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NO TRÂNSITO
I- apto: quando o desempenho apresentado é condizente
O que é avaliação psicológica no para a condução de veículo automotor.
contexto do trânsito?
II- inapto temporário: quando não é apresentado
A Avaliação Psicológica no contexto do Trânsito é uma
desempenho condizente para a condução de veículo
exigência do Código de Trânsito Brasileiro e do Conselho
automotor, porém o avaliado possui um tempo para se
Nacional de Trânsito. Foi regulamentada pelo Conselho
adequar e voltar a fazer o processo para a obtenção da
Federal de Psicologia e é fiscalizada pelos Conselhos
CNH.
Regionais de Psicologia, pois se trata de uma atividade
exclusiva dos psicólogos.
III- inapto: quando o desempenho apresentado não é
condizente para a condução de veículo automotor.
A Avaliação Psicológica no contexto do Trânsito é
um processo técnico-científico de coleta de dados, Por que a avaliação psicológica é
estudos e interpretação de informações a respeito
dos fenômenos psicológicos dos indivíduos. É um obrigatória para obtenção de CNH?
processo de conhecimento do outro de forma científica O ato de dirigir é complexo, envolve diversas
e especializada. Dentre os instrumentos psicológicos competências, habilidades e atitudes e requer do
utilizados para a avaliação psicológica encontram-se motorista um bom nível de maturidade emocional e
os testes, entrevistas, questionários e observações. Para capacidade intelectual, as quais lhe permitem interpretar
os candidatos a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) estímulos e reagir estrategicamente no trânsito. Sendo
a entrevista individual e os testes psicológicos são assim, a CNH não pode ser considerada como um direito
obrigatórios para a realização da avaliação psicológica. de todos, mas sim como uma permissão, um privilégio
que o Estado concede àquelas pessoas que se mostram
A etapa de aplicação de Testes Psicológicos pode ser capazes e aptas para obtê-la. Portanto, a avaliação
realizada coletivamente e possui uma duração média de psicológica tem por finalidade contribuir para promover
02 (duas) horas. A etapa de Entrevista deve ser individual a segurança dos motoristas, já que o psicólogo é um dos
e a duração média sugerida pelo Departamento Médico responsáveis pela liberação do candidato para a direção
e Psicológico do DETRAN é de 30 (trinta) minutos. Cabe de veículos automotores.
ao profissional psicólogo avaliar se o candidato necessita
realizar mais etapas de avaliação, como reaplicação de
testes, por exemplo, o que deve ser sempre explicado ao
Direitos dos Candidatos
avaliado o porquê desse procedimento.
• Ser tratado com respeito e educação;
• Realizar a avaliação psicológica em ambiente físico
Após a finalização da avaliação o psicólogo elabora
adequado e confortável, com iluminação, ventilação,
um laudo, com resultado final conclusivo. Atualmente
mobiliários e ruídos que não venham a interferir
existem três tipos de resultados possíveis:
negativamente no processo;
• Ser informado da duração do processo, bem como • Não ingira bebidas alcoólicas ou outras substâncias
das etapas que o compõe; psicoativas antes da Avaliação Psicológica;
• Receber esclarecimentos necessários para o bom • Procure concentrar-se nas atividades que lhe serão
andamento do trabalho; solicitadas;
• Ter a garantia de que seus resultados serão mantidos • Chegue para a avaliação com antecedência;
em sigilo, na medida garantida pela lei; • Desligue o celular quando entrar na sala de avaliação
• Solicitar entrevista de devolutiva, com explicação e/ou entrevista.
sobre os resultados da avaliação, a qual deve ser
gratuita. Em casos de desobediência aos padrões do
processo de avaliação ou não concordância com
Direitos dos Psicólogos o resultado obtido, o avaliado poderá procurar
o Setor de Ouvidoria do DETRAN/PR (0800643-
• Ser tratado com respeito e educação; 7373)
• Ter a sua profissão e seus instrumentos de trabalho
respeitados. Em caso de denúncia ética contra o profissional
psicólogo que aplicou a avaliação psicológica,
o avaliado poderá entrar em contato com o
Deveres dos Candidatos Conselho Regional de Psicologia do Paraná
pelo telefone (041) 3013-5766 ou pelo site
• Cumprir o horário pré-agendado; www.crppr.org.br, link “Fale Conosco” para o
• Respeitar e tratar o profissional cordialmente; destinatário Orientação e Fiscalização.
• Ter cuidado para com o material do psicólogo, sem
rasurar ou danificar os cadernos utilizados para
aplicação dos testes psicológicos. Legislação
• Resolução CFP nº 007/2009: institui normas e
Deveres dos Psicólogos procedimentos para a avaliação psicológica no
contexto do Trânsito.
• Possuir a capacitação condizente a atuação da • Resolução CFP nº 009/2011: altera o Anexo II da
Psicologia no Trânsito; Resolução CFP 007/2009.
• Atuar de forma ética; • Nota Técnica CFP nº 001/2011: esclarece os
• Cumprir o horário pré-agendado com os avaliados; psicólogos acerca do conceito de atenção da
• Prestar atendimento respeitoso e cordial frente aos Resolução CFP 007/2009.
avaliados e demais envolvidos; • Resolução CFP nº 003/2007 - Capítulo II - Da
• Repassar de forma clara e objetiva todas as avaliação Psicológica para Carteira Nacional de
informações pertinentes à Avaliação Psicológica; Habilitaçao.
• Informar o avaliado sobre o direito à Entrevista • Resolução CFP nº 016/2002: dispõe acerca do
Devolutiva Gratuita; trabalho do Psicólogo na avaliação psicológica de
• Manter sigilo sobre as informações recebidas nas candidatos à Carteira Nacional de Habilitação e
avaliações. condutores de veículos automotores.
• Resolução CFP nº 006/2010: altera a Resolução
CFP 016/2002.
Informações gerais aos candidatos • Resolução CFP nº 007/2003: institui o Manual
de Elaboração de Documentos Escritos produzidos
pelo Psciólogo, decorrente da avaliação psicológica
• Procure dormir bem na noite anterior à avaliação; e revoga a Resolução CFP 017/2002.
• Alimente-se de forma leve e saudável; Estas e outras resoluções estão disponíveis para
• Procure vestir uma roupa confortável; download em www.crppr.org.br, link “Legislação”.
POLÍTICA NACIONAL DE TRÂNSITO: POSSIBILIDADE DE
INTERVENÇÃO PELA VIA DA EDUCAÇÃO
INTRODUÇÃO
1
Professora Assistente do Curso de Serviço Social da UNIOESTE/Campus de Toledo. Doutoranda do
Programa de Pós Graduação Stricto Sensu em Desenvolvimento Regional e Agronegócio/Unioeste -
PGDRA. e-mail: diuslene.fabris@hotmail.com. Telefone (45) 9823-8844. Endereço Residencial:Rua da
Faculdade 362, Jd. La Salle ,Toledo/Paraná/Brasil.
No campo jurídico, o trânsito é conceituado como sendo qualquer
movimentação ou deslocamento de pessoas, animais e veículos de um local a outro
(RIZZARDO, 2004). Nos termos do Código Nacional de Trânsito brasileiro em seu
artigo 1º, § 1º, o trânsito é a utilização das vias por pessoas, veículos e animais, isolados
ou em grupos, conduzidos ou não, para fins de circulação, parada, estacionamento e
operação de carga e descarga (Brasil, 1998). Essa definição é mais abrangente e inclui
não só pessoas e automóveis, mas também as cargas ou mercadorias como elementos
que devem ocupar parte do espaço com prioridades reservadas. Como bem argumentou
Santos (2012), ao abordar a economia do espaço da cidade capitalista ao entender que
não se constitui exclusivamente de temas considerados clássicos, mas também de novas
contradições.
As mudanças na forma dos deslocamentos, exigem que o trânsito adquira
caráter que transcende ao universo de deslocamentos pelo espaço geográfico e passa a
ser permeado por aspectos do sistema socioeconômico.
Rizzardi (2004) e Vasconcellos (1998), afirmam que o trânsito compõe a vida
de homens e mulheres desde os primórdios das civilizações. Contudo, o acelerado
desenvolvimento social e, especialmente, econômico, inerente à própria aceleração da
atividade industrial, aliada à proliferação do automóvel, fez com que os movimentos e
rotas fossem se modificando, que forçou um ordenamento e estabelecimento de normas,
assim, surge a ideia do trânsito como um regulador do espaço. Portanto, a introdução do
veículo automotor alterou as formas de deslocamentos e de tempo. Ele se tornou um
elemento indicador da condição econômica de cada indivíduo.
Nesse sentido, os veículos automotores mais sofisticados são fabricados de
forma a oferecer a maior quantidade de tecnologias disponíveis no quesito segurança.
Inversamente, no Brasil, os classificados como "carros populares", de menor custo,
apresentam motores de menor potência e poucos itens de segurança disponíveis na
fabricação2. Na verdade, essa situação se traduz em grave problema em diferentes
2
Como exemplo, pode-se citar que somente em 1998 o CONTRAN estabelece como regra de fabricação
dos carros os cintos de três pontas (Resolução 048/98 de 21 de maio); Resolução 277 de 28 de maio de
2008 , para atender aos artigos 64 e 65 do Código de Trânsito Brasileiro - dispõe sobre o uso obrigatório
de sistema de retenção para crianças menores de 10 anos; outro item de segurança que foi reiterada muitas
vezes exigido e posteriormente revogado ou com implantação adiada foi a exigência do air bag e freios
ABS- O Código de Trânsito Brasileiro foi alterado pela Lei nº 11910 de 18 de março de 2009, que
acrescentou ao seu artigo 105, o inciso VII juntamente com os parágrafos 5º e 6º a obrigatoriedade do air
bag e freios ABS- Resolução 311 de 03 de abril de 2009 foi revogada pela Resolução 394/11 . No
decorrer do processo, a utilização do sistema ABS de freios na fabricação de todos os veículos nacionais
separou-se do equipamento air bag na Resolução do CONTRAN nº 380 de 28 de abril de 2011.
espectros, principalmente, pelo abrupto aumento da frota sem que as cidades tenham
desenvolvido condições para suportá-la e também na medida em que esse tipo de
veículo passou a ocupar o espaço precário; não obstante, as ocorrências dos acidentes
provam que as condições de proteção aos passageiros transportados não são as mais
seguras.
Fato é que cada vez mais a utilização do automóvel tem se tornado a primeira
opção para as locomoções de curtos e médios trajetos.
Evidentemente que esse direcionamento da forma de locomoção implica na
ampliação de problemas vividos nas cidades que se relacionam à mobilidade e ao
aumento dos riscos e de violência. Logo, requer mais atenção e intervenção do estado
como agente mediador e regulador dos conflitos.
O aumento expressivo das frotas agrava os problemas de circulação e acresce
elementos que comprometem o cotidiano das cidades e a qualidade de vida das pessoas.
O aumento do fluxo de locomoções no espaço, traz inúmeras consequências: faz
aumentar os índices e volume dos sons, provoca estresse, poluição ambiental,
congestionamentos e, muitas vezes, gera um ambiente propício aos acidentes de trânsito
que vitimam pessoas de todas as classes sociais e faixas etárias.
Desse modo, o trânsito deixa na sociedade sua marca e chama a atenção pelo
fato de que não se trata de um mero problema de ordem técnica. Mas abrange questões
sociais, econômicas e políticas que requerem a interferência jurídica para normatizar e
legalizar os usos dos espaços e das condutas no trânsito. A compreensão do trânsito
como um objeto passível de controle político e a regulação legal, torna-o
responsabilidade de todos, através de recursos de planejamento que incorporem a
gradual participação cada vez maior da sociedade.
Nessa lógica, entender o trânsito em toda sua extensão é o primeiro passo para
buscar solucionar os problemas por ele causados, para entender o papel de cada um
nesse processo. O trânsito não vai ser eliminado nas sociedades modernas, porém
necessita de soluções práticas e eficientes de forma a reduzir ao máximo os seus danos a
fim de melhorar a mobilidade urbana e a vida das pessoas.
Sancionada em 2014 a obrigatoriedade destes itens deverá gradativamente ser implantada na fabricação
dos veículos nacionais.
As cidades contemporâneas têm se constituído como ambientes construídos por
numerosos conjuntos de estruturas físicas destinadas a darem continuidade e a
impulsionarem os processos de desenvolvimento. A complexidade do modo de
produção capitalista produziu ecos na vida em sociedade. As relações sociais, as
instituições e o espaço urbano, gradativamente, agregaram novas necessidades e exigem
respostas tecnológicas.
A propósito, o espaço de circulação como estrutura de mobilidade atua como
elemento integrante do complexo espaço urbano, onde se impõe a necessidade da
minimização do conflito através da regulamentação do uso. Sobre a complexidade que é
inerente ao espaço urbano, Santos (2006, p. 63), afirma que "[...] o espaço é formado
por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório de sistemas de objetos
e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como um quadro único[...]"
onde a história se desenrola.
Na perspectiva da regulação do espaço da circulação e da mobilidade, as
normas jurídicas estão para regular as relações que se estabelecem neste espaço e que o
Estado deve ser o responsável por criar as normas que irão influenciar na organização
do espaço geográfico. A finalidade é de garantir aos cidadãos o direito de ir e vir,
imposto pela Constituição Federal de 1988 como um dos princípios fundamentais.
Para atender à prerrogativa constitucional, em 23 de setembro de 1997 foi
promulgado o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), registrado sob a Lei n° 9.503, a
qual define no artigo 24, inciso II, a responsabilidade dos órgãos e entidades municipais
de trânsito em "planejar, proteger, regulamentar e operar o trânsito de veículos, de
pedestres e de animais e promover o desenvolvimento da circulação e da segurança do
ciclista". Assim, as municipalidades estão incumbidas de realizarem atribuições
relativas ao planejamento e à operação do trânsito.
Para que os municípios exerçam seus deveres no que concerne à política de
trânsito, precisam de se adequarem institucional e financeiramente. Contudo, para
muitos deles é uma tarefa inviável, razão pela qual muitas cidades deixam de se inserir
adequadamente ao Sistema Nacional de Trânsito (SNT).
O fato de haver municípios, fora do processo ou precariamente incluídos,
torna-se fator de preocupação, uma vez que, este constitui um dos maiores desafios do
planejamento de transportes e trânsito. Nos países em desenvolvimento, como é o caso
do Brasil, é preciso viabilizar politicamente a redistribuição do espaço de circulação.
Cabe destacar ainda, a importância da gestão municipal ou local do trânsito, a
qual deve ser feita de acordo com os princípios norteadores da construção dos Planos
Diretores de Transporte e Mobilidade, invocados no trabalho editado pelo Ministério
das Cidades , os quais podem e devem ser observados quando da elaboração de
projetos de leis e planos de ação referentes ao trânsito, são eles: melhorar a qualidade de
ambiental; fazer prevalecer o interesse público; combater a degradação de áreas
residenciais ocasionada pelo trânsito intenso de veículos dentre outros.
Um dos objetivos da implantação da municipalização do trânsito, é oportunizar
a estes o empoderamento em torno das questões do trânsito em assuntos tais como:
elaboração de estratégias para redução do número de viagens motorizadas;
reorganização do desenho urbano; circulação de veículos; desenvolvimento e incentivo
aos meios não motorizados de transporte; valorização; incentivo e reconhecimento da
importância do deslocamento de pedestres; equipar as estruturas de circulação com
elementos que favoreçam a mobilidade das pessoas com necessidades especiais e
idosos; dar total prioridade para a implantação organização e expansão do transporte
coletivo de qualidade.(BRASIL, 1998)
O mais importante nisso tudo, diz respeito ao fato de que a gestão municipal do
trânsito deve ser feita e compreendida pelos municípios como uma política que exige
responsabilidade, a qual pode possibilitar aos municípios: o desenvolvimento urbano
das cidades através de políticas de estacionamento, programas de sinalização, de
orientação do trânsito, faixas exclusivas para ônibus, políticas de operação de descarga
de mercadorias, retornando como melhoria à qualidade de vida da população
(DENATRAN, 2000).
No entanto, a municipalização requer orientações para a implantação e a
manutenção do sistema. Por isso, vários órgãos públicos gestores e responsáveis pelo
trânsito e transportes têm de se manifestar expedindo normas e critérios que facilitem a
gestão do processo, seguindo as determinações impostas pela Constituição Federal
(1988) e pelo Código Brasileiro de Trânsito (1997).
Como parte das ações de apoio e incentivo aos municípios, no ano de 2003, o
Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN), em parceria com o Ministério das
Cidades e o Ministério da Justiça, produziu uma cartilha intitulada "Municipalização do
Trânsito - roteiro para implantação." Nesse registro, há orientações sobre o passo a
passo do processo de municipalização o qual deveria ter início com a criação de
estrutura administrativa local: para promoção da fiscalização; da educação; da
engenharia e julgamento de multas. A integração do município no Sistema Nacional de
Trânsito (SNT), da etapa inicial até a etapa final é de inteira responsabilidade da
autoridade municipal.
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Art.6º. São objetivos básicos do Sistema Nacional de Trânsito: I- estabelecer diretrizes da Política
Nacional de Trânsito, com vistas à segurança, à fluidez, ao conforto, à defesa ambiental e à educação para
o trânsito e fiscalizar seu cumprimento; II - fixar, mediante normas e procedimentos, a padronização de
critérios técnicos financeiros e administrativos para a execução das atividades de trânsito; III- estabelecer
a sistemática de fluxos permanentes de informações entre os seus diversos órgãos e entidades, a fim de
facilitar o processo decisório e a integração do Sistema . Lei Federal nº 9.503/97. (BRASIL, 1997.)
