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O E S P IR IT O DO
D IR E IT O RO M A N O
Nas d i v e r s a s fa ses de
s e u d e s e n v o lv im e n to .
TRADUÇÃO DE
RAFAEL B EN A I ON
P rof, da Faculdade de Direito do Amazonas, membro efetivo do Instituto da Ordem
dos Advogados Brasileiros e advogado nos auditórios da Capital Federal.
PREFACIO DE
CLOVIS B E V I L'A Q U A
Volume I
a l b a
EDI TORA
LAV R A D I O , 60 — RIO DE J A N E I R O
BRASIL
19 4 3
ADVERTENCIA
RAFAEL BENAION
PREFACIO
Meu distinto colega, Dr. Rafael Benaion
Saudações cordiais.
LI VRO S E G U N D O
SISTEMA DO DIREITO ESTRITO
§ 26. Introdução 3
PARTE PRIMEIRA
CARACTERÍSTICA GERAL DO SISTEMA
TÍTULO I
IMPRESSÃO EXTERIOR DO MUNDO JURÍDICO
§ 27. Publicidade da vida jurídica. — Plástica do direito 7
TÍTULO n
TENDÊNCIAS FUNDAMENTAIS DO DIREITO ANTIGO
CAPÍTULO I. — Expontâneidade do direito . .................. 15
§ 28. Espontaneidade do direito sob o aspecto da fórma e do
fluido 15
Secção I. — Origem do direito escrito .................................. 21
§29. O uso e a lei, direito escrito e não-escrito. — Impor
tância desta distinção para a espontaneidade do direito;
— Tendência do direito antigo para o sistema de direi
to escrito (direito privado — direito público — justiças
populares) 21
II Secção. — Espontaneidade interna do direito.................. 36
§ 30. Separação dos elementos extranhos. — O elemento
religioso satisfeito no fas, o elemento moral e econômico
na censura. — A censura contrapeso do direito. — Con
traste'assinalado entre o direito e a moral. 36
III Secção. — Conservação e extensão do direito escrito 44
§31. Estabilidade do direito da lei das XII tábuas. — Razão
deste fenómeno. — A?-antiga interpretado 44
no RUDOLF VON JH BRI NG
(1) Sobre esta expressão e sua significação, para os jurisconsultos do direito novo,
vejam-se os textos citados por D ir k s e n , Manuale, v. Strictu s. Utiliza-se deles para
designar o direito antigo, circunscrito, rigido e estrito, em oposição ao direito novo,
mais livre c mais dútil. Determinaremos, no fim déste sistema, a idéia do jus strictum
por meio dc noções que déle tenhamos adquirido no Recorrer de nosso estudo.
4 RTJDOLF VOI£ J H E R ING
TÍTULO PRIMEIRO
(9) Esta apreciação está expressamente confirmada pelo Tit. 16, § 1, das Novelas
de Teodósio II, H a e n d e l (Novellae constitution.es imperatorum, etc., pag. 6.1). Os com
piladores de Justiniano não se ocuparam dessa passagem do resumo da L. 21, Cod. de
test. (6, 23). Natura, diz ela, talis est hóminum, ut quosdam diligant, alios timeant,
quibusdam sint officiosae, gratiae debitores, alios suspicentur, quorundam fidem intel-
ligant eligendam, aliis nihil credendum existiment, n e o t a m e n a u d e a n t d e s i n g u l i s
q u a e SEN TiA N T cO M F iT E R i. I d e o veteres testamenta scripta testibus offerèbant ablaturum-
que eis tubularum perhiberi testimonium postulabant. S ed... eo res processa, —
ITT DUM SUA QUISQUE NON NUNQ UAM JUDICIA PUBLICARE FORM ID AT, DUM TERTIBUs' TESTA
M EN TI SUA N ON AUDET SECRETA COM M ITERE, NE SUIS FAOULTATIBUS IN H I ANTES OFFENDAT, IN
TESTATUS MORI, QUAM SUA M ENTES ARCANA PERICULOSI PATIATUR EXPRIM ERE. Teófilo 4II,
10, § 1) acresce outro motivo, que em determinadas circunstâncias podia ser muito triste:
o temor, por parte dos testadores, de que atentassem contra sua vida as pessôàs insti
tuídas ou conhecedoras da última vóntade. Esta explicação foi desfeita por L a s s a l l e ,
System der erworbenen Rechte, 11, pag. 150 (Sistema dos direitos adquiridos), que a
substitúi com “a função orgânica dos testamentos no espirito do povo” (!).
