor não pode recorrer
a Tribunal para fazer cumprir coercitivamente, se o devedor não cumprir – direito de
pretender o seu cumprimento.

è As obrigações podem ser:


o Singulares: um credor e um devedor.
o Plurais: ou de um lado passivo, ou do lado ativo, ou de ambos, mais que um credor
e devedor:
§ Conjuntas: cada devedor só é obrigado a responder pela quota parte de que
tem obrigações.
§ Solidárias: qualquer devedor é obrigado a cumprir a totalidade da obrigação,
depois ajustando contas com os seus co-devedores.

è Relação obrigacional simples: do vínculo jurídico consegue-se vislumbrar o credor, o


devedor e o dever de prestação (ex.: contrato de compra e venda – vendedor tem a
obrigação de entregar a coisa; o comprador tem a obrigação de pagar o preço).
Deveres que correspondem aos correlativos direitos de exigir a prestação, a
obrigação esgota-se nesse cenário – ressonância magnética ou fotografia – dever
principal.
è Relação obrigacional complexa: a fotografia pode ter outras realidades para além
das que aparecem de imediato diante os olhos, pode-se esmiuçar o conceito
mostrando a fotografia completa:1
o Deveres primários ou principais de prestação: trata-se da já referida relação
obrigacional simples, alma e essência da relação; definem o tipo de contrato,
sempre que nasça uma relação dessa natureza (ex.: compra e venda de uma jarra).
o Deveres secundários de prestação:
§ Acessórios: preparam o cumprimento ou assegurarem a perfeita
realização da prestação principal – dever de embalar, transportar ou
conservar a coisa vendida (ex.: a jarra é um objeto frágil, o vendedor tem o
dever de a embalar cuidadosamente para evitar que se parta).

1
MOTA PINTO salienta que se apenas se tivesse em conta os deveres principais, nunca se
compreenderia situações de inadimplemento, embora a prestação principal tenha sido
cumprida. Serão casos de violação de deveres laterais como o caso de um trabalhador que executa
a sua tarefa normal, mas viola o dever de lealdade para com a sua empregadora. Salienta, também,
que há certos deveres laterais, criados pelo contrato, que se estendem a terceiros que, ao
serem violados, estes se transformam em credores com direito a indemnização contratual.

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§ Autonoma: secundários com a prestação principal:
• Sucedâneos da prestação principal: substituem-se o dever principal
(dever de indemnizar), resultante de uma impossibilidade culposa da
prestação originária (ex.: se o vendedor partir deliberadamente a jarra
depois de receber o preço, tem que indemnizar o comprador pelos
prejuízos causados).
• Cumuláveis com o cumprimento da prestação principal:
incumprimento prolongado resultando em mora ou cumprimento
defeituoso (ex.: se a jarra estiver rachada ou se for para entregar ao
domicíllio no próprio dia e demorar um mês).
o Deveres laterais de prestação: corresponde à exata satisfação dos interesses
globais envolvidos na relação obrigacional complexa; deveres que nascem de
cláusulas contratuais, de dispositivo da lei ad hoc ou do princípio da boa fé –
transversal ao direito privado, decorrem de deveres laterais de conduta, v.g.
deveres de cuidado, lealdade, aviso, prevenção, proteção, informação, etcetera,
abrangem a pessoa do credor e pessoas relacionadas com ele.
o Outras situações jurídicas passivas: inclui os ónus, estados de sujeição,
expectativas jurídicas, exceções e direitos potestativos.
è Se algum dos deveres vier a ser incumprido pelo devedor, este incorre em
responsabilidade civil obrigacional, aplicando as regras mais favoráveis da
responsabilidade obrigacional, seja em matéria de ónus de prova da culpa, seja em
matéria de regime de responsabilidade plural.

Outras Características das Obrigações:

è Será que devemos incluir como características a patrimonialidade, autonomia e


relatividade?

Patrimonialidade?

è Em sentido rigoroso só se deve considerar uma obrigação que tenha a característica da


patrimonialidade – a obrigação não precisa de ter caráter pecuniário – 298º nº2. A
patrimonialidade na aceção e sentido que o dever de prestar teria que ser avaliável em
dinheiro não corresponde a uma característica das obrigações.
è O que se pergunta é se a patrimonialidade não deveria ser entendida em sentido
distinto, isto é, na medida em que o não cumprimento do dever de prestar, leva a
uma consequência negativa de o devedor ver o seu património executado, para
indemnização dos prejuizos que o não cumprimento da prestação causa ao credor.
è Visa realçar: o não cumprimento de uma obrigação, em sentido técnico-jurídico, apenas
pode desencadear consequências patrimoniais desfavoráveis ao devedor e mais
nenhumas outras (ex.: não é permitida a prisão por dívidas, exceto em casos como
veremos infra), a execução, em caso de incumprimento, não incide sobre a pessoa do
obrigado, mas exclusivamente sobre os seus bens.
è É uma característa das obrigações nesta última aceção.

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Autonomia?

è Há obrigações que podem considerar-se autónomas: quando nascem de uma das


fontes do livro II do Código Civil. Deveres de efetuar uma prestação que se
apresente com existência própria, ou seja, quando surja por virtude de factos que não
pressupõe direitos preexistentes, nem uma relação entre os sujeitos anterior.
è Há obrigações que pode considerar-se não autónomas: dever de prestar o vínculo
jurídico relativo titulado do credor do lado ativo e do devedor do lado passivo que não
nasça de uma dessas cinco fontes, isto é, que se encontrem dependentes e derivem
de vínculos de natureza diversa (embora tenham a mesma estrutura, estão ligadas a
direitos preexistentes, em torno dos quais gravitam):
o Direito da família (ex.: o não pagamento de uma pensão de alimentos pode levar à
prisão, há um interese superior do menor, de subsistência).
o Direito real (ex.: compropriedade de uma casa [duas ou mais pessoas titulares de
determinado bem jurídico], todos estão vinculados às despesas que têm que ser
feitas nessa mesma casa, todos estão obrigados a suportar, proporcionalmente às
suas quotas, os custos).
o Direito das sucessões (ex.: quando uma pessoa morre pode nomear herdeiros
[sucessores universais] e legatários [sucede em bens certos e determinados do
autor da sucessão], mas não cabe ao de cuius fazer a distribuição, cabe ao herdeiro
entregar o bem certo e determinado ao legatário, é a sua obrigação).
è A autononomia não é característica das obrigações em sentido técnico-jurídico.
Pode suceder que o regime da obrigação sofra determinadas vicissitudes em
função dessa limitação de autonomia, os restantes ramos não olham para a liberdade
da mesma forma, mas, em larga medida, os regimes das obrigações autónomas e não
autónomas é coincidente, logo, também são obrigações em sentido técnico-jurídico.

Relatividade?

è O vínculo jurídico obrigacional é relativo, só o credor pode exigir ou não o


cumprimento e só ao devedor cabe cumprir, no caso de inadimplemento pode o
credor exigir coercivamente o cumprimento – 817º (ex.: o devedor só tem o dever de
entregar o livro àquele credor, num determinado dia), isso não é discutivel.
è O que se questiona é se um terceiro estranho contribuir para a violação desse
crédito, pode ser diretamente responsabilizado pelo credor. Eficácia externa das
obrigações é possível?
è O terceiro pode inviabilizar o cumprimento dessa obrigação através de ação sobre:
o A pessoa do devedor (ex.: se raptar, matar ou cortar os braços do devedo, este já
não consegue entregar o livro naquele determinado dia).
o O objeto da prestação (ex.: pegar fogo ao livro).
o O próprio direito de crédito (ex.: A promete vender o livro a B, o C diz que compra
já hoje pelo dobro do preço. Estando os dois interessados só um deles vai ficar com
o livro, é o C, o B apenas permite adquirir um direito de crédito, o C permite adquirir
um direito real, que ganha sempre mesmo que tenha sido constituido depois).
è O terceiro pode ou não pode ser responsabilizado diretamente pelo credor? Não
obstante ser estranho pode-se-lhe apontar o dedo? Há duas correntes doutrinais:

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1. Clássica: tese da eficácia relativa dos direitos de crédito – Antunes Varela,
Almeida Costa, Galvão Telles.
2. Moderna: tese da eficácia externa das obrigações – Menezes Cordeiro, Santos
Justo, Rita Amaral Cabral, Romano Martinez, Paulo Mota Pinto.

1. Clássica: nega a eficácia externa das obrigações. A relação jurídica obrigacional é


relativa, isso significa que é titulada por credores e devedores. Só têm direito de exigir
o cumprimento a esse(s) devedor(es) e só esse(s) pode(m) concorrer para o
incumprimento da obrigação.
è Antunes Varela compara a um soldado na guerra entrincheirado que pode disparar
para a frente e receber disparos da frente – logo, o credor só pode exigir (direitos de
crédito) àquele devedor e só por aquele pode ser acatado. Diferente é o caso do titular
de um direito absoluto (direitos reais, de personalidade, etcetera), no meio do teatro de
guerra em que pode ser agredido circularmente por todos os lados a qualquer altura –
pode exigir o cumprimento do dever de respeito erga omnes, pode ser invocado por
todos e contra todos.
è Se o crédito não for satisfeito por ação de um terceiro, obviamente, o credor não tem
direito de exigir uma indemnização, porque esse terceiro está fora do âmbito de
proteção de que o seu direito crédito é merecedor.
è É temperada com a figura do abuso de direito, má fé – há responsabilização direta
para com o credor quando o terceiro aja em abuso de direito, isto é, de má fé2, para
além da responsabilização indireta que, eventualmente, poderá haver quando não seja
possível tutelar o credor via abuso de direito, isto é, poderá o terceiro ter que
indemnizar por violar um direito do devedor, via responsabilidade civil
extracontratual, que, por sua vez, indemnizará o credor, mas nunca diretamente.

Argumentos de natureza filosófica (méritos, teóricos):

è Autonomia Privada: é um dos vetores essenciais e estruturantes em que assenta o


direito privado e civil, é contrário à hipótese de um terceiro, no exercício da sua
autonomia privada, contratar com um devedor, pondo em causa o direito de
crédito constituído pelo credor – seria negar a vitalidade da autonomia privada, o
terceiro podia desconhecer a existência do contrato anterior.
è No direito civil português não é proibido que um devedor possa, se assim o desejar,
contrair sucessivamente obrigações, cujo cumprimento em simultâneo se mostre
impossível.
è Os direitos de crédito não estão sujeitos à publicidade, não há nenhum documento ou
organismo no qual uma pessoa tenha que declarar quais as suas respetivas obrigações,
logo, os direitos de crédito que lhes estão associados, também não são
conhecidos. Os direitos absolutos são públicos porque são típicos, a autonomia privada
não existe no domínio dos direitos reais, não podem criar outros para além dos que
constam da lei – artigo 1305º –, publicidade pode ser espontânea (decorre da posse –
coisas móveis) e intencional ou organizada (o Estado organiza em relação a
determinado tipo de coisas – coisas registáveis).

2
Os efeitos do abuso de direito são equivalentes aos da falta de direito.

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è A responsabilização de um terceiro poderia constituir um entrave ao desenvolvimento
económico, à livre circulação de bens e serviços ou problemas de concorrência.
è A não responsabilização de um terceiro não significa a desproteção total do credor,
há institutos ou mecanismos que servem para ver ressalvado o seu prejuízo – artigo
334º do abuso de direito3 é uma vávula de escape para situações injustas e inequas,
deve ser utilizado quando a conduta do terceiro é manifestamente censurável.

Argumentos de natureza positiva (todos devemos obediência à lei):

è Artigo 406º nº2 – argumento de caráter literal, só produz efeitos relativamente a


terceiros nos casos especialmente previstos na lei.
è Artigo 483º e 798º:
o 483º – o sujeito é “aquele que”, é indeterminado, o terceiro será obrigado a
indemnizar por violar o direito de outrem, esse direito é absoluto – situação de
dever geral e universal.
o 798º – o sujeito é “o devedor”, adstrito a uma obrigação, um dever de prestar, só se
fala em violação por parte do devedor relativamente a um direito específico do
credor – aqui não se fala sequer em terceiro.
è Artigo 490º – está prevista para a responsabilidade extracontratual, vem sancionar,
responsabilizar, quem ajude o autor\devedor a incumprir – terceiro – dor de cabeça
dos defensores da eficácia interna.
è Artigo 413º (contrato-promessa) e 421º (pacto de preferência) – casos especiais
previstos na lei – artigo 406º nº2 – só excecionalmente têm eficácia externa, está aqui
a prova. Normas que tratam de eficácia externa.
è Artigo 1306º – tipicidade dos direitos reais, enquanto que os direitos de crédito estão
sujeitos à autonomia privada (criar qualquer tipo de obrigações); os direitos reais, com
a força de direitos reais, são aqueles que estão previstos na lei civil, não se podem criar
outros.
o Antunes Varela: são típicos, ou seja, toda a gente sabe quais são os direitos
absolutos, qualquer um que viole é obrigado a indemnizar; nos direitos de crédito
não, não sendo típicos, não são em si mesmo cognoscíveis (estão sujeitos a
uma geringonça total, liberdade máxima).
è Artigo 495º nº3 – caso especial do artigo 406º nº2, a exceção que confirma a regra. Há
eficácia externa desta norma em concreto, é uma situação pontual e dela não se
pode generalizar uma qualquer solução que com caráter genérico atribuísse eficácia
externa a toda e qualquer obrigação. Apenas se atribui quando seja uma situação
altamente grave, lesão do valor vida ou integridade física.

2. Moderna: o que se defende é a mera eficácia externa das obrigações, coisa diferente
da eficácia interna.
è Eficácia interna: o credor só tem o direito de exigir o cumprimento àquele devedor.

3
Uso do direito numa direção ilegítima. Determinado direito, em si mesmo válido, é exercido de
modo ofensivo, relativamente ao sentimento de justiça dominante da comunidade social e, ou a
ordem jurídica trata o titular como se o direito não existisse, ou condena-o à indemnização dos
danos, mantendo-se o ato abusivo.

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è Eficácia externa: a quem é exigido o cumprimento do crédito é ao devedor, mas se um
terceiro pode concorrer para a violação do crédito, livremente, com a sua conduta,
está sujeito à possibilidade de o credor o responsabilizar por essa intromissão na
relação relativa. Isto é, há também um dever, à semelhança dos direitos absolutos, de
respeito pelo direito do credor, ou seja, de não impedir ou dificultar o cumprimento da
obrigação.
è É temperada com moderação, exige sempre a culpa do terceiro, mas não
necessariamente má fé, é menos exigente, para fazer surgir na sua esfera jurídica
responsabilidade extracontratual para com o credor por violar o seu direito de crédito,
embora haja doutrinas que aceitem também a mera culpa.

Argumentos de natureza filosófica (méritos, teóricos):

è Há várias posições que divergem nos requisitos que cada autor vem exigir para
responsabilizar o terceiro.
o Radical: deve responsabilizar-se independentemente de conhecer ou não.
o Conhecimento: só faz sentido quando o terceiro pelo menos tenha
conhecimento, antes de agir, da situação creditícia, se não, falta o pressuposto
da culpa na responsabilidade civil.
o Cognoscibilidade: se não conhecia, mas devia conhecer há responsabilidade
civil, pois adequa-se melhor à ética de comportamento entre todas as pessoas
dentro do comércio jurídico, que se devem pautar o seu comportamento pelo
critério mínimo de respeito e cuidado com a pessoa e o património, não só das
respetivas contrapartes, mas também de terceiros. Há má fé em sentido ético
manifesta que deve ser censurada. Não tem que saber em teoria, mas em
concreto sabe (importância da riqueza mobiliária nesta geração por contraponto à
riqueza perspetivada nos anos 60 de que a riqueza está na terra [ex.: ações da
apple, da google, etcetera]).

Argumentos de natureza positiva (todos devemos obediência à lei):

è Artigo 406º nº2 – o argumento literal utilizado pela tese clássica só prova em certo
tipo de fontes de obrigações, as de contratos, há mais fontes de obrigações. Nem
sequer isso é verdade, pois não é o que se diz da eficácia externa, como já analisado
(apenas impõe o respeito e não o cumprimento).
è Artigo 483º e 798º – pode-se ler as normas de forma diferente. O primeiro artigo tem o
seu acento tónico na parte “direito de outrem” e não em “aquele que”, o que dá
margem interpretativa suficiente para incluir não só os direitos absolutos, mas
também os direitos de crédito. “Aquele que” – lê-se terceiro – “violar o direito de
outrem” – direito de crédito do credor.
è Artigo 490º – está prevista para a responsabilidade extracontratual, vem sancionar,
responsabilizar, quem ajude o devedor a incumprir – terceiros.
è Artigo 413º (acordo de vontades através do qual se compromete perante outrem a
celebrar determinado contrato, a pessoa já se obrigou) e 421º (alguém que se

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compromete perante outra pessoa a dar vantagem caso decida celebrar determinado
negócio [right to first refusal] a pessoa ainda não se obrigou e pode nunca querer
celebrar um negócio) – os direitos deixam de ter eficácia meramente obrigacional e
passam a ter eficácia real, desde que estejam previstos os requisitos dos artigos
referidos (as partes celebrarem por escritura pública; declararem expressamente que
pretendem atribuir eficácia real a esses contratos; inscreverem esses contratos no
registo; esses contratos terem por objeto imóveis ou móveis sujeitos a registo). Qual o
interesse em conferir eficácia real? Se tiver eficácia real é diferente, terá um direito
real de aquisição, no confronto é o titular do direito real primeiramente constituído
que tem preferência, o incumprimento já não prejudica o contraente que queria honrar
esse mesmo contrato. Normas que tratam de eficácia real.
è Artigo 1306º – o argumento de Antunes Varela é falacioso, a doutrina maioritária da
eficácia externa das obrigações o que defende é a responsabilização do terceiro
quando tenha agido com culpa, isto é, se quando ao contratar sabia, por algum
motivo, da existência desse direito de crédito. O artigo pouco ou nada acrescenta.
è Artigo 495º nº3 – quando alguém lesa a vida ou põe em causa a integridade física tem
que indemnizar o lesado, também se deve ter em consideração quem o tenha auxiliado
e as pessoas a quem o lesado, legalmente, estava obrigado a dar alimentos
(casamento, filhos) ou dava alimentos devido a uma obrigação natural (união de facto) –
funda-se num dever de ordem social ou moral, cujo cumprimento corresponde a um
dever de justiça, mas não é judicialmente exigível. Impõe a quem não é parte de uma
relação jurídica obrigacional, o dever jurídico de indemnizar todos os prejuízos
que a sua conduta culposa e inadimplente venha a causar, tanto prestações civis
(casamento – cumunhão de mesa, leito e habitação, há direitos e deveres [respeito,
fidelidade, assistência, etcetera], há direito a suceder) como naturais (união de facto,
também há cumunhão de mesa, leito e habitação, não tem direito sucessório, mas
também não tem deveres).

è Há três níveis:
1. Eficácia Interna ou Relativa, traduz o dever, que quem é devedor tem para com
o credor, que é o de prestar a prestação devida. Toda a obrigação tem dois
polos.
2. Eficácia Externa, quem não está dentro dos dois polos, quem está fora do
segmento de reta, tem de respeitar a obrigação. É um problema controverso, há
quem entenda que tem de respeitar e há quem entenda que não tem.
3. Eficácia Real, quem está fora dos polos, um terceiro, não só tem de respeitar,
como também tem o dever de cumprir; a eficácia real, esta só existe nos casos
e termos previstos na lei (artigo 406º nº2 – artigos 413º, 421º, 443º [figura do
contrato em favor de um terceiro]).

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Que interesse fundamental é protegido no Direito das Obrigações?

è O Direito das Obrigações visa tutelar, proteger e realizar o interesse do credor (lícito
e digno de proteção jurídica), a parte ativa do vínculo jurídico relativo, com as regras
desta parte II do livro do Código Civil (ex.: dação em cumprimento, causa de extinção
das obrigações para além do cumprimento [destino natural das obrigações consegue
realizar melhor o interesse do credor] – o devedor fica exonerado do cumprimento da
obrigação, artigo 837º e seguintes, intitutos que exoneram o cumprimento da obrigação,
mas só são permitidos se o credor consentir, pois o Direito das Obrigações visa proteger
o interesse do credor).
è O direito não trata o credor e o devedor de forma igual, mas também não é
completamente indiferente ao devedor (embora só o tome em conta quando não
prejudique o interesse do primeiro).
è Não quer dizer que o interesse do devedor não seja nunca protegido, nunca seja tido
em consideração, há um conjunto de normas jurídicas que também mostra que o
interesse do devedor também é tido em conta (ex.: artigo 772º [local do cumprimento
da obrigação, não havendo acordo das partes ou lei que estipule o contrário], 779º
[prazo para o cumprimento da obrigação, não é exigível antes do decurso do prazo, mas
é cumprível e pagável a todo o momento por iniciativa do devedor, sem que o credor se
possa opor a esse cumprimento]).

Obrigações Naturais

è Artigo 402º tem a noção das obrigações naturais.


è São exigidos três requisitos cumuláveis, no dever de prestar:
1. Dever de ordem moral ou social – consciência moral.
2. Incoercível, não é judicialmente exigível, o cumprimento só pode ser pretendido.
3. Dever de justiça, tem que ser suscetível de ser reclamado através de um dever
de justiça (justiça é a virtude constante e permanente de atribuir a cada um aquilo
que é seu – realizar a justiça no caso concreto) – consciência jurídica.
è Os primeiros fundamentam liberalidades, já os deveres jurídicos consubstanciam
obrigações civis munidas de ação. As obrigações naturais encontram-se no justo meio
entre estes deveres, não podendo ser coercível por esta razão, deste modo, não se
trata de dever jurídico nem de um dever moral e social apenas. Para além deste último,
como visto supra, exige-se que seja também um dever de justiça – deveres
reclamados pela justiça, mas não impostos pelo direito, não coercíveis, por isso não
se tratam de deveres jurídicos, mas somente de deveres de justiça, resultando no justo
meio referido.
è Há vários exemplos em que o próprio legislador qualifica determinado dever de prestar
como obrigação natural, mas há mais obrigações naturais para além daquelas que a lei
civil qualifica como tal, há outras que caem no conceito genérico do artigo 402º.
Exemplos dos casos previstos:
o 1895º, bens cuja propriedade pertence aos pais (filho menor que trabalhe com os

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pais deve ser compensado pelo seu trabalho);
o 304º, prescrição (efeito do tempo nas obrigações, há o ónus de invocar a
prescrição, para que se transfigure numa obrigação natural – penalizar a inércia do
titular do direito de crédito, há um limite para o exercício do direito de crédito [o
prazo de prescrição varia]);
o 495º nº3, pensão de alimentos (em união de facto);
o 1245º, jogo e aposta, há várias modalidades:
§ Proibido, não gera qualquer obrigação – viola regras imperativas na ordem
jurídica portuguesa e que põe em causa princípios e valores estruturantes,
como a dignidade da pessoa humana (ex.: roleta russa);
§ Tolerado ou Lícito, gera obrigações naturais se o devedor quiser cumprir
não pode pedir de volta, o credor também não pode exigir o cumprimento;
§ Autorizado, gera obrigações civis, objeto de regulamentação legal pela
autoridade pública (ex.: lotaria ou casino), cai no monopólio do Estado (Santa
Casa da Misericórdia), estão previstos na Lei do Jogo.
• 1246º do Código Civil, competições desportivas geram obrigações civis
não só para os participantes, mas também para as entidades
organizadoras.4
è 403º, se o credor não pode exigir o cumprimento; se o devedor cumpre, cumpre
bem – justiça. Não pode repetir se cumprir espontaneamente, isto é, livre de qualquer
coação (nestes casos apenas, cessando a ameaça pode exigir a repetição [reembolso])
– irrepetibilitade da obrigação.
è 404º, remissiva, manda aplicar o regime das obrigações civis, em tudo aquilo que
não esteja relacionado com o cumprimento coativo da prestação (artigo 762º e
seguintes, há uns que não se aplicam devido à coercibilidade) – quando o devedor
quer cumprir.
è É possível transformar uma obrigação natural numa obrigação civil através de uma
promessa de reconhecimento e cumprimento da dívida, nos termos do artigo 458º
(por documento escrito), pode revestir forma de contrato, reforçando a situação
patrimonial do credor – segundo Antunes Varela e Almeida Costa, esta transformação
não é permitida nos casos de jogo e aposta, pois não se tratam de modos
honestos de ganhar a vida, mas admitem nos casos de dívidas prescritas.5

4
ANTUNES VARELA: trata-se de uma obrigação civil se for feita entre dois competidores e não uma
pessoa de fora, pois o jogo e aposta funcionam como motivação, desde que não sejam
fraudulentos.
5
ALMEIDA COSTA, pp. 464 e seguintes.

Rebeca Louro - 2018 11


Parte Especial – Fontes das Obrigações

Contratos

è Acordo bilateral, isto é, acordo em que duas ou mais pessoas prosseguem, através de
um encontro de vontades, a realização de interesses naturalmente contrapostos e
divergentes – conceito puramente doutrinal.
è Tem sempre necessariamente duas partes (centro autónomo de interesses que se
procura realizar através da celebração de um contrato) ≠ pessoa\sujeito.
è Pode haver acordos plurilaterais, situação em que se visam realizar diferentes
interesses prosseguidos por diferentes partes.

Relações Contratuais de Facto:

è Ideia de Haupt, pensador alemão. Existem determinadas situações de vida do dia-a-dia


que, embora reconduzíveis à figura do contrato, não deviam ser designadas como tal,
são relações sociais típicas e tradicionais do dia-a-dia, serão fonte de obrigação.
1. Transação de bens e serviços massificados (ex.: “contrato” de transporte,
apanhar o metro), serão situações verdadeiramente reconduzíveis ao contrato de
transporte? Onde está a proposta e a aceitação? Mais que contratos são
situações que se reconduzem a estas relações contratuais de facto.
2. Situações que precediam a celebração de negócios jurídicos e\ou contratos,
já há uma tal relação que justificava que a pessoa e o seu património estivessem
já sobre a alçada do direito, isto é, se houvesse alguma violação justificaria a
obrigação de indemnizar, justificável por esta figura.
3. Situações negociais prolongadas no tempo que sofressem de um vício
genético que afetasse ab initio a sua vigência. O vício que afeta a sua validade
levaria a que, na prática, resultasse que nunca tinham estado em vigência (ex.: o
pai e uma mãe celebram um contrato com uma babysitter para tomar conta do
filho, descobre-se que a esta foi alvo de coação moral ao fim de uns anos, mas
não está isenta dos deveres de boa fé relativamente à criança6).
è Na nossa doutrina, já em plena vigência do Código Civil de 1966\67, mostrou-se pouco
entusiasmo relativamente a esta figura, pois podem ser justificadas à luz de outras
figuras, de verdadeiras fontes de obrigações. Estas situações podem acomodar-se à luz
do contrato:
1. Contratos de forma automática e instantânea – o próprio Código Civil tem
algumas regras permitem explicar algumas perplexidades: muitos dos contratos
serem tidos por pessoas sem capacidade jurídica (menores), o Código Civil tem
uma regra (125º) que é excecionada pelo 127º (vida corrente do menor). Onde
está a proposta e a aceitação? O Código Civil contém regras que admitem a
celebração destes contratos sem o esquema clássico de proposta e aceitação
(234º), é aceite ainda que não haja verdadeira declaração de aceitação – do

6
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Rebeca Louro - 2018 12


comportamento\conduta há uma vontade inequívoca. Contratos de adesão:
alguém predispõe um conjunto de regras contratuais que pode ser aceite ou
recusado (não há liberdade de estipulação).
2. Contactos prévios que precedem a celebração do contrato, que justificam a
proteção mínima da pessoa e do seu património – 227º responsabilidade pré-
contratual, culpa in contrahendo, boa fé, impõe-se o dever de indemnizar pelos
danos causados quer à pessoa, quer ao património.
3. Relações que padecem de um vício genético – há certos deveres jurídicos que
se impõem e que não são afetados pela declaração de nulidade ou anulabilidade
do negócio jurídico.
è Todas estas situações podem ser identificadas no paradigma clássico dos
contratos.