O município se constitui em pessoa jurídica com competência para propor
normas e leis que tratem de suas questões internas e de assuntos do interesse local.
Nesta perspectiva, é possível ao município controlar eventos e movimentos que ocorrem
nos seus limites geográficos, de tal forma que, fica possível a intervenção no trânsito
local a partir da definição de um plano local de fluxos, que seja capaz de atender às
particularidades do seu espaço.
Segundo o DENATRAN (2003), a atribuições dos municípios referentes ao
trânsito não devem se limitar à colocação de placas ou à aplicação de multas, mas
necessita constituir-se num sistema voltado à organização da ocupação do espaço das
cidades e dos seus fluxos.
Considerando que a própria dinâmica da cidade traz intrinsecamente a questão
do trânsito, o DENATRAN (2003), defende que as prefeituras municipais devam
interferir nos fluxos e no uso das vias urbanas, pautando-se sempre nos princípios,
regras e normas estabelecidas pelos órgãos de trânsito. Essa entidade pressupõe que
nenhum município é pequeno demais ao ponto de se eximir da preocupação ou do trato
da questão que envolve veículos e pedestres.
A vida urbana não se realiza de forma adequada se o trânsito não tiver fluidez e
não oferecer segurança. Sendo, portanto, elemento muito importante inclusive para o
desenvolvimento das cidades e de uma região. Neste sentido, o DENATRAN (2003),
explica que a criação de órgão municipal executivo de trânsito constitui-se numa forma
de garantir ao gestor condições para atender às necessidades da população de forma
integral e integrada.
A medida que a legislação passa a responsabilizar os municípios pelo cuidado
com a questão do trânsito e, consequentemente, da mobilidade, qualquer incidente ou
acidente que ocorra em espaço urbano, de responsabilidade municipal por falta de
sinalização, pode ser encarado como negligência do Poder Executivo local, ficando
sujeito às sanções legais previstas no art. 1°, § 3°, do CTB. Porém, o poder público
municipal pode estabelecer parcerias com órgãos estaduais e/ou federais para garantir as
boas condições de trafegabilidade, fluidez e segurança nas vias públicas, permanecendo
ainda assim como o principal responsável:
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Art. 73 Os órgãos ou entidades pertencentes ao Sistema Nacional de Trânsito têm o dever de analisar as
solicitações e responder, por escrito, dentro de prazos mínimos, sobre a possibilidade ou não de
atendimento , esclarecendo ou justificando a análise efetuadas e, se pertinente, informar ao solicitante
quando tal evento ocorrerá.
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Art. 75. O CONTRAN estabelecerá, anualmente, os temas e os cronogramas das campanhas de âmbito
nacional que deverão ser promovidas por todos os órgãos ou entidades do Sistema Nacional de Trânsito,
em especial nos períodos referentes às férias escolares, feriados prolongados e à Semana Nacional de
Trânsito.
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Art. 74. A educação para o trânsito é direito de todos e constitui dever prioritário para os componentes
do sistema Nacional de Trânsito.§1º É obrigatória a existência de coordenação educacional em cada órgão
ou entidade componente do sistema Nacional de Trânsito. §2º Os órgãos ou entidades executivos de
trânsito deverão promover, dentro de sua estrutura organizacional ou mediante convênio, o
funcionamento de Escolas Públicas e Trânsito, nos moldes e padrões estabelecidos pelo CONTRAN.
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O Art. 93 encontra-se no capítulo VIII - da engenharia de tráfego, da operação, da fiscalização e do
policiamento ostensivo de trânsito e que define: Nenhum projeto de edificação que possa transformar-se
em polo atrativo de trânsito poderá ser aprovado sem prévia anuência do órgão ou entidade com
circunscrição sobre a via e sem que do projeto conste área para estacionamento e indicação das vias de
acesso adequadas.
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Art. 94 Qualquer obstáculo à livre circulação e à segurança de veículos e pedestres, tanto na via quanto
na calçada, caso não possa ser retirado, deve ser devida e imediatamente sinalizado. Parágrafo único. É
proibida a utilização das ondulações transversais e de sonorizadores como redutores de velocidade, salvo
em casos especiais definidos pelo órgão ou entidade competente, nos padrões e critérios estabelecidos
pelo CONTRAN.
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Nenhuma obra ou evento que possa perturbar ou interromper a livre circulação de veículos e pedestres,
ou colocar em risco sua segurança, será iniciada sem permissão prévia do órgão ou entidade de trânsito
com circunscrição sobre a via. § 1º A obrigação de sinalizar é do responsável pela execução ou
manutenção da obra ou do evento. § 2º Salvo em casos de emergência, a autoridade de trânsito com
circunscrição sobre a via avisará a comunidade, por intermédio dos meios de comunicação social, com
quarenta e oito horas de antecedência, de qualquer interdição da via, indicando-se os caminhos
alternativos a serem utilizados. § 3º A inobservância do disposto neste artigo será punida com multa que
varia entre cinquenta e trezentas UFIR, independentemente das cominações cíveis e penais cabíveis. §
município fiscalizar o trânsito, utilizando agentes próprios ou da Polícia Militar, por
meio de convênio, autuar e aplicar os requisitos previstos nos artigos 24, 23 e 21 do
CTB.
Diante da abrangência de suas competências, o município deve se preocupar
com a criação de um órgão municipal de trânsito que regulamente os fluxos, adequando-
os à realidade e às necessidades daqueles que precisam se deslocar, o art. 8º10, do CTB.
Depois de criado o órgão municipal de trânsito, cabe ao município instituir também sua
Junta Administrativa de Recursos de Infrações (JARI- art. 16, CTB), a qual está
destinada à observação da correção da aplicação das multas, possibilitando a
contestação por parte do cidadão, que na realidade se torna também um instrumento de
controle do processo de autuação e multa.
No aspecto financeiro, os municípios devem reverter os recursos obtidos com
as multas em projetos de trânsito, com a obrigação de repassar 5% do montante
arrecadado para programas nacionais, conforme prevê o art. 320, do CTB. A utilização
desses recursos deve estar voltada à otimização de resultados e redução de índices de
acidentes de trânsito. Uma parte desses recursos, conforme definem os artigos 16 e 337,
do CTB, deve servir para o apoio financeiro à JARI e ao Conselho Estadual de Trânsito
para propiciar maior interação entre os órgãos de trânsito.
Para além das atribuições legais, financeiras e institucionais, os municípios têm
também as atribuições técnicas, que dizem respeito à promoção do planejamento,
organização e operação do trânsito em todas as esferas de circulação, incluso paradas e
estacionamentos, ademais, a implantação e manutenção da sinalização de trânsito
(BRASIL, 1998).
O art. 95 do CTB, define que compete ao município autorizar e fiscalizar obras
nas vias públicas, controlar a circulação de veículos especiais, e analisar projetos de
polos geradores11 (art. 93 do CTB), considerando que estes são geradores de tráfego e
alteram a ocupação do espaço da cidade. Fato que torna fundamental a papel da
4º Ao servidor público responsável pela inobservância de qualquer das normas previstas neste e nos arts.
93 e 94, a autoridade de trânsito aplicará multa diária na base de cinquenta por cento do dia de
vencimento ou remuneração devida enquanto permanecer a irregularidade.
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ART. 8º Os estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão os respectivos órgãos e entidades
executivos de trânsito e executivos rodoviários, estabelecendo limites circunscricionais de suas atuações.
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Os polos geradores de trânsito intenso podem ser: um supermercado; uma loja de departamentos; um
shopping center; um estádio de futebol ,uma universidade um clube, uma fábrica e tantos outros
equipamentos sociais e econômicos.
municipalidade ao avaliar projetos com estas características a fim de evitar problemas
futuros, tanto para os veículos como para os pedestres e moradores de uma dada região.
Em síntese, a função dos municípios mediante o CBT a PNT e ao SNT, vai
muito além da mera tarefa de pintura de sinalizações, ou preocupação com a instalação
de equipamentos de punição. Ela deve se respaldar na busca pelo bem-estar e
preservação da vida das pessoas que estejam motorizadas ou não.
1.5 COMPORTAMENTOS SOCIALMENTE SIGNIFICATIVOS NO TRÂNSITO: A
INTERVENÇÃO PELA VIA DA EDUCAÇÃO.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6 ed. São Paulo: Atlas,
2008.
HOFFMANN, Maria Helena.; LUZ FILHO, Silvio Serafim da. A educação como
promotora de comportamento socialmente significativos no trânsito. In: HOFFMANN,
Maria Helena; CRUZ, Roberto Moraes.; ALCHIERI, João Carlos. (Orgs.).
Comportamento humano no trânsito. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003. p. 105-
109.
Resumo
O objetivo deste estudo foi verificar possíveis diferenças nos escores dos instrumentos que avaliam a autoeficácia para dirigir, o
desengajamento moral e a impulsividade em razão de variáveis como sexo, faixa etária, tempo de habilitação e frequência com
que se dirige, bem como analisar a predição destes construtos para envolvimento em multas e acidentes de trânsito. Participa-
ram 500 motoristas em processo de renovação da CNH, com idades entre 23 e 78 anos, sendo 60,4% do sexo masculino. Os
instrumentos utilizados foram a Escala de Autoeficácia para Dirigir (EADir), a Escala de Justificativas de Motoristas (EJM) e a
Escala de Avaliação da Impulsividade (EsAvI-A). Os resultados indicaram diferenças significativas para todas as variáveis socio-
demográficas e que os construtos predizem multas e acidentes de trânsito. Esses achados contribuem para a compreensão de
alguns comportamentos dos condutores e reforçam os indícios de que infrações e acidentes de trânsito são multideterminados.
Palavras-chave: Autoeficácia; Trânsito; Avaliação psicológica.
Abstract
The aim of this study was to investigate possible differences in the scores of instruments that assess the efficacy to drive, impul-
sivity and moral disengagement because of variables such as sex, age, time of driver license and the driving frequency, as well as
analyzing the prediction of these constructs for involvement in fines and traffic accidents. 500 drivers participated in the process
of renewal of CNH, aged 23-78 years, 60.4% male. The instruments used were the Self-Efficacy Scale to Drive (EADir), Scale
justifications drivers (EJM) and the Scale for Assessing Impulsivity (EsAvI-A). The results indicated significant differences
for all sociodemographic variables and that the constructs predict fines and traffic accidents. These findings contribute to the
understanding of some driver behavior and reinforce the evidence that violations and traffic accidents are multidetermined.
Keywords: Self-efficacy; Transit; Psychological evaluation.
Resumen
El objetivo de este estudio fue investigar las posibles diferencias en las puntuaciones de los instrumentos que evalúan la eficacia
de la unidad, la impulsividad y la desenganje moral debido a variables como el sexo, la edad, el tiempo de activación y la frecuen-
cia con la que se dirige, así como el análisis de la predicción de estos construcciones para la participación en multas y accidentes
de tránsito. 500 pilotos participaron en el proceso de renovación de la CNH, con edades entre 23-78 años, el 60,4% hombres.
Los instrumentos utilizados fueron la Escala de Autoeficacia para Conducir (EADir) Escala Justificaciones de conductores
(EJM) y la Escala para la Evaluación de la Impulsividad (EsAvI-A). Los resultados indicaron diferencias significativas para todas
las variables sociodemográficas y los construtos predicen multas y accidentes de tránsito. Estos resultados contribuyen a la
comprensión de algunos comportamientos del conductor y refuerzan la evidencia de que las violaciónes y accidentes de tránsito
multideterminadas.
Palabras clave: Auto-eficacia, Tránsito, Evaluación psicológica.
O trânsito tem se tornado um problema de saúde Estima-se que o fator humano seja o principal
pública em virtude dos números e das consequências responsável, visto estar presente em cerca de 90% dos
dos acidentes automobilísticos, já que dados da Orga- acidentes, sendo causados por erros ou violações à lei
nização Mundial da Saúde (OMS), do ano de 2009, (Hoffmann, 2005; Rozestraten, 1988). As condutas
indicaram que 1,3 milhão de pessoas morreram no que podem gerar riscos e os fenômenos psicológicos
mundo por acidentes de trânsito. Em relação ao Brasil, envolvidos na condução de veículos são de interesse
o Ministério da Saúde (2010) contabilizou mais de 40 da Psicologia do Trânsito, definida como o estudo
mil óbitos por acidentes de trânsito e 145,9 mil pessoas, dos comportamentos das pessoas neste contexto, bem
a maioria homens jovens e adultos da Região Sudeste, como dos fatores humanos externos ou internos que as
foram tratadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em motivam (Rozestraten, 1988). No que se refere à ava-
decorrência dos acidentes de trânsito, com um custo de liação psicológica pericial, a psicologia do trânsito tem
187 milhões de reais. como objetivo atuar de forma preventiva, buscando a
Disponível em www.scielo.br http://dx.doi.org/10.1590/1413-82712014019003008
458 Mognon, J. F. & Santos, A. A. A. Autoeficácia, desengajamento, impulsividade em motoristas
diminuição da possibilidade dos motoristas se envolve- para a construção da habilidade de dirigir, sendo impor-
rem em situações de risco (Lamounier & Rueda, 2005). tante que o seu papel seja mais bem compreendido, já
Desde 1962 a avaliação psicológica pericial é requisito que é indispensável para o processo de aprendizagem,
obrigatório para obtenção da Carteira Nacional de mas também é preciso entender a extensão que essas
Habilitação (CNH) e desde 1953, quando o motorista crenças podem refletir em uma avaliação irrealista e
exerce atividade remunerada (EAR). contribuir com a emissão de comportamentos de riscos.
Entretanto, além das habilidades tradicionalmente Corroborando essa ideia, Horsthuis (2011) identificou
investigadas na avaliação pericial, as crenças desses a autoeficácia como melhor preditora para o cometi-
motoristas sobre o trânsito e o respeito às normas mento de erros na direção, lapsos e violações do que as
sociais também podem ser relevantes para compreen- variáveis sexo e idade.
der os motivos dos acidentes de trânsito. Uma crença Os comportamentos de risco e consequentes
que precisa ser investigada é a autoavaliação dos transgressões às normas de trânsito são preocupantes,
motoristas sobre a sua capacidade para dirigir com visto que os condutores que não respeitam os limi-
segurança, a qual é denominada de autoeficácia para tes de velocidade e a sinalização e não usam cinto de
dirigir e embasada pela Teoria Social Cognitiva. Para segurança se envolvem mais com acidentes de trânsito
Bandura (1997), as crenças de autoeficácia referem-se (Magalhães & Loureiro, 2007). Estudos têm mostrado
ao julgamento pessoal sobre as suas capacidades para que não faltam aos motoristas atenuantes sociais ou
produzir os resultados esperados em uma determinada motivos exculpatórios que fazem parecer que o seu
tarefa. Vale lembrar que o construto de autoeficácia tem próprio comportamento não seja substancialmente
sido estudado em diversos contextos, como organiza- relevante para controlar a ocorrência de acidentes (Per-
cional, saúde, educacional e esporte (Bandura, 1997). feito & Hoffmann, 2003; Thielen, 2010).
No entanto, Delhome e Mayer (2004) já destacavam A interpretação dos resultados de comportamen-
que poucos são os estudos de autoeficácia relativos à tos e de julgamentos feitos nessa situação também
condução veicular. tem sido estudada pela Teoria Social Cognitiva em
Nesse sentido, as poucas pesquisas investigando a referência ao fenômeno denominado de desengaja-
autoeficácia para dirigir foram realizadas no exterior. O mento moral. Esse construto é entendido a partir das
fator idade pode ser entendido como importante ao se ideologias morais criadas pelas pessoas para justificar
avaliar a autoeficácia para dirigir, pois os resultados das seus comportamentos com objetivo de convencer a si
pesquisas (MacDonald, 2007; Stacey & Kendig, 1997) mesmo e aos outros que tais atitudes ou pensamentos
com motoristas com idades acima de 60 anos mostra- não são inadequados para determinada situação (Ban-
ram baixos níveis de autoeficácia, associados também dura, 1990).
com a baixa quantidade de quilômetros percorridos. O desengajamento moral tem sido estudado em
Ademais, no estudo de Taubman, Ari, Mikulincer e contextos desde processos de execução penal, práti-
Iram (2004), as altas pontuações em autoeficácia para cas terroristas e ações militares, degradação do meio
dirigir foram relacionadas à condução imprudente nos ambiente, até ações no mundo corporativo em que há
motoristas jovens. Com base nos resultados dos dois o uso de processos de produção prejudiciais à saúde
estudos, pode-se afirmar que o excesso de confiança humana (Azzi, 2011). No Brasil, os estudos com base
nas habilidades de dirigir nos jovens tende a contri- na teoria do desengajamento moral são recentes e apa-
buir com comportamentos de risco, enquanto para os recem relacionados a diversas temáticas, inclusive ao
motoristas idosos, há a falta de confiança em dirigir trânsito, remetendo especialmente ao cometimento de
com segurança. infrações (Iglesias, 2002; Luiza Neto, 2009).