(10) O próprio Augusto foi vitima de um caso semelhante. Valerius Maximus,
Jiv. Ill, c. 8, § 6, refere-o c assinala muitos outros casos de verdadeiras velhacarias
dêsse gênero. Veja-se, também, Petronio, Sat., c. 71, et haec omnia publico ideo, ut
familia mea jam nunc sic me amet ut mortuum, c. 141.
(11) Essas duas instituições parecem haver tido entre si certa relação. Pelo menos
T ito L ivio , VI, 27 e 31, se exprime de mòdo a fazer crêr que os registos do censo de-
o ÈsM&rro bo d i r e i t o ü ôm àko u
deviam igualmente conter os capitais colocados a juros : fugere senatum testes tabulas
publicas census cujusqne, quia nolint conspici summam eeris alieni (27), e aes alienum
cujus noscendi causa censores facti (31).
(12) E’ provável que a estas instituições fòsse preciso acrescentar a publicidade
da caução, prescrita no direito antigo (nota 7).
12 R tJ D O L P VON J H È R 1 N G
CAPÍTULO PRIMEIRO
Espontaneidade do direito
OBSERVAÇÃO PRELIMINAR
><18K T ren d elen burg , Natur recht (Direito naturai), segunda edição, pag. 88.
Éntre todas as forças ê -idéias que influem nas^ ações huma-¿
nas;: — o bem, o béld, o útil, a religião, —1 o direito se dìstingiiè;;
porque se utiliza da força para se realisar e, deste mòdo, en fia rá
a liberdade das realisações espontâneas, o livre arbítrio. À
mèdi d a que o direito difunde o seu domínio, mais diminúè a 1Í-;
berdade que resta ao homem. Se o direito pudésse chegaria^
compreender todo o conteúdo destas idéias; se os preceitos d a '
moral, os usos da vida, os dogmas da religião e as leis naturais?
do bèlo, do verdadeiro e do útil, se transformassem em regras
de direito, o indivíduo seria um autômato, sem poder fazer ou
tros movimentos senão os que a lei lhe prescrevesse. Entenden
do-o dessa m aneira, o direito estaria em contradição comsigo
mêsmo, isto é, com a sua missão pela hum anidade. Não é pos
sível, com efeito, que' esta missão consista em fazer do homem
uma máquina, despojando-o, precisamente, do que o eleva aci
ma da natureza inanim ada e do reino animal, ou seja da livre
determinação de suas próprias ações. O reconhecimento do di
reito de espontaneidade é,vpois, a prim eira condição que nêle en
contramos. Os limites e os módos de como esta condição se
realisa num direito particular, constituem a medida por meio
da qual apreciamos a sua espontaneidade interna, isto é, o gráu
segundo o qual compreende e reprodús a verdadeira essência do
direito. Mas esta missão, não é a única que se impõe ao direito.
O fim da hum anidade não é apenas o de assegurar a existência
efêmera e livre determinação dos atos do indivíduo; a humani
dade eleva-se acima da esfera da vida puram ente individual,
compreendendo organisações mais elevadas e mais duradóuras,
que, também, necessitam de espontaneidade para a missão que
têm de cum prir.
A existência dessas organisações se manifesta, relativam ente
ao indivíduo, de um duplo mòdo : primeiramente, elevando (ao
mais alto gráu) a sua cultura e atividade; depois, subordinan
do-o aos fins e às necessidades da vida comum, e restringindo-o
consequêntemente, na espontaneidade e liberdade de sua vonta
de. A missão suprem a do direito é a de conter, assegurar e, re
forçar ¿ vontade do indivíduo, como a de outros seres artificiais.
Póde-se, portanto, denominar a jurisprudência, a teoria do equi
líbrio da espontaríeidade humana. A experiência da história
mostra que êste equilíbrio, se bem que fundado e m antido pela
força da lei/não implica sempre o equilíbrio real dêsses dois ele
mentos, postos que, um e outro se desenvolvem enérgicamente.