Princípios Fundamentais dos Contratos:

è Há desvios ou exceções em todos os princípios.

Princípio da Liberdade Contratual

è Artigo 405º.
è O princípio da liberdade (princípio máximo do direito privado) permite fazer tudo o que
não é proibido pelo direito; tem uma decorrência direta e imediata que é a autonomia
privada que diz que no direito das obrigaçãoes, a regra é a de que, as partes podem
fazer o que bem entenderem, respeitando os limites imperativos impostos pela lei; e
uma das concretizações é a liberdade contratual (decorrência indireta do princípio da
liberdade e direta da autonomia privada que, por sua vez, é decorrência direta da
primeira), ou seja, as partes podem celebrar os contratos que desejarem, como
entenderem e para realizarem os interesses que entenderem, o contrato é o meio de
preferência da concretização desta liberdade (divide-se em liberdade de celebração e
liberdade de estipulação).
è Liberdade de celebração, prevista na primeira parte do nº1, diz que, em regra,
ninguém é obrigado a celebrar um negócio jurídico ou contrato. Mas há desvios:
o Autolimitação (Antunes Varela): alguém, por acordo com outra pessoa, assume
com outrem o dever de celebrar determinado contrato e\ou negócio jurídico
(ex.: contrato-promessa [maior limitação]; pacto de preferência [duplamente
condicionada – só existe se o obridado decidir ele próprio a livremente de contratar
e se o titular do direito de preferência igualar as restantes propostas]).
§ João Tiago considera ainda, em última análise, um caso de liberdade.
o Heterolimitação: a obrigação de contratar e de celebrar um negócio jurídico
constituem consequência imediata do direito ou da ordem jurídica. Apenas se
justifica em determinadas situações, situações estas muito limitadas. (ex.:
monopólios de facto e\ou de direito, uma empresa presta um serviço ou fornece um
bem essencial para a satisfação das necessidades individuais das pessoas, que

Rebeca Louro - 2018 13


têm o monopólio, isto é, nenhuma outra empresa tem condições para prestar este
serviço ou fornecer este bem [EDP, não contrata porque a pessoa é do benfica];
alguém que gere os únicos quartos disponíveis para alugar numa determinada
localidade não aceitar alugar a cidadãos do sexo masculino – por discriminação,
recusa sem fundamento). Quando alguém está nestas situações a pessoa não se
pode recusar a celebrar determinado contrato, está obrigado a fazê-lo, não goza
de liberdade contratual.
§ A sanção é identida, isto é, tem que indemnizar os prejuízos causados –
restauração in natura do ilícito e do dano causado, artigo 830º, pode-se
aplicar mesmo fora do contrato-promessa. Permite, através de ação de
execução específica, a pessoa que recusa a contratar, mas está
obrigada, é substituida pelo Tribunal, emite em seu nome para que o
contrato se forme entre eles. Há outros exemplos previstos em regimes
jurídicos especiais no ordenamento jurídico português (ex.: médico de um
hospital público está obrigado por lei a prestar serviço a todos, mesmo que
tenham uma tatuagem de uma cruz suástica; o advogado defensor oficioso de
alguém sem meios económicos para ter um advogado, se for nomeado, não
pode recusar – é assim exceto em situações limite, altamente excecionais e
não por meras objeções de consciência).
è Liberdade de estipulação, de acordo com a segunda parte do nº1 e o nº2, liberdade
de fixação do conteúdo do negócio e pelo tipo negocial que se entender (típicico,
atípico ou misto), dentro dos limites da própria lei (ex.: contrato de escravatura é nulo –
artigo 280º), é como ir a uma pizzaria, fazer a própria pizza e escolher os ingredientes.
Também aqui há desvios:
o Há também, muitas vezes, regras imperativas que se impõem às partes, como o
artigo 2196º (não é um contrato, mas um negócio jurídico unilateral), cuja
constitucionalidade é questionada, e o 953º (verdadeiro e próprio contrato), há
limitação à liberdade de fixação do conteúdo dizem, respetivamente, que não pode
o cônjuge deixar em testamento determinado bem para a amante e não pode em
vida doar à amante.
o Também não existe nos contratos por adesão, que têm uma lógica de pegar ou
largar. Sujeição dos contratos ao regime das cláusulas contratuais gerais que
visam beneficiar e proteger os adquirentes desses serviços.

Princípio do Consensualismo

è Há várias aceções e diferentes manifestações deste princípio:


1. Os contratos são, em regra, consensuais, isto é, a validade de um contrato não
depende da sua redução a escrito ou da observância de qualquer formalidade
adicional – artigo 219º.
2. A validade de um contrato depende apenas de um mero encontro de vontades
entre as diferentes partes, não sendo necessária a entrega de qualquer coisa,
nomeadamente, a tradição do objeto do contrato. Mas há exceções, uma tradição
romanista:
a. Contratos reais quoad constitutionem: para se considerarem devidamente
celebrados, além do encontro das vontades representativas dos diferentes

Rebeca Louro - 2018 14


interesses opostos, pressupõe a entrega ou tradição da coisa, objeto do
contrato. No direito português existem os contratos de:
i. Depósito;
ii. Mútuo;
iii. Comodato;
iv. Penhor;
v. Doação de coisa móvel não reduzida a escrito;
vi. Parceria pecuária;
Mas também se questiona se faz ainda sentido exigir-se esta tradição
jurídica, é preciso repensar a utilidade destes contratos em contratos
consensuais.
o Antunes Varela: assim seriam nulos, mas admite-se a conversão
em contratos-promessa.
o Outra parte da doutrina: é preciso pensar caso a caso, a entrega da
coisa desempenha alguma função social e juridicamente
relevante? É preciso ir à ratio desta entrega, se não podem-se
fazer contratos atípicos (depósito, mútuo e comodato), se sim não
se pode excluir a entrega da coisa (penhor – uma pessoa dá a
outrem uma coisa móvel como garantia real do cumprimento de uma
obrigação, é uma garantia de terceiros no comércio jurídico [≠
penhora, diligência processual, penhoram-se bem do devedor para
cumprir uma ação por dívidas pelo Tribunal]; doação – por escrito ou
com a entrega da coisa, serve para evitar dúvidas quanto à
verdadeira titularidade da coisa; e parceria pecuária – visa permitir
uma parceria em que uma das pessoas tem animais e pede à outra
que os guarde, a entrega da coisa é essencial do negócio jurídico).
3. Artigo 408º: a constituição ou transferência de coisa certa e determinada dá-
se por mero efeito da declaração de vontade (a transferência de propriedade dá-
se no momento da celebração plena do contrato entre as partes), o direito civil
português correlaciona este artigo com o 796º nº1, res suo domino perit, o risco
transfere-se com a propriedade, ainda que não haja entrega – contrato real quoad
effectum. 7 Mas estes comportam exceções, desde logo os nºs 2 e 3 do artigo
796º e do artigo 408º o nº2 acrescenta que se transmite é um mero direito de
crédito e não real quando a coisa seja futura ou indeterminada.
Artigo 409º: as partes podem ajustar, num contrato de transferência de
propriedade, uma cláusula de reserva de propriedade. Quando se trate de uma
coisa móvel não registável:

7
Pergunta frequente em sede de PROVA ORAL: com base neste princípio classificar determinado
contrato como consensual ou real, v.g. o contrato de compra e venda é consensual se não
prossupuser a entrega da coisa, mas quanto aos efeitos é de eficácia real, pois constitui-se um
direito real (e não um mero direito de crédito) – os direitos reais podem ser de gozo (poder jurídico
que permite ao titular usar e fruir desse mesmo objeto – transferência do direito de propriedade),
garantia (permite ao titular fazer-se pagar pelo valor de determinado crédito, sobre uma determinada
coisa, em relação a outros credores do seu devedor) ou aquisição (permite ao seu titular adquirir,
por mera manifestação da sua vontade, um outro direito real de gozo) – mas pode-se pedir para dar
um exemplo de um contrato real quanto aos efeitos e à formação (há 1\2 hipótese de acertar
[3\6]): doação (direito real de gozo), penhor (direito real de garantia) e mútuo (artigo 1144º - direito
real de gozo).

Rebeca Louro - 2018 15


• Antunes Varela, Almeda Costa, Menezes Leitão (maioria da doutrina):
cláusula de reserva de propriedade é sempre oponível a terceiros, quer
estejam de boa ou má fé (conheçam ou não da cláusula), interpretação
do artigo 409º nº2 à contrário sensu, decorre da mera convenção entre
os contraentes.
• Romano Martinez (minoria da doutrina): põe em causa direitos
adquiridos por terceiros, previsto no artigo 435º, só é oponível se os
terceiros que estiverem de má fé.
• João Tiago e a doutrina moderna: quanto aos direitos adquiridos do
artigo 435º não é assim, pois não foram adquiridos, a coisa transferida
assim o foi por parte de uma pessoa sem legitimidade para o fazer
(892º). Segundo o artigo 1301º a posse não vale título, este princípio
não é admitido em Portugal, mas em ordenamentos como o Francês
quem, de boa fé, adquirir a posse de coisa móvel não registável, adquire
automaticamente a sua propriedade. A cláusula é sempre oponível a
terceiros quer estejam de boa ou má fé, no princípio da causalidade só
se transacionam validamente bens ao abrigo de causas válidas, lícitas.

o Exceção: artigo 1325º, quando duas coisas diferentes se unem e


incorporam uma na outra, há uma aquisição do direito de
propriedade por parte dos terceiros (ex.: dono do prédio negoceia
com empresa sobre o elevador, entretanto já vendeu os andares, até
que um dia os habitantes chegam e não há elevador, pois o dono do
prédio deixou de pagar pelo elevador, neste caso aplica-se o regime
da acessão).

Princípio da Boa Fé

è A boa é estruturante nesta matéria dos contratos das obrigações, ou seja, desde o
momento em que estão para nascer, passando pela fase em que nascem e crescem,
até à sua morte, estão sempre sujeitos sempre ao princípio cardinal da boa fé.
Acompanha todas as fases da formação, execução e cumprimento (até quando à
lacunas – artigo 239º).
è A boa fé é um conceito que comporta diferentes sentidos, mas só o último, a enunciar, é
que é relevante para esta matéria:
o Subjetivo: relacionado com o estado de alma:
§ Psicológico: centra a análise no estado psicológico do agente, há um mero
desconhecimento.
§ Ético: não basta alegar e provar o desconhecimento, é preciso que seja
diligente nesse conhecimento.
o Objetivo: regras de conduta (artigos 227º, 762º, 239º).
è Transparece, dá sinais de si, em diferentes fases da vida da obrigação, impondo
deveres de zelo, diligência, informação, lealdade, proteção, durante as preliminares, ou
seja, durante a negociação. É uma realidade que pauta as relações e o tipo de
condutas que podem ser lesivas, impondo sanções. É ainda uma matéria infindável.

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è Assume uma relevância extremamente importante no domínio pré-contratual – artigo
227º. Diz que incorre em culpa in contrahendo e age de má fé a pessoa que:
o Não se abstiver e incentivar à celebração de um contrato nulo.
§ Interesse contratual negativo.
o Propuser a celebração de um contrato válido e eficaz, mas, no decurso da
celebração desse contrato, violar deveres laterais de conduta.
§ Interesse contratual positivo, é discutível, mas tem-se admitido.
o Romper injustificadamente negociações que venha a ter para a conclusão do
negócio jurídico.
§ Interesse contratual negativo.
§ Interesse contratual positivo nos casos em que há uma rutura
injustificada ou súbita das negociações e há uma recusa de formalização
de um contrato já existente.
• Rutura das negociações apenas não é ilegitima, pois não frustra ou viola
a tutela de confiança, ganha a autonomia privada.
è A responsabilidade pré-contratual pode resultar em indemnização pelo interesse
contratual:
o Negativo: colocar o lesado na situação em que estaria se não tivesse negociado
ou celebrado o contrato, acreditado, sem culpa, na atuação de boa fé da
contraparte – dano de confiança.
§ Dano emergente: afetação de valores já existentes na titularidade do
lesado.
§ Lucros cessantes: vantagens que deixou de auferir, ou porque não
celebrou outros negócios que dependiam da conclusão do que se frustrou, ou
porque a expectativa deste desviou a sua atividade de outras direções
possíveis.
o Positivo: repor a situação em que estaria se o contrato tivesse sido celebrado e
plena e integralmente cumprido – dano cumprimento.
è Há uma articulação difícil do artigo 227º (moral) e 253º nº2 (erro por dolo, dolus malus,
mas o dolo não é ilícito quando seja dolus bonus [faz parte do dia-a-dia], é tolerado,
ainda assim, a boa fé não o admite) – a esfera de ação começa onde termina a doo erro
por dolus bonus, ou seja, a culpa in contrahendo não se apoia em factos que se
qualificam como dolo tolerado.

Princípio da Força Vinculativa dos Contratos

è Artigo 406º contém dois subprincípios.


è (Sub)Princípio da estabilidade dos contratos no nº1: um contrato, uma vez
celebrado, deve ser cumprido integralmente – intangibilidade e irretratabilidade –, não
pode fazer cessar a sua vigência, a não ser nos casos especialmente previstos na lei ou
por acordo das partes.
o Quando se diz que deve ser pontualmente cumprido significa a tempo e horas,
mais do que isso, tem que ser cumprido ponto por ponto – pacta sunt servanda
(contratos são os pactos do direito privado), só se pode extinguir por uma de duas
situações, sob pena de violar o direito do credor ou que este perca o seu interesse
nele.

Rebeca Louro - 2018 17


o Pode apenas extinguir-se:
§ Pelas partes por mútuo acordo;
§ Nos casos e termos previstos na lei (o contrato nasce de forma válida e
eficaz, por isso tem que ser cumprido enquanto está em vigência8):9
• Revogação: celebração entre as partes de um acordo que visa pôr termo
ao acordo que inicialmente celebraram. É sempre um negócio bilateral e
os seus efeitos produzem-se ex nunc, isto é, apenas para o futuro.
• Resolução: pela sua importância prática é objeto de regulamentação no
Código Civil no artigo 432º e seguintes – emissão de uma declaração
negocial unilateral e recetícia ou recipienda, que visa pôr termo a um
contrato em vigor, destruindo todos os efeitos produzidos. É unilateral e
recetícia, os seus efeitos são retroativos, ex tunc.
o A resolução ilícita corresponde ao incumprimento contratual,
incorrendo, a parte que resolveu, em responsabilidade contratual,
que poderá fazer renascer o contrato, embora resolvido, mas mais
uma vez, ilicitamente, devido ao regime da reconstituição in natura –
artigo 436º, há quem interprete assim.
o Condição Resolutiva Tácita: artigo 801º nº2, tacitamente existe em
todos os contratos bilaterais sinalagmáticos, se uma das partes
incumprir a sua obrigação, a outra tem sempre direito de
resolver o contrato, embora não esteja nele previsto.
• Caducidade: sempre que se verifique um facto que gere
automaticamente a cessação do negócio jurídico (morte [todos os
contratos que tenham natureza pessoal], verificação de um termo). Não
pressupõe manifestação de vontade e nenhuma das partes e tem eficácia
ex nunc.
• Denúncia: forma específica de fazer cessara vigência de contratos que
têm características especiais, ou seja, não se podem denunciar quaisquer
contratos, só aqueles que têm execução prolongada e continuada no
tempo (não pode denunciar um contrato de compra e venda). Declaração
unilateral recetícia, uma das partes comunica a outra a intenção de
renovar o contrato a partir de determinada data, não tem que estar
previsto no contrato o direito de denúnciar.10 Questiona-se se não terá
que haver um aviso prévio razoável – tem-se entendido que quando já
esteja a ser exercido há mais de um ano, tem que avisar com três
meses de antecedência (ex.: contratos de arrendamento, de distribuição
comercial, parcerias comerciais). É unilateral, recetícia e tem eficácia
ex nunc.
§ Há ainda uma forma de cessação em casos excecionais, não se pode deixar
de fora a figura da alteração anormal das circunstâncias, artigo 437º –
sempre que determinado contrato é celebrado o ordenamento jurídico não
pode deixar de atribuir a uma eventual modificação do estado das coisas

8
Há casos em que os contratos padecem de um vício genético, aplicando-se as invalidades –
nulidade e anulabilidade, destroem, com caráter retroativo os efeitos produzidos pelos contratos.
9
Existem situações, que resultam de uma tradição jurídica, que utilizam de uma forma incorreta estas
figuras.
10
MOTA PINTO, não há vinculos contratuais perpétuos, apenas o casamento, tendencialmente.

Rebeca Louro - 2018 18


existentes, de facto, à data da celebração daquele contrato, não pode deixar
de se questionar, ou seja, o ordenamento jurídico não pode deixar de ser
indiferente à alteração do status quo (estado de coisas). Há várias teorias:
• Cláusula rebus sic stantibus: todos os contratos são celebrados no
pressuposto da manutenção de um conjunto de factos e situações à
data da celebração, sendo que, por uma alteração, deve o contrato ser
passível de supressão pela parte lesada.
• Imprevisão: a sua base assenta na teoria supra, mas procura limitar a
possibilidade de resolução de contrato, logo que se verifique a alteração
dos factos e situação existente, só seria possível quando a alteração
dos factos e situações fosse imprevisível.
• Pressuposição: todo e qualquer contrato é celebrado com base numa
condição embrionária, isto é, tácita, o contrato só se mantém válido, se
um conjunto de circunstâncias pressupostas, ao tempo da
conclusão do negócio jurídico, se mantiverem após a sua
execução.11
o Crítica: ambas as partes achavam relevante de comum acordo ou só
uma achava relevante e a outra apenas conhecia ou devia conhecer?
• Base do acordo (Oertmann): só será possível quando a tal
pressuposição revestir as seguintes características:
o Factos que tivessem sido absolutamente essenciais e vitais para
ambas as partes contratarem;
o Respeitasse a factos futuros que dissessem apenas e só respeito a
um deles, mas que a outra parte não pudesse deixar de aceitar:
§ Ou porque foi comunicada e aceitou expressamente;
§ Ou porque a outra parte não pudesse deixar de achar
relevante e não pudesse deixar de aceitar à luz do princípio
da boa fé;
• Manuel de Andrade: a pressuposição seria relevante, não só nas
circunstâncias referidas no ponto anterior, mas também nos casos
relativos a factos respeitantes a uma das partes e a outra parte à data
não tinha que aceitar à data da celebração, mas que mais tarde pode
a boa fé impor que o aceite.
Na prática e no direito positivo encontra-se entre os artigos 437º a 439º, para
se aplicar têm que estra preenchidos os pressupostos:
1. Modificação da base do negócio12.
2. As circunstâncias sofreram uma alteração anormal, isto é, que não se
pode aceitar como fazendo parte da execução normal do contrato –

11
Erro in futuro, determinados factos existem e manter-se-ão em vigor, mas não se verificam no
futuro ≠ Erro, achar que existem determinados factos, mas simplesmente não existem.
12
Circunstâncias factuais essenciais quer para ambas as partes; quer as circunstâncias relevantes
apenas para uma das partes, mas que a outra não pode deixar de aceitar porque: assim lhe foi
comunicado e ela aceitou, não podia deixar de aceitar se lhe fosse comunicado à luz do
princípio da boa fé, não pode deixar de aceitar à luz do mesmo princípio da boa fé por força das
circunstâncias posteriores à celebração do negócio.

Rebeca Louro - 2018 19


o critério da anormalidade é mais amplo que o critério da
imprevisibilidade.13
3. Tem que haver um dano, a lei utiliza a expressão “parte lesada”. 14 15
4. A manutenção do contrato tal como foi celebrado, não se admitir a sua
resolução ou modificação violaria os princípios da boa fé.
5. Não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato: se no ponto
de vista normal de execução, comportava aquele facto.16
6. Não pode pedir a resolução, com base neste artigo, não pode
prevalecer-se deste regime benéfico para si a parte que na data estava
em mora– artigo 438º.
A parte lesada pode resolver o contrato ou pedir a sua modificação
sobre juízos de equidade.
É preciso articular com o regime do risco – res suo domino perit – o
artigo 796º (contratos com eficácia real apenas) derroga, prevalece,
sempre sobre este artigo 437º, que é de rara aplicação.
Este artigo tem aplicação em alturas de grande transformação da
sociedade.
Só pode ser aplicada relativamente a contratos continuados e
prolongados no tempo, isto é, não se aplica a contratos de execução
imediata, ainda não executados, bilaterais. Bilaterais imperfeitos e
unilaterais.

è (Sub)Princípio da relatividade dos contratos no nº2: nenhum terceiro pode ficar


obrigado perante obrigações assumidas por outros que não ele próprio, da
mesma maneira que nenhuma das partes do contrato pode obrigar um terceiro a
obrigações assumidas por elas próprias. Pretensos desvios do (sub)princípio da
relatividade dos contratos:
o Contrato a favor de terceiro:
§ Artigo 443º e seguintes.
§ É um acordo de vontades bilateral composto pelo:

13
ALMEIDA COSTA e ANTUNES VARELA (tentaram criar uma outra via, mas não foi adotada):
em certos casos (ex.: expropriações selvagens, ocupações de imóveis, movimentos agrícolas mais
selvagens [de unidades coletivas de produção]) o risco (796º) nunca poderia levar a melhor do
437º. É preciso fazer uma distinção entre risco normal de perda ou deterioração da coisa; e risco
anormal, perda ou deterioração resultado das situações mencionadas – nestes casos não devia
prevalecer.
14
A excessiva onerosidade ou agravamento da possibilidade de cumprimento não constitui
em si ó uma razão para o não cumprimento, não permite a exoneração nem a modificação.
15
Há situações (circunstâncias subjetivas de uma das partes), de tal forma graves e inesperadas,
que podem levar à aplicação do artigo 437º (ex.: pianista convidado para tocar no CBO, tem a sala
esgotada, mas segundos antes de atuar descobre que morreu um familiar).
16
Houve duas alturas em Portugal em que se invocou este artigo constantemente: 1975 e anos
seguintes (descolonização, mudança de regime) e 2007 e anos seguintes (crise mundial do sub-
prime). Nesta última foram suscitadas muitas situações semelhantes de devedores e credores devido
à crise, relativamente aos bancos e os empréstismos, entre outros direitos de crédito dos bancos,
não podem estes estar dependentes da atividade económica do investidor, pois não são
sócios. Da atividade económica faz parte o risco, os lucros são a sua compensação, mas a atividade
não é constante, move-se por ciclos económicos, muito embora a crise de 2008 não tenha sido uma
crise qualquer (a TROIKA entrou em Portugal), foi uma crise sem paralelo – equiparável ao crash da
bolsa de 1929.

Rebeca Louro - 2018 20


• Promissário: beneficiário da promessa;
• Promitente: quem promete;
§ Há um terceiro, que não é parte do contrato, é um estranho ao contrato.
§ A pessoa que tinha direito à prestação a ser efetivada a favor de terceiro
(promissário), aceita desviar esse direito a favor desse mesmo terceiro.
Contudo, tem que haver uma intenção de conferir ao terceiro esse mesmo
direito, as partes agem com esse intuito claro de lhe conferir esse direito de
exigir o cumprimento da promessa.
§ O terceiro não tem que aceitar a prestação, segundo o artigo 444º, mas
mesmo que aceite nunca se torna parte no contrato, ainda assim é-lhe
benéfico aceitar, pois, de acordo com o artigo 448º, garante a não
revogação dessa promessa – aceitar a prestação é diferente de aceitar o
contrato.
§ A aceitação ou rejeição tem que ser sempre feita ao promitente e também
ao promissário, pois, em última análise, o titular em termos económicos
daquele direito é o promissário.
§ Para além do promissário (em última análise o titular do direito a ser
prestado), também o terceiro tem direito a exigir o cumprimento da
promessa.
§ Pode haver uma promessa de exoneração ou liberatória de uma dívida,
nos termos dos artigos 443º nº2 e 444º nº3, nestes casos só ao
promissário é lícito exigir o cumprimento da promessa ou dívida a ser
prestada ao terceiro, de quem o promissário é devedor (artigo 863º o perdão
das dívidas exige a autorização do devedor, por uma questão de honra
própria, pressupõe sempre um acordo entre as partes).
§ Figuras afins:
• Contrato a favor de terceiro impróprio ou falso: artigo 770º a), trata-
se de uma mera liberalidade, confere a um terceiro um benefício, mas
não há intenção de lhe conferir o direito de exigir o cumprimento da
promessa, trata-se de uma mera autorização de prestação a um
terceiro, este não atua como autor da prestação (ex.: um rapaz pede a
uma florista que entregue uma rosa à namorada em casa dela, esta
última não pode exigir a entrega da rosa à florista).
• Contrato com eficácia de proteção de direitos de terceiros, acresce à
responsabilidade extracontratual que existiria sempre, mesmo que não
existisse a primeira figura. A desenvolver infra (ex.: o senhorio arrenda
uma casa a um senhor, cujo agregado familiar é composto pela mulher,
filhos e empregada doméstica, há uma infiltração na casa e cai um
bocado de estuque em cima da cabeça da empregada. Quem tinha o
direito de exigir que o imóvel estivesse em condições era o marido e não
a empregada, mas há situações em que há deveres laterais, para além
da responsabilidade extracontratual). Retira-se esta figura da relação
jurídica obrigacional complexa.17
o Contrato de pessoa a nomear:
§ Artigo 452º e seguintes.

17
ORAL para subir notas quando está a correr bem.

Rebeca Louro - 2018 21


§ Não se trata de um verdadeiro desvio ao princípio da relatividade dos
contratos, pois o terceiro adquire os direitos e obrigações a partir da
celebração do contrato, nos termos do artigo 453º, a declaração de
aceitação tem eficácia retroativa, isto é, tudo se passa como se o contrato
tivesse sido celebrado de início com o terceiro, logo, não é um verdadeiro
desvio – artigo 455º.18
§ Qualquer parte reserva um direito de indicar um terceiro que venha a
assumir as obrigações e a adquirir os direitos dessa parte que o
nomeou. Esta admissibilidade tem limites, não pode haver em contratos
pessoais (ex.: nomear um terceiro para celebrar o contrato de casamento por
ele).
§ A declaração de nomeação é feita mediante declaração por escrito, dentro
de um prazo estipulado pelas partes ou, na falta dele, dentro de cinco dias.
Uma vez aceite tem que ratificar o contrato, para aceitar o contrato –
artigo 453º. A aceitação tem que seguir a mesma forma exigida ao contrato.
o Responsabilidade pós-contratual:
§ Eficácia posterior das obrigações, quando já tenha sido celebrado e
executado o contrato, quanto às prestações principais.
§ A completa satisfação dos interesses das partes pode envolver que
esses deveres principais sejam acompanhados pode deveres
secundários e por devers laterais – relação obrigacional complexa.
§ Pode surgir um dever de indemnização derivado da conduta de uma das
partes depois da extinção do contrato. Impõe-se aos contraentes o dever
de se abster, de comportamentos suscetíveis de colocar em perigo ou
prejudicar o fim do contrato.
§ Há algum fundamento em face do nosso direito para esta responsabilidade,
embora não haja consagração expressa: artigo 239º relativo à integração do
negócio jurídico e 762º nº2, o princípio da boa fé assegura um amplo suporte
ao instituto.