No estudo de Delhome e Meyer (2004), os prin- Dentre os resultados da pesquisa de Iglesias
cipais resultados indicaram que os motoristas com (2002) com 100 motoristas do Rio de Janeiro, foi
escores baixos em autoeficácia para dirigir foram os identificada correlação positiva e significativa, de mag-
que cometeram mais erros, quando comparados aos nitude moderada entre o desengajamento moral e as
que apresentaram altos escores, enquanto os motoris- infrações de trânsito. No mesmo sentido, o estudo de
tas menos experientes na direção, mas que acreditavam Luiza Neto (2009) com 161 policiais do Distrito Fede-
muito na sua capacidade para dirigir, cometeram mais ral permitiu inferir que as justificativas morais mais
erros do que os motoristas com baixas crenças de recorrentes dadas pelos motoristas mascaravam o ato
autoeficácia. Para os autores, a autoeficácia contribui infracional, tornando-o menos repreensível. Ainda
Psico-USF, Bragança Paulista, v. 19, n. 3, p. 457-466, set./dez. 2014
Mognon, J. F. & Santos, A. A. A. Autoeficácia, desengajamento, impulsividade em motoristas 459
nesse mesmo estudo, foram analisados os recursos da impulsividade, as pesquisas nacionais são escassas. O
interpostos junto ao Departamento Estadual de Trân- único estudo publicado que focalizou a impulsividade
sito, sendo verificado que predominavam justificativas em motoristas foi o de Pasa (2013), em uma amostra
atribuindo a responsabilidade pela multa ao aparelho de 158 condutores infratores e 181 não infratores da
medidor, à sinalização, ao órgão de trânsito, ao policial cidade de Porto Alegre. Os autores verificaram que a
e aos outros motoristas. impulsividade, bem como comportamentos de ingerir
Contudo, Iglesias (2008) ressalta que pessoas pací- bebida alcoólica, assumir infrações de outro condutor,
ficas também podem cometer atos antissociais, desde solicitar que outro condutor assumisse suas infrações
que legitimadas por algum pensamento que lhe sirva e a frequência com que o condutor dirige foram pre-
como justificativa. No entanto, no trânsito, não apenas ditores para o cometimento de infrações no trânsito.
circunstâncias momentâneas explicam os compor- Por outro lado, também se evidenciou que possuir mais
tamentos dos motoristas, já que dentre as principais anos de estudo representou um fator de proteção à dire-
variáveis preditoras de comportamento de risco no ção segura. As outras pesquisas encontradas buscaram
trânsito estão os traços de personalidade do condutor avaliar a personalidade de forma geral, e encontraram
(Pasa, 2013). alguns resultados relativos especificamente à impulsivi-
Em acréscimo, Santos, Boff e Konflanz (2012) dade, demonstrando que os motoristas com acidentes e
realizaram uma revisão de estudos internacionais que vítimas apresentam maiores médias para impulsividade
incluiu 13 artigos publicados entre os anos de 2000 a e que ela está associada com infrações de trânsito (Alves
2011, em que foram encontradas evidências de que a & Esteves, 2004; Lamounier, 2005).
avaliação dos traços de personalidade facilita a identi- Com base em Pasa (2013), alguns aspectos sociode-
ficação de motoristas com perfis de alto risco para o mográficos, como sexo, idade, escolaridade, frequência
envolvimento em infrações e acidentes de trânsito. Um com que dirige, tempo de CNH e fatores relacionados
dos traços de personalidade que se mostra relevante no ao funcionamento da personalidade, estão comumente
trânsito é a impulsividade, que se encontra diretamente associados à direção insegura. Assim, o objetivo deste
relacionada com comportamentos de risco (Araújo, estudo foi verificar possíveis diferenças nos escores dos
Malloy-Diniz & Rocha, 2009; Ryb, Dischinger, Kufera instrumentos que avaliam a autoeficácia para dirigir, o
& Read, 2006;). desengajamento moral e a impulsividade em razão de
A impulsividade, segundo Wickens, Toplak e variáveis como sexo, faixa etária, tempo de habilitação
Wiesenthal (2008) refere-se à busca intencional de ris- e frequência com que se dirige, bem como analisar se
cos e emoções e está diretamente ligada às violações. alguns desses construtos predizem multas e envolvi-
Diferente dos dois construtos já mencionados, a impul- mento em acidentes de trânsito.
sividade faz parte da Teoria do Traço e é definida por
Pueyo (2003) como a falta de autocontrole sobre os Método
processos emocionais e automáticos e tendência a atuar
de forma rápida e sem reflexão. Participantes
Pesquisas publicadas no exterior revelaram que a Participaram 500 motoristas em processo de
impulsividade está relacionada com a percepção e com- renovação de CNH em duas clínicas credenciadas ao
portamentos de risco no trânsito, como abuso de álcool DETRAN/PR da cidade de Curitiba. As idades dos
e excesso de velocidade (Ryb e cols., 2006); erros e participantes variaram entre 23 e 78 anos (M=40,61;
violações agressivas (Constantinou, Panayiotou, Kons- DP=12,88), 60,4% (n=302) era de sexo masculino e
tantinou, Loutsiou-Ladd & Kapardis, 2011); ainda, 88,2% (n=441) com escolaridade de ensino médio a
com multas e envolvimento em acidentes (González- pós-graduação. O tempo de habilitação dos condutores
-Iglesias, Gomes-Fraguela, Romero & Sobral, 2012). Os variou de 5 a 56 anos (M=16,82; DP=11,86), 62,2%
dados dessas pesquisas reafirmam a importância de se (n=306) declararam não ter tido multas nos últimos
focalizar a impulsividade no trânsito e a relevância da 12 meses e apenas 38,8% (n=192) tiveram de uma a
sua avaliação nos comportamentos dos condutores. 10 multas no último ano. No que se refere ao envolvi-
No entanto, apesar dos dados empíricos dos estu- mento em acidentes de trânsito, verificou-se que 174 do
dos recuperados e da resolução 425/2012 do Conselho total dos pesquisados já haviam sofrido, 102 (58,6%)
Nacional de Trânsito (CONTRAN) apontar que um dos declararam que apenas um durante o tempo que pos-
aspectos esperados do motorista é o controle adequado suem a CNH; 63 (36,2%), de dois a três; e apenas 9
Psico-USF, Bragança Paulista, v. 19, n. 3, p. 457-466, set./dez. 2014
460 Mognon, J. F. & Santos, A. A. A. Autoeficácia, desengajamento, impulsividade em motoristas
(5,2%) mais de quatro acidentes. Contudo, 107 (61,5%) denominado de Reconstrução da conduta (com 10 itens
relataram ter sido vítimas dos acidentes, ou seja, ter- e α de 0,82) – referindo-se à racionalização da conduta
ceiros foram os responsabilizados pela situação. Já 38 em uma boa ação; o segundo fator denominado de Jei-
(21,8%) informaram terem sido responsabilizados pela tinho – possui itens referentes tanto aos mecanismos
ocorrência e 29 (16,7%) relataram ter sofrido mais de de Reconstrução da conduta como aos de Distorção
um acidente, sendo em algum momento vítima e, em do agente de ação (possui 11 itens e α de 0,82) – rela-
outro, responsabilizados. ciona-se à atribuição de culpa ao outro pelo seu ato e
racionalização da conduta; e o terceiro – predominân-
Instrumentos cia dos mecanismos de Distorção do agente da ação (7
itens e α 0,70) – refere-se a atribuição da sua culpa ao
Questionário Sociodemográfico outro.
Para obtenção de informações como sexo, idade,
escolaridade, estado civil, rendimentos mensais, tempo Escala de Avaliação da Impulsividade – EsAvI-A (Rue-
de carteira de motorista e categoria da CNH. Foi tam- da & Ávila-Batista, 2013)
bém perguntada a frequência com que dirige, além do O instrumento avalia a impulsividade e apresenta
número de multas nos últimos doze meses e o envolvi- propriedades psicométricas adequadas. Possui 36 itens
mento em acidentes de trânsito. divididos em quatro dimensões, nomeados como: fator
1 – falta de concentração e de persistência (composto
Escala de Autoeficácia para Dirigir (Mognon & Santos, por 14 itens e α=0,87) – que se refere à incapacidade
no prelo) que o indivíduo apresenta de manter o foco em uma
Tem como objetivo avaliar a crença dos motoristas determinada tarefa ou atividade por um tempo prolon-
em sua capacidade para dirigir veículos com segurança. gado sem se dispersar, assim como dar continuidade
Possui 28 itens distribuídos em uma escala com pontua- a algo que tenha iniciado; fator 2 – controle cognitivo
ção do tipo likert de 1 (pouco confiante) a 10 (totalmente (composto por 9 itens e α=0,85) – refere-se a quanto o
confiante). O resultado da análise fatorial exploratória indivíduo procura refletir sobre suas ações, buscando
indicou estrutura unifatorial e a confiabilidade, verifi- avaliá-las antes de agir ou responder aos estímulos
cada por meio do alfa de Cronbach, foi de 0,94. externos ou internos; fator 3 – planejamento futuro
(composto por 7 itens e α 0,78) – o qual avalia a capa-
Escala de Justificativas de Motoristas – EJM (Iglesias, cidade de planejar ações cujos efeitos não se restringem
2002 adaptada por Luiza Neto, 2009) ao momento presente; fator 4 – audácia e temeridade
O objetivo da escala é avaliar o cometimento de (composto por 6 itens e α 0,62) – refere a incapacidade
atos antissociais pelos motoristas e são avaliados por de avaliar situações que possam envolver algum risco,
meio de justificativas. Foi elaborada por Clark, Igle- bem como refletem a busca por sensações novas.
sias e da Silva (2000, apud Iglesias, 2002) com base na
Multifaceted Scale of Mechanismsof Moral Disengagement de Procedimento de coleta de dados
Bandura. Os itens do instrumento original foram sub- Com a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa,
metidos a um processo de tradução e retradução por a autorização do DETRAN/PR e das proprietárias das
um pesquisador bilíngue, adaptando-os à temática do clínicas iniciou-se a coleta dos dados. Os candidatos
comportamento infracional no trânsito. Inicialmente à renovação que tiveram resultado de “apto” na ava-
composta por 57 itens, representava cada um dos qua- liação de aptidão física e mental eram encaminhados,
tro esquemas de desengajamento moral. A versão final individualmente, pelo médico, a uma sala previamente
de coleta, no entanto, apontou inconsistência em 20 preparada para a realização da pesquisa. Então, a pes-
dos 57 itens, mantendo-se um formato de 37 itens, os quisadora se apresentava, informava que o resultado no
quais foram avaliados por meio da análise de cinco juí- exame médico havia sido “apto”, bem como os motivos
zes especialistas em psicologia social, ambiental e do para o candidato ter sido encaminhado até a sala. Com
trânsito, indicando a necessidade de efetuar alterações isso, apresentava os objetivos da pesquisa e, principal-
de ordem semântica e a exclusão de um item ambíguo. mente, ressaltava que a participação era voluntária, que
Luiza Neto (2009) investigou as qualidades psi- os dados seriam mantidos em sigilo, que os procedi-
cométricas do instrumento e os resultados indicaram mentos do DETRAN e da pesquisa eram distintos e
uma versão final com 28 itens, sendo o primeiro fator independentes e que a avaliação não era obrigatória, e
Psico-USF, Bragança Paulista, v. 19, n. 3, p. 457-466, set./dez. 2014
Mognon, J. F. & Santos, A. A. A. Autoeficácia, desengajamento, impulsividade em motoristas 461
caso não aceitassem participar não haveria nenhuma da normalidade. O método utilizado para seleção do
consequência no seu processo de renovação. Os con- melhor modelo foi o forward stepwise, pelo critério de
dutores que aceitaram participar da pesquisa assinaram máxima verossimilhança (Likelihood Ratio – LR). A ade-
o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e a quação do modelo de regressão logística foi verificado
pesquisadora explicava a forma de realização de cada pelo o teste Wald e o resultado foi significativo ao nível
instrumento. O tempo aproximado de cada aplicação de 5% (p<0,05), rejeitando-se a hipótese nula de que as
foi de 15 minutos. variáveis independentes avaliadas não produzem efeito
sobre as variáveis dependentes.
Procedimento de análise de dados
Os dados foram tabulados e analisados com o soft- Resultados
ware estatístico SPSS (Statistical Package for Social Sciences),
versão 18.0. Depois, foram submetidos a procedimen- Considerando os objetivos estabelecidos, pri-
tos de estatística descritiva, sendo analisadas diferenças meiramente foram investigadas diferenças atribuídas
decorrentes de variáveis sociodemográficas com o teste à variável sexo. A Tabela 1 mostra os resultados das
t de Student, quando se compararam homens e mulhe- análises.
res, e com a ANOVA, para a comparação da amostra Os dados da Tabela 1 mostram as diferenças
de acordo com faixas etárias, tempo de experiência do estatisticamente significativas na EADir, e nas três
condutor e frequência com que dirige. Para a análise e dimensões da EJM, na dimensão Audácia e temeridade
regressão logística, seguiram-se alguns procedimentos e na variável envolvimento em acidentes sendo as maio-
padrão, como a verificação de ausência de multicoli- res médias para os homens, enquanto, no fator Falta
nearidade entre as variáveis por meio da correlação de concentração e persistência da EsAvI-A, as maiores
de Spearman, em razão da ausência do pressuposto médias foram para as mulheres.
Tabela 1. Análise para a variável sexo na EADir, EJM, EsAvI-A, multas e envolvimento em acidentes (N=500)
Sexo N Média Desvio padrão t p
EADIR M 302 242,26 31,118 0,001
F 198 229,69 37,399 4,042
Reconstrução da conduta M 302 11,78 3,915 0,053
F 198 11,13 3,245 1,946
Jeitinho M 302 15,35 5,055 0,027
EJM
Para a variável idade foram estabelecidos grupos Buscou-se também avaliar diferenças para a
com maior risco de acidentes de trânsito, segundo dados variável frequência com que os motoristas dirigiam
do Ministério da Saúde de 2010. Assim, os grupos foram semanalmente e aplicou-se a ANOVA. Os resul-
divididos, compreendendo o primeiro idades entre 23 a tados indicaram diferença significativa na EADir
29 anos; o segundo, de 30 a 39 anos; o terceiro, de 40 a 49 [F(2,497)=42,032; p<0,001] para multas [F(2,
anos e o último grupo com idades acima de 50 anos. Os 497)=8,941; p<0,001] e envolvimento em acidentes
resultados indicaram diferenças estatisticamente signifi- [F(2, 497)=11,816; p<0,001]. O post-hoc de Tukey indi-
cativas nos escores da EADir [F(3,496)=5,706; p<0,001] cou que os motoristas que dirigem uma vez ou mais
com menor média para os com mais de 50 anos; e nas por dia apresentaram escores em autoeficácia para
dimensões da EsAvI-A – Falta de concentração e Per- dirigir, número de multas e envolvimento em aciden-
sistência [F(3,496)=4,106; p=0,006], Planejamento do tes maiores que os que dirigem uma vez por semana e
futuro [F(3,496)=8,947; p=0,001] e Audácia e temeri- este, maior que os que raramente dirigem.
dade [F(3,496)=7,626; p=0,001] com maiores médias Com o objetivo de compreender se os construtos
para os motoristas mais jovens, enquanto, na dimensão de autoeficácia para dirigir (EADir), desengajamento
Controle cognitivo [F(3,496)=6,103; p=0,001], a maior moral (EJM) e impulsividade (EsAvI-A) predizem o
média foi para os motoristas acima de 50 anos. número de multas nos últimos doze meses e o envolvi-
Quanto à variável tempo de obtenção da CNH, mento em acidente de trânsito, utilizou-se a regressão
julgou-se pertinente realizar a comparação conside- logística. Os resultados indicaram que, na EADir, o
rando-se o efeito da variável idade. Foram incluídas a modelo prediz o número de multas (OR=1,62; IC 95%
autoeficácia para dirigir, os fatores da EJM, as dimen- 1,28-2,05) e envolvimento em acidentes (OR=1,42;
sões da EsAvI-A, número de multas e acidentes. Para IC 95% 1,13-1,78), enquanto, para a EJM, a dimensão
tanto, recorreu-se à MANOVA, cujos resultados indi- Reconstrução da conduta (OR=1,29; IC 95% 0,98-
caram diferenças estatisticamente significativas apenas 1,66), o envolvimento em acidentes e o fator Jeitinho
nos escores da EADir [Wilks’λ=0,921, F(3,496)=5,20, na predição de multas (OR=1,33; IC 95% 1,02-1,72).
p< 0,002; η2=0,032). Na Figura 1 é possível verificar a Por fim, a dimensão Falta de concentração e persis-
separação dos grupos para tempo de CNH quanto às tência da EsAvI-A contribui com a predição de multas
pontuações na EADir. (OR=1,25; IC95% 0,97-1,56). Os resultados indicam
A Figura 1 traz os dados obtidos na EADir, visto que pessoas que acreditam muito na sua capacidade
que foi a única que apresentou diferença significativa, como motorista apresentaram uma probabilidade
quando se considerou tempo de CNH e se controlou o aproximadamente 50% maior de terem multas e envol-
efeito da idade. Os resultados indicaram que a autoefi- vimento em acidentes. Os motoristas que se utilizam
cácia para dirigir aumenta conforme aumentam os anos mais de justificativas baseadas na Reconstrução da
de obtenção da CNH. conduta têm maiores chances de envolvimento em
acidentes. Já em relação ao cometimento de multas, as
pessoas que julgaram utilizar justificativas baseadas no
fator Jeitinho apresentaram probabilidade maior, bem
como as que pontuaram mais em Falta de concentração
e persistência.
medidas de autoeficácia para dirigir (EADir), de desen- estudo de Taubman e cols. (2004), o excesso da auto-
gajamento moral (EJM) e de impulsividade (EsAvI-A) confiança na capacidade para dirigir foi relacionadas à
podem predizer multas e envolvimento em acidentes condução imprudente nos motoristas jovens. Diante
de trânsito. disso, estudos futuros deverão ocorrer para melhor
No que se refere à variável sexo, verificou-se que esclarecer o papel do fator idade e dos aspectos cogni-
os homens apresentaram médias significativamente tivos na autoeficácia para dirigir.