Aqui, o direito de espontaneidade do particular prevalece con
tra o da generalidade, ou força do poder público; além, êste úl
timo impéra à custa da espontaneidade do particular, ou da li
berdade do indivíduo. Nêste último caso se realisa uma situa
ção crítica, a que chamamos não-esp,ontaneidade do direito. O
primeiro extremo, ao contrário, quaisquer que sejam os perigos
O E S P ÍR IT O DO D IREITO ROM ANO 19
(20) Não queremos falar aqui do direito turco, porque pertence mais às legisla
ções orientais que às europeias. Veja-se, relativamente a èsse direito, N. v o n T o r n a u w ,
Mosl. *Recht (Direito Musulmano), Leipzig. 1885, pags. 56, 83, 92 e 93. Nêle se en
contram disposições legais sôbre a regação das árvores e a criação de" animais«
tfSECÇÃO. — ORÍGÈM DO DIREITO ESCRITO
L éges s u n t in v e n ia e , q u a e o m n ib u s
se m p e r u n a a tq u e e a d e m v o c e loqu e -
r e n tu r , x
Cíe., de off., H, 12.,
(21) Não pódc haver glorificação mais exagerada do direito consuetudinario, que.
a seguinte passágein que tomámos de um trecho de Stahl, sobre a obrigação da lei
comunal, de 11 de março de 1850 (Gazeta d ’Augesburg, 1^53, n.° 15, pag. 228). Esta,
passagem merece iser conservada, cuidadosamente, para provar até que ponto pôde se
afastar dos principios essa doutrina malsã e absolutamente falsa na historia. “A co
dificação, diz èie, destroy por toda a parte, ou relaxa, pelo mènos, as mais sólidas
relaçõès jurídicas, altera a consciencia jurídica, acabando, em ffltútos casos, com a.
sua ingenuidade. E’ nociva para os povos rurais, porque lhes arranca sua inocência
primitiva, provoca entre iêles a reflexão de poder existir o contrário do que atualmente
.éxiste e que lhes foi conservado sem respeito algum ao direito”. Mas a história nos
mostra o que realmente era èsse estado de “inocência” (!). Que sc recorde, por exem
plo, a origem da lei das XII tábuas (L. 2, § 3,4 de orig. juris, 1-2).
Os viajantes que aprenderam a conhecê-lo por experiência, nos povos não civili-
sados, como Lad. Magyar (Viagens na Africa do Sul, I, pág. 286. Pest. 1859), vèm.
precisamente na incerteza e na elasticidade do direito consuetudinàrio a fonte prin
cipal da confusão do direito. O ideial do direito consuetudinàrio somente existe na-,
imaginação dos que o inventaram.
(22) Tal é a idéia que se tcin, comumcnte, da primitiva formação dc todo o di
reito. O direito,, segundo esta idéia, nasceu, como o idioma, sem esforço. K’ o fruto
da ação invisivel, inconeciente c pacifica do talento do povo. ?£ns a idealisação das
origens dos povos, correspondendo mal ao que vimos em outro logar, c à'opinião que-
sustentámos em nossa Luta pelo direito, 5.a edição, 1873, pag. 26 e seguintes, c que cor
responde melhor à história. Em qualquer época e, consequentemente, mais ainda em
sua origem' o direito c seus princípios, para serem postos em vigor, tiveram que susten
tar rude luta. Damos, sobre isto, a nossa aprovação completa à passagem seguinte de-
T r e i t s c h x e , cm sua Historish-politische Aufsatsen (Escritos sobre a *historia política),
pag. 137: “ O que parece à posteridade que c simples obra indispensável da opinião
pública universal, em realidade só é fruto dos rudes combates sustentados por alguns,
homens enérgicos e valorosos**.
O E S 'P íR IT O DO D IR E IT O R O M A N O 23
(23) Podem citar-se, como exemplos tirados da história do Direito romano,, a in
fluência que ^exercem os usos nas relações da família romana (§ 36), e potadamente
sobre os tribunais desta, ao tratar-se de. aplicar o. direito de vida e morte, confiado
ao pai e ao marido. Os romanos tinham perfeito conhecimento dêsse carater de indé-
términaçao do direito consuetudinàrio e do contraste que oferece com a lei. Veja-se,
por exeniplo, L, 2, § 3, de O. J. (1-2): INCERTO magis jure et consuetudine, quam per
BEGEM LAT AM. § 4. Postea NE DIUTIUS ID FIELET placuit, etc. Os grêgos sen
tiram a elasticidade e a incerteza do direito consuetudinàrio, como Róma antes da leí
das XII tábuas. Segündo êlés, a verdadeira liberdade pública se manifesta no im
pério da lei, enquanto que o direito consuetudinàrio apresenta um lado de imperfeição
e de atrazo que só vonvem aos Bárbaros. Assim o grêgo expressa claramente qüe sc
deve checar ás leis: vóu,iiia> ° bárbaro nada mais tem que vójwmx- Veja-se a êste res
peito K. F. Hermann, Ucher Gesetz. . . (Da lei, da legislação e do poder legislativo ña
antiguidade)., Göttingern, 1849, paginas 9, 21.
