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05/02/2022 12:03 Mulher morre com hepatite fulminante após consumir 'ervas de emagrecimento' - 04/02/2022 - Cotidiano - Folha

Mulher morre com hepatite fulminante


após consumir 'ervas de emagrecimento'
Enfermeira chegou a fazer transplante de fígado, mas seu corpo rejeitou o
órgão

4.fev.2022 às 20h22

Heloísa Barrense

SÃO PAULO | UOL A enfermeira Edmara Silva de Abreu, 42, morreu na


madrugada desta quinta-feira (3) em São Paulo após ter sido diagnosticada
com uma hepatite fulminante decorrente do consumo de um composto de
"ervas para emagrecimento". O produto, vendido em cápsulas, se dizia
"natural" e, na composição, continha ervas como chá verde, carqueja e mata
verde, substâncias hepatotóxicas (que podem causar danos ao fígado).

De acordo com a prima de Edmara, a professora de educação física Monique de


Abreu Saraiva Artecio, 35, a enfermeira era "extremamente saudável" e
começou a ter sintomas de enjoo há duas semanas. "Minha prima sempre foi
uma pessoa extremamente saudável, ela era enfermeira obstetra e sempre
estava tudo certo com a saúde dela. Há duas semanas ela começou a ter ânsia e
esse sintoma ficou mais frequente", disse Monique ao UOL.

Edmara, que trabalhava no Hospital e Maternidade Santa Joana, resolveu se


consultar com um médico e foi logo internada porque, na ocasião, a equipe
desconfiou que se tratava de um problema na vesícula. "Então fizeram exames
para saber o que era e deu que ela já estava com uma hepatite fulminante."

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Medicamento é vendido online em diversos sites de revenda


- Reprodução

Segundo Monique, os médicos ainda realizaram mais testes para saber se a


doença era decorrente de um agravamento de leptospirose ou de dengue, que
geralmente são os causadores das lesões no fígado, mas os resultados para
ambos os casos deram negativo.

"Então pegaram tudo o que tinha de medicamento que ela tinha e levaram para
os médicos. Foi quando viram esse frasco de '50 ervas emagrecedor' e
perceberam o tanto de coisa que tinha nesse produto." Segundo a prima,
Edmara teria comprado o medicamento pela internet. No entanto, a família não
sabe desde quando a enfermeira começou a utilizá-lo.

Edmara foi transferida para a UTI (Unidade de Terapia Intensiva) do


HCFMUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade
de São Paulo), que é referência em casos de hepatite. Ela estava na fila para
conseguir um transplante de fígado, passou por um coma induzido e finalmente
conseguiu realizar a cirurgia, que levou 12 horas, no sábado (29).

No entanto, o corpo da enfermeira rejeitou o novo órgão e os médicos


atestaram a morte cerebral de Edmara na quarta (2). Na madrugada do dia
seguinte ela sofreu uma parada cardíaca e morreu.

"Ela confiava no medicamento, até porque ela achou que era natural, está
escrito na embalagem que são apenas ervas. Não é nada de tarja preta, nenhum
medicamento que aparenta ser perigoso. Ela não estava tomando mais nada, só
esse mesmo", relata a prima. "É importante falar disso para que outras famílias
não passem pela dor que estamos passando hoje."

MÉDICA FAZ ALERTA

A médica assistente no departamento de gastroenterologia na Divisão de


Transplantes de Órgãos do Aparelho Digestivo no HCFMUSP, Liliana Ducatti,
publicou nas redes sociais um alerta a respeito do uso de substâncias que se
dizem naturais, mas que podem causar danos agressivos ao corpo. "A hepatite

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fulminante é uma condição em que a pessoa não tem problema no fígado, tem
fígado saudável, ela ingere algum remédio, alguma substância que faz com que
esse fígado adoeça gravemente e rapidamente", explicou ela ao UOL.

A doença pode ser causada pelo uso de diversos medicamentos, como


antibióticos ou isotretinoína, utilizado no combate a acnes
(https://www1.folha.uol.com.br/webstories/2021/07/o-que-voce-precisa-saber-antes-de-tomar-remedio-para-

espinhas.shtml). Por isso, Ducatti afirma que é sempre importante fazer o uso destas
substâncias com acompanhamento médico. "Se há sinal de danos ao fígado, a
medicação é prontamente interrompida", explica ela.

No caso da hepatite fulminante, os sintomas aparecem quando a lesão já está


muito avançada. "Existe uma hepatite aguda que acaba evoluindo para a
fulminante, em que o fígado fica sem funcionar."