maiores em Autoeficácia para dirigir, nos fatores Recons- Na EsAvI-A, as diferenças foram significativas
trução da conduta, Jeitinho e Distorção do agente da nas dimensões Falta de concentração e persistência,
ação da EJM, na dimensão Audácia e temeridade da Planejamento do futuro, e Audácia e temeridade, com
EsAvI-A e na variável envolvimento em acidentes. A maiores médias para os motoristas com idades entre 23
partir dos resultados, é possível inferir que os homens e 29 anos. Contudo, na dimensão Controle cognitivo,
acreditam mais na sua capacidade para dirigir e se valem a maior média foi obtida por motoristas de 50 anos ou
de mecanismos para transformar o seu ato prejudicial mais. Com base na descrição do que representa cada
no trânsito em uma boa conduta, distorcendo os seus dimensão, pode-se afirmar que os motoristas mais
efeitos maléficos por meio de justificativas socialmente jovens foram os que declararam apresentar maior difi-
aceitas com objetivo de evitar penalidades em benefício culdade para manter o foco em determinada atividade
próprio. Apresentam, também, incapacidade de avaliar por um tempo prolongado, bem como em dar con-
as situações que envolvem risco e tendem a buscar por tinuidade a algo que tenham iniciado. Apesar disso,
sensações novas, consequentemente tendem a ter maior declararam que planejam suas ações futuras, mas não
envolvimento em acidentes de trânsito. avaliam as situações que podem envolver risco e buscam
Há congruência desses achados com os resul- por sensações novas, enquanto os mais idosos declara-
tados da revisão realizada por Magalhães e Loureiro ram que procuram refletir sobre suas ações. Aspectos
(2007) e dos dados de 2010 do Ministério da Saúde, referentes à idade são importantes para compreen-
nos quais os homens integram o grupo de risco, sendo são dos comportamentos dos motoristas no trânsito,
a maioria nos acidentes de trânsito. Embora não haja embora não tenham sido encontradas diferenças signi-
estudos que corroborem os dados sobre o desengaja- ficativas no número de multas e de envolvimento em
mento moral, aqui encontrados, a pesquisa de Luiza acidentes. Contudo, este achado, em especial, deve ser
Neto (2009) identificou predomínio dos homens nas avaliado em novos estudos, já que, segundo dados de
solicitações de recursos aos órgãos de trânsito contes- 2010 do Ministério da Saúde, os jovens entre 24 e 35
tando as multas recebidas, o que pode ser indicativo anos são os maiores envolvidos com acidentes de trân-
da não aceitação da ocorrência, com possível autojul- sito, e a literatura tem destacado que pessoas impulsivas
gamento positivo sobre a habilidade no trânsito ou apresentam mais comportamentos de riscos e obtêm
pela justificação de sua conduta ao volante. Quanto mais multas (Araújo e cols., 2009; Ryb e cols., 2006)
à impulsividade, González-Iglesias e cols. (2012) não e maior envolvimento em acidentes (Alves & Esteves,
encontraram diferenças significativas para a variável 2004; Constantinou e cols., 2011; Lamounier, 2005).
sexo. Mas, os resultados da presente pesquisa refor- Tanto no que se refere ao tempo de obtenção
çam a necessidade de se investigar essa variável, pois da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) como
além dos fatores biológicos e inatos, aspectos culturais à frequência com que os motoristas dirigem, foram
e contextuais ligados às diferenças entre os sexos no identificadas diferenças significativas nos escores da
trânsito precisam ser explorados. EADir e no número de multas e acidentes. Tais resul-
No que se refere à faixa etária, foram identificadas tados revelaram que a autoeficácia para dirigir aumenta
diferenças significativas na EADir, com menor média gradativamente com o tempo que se possui a CNH, che-
para os motoristas da faixa etária acima de 50 anos, gando a níveis bastante altos quando se tem 24 anos de
indicando que eles acreditam menos na sua capacidade habilitação. Também, quanto mais a frequência sema-
para dirigir com segurança. Este resultado assemelha- nal que o motorista dirige mais confiante se sente na
-se aos de Stacey e Kendig (1997) e McDonalds (2007), direção, o que pode contribuir, consequentemente, com
o que possibilita deduzir que, ao perceber a diminui- maior número de multas e envolvimento em acidentes.
ção das capacidades cognitivas, os motoristas sintam-se Assim, esses resultados indicam que a autoeficácia para
menos confiantes e evitem dirigir. Mas, vale ressaltar dirigir está atrelada à aquisição de habilidades e expe-
que, quanto à idade, há dissenso na literatura, já que, no riência. Com isso, pressupõe-se que ações no sentido
Psico-USF, Bragança Paulista, v. 19, n. 3, p. 457-466, set./dez. 2014
464 Mognon, J. F. & Santos, A. A. A. Autoeficácia, desengajamento, impulsividade em motoristas
de prolongar o treinamento nos centros de formação refletem as crenças que têm sobre o trânsito, as normas
de condutores (autoescolas) podem contribuir para que e os outros motoristas, que podem sofrer interferência
os futuros condutores sintam-se mais autoeficazes para da cultura e do contexto no qual estão inseridos.
dirigir. Além disso, é importante, também, que sejam No que diz respeito ao fator “Jeitinho”, verifi-
feitos estudos que busquem compreender o quanto a cou-se que os motoristas que mais recorreram a esse
autoeficácia para dirigir pode contribuir para que os esquema, que é a busca por resolução de problemas por
motoristas assumam comportamentos de risco. meio da influência social, combinando-a com truques
Com objetivo de compreender essa última indaga- de esperteza e quebra das regras sociais, apresentam
ção, aplicou-se a regressão logística nos dados. Assim, maiores chances de ter multas. Luiza Neto (2009) tam-
verificou-se que os motoristas com escores altos em bém identificou que esse esquema está presente nas
autoeficácia para dirigir têm maiores chances de ter justificativas dos motoristas tanto no momento das
multas e envolvimento em acidentes. Outros estudos abordagens dos policiais como nos recursos de multas
já apontavam a autoeficácia para dirigir como preditora interpostos ao DETRAN, quando são usados argu-
para a frequência de arriscar-se na direção e compor- mentos que variam desde a sensibilização da polícia e
tamentos de risco no trânsito, como violações, erros agentes de trânsito, invocação de prestígio até a ameaça.
perigosos, atenção inadequada e lapsos (Horsthuis e Para as dimensões da Escala de Avaliação da
cols., 2011; Taubman e cols., 2004). Com isso, eviden- Impulsividade (EsAvI-A) somente foi encontrada
ciou-se a necessidade de novos estudos nacionais, visto predição para a dimensão “Falta de concentração e per-
que estudos estrangeiros, como o de Delhome e Meyer sistência” com multas, indicando que as pessoas com
(2004), já apontaram que a autoeficácia contribui para o dificuldade para manter o foco por tempo prolongado
aprimoramento da habilidade de dirigir, mas, também, em algo têm maiores chances de cometer multas. Nesse
que o excesso de confiança nesta habilidade pode levar caso, a distração parece estar mais implicada com o erro
os motoristas a superestimar o controle que podem do que com a imprudência. Esse resultado é em parte
exercer sobre as situações de condução e tornar-se esperado, já que a atenção é essencial no contexto do
uma possível ameaça para multas e acidentes. Adicio- trânsito, tanto que a avaliação deste construto é obri-
nalmente, seria conveniente que investigações fossem gatória nos processos de avaliação psicológica pericial.
realizadas com amostras ampliadas e diversificadas, pre- Mas o resultado encontrado na pesquisa não identificou
ferencialmente recorrendo a outras estratégias, como o as outras características da impulsividade avaliadas pela
uso de simuladores de direção, a fim de verificar a auto- EsAvI-A como preditoras para o envolvimento em aci-
percepção do motorista e compará-la com dados reais dentes de trânsito, diferindo do estudo de Pasa (2013).
de como ele dirige. Todavia, Araújo e cols. (2009) já haviam concluído, em
Os resultados da análise de regressão indicaram seu estudo de revisão da literatura, que a relação entre
ainda maior probabilidade de envolvimento em aciden- impulsividade e acidente de trânsito é controversa.
tes também para os motoristas que utilizam o esquema Assim, dada a importância que esse construto repre-
“Reconstrução da conduta”. O uso desse esquema visa senta na avaliação pericial no trânsito, esses achados
transformar o ato prejudicial em uma boa conduta, merecem ser retomados em estudos futuros.
podendo ser utilizado pelos motoristas para minimizar Não se pode deixar de apontar as limitações deste
o efeito negativo da ação transgressora sobre si mesmo. estudo. A primeira refere-se ao uso de instrumentos de
No estudo de Iglesias (2002) já havia sido apurada autorrelato, bem como ao uso para apuração do envol-
correlação de magnitude moderada entre esse mesmo vimento em multas e acidentes, visto que os resultados
fator com infrações de trânsito. Igualmente, Luiza Neto podem não corresponder à realidade, pois a desejabi-
(2009) identificou o uso recorrente desse esquema na lidade social estava muito presente, dado o cenário da
justificação às infrações de trânsito. Ressalta-se que não pesquisa, em uma clínica de avaliação pericial para o
houve como comparar com os resultados encontrados trânsito e em processo de renovação da CNH. Embora
no que se refere ao envolvimento em acidentes, já que tenham sido tomados cuidados no momento da abor-
essa variável não foi contemplada nas pesquisas citadas, dagem para a participação da pesquisa, é importante
que focalizaram apenas as multas. No entanto, parece que haja cautela na interpretação dos dados.
que essas variáveis estão diretamente relacionadas Conclui-se que os fatores envolvidos na ocor-
entre si, como verificado no estudo de Constantinou rência de comportamentos de risco que resultam em
e cols. (2011). Mas são necessários novos estudos, já multas e acidentes são multideterminados. Apesar disso,
que as justificativas morais fornecidas pelos motoristas espera-se que os resultados encontrados nesta pesquisa
Psico-USF, Bragança Paulista, v. 19, n. 3, p. 457-466, set./dez. 2014
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567-573. Aprovado em: 03/02/2014
Este artigo se deu com base na dissertação de mestrado da primeira autora intitulada “Estudos para construção da
Escala de Autoeficácia para dirigir (EADir)”, e as autoras agradecem à CAPES pelo financiamento da pesquisa.
Sobre as autoras:
Jocemara Ferreira Mognon é psicóloga, mestre e doutoranda em Psicologia na área de concentração Avaliação Psi-
cológica na Universidade São Francisco-Itatiba/SP e bolsista CAPES.
Acácia Aparecida Angeli dos Santos é Psicóloga, doutora em Psicologia Escolar e Desenvolvimento Humano
pela USP e docente da Graduação e do Programa de Pós-Gradução Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São
Francisco –Itatiba/SP.
Dra. Acácia A. Angeli dos Santos – Universidade São Francisco – Programa de Pós-Graduação em Psicologia – Rua
Alexandre Rodrigues Barbosa, n. 45
CEP: 13251-040. Itatiba/SP.
E-mail: acacia.angeli@gmail.com
Psico-USF, Bragança Paulista, v. 19, n. 3, p. 457-466, set./dez. 2014
wwwSVLFRORJLDFRPSW
Docum ent o produzido em 22- 10-2006
$9$/,$d236,&2/Ï*,&$'(&21'8725(6
'(9(Ë&8/267(55(675(612%5$6,/
(2006)
&DUROLQD%DUWLORWWL
Psicóloga Especialista em Avaliação Psicológica.
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Psicologia UFSC – Brasil
Pesquisadora do Laboratório de Psicologia do Trabalho e Ergonomia e Núcleo de Avaliação
e Perícia Psicológica – UFSC (Brasil)
(YkQHD-RDQD6FRSHO
Psicóloga
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Psicologia UFSC – Brasil
Pesquisadora do Laboratório de Psicologia do Trabalho e Ergonomia e Núcleo de Avaliação
e Perícia Psicológica – UFSC (Brasil)
3DXOD&ULVWLQD*DPED
Psicanalista e Especialista em Avaliação Psicológica
&RQWDFWRV
evanea@terra.com.br
5(6802
Ser pedestre e passageiro é um direito; todos nós temos o direito de ir e vir pelas ruas sem
ter que portar nenhuma autorização. Porém, ser condutor é uma concessão; e para que as pessoas
possam conduzir veículos automotivos é necessário cumprir algumas exigências impostas pelo
Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN), especificadas na Resolução nº. 080/98 –
CONTRAN. Nesta Resolução, estão elencados os exames exigidos para obtenção da Carteira
Nacional de Habilitação (CNH), são eles:
• Avaliação Psicológica (A.P.): esta avaliação deve ser feita por um Psicólogo Perito
Examinador do Trânsito (PPET1) que aferir psicometricamente as características
psicológicas referentes à área percepto-reacional, motora e nível mental; do equilíbrio
psíquico e habilidades específicas.
1
Para que o psicólogo possa atuar como Perito Examinador do Trânsito (PPET), ele deve fazer um curso de Perito
Examinador do Trânsito, com duração de aproximadamente 80 horas.
que focaliza, de uma só vez, diversos estímulos que estão dispersos espacialmente, realizando
uma captação rápida de informações e fornecendo um conhecimento instantâneo para o
indivíduo. A atenção discriminativa é a função mental que ao focalizar dois ou mais estímulos
diferentes, necessita realizar uma discriminação, uma separação, para tornar em consideração
somente o estímulo de seu interesse e assim emitir uma resposta específica (Tonglet, 1999).
Na resolução 080/98 está descrito que o perito examinador do trânsito deve avaliar a
atenção (na área percepto-reacional) e a atenção concentrada (habilidade específica). Desta forma
a informação descrita na resolução não é precisa quanto a avaliação da atenção; não está claro se
o psicólogo deve avaliar o construto atenção em seus 3 tipos, ou somente a atenção concentrada.
A SHUFHSomR é o processo mental através do qual a informação sensorial é organizada e
integrada significativamente, podendo, desta maneira, ser reconhecida. “A vivência
fenomenológica das percepções não corresponde exatamente à influência direta do meio externo
sobre os receptores do sistema nervoso, mas sim à maneira particular como o cérebro organiza e
representa essa influência” (Bastos, 2000).
um ato de conhecimento da consciência. Os fatos oferecidos pelo mundo à nossa volta resultarão
numa representação única e individual para cada um de nós, e será esta representação que
constituirá a realidade particular de cada indivíduo. Desta forma, a representação da realidade
(mais importante que a própria realidade) será tão mais completa, global e integrada quanto
maior a capacidade de consciência que a pessoa tem dos fatos ao seu redor.
a) ansiedade e excitabilidade
b) ausência de quadro reconhecidamente patológico;
c) controle adequado da agressividade e impulsividade;
d) equilíbrio emocional;
e) ajustamento pessoal-social;
f) demais problemas correlatos (alcoolismo, epilepsia, droga adição, entre outros), que
possam detectar contra-indicações à segurança do trânsito.
(GLWRUD
d2 Avaliação da atenção concentrada visual e, em CETEPP
sentido mais amplo, da capacidade de concentração.
TACOM A e TACOM B Investiga, avalia e mensura a Atenção Concentrada Vetor
de motoristas.
BFM 4 Mensura a atenção concentrada através de um Vetor
modelo de avaliação complexo permitindo que se
possa avaliar com maior profundidade e sob uma
maior pressão de tempo, os candidatos à obtenção da
C. N. H. e motoristas em geral
BGFM-2 Mensura a atenção concentrada com enfoque Vetor
neuropsicológico sobre a atenção e a emoção.
Atenção concentrada Possibilita tanto a visualização dos percursos
cerebrais das vias corticais e subcorticais como
também as interferências das emoções nos sistemas
atentivos
AC Avalia a capacidade que o sujeito tem de manter a Vetor
sua atenção concentrada no trabalho durante um
período.
AC 15 Avalia a capacidade que o sujeito tem de manter a Vetor
sua atenção concentrada no trabalho durante um
período. Além disso permite avaliar fadiga, a
resistência à monotonia e de modo indireto o
interesse pelo tipo de trabalho realizado
Deve ser avaliada através de técnicas psicológicas.
(GLWRUD
* $'0
Ajustamento pessoal - Avalia aspectos da personalidade do sujeito, inclusive
PLG Vetor
social características de ajustamento pessoal e social.
1 /%3
O PLG é capaz de apontar indício de intoxicação por
PLG Vetor
*' Demais problemas
substâncias psicoativas e sinais de epilepsia.
,12* # 0 correlatos (alcoolismo, O PMK é uma prova de expressão gráfica que se
epilepsia, droga adição, propõe a explorar a personalidade, estudando sua
"/ entre outros), que possam fórmula atitudinal mediante a análise das tensões
.' detectar contra-indicações PMK musculares involuntárias, que revelam as tendências Vetor
- ")#
à segurança do trânsito fundamentais de reação, constituído por suas
peculiaridades temperamentais e caracterológicas. É
capaz de detectar sinais de intoxicação e epilepsia.
O EFN tem como objetivo avaliar a personalidade a
Testes de personalidade Casa do
EFN partir do levantamento de Traços de Personalidade e
em geral psicólogo
os resultados podem ser equiparados ao DSM-IV
Há testes que avaliam o
Rapidez de raciocínio raciocíonio, porém nenhum
avalia a rapidez de raciocínio.