(24) Daí a designação grêga do direito: âí/T) I, P- 255, nota ’165.
Ó ESPÍRITO DÒ DIREITO ROMANO 2S
(25) Se se quizer uma prova evidente, comparem-se os casos em que nossa dou
trina fala de um .moderno direito consuetudinàrio universal, transportando-o para o
terréno do direito romano. Ai, onde um admite uma prática obrigatória (por exem
plo, éxtènsão da restitutio minorum a todas as universitafes personarían), o outro diz
“que uma pratica baseada numa teoria errônea não é suficiente para motivar ó prin
cipio em questão”. Jâ^ mencionámos os dois córifeus do-direito consuetudinario: P uchta
(Pandectas, § 103) e S avigny , (System, VII, pag. 161).
(26) Cic. de o ff., II, 12. Jus enim semper est quaesitum aequabile ñeque enim
bitter esset jus. Id si ab uno justo et bono viro consequebantur, erant eo contenti;
quum id m initi contingeret; leges sunt inventae, queue, cuçn omnibus semper un. aatque
eadem volee loquerentur.
26 RUDOLF VÕN JHBRING
io direito. Não existia, para o juiz, dem anda que não pudésse
invocar, em seu favor, o apoio de um a lei.
O campo de ação do direito consuetudinario era, pois, muito
imitado no direito antigo. Afóra os casos da pignoris capio,
lão sabemos de outro exemplo senão a faculdade que se deu
10 Pretor, nos litígios sòbre a propriedade, em não acom panha^
iomo antes, as partes ao logar litigioso (m anum conserere),
juando a extensão do território rom ana tornava incômoda esta
form alidade (II) (3839) . Com relação ao fundo do direito, não"
conhecemos exemplo, de espécie alguma, nesta época, de produ
tos expontâneos do direito consuetudinàrio; e os que se pudés-
»em^designar como tais, eram conseqüência da inierpelatio dos
juristas (§ 31), isto é, do progresso da lei. Se se quizer consi
derar a obra dos juristas como direito consuetudinàrio, conse-
^uir-se-á dilatar grandemente o seu dom ínio; porque, sob a fôr
ma da interpretatio, o trabalho dos juristas fez realm ente flo
recer princípios novos do direito. Mas esperamos provar, sem
3antestação, m ais adiante (§§ 49, 53-68), que essas criações dos
jurisconsultos, que form ám o jus civile, no seu sentido estrito,
já não bastaram para apoiar .a idéia do desenvolvimento natural,
ou orgânico, do direito, e que tudo quanto sae de suas mãos, leva
o cunho de um a intenção calculada e de um a arte altamente
aperfeiçoada, sujeita á regras fixas. Se o direito romano tor
nou-se grande, deve unicamente a sua grandeza a circunstâncias
jue êle não conheceu jam ais, ou m elhor, atravessou rápidam ente
B com felicidade ‘èsse pretendido período de nostalgia dos po
vos, esse letargo primitivo, no qual o homem cruza os bjaços, dei- -
gando que a força natural obre por si mésnaa; o direito romano
diegou m uiío depressa ao objetivo da reflexão e da atividade
conciente dos hom ens (3Ô) . *
Outro motivo, mais geral, vem juntar-se aos testemunhos
históricos especiais que acabamos dfe citar, e que não nos é pos
sível conciliar com a suposta im portância que tivesse o direito
consuetudinàrio-no direito privado da antiguidade. Tal é a ten-
íência para a precisão formal exterior, tendência que se m a
nifesta, de m òdo incontestável, no direito antigo. Repugna a
êste reconhecer eficácia jurídica ao pacto nú, isto é, à vontade
individual despida de fôrm as; porque deveria ser muito contrá
rio à essa natureza, concedê-la a vontade geral despojada de
Formas, ou vontade objetiva, isto é, ao direito consuetudinàrio.
Mão é só a ausência de formas o que constitúe a imperfeição.
(33) Gk. XX, tO, institution CONTRA XII tabulas tacito consensu. A que
rela" inofficiosi, nnscida da prática da jurisprudência centunviral, pertence ao terceiro
sistem a. Vostarcmos a ela, quando nos ocuparmos do terceiro sistema.