Contrato-Promessa:

è Artigo 410º e seguintes.


è Acordo bilateral de vontades, nos termos do qual uma ou ambas as partes se
comprometem a celebrar um negócio jurídico ou um contrato, posteriormente.
Embora nada obste a que tenha por objeto a realização de um negócio jurídico
unilateral, salvo proibição na lei, nem é destituído de interesse que possa ter por objeto
um outro contrato-promessa.
è São contratos preliminares ou preparatórios, faz parte de um conjunto de tipos
negociais, que precedem a celebração de um negócio jurídico ou contrato, que
venham a ser celebrados posteriormente.
è O pacto de preferência também antecede a celebração de um outro negócio. Estes dois
estão regulados no Código Civil, a sua tipicidade social justificou a sua tipicidade legal,
mas há outros, que, por ventura, não estão:

18
ORAL pergunta frequente.

Rebeca Louro - 2018 22


o Umbrella Agreements – acordo quadro através do qual se preparam outros
negócios jurídicos posteriores, cuja operação negocial é complexa. Contratos que
se sucedem com uma determinada lógica e dependência, cuja metodologia e lógica
será estabelecida previamente à celebração do contrato definitivo. Isto é, acordo
quadro ou de princípios em que se estabelecem interesses e a metodologia de
trabalho, os negócios ou contratos a celebrar com determinado objetivo. Por
exemplo, acordo de confidencialidade, seguido de um MOU (memorandum of
understanding), um contrato-promessa de compra e venda e a execução da compra
e venda de ações.
è O contrato-promessa faz parte de uma família maior de contratos preparatórios ou
preliminares que, por alguma razão não conseguem ou não podem celebrar de imediato
o contrato definitivo, por via da sua celebração e estabelecimento de um programa
contratual relativamente rígido (datas e objetivos), faz com que a proteção das partes
seja mais forte do que a que resultaria apenas pela invocação do princípio da boa fé ao
nível do 227º.

Modalidades do Contrato-Promessa:

Eficácia dos Contratos-Promessa:

è Eficácia real: decorrem direitos e deveres reais para as partes que se obrigaram, se
estiverem preenchidos os requisitos do artigo 413º:
§ Tem por objeto mediato imóveis ou móveis sujeitos a registo;
§ Celebrado por escritura pública ou documento particular autenticado;
§ Expressamente indicar no contrato a intenção de celebrarem este contrato
com esta mesma eficácia;
§ Quando inscreverem o contrato-promessa no registo.
o Esta onerosidade das partes contraentes visa protegê-las de uma eventual violação
da promessa, pois é oponível erga omnes, isto é, determina a ineficácia dos
atos realizados em sua violação. Numa palavra, um direito de crédito assistido de
eficácia absoluta.
o Concretizando, relativamente a confrontos com potenciais direitos adquiridos por
terceiros, o primeiro direito real constituído prevalece, pois ambos têm eficácia
real. Sendo atribuida eficácia real e em caso de alienação do objeto do contrato-
promessa pelo promitente vendedor a um terceiro, surge na esfera jurídica do
promitente comprador um direito real de aquisição, conferindo-lhe um direito
de poder exigir ao promitente vendedor o cumprimento da promessa, que
pode fazer valer sobre todos os direitos reais ou pessoais referentes à coisa
de terceiros, desde que estes não se encontrem registados antes do registo do
contrato-promessa. Logo, a alienação não impede a execução específica do
contrato-promessa, do artigo 830º, pois a eficácia real acarreta necessariamente
a possibilidade de realização coativa.
è Eficácia meramente obrigacional: dele apenas decorrem direitos e deveres de
natureza obrigacional para as partes.
o Relativamente a confrontos com potenciais direitos adquiridos por terceiros, de

Rebeca Louro - 2018 23


acordo com o 408º e 1317º (princípio do consensualismo, a propriedade transferiu-
se para a esfera jurídica do terceiro), o direito real do terceiro prevalece sobre o
direito de crédito da parte, cujo direito referido foi violado. Claro que, para quem
assim o admita e dentro dos requisitos em concreto, poder-se-á aplicar o regime
da eficácia externa das obrigações, isto é, para além de pedir indemnização à
parte violadora, pelo artigo 562º e seguintes (indemnização pelos danos sofridos,
calculada em termos gerais) ou até pelo 442º e 881º (fixada à priori a título de sinal
ou pena convencional), poderá pedir indemnização ao terceiro, ao abrigo do artigo
483º.
è Quem pode ser sujeito de uma ação de execução específica? Como é que a parte que
vê o seu direito violado (B) poderá agir, como é que o direito irá caducar ou como
poderá essa parte fazer prevalecer o seu direito? Com base numa:
o Ação judicial atípica (Tese Maioritária [Antunes Varela, Almeida Costa] –
Clássica): o meio judicial concreto que permite ao B fazer sua a coisa entregue a C
(terceiro) – ação de execução específica contra o A (parte incumpridora) e o C
cumulada com uma ação de nulidade por venda de bens alheios da compra e
venda do A ao C.
§ Falhas:
• Quanto à execução específica movida ao A, tem pouco interesse, pois a
coisa já não se encontra na esfera jurídica de A quando à data em
que a ação é intentada, já vendeu a coisa, bem ou mal, a C, já há
incumprimento definitivo. Se a ação fosse julgada procedente o que
havia era uma sanção de uma venda de bens alheios.
• Quanto à nulidade que se cumula com a ação de execução específica por
venda de bens alheios, bem ou mal, quando A vendeu a coisa ao C, o A
ainda era o proprietário, não estava a vender uma coisa alheia, pois o
contrato-promessa com eficácia real não transmite a propriedade da coisa
do prometente alienante para o promitente adquirente, portanto, não há
nenhuma venda de bens alheios.
o Ação de execução específica (Oliveira Ascensão): o B deve intentar uma ação
de execução específica contra C.
§ Falhas: já não havia problemas de legitimidade, pois à data em que a ação é
intentada o proprietário da coisa indevidamente alienada era o terceiro, que
ilegitimamente a tinha recebido. Mas a ação de execução específica
pressupõe que alguém se tenha obrigado perante outrem a celebrar um
certo contrato, o C nunca se comprometeu a vender o que quer que fosse ao
B. Quem se obrigou a cumprir foi A, não o C, logo, este último não pode ser
réu de uma ação de execução específica.
o Ação de reivindicação (Menezes Cordeiro): o meio jurídico processual mais apto
é uma ação de reivindicação, é a ação paradigmática de defesa do direito de
propriedade e dos direitos reais – artigo 1311º. O titular de um direito real pode
reivindicar o seu direito diante qualquer terceiro que, ilegitimamente, detenha ou
possua a coisa sobre a qual o direito incide, exigindo que lhe seja entregue a
coisa, intentanto uma ação.
§ Falhas: o artigo 1311º fala em proprietário (titular do direito real, pois o regime
geral dos Direitos Reais está feito a respeito do direito de propriedade). Só faz
sentido se o C estiver na posse ou detiver a coisa, não resolve o problema:

Rebeca Louro - 2018 24


quando A promete vender a B, incumpre e A vende a C, sem ainda ter
entregue a coisa, segundo o princípio do consensualismo o direito ja passou
para essa esfera jurídica – a ação de reivindicação não faz sentido, pois o
terceiro não possui nem detém a coisa.
• Mesmo quando C não recebe a coisa, ele já é possuidor (possuir não
pressupõe, necessariamente, o controlo material sobre ela, pode-se
possuir uma coisa por intermédio de outra pessoa ≠ deter a coisa não
implica possuí-la, pode-se deter a coisa materialmente, mas não ser o
proprietário).
§ Segundo problema: a ação de reivindicação é uma ação que não tem
natureza constitutiva, tem natureza meramente declarativa, ou seja, quando o
Tribunal profere uma sentença numa ação de reivindicação, limita-se a
declarar que alguém é titular de um direito real e que há outra pessoa
que está a lesar esse direito – não resolve o problema prático de fazer
com que a coisa, quando está na posse de terceiro, seja entregue ao próprio
titular.
o Menezes Leitão vem dizer que nenhuma destas três teses é satisfatória: o meio
processual ao abrigo do qual o próprio promitente fiél vai fazer sua a coisa é uma
ação intentada em regime de litisconsórcio necessário passivo, atípica, com
natureza constitutiva.
§ Ação intentada em regime de litisconsórcio necessário passivo: tem que ter
obrigatoriamente dois réus.
§ Atípica: características das várias ações, um misto de cada uma das ações.
§ Natureza constitutiva: o promitente fiél tem que pedir concretamente ao
Tribunal que, não só declare que seja titular do direito, mas que
introduza, por via de uma sentença, uma modificação da ordem jurídica,
ordenando e reconhecendo essa mesma titularidade.

Contratos-Promessa Unilaterais e Bilaterais:

è Contratos-promessa unilaterais: decorre apenas a obrigação para uma das partes,


de celebrar o contrato prometido
o Relativamente a estes, se nada se fixar, o Tribunal, a pedido do promitente, poderá
fixar um prazo para o exercício do direito, findo o qual este caducará (não há
vinculos vitalícios) – artigo 411º.
è Contrato-promessa bilateral: ambas estão reciprocamente obrigadas à celebração
do contrato prometido.
è A forma do contrato-promessa varia consoante seja unilateral ou bilateral – 410º:
o Unilateral: só a parte que se obriga é que está obrigada a cumprir as formalidades.
o Bilateral: ambas se obrigam às formalidades.
è Desvio importante ao princípio da liberdade negocial, há uma autolimitação. É uma
forma grave de limitar essa liberdade19, é uma forma bem mais grave que o pacto de
preferência.20

19
Pergunta frequente de Exame ou Oral.

Rebeca Louro - 2018 25


Regime Jurídico do Contrato-Promessa:

è Princípio da equiparação, segundo o artigo 410º nº1, ou seja, aplicam-se as regras


do contrato prometido, mas comporta duas exceções21:
o Forma: não está sujeito à mesma forma do contrato definitivo, isto é, a regra é a de
que há liberdade de forma.
§ 410º nº2: quando o objeto do contrato definitivo apenas seja válido por
documento autentico ou particular, o contrato-promessa terá que ser reduzido
a escrito e assinado pelos dois promitentes ou só por um, consoante seja
bilateral ou unilateral, ou seja, pelas partes que se vinculam (ex.: se forem
uns brincos ou um automóvel há liberdade de forma; se for um terreno é só
sujeito a documento particular assinado pelas partes que se vinculam) –
aplica-se apenas a contratos-promessa de prédios rústicos (terrenos,
herdades, descampados).
§ 410º nº3: exceção ao 410º nº2, pois exige requisitos de forma adicionais
quando se trate de um contrato-promessa que tenha por objeto um contrato
oneroso e implique de aquisição ou transferência de direitos reais sobre
prédios urbanos (edifícios, andares, armazéns, prédios [já construídos, em
papel ou em construção] – conjunto ou unidade imobiliária). O documento
particular com assinaturas consoante seja unilateral ou bilateral, tem que
conter:
• O reconhecimento das assinaturas;
• A certificação da existência da licença de construção ou utilização da
coisa22;
o A ausência deste último pode sanar-se mediante prova, na
declaração de ação de nulidade, de que essa licença existia
efetivamente à data da celebração do contrato-promessa ou foi,
entretanto, concedida.
Se algum dos requisitos não for preenchido o contrato é nulo, mas esta
nulidade só pode ser invocada pelo promitente adquirente, exceto se
este agir culposamente gerando o inadimplemento do contrato, nestes
casos pode ser invocado pelo promitente alienante – nulidade suis generis.
o Disposições que, pela sua natureza própria, não se devam considerar
extensíveis ao contrato-promessa: o contrato-promessa tem uma natureza
específica (eficácia provisória ou preliminar), diferente do contrato prometido
(eficácia definitiva). Exemplos:
§ Artigo 892º: não se pode aplicar, não faz sentido. Pode haver um contrato-
promessa sobre coisa alheia, pois nada garante que no dia da celebração do
contrato definitivo o promitente não seja proprietário dessa mesma coisa.

20
É um contrato unilateral, cuja obrigatoriedade de dar preferência só existe se se reunirem duas
condições: à tomada de decisão de contratar e à apresentação, por parte do titular do direito, de uma
proposta que iguale a proposta apresentada por de terceiros.
21
Semelhante ao regime jurídico das obrigações naturais.
22
Estas exigências visam, principalmente, estabelecer um controlo notarial, a fim de prevenir a
negociação de construções e edificações clandestinas, para a proteção de futuros adquirentes,
havendo também uma afloração do interesse público.

Rebeca Louro - 2018 26


Contratos de alienação: não se aplicam os preceitos relativos à transferência
§
de propriedade, não se colocando o problema do risco.
§ Artigo 1682º-A nº2: mesmo em separação de bens não se pode vender ou
arrendar a casa sem consentimento do outro cônjuge – não se aplica ao
contrato-promessa, pode prometer sem o consentimento, poderá adquirir o
consentimento mais tarde, a propriedade não é transmitida de imediato.23
• Contudo, se à data da celebração do contrato prometido o cônjuge não
tiver ainda consentido, o tribunal não pode julgar a ação de
execução específica procedente, uma vez que estaria a substituir-se a
um terceiro estranho ao contrato-promessa.
è Qual é a validade do contrato-promessa bilateral quando assinado apenas por uma
das partes? Houve uma grande discussão na doutrina:
1. O contrato-promessa era válido.
2. O contrato-promessa era nulo.
3. O contrato-promessa era nulo, mas podia transformar-se num contrato
promessa unilateral, através de instrumentos que visam aproveitar os negócios
jurídicos nulos ou anuláveis (em qualquer um deles, exige-e a integração do
contato à luz dos sitames da boa fé – 239º):
§ Redução (Almeida Costa): é nulo, mas pode reduzir-se de promessa
bilateral a promessa unilateral – artigo 292º, a lei presume que o negócio
se reduz a não ser que a parte prejudicada com a redução alegar e
provar que, se tivesse antevisto a possibilidade da redução, não queria o
negócio tal qual como ficava, apenas o teria celebrado com a vinculação de
ambos, o negócio não teria sido concluído sem a parte viciada. O contrato-
promessa bilateral é a soma de dois contratos-promessas unilaterais, não são
dois contratos num só. Transforma-se logo em unilateral – ónus da prova
sobre o que pretende ver o negócio nulo, por norma o vendedor.
§ Conversão (Antunes Varela): é nulo, mas pode salvar-se através da
conversão – 293º, o negócio jurídico já está morto, mas se uma das partes
alegar e provar que, se tivessem antevisto a conversão, ainda teriam
querido o contrato tal como ele se pode salvar, faz-se uma leitura do
contato-promessa diferente, para chegar a um resultado semelhante. O ónus
impende sobre quem quer salvar o contrato, por norma, o promitente
comprador (parte mais fraca historicamente).
• Há um Acórdão (1989) que viria a resolver o problema, mas deixa tudo
por dizer:
o João Tiago: o Tribunal recorreu à conversão quando fala em “pode
transformar-se num contrato-promessa unilateral”, isto é, enquanto
não se provar a vontade hipotética conjetural, no sentido da
conversão, o contrato está morto. A tese da redução parte do
pressuposto erróneo de que os contratos-promessa bilaterais são
compostos por dois unilaterais.
o Almeida Costa: tutela do promitente adquirente é melhor feita
pela redução – contexto ecónomico e específico determinado, dos
anos 80, o promitente é a parte mais débil. Se a assinatura que
estiver a falhar for a do promitente comprador, não está obrigado,

23
Exemplo que sai muito nas avaliações.

Rebeca Louro - 2018 27


mas o promitente vendedor está amarrado. Se faltar a assinatura do
promitente vendedor? Se está vinculado o comprador, como é que o
protege? O nosso país estava subdesenvolvido, para contrariar essa
força apostou-se na construção, mas quando há construção em
excesso há inflação, o poder de compra diminui e, por isso, o
promitente comprador é a parte mais fraca, que quer comprar
mesmo, quer cumprir, quem queria incumprir era o vendedor, pois o
dinheiro não valia nada e estava disposto a pagar uma simples
indemnização.
è É preciso regressar ao artigo 410º nº3 e interpretá-lo.
o Prevê uma nulidade suis generis, atípica, mais semelhante com o regime da
anulabilidade. Não se aplica a regra da nulidade de apenas poder ser invocada
pelo promitente adquirente (nos anos 80, hoje a parte mais débil é o promitente
vendedor), a não ser que tenha sido o adquirente a impedir culposamente,
nesses casos também pode ser o promitente alienante, contudo, o promitente
adquirente ao poder invocar também incorreria na figura do tu quoque.
o O Tribunal não pode, oficiosamente, declarar a nulidade do contrato-promessa de
que tenha conhecimento, nem o podem fazer terceiros interessados.
è O artigo 412º permite a livre transmissão dos direitos e obrigações que decorram do
contrato-promessa (ex.: 424º e 577º, respetivamente, sobre a cessação da posição
contratual e a cessão de créditos), exceto os que decorram do contrato-promessa que
tenha uma ligação indissolúvel à pessoa, devendo, por isso, atender-se à natureza do
contrato-promessa, à das suas prestações e à vontade real ou presumível dos
contraentes (ex.: artigo 1591º, contrato-promessa de casamento não é objeto de
execução específica).

Regime aplicável ao não cumprimento da promessa:

è Quando ocorra a declaração de nulidade ou anulabilidade do contrato prometido,


regressa-se à situação jurídica anterior à celebração do contrato-promessa.
è Havendo uma recusa injustificada da celebração do contrato definitivo:
o Expressa: um contraente declara ao outro promitente que não quer cumprir.
o Tácita: um contraente celebra um contrato incompatível com o cumprimento da
promessa.
è É preciso distinguir entre o contrato-promessa celebrado (artigo 441º):
o Com sinal: presunção de que alguém entrega a outra uma coisa por conta de
uma obrigação futura – esta presunção pode ser ilidida, 350º nº2. A importância
entregue pode ter o alcance simultâneo de sinal (441º) e de cumprimento
antecipado da obrigação futura (440º). Pode-se avançar para a resolução
havendo simples mora – situação anómala e estranha, a analisar infra.
o Sem sinal: quando não há entrega de coisa nenhuma. Só se pode avançar para a
resolução do contrato se estivermos perante uma situação de incumprimento
definitivo – 801º nº2 via 808º.
è O promitente fiel (enganado) pode fazer duas coisas:
1. Direito à execução específica do contrato – artigo 830º –, cumulável com o
direito de indemnização moratória, correspondente aos danos sofridos pelo

Rebeca Louro - 2018 28


atraso do incumprimento da promessa.
§ Pode pedir a um Tribunal Judicial que emita uma sentença, que se traduz
numa declaração negocial, que substitua a declaração negocial que a
parte incumpridora se recusa a emitir e devia emitir - nº1.
§ Em regra, é permitida, mas há casos em que não é permitida:
• Incumprimento definitivo: só faz sentido se houver ainda interesse da
parte fiel na execução do contrato-promessa (ex.: se já tivesse vendido o
imóvel a um terceiro, a ação de execução específica sendo procedente,
traduzir-se-ia na venda de bens alheios) – tem que haver situação de
simples mora.
• A própria natureza da obrigação assumida não admite a ação de
execução específica, abrange dois tipos de situações: contratos-
promessa que tenha natureza iminentemente pessoal (ex.: contrato-
promessa de casamento, trabalho, doação), embora incorram em
responsabilidade pelo incumprimento, têm a possibilidade de desistir;
contratos reais quoad constitutionem, pois o Tribunal não se pode
substituir à parte no ato material de entrega da coisa.
• A execução específica pode ser afastada pelas partes, considera-se
afastada quando haja: convenção pelas partes (cláusula negocial
expressa nesse sentido); tacitamente, nos casos em que foi celebrado,
ora com sinal (artigo 440º a 442º), ora com uma cláusula penal (que
preveja o incumprimento do contrato-promessa e quais as suas
consequências) – artigo 830º nº2 – presume-se que as partes quiseram
estas consequências para o inadimplemento, mas esta presunção é
ilidível – 350º nº2.
§ Há um caso em que, não obstante tenha sido prestado sinal, o contrato-
promessa que tenha objeto um prédio rústico (410º nº2) pode ser executado
específicamente por ação em Tribunal – quando haja eficácia real do
contrato-promessa, artigo 413º.
§ Nos casos em que o contrato-promessa se incluir nas situações do artigo 410
nº3, se o contrato-promessa tiver sido sinalizado, não significa que as
partes estejam a afastar o direito à execução específica, tutela do promitente
adquirente (contratos-promessa de compra e venda para habitação) – artigo
830º nº3.
§ Nos casos em que o contrato-promessa se incluir nas situações do artigo
410º nº3, a parte contra a qual foi intentada pode invocar a modificação do
contrato, nos termos do artigo 437º, mesmo se estiver em mora, exceciona
o artigo 438º, atenuando a severidade do sistema imperativo da execução
específica – artigo 830º nº3.
2. Direito à resolução do contrato, cumulável com a indemnização.24
§ Problema: a regra é a de que só é possível resolver o contrato quando se
verifique o incumprimento definitivo da obrigação, é preciso transformar a
mora em incumprimento definitivo – artigo 801º ex via 808º. Mas no contrato-
promessa não funciona assim. É possível resolver o contrato-promessa,

24
TESTE, EXAME ou ORAL: importante explicar qual o problema, mais importante do que explicar
toda a divergência, por questões de gestão de tempo. Mas é importante focar na doutrina também!

Rebeca Louro - 2018 29


mesmo estando em mora, se o contrato-promessa tiver sido celebrado com
sinal – 442º nº3.
§ Primeira parte da norma: “Em qualquer dos casos do número anterior” (ficar
com o sinal; sinal em dobro, indemnização atualizada), a parte não
incumpridora pode requerer a execução específica do contrato – desde
que não declare o incumprimento definitivo da obrigação, não resolva o
contrato, não acione o regime do sinal e opte por tentar por uma segunda via
o cumprimento.
§ Segunda parte da norma (PROBLEMA): se o promitente não faltoso
(promitente comprador) pedir uma indemnização atualizada, o promitente
vendedor pode opor-se ao pagamento do aumento do valor, exceção de
cumprimento do contrato-promessa – salvo o diposto no artigo 808º, o
cumprimento do contrato-promessa por oposição à indemnização atualizada
não pode ser invocado quando haja incumprimento definitivo da
obrigação de contratar. O que significa que pode resolver compaginado com
a indemnização atualizada, quando ainda só haja mora. Pode haver
resolução do contrato-promessa havendo simples mora?
§ Solução doutrinal:
• Almeida Costa: não há problema nenhum, não há nenhuma espécie
desvio a um regime normal de regra, o que acontece é que todo o
contrato-promessa sinalizado se considera celebrado com uma
condição resolutiva tácita, isto é, sempre que se dê o incumprimento do
contrato promessa e o promitente comprador peça a indemnização
atualizada, nesse momento transforma-se a mora em incumprimento
definitivo, tacitamente. No fundo, o artigo 808º tem mais uma situação
que não está no mesmo preceito, mas no 442º nº2, que é o sinal.
• Antunes Varela: há, de facto, uma anomalia, embora ele gostasse de
poder concordar (uma coisa é o que se defende enquanto direito a
constituir e direito que deveria constituir, outra é o que a lei diz). A única
forma de interpretar a norma racionalmente é apenas a de se concluir que
quando se está perante um contrato-promessa sinalizado a resolução
pode existir havendo simples mora. Importa ainda salientar que,
embora não precise, é de toda a conveniência que se transforme a
mora em incumprimento definitivo. Isto por dois motivos: certeza e
segurança jurídica, a parte está, devidamente, segura da sua posição, já
ninguém discute se a resolução seja bem feita, dar uma outra
oportunidade para cumprir, um novo prazo, contornando-se toda esta
discussão jurídica; se apenas resolver quando existir incumprimento
definitivo, o contraente incumpridor já não se pode oferecer para
cumprir a promessa.
• Menezes Leitão: tenta encontrar uma solução intermédia – há um
problema e está na parte final do artigo 442º nº3, mas esta norma só
tem um problema quando o promitente comprador pede
indemnização atualizada. É preciso distinguir: quando há sinal a
resolução depender ou não do incumprimento definitivo está, por sua vez,
dependente da escolha do promitente comprador – se optar pelo
sinal em dobro tem que se transformar a mora em incumprimento

Rebeca Louro - 2018 30


definitivo; se optar pela indemnização atualizada, basta a simples
mora.
• Antunes Varela: o artigo diz na parte inicial “Em qualquer um dos casos
do número anterior...”, não se pode dissociar o sinal em dobro da
indemnização atualizada.
• Ribeiro de Faria (contemporâneo de Antunes Varela): tenta,
reconhecendo o problema, salvar a norma. O problema está nas palavras
“salvo o disposto no artigo 808º”, mas este artigo também tem duas
partes, permite transformar a mora em incumprimento definitivo por
uma de duas vias: notificação admonitória, que é o estabelecimento de
um novo prazo para que o devedor cumpra; ou transforma-se
automaticamente a mora em incumprimento definitivo quando o não
cumprimento da obrigação num determinado prazo, que é
absolutamente essencial, torna esse novo prazo dispensável, ou seja,
quando se perde o interesse. É preciso interpretar o artigo 808º
reduzindo-o apenas a uma só dimensão, dizendo que só se aplica aos
casos da obrigação que tenha um prazo absolutamente essencial, já não
haveria nenhum problema, pois nos casos em que o contrato-promessa
não tivesse uma natureza essencial ou pessoal, seria sempre necessário
dar uma segunda oportunidade ao promitente devedor para que pudesse
cumprir. Em suma, só poderá resolver havendo mora nos casos em
que o contrato-promessa tenha uma natureza essencial ou pessoal,
pois nos casos em que se estabelece um novo prazo, sendo possível a
existência de um novo prazo, concede-se uma oportunidade para
cumprir ao promitente incumpridor, não podendo resolver, a menos que
haja incumprimento definitivo. No fundo, só admite a resolução quando
haja incumprimento definitivo
o Quanto à indemnização:
§ Se não há sinal aplica-se o 562º e seguintes, indemnização pelos danos
que forem provados, em harmonia com as regras gerais de responsabilidade
civil.
§ Se houver sinal aplica-se o 442º e seguintes:
1. Quando for executado, esse sinal é imputado no preço.
2. Se houver incumprimento pode resolver o contrato e ficar com o
sinal (se o faltoso for o promitente comprador); se o promitente faltoso
for o vendedor surgem dois direitos:
a. Sinal em dobro;
b. Indemnização atualizada (apenas quando haja tradição da
coisa): diferença do valor atual da coisa e o valor convencionado,
somando-lhe o sinal.
i. É preciso conjugar com o artigo 755º alínea f)25 – para além
da indemnização atualizada, tem o direito de retenção da

25
Discussão sobre o exato âmbito e alcance do artigo 755º nº1 f):
§ O direito de retenção funciona apenas para a indemnização atualizada ou também para
o sinal em dobro? A própria lei diz que se aplica nos termos do artigo 442º, que fala em
ambos.
§ Se o direito de retenção apenas pode ser utilizado para salvaguardar o valor que a coisa
tiver valorizado no período em que está na posse (diferença do preço atual e o acordado)

Rebeca Louro - 2018 31


coisa, como é um direito real de garantia, permite pedir a
execução da coisa e o dinheiro recebido pela coisa é
prioritariamente entregue ao detentor do direito, no que diz
respeito ao montante da indemnização que lhe é devida.
Dupla componente: função compulsória (enquanto não
pagar, não fica com a coisa) e agressiva (promove-se a
venda executiva, recebendo o que lhe pertence, se não paga a
bem, paga a mal).
3. Pode pedir a execução específica, em vez de resolver, nos casos em
que é permitida quando há sinal; o devedor pode invocar a exceção de
cumprimento do contrato-promessa, esta exceção opera e é
procedente, salvo o disposto no artigo 808º quando haja incumprimento
definitivo, isto é, só poderá invocar esta exceção se estiver em mora e
ainda não estiver em incumprimento definitivo. O legislador consagrou
uma solução em que se pode resolver havendo ainda simples mora –
discussão doutrinal supra.
4. Quando se opta pela resolução do contrato e pedir indemnização
calculada com base no sinal, o regime do sinal é autosuficiente, só pode
pedir uma das indemnizações referidas no mesmo nº4 do artigo 442º.
Numa palavra, exclui-se qualquer outra indemnização
compensatória devida pelo promitente faltoso, contudo, estas
indemnizações referidas respeitam ao incumprimento do contrato-
promessa, todavia, podem existir outras com fundamento diverso,
como é o caso das benfeitorias (artigo 1272º e 1273º).