&216,'(5$d®(6),1$,6
Apesar do sistema trânsito ter muitos elementos comuns em todos os países, cada federação
têm seu próprio Código de trânsito com suas especificidades. Porém, as habilidades do condutor
devem ser semelhantes seja num condutor brasileiro ou japonês independentemente da tecnologia
empregada nos veículos. Não importa se há sensores de velocidade no automóvel, se este é
hidramático ou não; o condutor terá que ter algumas habilidades essenciais para operar o
automóvel (analisar os fatores de risco da situação, tomada de decisão, concentração, atenção,
etc). Sendo assim, o objetivo deste artigo foi apresentar à comunidade portuguesa quais são os
fenômenos psicológicos que devem ser avaliados no processo de avaliação psicológica dos
condutores brasileiros e quais instrumentos de medida são utilizados pelos Psicólogos Peritos
Examinadores de Trânsito no Brasil.
5()(5Ç1&,$6
Bastos, Cláudio Lyra. (2000). Manual do exame Psíquico: uma introdução prática à
psicopatologia. Rio de Janeiro: Revinter.
Luria, A.R. (1979). Curso de Psicologia Geral (Vol. 1). Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira.
Tonglet, Em. (1999). Bateria de Funções Mentais para motoristas. São Paulo: Vertor
Editora Psicopedagógica.
Artigo Científico
Resumo
Este artigo tem por objetivo apresentar as funções psicológicas e cognitivas que motoristas
utilizam ao dirigir e suas implicações em relação a segurança no trânsito. O tema merecer
atenção, frente aos dados estatísticos preocupantes de acidentes no trânsito, que vitimam
pessoas todos os dias e ressaltam a necessidade eminente de pesquisas e investimentos nesta
área. A condução de um veículo envolve múltiplos estímulos cognitivos e atitudes do
motorista, sendo uma atividade complexa, que muitas vezes não é compreendida em todas as
suas dimensões. O estudo realizado é de cunho teórico e exploratório. A compreensão e
identificação das principais funções psicológicas e cognitivas do ato de dirigir favorecem
a avaliação de fatores preditores de comportamentos de risco, assim sua relevância em
corroborar para a efetividade de intervenções preventivas no trânsito. © Cien. Cogn.
2011; Vol. 16 (2): 013-029.
Abstract
This article aims to present the psychological and cognitive functions that drivers use to drive
and its implications for traffic safety. The subject deserves attention, facing the troubling
statistics of traffic accidents, killing people every day and highlight the perceived need of
investment and research in this area. Driving a car involves multiple cognitive stimulation and
behavior of the driver, being a complex activity that is often not understood in all its
dimensions. The study is of theoretical and exploratory. The understanding and identification
of predictors of risk behavior in traffic have relevance for to the effectiveness of preventive
interventions. The understanding and identification of major psychological and cognitive
functions of driving favor the evaluation of predictors of risk behaviors, and their relevance to
corroborate the effectiveness of preventive interventions in traffic. © Cien. Cogn. 2011; Vol.
16 (2): 013-029.
- A.B. Balbinot - Endereço para correspondência: Av. Paulo Gama, 110 - prédio 12105, 3º andar, sala 332.
Porto Alegre, RS 90.040-060, Brasil. E-mail para correspondência: ambalbinot@gmail.com. M.A. Zaro - E-mail
para correspondência: zaro@ufrgs.br.
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1. Introdução
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• a correta capacidade perceptiva e atencional, para captar o que ocorre ao redor, identificar
e discriminar os estímulos relevantes de situações e problemas de trânsito a serem
resolvidos;
• perceber a situação, interpretá-la corretamente e avaliá-la;
• tomar uma decisão sobre a ação ou manobra mais adequada;
• executar a decisão com a rapidez e precisão possíveis – a capacidade de resposta do
condutor, a performance se referem às atividades sensório-motoras e psicomotoras que o
condutor utiliza para o controle do veículo;
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3. Tipos de atenção
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de atenção mediada por processamento automático das informações e não requer controle
consciente do indivíduo (Macar, 2001).
A atenção pode ter como foco diferentes eventos, além dos estímulos sensoriais que
chegam pelos sentidos. Ela pode dirigir-se a processos mentais, tais como as memórias, os
pensamentos e a execução de cálculos mentais. Quando o foco é voltado para o ambiente
externo, também pode ser chamada de percepção seletiva; e quando é voltada ao ambiente
interno, pode ser chamada de cognição seletiva (Gazzaniga, Ivry & Mangum, 1998).
Um condutor, ao dirigir, em seu percurso rotineiro pode reduzir sua atenção seletiva e
distrair-se com seus pensamentos ou preocupações em sua cognição seletiva. Percebe-se, ao
dirigir, que algumas vezes determinado trecho do caminho não foi percebido ao ser
percorrido, pois sua atenção não estava focada no trajeto.
O cérebro capta e processa muitas informações, que não chegam todas à consciência –
podem vir a se tornar conscientes, através da atenção, da focalização consciente de algumas
informações ou de partes da realidade. Inicialmente, a execução de muitas tarefas é realizada
por processos controlados, conscientes e posteriormente automáticos. Muitas tarefas,
principalmente aquelas que requerem prática, precisam ser inicialmente percebidas
conscientemente.
Aprender a dirigir requer concentração, assim como para andar de bicicleta ou tocar
piano. Com a prática, se reduz o nível de concentração e alerta. Depois disso, prestar atenção
aos detalhes pode até mesmo atrapalhar o progresso da ação. Sternberg (2000) avalia a
execução de muitas tarefas e observa que, inicialmente, são executadas por processos
controlados, conscientes, que posteriormente tornam-se automáticos. Por exemplo, a ação de
dirigir um carro, com o passar do tempo e a prática, deixa de ser controlada e passa a ser
automática, sem a consciência de todos os movimentos, que mesmo assim são executados,
permitindo, assim, que a atenção possa ser direcionada para o trânsito.
Dessa forma, os processos atencionais estão inter-relacionados com a memória de
trabalho e a memória de longo-prazo. A memória de curto prazo é acionada pelo tempo
necessário para a informação ser utilizada. Por exemplo, qualquer conteúdo que é decorado
para uma prova permanece no cérebro até o término dessa tarefa. Essa informação poderá se
tornar uma memória de longo prazo se encontrar vínculo com outra informação já armazenada
ou pela repetição. A memória de longo prazo é aquela que permanece por mais tempo no
cérebro. Quando conservada por anos, torna-se memória remota, a consolidação como
conhecimento apreendido (Bear, 2002).
Existem distinções entre os tipos de memória. A distinção considerada importante no
processo de aprendizagem veicular é entre as memórias declarativa e não declarativa.
Segundo Bear (2002), a memória declarativa, episódica ou autobiográfica guarda os fatos
vividos pelo indivíduo, no geral algo inesperado que tenha acontecido, uma situação que
despertou algum tipo de emoção, resultando de esforços conscientes, de um modo geral
disponíveis para evocação consciente. A memória não declarativa divide-se em diversas
categorias, destacando-se, para os propósitos deste estudo, a memória de procedimentos para
habilidades motoras ou sensoriais e comportamentais, como andar de bicicleta e dirigir.
Muitas vezes, pela observação e pelo treinamento, esses conhecimentos são arquivados de
maneira implícita, sem que haja consciência do aprendizado. Requerem repetição e prática,
com menor probabilidade de serem esquecidas, mas de modo geral não estão disponíveis para
evocação.
Conforme Wickens, Toplak e Wiesenthal (2008), a experiência de condução é baseada
em associações e longa aprendizagem de comportamentos automáticos, desencadeados por
situações que exigem tempos rápidos e julgamentos rápidos. Assim, muitos comportamentos
têm de se tornar automáticos, a fim de que o aprendiz se torne um condutor habilidoso. A
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morrem, 50% sofrem lesões e 5% sobrevivem ilesos; a 64km/h, 85% morrem e os 15%
restantes sofrem algum tipo de lesão (Traffic Advisory Unit, 1993). Esses fatores ratificam a
relação velocidade e a gravidade dos riscos, neste caso em relação aos pedestres.
Para uma performance mais segura no trânsito, o condutor deve observar os fatores
relacionados, os quais devem ser evitados ao dirigir, principalmente no que diz respeito à
bebida alcoólica ou a drogas, pois além de reduzirem a concentração, afetam a coordenação
motora, mudam o comportamento e diminuem o desempenho, o que limita a percepção de
situações de perigo, reduzindo a capacidade de ação e reação. Para Marín e Queiroz (2000), o
consumo de álcool é o fator mais associado a acidentes, pois dificulta a tomada de decisões e
entorpece as habilidades psicomotoras.
O desvio de atenção, seja por qualquer atividade, como a mais simples de acender um
cigarro ao dirigir, representa momentos decisivos, pois segundos fazem a diferença entre
colidir ou não. A tabela 2 expõe alguns desvios de atenção relacionados ao tempo e à
distância percorrida.
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Figura 1 - Processo de reação (Adaptado de Vanstrum & Caples (1971)2 apud Khisty & Lall,
2003, p.104).
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Na percepção dos motoristas infratores, seria por imposição; na percepção dos motoristas não
multados, por aceitação de um mecanismo regulador que orienta o trânsito.
Muitos fatores podem vir a reduzir a capacidade de concentração do motorista ao
dirigir, tais como: o uso do celular, mesmo que acionada a viva voz; assistir a televisão no
interior do veículo em deslocamento; e escutar som em volume que não permita ouvirem-se
os sons do próprio veículo e externos (Departamento Nacional de Transito, 2005).
Wickens et al. (2008) referem, quanto à segurança dos condutores, que esta pode ser
comprometida pelo potencial de distração causado pelo uso de telefones celulares, MP3
players, mensagens de texto e outros dispositivos eletrônicos por condutores. A utilização
desses dispositivos pode colocar em risco aqueles que os utilizam, ao dirigir, por distração e
aumento na carga cognitiva. Vários estudos vêm sendo desenvolvidos nessa área, e parte da
dificuldade em entender o risco relativo a esses aparelhos, segundo os autores, deve-se talvez
ao fato de não existirem dados conclusivos. Mas o Código de Trânsito Brasileiro (CTB)
proíbe o uso do aparelho celular ou de fones de ouvido conectados à aparelhagem sonora.
Primeiramente, acreditava-se que o uso de celulares por motoristas tornava-se
perigoso, por limitar movimentos e pelo fato de uma das mãos não estar ao volante. No
entanto, estudos apontam ser mais complexa a situação, considerando a utilização de viva-voz
também perigosa. Na Universidade de Utah, no Laboratório de Cognição Aplicada, Drews,
Pasupathi e Strayer (2008), por meio de um simulador de direção, estudaram os efeitos de
conversas em telefones celulares por motoristas. Os participantes deveriam dirigir sob uma
variedade de condições, falando com um celular na mão e pelo viva-voz. Dentro do
simulador, os motoristas tinham de completar tarefas simples, como dirigir diversos
quilômetros ao longo de uma estrada e encontrar uma saída em particular, ou dirigir por ruas
locais em que precisariam frear em semáforos, mudar de faixa e prestar atenção aos pedestres.
A velocidade, a capacidade de se manter na faixa e o movimento dos olhos foram
cuidadosamente monitorados.
Os autores concluíram que o ato de dirigir faz a pessoa olhar instintiva e
continuamente para os lados. Conforme os autores, com a utilização do telefone, a tendência
do motorista foi de fixar o olhar em um ponto à frente. A tendência de fixar o olhar afeta a
dirigibilidade e a atenção do condutor no trânsito, pois limita a varredura do campo
perceptivo, importante ao dirigir. Os apontamentos levantados reforçam que a utilização do
celular ao dirigir transforma-se em um problema que pode gerar um acidente e multa; no
entanto, encontra-se entre as infrações mais cometidas em Porto Alegre.
Uma medida direcionada à violação considerada uma das principais causas de
acidentes – dirigir após a ingestão de bebidas alcoólicas – foi a aplicação, no Brasil, da
chamada Lei Seca, de julho de 2008. A apresentação de uma fiscalização ostensiva motivou
mudanças de comportamento de condutores, como a maior utilização de táxis à noite, à saída
dos bares, o rodízio do motorista – um integrante do grupo não consume bebida alcoólica para
dirigir. Em Porto Alegre, um estudo realizado pela Escola de Administração da (UFRGS)
com 857 motoristas sobre o impacto da Lei Seca constatou que os motoristas estão preferindo
beber mais em casa ou em estabelecimentos próximos a ela, e que 53,8% dos entrevistados se
consideram mais conscientes que, depois de ingerir bebidas alcoólicas, não devem dirigir
(Jornal Zero Hora, 15/04/2009). No entanto, após meio ano, houve uma redução das
fiscalizações, diminuindo assim o impacto sobre os motoristas (Jornal Zero Hora,
12/02/2009).
5. Conclusões
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Ciências & Cognição 2011; Vol 16 (2): 013-029 <http://www.cienciasecognicao.org> © Ciências & Cognição
Submetido em 08/11/2010 | Revisto em 17/05/2011 | Aceito em 22/07/2011 | ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 31 de agosto de 2011
Agradecimentos
6. Referências bibliográficas
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Notas
29
“EU ANDO PELO MUNDO E OS AUTOMÓVEIS CORREM PARA QUÊ”? :
UMA REFLEXÃO PSICANALÍTICA SOBRE A RELAÇÃO TRÂNSITO,
CIDADE e SUBJETIVIDADES.
pelas idéias de Fabio Herrmann sobre o mesmo tema. Nossas experiências enquanto
iniciado com o autor acima citado, nos possibilita romper com os muros do consultório
padrão e colocar o divã a passeio, ou seja, ela devolve à Psicanálise o seu estatuto de
setting padronizado. Se o que produz os sentidos que permeiam nossas relações são os
rompê-los, para que surjam novos sentidos produzidos pelo desvelamento de suas
regras.
Quanto ao tema do trânsito que ilustra o método nesse trabalho, trazemos três
situações: uma que elucida a sensação de risco de morte experienciado nas ruas, outra
que, dada nossa condição feminina, aponta para um imaginário que determina
preconceitos ainda sofridos nesse meio e, ainda, uma terceira relativa à supervalorização
cidade e com as pessoas, uma forma mais livre. Já que, por sua vez, no automóvel
interpretar nossa relação com o trânsito, buscando ampliar os sentidos desse assunto,
lhe é destinada, mas, também, por questões práticas, conflui com as representações
mecânicas e institutivas neste universo. Quando este pedestre passa a usar rodas, a
maquínico, o volante torna-se uma arma a mais nesta luta de forças que se instala.
Para fazer esse movimento, o motorista avança, com o carro, o espaço que estava sendo
ocupado por um carro pequeno, um Fiat Uno, mais precisamente. Para evitar a colisão, a
susto, acreditando que não foi vista, ou para chamar sua atenção (no sentido de “dar
encontrarem em excelente estado, a motorista do Uno consegue brecar a tempo de, mais
uma vez, evitar outra colisão ainda mais desastrosa, em que talvez não sobrevivesse
para relatar essa experiência, visto que seu carro cabia quase inteiro sob a carroceria da
imensa caminhonete.
Tanta pressa em vão. No sinaleiro no final dessa avenida, os dois carros param
Essa, posteriormente, relata que usou de todos os seus recursos para não agredir
fisicamente aquele homem que lhe tinha oferecido tantos riscos, e fica transtornada em
se dar conta de que, caso tivesse uma arma em seu porta-luvas, provavelmente a teria
usado.
Tal narrativa nos conta de uma ruptura no fluxo natural do dirigir cotidiano.
Diariamente, quando dirigimos, temos que dividir o espaço nas ruas com outros
de trânsito, como, e principalmente, aquelas da boa convivência, que nos protegem das
das regras citadas, ou mais que isso, revela que a proteção por nós atribuída à elas são
na verdade uma crença ilusória, que esconde que a loucura do nosso dia-a-dia, e de
etc. – que coabitam com os motoristas o espaço das ruas. A esse propósito, Fábio
outra problemática. Temos nos deparado com conceitos arcaicos que ainda perduram
nos dias atuais, e na “pseudo-liberdade” tão pregada pelos homens. Seguindo esta idéia
gênero que têm sido conceituada pela sociedade há muito tempo. O modelo construído
sempre impôs uma delimitação ao caminho a ser percorrido pela mulher. Quando esta
esta, em que a mulher em sua construção tanto social como pessoal vem buscando
através dos tempos, o transformar, o criar e o enveredar por outras trilhas que não as
ainda busca um espaço para desenvolver seu potencial criativo, sua competitividade,
surdina; do contrário, tais imagens de mim não seriam críveis, se fosse eu exposto
de si para o mundo.
cidade, pelo trânsito, nos revelando à fabricação de um quotidiano que levou o homem
comum à ruptura com a própria natureza, construindo um mundo onde a lei é: “diga o
Numa palavra: quando o homem recria o mundo à sua imagem e este mundo
vai recriando, vai produzindo seu homem, é como se estivéssemos diante de
um relógio sem ponteiros, cujo eixo só serve para dar corda e volta para o
mecanismo, ou diante de um jogo de espelho sem corpo a refletir. A rigor, o
relógio mostra algo e algo é refletido pelos espelhos, mas isto que se patenteia,
sendo miolo do projeto humano, simplesmente não pode ser reconhecido pelo
próprio homem, pois é a denuncia de seu desconhecimento interno, da falta de
proporção entre o que deseja para si e o que lhe convém” (HERRMANN,
2001, p.21)
pesadas, velozes, mortíferas. Eles se vêem lançados nesse caos, às voltas com seus
SOBRE AS AUTORAS
Aline Miranda Schwartz de Araujo. Psicóloga, Psicopedagoga, Bailarina
Contemporânea. Atualmente é mestranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia
Aplicada da Universidade Federal de Uberlândia. Bolsista pela Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Membro do Grupo de Estudos
e Pesquisa em Teoria dos Campos – CETEQ- CNPq.