(39) Não citaremos aqui nenhum capitulo, ou parágrafo da segundo sistema; de
veríamos citá-los todos, porque cada matéria que tratássemos levaria a prova desta
v¿> ì 4 , .. <• -, . :i \ & W &
32 RUÇO X.1T V O N J H E R I N G
vn£sses casos, senão,’ por sua vez, a falta de precisão. Tap difí
cil éLem cortas circunstâncias discernir se um a promessa despida-
dé form as criou um laço m oral, ©u jurídico, como s a f e se uiir
costume repousa sobre o sentimento jurídico, oü sobre o de üitiá^
obrigação puram ente m oral. O formalismo (§ Õ0-53)*, um dos
fracos fundam entais que mais se destacou ito direito antigo, con-f
duziu, no direito privado, às convenções formais, e no procèsso^
ao agrupam ento das ações sob form as fixas. Assim, a menos-
que se ponha em contradição comsigo mesmo, conduziu o direb
to, dêsde as suas origens, á formação e ao desenvolvimento do*
sistem a escrito, em oposição ao do direito não-escrito.
As relações privadas pódem, sem inconveniente alguiíu sub
m eter-se a regras fixas e inflexíveis, porque se m ovim entam sob
fôrm as estereotipadas. A regularidade, a segurança, a visibili
dade, são, precisam ente, as condições que reclam am ; e qüàndo
as suas vias são amplas e estão traçadas com precisão, as vantá-
gens que disso resultam , são nüm erosas. Mas outra cóusa ocor
re, com relação ao Estado e à vida pública. As situações p o r
que tem que atravessar, as contingências que pódem sobrevir e
as medidas que se devém tom ár, não pódem seç calculadas der
antem ão. O Estado deve chegar ao extraordinário, possuindo
p a ra èsse fim um a organização flexível e elástica, que lhe torne
apto para lutar em casos anorm ais. Se assim não fòsse, se um a
política de baixas vistas, com pretenciosa sabedoria, crê cons
tru ir a organisação do Estado, à semelhança dè tun relógio, onde
cada mola, cada roda, tem exatam ente designada, a sua fN u nção,
a m enor discrepância proporcionaria um a interrupção e as con
seqüências mais sensíveis, ou melhor, obrigaria o poder público
a ,p ô r por terra a constituição. Habituados os romanos, por seu
direito privado, a fixar o direito, a assegürar-lhe um a existência
objetiva, deram prova de seu imenso instinto político, não se
deixando levar pelo mesmo afan, em m atéria de direito públi
co. Enquanto, que, no processo civil, tinham, por intermédio:
da lei e com bastante cuidado, ligado as mãos ao m agistrado,
não se lhes ocultava que nas relações do direito público, a li
vre intenção, e não a regra m orta, é a que deve prevalecer e as
sim sé abstinham de tira r ao m agistrado a faculdade dé fazer o
bem para impedir-lhé á de fazer o mal (§ 40).
Foi no direito crim inal) que menos se manifestou a força
suprem a da lei (40) . Do mêsmo mòdo, por muito tempo, o povo
exerceu por si mêsmo, a jurisdição criminal nos comícios; esta
form a de processo foi, pelo menos, \desfavoi%vel p ara a fixa
ção dos princípios do direito penal. A lei d*as XII tábuas con
tin h a algumas dispbsições crim inais especiais, notadam ente o
(40) Esta c a parte em que as nossas idéias atuais mais diferem. A divergência
entre o nosso direito moderno e o direito romano antigo, está contida nestas duas
máximas: Rmlla POENÁ sine lege e nulla ACTIO sine lege (legis actio).
Ö ESPÍRITO DO ÖIREITO áOM'ANO 33
(44) Civem, diz Platcner, Z. c ., pag. 8: scire debet ex noíione reipublicae, cui
adscriptus est» quae peccata sint fugienda, si in poenam incurrere n olit. Legem hic
omnino deesse dici nequìt, verum enim vero lex, qua poena infllngitur, est ilia om
nium civium communis conscientia, quae cum nnoquoque quasi nascitur et adolescit,
ita ut a nemine ignorari possit, qui vinculo reipublicae illigatus teneaiur.