Pacto de Preferência:

è Artigo 414º a 423º.


è É mais contrato preliminar, que antecede a elaboração dos contratos definitivos,
legalmente tipificados na ordem jurídica devido ao seu uso frequente (modelos não
consagrados na lei são socialmente tipificados, pelo seu uso frequente também).
è Pese embora o artigo 414º o pareça consagrar de forma genérica, apenas está
regulado o direito de preferência que tem por objeto um contrato de compra e venda.
Todavia não é assim, pois há pactos de preferência que têm por objeto outro tipo de
contratos. O legislador reduziu à compra e venda, porque na maior parte das vezes
tem por objeto uma compra e venda. Mas não há limitação legal quanto ao objeto do

ou todo o preço da coisa (diferença acrescida do sinal)? Conflito entre vários titulares de
direitos reais de garantia que incidam sobre a mesma coisa, a lei estabelece uma hierarquia
nos artigos 751º e 759º nº2: privilégios creditórios (Estado); titular do direito de retenção;
credor hipotecário (Bancos). Esta solução é desfavorável aos Bancos, que contrataram
advogados para conseguirem retirar do topo da hierarquia o Estado (direitos artigo 755º nº2
f), creditórios) – o artigo menciona imobiliários especiais, só vale em imóveis certos e
determinados, o Estado passa para terceiro lugar. Relativamente ao detentor do direito de
retenção, é preciso interpretar o direito de retenção, quando está em causa a indemnização
atualizada, apenas vale quanto ao valor que o imóvel tiver valorizado desde a posse do
comprador (diferença entre o preço acordado e o preço atual, o sinal não conta), a
expectativa só está tutelada em relação à valoração que se verificou na esfera patrimonial
desse credor.

Rebeca Louro - 2018 32


pacto de preferência, basta verificar o artigo 423º que diz que as disposições
anteriores são extensíveis a outros contratos com elas compatíveis, com as necessárias
adaptações.
è O pacto de preferência é um contrato, é um acordo bilateral de vontades através do
qual uma das partes se compromete a dar preferência a outra na celebração de
determinado negócio futuro. É unilateral26, pois gera obrigações apenas para uma
das partes, aquela que se compromete, perante a outra, a dar preferência na
celebração eventual de determinado negócio jurídico.27
è Distingue-se do contrato-promessa unilateral, a obrigação assumida é mais forte neste
último, pois no pacto de preferência a obrigação de dar preferência encontra-se
duplamente condicionada:
o Tomada de decisão de contratar pelo promitente.
o Igualação do titular do direito de preferência da melhor proposta de contratar
que o obrigado à promessa tenha recebido de terceiros.

Fontes dos Pactos de Preferência:

è As preferências podem ter por fonte:


o Natureza convencional: nascem de contratos (pacto de preferência ou direito
convencional de preferência).
o Natureza legal: resultam da própria lei (direito legal de preferência – não existem
pactos de preferência legal) são mais fortes, prevalecem sobre os convencionais.
§ Ex.: comproprietário, superficiário, titular do direito de servidão – frequentes
no domínio dos direitos reais, em particular, em direitos reais de gozo que se
constituem às custas da propriedade – também existem fora do domínio dos
direitos reais, v.g. o arrendatário já não é um direito real de gozo.
è Gera problemas de prevalência de direitos de preferência: quando haja diferentes
pessoas a quem tenha sido atribuido um determinado direito de preferência sobre o
mesmo objeto.
o A e B são comproprietários de uma casa, que se encontra arrendado em favor da
C, sobre a qual atribuem um direito de preferência de natureza convencional em
favor do D. Entretanto, B quer alienar a sua quota a D.
§ Há três direitos de preferência: de A, que é comproprietário, C, que é
arrendatário, e D, convencionalmente foi atribuído direito de preferência – não
podem todos preferir.
è A lei estabalece, então, no artigo 422º, uma hierarquia:

26
Pode ser atribuído mediante pagamento de um preço, não é ilícito. Aqui poder-se-ia dizer que é
bilateral, no sentido que gera obrigações para ambas as partes (pagar para ter o direito de
preferência e a obrigação normal do pacto em si), mas a obrigação de pagamento, na economia
do negócio, não é relevante, a obrigação prioritária e primária é a de celebrar o contrato definitivo –
também acontece nos contratos-promessa unilaterais (aqui tem que ser assinado pela parte que
não se compromete? Não, pois não há a assunção do dever de contratar pela parte que não se
vincula).
27
Pactos de preferência recíprocos: corresponde a uma coligação contratual, dois negócios
disntintos, que tem vida própria, que podem estar unidos entre si, por força do negócio que as
partes pretendem celebrar (acontece quando há ainda um contrato anterior a este em que se
convenciona esta coligação). As vicissitudes que possam, eventualmente, ocorrer num, podem
ocorrer no outro, e vice versa.

Rebeca Louro - 2018 33


1. Direito legal de preferência.
a. Artigo 1409º, a compropriedade é o direito legal de preferência mais forte
de todos (só existe no caso de venda a terceiros fora da comunhão); o
legislador não considera a compropriedade uma forma racional, em termos
económicos, de gerir a coisa – contribui para a deterioração, por isso não há
entre comproprietários, favorece o acrescer das quotas.
2. Direito convencional de preferência com eficácia real.
3. Direito convencional de preferência sem eficácia real.

Alcance da Vontade do Titular do Direito de Preferência:

è Pode o titular do direito de preferência renunciar ao direito de preferência, sim pode.


è Mas a renúncia a um direito de preferência de natureza legal não ocorre nos mesmos
termos, pois quando tem fonte legal tem uma razão de ser, e esta razão de ser é uma
razão de ordem pública, as partes estão mais amarradas.

Modalidades do Pacto de Preferência – artigo 421º:

è Eficácia Real: é necessário que o pacto cumpra os requisitos de forma a que o artigo
413º está sujeito.
o Vantagem na atribuição de eficácia real: se houver lugar à violação da obrigação
de dar preferência, o titular do direito pode intentar uma ação de preferência,
segundo o artigo 1410º (ação judicial legalmente tipificada), para ficar com a coisa.
è Eficácia meramente obrigacional: neste caso não prevalece em relação à alienação
a terceiros, à semelhança do contrato-promessa.
o Desvantagem: o terceiro adquire um direito real de gozo que, no confronto,
prevalece sobre o direito de crédito do titular do direito de preferência,
podendo este pedir indemnização ao obrigado à preferência e, eventualmente, para
quem aceite a eficácia externa das obrigações, ao terceiro.

Regime Jurídico aplicável ao Pacto de Preferência:

è À forma do pacto de preferência é aplicável o disposto no artigo 410º nº2, segundo o


artigo 415º. Ou seja, se o pacto de preferência tiver por objeto a celebração de um
contrato para o qual a lei exija a sua redução a escrito o pacto só vale se: constar de
documento escrito, assinado pela pessoa obrigada à preferência.
o O artigo 415º não dá lugar a um regime idêntico ao do 410º nº3. Então, incidindo o
pacto de preferência sobre prédios urbanos?
§ A lei não exige, pois, as razões de ser das exigências do artigo 410º nº3 não
fazem sentido (tutelar o promitente adquirente), o grau de vinculação
assumido não é o mesmo.
è Como se cumpre a obrigação que nasce do pacto de preferência, na prática está
compreendido entre os artigos 416º e 419º.

Rebeca Louro - 2018 34


è Artigo 416º:
o Exige a comunicação – transmitindo o projeto e as cláusulas do respetivo
contrato, apresentada a terceiros ou por eles recebidas – todos os elementos que
se mostrem significativos para a formação da vontade de exercer ou não a
preferência. É necessário revelar a identidade do terceiro?
§ Oliveira Ascensão: não se exige nunca a revelação da identidade do
terceiro para efeitos de dar cumprimento à obrigação de dar preferência, com
base na letra do artigo 416º apenas se exige que revele: “o projeto e as
cláusulas do respetivo contrato”.
§ Menezes Cordeiro (aquela que o professor João Tiago acha melhor, pois há
sempre a hipótese de estar a ser burlado): a revelação da identidade é
sempre necessária em qualquer circunstância, desde logo, porque assim o
imporia o princípio da boa fé na execução dos contratos no cumprimento das
obrigações.
§ Antunes Varela, Pires de Lima, Almeida Costa (seguinda com mais
frequência): não é sempre necessário revelar a identidade do terceiro, apenas
se torna necessário em três situações:
• Em que está em causa a possibilidade de aquisição de bens de valor
estimativo para o titular do direito de preferência (ex.: direito de preferir
na venda de um conjunto fotografias antigas da sua família);
• Em que, do exercício ou do não exercício do direito de preferência,
poderia resultar uma afetação técnico-jurídica de uma revelação
jurídica que o titular do direito de preferência mantivesse em relação
ao obrigado à preferência (ex.: arrendamento – direito legal de
preferência só existe quando o arrendatário viva há mais de três anos no
imóvel, artigo 1091º – pode ser relevante revelar a identidade. Vai vender
o imóvel, dá direito de preferência ao arrendatário. Quando há venda de
um imóvel que está arrendado, o arrendamento nunca caduca, segue o
apartamento, ou seja, vende o apartamento, mas a pessoa continua a ser
arrendatário. A possibilidade de denúncia do contrato de arrendamento,
depende de o senhorio necessitar do imóvel para viver, ou seja, o
arrendatário vive no apartamento que é vendido a um terceiro que não
tem casa naquela localidade, o direito de arrendamento não caduca, só
pode haver denúncia nos casos que a lei prevê a que esta chama:
necessidade própria de habitação do senhorio);
• No exercício de atividades comerciais concorrentes (ex.: A tem uma
loja própria de brinquedos e N, empresário na mesma área de negócio,
tem uma loja também de brinquedos e tem uma preferência, o A vende a
um terceiro sem dizer quem é, é importante saber quem é o terceiro para
saber se também é um empresário que trabalha naquela área, pode ser
importante para a decisão de contratar);
o O titular do direito tem que responder dentro de 8 dias, depois de recebida a
comunicação, sob pena de caducidade – valoração do silêncio como rejeição do
direito. O prazo só começa a contar uma vez recebida a indicação, em termos
adequados, isto é, quando ao titular forem transmitidos todos os elementos de
facto que ele considere e repute essenciais e indispensáveis para tomar a
decisão de contratar, segundo os ditames de boa fé – se nada disser naquele

Rebeca Louro - 2018 35


prazo o direito não caduca, se não tiver sido adequadamente efetuada a
comunicação (não pode ser um mero convite a contratar). O titular pode:
§ Não dizer nada – o direito caduca.
§ Aceitar preferir – celebrou-se o contrato? Celebrou-se um contrato
diferente? Cruzam-se as vontades, ambas as partes estão interessadas na
celebração, mas a celebração de um contrato efetivo varia:28
1. A aceitação do direito de preferência consubstancia a celebração do
contrato definitivo pelo simples encontro de vontades: quando utilizaram
a formalidade que a lei, para aquele tipo bem, exige (ex.: vender 1/3
dos tratores).
a. O não cumprimento do contrato definitivo: pode transformar-se a
mora em incumprimento definitivo e resolução ou exigir que a
parte pague o preço – 817º.
2. A aceitação do direito de preferência não é suficiente, devido às
formalidades impostas na lei, mas prometeram vender e comprar, ou
seja, celebraram um contrato-promessa, tem que seguir a forma pelo
seu regime imposto nos artigos 410º nº2 e 3, consoante se trate de um
prédio rústico ou urbano, respetivamente.
a. O não cumprimento do contrato-promessa segue o regime
supramencionado (se for o preferente o faltoso, o seu direito
caduca):
i. Sem sinal: execução específica cumulável com uma
indemnização pelos juros de mora (artigo 830º); resolver
quando, e apenas quando transformar a mora em
incumprimento definitivo, cumulável com uma indemnização
pelos danos provado nos termos do artigo 562º e seguintes.
ii. Com sinal: execução específica apenas nas exceções (artigo
830º nº2 e 3 e outros já demonstrados), cumulável com uma
indemnização por juros de mora; resolver, mesmo quando haja
mora, podendo reter o sinal, quando seja o adquirente o faltoso;
pedir o sinal em dobro e uma indemnização atualizada, quando
seja o alienante o faltoso. Têm o direito de retenção da coisa,
artigo 755º nº1 f).
b. Se o titular do direito disser que não quer cumprir, depois de
ter preferido, porque não está vinculado (a declaração
antecipatória de incumprimento é equivalente ao incumprimento
definitivo) e o obrigado vender a um terceiro, gera-se uma
situação de confiança e considera-se resolvido tacitamente, sem
necessidade de invocar o incumprimento.
3. A aceitação do direito de preferência não é suficiente para celebrar,
nem um contrato de compra e venda, nem um contrato-promessa.
a. O não cumprimento gera responsabilidade pré-contratual, por
rutura injustificada das negociações (artigo 227º).
§ Dizer que não quer preferir, isto é, renunciar:

28
JOÃO TIAGO: “Apontem uma nota, no dia do EXAME vai sair, não devo trocar as mãos pelos
pés e devo interpretar os factos corretamente”.

Rebeca Louro - 2018 36


• Concreta: não se estende para qualquer outro negócio que se faça –
rejeita-se um projeto em concreto, se aparecer outro projeto negocial
ainda existe o direito.
• Genérica, abstrata e indiscriminada: não quer preferir em mais
nenhum projeto, é admissível em função da natureza do direito em
causa.
o Será que se pode renunciar genericamente um direito legal de
preferência para o futuro? Não parece aceitável, pois seria permitir-
se que as partes pudessem alterar um regime legal imperativo,
imposto por razões de ordem pública.
è Artigo 417º: quando o direito de preferência tiver por objeto uma determinada coisa e o
obrigado à preferência quiser vender a coisa juntamente com outras, o titular pode
querer preferir só a coisa sobre que incide o seu direito, com redução proporcional
do preço (ex.: direito de preferência sobre a venda de um imóvel, o terceiro quer
comprar o imóvel e o recheio [mobília], o titular do direito de preferência não quer
comprar o recheio – sendo separável pode preferir apenas pelo imóvel):
o O obrigado pode exigir que seja vendido globalmente, se a sua separação criar
prejuizos e não derive do contrato a que se vinculou a venda isolada da coisa
em questão – o direito de preferência terá que cobrir toda a proposta, mesmo que
tenha que ficar com uma coisa, sobre a qual não incidia o seu direito de preferência.
è Artigo 418º: se o terceiro se comprometer a prestar uma coisa acessória que o titular
não possa satisfazer:
o Se for para afastar a preferência, se tentar dar um nó cego no titular do direito de
preferência, arranjando um terceiro que preste uma prestação que o titular não
consegue cobrir com coisa igual, não é permitido, pois há intuito fraudulento
o Se não for essa a intenção:
§ Se for avaliável em dinheiro, pode compensar esse montante em dinheiro.
§ Se não for avaliável em dinheiro, a preferência, à partida, é excluída.
è Artigo 419º:
o Nº1: se o direito pertencer, simultaneamente, a vários titulares, só pode ser
exercido por todos em conjunto. Tem também uma regra do direito de não
decrescer, ou seja, se se extinguir em relação a algum deles ou um deles não o
quiser exercer, acresce aos restantes titulares – todos têm que consentir e
aceitar o direito de preferência do terceiro – litisconsórcio necessário.
§ É exercido por todos em conjunto.
o Nº2: se o direito de preferência pertencer a mais do que um titular e só puder ser
exercido por um deles, abrir-se-á, na falta de acordo, licitação entre todos,
revertendo o excesso para o alienante.
§ Os vários contitulares encontram-se numa posição alternativa.
è Artigo 420º: os direitos de preferência não são, em princípio, transmissíveis a
terceiros, nem em vida nem em morte, pois são direitos que caducam e são
pessoalíssimos. Essa natureza pessoal pode, no entanto, ser afastada por
estipulação expressa das partes ou em consequência da própria natureza do
contrato.

Rebeca Louro - 2018 37


Regime do não cumprimento da obrigação de preferência:

è Tudo depende da natureza, do tipo de preferência.


è Se for convencional sem eficácia real, só existe a possibilidade de obter uma
indemnização dos danos que resultarem do incumprimento do pacto de
preferência.
è Se for convencional de eficácia real, aplica-se o regime infra.
è A regra do artigo 4010º nº1, embora prevista para a compropriedade, é aplicável a toda
e qualquer violação da obrigação de dar preferência, é a ação de execução específica
do pacto de preferência – ação de preferência: tem direito de fazer sua a coisa
indevidamente alienada a terceiro, desde que ponha a ação no prazo de 6 meses e
deposite o preço devido, que o terceiro haja despendido (a fim de ser reembolsado,
caso a ação proceda), no prazo de 15 dias a contar da propositura da ação (onde se
lê comproprietário, lê-se titular do direito de preferência).
è Problemas jurídicos que têm vindo a ser levantadas:
o A ação é intentada contra quem? Apenas contra o terceiro que adquiriu o objeto do
direito de preferência? Ou também contra o obrigado à preferência? Isto é uma
dúvida que se colocava antes da nova redação do artigo 1410º, antes de 1996.
§ Antes da nova redação: a ação tinha que ser intentada no prazo de 6 meses
a contar da data em que o titular tomou conhecimento, e o preço tinha que ser
pago “no prazo de 15 dias da citação dos réus”. Parece que na antiga redação
tinha que ser intentada contra ambos (litisconsórcio necessário passivo).
§ Depois da nova redação:
• É melhor pôr-se a ação logo contra os dois, pois se admitir que pode
interpor contra o terceiro para obter a coisa e depois uma outra contra o
obrigado para obter uma indemnização, os Tribunais podem, através dos
mesmos factos, tomar decisões contraditórias; sobretudo, nos casos
em que se pretende cumular com o pedido de indemnização.
• A lei foi alterada, a ação tem que ser intentada contra o terceiro. Não
há nenhuma contradição de julgados, mesmo quando as duas ações
conduzem a resultados diferentes, pois só é juridicamente relevante
quando se traduza em duas questões judíciais que não possam ser
executadas simultaneamente, não é o caso. Pese embora o titular do
direito de preferência possa resolver tudo na mesma ação, não está
obrigado a tal (litisconsóricio passivo, voluntário, não necessário).
o Como funciona se o preço tiver sido simulado? Paga-se o preço simulado ou
dissimulado? A ação só procede se o preço for depositado num prazo de 15 dias, é
condição de procedência (ex.: preço real de 100€; preço declarado de 150€ ou
50€).
§ Se o preço declarado (simulado) for superior, é o preço real (dissimulado)
que se paga. O titular do direito de preferência tem que provar que o
negócio é dissimulado, pode usar testemunhas, mas não apenas
testemunhas, isto é, exclusivamente, nos termos do artigo 294º (as
testemunhas servem para corroborarem a força probatória de outros meios de
prova). Aplica-se a regra da simulação do artigo 243º, não pode afetar
terceiros de boa fé.

Rebeca Louro - 2018 38


§ Se o preço declarado (simulado) for inferior, é o preço real (dissimulado)
que se paga. Esta visão é mais discutível:
• Antunes Varela: aplica-se o preço declarado, pois trata-se de uma
sanção por ter violado a preferência através da simulação (faz sentido
num ponto de vista ético).
• Maioria da Doutrina: o artigo 243º não permite que se prejudique
terceiros de boa fé, mas já não vem proibir que deixem de beneficiar, isto
é, o ordenamento jurídico não permite o enriquecimento injustificado,
sem causa. O artigo 243º também tem um elemento de natureza
histórica, nunca se quis esse benefício a terceiros. É também o preço
real a ser depositado por parte de terceiros.

Contratos Mistos:29

è O princípio da liberdade contratual decompõe-se em duas liberdades:


o Celebração – artigo 405º nº1 primeira parte.
o Estipulação – artigo 405º nº1 parte final e nº2.
è Resultado ou concretização prática da aplicação desta última liberdade, a de
estipulação, vários contratos que se combinam e misturam com outros, formando
um contrato novo, diferente de todos os outros já existentes.

è Dentro desta categoria há diferentes tipos negociais:


1. Contrato combinado: no seu teor juntam-se e combinam-se regras típicas de
dois contratos diferentes (ex.: aluno que vem estudar para Lisboa pretende
arrendar uma casa já com mobília, para não ter que comprar o próprio – junção do
arrendamento e do aluguer).
2. Contrato acopolado ou de duplo tipo: no mesmo contrato combinam-se tipos
contratuais diferentes, mas de forma diferente: à obrigação assumida por uma
das partes nesse contrato corresponde uma contraprestação da outra que é
típica de um tipo contratual diferente (ex.: contrato entre o condomínio e o
porteiro do prédio [que vivia no rés do chão, sem pagar renda, prestando serviços
de segurança, vigilância, limpeza, etcetera] – não paga a renda, a renda que paga
corresponde a um trabalho que se presta que é característico de um contrato
diferente – as obrigações assumidas pelas partes têm como contraobrigações
típicas de um contrato diferente).
3. Contrato misto em sentido estrito: as partes recorrem a um tipo negocial para
prosseguir e desenvolver uma finalidade que não é típica desse tipo
contratual (ex.: dar um presente a um aluno, tendo 57 alunos, por isso não dá um
presente às claras. Vende um imóvel que vale 100.000€ por 5.000€, não é
simulado, pois a vontade declarada corresponde à vontade real – recorre-se a um
tipo contratual [compra e venda] para prosseguir uma finalidade que não é tipica

29
Tanto os contratos mistos, como a união ou coligação de contratos têm tido muito pouca
importância em sede de avaliação, seja ela qual for, nos últimos anos (mas convém saber, mais
vale prevenir do que remediar).

Rebeca Louro - 2018 39


da compra e venda [doação], que é a atribuição de um benefício económico à
contraparte).

União ou Coligação de Contratos:

è Celembram-se dois ou mais negócios jurídicos, negócios esses que são


formalmente autónomos um do outro, mas ligados um ao outro por força do
programa contratual que está subjacente à execução desses dois negócios em
concreto (ex.: trabalha em Braga, a certa altura, é contratado para trabalhar em Lisboa.
Fala com um proprietário de uma casa que arrenda, por vir trabalhar para Lisboa).
è Contratos ligados entre si, as vicissitudes ocorridas ao nível da execução de um
dos contratos podem, eventualmetne, repercutir-se nas vicissitudes do outro. A
forma como um contrato vai evoluir, depende do outro (ex.: um casal quer celebrar uma
escritura pública de uma compra e venda de um imóvel com outro, mas como se trata
de um imóvel que é do seu filho menor [a alienação de bens dos filhos menores
depende da responsabiliadde parental, mas necessita de validação do Tribunal], é
preciso autorização do Tribunal, ao abrigo do artigo 1889º nº1 a). Os casais não se
conheciam, não confiavam um no outro – um não dá a chaves de casa [celebra a
escritura] sem o pagamento, o outro não paga enquanto não receber a autorização do
Tribunal – chama-se um terceiro de confiança, celebrando um contrato de depósito, ou
seja, fica com o dinheiro até ao dia da decisão do Tribunal, se for positiva entrega ao
casal vendedor, se for negativa devolve ao comprador – podendo celebrar a escritura).
è Se um dos contratos vier a ser nulo ou anulável, se vier a caducar por qualquer
motivo, o outro também pode ser nulo ou anulável, ou caducar. É lícito ao abrigo do
princípio da liberdade contratual.
è É preciso, depois, saber se estamos a falar de contratos que se repercutem uns nos
outros bilateralmente, ou se a coligação e a dependência é unilateral, ou seja, só um
deles é que se vai repercutir no outro.

Negócios Unilaterais

è Artigo 457º a 463º.


è São fontes das obrigações, podem existir e existem obrigações, isto é, vinculos jurídicos
relativos, através dos quais uma pessoa (devedor) se compromete a realizar uma
prestação em favor de uma outra (credor), que nasçam de uma mera declaração
unilateral do devedor.
è Apenas obriga o devedor, que se compromete a realizar uma prestação, pois
ninguém pode ser tornado credor contra a sua vontade.
è Mas se os contratos, enquanto fonte das obrigações, estão sujeitos ao princípio da
liberdade contratual, nos negócios unilaterais vigora o princípio da tipicidade ou do

Rebeca Louro - 2018 40


numerus clausus – artigo 457º, a promessa unilateral só obriga nos casos previstos na
lei.
è Assim o é, porque o negócio unilateral é uma declaração emitida por uma das partes
(um único centro de interesses que apenas por si produz o efeito visado) que, quando
funcione como fonte de obrigações, tem a característica de ser o seu próprio autor que
se coloca ele próprio numa situação passiva de assumir logo, perante quem quer
que seja, uma determinada obrigação:
o Se assim não fosse, assumiam, sem adequada ponderação, obrigações de prestar
em favor de outras pessoas, o que não acontece nos contratos, pois tem sempre
duas partes, pressupondo uma negociação, e há sempre ponderação e reflexão,
que não existe quando sozinho, pode emitir uma declaração nos termos da qual
pode ficar adstrito a determinada pessoa à realização de uma prestação.

Modalidades de Negócios Unilaterais:

è Entre os artigos mencionados estão compreendidos:


o Artigo 458º, promessa de cumprimento e reconhecimento da dívida.
o Artigo 459º a 462º, promessa pública.
o Artigo 463º, concurso público.
è Não é verdade que todos sejam negócios jurídicos, fontes de obrigações, o artigo 458º
não é. Todavia, todos são negócios unilaterais, assim como outros fora desta lista,
mas não são necessariamente fonte de obrigações, como o testamento, que é o
negócio unilateral de preferência30.
è Fora deste elenco há mais dois negócios unilaterais que são fonte de obrigações,
mas são sancionados, porque previstos na lei:
o Doação pura a favor de um incapaz: artigo 951º nº2, a doação é um contrato,
mas dentro de um contrato de doação há dois tipos:
§ Modais, nos quais se exige do donatário uma qualquer condição ou encargo
para o benefício.
§ Puras, faz-se o benefício não se exigindo nenhum encargo. O negócio puro
feito a incapazes é um negócio unilateral, fonte de obrigações, pois não
podem aceitar doações com encargos, se não por via de um intermediário
(artigo 951º nº1). Porém, as puras (sem encargos) produzem efeitos
independentemente de aceitação, não está dependente de um acordo de
vontades entre as partes.
o Ato de instituição de uma Fundação inter vivos: artigo 185º nº2, as Fundações
são pessoas coletivas com substrato patrimonial, com um conjunto de bens afeto a
uma realidade que não é a de quem entra no património; adquirem personalidade
jurídica através do reconhecimento. O reconhecimento é feito por uma autoridade
administrativa, que tem que ver preenchidos dois requisitos: finalidade de interesse

30
Pergunta frequente de ORAL (principalmente com o Henrique): o testamento é um negócio
unilateral fonte de obrigação? Não, pois apenas produz efeitos: depois da morte do testador, se
houver aceitação e o testamento não obriga o testador, isto é, em vida pode-se fazer os
testamentos que se quiser, vale sempre o último feito, é livremente revogável, mediante a feitura de
um outro, não obrigando o testador.