Resumo
Abstract
1. INTRODUÇÃO
2. REFERENCIAL TEÓRICO
Para que haja uma análise aprofundada das questões que motivam as
ocorrências de transgressões no trânsito se faz necessária a compreensão dos
fatores humanos que envolvem o comportamento do indivíduo neste contexto.
Segundo Vasconcellos (1998), o comportamento de cada indivíduo no
trânsito é determinado pelas condições do momento. A cada situação dada,
reações, comportamentos e atitudes diferentes se apresentam. Tudo depende
de uma complexidade de fatos, ligados aos fatores de necessidades e
interesses pessoais, diversificando esses comportamentos.
O comportamento humano pode ser definido operacionalmente como a
soma de atividades (sejam elas ações externas – atos – ou internas –
pensamentos) com que uma pessoa reage ou responde a uma situação. O
homem ou a mulher ao volante é um ser humano que, além de uma série de
aptidões, de uma personalidade, hábitos e atitudes definidos, possuem
necessidades fisiológicas (alimento, sono, descanso), necessidades
psicológicas e socioculturais (segurança, comodidade, auto realização,
aceitação). O equilíbrio entre estas várias instâncias e a necessidade da
capacidade para supri-las, superá-las ou adaptar-se a elas permitem o
funcionamento psicofísico normal do indivíduo, Hoffmann, Cruz e Alchieri
(2011).
Cada ser humano tem uma experiência diferente de vida, cultura, ideais
e valores, que carrega para o trânsito. Além de se inserir de distintas formas,
Comportamento Humano no Trânsito 7
não apenas pelo modo como transitam, mas pelos recursos que possuem para
inserir-se de forma autônoma e competente no trânsito.
Assim, conforme explicitado acima, pode-se perceber que o
comportamento humano no trânsito sofre as influências das necessidades dos
indivíduos, das diferentes personalidades e condições que se apresentam no
cotidiano de cada um.
discricionariedade com relação a sua lavratura”. Assim, não cabe escolha, uma
vez constatada a infração lavrar-se-á o respectivo auto na forma da lei.
Porém, é necessário considerar que esse entendimento foi estabelecido
após a publicação do atual Código de Trânsito Brasileiro, pois somente a partir
da publicação da Resolução 149/2003, já revogada pela Resolução 404/2012,
ambas do CONTRAN, foi instituída a fase para defesa da autuação, na qual a
legislação prevê uma série de requisitos a serem observados pela Autoridade
de Trânsito antes da imposição da penalidade, tais como: homologação da
consistência do auto de infração; emissão da notificação da autuação no
máximo em trinta dias contados da data da autuação; três tentativas de entrega
para notificação e no impedimento notificação por edital público, devendo ser
garantido o prazo mínimo de quinze dias ao infrator para interposição de
defesa da autuação. Assim, somente após o prazo estipulado, será possível
que a autoridade se manifeste em relação à penalidade que irá aplicar ao
infrator, no caso das autuações passíveis de penalidade de advertência por
escrito, seja de oficio, por critério da autoridade, ou a pedido do cidadão as
regra exigidas tornam mais distante a sua aplicabilidade em relação à data da
constatação da transgressão.
Com isso, outro fator determinante para a escolha da penalidade a ser
aplicada às infrações, são os campos obrigatórios a serem preenchidos no AIT,
estipulados atualmente pela Portaria 59/2007 do Departamento Nacional de
Trânsito - DENATRAN. Muitas vezes esses dados são insuficientes para
esclarecer as circunstâncias da constatação da infração, se realmente houve
por parte do infrator um simples lapso ou uma transgressão, que mesmo
graduada como leve ou média, acarretou ou poderia vir acarretar em prejuízos
para os demais participes do trânsito.
As autoridades de trânsito devem de maneira imperiosa analisar o
prontuário do infrator e, além desse, certificar-se do contexto socioambiental
em que este está inserido, antes de aplicar a penalidade cabível, primando pela
medida que a seu critério irá contribuir para a mudança de comportamento
individual e coletiva.
Outra questão a ser observada, refere-se ao custo que a aplicação
desse tipo de penalidade acarretará aos cofres públicos, pois não haverá
ressarcimento de valores referente ao processamento das autuações
Comportamento Humano no Trânsito 10
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
1.200.000
1.000.000
Gravissima
800.000
Grave
600.000 Média
Leve
400.000
200.000
0
2009 2010 2011 2012 2013
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
6. REFERÊNCIAS
A Psicologia do
Trânsito e os 50 Anos
de Profissão no Brasil
Traffic Psychology And 50 Years
Of Profession In Brazil
Universidade de Brasília
Artigo
Resumo: Em 2012, a Psicologia completa 50 anos como profissão reconhecida no Brasil, sendo esse um
momento oportuno para pensar e repensar a prática do psicólogo em suas diversas áreas. Neste artigo, analisa-
se especificamente o desenvolvimento histórico da Psicologia do trânsito, sendo abordados acontecimentos
históricos pré e pós-regulamentação da Psicologia, como a promulgação de leis, resoluções e suas respectivas
alterações, a criação do Conselho Federal, dos Conselhos Regionais e da Associação de Psicologia do
Trânsito, além da discussão sobre o veto presidencial à avaliação psicológica em futuros motoristas. Como
conclusão, cita-se algumas iniciativas que devem ser comemoradas pela categoria, como a ampliação das
oportunidades de formação profissional (cursos de perito e especializações), a participação da Psicologia
em instâncias consultivas e decisivas das políticas de trânsito e os esforços do Conselho Federal para discutir
e qualificar as ações dos profissionais com a elaboração de referências técnicas, a organização de debates,
seminários e publicações. Sugere-se, ainda, iniciativas que devem ser aprimoradas nos próximos anos,
como, por exemplo, a ampliação da discussão sobre políticas públicas de mobilidade urbana durante a
graduação e a pós-graduação, a participação ativa (individual e coletiva) nos movimentos sociais sobre o
tema e o modelo de atuação profissional, que incorpore outros paradigmas.
Palavras-chave: Atuação do psicólogo. Avaliação psicológica. Psicologia do trânsito. Políticas públicas.
História da Psicologia-Brasil.
Abstract: In 2012, psychology will be 50 years as a recognized profession in Brazil and this is an opportune
time to think over the practice of psychologists in various areas. This article examines specifically the
historical development of traffic psychology and the historical events discussed pre- and post-regulation
of psychology, such as the enactment of laws, resolutions and their amendments, the creation of the
Federal Council, Regional Councils and the Association of Traffic Psychology, besides the discussion of the
presidential veto in psychological assessment for future drivers. In conclusion we quote some initiatives that
should be celebrated by the category, such as the expansion of training opportunities (courses, expertise
and specializations), participation in advisory bodies of psychology and decisive policy of transit, and the
efforts of the Federal Council to discuss and describe the actions of professionals with the preparation of
technical references, organizing debates, seminars and publications. We also suggest initiatives that should
be improved in the coming years, for example, the expansion of the discussion on policies for urban mobility
during undergraduation and graduation, active participation (individual and collective) in social movements
on the subject and the professional role model, that incorporates other paradigms.
Keywords: Psychologist performance. Psychological evaluation. Traffic psychology. Public policies. History
of psychology- Brazil.
Resumen: En 2012, la Psicología completa 50 años como profesión reconocida en el Brasil, siendo ése un
momento oportuno para pensar y repensar la práctica del psicólogo en sus diversas áreas. En este artículo, se
analiza específicamente el desarrollo histórico de la Psicología del tránsito, siendo abordados acontecimientos
históricos pre y pos-reglamentación de la Psicología, como la promulgación de leyes, resoluciones y sus
respectivas alteraciones, la creación del Consejo Federal, de los Consejos Regionales y de la Asociación
de Psicología del Tránsito, además de la discusión sobre el veto presidencial a la evaluación psicológica
en futuros conductores. Como conclusión, se citan algunas iniciativas que deben ser conmemoradas
por la categoría, como la ampliación de las oportunidades de formación profesional (cursos de perito y
especializaciones), la participación de la Psicología en instancias consultivas y decisivas de las políticas de
tránsito y los esfuerzos del Consejo Federal para discutir y calificar las acciones de los profesionales con la
elaboración de referencias técnicas, la organización de debates, seminarios y publicaciones. Se sugieren,
asimismo, iniciativas que deben ser perfeccionadas en los próximos años, como, por ejemplo, la ampliación
de la discusión sobre políticas públicas de movilidad urbana durante la graduación y la posgraduación,
la participación activa (individual y colectiva) en los movimientos sociales sobre el tema y el modelo de
actuación profesional, que incorpora otros paradigmas.
Palabras clave: Actuación del psicólogo. Evaluación psicológica. Psicología del tránsito. Política pública.
1 Agradecimentos Historia de la Psicología- Brazil.
a Lílian de Cristo
pelos comentários
e sugestões
úteis na versão O ano 1962 foi especial para a Psicologia entrou no rol das profissões reconhecidas
preliminar deste brasileira. O Presidente João Goulart em nosso país, sendo definido com maior
artigo. Este trabalho
contou com o promulgava, a 27 de agosto, a Lei nº 4.119, clareza o seu campo de ação profissional.
apoio financeiro que dispõe sobre os cursos de formação O documento legitimou, do ponto de vista
do CNPq por
em Psicologia e regulamenta a profissão de legal, as práticas psicológicas já existentes
meio de bolsa de
doutorado. psicólogo. A partir dessa política, a Psicologia até aquele momento, impulsionadas por
Ainda na década de 1940, foi promulgado outro decreto-lei, n° 9.545, que causou impacto na
futura profissão de psicólogo, que abordava a habilitação e o exercício da atividade de condutor de
veículos automotores, indicando as normas para o exame médico (físico e mental) de candidatos
a condutor de veículos (Brasil, 1946). O documento informava explicitamente que deveria ser
1981), um documento que foi produto de promovidas pelo Ministério dos Transportes,
uma convenção internacional celebrada em em 1985. Vários representantes de entidades
Viena, em 1968, à qual o Brasil veio a aderir participaram dessas reuniões, e um dos
somente anos depois. Os países contratantes resultados foi a publicação do livro O Acidente
se comprometeram a facilitar o trânsito viário de Tráfego: Flagelo Nacional Evitável (Empresa
internacional e a aumentar a segurança nas Brasileira de Planejamento de Transportes,
rodovias pela adoção de regras de trânsito 1987), que sintetizou o conhecimento
uniformes. disponível e as formas de o Brasil enfrentar
os acidentes. Atualmente, a ABRAPT está
No contexto acadêmico, com a volta de inativa, embora não falte interesse de vários
Rozestraten ao Brasil, a área tomava novo profissionais e de pesquisadores em criar
fôlego com a criação, pelo pesquisador, do outra associação. Se esse anseio se tornar
primeiro grupo de pesquisa em Psicologia do realidade, terá este exemplo como modelo
trânsito, em 1983, na Universidade Federal de para inspirar novamente uma participação
Uberlândia. Esse grupo organizou congressos ativa na formulação de políticas públicas de
brasileiros de Psicologia do trânsito, criou trânsito.
um periódico científico específico, a revista
Psicologia: Pesquisa & Trânsito, atualmente Ainda nessa época, a Psicologia rediscute o
inativa2 (Spagnhol, 1985), elaborou um guia seu papel frente aos problemas do trânsito e
internacional de pesquisas em Psicologia o trânsito como expressão do uso do espaço
do trânsito (Rozestraten, 1982) e ofereceu urbano, um avanço para a época, discussão
as primeiras disciplinas na graduação e os que foi aprofundada nas décadas seguintes.
primeiros cursos de especialização específicos O número especial da revista do Conselho
da área. Também foram publicados trabalhos Federal de Psicologia (1986), por exemplo,
importantes estruturando a Psicologia debateu o tema:
do trânsito com foco em todos os seus
participantes, seja criança, jovem, adulto ou Segundo especialistas da área, os acidentes
fatais no trânsito são de tal magnitude
idoso; motorista, passageiro, pedestres ou
que estão se constituindo em problema
ciclistas (Rozestraten, 1981, 1983, 1988b), epidemiológico. A sociedade como um
em interface com várias áreas da Psicologia todo sensibiliza-se para essa questão,
e de outros campos do saber (Rozestraten, e o CPF assume a discussão. A prática
predominante dos psicólogos na área
1985), ampliando a visão da psicotécnica
do trânsito é a da aplicação dos exames
aplicada ao motorista de outrora. psicológicos para seleção de candidatos
à carteira de habilitação. Será essa uma
Em 1982, foi realizado o Primeiro Congresso boa forma de contribuir para minorar os
graves problemas do trânsito? Há outras
Brasileiro de Psicologia do Trânsito, em Porto alternativas de atuação? (p.18)
Alegre, sendo o ponto de maior destaque
a fundação da Associação Brasileira de
Em suma, a década de 80 foi uma época de
Psicologia do Trânsito (ABRAPT), cujo
grande preocupação com a segurança no
primeiro presidente foi o Dr. Enis Rey Gil.
trânsito, o que foi expresso, por exemplo, na
A partir dessa associação, a Psicologia
organização dos primeiros eventos nacionais
do trânsito teve voz ativa e influente na
elaboração de documentos que mais tarde nas diversas áreas, como Psicologia, Medicina,
embasariam políticas nacionais de segurança educação, Engenharia e legislação de trânsito.
2 A revista no trânsito. Como exemplo, destaca-se a Além disso, a Psicologia questionava o seu
publicou quatro
edições, de 1983 participação nas reuniões de trabalho em papel e tentava desenvolver novas práticas.
a 1985. prol da segurança de tráfego, que foram Na década de 90, a Associação Brasileira de
Psicologia do Trânsito continuava ativa, sendo psicológicos poderão ser obrigatórios para
convocada, junto a outras entidades, pelas os infratores contumazes, caso em que se
torna necessária uma investigação mais
instâncias superiores do trânsito para discutir
detalhada do comportamento individual.
e avaliar o Sistema Nacional de Trânsito, Justifica-se, assim, vetar o inciso II do
conforme evidencia a Ata n° 3.681, da 26a art. 147 (...) (http://www.planalto.gov.br/
reunião ocorrida no Ministério da Justiça: ccivil_03/leis/Mensagem_Veto/anterior_98/
“ASSUNTOS GERAIS: Com a finalidade de Mvep1056-97.htm)
colher subsídios para elaboração de um
documento que contenha as informações Com relação a essa justificativa, parece injusto
sobre a situação do Sistema Nacional de atribuir somente aos exames psicológicos
Trânsito e as expectativas para os próximos a responsabilidade na diminuição dos
tempos, o colegiado recebeu, em plenário, acidentes de trânsito, mesmo que existam
para falar sobre o assunto, os representantes poucas evidências de que é possível predizer
seguintes: (...) 12 - Associação Brasileira de o comportamento infrator ou o acidente
Psicologia do Trânsito (ABPT) Dr. RENIER de trânsito a partir de alguns instrumentos
ROZESTRACTEM (...)” (Diário Oficial, 1994, psicológicos usados no processo de habilitação
p. 15, grifos no original). Essa parece ser atualmente (e.g., Silva & Alchieri, 2007,
mais uma evidência da força da associação 2008, 2010). Os acidentes de trânsito
nacional na formulação de políticas públicas possuem causas multifatoriais que precisam
na área de trânsito. ser analisadas e que vão além do indivíduo
(Rozestraten, 2001).
Anos depois, em 1997, foi instituído o
Código de Trânsito Brasileiro – CTB (Brasil, A mobilização e a articulação política dos
2002), atualmente em vigor. Essa lei trouxe psicólogos, do CFP e dos CRPs garantiram
profundos avanços para a segurança viária que o veto fosse suplantado por nova lei que
com repercussões no comportamento do incluiu o exame (ver Tabela 1), demonstrando
brasileiro, dentre os quais a redução das a força política dos psicólogos. Algumas
mortes no trânsito (Fundação Getúlio Vargas, instituições e políticos advogaram a causa.