Ainda, segundo a médica, o frasco de "ervas de emagrecimento" tinha várias


substâncias hepatotóxicas. "Sem acompanhamento, o caso evoluiu para
hepatite fulminante. A medicação não tem nada de emagrecedora. É uma falsa
ilusão. Não são todas as pessoas que irão desenvolver a hepatite fulminante,
isso é raro, mas ainda assim é algo grave e evitável. Essa é uma medicação que
não emagrece (https://f5.folha.uol.com.br/viva-bem/2022/01/como-emagrecer-5-dietas-populares-e-o-que-os-
especialistas-pensam-delas.shtml) e pode causar danos", explica ela.

A médica relata que as substâncias em questão, como o chá verde, não são
necessariamente problemáticas em quantidades pequenas.

"Não estamos falando sobre esse chá que tomamos de vez em quando por
prazer, para relaxar, mas o uso deles em grandes quantidades, que podem ser
tóxicos para o fígado. Como esse remédio era em cápsulas, a gente nem sabe a
real concentração dessas substâncias", relata. "O problema desses remédios
ditos naturais é que também não tem como saber a real composição, além de
ter esse tanto de erva. Das 50, 10 eram hepatotóxicas."

Para Ducatti, o caso de Edmara não é o primeiro –e nem será o último. "Não é
frequente, mas já tivemos alguns casos e infelizmente teremos outros. Acaba
sendo uma amostra viciada, já que recebemos pacientes do país inteiro. São
casos por esses compostos emagrecedores, por tomar esses chás em grande

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quantidade, que dizem ser de detox... Felizmente, muitos casos são de hepatite
aguda e as pessoas conseguem se recuperar a tempo e o fígado se regenera."

A médica ainda faz um alerta para as pessoas que buscam emagrecer:

Nós sabemos que não existe nada


milagroso. É um conjunto de mudança do
estilo de vida, atividade física,
alimentação saudável. Existem médicos
muito gabaritados no assunto,
endocrinologistas, nutricionistas,
profissionais de educação física. Então,
sempre é necessário um
acompanhamento. Não devemos cair nas
falsas ilusões de emagrecimento rápido
porque estes medicamentos não
emagrecem

Liliana Ducatti
médica

PRODUTO PROIBIDO NO BRASIL

O UOL entrou em contato com a Anvisa, que informou que o produto está
proibido no país desde 2020, por não estar regularizado como medicamento.

"O produto 50 ervas emagrecedor não pode ser classificado como alimento, ou
mesmo como suplemento alimentar, pois contém ingredientes que não são
autorizados para o uso em alimentos. Entre estes componentes estão o chapéu
de couro, cavalinha, douradinha, salsa parrilha, carobinha, sene, dente de leão,
pau ferro, centelha asiática. Essas espécies vegetais têm autorização para uso

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somente em medicamentos, como fitoterápicos, e não em suplementos


alimentares", diz comunicado.

A agência informou que publicou duas medidas que proíbem "a


comercialização distribuição, fabricação, propaganda e uso, além da apreensão
e inutilização do produto". A primeira medida foi para a empresa Pró-Ervas em
18 de novembro de 2020 e a segunda para o produto 50 Ervas Emagrecedor
Forte - Natuviva, em 2 de março de 2021.

"O motivo das proibições foi a comprovada divulgação e comercialização dos


produtos sem registro, notificação ou cadastro na Anvisa, fabricados por
empresa que não possui Autorização de Funcionamento na Agência para
fabricação de medicamentos, em desacordo com os artigos 12, 50 e 59 da Lei nº
6.360/1976", diz comunicado.

A agência ainda afirmou que ações de fiscalização se aplicam "a quaisquer


estabelecimentos físicos ou veículos de comunicação, inclusive eletrônicos, que
comercializem ou divulguem os produtos" e alerta que "a venda de produtos
clandestinos pode ser considerada crime."

A Anvisa ainda emitiu um alerta aos consumidores:

Qualquer produto com propriedades


terapêuticas, por exemplo a promessa de
emagrecimento, só pode ser
comercializado no Brasil com autorização
da Anvisa e o comércio só pode acontecer
em farmácias ou drogarias, já que
substâncias com propriedades
terapêuticas são consideradas
medicamentos. A Anvisa lembra que
produtos sem registro na Agência não
oferecem garantia de eficácia, segurança

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e qualidade exigida para produtos sob


vigilância sanitária. Sem esses requisitos
mínimos, os produtos irregulares
representam um alto risco de dano e
ameaça à saúde das pessoas.

Anvisa
Agência Nacional de Vigilância Sanitária

"Desconfie de produtos com promessas milagrosas, que prometem


emagrecimento fácil ou qualquer outro tipo de ação de tratamento, cura ou
prevenção de doenças. Todo produto com ação terapêutica precisa estar
regularizado na Anvisa como medicamento", finaliza comunicado.

A reportagem tentou localizar a Pró-Ervas, responsável pela produção do


medicamento que é amplamente revendido online em diversas plataformas,
mas não encontrou nenhum representante da empresa até o momento. O texto
será atualizado quando houver novas informações.

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