Rebeca Louro - 2018 41


social e que tenha condições para ser cumprida. Podem ser criadas entre vivos ou
por testamento.
§ Entre vivos é feito por escritura pública que é irrevogável, logo que seja
requerido o reconhecimento – o autor está, imediatamente, sujeito a um
conjunto de obrigações.

Promessa de Cumprimento e Reconhecimento de Dívida:

è Trata-se de um negócio unilateral que não é fonte de obrigações, pois é uma


simples presunção de causa, causa essa que poderá, ou não, ser fonte de obrigações
(ex.: consoante seja ora um contrato, ora uma obrigação natural, que acaba por se
transformar ela em obrigação civil, mas nunca o ato de promessa ou reconhecimento).
è Não é necessário que o devedor indique o fim jurídico que o leva a obrigar-se,
presumindo-se a existência de validade da relação fundamental.
è Mas como todas as presunções, esta também é ilidível, resultando ou na falta, ou na
ilicitude, ou na imoralidade da causa dos negócios jurídicos.
è A causa traduz-se no fim especial típico expresso no conteúdo do negócio, ou
como a função económica-social típica do negócio, segundo Vaz Serra. O negócio que
vincula uma pessoa a uma obrigação indica o motivo determinante, a função prática
ou fundamento jurídico da mesma.
o Diferente é a abstração, abstração esta que permite que os negócios valham,
independentemente da respetiva causa ou relação fundamental.
è A dita presunção é uma presunção da causa, os negócios não deixam de ser causais,
mas há uma simples inversão do ónus da prova, isto é, a necessidade de demonstrar
a falta ou nulidade de causa.
è Quanto à forma, tem exigências mínimas de redução a escrito. Todavia, se a prova da
relação depender de formalidade maior força, também terá que se observar na
promessa ou reconhecimento.
è São formalidades exigidas para a prova e não para a substância da relação
fundamental.

Promessa Pública

è A vinculação do promitente exige a divulgação da mesma, de forma a que seja


cognoscível pelos eventuais destinatários.
è As promessas públicas podem dirigir-se à produção de um resultado positivo, mas
também podem ter outra natureza, pode ser efetuada a favor de quem se encontre
numa determinada situação ou até da demonstração de que um certo ato ou efeito
não pode realizar-se.
è A sua eficácia não está dependente do conhecimento prévio por parte da pessoa
que se coloca nessa situação prevista, ou do propósito desta de conseguir o benefício
respetivo, pois não afetam o caráter unilateral do negócio jurídico, a obrigação nasce

Rebeca Louro - 2018 42


sempre com o anúncio público.
è O prazo pode ser fixado pelo promitente ou derivar da natureza do seu fim, sendo
que só poderá ser revogada com fundamento em justa causa. Sem prazo, manter-
se-á a obrigação, até que o promitente a revogue, o que poderá suceder a todo o
tempo.
è O cumprimento da prestação poderá ser efetivado por mais do que uma pessoa,
devendo a promessa ser distribuída equitativamente, atendendo ao papel de cada
um.
Concurso Público

è O prémio é prometido unicamente aos que se candidatem a recebê-lo, não bastando


a efetivação de uma prestação, pois é preciso que lhe seja atribuído pelo júri
designado no anúncio, ou na falta dele, pelo promitente.
è Estas decisões de admissão de candidatos e atribuição de prémios são da
exclusiva competência destas entidades, não podendo, por norma, ser recorríveis:
o Doutrina em geral: não será recorrível.
o Menezes Leitão: poderá ser recorrível se se tratar de um concurso objetivo e
sobre cultura geral, já assim não o é se for subjetivo e, por isso, estiver à
discricionariedade do júri.
è Apenas será válida, se se fixar o prazo para a apresentação dos concorrentes no
anúncio, a fim de impedir que se adie para se apresentarem mais concorrentes.

Gestão de Negócios

è O artigo 464º impõe três requisitos cumulativos:


1. Direção de negócio alheio.
§ O conceito de negócio não é utilizada no seu sentido técnico-jurídico (acordo
de vontades ou declaração unilateral), é mais amplo, é o assunto ou
interesse (ex.: dois vizinhos que vivem num prédio geminado, um dos
vizinhos vai de férias e o outro vê que o telhado daquele ameaça ruína ou que
as plantas estão a morrer, repara esses danos iminentes ele próprio, dirigindo
um assunto alheio, ou se ligar a um profissional para reparar, já é um negócio
alheio), também há assuntos não avaliáveis em dinheiro (ex.: se a avó do
vizinho morrer quando ele não se encontra no país e manda rezar uma missa
em seu nome).
2. No interesse e por conta do dono do negócio – alienidade, produz efeitos na
esfera jurídica que lhe não pertence, alheia, não é indispensável que o gestor
conheça o dono do negócio.
3. Falta de autorização – não há autorização expressa nem tácita, pois se tivesse
autorizado não era gestão de negócios (ex.: procuração, contrato de mandato
ou prestação de serviços), mas se procurar contactar o dono, ainda que sem
sucesso (se suceder já não se trata de gestão de negócios), poder-se-á evitar
uma posterior e eventual responsabilidade.
è Enquanto fonte é um instituto curioso, no qual confluem dois interesses antagónicos

Rebeca Louro - 2018 43


que, à partida, não poderiam subsistir juntos:
o A solidariedade humana e pessoal pode justificar que, ao abrigo do espírito e
intenção pura e benéfica, alguém possa interferir numa esfera jurídica de
terceiros para poder evitar a deterioração, a desvalorização ou mesmo a
destruição de bens de uma esfera jurídica alheia.
o No direito civil e privado o juiz dos interesses próprios é o respetivo titular – a
ninguém pode ser imposto um benefício contra a sua própria vontade.
Salvarguarda do princípio de ordem pública que condena intromissões da esfera
pessoal e patrimonial alheia.
è Deste regime hibrido resulta que, da gestão de negócios alheios, se criam obrigações,
nascem deveres relativos, que podem obrigar o dono do negócio a compensar o
gestor por despesas que tenha tido no exercício da gestão; pode obrigar o gestor
a indemnizar o dono do negócio por prejuízos que, eventualmente, possa causar
durante a gestão do negócio, ao património do dono do negócio (não tomando as
providências administrativas consideradas minimamente indispensáveis por um bom pai
de família).
è Além dos três requisitos cumulativos não deveria existir um quarto, da utilidade? Isto é,
não seria também exigível que a própria atuação fosse útil para o dono do negócio, no
sentido de lhe permitir realizar, em termos objetivos, um interesse próprio.
o A questão está deslocada quando a pensamos no sentido em que, a tal utilidade
devia constituir um dos requisitos da gestão de negócios, porque parece que não
deve e que haverá sempre gestão de negócios, mesmo quando a atuação do
gestor não é útil e não realiza, em termos objetivos, os interesses do dono do
negócio.
o A questão deve ser analisada num prisma diferente, que tem a ver com o tipo de
gestão de negócios que pode existir. Diz-se que há outras gestões de negócios:
regular (esta sim útil, ou seja, acrescenta algo ao património do dono do
negócio) e irregular.
§ Artigo 464º “interesse” = alienidade, dissociação dos dois patrimónios e
dos dois interesses.
§ Artigo 465º a) “interesse” = utilidade, com a sua atuação deve permitir ao
dono do negócio realizar interesses objetivos próprios.

Modalidades de Gestão de Negócios:

Relações Internas:

è Relação que se estabelecem entre o gestor do negócio e o dono do mesmo negócio,


que pode ser:
o Regular: artigo 465º a) exige dois requisitos cumulativos: interesse e a vontade,
real ou presumível – desde que essa vontade não seja contrária à lei, bons
costumes ou ordem pública.
• Há quem dê primazia ao interesse sobre a vontade e vice-versa, quando
apontem em sentidos opostos.
o Galvão Teles e, inicialmente, Menezes Cordeiro: havendo um

Rebeca Louro - 2018 44


conflito o gestor devia abster-se, não praticando qualquer ato de
gestão.
o Vaz Serra e Ribeiro Mendes: atribui-se prevalência ao interesse
objetivo, descuidando a vontade.
o Menezes Leitão: devem ser combinados num sitema móvel,
acabando por não densificar muito o critério de distinção, mas
dizendo que deve ter mais peso o elemento da vontade, porque se
considera que uma pessoa é o melhor juíz dos seus interesses,
pois a ninguém pode ser imposto um benefício contra a sua vontade.
§ O gestor não é obrigado a agir.
§ Produzem-se dois aspetos positivos para o gestor e afasta-se um negativo:
• 468º nº1, o dono do negócio é obrigado a reembolsar o gestor pelas
despesas fundadamente consideradas indispensáveis, pelo gestor.
• 470º nº2, em regra é gratuita (iniciativa motivada por razões de
solidariedade humana), mas se corresponder à atividade profissional
do gestor – indemnização correspondente aos honorários
profissionais.31
• 466º nº1 e 2, irresponsabilidade do gestor.
o Irregular: não estão reunidos os dois ou um dos requisitos cumulativos do artigo
465º a), interesse e vontade – a ninguém pode ser imposto um benefício contra
a sua vontade (ex.: o vizinho está hospitalizado, é um homem conservador, há
trinta anos que planta centeio, mas o terreno não é bom para centeio, é melhor para
trigo, então o vizinho, animado por um espírito positivo, sabendo que está
hospitalizado e não pode tomar providências quanto àquele período, muda a
plantação do terreno, que é melhor para o vizinho hospitalizado – o gestor deve
conformar-se com o interesse e vontade).
• 468º nº2, em matérias de despesas, se não aprovar a gestão, o dono
responde apenas pelas regras do enriquecimento sem causa.
• 470º, não se aplica, mesmo que corresponda ao exercício da atividade
profissional do gestor.
• 466º nº2, se for culposa responde pelos danos provocados, quer pela
sua atuação, quer com a injustificada interrupção da mesma.
è Terá o gestor, logo que possível, de informar o dono que assumiu a gestão, sob
pena de responsabilidade, de acordo com o artigo 465º b). O regime do 469º é
importante, pode suceder que nenhuma dúvida pode existir quanto à atuação irregular
do gestor, mas, ainda assim, o dono pode aprovar a sua gestão, passando a ser
regular, com todas as consequências que dali resultem. A aprovação não tem
exigências de forma, aplicando-se as regras gerais dos artigos 217º (tácita ou
expressa) e 219º (liberdade de forma).
è Um incapaz pode assumir a gestão de um negócio alheio, para apurar a sua
responsabilidade recorre-se aos artigos 488º e 489º.

31
Ver artigo 1158º nº2 relativo à fixação da remuneração, para o mandato.

Rebeca Louro - 2018 45


Relações Externas:

è Relação entre o gestor ou o dono do negócio, consoante quem tenha contratado


com o terceiro, e terceiros, que pode ser:32
o Representativa: o gestor contrata em nome do dono, como se fosse autorizado,
o que não é.
§ 471º, remete para o 268º da representação sem poderes (tem que seguir a
forma requerida para a procuração), são, em relação ao dono, julgados
ineficazes, a não ser que este os ratifique, que não acontece por inerência
de uma aprovação e vice-versa. Não vincula:
• O dono, porque não ratificou a gestão.
• O gestor, não contratou em nome próprio.
o O terceiro tem o ónus de pedir a justificação dos poderes do
representante – depende do tipo de negócio, se for uma fechadura
não se afigura razoável esta diligência, até porque o gestor poderia
dizer que tinha e não ter, neste caso já seria responsável, por
induzir o terceiro em erro. O gestor responsabiliza o terceiro por via
da responsabilidade pré-contratual, por violação de deveres
declarativos, artigo 227º.
o O dono do negócio pode responder segundo as regras do
enriquecimento sem causa, caráter de subsidariedade deste
instituto – ver infra as divergências quanto ao valor do
enriquecimento a ser restituído:
§ Enriquecimento real;
§ O menor de dois:
• Enriquecimento patrimonial.
• Empobrecimento patrimonial.
o Não Representativa: o gestor age contratando em nome próprio, mas no
interesse e vontade do dono do negócio.
§ 471º, remete para o 1180º, 1181º (direitos) e 1182º (obrigações – podem
passar as obrigações para o dono através das formas de assunção de
dívida do artigo 595º, mas se o dono se recusar a aprovar a gestão vê-se
inviabilizada a transferência das obrigações do gestor para o dono, não
prejudicando a posição do terceiro) do regime do mandato sem
representação, com as devidas adaptações. O dono substitui-se ao gestor,
no exercício dos créditos resultantes de tal negócio.

Gestão de Negócio Alheio Julgada como Própria:

è Artigo 472º divide-se em dois:


o Age-se no seu próprio interesse e por conta própria, embora não o seja, porque
não é sua a coisa, mas acha que é, apenas se aplica o regime da gestão de
negócios se houver aprovação da gestão. (ex.: A vende uma coisa de B achando
que era sua, ou faz reparações no edifício de B achando que é seu)
32
Não releva saber se é regular ou irregular quando seja externa.

Rebeca Louro - 2018 46


o Gestão imprópria (figura afim) de negócio: age-se aplicam-se as regras do
enriquecimento sem causa, sem prejuízo de outras que ao caso couberem (ex.: A
faz obras na casa de B, que ameaça ruína, para prevenir que provoque danos à sua
própria casa); se houver culpa do gestor na violação do direito alheio, aplica-se
a figura da responsabilidade civil – situação em que o gestor age, sabendo que o
negócio ou assunto não lhe pertence, mas agindo como se o negócio ou assunto
lhe pertencessem.

Responsabilidade do Gestor:

è O artigo 466º nº2 está mal redigido em termos técnicos, parece que vem determinar
certo requisito que é a culpa (perante o caso concreto, aquela conduta é censurável,
acontece quando, olhando para as circunstâncias do caso, deveria e podia ter pautado a
conduta de forma diferente), mas na verdade é da ilicitude que a norma fala e define
(enquanto requisito da resposabilidade civil olha para a conduta do lesante de forma
objetiva, desprovida de qualquer juízo ético).
è Quando é que se cosidera culposa? A resposta não está no artigo.
o Culpa em concreto: se há menos diligência do que aquela que usa no dia-a-dia
– posição maioritária quanto à gestão de negócios.
o Culpa em abstrato: compara-se a conduta com a de um homem médio, artigo
487º nº2.
§ Almeida Costa: à culpa em abstrato poder-se-á fazer apelo em duas
situações:
• Conduta do gestor corresponde ao exercício da sua atividade
profissional.
• Havia várias pessoas e o gestor afasta os possíveis candidatos,
assumindo a gestão, de forma deliberada e consciênte, ainda que de
boa fé.

Enriquecimento Sem Causa33

è O seu regime está desenhado entre os artigos 473º e 482º.


è Trata-se de uma situação jurídica em que alguém, injustificadamente, obteve uma
vantagem à custa de outra pessoa – artigo 473º nº2. É devedor o enriquecido e credor
o empobrecido.
è Almeida Costa apresenta seis requisitos, que têm que se verificar, para se considerar
nascida a obrigação desta fonte:
o Positivos, têm que se verificar:
1. Um enriquecimento: vantagem patrimonial avaliável em dinheiro direta
ou indireta (poupança de despesas), os enriquecimentos não patrimoniais

33
É preciso SABER DE COR PARA AS ORAIS os requisitos do enriquecimento sem causa, da
gestão de negócios, dos negócios unilaterais, etcetera, de CÓDIGO FECHADO com o Professor
HENRIQUE ANTUNES!!

Rebeca Louro - 2018 47


não têm nem se traduzem numa consequência patrimonial indireta, nunca
poderá fundar o nascimento de uma qualquer restituição fundada no
enriquecimento sem causa34. De que tipo de enriquecimento se fala?
• A noção relevante é o enriquecimento patrimonial – Antunes Varela,
Almeida Costa e Galvão Teles. Reflete precisamente a diferença, para
mais, produzida na esfera jurídica do enriquecido, que resulta da
comparação entre a sua situação patrimonial efetiva (real) e aquela
em que encontraria se a deslocação patrimonial se não houvesse
verificado (hipotética).
• A noção relevante é de enriquecimento real – Menezes Leitão e Júlio
Gomes. Corresponde ao valor objetivo e autónomo da vantagem
adquirida concretamente pelo enriquecido.
o Pode conduzir a resultados práticos distintos: uma pessoa que
não gosta de doces nem de gelados recebe à sua porta um cabaz de
doces e gelados, mas, como o seu avô dizia “quando grátis, nem
uma injeção na testa se recusa”, aceitou. Contudo o cabaz era para o
seu vizinho.
§ Segundo a primeira Teoria, a clássica, o enriquecimento
patrimonial é igual a zero.
§ Segundo a segunda Teoria, a moderna, há enriquecimento real,
pois não pagou pelo cabaz e este custou dinheiro.
• O artigo 479º fala em “obtido”, é um conceito muito amplo,
a lei não toma partido.
2. Um suporte do enriquecimento por pessoa diversa do enriquecido: existe
nos casos em que alguém obtenha uma vantagem patrimonial ou real, à
custa de outrem, não se traduzindo essa mesma vantagem,
necessariamente, num prejuízo ou desvantagem suportada por outra
pessoa (empobrecimento), mas, por norma, resulta num empobrecimento de
outra pessoa, não necessariamente correspondente com o
enriquecimento. Nem sempre acontece e, sobretudo para que nasça a
obrigação, basta que haja enriquecimento e sirva de suporte a uma pessoa
distinta.
• Ex.: um senhor esteve o ano inteiro a treinar para uma corrida de
bicicletas, na véspera da corrida a sua bicicleta estraga-se, vê uma
bicicleta no jardim da casa de alguém, leva-a para a corrida, ganha, a
bicicleta permanece imaculada, sem nenhum estrago ou sujidade e
devolve-a ao dono, deixando-a no mesmo sítio.
3. Correlação entre enriquecimento e respetivo suporte: têm que estar
relacionados, no sentido de que a vantagem tem que ter por fonte e estar
assente numa causa que é o respetivo suporte.
• Quanto ao tipo de relação ou nexo, não se exige que exista uma
correspondência objetiva entre o enriquecimento e o suporte, isto é,
que tenham o mesmo valor ou se produzam por algo da mesma
espécie. Não se exige também uma relação de causa ou efeito.

34
ALMEIDA COSTA: Poderá a vantagem ser de ordem não patrimonial, desde que produza
consequências avaliáveis em dinheiro, isto é, quando se converta numa vantagem patrimonial
indireta.

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• Essa relação tem que ser direta (correspondência imediata entre o
património do enriquecido e o suporte) ou admite-se que seja indireta
(entre o património do empobrecido e do enriquecido intermedeie o
património de uma terceira pessoa)?
o A maioria da doutrina exige a solução da imediação, ou seja, para
que haja a obrigação de restituir, necessário é que, entre o
património do enriquecido e do empobrecido (suporte), não
exista mais nada. Produz-se imediatamentee entre o património do
enriquecido e do empobrecido.
o Mas existem situações previstas na lei que dispensam a
existência desta falta de intermediação, situações descritas no
artigo 481º, acrescentando os artigos 289º nº2 e 616º nº3. Há duas
deslocações sucessivas, através de um património intermédio.
Se se admitisse como genérico, levantaria dificuldades, pois há que
definir as relações entre o seu titular, o empobrecido e o enriquecido.
Todavia, não resulta necessarimente numas violação do requisito, o
facto de se ter efetuado por intermédio de um terceiro a atribuição
patrimonial, pode é ser uma única aquisição e não duas aquisições
sucessivas (os interesses do terceiro não são atingidos, a situação
continua a respeitar ao empobrecido e enriquecido).
o Negativos, não se podem verificar:
4. Ausência de causa legítima: causa jurídica que justifique um
enriquecimento, não há quando não existe relação jurídica ou facto jurídico,
que de acordo com os princípios da ordem jurídica, justifiquem a deslocação
patrimonial em favor do enriquecido35.
• Ex.: o contrato e negócios jurídicos justificam o enriquecimento; o
devedor que vê extinta a dívida por prescrição; posse pública e pacífica
de algo por determinado número de anos – usucapião.
5. Ausência de outro meio jurídico: caráter subsidiário ou residual, é o
último recurso de que se pode lançar mão para corrigir uma determinada
situação jurídica, não se faculta outro meio para corrigir os prejuízos. Se
houver outra ação normal que possa ser exercida, o empobrecido deve dar-
lhe preferência. A falta de outro meio pode ser originária ou superveniente
– 474º.
• Ex.: responsabilidade civil, ação de reivindicação (artigo 1311º), figura do
contrato, ação de nulidade, anulabilidade ou inexistência – outros
institutos que permitem resolver o problema criado pelo enriquecimento
injustificado.
• Há casos em que os factos preenchem, simultanemente, os requisitos
da responsabilidade civil e o enriquecimento sem causa, é preciso ter
em conta o artigo 498º nº4: prescrição da responsabilidade contratual
permite recorrer ao enriquecimento sem causa, porque, para todos os
efeitos, é como se não houve já outro instrumento para corrigir; mas

35
Quando o direito não consente ou não aprova, por não existir uma relação ou facto que
justifique essa deslocação patrimonial, de acordo com os princípios do sistema jurídico.
Sempre que aproveita a pessoa diversa que, segundo a lei, deveria beneficiar. Substancialmente
ilegítimo ou injusto, mas não formalmente antijurídico.

Rebeca Louro - 2018 49


também poderá haver simultanemente com responsabilidade civil
quanto ao valor que excede o valor do dano da responsabilidade civil,
pois aqui não haverá outro meio recorrível para corrigir o enriquecimento
sem causa.
6. Ausência de preceito legal que, ou negue o direito à restituição (ex.: falta
do requisito da causa; prescrição [300º e seguintes], o credor que vê o seu
direito prescrito não pode lançar mão do enriquecimento sem causa para ver
o seu direito cumprida; ou usucapião [1287º e seguintes]; frutos perecidos
pelo possuidor de boa fé [1270º nº1]; alimentos provisórios [2007º nº2];
objetos achados e não reclamados dentro de certo prazo [1323º nº2]) ou
atribua outros efeitos ao enriquecimento (ex.: alteração anormal das
circunstâncias [437º]; regime das benefeitorias úteis que possam ser
levantadas [1273º nº1]; especificação de má fé [1323º nº2]).
è Há algumas hipóteses de enriquecimento sem causa previstas avulsamente na lei, à
semelhança das obrigações naturais, o artigo 473º nº1 é uma noção geral.
è O nº2 do artigo 473º diz outros casos de enriquecimento sem causa:
o O que foi indevidamente recebido, repetição do indevido (ex.: marido paga uma
dívida da mulher e depois divorciam-se).
§ Ao cumprimento de obrigação que não existe, nem relativamente ao que
o efetua nem a terceiro, há três pressupostos:
• Prestação com finalidade de cumprir uma obrigação.
• Obrigação não exista na data da prestação, sendo efetuada a pessoa
diferente do credor, o devedor tem a possibilidade de a repetir, dado
que nada devia a esse terceiro, mas apenas se o seu cumprimento não
se tornar liberatório (476º nº2); assim como o crédito pode existir, mas
ainda não ter sido vencido por haver sujeição a um prazo (476º nº3).
• Nem mesmo se relacione com um dos deveres de ordem moral ou
social, impostos pela justiça, que originam obrigações naturais.
§ Quando se cumpre uma obrigação alheia:
• Pode suceder na convicção de que é uma obrigação própria (477º nº1),
mas sempre que não haja direito de repetição o autor fica sub-rogado nos
direitos do credor.
• Sabe ser uma dívida alheia, mesmo assim efetuando o cumprimento
na convicção errónea de estar a isso obrigado para com o devedor,
existe direito de repetição se o credor conhecia o erro ao estabelecer a
prestação. Se estiver de boa fé, apenas se pode exigir ao devedor
exonerado, aquilo com que o mesmo injustamente se locupletou (478º).
o O que foi recebido por virtude de uma causa que deixou de existir (ex.: casal que
vive em união de facto, a casa é de um, mas o outro pagava metade da casa ao
banco todos os meses, depois separam-se).
o O que foi praticado em vista de um efeito que não se verificou, falta de resultado
previsto (ex.: um namorado dá um anel de noivado à namorada, entretanto o noivo
descobre que a sua noiva estava a traí-lo, separam-se e pede o anel de volta). Há
três requisitos ou pressupostos:
§ Que se haja realizado uma prestação para obter um especial resultado
futuro, de harmonia com o conteúdo do negócio.
§ Que se depreenda do conteúdo do negócio a fixação do fim da prestação.

Rebeca Louro - 2018 50


§ Que o resultado não se produza.
• O artigo 475º exclui a ação de enriquecimento supra em dois casos:
o Se o autor já sabia que o efeito previsto era impossível, certeza
da inviabilidade do resultado., não bastando a convicção.
o Se o autor impediu de má fé a verificação do resultado.
è Também os artigos 475º, 476º, 477º e 478º – os três últimos dizem respeito ao devedor
que cumpre uma dívida enganando-se na pessoa do credor, ou achando que era
exigível e ainda não era exigível, ou achando que era devedor e não era devedor36.
è Artigo 482º, o enriquecimento sem causa prescreve no prazo de 3 anos, a contar do
conhecimento da pessoa do enriquecido, dentro do prazo de 20 anos, abaixo
mencionado.
è Artigo 498º nº4, a responsabilidade civil prescreve no prazo de 3 anos, a contar da
data em que o evento danoso teve lugar, ainda que não se saiba quem é o seu autor.
O prazo de 3 anos corre dentro do prazo ordinário de 20 anos do artigo 309º, que
conta logo que o facto é praticado. O artigo 498º nº3 permite aplicar um prazo mais
longo do que 3 anos, se for um crime, nos termos do artigo 118º nº1 c) do Código
Penal, o furto tem um prazo que atinge os 5 anos.

Como se calcula a obrigação de restituir?

è Deve proceder-se à restituição em espécie, mas não sendo possível, entregar-se-á o


valor correspondente, não podendo exceder a medida do locupletamento. Tudo o que
se haja conseguido às expensas do titular da coisa, mediante o uso, fruição, ou
consumo indevidos da coisa, mas por outro lado, deverá descontar-se o que
resultou de fatores diferentes e pessoais do beneficiado, como o seu trabalho,
iniciativa, espírito de iniciativa, experiência ou perícia, como será analisado.
è Teoria Tradicional ou do Duplo Limite (Almeida Costa e Antunes Varela): o
concreto valor que o enriquecido deve restituir ao empobrecido, mede-se pelo menor de
dois valores: enriquecimento patrimonial (diferença para mais do enriquecimento
atual ou real e hipotético)37 e o empobrecimento patrimonial (diferença para menos do
empobrecimento atual ou real e hipotético)38.
o Problema: o que se faz quando um dos valores for zero?
§ Quando estejamos perante empobrecimento patrimonial igual a 0, o valor é
substituído pelo valor objetivo de mercado que resultou da utilização do
bem – teoria do dano real.
§ Quando estejamos perante enriquecimento patrimonial igual a 0 não há
solução.