2007). Uma das novidades do documento Destaca-se, por exemplo, o discurso de um
foi a incorporação do tema educação como Senador da República, a 17 de outubro de
um dos elementos centrais para todos os 1997, no Senado Federal:
participantes do trânsito. É importante
Seja do ponto de vista econômico, seja
destacar que o novo código repercutiu
de saúde pública, os recursos preventivos
no trabalho do psicólogo antes mesmo de superam em muito, em eficácia, qualquer
entrar em vigor. Na época em que era um providência tomada a posteriori. E uma
projeto de lei, o Presidente da República medida antecipadora de futuros sinistros,
de comprovada serventia, é a avaliação
Fernando Henrique Cardoso (1995-2003) mental do candidato à Carteira Nacional
vetou alguns artigos, inclusive o que indicava de Habilitação. E, por seu caráter científico
a obrigatoriedade do exame psicológico ao e seu enfoque especializado, de grande
acuidade na detecção de desvios de
candidato à habilitação. As razões do veto
personalidade, tendências agressivas ou
foram as seguintes: distúrbios de psicomotricidade, e mesmo
neurológicos, difíceis de surpreender ao
Países rigorosos no combate à violência exame clínico comum, o teste psicológico
no trânsito não adotam o exame não pode deixar de integrar a avaliação
psicológico para motoristas. Considera- mental do pretendente à condução de
se que os exames fisico-mentais sejam veículos automotores (Borges, 1997, p. 12,
suficientes para a análise da capacitação grifo no original)
do candidato à habilitação. Os exames
Resoluções Assuntos
nº 283, de 01 de julho Altera a Res. nº 267/2008, tendo sido alterado apenas o art. 18
de 2008
nº 327, de 14 de Altera a Res. nº 267, tendo sido alterada apenas a alínea “b” do inciso
agosto de 2009 I do art. 16
Vencida a luta política para suplantar o veto, a Psicologia institucionalizou as discussões que
vinham ocorrendo sobre a ampliação da área e da atuação do psicólogo na década anterior
no âmbito acadêmico, estimulada por alguns profissionais. Assim, foi organizado o I Fórum
Nacional de Psicologia do Trânsito, realizado em 1999. Esse evento foi considerado um marco
importante na elaboração de diretrizes para as políticas e normatizações do CFP e dos CRPs na
área de trânsito, levando em conta o potencial da área em planejamento urbano e educação
(CFP, 2000a). Convém destacar o papel desse fórum ao convocar os psicólogos para desenvolver
novas práticas e se inserir em novos espaços de atuação. Foram estabelecidas as competências do
psicólogo, algumas inovadoras para a época, com enfoque na atuação ampla e interdisciplinar,
sugerindo, a partir disso, outras atividades profissionais, como, por exemplo: colaborar na
elaboração e na implantação de ações de engenharia e de operação de tráfego, participar de
3 Instância
deliberativa equipes multiprofissionais no planejamento e na realização das políticas de segurança para o
dos Conselhos trânsito, auxiliar na elaboração e na implantação de programas de saúde, educação e segurança e
Federal e
Regionais de prestar assessoria e consultoria aos órgãos públicos/privados de trânsito (CFP, 2000a). Decorridos
Psicologia. Ela 13 anos desse evento, muitas das competências explicitadas não fazem parte efetivamente das
é subordinada
às deliberações práticas da maior parte dos psicólogos (ver CFP, 2009a), embora tenham um valor pedagógico
do Congresso importante para indicar aos estudantes e profissionais o que se pode fazer.
Nacional de
Psicologia (CNP).
Ver Res. CFP n° No documento decorrente desse fórum, cujas propostas foram deliberadas pela Assembleia das
10/98.
Políticas, da Administração e das Finanças do Sistema Conselhos (APAF)3 – o Caderno de Psicologia
Outro fruto das discussões do referido fórum foi a elaboração do Manual para Avaliação Psicológica
de Candidatos à Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e condutores de veículos automotores
(CFP, 2000b). Foi o primeiro manual dessa natureza publicado pelo Conselho Federal, e indicou as
exigências mínimas de qualidade naquele trabalho (ver na Tabela 3 um histórico de resoluções do
CFP sobre a avaliação em motoristas). O documento foi fruto de discussões no seio do CFP para
adequar o trabalho do psicólogo às exigências das resoluções do CONTRAN, que regulamentavam
os artigos referentes aos exames dos candidatos à CNH do Código de Trânsito, com repercussões
na nossa profissão.
Resoluções e Assuntos
nota técnica
O início do século XXI caracterizou-se, no plano político nacional, pela eleição do Presidente Luiz
Inácio Lula da Silva (2003-2010). Nesse período, outras leis e normatizações afetaram o trabalho
do psicólogo no que diz respeito ao seu trabalho de avaliar condutores de veículos automotores.
Em 2001, por exemplo, foi promulgada a Lei n° 10.350 (Brasil, 2001), que estabeleceu que a
avaliação psicológica deveria ser realizada no Nessa ocasião, foi discutido o protagonismo
ato de renovação sempre que o condutor se social da Psicologia no campo da circulação
submeter o condutor que exerce atividade humana. Na conferência, tentou-se colaborar
remunerada ao veículo. para ampliar a intervenção da Psicologia do
trânsito, inserindo-o em uma discussão mais
Em 2004, entrou em vigor a Res. CONTRAN ampla relacionada à vida social, à dimensão
n° 168, que estabelece, dentre outras coisas, afetiva dos espaços de circulação (Silva, 2003).
normas e procedimentos para a realização
dos exames para a habilitação. De acordo Uma das expressões da estratégia do CFP foi o
com o documento, o processo de habilitação surgimento do Centro de Referências Técnicas
do condutor, após o devido cadastramento em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP),
dos dados informativos do candidato no em 2006, com o objetivo de consolidar a
Registro Nacional de Condutores Habilitados produção de referências para atuação dos
(RENACH), seguirá com a realização da psicólogos em políticas públicas, por meio
avaliação psicológica, exame de aptidão de pesquisas realizadas nos diversos Estados.
física e mental, curso teórico-técnico, exame No caso do trânsito, o CREPOP realizou,
teórico-técnico, curso de prática de direção recentemente, uma pesquisa nacional que
veicular e exame de prática de direção evidenciou a participação dos psicólogos
veicular, nessa ordem. Apesar disso, na eminentemente na política de trânsito por
prática, existem variações (incorretas) nessa meio da avaliação em (futuros) motoristas
ordem dos exames, por exemplo, nos casos e o desconhecimento da maior parte dos
em que a avaliação médica é feita antes da respondentes sobre os marcos lógicos e
psicológica. A resolução estabelece ainda legais relacionados a trânsito, transporte e
que a avaliação psicológica será exigida mobilidade urbana (CFP, 2009a)4, o que
quando da: obtenção da autorização para precisa ser superado.
conduzir ciclomotor (ACC) e obtenção da
CNH; renovação caso o condutor exerça Outra iniciativa que o CFP buscou para
serviço remunerado de transporte de pessoas construir e consolidar a participação da
ou bens; substituição do documento de Psicologia no âmbito da política pública foi
habilitação obtido em país estrangeiro, ou o Movimento Nacional pela Democratização
por solicitação do perito examinador. no Trânsito, que expressou “o desejo da
sociedade civil em construir políticas públicas
No plano institucional da Psicologia, o CFP voltadas para o trânsito que contemplem uma
intensificou suas ações no sentido da inserção discussão crítica, democrática e transparente
4 Os marcos lógicos do psicólogo em políticas públicas. Isso fica de forma intersetorial, interinstitucional
e legais podem
ser acessados evidente nas frases do então presidente do e interdisciplinar” (http://www.mndt.
aqui:http:// CFP à época: org.br/quemsomos.cfm). O movimento,
crepop.pol.org.
br/novo/345_ criado em 2007, e formado inicialmente
levantamento-de- O II Seminário de Psicologia e Políticas por 27 instituições que trabalham direta
mobilidade-urbana- Públicas resulta do caráter estratégico
das políticas para o futuro da profissão ou indiretamente com o tema, buscou
transporte-e-transito
A pesquisa pode ser de psicólogo. Nesse contexto, e com as desenvolver ações que objetivam a
acessada em http:// mudanças ocorridas desde a promulgação mobilidade, a cidadania, a saúde e a paz no
crepop.pol.org.br/ da Constituição de 1988, surge um novo
novo/wp-content/ trânsito; contudo, ao que parece, encontra-se
dilema: ou os psicólogos envolvem-se com
uploads/2010/11/ a construção de políticas públicas ou não atualmente desarticulado.
Descritivo-
terão perspectiva de futuro com a profissão
com-OUTROS-
Formatado. no Brasil (Silva, 2003, p. 6) Em 2008, o CONTRAN emitiu a Res. n°
pdf 300, que estabeleceu o procedimento
administrativo nos casos em que o condutor do trânsito (CFP, 2009b). Essa resolução foi
foi condenado por crime de trânsito ou concebida para orientar os psicólogos em
se envolveu em acidente grave, devendo função da Res. n° 267 (CONTRAN, 2008a).
submeter-se a novos exames para que
pudesse voltar a dirigir, incluindo a avaliação Em três de junho de 2011, foi criada a Rede
psicológica. Latino-Americana de Psicologia do Trânsito
(Relapsitran)5, uma iniciativa cujo objetivo é
Ainda nesse ano, entrou em vigor a Res. fomentar o intercâmbio de conhecimentos,
n° 267 (CONTRAN, 2008b, 2009), que informações e ideias entre profissionais e
estabelece os seguintes processos psíquicos pesquisadores de Psicologia e de outras áreas
a serem avaliados: tomada de informação, de conhecimento. A rede tem a perspectiva
processamento de informação, tomada de de contribuir para disseminar a Psicologia
decisão, comportamento, autoavaliação do do trânsito nos países latino-americanos,
comportamento e traços de personalidade. promovendo seu desenvolvimento científico
Quanto ao resultado da avaliação, o e profissional, conta atualmente com 90
candidato poderá ser considerado: apto, participantes em diversos Estados brasileiros,
inapto temporário ou inapto. A resolução psicólogos e não psicólogos, além de
anterior previa que o candidato poderia ser psicólogos de outros países, como Argentina,
considerado, além desses resultados, apto Chile e México. São assuntos recorrentes
com restrição. A junta psicológica foi mantida. na Relapsitran o compartilhamento de
No credenciamento, dentre as mudanças, referências bibliográficas, de eventos e de
destaca-se a necessidade de se ter, no experiências profissionais.
mínimo, dois anos de formado; além disso,
estabeleceu que a carga horária do curso de Em síntese, conforme apresentado, o trabalho
perito seria aumentada para 180hs e que, do psicólogo do trânsito tem sido orientado
a partir de 2013, só serão credenciados os por decretos-lei, leis, resoluções e portarias
psicólogos portadores de título de Especialista provenientes de várias instituições. No seio
em Psicologia do Trânsito reconhecido dos DETRANs e das clínicas, a Psicologia
pelo CFP. Várias especializações têm sido construiu o seu espaço e segue seu itinerário,
criadas em todo o País, e vários psicólogos cujas bases foram lançadas na época do
estão voltando para se atualizar (ver Silva & primeiro Código de Trânsito. Anos depois,
Günther, 2009 para uma discussão crítica nas décadas de 80 e 90, a Psicologia do
sobre essa questão). Vale ressaltar que essa trânsito teve bastante influência nas instâncias
era, conforme apresentado anteriormente, de decisão da política pública de trânsito.
uma proposta do I Fórum Nacional de No século XXI, a Psicologia do trânsito
Psicologia do Trânsito, deliberada pela APAF conseguiu consolidar a sua participação
em 2000. Atualmente, o CONTRAN analisa no processo de habilitação, superando
a possibilidade de estabelecer um prazo movimentos contrários à sua obrigatoriedade,
5 A Relapsitran maior a partir do pleito dos psicólogos (e.g., e simultaneamente, vem buscando ampliar o
faz parte do Portal até 2015), contudo, até o momento, ainda foco das suas intervenções além do motorista,
de Psicologia do
Trânsito (www. não existe um posicionamento oficial sobre envolvendo-se com políticas públicas,
portalpsitran.com. esse ponto. embora ainda a passos lentos. Em 50 anos
br). Conheça a de regulamentação da Psicologia no Brasil,
Relapsitran: http://
portalpsitran.com. Em 2009, o CFP publicou nova resolução portanto, o quê podemos comemorar e o quê
br/rede-latino- que revogava a Res. nº 012 (CFP, 2000b) e podemos aprimorar?
americana-de-
psicologia-do- que instituiu novas normas e procedimentos
transito para a avaliação psicológica no contexto
Cortés, & Sáiz, 1995). Para os próximos seus estados emocionais, valores e normas
anos, os psicólogos do trânsito devem pessoais e suas influências na percepção
buscar implementar também um modelo subjetiva de risco, assim como na sua relação
intervencionista não só junto aos motoristas, com a tolerância ao risco na hora de tomar
como também nos usuários mais vulneráveis decisões (Carbonell et al., 1995). Alguns
do trânsito (e.g., pedestres e ciclistas). A exemplos próprios da Psicologia do trânsito
tônica neste modelo é a intervenção nos para explicar o comportamento do motorista,
processos humanos para tentar modificá- são: o modelo de risco zero (Näätänen &
los, considerando os fenômenos observados Summala, 1974), a teoria da homeostase de
como determinados pelo momento e pelo risco (Wilde, 2005) e o modelo de evitação
ambiente social (Monterde, 1987). Isso da ameaça (Fuller, 1984). Não se tem registro,
implica a adoção de outras teorias e conceitos na literatura nacional, do teste destes modelos
que têm sido estudados e/ou aplicados, explicativos. Talvez um dos grandes desafios
especialmente no contexto internacional, na área de trânsito, até o aniversário do
aos problemas do trânsito para produzir centenário da regulamentação da Psicologia
intervenção na segurança. Exemplos disso no Brasil, seja justamente aprimorar a atuação
são os modelos congnito-motivacionais profissional incorporando esses ou outros
que destacam o papel ativo do sujeito que modelos, embasando cientificamente a
é capaz de redefinir os planos de conduta execução, o acompanhamento, a avaliação ou
em função do contexto, e não apenas reagir a elaboração de políticas públicas de trânsito
a ele. Com esses modelos, a investigação com base na Psicologia, a fim de intervirmos
passa a centrar-se nas expectativas e nas com qualidade junto ao comportamento dos
motivações, por exemplo, do condutor, nos usuários do trânsito e do transporte.
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Transportes/GEIPOT. Recife: Editora Universitária da UFPE. Psicólogo.
Hartmut Günther
Universidade de Brasília – DF – Brasil
Resumo
Neste artigo, são abordados aspectos históricos da psicologia do trânsito no Brasil: o desenvolvimento
dos primeiros estudos psicotécnicos com motoristas para a promoção da segurança no trânsito e a
importância dos Departamentos de Trânsito (DETRANs) na institucionalização e expansão da
psicologia brasileira. Ao final, são sugeridas direções futuras de pesquisa e trabalho nesta área, em
face às novas oportunidades e desafios que emergem com maior intensidade no século XXI, na
perspectiva de melhorar a qualidade de vida urbana, prejudicada com os congestionamentos e a
poluição atmosférica.
Palavras-chave: Comportamento no trânsito, Circulação humana, Qualidade de vida urbana,
Psicologia do trânsito, História da psicologia.
Abstract
In this article, the historical aspects of Traffic Psychology in Brazil are addressed: the development of
the first studies with drivers aimed at promoting traffic safety, and the importance of the Traffic
Departments (DETRANs) for the institutionalization and expansion of (Traffic) Psychology. The
article closes with considerations regarding the future of Traffic Psychology in Brazil, in light of the
challenges and opportunities that emerge with the XXI century, such as the quality of urban life,
traffic jams and air pollution.
Keywords: Traffic behavior, Human circulation, Quality of urban life, Traffic psychology, History
of psychology.
eliminatório (Vieira, Pereira, & Carvalho, modo de avaliar os motoristas, de acordo com a
1953; Vieira, Amorim, & Carvalho, 1956; categoria de veículo pretendida. Em outro
Spagnhol, 1985). Essa medida somente entrou estudo, Vieira et al. (1956) apresentaram
em vigor no ano de 1951, sendo um ano resultados de exames de motoristas nos testes
importante para a psicologia brasileira. PMK, Atenção Difusa, Tacodômetro e Visão
Como decorrência, foram publicadas, Noturna e Ofuscamento. Os autores também
ainda na década de 1950, as primeiras reflexões destacaram a importância de estudar a
sobre a seleção psicotécnica de motoristas e sua personalidade e os fatores patológicos que
importância na diminuição dos acidentes de aparecem com maior frequência nos exames
trânsito, bem como a elaboração dos primeiros (ver Alchieri & Stroeher, 2002, sobre as
critérios e normas para a população brasileira limitações da avaliação psicológica em
nos diversos testes usados para a habilitação motoristas).