36
Não deve sair no teste ou exame.
37
É subjetivo, na relação que a coisa tem com o património do enriquecido – coisa em confronto
com o enriquecimento, será a diferença do valor real da coisa e o máximo que teria gasto (será 0
quando nada teria dado pela coisa, será o valor real quando daria o valor real pela coisa).
38
O que no património do empobrecido não há, mas devia haver se o evento não tivesse ocorrido
(0 quando não costuma fazer nem ia fazer, valor real, quando não fez mas costuma fazer)

Rebeca Louro - 2018 51


è Teoria Moderna ou do Enriquecimento Real39 (Menezes Leitão e Júlio Gomes): o
valor a ser restituído é o valor da vantagem real, o que concretamente se alcançou,
a vantagem efetivamente obtida, não é preciso fazer qualquer cálculo.
o Se o enriquecido estiver de boa fé (desconhece a causa justificativa do seu
enriquecimento), pode restituir o valor do enriquecimento patrimonial, se for
mais vantajoso para este.
è Deve atender-se também ao artigo 480º sobre o agravamento da obrigação, quando o
empobrecido haja deixado de auferir os frutos da coisa (rendimento que se retira de
determinado bem jurídico). Ou seja, deixa de se restringir àquilo que enriqueceu sem
causa, abrangendo ainda as diminuições e os não aumentos posteriores devidos a
culpa do enriquecido.

Modalidades Específicas do Enriquecimento Sem Causa:

Lucros Ilícitos:

è Aufere-se lucro por intervenção, alguém obtém uma vantagem às custas de outra,
mas a vantagem também se deveu a fatores e perícia do enriquecido. Uma vez
determinado o valor a restituir, seja por qual das teorias for, ainda é preciso retirar da
componente indemnizatória um fator que não se consegue contabilizar, que é a
causa da própria perícia na contribuição para o enriquecimento. Parte do lucro
tem causa (perícia).
è Também se aplica a direitos absolutos? Convite à intromissão não autorizada na esfera
jurídica de outras pessoas, não faz sentido.
è O enriquecimento sem causa é pouco, apenas permite obter parte do enriquecimento,
aquele que não teve causa. Há, portanto, duas alternativas:
o Responsabilidade civil pura e dura apenas resolve a parte dos danos e não dos
lucros40.
o Gestão de negócios (Menezes Leitão e Júlio Gomes): gestão imprópria de
negócios – alguém direciona negócio alheio, sabendo que o negócio é alheio (472º),
mas achando que é próprio, se o dono aprovar, aplicam-se as regras da gestão
de negócios (465º nº1 e) obrigações do gestor – restituir ao dono tudo aquilo
que tiver obtido no exercício da gestão; 472º segunda parte, em qualquer outra
situação, quando o gestor aja com culpa, aplica-se o regime do enriquecimento sem
causa ou responsabilidade civil).
§ Antunes Varela: se a lei diz que quando alguém gere negócio alheio,
achando que é próprio, são potencialmente aplicáveis as regras de gestão de
negócios se houver aprovação, por maioria da razão, também é aplicável o
regime da gestão de negócios às situações de lucro por intervenção. Segundo
o artigo 465º e) é-lhe restituída a totalidade do lucro ilícito, saindo do
regime do enriquecimento sem causa.

39
Valor concreto da coisa no mercado, não depende de qualquer interferência que a coisa tenha
no património do enriquecido.
40
No enriquecimento sem causa refere-se às vantagens resultantes de uma simples deslocação
patrimonial injustificada. Na responsabilidade civil visa os prejuízos derivados de um ato ilícito
ou equivalente.

Rebeca Louro - 2018 52


• A lei é clara, o artigo 472º nº1 primeira parte aplica-se à gestão de
negócios alheios julgados próprios, a segunda parte diz “quaisquer outras
circunstâncias”, tratando-se de gestão de negócios imprópria, a lei não
dá alternativa, pois apenas permite o regime do enriquecimento sem
causa ou responsabilidade civil e não por via do regime da gestão
de negócios.
• Ainda que viável, a aprovação da gestão faz com que o dono do
negócio renuncie a toda e qualquer indemnização que teria de exigir
do gestor. Não resolve a parte dos danos, apenas dos lucros ilícitos.
o Responsabilidade civil: se houver culpa, segunda parte do artigo 472º nº1, pode
dar lugar a responsabilidade civil.
§ Henrique Sousa Antunes: a responsabilidade civil só permite o lucro dos
danos, pois tem caráter restitutivo. Contudo, se a responsabilidade civil tiver
uma função sancionatória (teoria que será melhor desenvolvida infra), já
engloba os lucros ilícitos (vantagem obtida sem causa justificativa, pode
considerar-se um dano), pois o dano destes lucros pode incluir-se no
artigo 496º, nos danos não patrimoniais. A obrigação de indemnizar deixa
de corresponder somente ao valor do dano e junta-se à equação o grau de
culpa, permitido pelo artigo 494º, através de juízos de equidade.

Responsabilidade Civil

Noções Genéricas:

è A responsabilidade civil é um instituto que se pode dividir em:


o Obrigacional ou contratual – artigo 798º e seguintes41.
o Extraobrigacional ou extracontratual:
§ Subjetiva ou por factos ilícitos – artigo 483º a 498º.
• Artigo 483º nº2, a responsabilidade civil independentemente de culpa só
existe nos casos e termos previstos na lei.
• Há casos em que a culpa está presumida: artigo 491º, 492º e 493º.
§ Objetiva ou pelo risco – artigo 499º a 510º.
• Trata-se de uma atividade que traz vantagens, mas é em si mesma
perigosa, pela sua própria natureza.
o “Ubi commoda, ibi incommoda”, alguém domina um risco retirando
dele vantagens, poderá causar danos e, consequentemente, terá que
suportá-los.
• Prescinde de um requisito que é a culpa.
o Por factos lícitos – responde pela prática de um facto lícito. Não há culpa, mas
gerou um dano, indemniza-se por via da equidade.
§ Extracontratual (ex.: Estado de Necessidade, artigo 339º).

41
Matéria de cumprimento e não cumprimento.

Rebeca Louro - 2018 53


§ Contratual (ex.: limitação voluntária de direitos de personalidade, artigo 81º
nº2).
è Cômputo da obrigação de indemnizar de ambas as modalidades de responsabilidade
civil – artigos 562º a 572º:
o Depois de se concluir que há responsabilidade civil, aplica-se a todas as
responsabilidades civis.
o Pode haver culpa do lesado – 570º – é preciso fazer uma apreciação casuística:
§ Concede totalmente a indemnização.
§ Reduz a indemnização.
§ Exclui totalmente a indemnização.
è É uma parte das obrigações, mas mais que isso é um princípio, uma trave mestra
semelhante ao princípio da liberdade, constituem duas faces da mesma moeda.
è No ordenamento jurídico português assentamenos na velha máxima Kantiana “a minha
liberdade (espaço de ação por excelência) só deve e só pode estar limitada pela
liberdade de outrem”. Se praticar factos voluntários que causar danos na liberdade
de outrem, responde-se pelas consequências danosas dessa conduta.

Finalidades da Responsabilidade Civil:

è Reconstituir e reparar o dano, mas será apenas e só isto? Sempre teve esta lógica. O
objeto da responsabilidade civil era unicamente medido pelo maior ou menor dano
que a conduta do agente tinha causado; havia uma indissociação do valor da
indemnização e do dano, não contava com o grau de culpa (desde a Roma antiga até
aos primeiros Códigos, início do século XIX).
è Vindo dos Estados Unidos, os “punitive damages”, valorizavam o grau de culpa.
Colocou-se a questão de saber se no direito positivo português faz sentido que exista
uma responsabilidade civil que assente também numa lógica de punição e não
apenas de reparação.
è Argumentos a favor da reparação apenas:
o A responsabilidade punitiva poderá afetar a liberdade do agente, introduz-se um
peso muito superior ao da responsabilidade criminal (as dívidas podem ser
consideradas mais restritivas da liberdade [tem que se ter um completo domínio da
ação e para tal tem que se ter meios para o fazer] do que a prisão, que limita a área
de circulação e movimentação), que assentam em lógicas diferentes, pois os bens
desta assenta em valores muito mais valiosos (ex.: vida).
è Argumentos a favor da punição:
o Visão ética do direito, a culpa não pode ser o parente pobre da
responsabilidade civil e ao contrário do que acontece na responsabilidade criminal,
cujo requisito nobre é a culpa – não é compaginável com condutas dolosas e
maldosas.
o Trata-se de uma mensagem que se dá na afirmação de uma lógica punitiva: para o
agente que praticou o ilícito (pensa duas vezes de repetir) e à comunidade em
geral (desincentivo). A função é de reconstiruir o património do lesado, mas se
passassemos a indemnizar acima do dano contribuiriamos para a prevenção do
dano para o futuro.

Rebeca Louro - 2018 54


o Se houver ponderação na lógica punitiva aquele fator de excesso se afasta,
introduz-se o vetor da equidade para temperar esta lógica punitiva.
o Argumentos de direito positivo:
§ Artigo 494º: limitação da indemnização em casos de mera culpa motivada
por razões de equidade. Aqui perdoa o agente por haver mera culpa, mas
prova que na lei se pode manter em diálogo com o objeto de indemnizar
não só o dano, mas também a culpa. E há apelo expresso à equidade,
funciona como medida justa de obrigação de indemnizar.
§ Artigo 570º: a culpa do lesado também releva para critérios de
indemnização.
§ Artigo 497º: a culpa é relevante e fala expressamente em culpa dos
lesantes:
• Nº1: relações externas, qualquer um dos lesantes é chamado a
responder.
• Nº2: relações internas, o acerto de contas é feito determinando o grau
de culpa.
§ Artigo 507º: semelhante ao anterior, mas está pensado para a
responsabilidade civil pelo risco.
§ Artigo 814º nº1: responde pelo seu dolo – responsabilidade contratual, o
credor sem motivo justificado recusa receber a prestação – mora do credor.
§ Artigo 496º: a noção de dano moral diz que a indemnização é fixada pela
equidade, um dos fatores a ponderar é a culpa.
§ A irrelevância negativa da causa virtual – requisito de nexo causalidade,
quando o facto ilícito for causa adequada do dano:
• Causa adequada, artigo 563º: o facto em concreto tenha sido causa do
dano e, em termos abstratos se mostrasse apto a causá-lo.
• Causa virtual: um facto pode ser causa real de um dano, mas também
pode ser causa virtual do dano, quando em si mesmo era suscetível de
provocar o evento danoso, mas em concreto não se verificou,
porque intervém um facto real ou operante. O autor da causa virtual
deve indemnizar pelos prejuízos causados pela conduta.
o Relevância positiva da causa virtual, consiste em saber se o autor
da causa virtual deve ser obrigado a indemnizar os prejuízos
causados com a sua conduta?
o Relevância negativa da causa virtual, consiste em saber se o
autor da causa real ou operante pode invocar a causa virtual
para se livrar da responsabilidade civil?
§ Não há, em regra, relevância positiva da causa virtual e há, em
alguns casos, relevância negativa da causa virtual: artigo 491º,
492º, 493º nº1 e 503º nº3.
o Antunes Varela, Almeida Costa e Galvão Teles: Só é admissível
nos casos especialmente previstos na lei.
§ Teoria da Diferença: artigo 566º nº2, a saber o valor da
indemnização calcula-se a diferença do património real e
hipotético do lesado.
o Fernando Pessoa Jorge: tem uma dimensão claramente punitiva,
pois não vigora com caráter geral a regra da relevância negativa da

Rebeca Louro - 2018 55


causa virtual, o que significa que, normalmente serve, não só
reparar o dano, mas também para castigar, pois só nos casos
previstos na lei é que há relevância negativa da causa virtual.42

Diferença de Regimes entre Responsabilidade Civil Extraobrigacional e


Obrigacional:43

è Diferença de conceito: obrigacional, sempre que alguém viola uma obrigação;


extraobrigacional, sempre que se viola um direito absoluto (ex.: direitos reais e de
personalidade).

Diferenças práticas:

1. Matéria de culpa:
a. Obrigacional: a culpa do lesante (devedor) é presumida, segundo o artigo
799º.
i. Mais favorável ao lesado, embora existam na extraobrigacional situações de
culpa presumida.
b. Extraobrigacional: é o lesado que tem que provar que a violação desse direito
é imputável ao lesante a título de culpa, a menos que caiba dentro das exceções
em que é presumida, como diz o artigo 487º nº1 (artigo 491º, 492º e 493º nº1,
responsabilidade civil extracontratual subjetiva – relevância negativa da causa
virtual, há presunção de culpa do lesante para equilibrar as partes, como há
presunção de culpa, pode invocar a relevância negativa da causa virtual).
2. Pluralidade de passiva/devedores: há dois ou mais lesantes.
a. Obrigacional: 513º (responsabilidade conjunta), o lesante tem que pedir a
cada lesante a sua parte da dívida, presumindo-se que a quota parte de cada um
é equivalente (516º) – o credor tem que fazer uma ação para cada um e terá
que suportar o risco de insolvência de um dos devedores.
b. Extraobrigacional: 497º e 507º (responsabilidade solidária), o lesado pode
pedir a qualquer um dos lesantes que pague a totalidade da indemnização,
depois ajustando contas os lesantes entre si.
i. Mais favorável ao lesado.
3. Prescrição:
a. Obrigacional, 309º, o crédito prescreve no prazo de 20 anos, mas há outros
prazos: 5 anos e entre 6 meses e 2 anos (prescrições presumidas).
i. Mais favorável ao lesado.
b. Extraobrigacional, 498º, prazo de três anos a partir do momento do
conhecimento dos direitos que lhe assistem, a menos que a responsabilidade
criminal estabeleça um prazo superior, e dentro do prazo de 20 anos, ordinário,
desde a prática do facto.

42
Argumento principal e mais importante.
43
Importantíssimo para o exame e oral.

Rebeca Louro - 2018 56


4. Responsabilidade por facto de terceiro: há determinadas circunstâncias em que
alguém responde, não por um facto seu, mas por um facto de terceiro.
a. Obrigacional, 800º, o devedor que utilize o terceiro, seu auxiliar, no
cumprimento da obrigação, responde por qualquer tipo de danos que esse
cause ao credor, ainda que não esteja sujeito às suas ordens e instruções.
i. Mais favorável ao lesado.
b. Extraobrigacional, 500º, a responsabilidade depende da existência da relação
de comissão, isto é, uma relação de subordinação e dependência – quando o
comitente tem o poder de dar ordens e instruções ao comisário (ex.: empregada
doméstica por via de contrato de trabalho – todo o direito do trabalho, no
exercício da profissão).
5. Pressupostos:
a. Obrigacional, exige-se a capacidade jurídica do lesante, o que só acontece
com a maioridade, com algumas exceções.
b. Extraobrigacional, 488º, a responsabilidade acontece num momento anterior: a
pessoa considera-se imputável quando consiga perceber e querer, a não ser
quando seja inimputável, mas se tenha colocado nessa situação. O nº2 diz que
um menor de 7 anos já é civilmente responsável pelos seus atos, presunção de
existência de responsabilidade civil; 16 anos há responsabilidade criminal; 18
anos há responsabilidade obrigacional.
i. Mais favorável para o lesado.
6. Possibilidade de graduação equitativa da indemnização, a possibilidade de
indemnizar a baixo do valor do dano por inexistir culpa suficientemente grave:
a. Obrigacional, não existe esta possibilidade.
i. Mais favorável ao lesado.
b. Extraobrigacional, 494º (499º, também se aplica às hipóteses de
responsabilidade pelo risco, mas há umas que nunca se aplicam, como as da
culpa).

Concurso de Responsabilidades:

è Um facto ilícito gera danos que, aparentemente, se enquadrariam quer numa hipótese
de responsabilidade obrigacional, quer numa hipótese extraobrigaional. Violação de
direitos absolutos, mas também o incumprimento de uma obrigação.
Responsabilidade civil existirá sempre, mas não é indiferente saber qual o tipo de
responsabilidade que está em causa.
o Concurso aparente de responsabilidades: ex.: um médico radiologista faz o raio-
x e esse mesmo médico por manusear incorretamente o raio-x e causa um dano ao
paciente (integridade física); numa operação que corta um órgão vital de um doente
levando-o a morrer (direito à vida).
§ Cúmulo
• Teoria da opção: o lesado pode optar por lançar mão de umas normas
ou de outras.
o Não compete ao lesado escolher, pois é uma decisão do Tribunal,
que é soberano na interpretação e aplicação do direito ao caso

Rebeca Louro - 2018 57


concreto.
• Ação híbrida: na mesma ação pode aplicar umas regras e\ou outras.
o Pela razão anterior também não parece de ser de acolher.
• Dupla indemnização: há lugar à aplicação de duas ações de
responsabilidade civil autónomas.
o A conduta é una e gerou um único dano, benefício injustificado ao
lesado.
§ Não cúmulo: uma das responsabilidades consome outra, resta saber qual
– princípio da consunção:
• Almeida Costa: primazia da responsabilidade obrigacional, em relação
à extraobrigacional, com todas as consequências jurídicas que adviriam
da sua aplicação:
o Problema específico de uma área vasta e ampla que é o direito das
obrigações, onde é inspirado pelo princípio geral de liberdade e
autonomia privada, como todo o direito privado. Havendo esse
princípio que se traduz, designadamente, numa liberdade de
contratar, se o dano ocorre no âmbito de uma relação jurídica, que
nasce de um acordo de vontades entre o credor e o devedor, mesmo
que na execução dessa obrigação se violem direitos que
extravasam essa relação obrigacional, este princípio essencial
justifica que se atribua a prevalência ao domínio da
responsabilidade obrigacional.
o Mesmo ignorando isto, não podemos deixar de perceber que a
relação jurídica obrigacional, seja de que fonte nasça, não só é
constituída por deveres principais de prestação, mas também por
deveres lateriais de prestação (que nascem do princípio da boa
fé, que impõe que na execução do contrato o devedor haja sempre
com cuidado e respeitando sempre quer o património quer a pessoa
da contraparte).
o Concurso real de responsabilidades: um determinado facto gera dois tipos de
danos diferentes enquadrados em dois tipos de responsabilidade civil, não se
consomem numa só.
§ Ex.: artigo 491º, contrato uma babysitter para tomar conta dos filhos, que são
irrequietos, entretanto ele saltou do sofá e fez um galo, enquanto o fez, deu
um pontapé num objeto, que tinha sido emprestado de uma pessoa amiga,
partindo-o – a babysitter desleixa-se nos deveres de vigilância, incumpre um
contrato e responde por danos provocados a terceiros pelo menor.

Responsabilidade Civil Extracontratual por factos ilícitos – subjetiva:

è A responsabilidade civil extracontratual também se pode designar por delitual ou


aquiliana.

Rebeca Louro - 2018 58


Facto:

è Tem que haver um facto voluntário, comportamento dominável pela vontade do


homem. Só existe quando, analisando o facto que em concreto causou pelo dano, esse
mesmo facto foi voluntariamente praticado, no sentido em que, há uma ação ou
omissão que tivesse ou pudesse ter sido controlada pelo homem. Os casos de força
maior ou factos naturais não geram responsabilidade civil, pois são objetivamente
incontroláveis.
è O facto tem que ser imputável à vontade do homem. Este facto pode revestir uma de
duas formas: ação ou omissão.
è Positivo ou ação: 483º, situação do comportamento positivo – a conduta do agente
constitui um facto positivo ou ação, que viola um dever jurídico de não intromissão
na esfera de outra pessoa.
è Negativo ou omissão: 486º44, levanta algumas questões:
o Comportamento voluntário de não fazer. Mas só gera responsabilidade civil
quando, independentemente dos demais requisitos legais de que depende a
responsabilidade civil (omissão ilícita, omissão culposa, omissão danosa, omissão
esta que é adequada a gerar o dano):
§ Seja por força da lei (ex.: um pai que tem ao seu cuidado filhos menores e
deixa de os alimentar; um polícia que presenceia uma situação de furto ou
agressão na via pública), seja por negócio jurídico (ex.: caso da babysitter
supra), havia o dever de praticar o ato omitido.
o Esta norma, o artigo 486º, foi muito trabalhada na doutrina, que acabou por
estender o seu âmbito de aplicação, interpretando de forma mais lata:
§ Quando diz por força de lei, não se trata apenas de lei civil, mas sim de toda
a ordem jurídica.
§ Quando se diz por força do negócio jurídico, esse negócio jurídico não tem
que ser, necessariamente, válido – surge a figura das relações
contratuais de facto, mesmo que padeça de alguma invalidade, essa
circunstância não isentará de responsabilidade civil a pessoa que
estivesse obrigada a praticar esse mesmo ato (ex.: caso da babysitter da
página 13).
o O dever de agir existe, ao abrigo de uma doutrina penalista45 que se chama
“segurança jurídica no tráfego” ou “deveres de proteção de perigo delitual”:

44
Quando se aplica este artigo, muito provavelmente é uma hipótese prática que também tem o
concurso real de responsabilidade civil, porque gera muitas vezes responsabilidade contratual e
extracontratual.
45
Quando há uma omissão juridicamente relevante, há um problema simultâneo de
responsabilidade civil e responsabilidade penal: o artigo 10º do Código Penal estabelece o
princípio de, quando um determinado crime, para se considerar praticado, pressupuser a verificação
de um determinado resultado, esse resultado tanto pode verificar-se por via de ação, como por
via de omissão. As omissões constituem uma forma típica de se considerar verificada a
responsabilidade criminal.
No próprio Código Penal existe um crime, especialmente previsto e regulado na lei como tal, em
que se censure esta falta de ação de auxílio: artigo 200º, a ordem jurídica e a ordem moral não
estão assim tão longe uma da outra – lei do bom samaritano (ex.: vê-se um acidente na A5 e

Rebeca Louro - 2018 59


quem está obrigado a praticar o ato é a pessoa que legalmente está obrigada
para o efeito, a pessoa que contratualmente está obrigada para o efeito, mas mais
que tudo, a pessoa que por se encontrar numa situação e numa relação de
proximidade com o bem jurídico protegido pela norma, estaria em condições
de, sem esforço adicional para a pessoa, evitar esse mesmo dano – doutrina
que é o colorário da amplicação deste mesmo artigo.
§ Ex.: uma criança numa praia perde o pé, por força da maré, numa praia
vigiada, o nadador salvador tem esse dever legal de socorrer; agora a mesma
situação numa praia sem vigilância, mas há uma senhor na água ao seu
lado, não há obrigação legal nem contratual, se a criança está à sua beira, o
mar está calmo, salvar não requer nenhum esforço adicional, se não o fizer
incorre em responsabilidade civil – diferente se estiver numa situação de
marés vivas no inverno.

Ilicitude:

è Só existe quando o facto voluntário se puder qualificar-se como ilícito.


è Há três formas de ilicitude:
1. Violação de um direito de outrem – 483º, tradicionalmente entende-se que
apenas estão contidos os direitos absolutos, mas a doutrina mais moderna tende
a enteder que também estão contidos os direitos de crédito (doutrina da
eficácia externa das obrigações – já que a expressão direito de outrem é
demasiado ampla).
2. Violação de uma disposição legal destinada a proteger interesses alheios –
483º, comportamentos humanos que violam normas que, embora protejam
interesses particulares, não atribuem direitos subjetivos aos titulares desses
mesmos interesses (ex.: normas do código penal, lei das contraordenações,
código da estrada [que proibe que se circule numa via acima de determinada
velocidade, não atribui direitos subjetivos]). É preciso que estejam reunidos três
requisitos, a saber:
a. À lesão dos interesses corresponda a lesão de uma norma legal: a
lesão dos interesses particulares, onde se consome o dano, corresponda à
ofensa de uma norma jurídica, que imponha, em termos precisos, definidos
e concretos, a adoção de determinado comportamento, e não são
respeitados.
b. Interesses alheios legítimos ou juridicamente protegidos por essa
norma: esses interesses sejam diretamente protegidos pela norma de
proteção e que não sejam por essa apenas reflexamente protegidos.
c. Necessário que a lesão dos interesses particulares se efetive no bem
jurídico ou no interesse que a lei tutela.
3. Abuso de direito, age formalmente no exercício de um direito, mas viola de
forma manifesta seja a boa fé, bons costumes ou a finalidade económica que
determinou a atribuição desse mesmo direito, dessa conduta pode, entre

começa a publicar nas redes sociais “lol este espetou-se” ou “mulheres ao volante perigo constante”,
comete-se um crime, pois não promoveu o socorro dessa pessoa, chamando, por exemplo, o INEM).

Rebeca Louro - 2018 60


outros, decorrer a obrigação de indemnizar todos os prejuízos que dessa conduta
resultar.
è O artigo 483º é suficientemente amplo para incluir todo e qualquer caso de ilicitude
extracontratual. O legislador acabou por tipificar nos artigos 484º (ofensa ao crédito ou
do bom nome) e 485º (prestação de conselhos, recomendações ou informações), o que
não seria necessário, pois já estariam abrangidos no artigo 483º. Mas houver uma
razão para isto.
è Artigo 484º: neste estão contemplados dois comportamentos humanos distintos:
§ Ofensa ao crédito: capacidade que aquela pessoa tem para resolver as
suas obrigações, mas afirma-se um facto que possa pôr em causa essa
capacidade de cumprimento de uma determinada pessoa singular e coletiva
das suas obrigações, incorre-se em responsabilidade civil extracontratual para
com ela.
§ Ofensa ao bom nome: quem afirmar ou difundir um facto que atente
contra o bom nome da pessoa responde pelos prejuízos causados a essa
mesma pessoa.
o Relevância jurídica da exceptio veritatis (exceção de verdade): responde-se pelo
prejuízo que se causa a essa pessoa, mesmo que os factos que esteja a
afirmar ou a difundir seja verdadeiro, embora objetivamente ponha em causa o
bom nome da pessoa? Haverá exclusão da responsabilidade civil, será uma causa
de exclusão específica de responsabilidade civil?
§ Posição minoritária (Pessoa Jorge): é sempre causa de exclusão.
§ Posição maioritária (Antunes Varela): haverá sempre e em qualquer
circunstância lugar à responsabilidade civil.
• Esta posição fez escola até há, relativamente, pouco tempo, o tribunal
não admitia a relevância da exceptio veritatis, pois levanta vários
problemas:
o Não é compaginável com um Estado de Direito Democrático, cujo um
dos pilares é a liberdade de imprensa, se fosse sempre irrelevante
impedia-se o chamado jornalismo de investigação. Porque é que
o legislador consagrou esta hipótese? Em 1966 Portugal não vivia
num regime democrático, esta consagração funcionava como um
aviso para o que se escrevia e o que se dizia, mesmo sendo
verdadeiro a pessoa responde por isso.
o A Constituição tem consagrada como liberdade essencial a
liberdade de imprensa e pareça que não se deva admitir a
irrelevância total da exceptio veritatis, também consagra com o
mesmo valor jurídico o direito ao bom nome, à honra, à reserva
da intimidade da vida privada da pessoa. São direitos que se
encontam no mesmo plano e têm a mesma dignidade e
importância jurídica.
§ Posições intermédias e mais recentes (Almeida Costa, Menezes Leitão e
Menezes Cordeiro): não existirá responsabilidade civil se a divulgação dos
factos for verdadeira e se se detinar a assegurar interesses legítimos (o
dever público de informar a comunidade de factos que são relevantes) ou se
se destinar a salvaguardar um direito do próprio agente.
• O Professor Antunes Varela só admitia a relevância nas situações em

Rebeca Louro - 2018 61


que a afirmação de um facto fosse feita no cumprimento de um dever
jurídico (ex.: testemunhar).
o Este artigo ganhará mais ou menos importância, consoante a imprensa seja mais
ou menos agressiva e exerça a sua liberdade de forma mais irresponsável.
è Artigo 485º: se alguém pratica um facto e ao fazê-lo sofrer um dano, na sequência
de uma recomendação, conselho ou informação que lhe foi prestada por terceiro,
esse terceiro não é responsável, ainda que tenha agido negligentemente, todavia, se o
terceiro o tiver feito dolosamente, já responde. O nº2 excetua esta regra da
irresponsabilidade:
1. Quando alguém tenha assumido a responsabilidade pelos danos (ex.: eu
dou conselhos e assumo as consequências que advenham desse conselho).
2. Quando existia o dever jurídico de dar conselho, recomendação ou
informação e se tenha procedido com negligência ou intenção de
prejudicar (ex.: funcionário da Câmara Municipal que diz ao particular que
aquele terreno é urbanizável).
3. Com a prática de um conselho, recomendação ou informação, esse
próprio procedimento constituir a prática de um facto punível, de um
crime (ex.: dar um conselho que consiste na prática de um crime e se for
cometido e dali resultar um dano).
o Em regra, não há responsabilidade civil quando alguém dá um conselho, uma
recomendação ou uma informação, pois este tipo de prestações são feitas por
critérios de mera cortesia social e fundados numa lógica de mera
obsequiosidade e muitas vezes efetuados em termos até algo displicentes.
Por conseguinte, tem que ser o agente que o recebe e que age com base neles, a
tomar, em última análise, uma decisão esclarecida, se segue ou não esses
conselhos, suportando os riscos decorrentes dessa mesma situação.

Causas de exclusão ou justificação da ilicitude:

è Regular exercício de um direito, não atua ilicitamente, mas é preciso atender ao


artigo 335º: se alguém, não agindo em abuso de direito, se limitar, regular, formal e
materialmente, a exercer um direito que a lei lhe confere e acabar por praticar um
facto danoso, não incorre em responsabilidade civil (ex.: se for caçador e tiver uma
licença de caça que permite caçar no terreno que é propriedade de um terceiro, este
não tem o direito de exigir qualquer indemnização).
è Cumprimento de um dever jurídico: se alguém se limitar a praticar um facto, que
quer, assume e resulta do cumprimento de um dever a que está adstrito, mas
desse mesmo dever acabar por praticar um dano numa esfera patrimonial alheia,
não responde por esse dano (ex.: médico que recebe dois doentes no hospital, ambos
carecidos de uma transfusão imediata de sangue, mas o médico só tem uma dose das
duas que seriam necessárias, o médico tem que tomar uma decisão, “play as god”, tem
o dever ontológico de salvar o maior número de vidas possíveis, mas numa
decisão destas tem que tomar uma decisão – escolhe aquele que tem mais
probabilidades de sobreviver, mas esta ilicitude é justificada).
o Não se pode praticar factos ilícitos invocando ter recebido ordens hierárquicas, se
esses constituirem a prática de crimes.

Rebeca Louro - 2018 62


è Modalidades de justificação de ilícitude típicas: artigo 336º (ação direta), 337º e, 338º
(legitima defesa), 339º (estado de necessidade) e 340º (consentimento do lesado). Têm
em comum:
§ A ideia de não ser possível recorrer em tempo útil aos meios coercitivos
normais – indispensabilidade do recurso às autoridades públicas.
§ A ideia da proporcionalidade, quando alguém age numa destas
modalidades, tem que lesar o menos possível o bem jurídico de terceiros
para tentar salvaguardar o bem jurídico próprio ou de outrem, que estava a
ser lesado (mas este critério não é bem idêntico em todos, v.g. a legitima
defesa permite causar um dano maior do que aquele que o agressor pretendia
ver sofrido, é uma forma de reação em defesa passiva, ao contrário da ação
direta e do estado de necessidade em que se age).
o Ação direta, 336º: tem iniciativa e domina os eventos, recurso à força com o fim
de realizar ou assegurar o próprio direito:
1. Realizar ou assegurar um direito próprio, ação pelo próprio lesado.
2. Indispensabilidade: impossibilidade de recorrer, em tempo útil, aos meios
coercivos normais, para evitar a inutilização desse direito.
3. Não pode exceder o estritamente necessário para impedir o prejuízo.
4. Proporcionalidade, nunca será lícita a sacrificação de interesses
superiores aos que se visam defender.
o Legitima defesa, 337º: realizada pelo próprio titular de um direito, ou por um
terceiro, contra uma agressão atual e ilícita a esse direito - reação:
1. Agressão atual e ilícita contra a pessoa ou o património do próprio ou de
terceiros – não tem que ser culposa, mesmo que seja a um inimputável.
2. Impossibilidade de recorrer aos meios coercitivos normais.
3. Proporcional/Adequado: não se pode causar um dano superior ao mal
que se pretenda evitar, mas o excesso considera-se lícito, desde que
não seja manifestamente excessivo (exclusão de ilicitude).
o O nº2 do 337º não é uma causa de justificação da ilicitude, é já uma
causa de exculpação – o ato é ilícito, mas não gera
responsabilidade civil, porque não há culpa (medo invencível do
agente).
o Erro de que estão preenchidos os pressupostos, 338º: não é por isso que deixa
de ser ilícita, a menos que o erro seja desculpável, aí não será obrigado a
indemnizar os prejuízos causados.
o Estado de necessidade, 339º: o sacrifício de coisas ou direitos patrimoniais
alheios, inclusive através do ato menos prejudicial do seu simples uso.
§ Requisitos:
1. Perigo atual.
2. Esse perigo ameaçar um direito ou bem jurídico relativo à pessoa
ou ao património do agente ou terceiros.
3. Necessidade: meio necessário para preservar o direito ou bem
jurídico em causa.
4. Interesses defendidos devem ser manifestamente superiores aos
sacrificados.
§ Responsabilidade por factos lícitos, não há ilicitude, porque há estado de
necessidade, 339º nº2. Mas terá que indemnizar se o perigo tiver sido

Rebeca Louro - 2018 63


causado por sua culpa exclusiva por ter causado um dano (ex.: para não
atropelar uma criança no meio da estrada que foi buscar uma bola, enfaixa-se
num carro que está estacionado). Em qualquer outro caso (quando não foi ele
que criou o perigo que depois teve que remover) o tribunal pode fixar uma
indemnização equitativa.
§ Outro exemplo de responsabilidade por factos lícitos, mas de
responsabilidade civil contatual – artigo 81º.
o Consentimento do lesado, 340º: pressupõe que o facto danoso tenha sido
praticado com base numa permissão do próprio agente que sofreu o dano
(ex.: combate de box, consentiu que a sua integridade física fosse lesada;
consideram-se incluídas todas as lesões efetuadas na integridade física de um
jogador de futebol, de um praticante de rugby, que as sofre no decorrer normal de
uma partida de futebol ou de rugby). Pode ser:
§ Expresso: quando se baseia numa declaração de vontade expressa do
titular do direito lesado
§ Tácito: quando resulte de factos que com toda a probabilidade fazem
depreender a aceitação (ex.: a simples participação em atividades
particularmente perigosas envolve, necessariamente, o consentimento do
lesado, excluídos os casos de dolo do lesante e de inobservância das regras
do jogo).
§ Presumido (ex.: situação típica de um agente que entra em situação de coma
num hospital e não pode, nem expressa nem tacitamente, aceitar que seja
objeto de uma intervenção cirúrgica).

Culpa:

è Só existe responsabiliade civil independentemente de culpa, nos casos e nos termos


especialmente previstos na lei – artigo 483º nº2.
è A culpa distingue-se da ilicitude46, são dois requisitos da responsabilidade civil analisam
e exprimem realidades distintas:
o A ilicitude analisa a conduta voluntária do agente no prisma objetivo, ou seja,
é ilícito o comportamento que, ou constitui abuso de direito, ou viola uma regra de
proteção, ou viola um direito de outrem. Análise desprovida de qualquer tipo de
considerações sobre a mente e a intenção do agente.
o A culpa analisa o facto voluntário do agente sobre o prisma subjetivo,
basicamente considera-se que o facto voluntário é culposo quando nos
apercebemos que o agente omitiu um conjunto de deveres mínimos de
diligências que não podia ter deixado de observar no caso concreto, há dois
requisitos:
§ Imputabilidade: só é suscetível de agir com culpa a pessoa que tinha, antes
de agir, conhecimento daquilo que deveria ser a sua conduta no caso
concreto (uma criança não pode nunca ser, em princípio, sujeito de um jurízo
de culpa).

46
Pergunta típica em sede de ORAL.

Rebeca Louro - 2018 64


§ Censurabilidade: depois de ter conhecimento daquilo que deveria fazer a sua
conduta é censurável, porque o agente orienta e pauta o sentido da sua
conduta no exato sentido contrário àquele que deveria ter seguido.
Olhando para o caso concreto nenhum motivo ou justificação existe para
justificar o afrouxamento das diligências.
è Os pressupostos da culpa são dois, já avançados:
o Imputabilidade, artigo 488º: a regra é a de que só é imputável quem tinha
capacidade de entender e querer o resultado da sua conduta, a não ser que se
tenha culposamente colocado numa situação de inimputabilidade – presume-
se a inimputabilidade nos interditos por anomalia psiquica e nos menores de 7
anos.
§ O artigo 489º condena inimputáveis a pagar total ou parcialmente os danos
causados, com dois limites:
• Se for impossível recorrer a outras pessoas para responder pelo
inimputável – à partida haverá um tutor que responderá ao abrigo do
artigo 491º (as crianças têm que ter um guardião e os interditos por
anomalia psíquica não estão necessariamente internados numa
instituição).
• Não pode privar o inimputável de alimentos necessários, conforme o
seu estado e condição, nem dos meios indispensáveis para cumprir os
seus deveres legais de alimentos.
o Censurabilidade: verifica-se que o agente não só sabia o que deveria ter feito,
como fez exatamente o contrário, não havendo nenhuma conduta ou fator que
possa justificar o que sucedeu, sendo essa conduta reprovável.
è Graus de culpa: durante muito tempo, a questão de saber se o agente agira com dolo
ou negligência era absolutamente irrelevante, pois não tinha qualquer relevância para
efeitos do que era a medida da obrigação de indemnizar. Daí que os autores tivessem
ido buscar indemnização ao direito penal, onde o fator de culpa foi sempre importante:
o Dolo direto: agente que representa, antes de agir, na sua cabeça, as
consequências danosas da sua conduta e move a sua conduta no sentido de
ver as concretizadas da sua parte (ex.: A aponta a pistola a B e dispara,
morrendo B).
o Dolo indireto ou necessário: o agente, antes de agir, representa na sua cabeça
o facto que vai praticar como uma consequência absolutamente necessária de
um dano que não quer, mas que se torna querido por se tratar de uma
consequência necessária da sua conduta. O agente não quer o dano, mas sabe
que o dano é uma consequência inevitável do que vai ser a sua conduta (ex.: A
quer pegar fogo à casa de B, seu inimigo, sabe que no último andar da casa de B
está C acamada, sua mãe, e que esta não conseguiria fugir. Não quer matar C, mas
quer pegar fogo à casa).
o Dolo eventual: pode, basicamente, resumir-se à expressão muito portuguesa do
“que se lixe”. O agente, antes de agir, representa as consequências
possivelmente danosas da sua conduta na sua mente, não são uma
inevitabilidade, ele não quer dano, mas antes de agir e praticar a conduta que
admite que possa vir a praticar o dano, não confia que o dano não se venha a
verificar (ex.: A vai ao Bairro Alto beber uns copos à noite, leva o seu carro, antes
de regressar a casa entra no carro e questiona-se se será capaz de levar o carro

Rebeca Louro - 2018 65


até casa – sim –, de o parar no lugar de garagem, que é um lugar apertado, sem
bater em nenhum dos carros – não garante, não sabe mas acha que sim. Antes de
enfiar o carro na garagem parte 4 ou 5 carros).
§ Anda a paredes meias da negligência consciênte.
o Negligência consciente: o agente, tal como o dolo eventual, representa na sua
cabeça como possível uma certa consequência danosa, também não quer,
mas ao contrário do dolo eventual, o agente antes de agir confia que esse
resultado não se vai verificar e verifica-se (ex.: exemplo do condutor bêbado,
mas respondendo à última pergunta como achando-se capaz de estacionar na
garagem sem bater em nenhum carro).
§ No direito das obrigações, saber se o agente agiu com dolo eventual ou
negligência inconsciente é irrelevante, agiu com culpa. Mas no direito penal
isto pode significar a diferença entre uma pessoa considerar-se culpada ou
não pela prática de um crime, pois ninguém comete crimes por negligência
(há algumas exceções), ou nos casos de crimes que admitem a negligência,
como o caso do homicídio, saber se agiu com negligência consciente ou dolo
eventual faz diferença quanto ao tempo de encarceramento.
o Negligência inconsciente: o agente nem sequer representou na sua cabeça as
consequêncas danosas da sua conduta (ex.: A está a andar virou-me e partiu
uma jarra da dinastia Ming que nem se apercebeu que lá estava).
è Como se aprecia a culpa? Artigo 487º:
o Nº1: o lesado tem que provar a culpa do lesante, a não que estejamos no âmbito
das presunções legais, já mencionadas.
o Nº2: critério de apreciação da culpa47:
§ Qual é a diferença entre a culpa:
• Em concreto: compara-se a conduta do agente concreta, com a
conduta que esse mesmo agente utilizaria em casos similares
(utilizada na gestão de negócios).
• Em abstrato: compara-se a conduta concreta do agente com a
conduta que um bom pai de família, do homem médio colocado nas
mesmas circunstâncias, teria praticado, se usar diligência inferior há
culpa (apenas em culpa grave ou leve, mas não levíssima, à exceção de
um caso, analisado infra).
§ Qual é o critério utilizado pelo legislador? O da culpa em abstrato, do bom
pai de família.
è Há situações em a responsabilidade pressupõe a culpa, mas esta última considera-se
pressumida (inversão do ónus da prova), embora ilidível – artigo 491º, 492º e 493º nº1
e 2. Cada uma delas assenta numa lógica própria:
§ Artigo 491º: responsabilidade dos vigilantes por danos que os vigiados
causem a terceiros.
§ Artigo 492º: o proprietário ou possuidor de um edifício que ruíndo ou
deteriorando-se causando danos a terceiros.
§ Artigo 493º:
• Nº1: alguém que tenha o encargo ou de vigiar um animal, ou uma coisa
móvel ou imóvel, responde por todos os danos que esses causarem a
terceiros.

47
Prova ORAL.

Rebeca Louro - 2018 66


o Estas três normas baseiam-se numa presunção de culpa e além de o lesante
poder afastar esta presunção e não responder, pode invocar, excecionalmente, a
relevância negativa da causa virtual, dentro do que seria uma lógica de
equilibrio, segundo Antunes Varela.
• Nº2: danos causados no exercício de uma atividade considerada
perigosa, seja pela sua própria natureza, seja pela natureza dos meios
empregues.
o Também se consideram incluídos os acidentes de viação?
§ A posição que triunfou é a de que não estão incluídos, geram
responsabilidade objetiva, que já é um regime benéfico para
o próprio lesado, que não precisaria também de beneficiar da
presunção de culpa, do artigo 493º nº2.
§ Menezes Leitão: há certos acidentes de viação que estão
abrangidos pelo artigo 493º nº2 – aqueles acidentes que
ocorrem em circunstâncias específicas tais que agravam
aquilo que é o risco de perigosidade inerente a uma
atividade de viação (ex.: ralis, provas desportivas, condução
sobre o efeito de drogas e alcóol).
o Neste preceito falta uma coisa: não está lá a relevância negativa da causa
virtual, a única forma que o lesante tem de não responder é demonstrar que o
lesante adotou todas as providências legalmente exigidas para a não consumação
do dano. Entende-se que este artigo é o único caso no ordenamento jurídico em
que se sanciona a culpa levíssima, pois o ilícito é praticado no exercício de uma
atividade perigosa.
è Pode haver vários autores, instigadores ou auxiliares do ato ilícito – todos eles
respondem pelos danos que hajam causado, a sua responsabilidade é solidária,
artigo 497º. Existirá a sua reponsabilidade, mesmo que tenham atuado em atos
isolados e sem plano conjunto, assim como também se concebem hipóteses de meros
encobridores.
è Há três tipos de culpa:
o Grave: consiste na omissão manifesta dos deveres mínimos de diligência do
bom pai de família.
o Leve: consiste na omissã dos deveres mínimos de diligência de um bom pai de
família.
o Levíssima: o que se omite já são deveres que nem o próprio bom pai de família
iria ter.
è Causas de exclusão da culpa: não gera responsabilidade civil, porque há uma causa
que justifica a culpa:
o Medo invencível: artigo 337º nº2.
o Desculpabilidade (ex.: médico num teatro de guerra no Vietnam, a certa altura
engana-se a ministrar uma substância a injetar num soldado, que em vez de
provocar alínio, causam a morte).
o O agente agir supostamente em legitima defesa ou ação direta, artigo 338º,
considerando que estão verificados os pressupostos da sua conduta, mas na
realidade os presupostos não existem (ex.: A vai num beco escuro à noite, onde
costuma haver assaltos, a certa altura vê um vulto a aproximar-se, que por uma
brincadeira estúpida simula um assalto, puxa uma pistola que era de carnaval, A

Rebeca Louro - 2018 67


dá-lhe uma facada e morre, depois vindo-se a descobrir que não era uma pistola a
sério).

Dano:

è Na lógica tradicional, dá-nos a medida da obrigação de indemnizar – finalidade


essencialmente reparadora ou reintegrativa. Traduz-se na diminuição do valor de um
ativo que exista no património do lesado, quando seja um dano patrimonial.
è Dano ou prejuízo é toda a ofensa de bens ou interesses alheios protegidos pela
ordem jurídica.
è Há diferentes tipos de danos:
o Danos patrimoniais e não patrimoniais – se são; ou não suscetíveis de
avaliação pecuniária.
o Danos pessoais e não pessoais – consoante se verifiquem em pessoas; ou em
coisas.
o Danos reais e de cáculo – se se trata do prejuízo que o lesado sofreu em sentido
naturalístico; ou se consiste na expressão pecuniária de tal prejuízo (avaliação
abstrata ou avaliação concreta – diferença para menos produzida no património do
lesado, teoria da diferença do artigo 566º nº2).
o Danos emergentes e lucros cessantes – averiguação da perda ou diminuição
de valores já existentes no património do lesado; ou dos benefícios que ele
deixou de obter em consequência da lesão.
o Danos presentes e futuros – se já se verificaram ou não no momento que se
considera, designadamente à data da fixação da indemnização.
§ Os danos futuros subdividem-se em certos e eventuais – produção infalível
ou possível apenas.
o Danos direitos e indiretos – se resultam; ou não do ato ilícito.
o Danos positivos ou de cumprimento e negativos ou de confiança – violação do
interesse contratual positivo; ou negativo.

Problemática dos Danos Não Patrimoniais:

è Como se resolve o problema dos danos morais reflexos, isto é, o dano moral que
uma pessoa sofra em resultade de um dano causado a um terceiro que não
morreu – regime do artigo 496º.
è O nº1 é uma norma incompleta, não diz quem são os titulares do direito à
indemnização por danos morais, é incompleta neste sentido, pois apenas delimita o
objeto do dano moral indemnizável, aquilo que pela sua gravidade o julgador entenda
ser suscetível de merecer a proteção do direito e da ordem jurídica.
è O nº2 delimita o titular do crédito indemnizável pelo dano moral, quando de um facto
ilícito resulte a morte de alguém.
è O nº3 protege as uniões de facto, semelhante ao nº2.

Rebeca Louro - 2018 68


è O nº4 constitui um desvio à teoria da diferença do artigo 566º nº2, ao estabelecer que
o cômputo da obrigação de indemnizar se faz por via da equidade48.
è Problemas:
1. Quando morre uma pessoa no âmbito de um facto suscetível de gerar
responsabilidade civil, a família própria, de sangue, é titular deste direito de
indemnização (acórdão de uniformização de jurisprudência nº6/2014 – um pai
de família morre num acidente de carro por culpa exclusiva sua e a família pede
uma indemnização pelos danos patrimoniais sofridos pela morte do condutor)?
§ Decisão do STJ: o seguro obrigatório é um seguro de responsabilidade civil,
visa cobrir os danos que o condutor causa a outrem, no caso não
havendo nenhum terceiro, não há como indemnizar os familiares,
pressupõe uma visão do artigo 496º nº2 numa lógica reflexiva, como
resultando do dano morte que o lesado sofreu, não atribui um direito de
crédito próprio aos familiares.
§ Almeida Costa: nos últimos instantes de vida que precederam a morte, o
lesado adquiria um direito a uma indemnização pelo dano morte que lhe é
causado, que se transmitiria mortis causa aos seus sucessores, portanto,
o artigo 496º nº2 tem um âmbito mais restrito, nesta lógica reflexiva, dos
danos que daí resultassem – ou seja, nos últimos segundos de vida o de
cuius adquire esse crédito indemnizatório de um dano que só se viria a
verificar uns segundos depois, que será atribuído reflexamente aos familiares.
• Não é um direito próprio das pessoas do artigo 496º, não nasce
originariamente na sua esfera jurídica, é atribuído de forma reflexa.
§ Antunes Varela: não se pode transmitir um direito adquirido mortis causa, se
já não é possível ser titular de direitos e estar adstrito a obrigações, ou seja, já
não tem personalidade jurídica para surgir esse mesmo direito, que se
há de refletir para a esfera jurídica dos familiares. Assim, o artigo 496º nº2
constitui uma fonte autónoma da obrigação de indemnizar os familiares da
pessoa que morre, indemniza-se o dano morte que ocorreu, mas na
perspetiva dos familiares, o sofrimento e dor, entre outros danos, que o
dano morte lhes produziu.
• É um direito próprio, autónomo das pessoas do artigo 496º, nasce por
via da violação de direitos seus.
§ Maria dos Prazeres Beleza (voto de vencido neste mesmo Acórdão): se é
fonte autónoma de indemnizar, então há um incumprimento de um dever do
próprio pai de família para com a sua própria família, que o constituiria
numa obrigação de indemnizar pelo dano morte que a família sofre, a
seguradora deverá substituir-se ao de cuius e indemnizar os famíliares
(parece um seguro por danos próprios e não de responsabilidade civil).
Aquelas pessoas são titulares de um direito próprio, não são perspetivadas
como terceiros nesse sentido, então, numa lógica de tutela dos lesados e da
família, o próprio pai de família que falece age em culpa própria, torna-se
lesante (o pai de família que tem o acidente, por culpa sua, viola o direito da
sua mulher e filhos de viverem em família) e os lesados são a família do de
cuius (transfere a sua responsabilidade civil para com terceiros para a
companhia de seguros, da mesma maneira que do seu acidente resultasse

48
Pergunta típica de ORAL.

Rebeca Louro - 2018 69


uma morte ou ferimentos de um terceiro, a companhia teria que indemnizar,
mesmo tendo morrido o condutor) – quais os seus direitos violados que
constituem obrigações do pai de família:
• Deveres do pai de família para com os familiares do pai de família: a
Constituição da República Portuguesa consagra direitos, liberdades e
garantias e no artigo 36º não se aplica só no casamento, todos têm o
direito a constituir família, independentemente de casamento, não
obriga nem exige a sua celebração.
2. Um acórdão decidido no Tribunal da Relação de Coimbra (1996): direito a
indemnização por danos morais reflexamente sofridos por terceiros em que não
há lugar à morte da vítima (história – uma família tinha um filho menor que
deixavam numa creche, gerida pela Santa Casa da Misericórdia, antes de irem
trabalhar. Um dia houve um curto circuito, que originou o incêndio e se propagou
imediatamente para o berço da criança, que estava ao pé de uma tomada,
deixando-a queimaduras graves, sem, contudo, ter provocado a sua morte – os
pais alegaram que cortaram o futuro, em condições de normalidade, da criança;
pediam uma indemnização pela própria dor e sofrimento físico e moral que a
própria criança experienciou durante o incêndio e depois [quatum doloris]; por fim,
alegavam que os próprios pais sofreram horrores por ver o filho naquela
circunstância e pretendiam auferir uma indemnização por essa angústia) –
aconteceu também noutro caso recente em que um homem teve um acidente e
ficou paraplégico e a sua mulher pediu uma indemnização pelos danos morais
reflexamente sofridos.
§ Ré: o único caso em que, pessoas que não tivessem eles próprios sofrido a
lesão de qualquer direito existente na sua personalidade jurídica, tivessem
direito a uma indemnização, seria no caso de ter ocorrido a morte da
vítima – a lei é o que é (dura lex sed lex), não há norma jurídica que permita
assegurar este fundamento.
§ Supremo Tribunal de Justiça: reconhece, pela primeira vez em 1996, o
direito à indemnização em caso de danos morais reflexamente sofridos por
terceiros. O nº1 do artigo 496º é uma norma incompleta, completa-se com
o artigo 483º nº1. Quem deve indemnizar: quem tenha violado o direito de
outrem (direito absoluto), é preciso encontrar o direito que tenha sido
violado dos pais (direito à constituição de família, de ver os seus filhos
crescer em condições de segurança mínimas) e da mulher (direito a constituir
família com o seu marido) – direito à constituição da família, artigo 36º da
Constituição. A indemnização é fixada com base na equidade, segundo o
nº4.

Nexo de Causalidade:

è Teoria da causalidade adequada, artigo 563º: há nexo de causalidade quando:


o Em concreto: quando o facto em concreto é causa do dano – por isso é que não
há relevância positiva da causa virtual.
o Em abstrato: quando o facto se mostra, em termos abstratos, adequado à
produção do dano – lógica de normalidade e probabilidades.

Rebeca Louro - 2018 70


Poderá haver causalidade indireta, desde que não seja levada ao extremo,
§
no sentido de admitir a relevância de todo e qualquer evento. É preciso fazer
o teste da adequação abstrata de evento para evento, por ordem
cronológica, desde que o nexo causal não seja quebrado, se for já não se
poderá considerar o primeiro como causa adequada em abstrato do último
evento.
è Outras teorias apresentadas ao longo do tempo49:
o Teoria da equivalência das condições/Conditio sine qua non: toda e qualquer
condição que tenha concorrido para a prática do dano – causalidade indireta
(adequada a causa da causa que causou o dano), alargamento dos responsáveis.
§ Está na base da teoria da causalidade adequada, mas não pode ser levada
ao extremo, se não admitir-se-ia a relevância positiva da causa virtual.
o Teoria da última condição ou da causa próxima: dano provocado em resultado
da sequência de um conjunto de factos que se sucederam uns aos outros,
considera-se a causa do dano o facto mais próximo deste (ex.: alguém é
aprisionado numa jaula com leões esfomeados – a causa relevante é o facto da
pessoa morrer na sequência do ataque dos leões) – restringe os reponsáveis.
o Teoria da condição eficiente: condição mais relevante para a produção do
dano – conduz a uma arbitrariedade e discricionariedade por parte do julgador.
o Teoria do escopo ou do fim da norma jurídica violada: se os danos que
resultarem desse facto corresponderem às utilidades que a norma pretendia
proteger. Analisa todos os eventos que concorreram para a produção do dano e só
considera aquele evento como causa do dano, se esse mesmo evento for o evento
que contribuiu para a produção do dano, que é o que a norma jurídica que
estava a ser violada, pretendia que não ocorresse – arbitrariedade e
discricionariedade por parte do julgador.

Relevância negativa ou positiva da causa virtual.