(Campos, 1951; Amorim, 1953; Vieira et al., As pesquisas desenvolvidas pelo Gabinete
1953; Antipoff, 1956; Nava, 1957; Nava & de Psicotécnica da Superintendência de
Cunha, 1958). O desenvolvimento dos Trânsito de Minas Gerais também têm
primeiros estudos para o exercício importância histórica. Elas serviram como
fundamentado desta prática, assim como das modelo de atuação para os psicólogos
aplicações dos testes, ficou sob a vinculados aos futuros Departamentos de
responsabilidade do Instituto de Seleção e Trânsito dos estados brasileiros, conforme será
Orientação Profissional (ISOP), no Rio de apresentado no tópico a seguir (Dagostin,
Janeiro. O ISOP foi fundado em 1947 por 2006). Uma importante publicação desta
Emílio Mira y López, criador do instituição foi a Revista do Gabinete de
Psicodiagnóstico Miocinético (PMK), Psicotécnica em Trânsito, considerado o
amplamente usado nas avaliações psicológicas primeiro periódico brasileiro especializado em
ainda hoje (Vieira et al., 1956; ver Mira y psicologia do trânsito (Hoffmann & Cruz,
López, 1999). Por intermédio da Divisão de 2003). Neste órgão, foram realizadas algumas
Seleção, coordenada muitos anos por Francisco pesquisas como a de Antipoff (1956), que
Campos, o ISOP proporcionou à psicologia estudou, em 110 motoristas, a influência da
aplicada e à pesquisa psicométrica elevadas idade e da emotividade no teste de Atenção
contribuições por meio de publicações, Difusa de Lahy. Nesse trabalho, Antipoff
participações em eventos científicos, salientou a necessidade de validar instrumentos
capacitação de profissionais, validação e estrangeiros para o contexto brasileiro.
padronização de testes, técnicas e baterias O reconhecimento da profissão de
(Campos, 1973). psicólogo no país ocorreu na década de 1960,
Uma das primeiras pesquisas empíricas por meio da Lei nº 4.119, de 27 de agosto de
realizadas no ISOP sobre avaliação psicológica 1962, e sua regulamentação pelo Decreto nº
em condutores foi a de Vieira et al. (1953). 53.464, de 21 de janeiro de 1964. Nessa época,
Nesse trabalho, foram divulgados os resultados os psicólogos iniciaram o movimento de
de exames psicológicos e tabelas de testes de criação do Conselho Federal e dos Conselhos
aptidão, como: Atenção Difusa, Inibição Regionais de Psicologia. Vale ressaltar que os
Retroativa, Visão Noturna e Ofuscamento e profissionais que atuavam na avaliação das
Volante Dinamógrafo. Além disso, Vieira et al. condições psicológicas para dirigir já contavam
(1953) responderam algumas críticas feitas com a tradição de mais de uma década na
contra o exame psicotécnico, relacionadas, aplicação dos exames psicológicos (Hoffmann
principalmente, ao prejuízo causado aos & Cruz, 2003; Dagostin, 2006).
motoristas considerados inaptos, com o Em função do avanço da legislação de
afastamento do seu meio de vida sem o trânsito e da psicologia aplicada nos anos de
recebimento de aposentadoria, assim como o 1960, foi regulamentada, em 1968, a criação
elevado custo dos exames. Nesse artigo, foram dos serviços psicotécnicos nos Departamentos
identificados alguns dos problemas ainda não de Trânsito dos estados. Desde então, e com o
resolvidos até hoje, como: o tempo necessário advento do código de trânsito brasileiro em
para a reavaliação do candidato inapto (que era 1998, o psicólogo se inseriu no processo de
de quatro meses à época), as imprecisões dos habilitação nos DETRANs, realizando a
critérios para se definir um candidato avaliação psicológica pericial de motoristas,
apto/inapto e a diferenciação nos critérios e no outrora denominado de exame psicotécnico,
166 Silva, F. H. V. C., & Günther, H.
de infrações por meio dos resultados dos testes meio das atividades relacionadas aos exames
(Silva, 2008). Em outros casos, artigos e livros psicotécnicos. Em função disso, a identidade de
foram produzidos por profissionais dos serviços muitos psicólogos do trânsito ainda permanece
de psicologia, relacionados à: procedimentos de fortemente associada à avaliação psicológica,
adaptação e padronização de medidas de como atividade profissional, e aos DETRANs e
comportamento no trânsito (Antipoff, 1956; clínicas psicológicas, enquanto contextos de
Nava & Cunha, 1958; Miranda et al., 1984; atuação.
Sisto, Ferreira, & Matos, 2006), avaliação de Isso justifica, em parte, as tensões que
diferenças individuais e de traços de decorrem da crítica reflexiva à atuação
personalidade dos condutores infratores e profissional baseada somente na testagem
acidentados (Nava, 1957) e análise das psicológica e circunscrita a esses contextos de
contribuições científicas para mitigar os trabalho. Essa herança histórica continuará
acidentes de tráfego (Nava, 1955). servindo como elemento constitutivo da
A importância dos DETRANs também identidade da maior parcela dos psicólogos do
ocorreu, e ainda ocorre, na viabilização de trânsito no Brasil. Entretanto, a problemática da
eventos na área de trânsito (congressos, mobilidade vai além do comportamento do
seminários e encontros científicos), oferecendo motorista, incluindo todos os comportamentos
apoio financeiro e estimulando a participação dos participantes do trânsito: pedestres,
dos psicólogos lotados nos serviços de ciclistas, motociclistas, policiais, engenheiros e
psicologia, para que divulguem os seus autoridades, assim como suas relações com o
trabalhos. Cabe destacar a participação dos contexto sócio-ambiental (Rozestraten, 1988;
DETRANs de diversos estados e dos Günther, 2003).
psicólogos dessas instituições no I Encontro No plano acadêmico, esse modo de
Inter-Estadual de Psicologia do Trânsito em compreender o trânsito vem sendo difundido no
Ribeirão Preto, em 1983, e nos Congressos Brasil com maior ênfase a partir da década de
Brasileiros de Psicologia do Trânsito, 1980, fruto das reflexões sobre a efetiva
colaborando na construção de espaços férteis contribuição ou não da psicologia do trânsito na
para o desenvolvimento da psicologia rumo a segurança viária. O livro do eminente professor
um trânsito mais harmônico (ver Rozestraten, Psicologia do Trânsito: Conceitos
http://www.conpsitran.com.br; Rozestraten, e Processos Básicos, publicado em 1988,
1984). sintetiza esse pensamento. Passados mais de 20
anos, essa obra continua sendo a introdução
mais importante à psicologia do trânsito no
Para onde caminhamos? Direções Brasil. O professor Reinier Rozestraten, a partir
futuras para a psicologia do trânsito de sua presença, de suas publicações e
no Brasil traduções, influenciou e inspirou diversos
A seguir, são apontados alguns caminhos profissionais e estudantes, mesmo aqueles que
pelos quais a psicologia do trânsito poderá ou não tiveram o privilégio de um contato direto
deverá percorrer em seu itinerário. Nossa com ele. Sua morte física em junho de 2008,
reflexão se baseia no que apresentamos aos 84 anos, deixou uma lacuna que
anteriormente, no momento atual da área no dificilmente será preenchida (ver Rozestraten,
contexto nacional e internacional e nas Maciel, & Vasconcellos, 2008, para conhecer
expectativas que nutrimos, tanto no campo um pouco mais sobre sua vida e obra).
acadêmico e profissional, quanto no campo da Em 1999, o I Fórum Nacional de
pesquisa e intervenção. Essa divisão é Psicologia do Trânsito foi considerado um
meramente didática, visto que esses campos marco importante na elaboração de diretrizes
interagem mutuamente. para as políticas e normatizações do Conselho
Federal e Conselhos Regionais de Psicologia na
área de trânsito, levando em conta o potencial
Campo acadêmico e profissional da área em planejamento urbano e educação.
Como visto até aqui, algumas instituições Assim, foram elaboradas diretrizes de atuação,
colaboraram direta ou indiretamente com a por assim dizer, sugeridas pelo Conselho
emergência e expansão da psicologia do Federal de Psicologia, estimulando uma
trânsito, de maneira específica, e da psicologia atuação ampla e interdisciplinar, exigindo
brasileira, de maneira geral, especialmente por outras competências profissionais, englobando:
168 Silva, F. H. V. C., & Günther, H.
a elaboração de pesquisas no campo dos desse tipo devem tentar esclarecer com
processos psicológicos, psicossociais e objetividade: quais são as contribuições da
psicofísicos para desenvolver ações sócio- psicologia do trânsito na segurança? Em que a
educativas, análise dos acidentes de trânsito e psicologia contribuiu/contribui para
orientações para evitar ou atenuá-los, assim conhecermos o comportamento do brasileiro no
como prestar assessoria e consultoria aos trânsito? Quais propostas, baseadas em nossas
órgãos públicos/privados de trânsito (Conselho investigações, foram elaboradas para ajudar as
Federal de Psicologia, 2000; ver, ainda, autoridades a resolver os problemas do
Rozestraten, 1988, Hoffmann, 2000; para trânsito?
outras indicações de atuação e intervenção). No campo profissional, é oportuno
Atualmente, muitas dessas diretrizes servem reconhecer que existe vida fora das clínicas e
como indicações do que se pode fazer; isto é, dos DETRANs. Isso implica no desafio de
não representam efetivamente as práticas continuar expandindo as atividades do
consolidadas do psicólogo do trânsito. psicólogo, de ocupar outros campos potenciais
Apesar disso, destacam-se esforços para de atuação e desenvolver práticas inovadoras,
fazer pesquisa sobre trânsito a partir de uma porquanto novos desafios e oportunidades
perspectiva mais ampla, sendo que parcela dos emergem no início deste século, os quais os
estudos está reunida em duas importantes psicólogos também devem colaborar (Günther,
obras. Uma delas foi o número especial sobre 2003; Alchieri et al., 2006).
psicologia do trânsito da revista Arquivos A esse respeito, destaca-se a resolução n°
Brasileiros de Psicologia, publicada em 2001, 267/2008 do Conselho Nacional de Trânsito
contendo investigações associadas: ao (CONTRAN), recentemente em vigor. Ela
comportamento perigoso de meninos no estabelece algumas mudanças importantes para
trânsito (Rocha, 2001a), ao avanço do sinal o trabalho do psicólogo, dentre elas, que, até
vermelho (Rocha, 2001b), aos desafios do cego 2013, só serão credenciados os profissionais
no trânsito (Sant´Ana, 2001), aos conflitos de portadores de título de especialista em
tráfego entre pedestres idosos e veículos psicologia do trânsito reconhecido pelo CFP.
(Monteiro, 2001), à avaliação da gravidade de Essa medida é importante para que, em alguns
infrações de trânsito por motoristas e policiais anos, tenhamos profissionais mais capacitados
(Clark & Engelmann, 2001), como também para atuar em diversos problemas do trânsito,
relacionadas às representações sociais do carro desenvolvendo novas competências e ocupando
e o comportamento dos jovens (Souza, 2001). outros espaços, notadamente no contexto das
Outra importante obra foi o livro políticas públicas de transporte (nível regional e
Comportamento Humano no Trânsito, federal). As universidades terão um papel
publicado em 2003, que reuniu várias pesquisas crucial no desenvolvimento da psicologia do
e reflexões teóricas sobre: ambiente, psicologia trânsito, especialmente no início deste século,
e trânsito (Günther, 2003; Rozestraten, 2003), o preparando os profissionais do provir; isso
uso do carro como uma extensão da casa porque, as especializações deverão ser
(Corassa, 2003), marketing social e circulação oferecidas por instituições de ensino superior
humana (Perfeito & Hoffmann, 2003), de psicologia, reconhecidas pelo Ministério da
educação como promotora de comportamentos Educação.
socialmente significativos no trânsito Logo que começou a vigorar esta
(Hoffmann & Luz Filho, 2003), psicologia resolução do CONTRAN, identificou-se o
social e o trânsito (Machado, 2003) e o surgimento de vários cursos de especialização
envolvimento da comunidade para redução de no país (p.ex., em Minas Gerais, Bahia, Goiás,
acidentes de trânsito (Lemes, 2003). São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná). A
Em um futuro breve, novos livros na área perspectiva é de expansão, uma vez que novos
devem ser organizados e publicados, cursos estão em fase de elaboração. O próprio
sintetizando os conhecimentos produzidos na CFP (2009) tem sinalizado que irá realizar com
última década e/ou oferecendo um ponto de maior frequência os concursos para a concessão
vista alternativo aos já existentes. Constata-se a do título de especialista na área. Com essas
ausência de um livro texto que contenha as iniciativas, o cenário atual mudará. De acordo
principais teorias e/ou aplicações da psicologia com o Conselho Federal de Psicologia (2009),
do trânsito, direcionado aos estudantes de dos 692 psicólogos que têm este título em
graduação e de pós-graduação. As publicações psicologia do trânsito, nenhum obteve a partir
História, psicologia e trânsito 169
responsáveis por até 70% das emissões. Na investigações são realizadas, o Brasil precisa
cidade de São Paulo, conforme um relatório de resolver problemas de infra-estrutura básica de
qualidade do ar de 2007, a causa dos índices transporte de massa a fim de disponibilizar e
elevados de poluição do ar decorre, incentivar a escolha por modos sustentáveis de
principalmente, das emissões dos veículos. locomoção. Isso pode se refletir no
Nesta cidade, a poluição do ar é responsável comportamento do brasileiro, mas ainda se sabe
por muitas doenças respiratórias, gerando pouco sobre essa questão. Em face disso,
transtornos para muitas pessoas, em especial espera-se para os próximos anos que a
crianças e idosos (Marín & Queiroz, 2000; psicologia do trânsito brasileira busque também
Companhia de Tecnologia de Saneamento estudar os diversos aspectos associados à
Ambiental, 2007). escolha do modo de transporte, amparando-se
Diversas medidas têm sido implementadas na nossa realidade, com nossos matizes sócio-
a fim de reduzir os efeitos negativos do culturais e ambientais diferenciados, analisando
transporte motorizado, como a formulação de possíveis diferenças regionais e sócio-
políticas e ações estratégicas para a redução de econômicas. A seguir são oferecidas algumas
danos ambientais pelo uso de meios de sugestões de pesquisa e intervenção, como uma
transporte sustentáveis, privilegiando os modos forma de incentivar este processo de conhecer,
não motorizados e coletivos de circulação estimulando, em um futuro breve, intervenções
(Departamento Nacional de Trânsito, 2004; baseadas em evidências empíricas:
Worldwatch Institute, 2005; Ministério das • identificar o impacto das mudanças na
Cidades, 2007; Secretaria Nacional de estrutura viária e de transporte no aumento ou
Transporte e da Mobilidade Urbana, 2007; diminuição do uso do transporte público;
Worldwide Fund for Nature, 2007). Outras • entender os vínculos que se
medidas de cunho tecnológico têm sido estabelecem entre as pessoas e os seus veículos;
estimuladas e implementadas pelas autoridades • avaliar o nível de satisfação dos
e empresas automobilísticas – p.ex., a usuários com os serviços de transporte coletivo,
fabricação de carros movidos à energia elétrica, assim como os aspectos que o influenciam;
a produção de biocombustíveis e de motores • prever o comportamento de uso do
flex (Vlek, 2003). transporte público ou da bicicleta (atitude,
Em que pese a importância dessas novas hábito, possíveis diferenças de gênero etc.);
tecnologias, estudiosos do comportamento • elaborar campanhas para estimular a
consideram que elas são insuficientes para adoção de modos de transporte sustentáveis,
resolverem os problemas atuais e futuros em buscando conhecer as características dos
relação ao meio ambiente. Desta forma, indivíduos que provavelmente seriam melhores
também será necessária a redução da demanda alvos;
pelo uso do carro particular, associada à • identificar possíveis soluções
estimulação de outras alternativas menos estruturais para os congestionamentos nas
poluentes de transporte, como a bicicleta, o cidades a partir da ótica dos usuários (p.ex.,
ônibus e o metrô (Gärling, Gärling, & conhecer a vontade das pessoas que viajam de
Loukopoulos, 2002; Gärling & Schuitema, carro de casa para o trabalho para financiar
2007). Psicólogos da Europa, América do Norte melhorias no transporte público);
e da Ásia têm desenvolvido pesquisas, • compreender a efetividade,
principalmente nos últimos dez anos, buscando aceitabilidade e viabilidade política de
entender os processos psicológicos que atuam estratégias de gerenciamento da demanda de
na escolha das pessoas pelo modo de viagens para reduzir o uso do carro particular,
transporte, bem como o impacto e as especialmente de cobrança de taxas para
conseqüências psicológicas das políticas de circulação de automóveis;
redução do uso do automóvel (Aarts, • conhecer as barreiras psicológicas das
Verplanken, & van Knippenberg, 1998; Gärling pessoas em relação às tentativas para reduzir a
et al., 2002). Essas pesquisas têm subsidiado utilização do automóvel ou para mudar para o
conhecimentos relevantes para a transporte público;
implementação e eficácia das políticas de • prever possíveis consequências
gerenciamento do trânsito naqueles países. psicológicas da redução do uso do carro;
Diferentemente das nações consideradas • investigar padrões de deslocamentos
desenvolvidas, onde muitas dessas diários, potencial para mudanças e motivadores
História, psicologia e trânsito 171
que afetam decisões dos diversos usuários Alchieri, J. C., Silva, F. H. V. C., & Gomes, J.
(universitários, trabalhadores etc.) nos seus M. N. C. (2006). Estágio curricular como
deslocamentos. desenvolvimento e atualização da psicologia
Estudos nessa direção poderão contribuir de trânsito no Brasil. Psicologia: Pesquisa
na elaboração de futuras políticas públicas de & Trânsito, 2(1), 53-59.
mobilidade urbana que visem reduzir o uso do Alchieri, J. C., & Stroeher, F. (2002).
automóvel, que estimulem outros modos de Avaliação psicológica no trânsito: O estado
transporte ou possibilitem a integração entre os da arte no Brasil sessenta anos depois. In R.
diversos modais, uma vez que o Brasil deverá M. Cruz, J. C. Alchieri, & J. Sardá (Orgs.),
discutir e implementar algumas dessas medidas Avaliação e Medidas Psicológicas (pp. 234-
com maior ênfase neste século. Para a 345). São Paulo: Casa do Psicólogo.
investigação desses e de outros tópicos de
pesquisa, sugere-se a Copa do Mundo de Amorim, J. A. (1953). Normas para a prova do
Futebol em 2014 e as Olimpíadas de 2016, que tacodômetro. Arquivos Brasileiros de
serão realizados em nosso país. Grandes Psicotécnica, 5(3), 33-36.
eventos como esses intensificam os
deslocamentos e têm impacto na vida das Antipoff, D. (1956). Contribuição ao estudo das
pessoas e das cidades próximas. Se essas diferenças individuais no teste de atenção
oportunidades ímpares forem aproveitadas para difusa. Arquivos Brasileiros de
elaborar, testar e desenvolver instrumentos, Psicotécnica, 8(2), 49-60.
métodos e teorias, impulsionaremos o
desenvolvimento da psicologia do trânsito. Antunes, M. A. M. (2001). A psicologia no
Além disso, os conhecimentos produzidos Brasil: Leitura histórica de sua
poderão ser aplicados em curto-prazo. constituição. São Paulo:
EDUC/UNIMARCO.