è Causa virtual: o facto, em condições normais, era apto a provocar o dano, mas
apenas não provoca porque entre o facto e o dano intervém outro facto que
provocou o dano efetivamente.
è Eventual relevância positiva da causa virtual: o autor da causa virtual não pode
ser chamado a indemnizar pelos danos, pois não foi a causa em concreto, logo, não
há nexo de causalidade.
è Eventual relevância negativa da causa virtual: o autor da causa virtual pode ser
chamado a indemnizar os danos causados, nos casos do artigo 491º, 492º e 493º
nº1, pois o autor real não indemniza. Ao presumir-se a culpa do lesante, podendo esta
presunção ser afastada, tem que se equilibrar esta situação, só comprova que a
responsabildiade civil tem, de facto, uma lógica punitiva ao obrigar a indemnizar pelo
566º nº2, visa punir também.
o Galvão Teles: responsabilidade pelo efeito parcial do evento. O autor da causa
virtual não responde pelo dano final, mas responde por todos os prejuízos que
em concreto gerou, até à verificação do dano real causado por outro facto
real.

49
Pode sair em ORAIS.

Rebeca Louro - 2018 71


Obrigação de Indemnizar:

è Os artigos 562º e 566º nº1 dizem que a regra é a da reconstituição natural. Se não
for possível recorre-se à indemnização em dinheiro. Teoria da diferença, do artigo
566º nº2, diferença entre a situação patrimonial atual e a situação patrimonial
hipotética do lesado, sem prejuízo de outras disposições de acordo com o critério da
equidade, quando a lei o permita.

Responsabilidade Civil Extracontratual Objetiva:

è Determinada pessoa, no exercício de uma atuação lícita que, por si só, for suscetível
de causar danos a terceiro, responde por todas as consequências, que no exercício
dessa conduta lícita, decorrerem a terceiros, ainda que essa mesma conduta não
tenha sido praticada com qualquer tipo de culpa da parte do agente.
è É uma solução, uma lógica absolutamente excecional, que decorre do artigo 483º nº2 –
apenas nos casos previstos na lei.
è Casos de Responsabilidade Objetiva previstas na lei em sentido mais amplo que o
Código Civil:
o Artigo 500º: comitente comissário.
o Artigo 501º: Estado e Pessoas Coletivas Públicas – aplica-se o regime do 500º, por
remissão.
o Artigo 502º: utilização de coisas perigosas (animais).
o Artigo 503º a 508º: acidentes de viação.
o Artigo 509º a 510º: instalações de energia elétrica e gás.
o Há também noutros diplomas:
§ Por acidentes no trabalho, é a entidade patronal que responde,
independentemente de culpa sua, a danos que o trabalhador venha a sofrer
no exercício da sua atividade laboral.
§ Do produtor por venda de produtos defeituosos (ex.: falha súbita dos travões,
v.g. um carro que parava quando chegava aos 120 km\h) – objeto de
transposição para o ordenamento jurídico português de diretiva comunitária.
§ Por danos ambientais, área do direito do ambiente.
è Em todas as modalidades de responsabilidade objetiva assentam no mesmo princípio e
no mesmo fundamento, inspirado na teoria do risco.
o Teoria do risco: quem exerce uma atividade que seja suscetível de provocar danos
a terceiros, é justo que, retirando as valências, os benefícios e as comodidades,
responda por todos os danos causados a terceiros, mesmo que não haja
culpa por parte do agente.
§ Subteoria do Risco criado: quem cria a situação de perigo, responde pelos
riscos (ex.: fábrica que utiliza meios poluentes).
§ Subteoria do Risco proveito: cada pessoa responde pelos danos
decorrentes de uma atividade da qual retire proveito (ex.: acidentes de
viação).
§ Subteoria do Risco autoridade: todos respondem pelos danos das
atividades que tem sobre controlo (ex.: comissário e comitente).

Rebeca Louro - 2018 72


Comitente e Comissário:

è Regime previsto no artigo 500º, que também se vai aplicar, por remissão, ao artigo
501º quando agentes do Estado e\ou das Pessoas Coletivas Públicas não estejam
dotadas de jus imperii, ou seja, na sua gestão privada (ex.: negligência médica de um
hospital público – responde o médico e o Estado).
è Requisitos:
1. Relação de comissão: relação de subordinação e hierarquia, vínculo jurídico no
qual se verifica um desequilibrio de posições (o comitente tem o poder de dar
ordens ao comissário – o dever de obediência hierárquica do comissário só cessa
quando as ordens constituam crime)50.
§ Para que se aplique o artigo 500º não é necessário que exista liberdade do
comitente na escolha do comissário, pois a responsabilidade do comitente
é objetiva, isto é, é independente de culpa.
§ Poderá, todavia, haver responsabilidade civil extracontratual subjetiva do
comitente quando haja também culpa do comissário, havendo
responsabilização solidária, o que só acontece em três casos – artigo 483º:
• Culpa in eligendo.
• Culpa in instruendo.
• Culpa in vigilando.
2. Responsabilização do comissário: se conseguir imputar ao comissário a prática
de um facto voluntário, do qual resulte a sua responsabilização.
§ Toda e qualquer tipo de responsabilização do comissário é suficiente para
admitir a responsabilização do comitente?
• Antunes Varela e Menezes Leitão: só há responsabilidade objetiva do
comitente se o comissário responder a título de culpa provada (artigo
483º). Se não houver responsabilização do comissário com base em
culpa provada, também não poderá haver responsabilização objetiva do
comitente sem culpa – o artigo 500º nº3 diz “excepto se houver
também culpa da sua parte”, se o comissário tiver praticado um facto
lícito, de que resulte excecionalmente responsabilidade civil, vide estado
de necessidade, ou que gere responsabilidade objetiva, vide acidente de
viação, já não haveria responsabilidade do comitente.
• Maria da Graça Trigo: pode haver responsabilização do comitente sem
culpa nos casos em que o comissário responde também sem culpa ou
responde na prática de um facto ilícito:
o O artigo 165º remete para o 500º e não distingue situações em que
haja culpa ou não do agente.
o O artigo 500º nº3 fala em “também”, mas a expressão não pode ser
interpretada no seu sentido rigoroso, o que a lei quer dizer é que o
comitente goza do direito de regresso sobre o comissário,
exceto se houver culpa da sua parte, isto quer dizer “além de haver
culpa da sua parte”.

50
MENEZES LEITÃO (voz isolada na doutrina) diz que também poderia haver situações de
responsabilização objetiva do comitente fora da relação de comissão – o nº2 diz que não é
excluída a responsabilidade do comitente, se o comissário violar as instruções do comitente.
JOÃO TIAGO, trata-se de um problema do terceiro requisito.

Rebeca Louro - 2018 73


§ A lógica desta reponsabilização objetiva:
• Obriga as pessoas que contratam pessoas a serem
diligentes na contratação.
• Garantia das obrigações, pois a empresa tem mais
património – o lesado deve poder contar com um
património mais amplo para poder salvaguardar a sua
posição jurídica – o que não encerra nenhum prejuízo para
o comitente, a menos que também tenha culpa, pois tem o
direito de regresso.
3. Ato praticado no exercício das funções de comissão: se o ato é praticado no
exercício ou por ocasião das funções do comissário, há duas balizas:
§ Se for por ocasião das funções não há responsabilidade objetiva do
comitente.
• Antunes Varela: teoria da causalidade adequada – o ato deverá
considerar-se praticado no exercício das funções desde que haja um
nexo de causalidade entre:
o Facto danoso.
o A sua atividade.
o Os bens e\ou utensílios\instrumentos entregues pelo comitente
ao comissário para o exercício dessa atividade.
§ Há responsalidade mesmo que o ato tenha sido praticado contra as
instruções do comitente – artigo 500º nº2 (ex.: contrato dois seguranças
para uma festa e peço para não baterem em ninguém, para não arranjarem
confusão, mesmo estando lá a ex-namorada de um deles com o seu
namorado atual, ainda assim ele bate – há responsabilização do comitente,
mas é objetiva).
è O artigo 500º nº3 fala no direito de regresso – trata das relações internas, entre o
comissário e o comitente, depois do comitente ter pago a indemnização a terceiro (a
culpa não é relevante no plano das relações externas), este tem o direito de pedir do
comissário tudo o que tiver pago a terceiros, a menos que haja culpa da sua parte.

Animais:

è Diferenças na aplicação dos artigos, ambos potencialmente aplicáveis a casos em que


haja animais:
o 502º: responsabilidade civil extracontratual objetiva.
§ Não pressupõe culpa.
§ Os danos resultam da sua especial perigosidade (ex.: o cão solta-se da trela
e morde uma pessoa).
§ Apenas responde pelo dano do animal o detentor deste – colhe os
benefícios de ter o animal (proprietário, usufrutuário, locatário, comodatários
ou possuidores em nome próprio).
o 493º nº1: respondabilidade civil extracontratual subjetiva.
§ Pressupõe culpa, mas é presumida.
§ Não resulta da perigosidade especial (ex.: o cão está à porta de casa a

Rebeca Louro - 2018 74


apanhar sol, a visita despede-se, abre a porta e cai, aleijando-se, o dano tanto
podia ter sido causado pelo cão como outro objeto).
§ Tanto responde o proprietário, como o possuidor – pessoa a quem o dono
der o animal para efeitos de assegurar a sua guarda durante um determinado
período de tempo.
è No caso de inaplicação de ambos os artigos, v.g. um carro embater num portão, a fim
de se desviar de um animal na estrada, poderá o dono do carro pedir indemnização ao
dono do animal pelos danos causados ao seu carro?
o Não, pois não houve culpa do dono (neste caso, partimos do pressuposto que
não) e não é um dano que decorre da perigosidade normal que envolve a
utilização do animal – segue-se pela via da gestão de negócios (gestão de
negócio alheio, no interesse e por conta de outrem, sem autorização), uma gestão
regular. Teria que se fazer uma interpretação mais ampla do artigo 468º, para se
incluir no conceito de despesas, os danos que o próprio gestor tiver sofrido.

Acidentes de Viação:

è Há acidentes de viação que constituem situações de responsabilidade civil que geram a


obrigação de idemnizar independentemente de culpa (artigo 503º e seguintes
apenas quando não há culpa), também há acidentes de viação que geram obrigação de
indemnizar por haver pressupostos de culpa (artigo 483º e seguintes).

Regime:

è Requisitos:
o Positivos, artigo 503º:
1. Direção efetiva do veículo: não significa estar a conduzir, significa exercer
um poder sobre ele, seja de natureza fáctica, seja de natureza jurídica, que
permita a alguém ter um controlo real sobre o veículo, independentemente
de qualquer titularidade de direito sobre o veículo. Passa por uma relação
especial com o veículo em que a pessoa tem a possibilidade de controlá-lo
de facto, é a pessoa que está em condições de tomar todas as
providências necessárias para que o veículo possa funcionar
adequadamente, para não provocar danos a terceiros, controlando os riscos
próprios do veículo.
• Não há direção efetiva do veículo nos casos do cliente do taxi, do aluno
na aula de condução, do proprietário numa hipótese de furto do seu
carro se o ladrão tiver tido um acidente.
• Quem poderá ser considerado como tendo direção efetiva do veículo,
sendo o detentor deste:
o Proprietário do veículo, ladrão, usufrutuário – não há dúvidas.
o Mais duvidoso:
§ Comodato (emprestar o carro): Antunes Varela – depende do
tipo de comodato:
• Comodato traduz-se na cedência pontual, momentânea e
de execução praticamente instantânea do automóvel,

Rebeca Louro - 2018 75


responsabilidade civil do comodante (quem empresta), v.g.
emprestar o carro para fazer um favor.
• O contrato celebra-se em condições de impor ao
comodatário o dever de assegurar que o automóvel está
em condições, responsabilidade civil do comodatário
(quem conduz) – emprestar para ir passear pela Europa no
Verão.
§ Locação (alugar o carro): Antunes Varela – respondem os dois,
artigo 507º, pode demandar os dois por responsabilidade
solidária, mas pode demandar ou um ou outro:
• Locador (empresa) é a primeira pessoa que está em
condições de assegurar que o automóvel tem todas as
condições necessárias de utilização. Além do mais ele é
remunerado pelo locatário, recebe uma contrapartida
pecuniária.
• Locatário (quem aluga), a partir do momento em que
assegura o controlo de facto do automóvel, também não
se pode desligar de completo desta responsabilidade de
assegurar que o veículo funciona adequadamente.
2. No próprio interesse, ainda que por intermédio do comissário: acidente
que se produz no âmbito da execução de um contrato no qual haja relação de
comissão (ex.: motorista que tem um acidente trabalhando na empresa) –
responde a pessoa em cujo interesse o automóvel está a ser utilizado,
quem beneficia da própria utilização do veículo:
• É o comitente, mas ter atenção ao artigo 503º nº3 conjugado com o
503º nº1 segunda parte. Quando há uma relação de comissão, dentro da
responsabilidade civil objetiva pelo risco, há uma espécie de anomalia,
pois há uma presunção de culpa que onera o comissário51:
o Ou o comissário prova que não foi culpa sua, que foi diligente, se
conseguir afastar a presunção de culpa, aplica-se o artigo 503º nº1
responde o comitente (responsabilidade objetiva, não depende de
culpa sua), porque o comissário não é responsável.
o Se o comissário não afastar a presunção de culpa, responde o
comissário ao abrigo do artigo 503º nº3, mas também há
responsabilidade do comitente independentemente de culpa
sua, através do artigo 500º. A sua responsabilidade é solidária,
quando eles estão a responder solidariamente, porque o comissário
tem culpa não afastada e o comitente garante, já não estamos a
aplicar o regime dos artigos 503º a 508º, aplicamos já o regime da
responsabilidade subjetiva (483º) no caso do comissário e objetiva
(500º) no caso do comitente.

51
Será assim, pois normalmente os comissários são pessoas experientes, que estão habituados a
conduzir muitas horas e que o fazem há já muitos anos. Outros exemplos que justificam esta
presunção de culpa é o transporte de crianças, exige-se um especial zelo, atenção e cuidado das
condições de utilização do automóvel. Protege, em última análise, o comissário, uma vez que o
obriga a parar em viagens longas.

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o Se o comissário estiver fora do exercício das suas funções
responde segundo o artigo 503º nº1, não responde como se fosse
comissário, responde como se fosse o detentor do veículo (que
poderá resultar em responsabilidade objetiva ou subjetiva, consoante
resulte do risco ou de culpa sua, respetivamente)52.
3. Veículo de circulação terrestre: circulação rodoviária e ferroviária (cavalo
dirigido por um cavaleiro, carroças, bicicletas, motas, carros, elétrico,
comboio, metro).
4. O acidente cause danos provenientes dos riscos próprios que o veículo
apresenta, mesmo que não se encontre em circulação (ex.: caso do
camião que transportava produtos inflamáveis e explodiu, não é um risco
próprio do veículo; mas se explodir o motor, já será).
o Negativos, artigo 505º, nem sempre há responsabilidade objetiva, esta pode ser
excluída quando o acidente foi imputável:
1. Ao próprio lesado.
2. A terceiro.
3. A causa de força maior estranha ao funcionamento do veículo.
• Dificuldades interpretativas: problema maior que esta norma levanta é a
sua remissão para o artigo 570º (culpa do lesado, aplica-se a todas as
modalidades de responsabilidade civil), que não exclui necessariamente a
responsabilização – pode ser excluída a responsabilização, assim
como mantido ou reduzido o montante a indemnizar.
o Doutrina unânime: o artigo 505º fala em “imputável” no sentido
corrente de “atribuível a” e não em sentido técnico-jurídico
(pressuposto da culpa) para efeitos do artigo 488º, mas tem que ser
única e exclusivamente, não pode haver duas ou mais causas a
contribuir para determinado resultado.
o Divergência na aplicação ao caso concreto (movimento de fases):
§ Até 2009 era praticamente uniforme: o artigo 505º era
interpretado muito rigorosamente, e em consonância com o
artigo 570º, o que desprotegia o lesado e alargava o âmbito do
505º.
§ Depois de 2009 há divergência: o artigo 570º prevalece sobre o
505º, maior tutela do lesado.
§ Consequências mais radicais depois de 2009 (posições
sobretudo doutrinais e não tanto jurisprudenciais): conduziria
quase, em última análise, a uma dinamitação do artigo 505º
pelo 570º, numa lógica de tutela do lesado.
§ Ora, analisemos em concreto53:

52
MARIA DA GRAÇA TRIGO: não deveria existir artigo 503º é inconstitucional, viola o princípio
da igualdade, pois distingue as formas de condução, v.g. dois comissários têm um acidente, mas
um deles não está no exercício das suas funções de comissão, o acidente vai achar-se
culposamente causado pelo comissário que está escrupulosamente a cumprir o seu trabalho,
premiando aquele que não está a usar o veículo para o seu trabalho (há jurisprudência pacífica
nesta matéria que inclui o artigo 506º, da colisão de veículos, na presunção de culpa do artigo 503º
nº3). Deveria direcionar-se todos os acidentes de viação para o artigo 493º nº2, mudando a
jurisprudência.
53
Ter em conta que os lesantes são as Seguradoras (com um património mais seguro).
Falou-se apenas em lesado, mas vale ipsis verbis quanto a facto imputável a título de terceiro.

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1. Culpa do lesante; não havendo culpa do lesado – não se aplica
nenhum dos artigos:
a. Não se aplica artigo 505º, porque pressupõe a aplicação prévia do
artigo 503º, em que não há culpa.
b. Não se aplica o artigo 570º, pois não há culpa do lesado.
2. Culpa do lesante; culpa do lesado:
a. Não se aplica o 505º, porque não se aplica o 503º, pois há culpa.
b. Aplica-se o artigo 570º, porque se aplica o artigo 483º, pois há
culpa do lesante e aplica-se o artigo 570º, porque há culpa do
lesado.
3. Não há culpa do lesante (risco), não há culpa do lesado, mas o
facto é-lhe imputável.
4. Não há culpa do lesanto (risco), há culpa do lesado.
o Tanto para o caso 3 e 4:
a. Clássica, Antunes Varela: aplica-se o artigo 505º, o facto é
imputável fora de qualquer juízo de censura do lesado, significa
apenas “atribuível a”. O artigo 570º nº2 diz que a culpa do lesado
consome a culpa do lesante, quando esta seja presumida,
excluindo-se a obrigação de indemnizar. Ora, se é assim quando há
culpa presumida do lesante e há culpa do lesado, por maioria da
razão, o mesmo acontecerá quando o lesante não tenha culpa e
o lesado tenha.
b. Moderna, Solução definida pelo STJ e bebe a sua essência da
posição de Vaz Serra nos estudos preparatórios do Código Civil:
afasta-se o artigo 505º, mas não contraria a posição de Antunes
Varela, apenas introduz um elemento:
i. Risco normal de circulação, o autmóvel é uma coisa complexa
e pesada (facto do lesado foi a única causa do acidente) –
aplica-se o artigo 505º.
ii. Risco concretizado ou agravado de circulação, situações que
agravaram o risco, concretizando aquilo que já é o risco normal,
ou seja, da especial capacidade de os danos se virem a produzir
(facto do lesado mais um fator x, um nexo causal, o dano não
se deve excusivamente ao lesado)54 – aplica-se o artigo 570º
(casos de inexperiência do condutor, em que a luz encadeia os
olhos, de gelo ou óleo que o condutor encontra na estrada, chuva
de granizo que cai de repente, em que o condutor está cansado).
c. Radical, Maria da Graça Trigo, Sinde Monteiro e Henrique
Sousa Antunes (estes autores oscilam entre esta posição e a
anterior): numa lógica de proteção do lesado, é preciso ter uma
visão personalista e humanista do direito. O artigo 505º não está
revogado ainda. Todavia, devemos pensar, numa lógica de direito
a constituir, que há uma presunção de causalidade (o acidente
de viação é sempre igual a risco), só se interrompe essa
presunção de causalidade, isto é, só se aplica o artigo 505º nos

54
No EXAME e na ORAL ver SEMPRE se não estamos perante uma hipótese de risco agravado
ou concretizado de circulação!

Rebeca Louro - 2018 78


casos em que o acidente fosse única e exclusivamente
imputável a uma falta grave e a uma falta de perícia
indesculpável do lesado – não é preciso haver uma situação de
risco concretizado ou agravado de circulação para se aplicar o
artigo 570º. Estes argumentos fundam-se:
i. Direito Comparado:
1. Interno: no direito do trabalho a entidade patronal responde,
independentemente culpa, por todos os danos que o
trabalhador venha a sofrer no exercício do contrato de
trabalho, ainda que haja culpa do trabalhador, desde que
não haja uma conduta tão culposa do trabalhador, que se
deva a uma falha grave e absolutamente injustificada, só aí
é que a entidade patronal não responde (ex.: trabalhador a
arranjar uma coisa na ponte 25 de Abril, a entidade diz que
tem que usar cabos e ele não usa e cai, aí não responde;
mas se usar e cair, já responde).
2. Comunitário: os peões são considerados partes débeis e
posições fracas da estrada – interpretação que tem vindo
a ser feita no direito comunitário.
ii. O automóvel em si mesmo considerado, ainda que nele não
se projete qualquer risco especialmente concretizado ou
agravado é o fator que contribui para os danos
concretamente causados ao lesado (peso e força bruta que o
automóvel apresenta). O concreto prejuízo causado à pessoa,
não pode nunca deixar de estar associado àquilo que é o risco
de circulação própria do veículo (ex.: ser atropelado por um
camião tir ou por uma carroça, os danos não são idêntidos).
1. Só se admite o artigo 505º nos casos de falha grave e
absolutamente injustificável ou nos casos em que,
efetivamente, o automóvel, naquilo que foi o processo de
causa dos danos, não interveio como automóvel, mas
interveio como objeto que tanto poderia ser um
automóvel como uma realidade diferente – não intervém
na sua normal aptidão para a produção dos riscos (ex.:
atirar-se do Viaduto Duarte Pacheco para a Avenida de
Ceuta, quando vai a cair passa um carro).
è Os beneficiários da responsabilidade estão previstos no artigo 504º, mas apenas
para acidentes imputáveis ao risco e não à culpa do lesante. Não pode o lesado
demandar o lesante pela totalidade dos danos que tenha sofrido. O nº1 diz que a
responsabilidade abrange quer os danos das pessoas transportadas, incluindo o
condutor, quer os danos de terceiros. Os nºs 2 e 3 limitam e reduzem o âmbito dos
danos indemnizáveis:
o Nº2: com base num contrato (ex.: uber ou taxi), indemniza-se apenas pelos danos
que atingirem as pessoas e as coisas por elas transportadas (ficam de fora os
danos reflexos do artigo 496º nº1, 2 e 3 (dos familiares) – só quando haja culpa,
isto é, quando haja responsabilidade civil extracontratual subjetiva, do artigo 483º).
o Nº3: transporte gratuito, indemnizam-se apenas os danos pessoais da pessoa

Rebeca Louro - 2018 79


transportada.
è Há também limites máximos indemnizáveis, segundo o artigo 508º, o que não é bom
para o lesado. Os limites máximos variam em função do meio de transporte em que o
acidente é originado, delimita permitindo ainda que haja uma folga confortável para os
lesados.
è Colisão de veículos, previsto no artigo 506º:
o Há culpa de algum dos condutores?
§ Se houver só de um, só esse é responsável e terá que responder por todos
os prejuízos que advierem dessa colisão, nos termos do artigo 483º.
§ Se houver culpa dos dois, há responsabilidade civil por todos os danos,
será subjetiva de acordo com o artigo 483º – a indemnização é determinada
em função do grau e da medida de culpa, quando não se sabe qual é a
medida e\ou o grau de culpa, o 506º nº2 vem dizer que se presume igual.
§ Não há culpa de nenhum deles (ex.: A vem a conduzir, apanhou óleo na
estrada e embate em B, que apanhou sol e também embateu):
• Artigo 506º nº1 parte final, se os danos forem causados apenas por um
veículo, sem culpa de nenhum deles, só a pessoa por responsável é
obrigada a indemnizar (ex.: um carro bate-me por trás e eu bato no da
frente) – quem indemniza tudo é quem bate.
• Artigo 506º nº1 parte inicial, se não tiverem sido causados só por
um, a responsabilidade é repartida na proporção e que o risco de
cada um dos veículos tiver contribuído para os danos, é preciso atender à
dimensão dos veículos (ex.: um camião tir colide com um renault twingo –
o risco de um automóvel pesado é superior ao de um automóvel ligeiro).
o Os casos em que há uma pessoa transportada apenas poderá pedir
indemnização por danos pessoais ao condutor do veículo em que se
encontra, mas e em relação ao condutor do outro veículo é um
terceiro, poderá pedir indemnização? Visto que o artigo 504º se
aplica às relações entre transportador e transportado, pois se se
olhar às relações entre o transportado e o terceiro aquele é
terceiro, está dentro do 504º nº1:
§ Como o transportado é um terceiro em relação ao outro
condutor, não se aplica a limitação do artigo 504º, pode pedir
a totalidade da indemnização dos danos que não podia pedir à
pessoa que o transportava a esse terceiro (condutor do outro
veículo) – 504º nº1.
§ Da mesma maneira que não pode pedir essa indemnização à
pessoa que o transportava, então também não pode
beneficiar da proteção em relação a terceiros (condutor do
outro veículo), este limite aplica-se também às relações externas.
§ Só se pode pedir a indemnização que atenda à proporção
dos danos que esse terceiro (condutor do outro veículo)
causou, parte que esse terceiro (condutor do outro veículo)
tem de assumir, por força de, naquele acidente de viação, ele
próprio ter uma responsabilidade de x, por força do que tiver
contribuído para os danos.
o Na prática o que acontece é que a pessoa transportada tem o direito

Rebeca Louro - 2018 80


a pedir indemnização pelos prejuízos a dois responsáveis que,
perante ela, respondem solidariamente nos termos do artigo
507º, mas sem incluir os danos materiais. O que acontece é depois
do acerto de contas dos lesantes (companhias de seguros que os
representam no processo), no plano das relações externas, é que
toda esta discussão é tida em conta, podendo pedir ou não uma
indemnização pelos danos materiais ao terceiro (condutor do
outro veículo).

Os seguros:

è Os seguros a favor de terceiros são obrigatórios (podendo estender para o próprio,


se não o fizer, se tiver um acidente causado por terceiro, está abrangido pelo o seguro
dele, se o próprio tiver culpa o seguro já não vai indemnizar) – há uma limitação legal à
liberdade de contratar.
è Um dos casos em que há lugar ao direito de regresso da seguradora, ou seja, depois
de pagar a totalidade de prejuízos que o segurado causou a terceiros, a companhia de
seguros pede de volta o valor que pagou, será quando esteja sobre o efeito de alcóol
ou drogas – em regra, não há direito de regresso da seguradora, pode agravar o
prémio semestral ou anual que é devido pelo seguro.
è Diploma 291/2007: artigo 64º se o valor da indemnização for inferior ao capital
mínimo de seguros, só é preciso accionar a seguradora. Apenas terá que accionar a
seguradora e o detentor do veículo quando o valor da indemnização exceda o valor
mínimo de seguros (o valor que a seguradora pode pagar).

Instalações de Energia Elétrica e Gás:

è Requisitos:
o Direção efetiva.
o Interesse próprio (quer da empresa que explora como das proprietárias,
concessionárioas ou a outro título).
è A responsabilidade da empresa existe: pelos danos que provenham de culpa dos
seus órgãos, agentes, representantes ou comissários; e pelos ligados às
deficiências do sistema em si.
è Exclui-se a responsabilidade se ao tempo do acidente a instalação correspondia às
normas técnicas vigentes e se encontrava em perfeito estado de conservação.
è Os danos motivados por utensílios de uso da energia são afastados deste regime
(ex.: usar um fogão em casa). Não obrigam a reparação de danos atribuídos a força
maior do funcionamento e utilização da coisa.
è Indemnização, 510º: só quando não haja culpa do responsável é que se aplica. De
resto remete para os limites máximos do 508º, sendo suscetíveis de adaptação ou
extensão a casos especiais.

Rebeca Louro - 2018 81

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