(45) Por exemplo, para satisfazer a vingança popular, Tito Livio, II, 35: se ju -
dicem quisque, se dominum vitae necisque inimici \>id ebani; como meio para fins po
liticos, por exemplp, XXXVII, 58; III, 59: hoc anno nec diem dici cuiquam nec in vin
cala duci quemquam suum pàssurus; IV, 41: de doùs acusados pelo mdsxno crime, um
condenado e*outro indenisado e absolvido.
O ESPIRITO DO DIREITO'ROMANO 35
(46) Esta exposição, de importância tão extraordinaria para o processo, está muito
^bem indicada por G ellius , XIV, 2, que a assinala, a propósito de um litigio que o
mesmo teve que resolver:' ut cognovisse et condemnasse de m o r i b t t non de probatio-
nibus reL.gestae viderer.
II SECÇÂO, — ESPONTANEIDADE INTERNA DO DIREITO
<50) V arrão, de lingua lat., liv. V, pag. 58. Praetorium jus ad legem, censorium
judicium ad eequum aestimabalur.
(51) Citam-se os ¿ditos dos censores sobre certas fôrmas do luxo. P l in io , / / i s
toria naturai, liv . V ili, c. 77, 78, 82; liv. XIII, c. 5; mas não temos necessidade de
fazer notar que não correspondem ä questão que aqui se trata.
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 39
(56) C. A. Schm idt, Der p rin zip ie lle U ntersch ... {Da diferença dé p rin c ip io s exis-
éentes entre o direito romano e o germ anico ).R o sto ck e S c h w e rin , 1853, pags. 65 e 67.
Nunca se emitiu juizo mais errôneo quç éste sobre o direito romano; e se tivessêmos ne
cessidade de justificar nossa afirmação, a encontraríamos nas circuntânciàs de- qúe se
melhantes opiniões continuam atualmente a se emitirem. A falta consiste em \que não
se teve até àqui o costume de estudar semelhantes questões ! gerais-; mas isso não es
cusa . ineiramente ao autor de que se trata, porque não é tão difícil, com efeito, acudir
As origens nessa questão fundamental para o direito romano. Congratulamô-nos ei *
poder mencionar o apoio que em A h re n s encontrou o nosso modo de vêr, J u r . Énc.
(E nciclopédia do direito), I, pags. 330-352 (1885) e R öder, G rundgedanken.... (Idéias
fun d a m en ta is e im portancia do D ireito rom ano e do D ireito germ anico ), pag. 72 e sc
emiate? (1855).
Jjß- RUDOLF VON J H ERI N G
potentia magistratuum, nec res judicata, nec deninque UNIVERSI POPULI ROMANI PO-
TESTÄS, qusé ceteris in rebus est maxima, labefactere possit.
(59) Na teoria dos direitos subjetivos, examinaremps a questão do fundamento-
do direito no sentido objetivo, e estabeleceremos (§ 63-64) que, segundo a opinião dos
romanos, o direito assim entendido sae do próprio indivíduo.
(60) Compare-se, por exemplo, a conhecida passágem de C icero, pro Csecina, e.
26: fundus-a PATRE reliqui potest, ad usucapió fundi, hoc est finis sollicitudinis ac
pericuti litium non a patre reliquitur, sed a legibus. Aquse ductus, haustus, iter, actus-
A PATRE, SED RATA AUCTORITAS HARUM RERUM OMNIUM A JURE CIVILI SU-
M1TÜR.
I ll SECÇÃO. — CONSERVAÇÃO E EXTENSÃO DO
DIREITO ESCRITO
E s ta b ilid a d e d o d ir e ito d a le i d a s X I I t á b u a s . R a z ã o d é s te f e n ô
m e n o . A a n t i g a in t e r p r e t a ti o .
(61) Póde-se analisar a força moral do direito de urna época pelas tabelas de^ mor
talidade da vida média de suas leis.
Q ESPIRITO DO D IR E Itq ' ROMANO 45
■Ä
(623 T ito L ivio , em uma passágem bem conhecida, III, 34? díz desta lei: q h i nono
q u o q u e in h o c im m e n s o a lia r a m s u p e r a lia s a c e r v a ta ru m legu m cuzriulo fo n s o m n i»
p u b lic i p r iu a tiq u e est j u r i s . Na época da juventude de Cícero» os meninos aprendiam
de cór a lei das Xll tábuas (de leglb., II, 23). Dois séculos depois, os jurisconsultos-
clássicos ainda a citavam.
, (.63). Èsse ponto se encontra desenvolvido com mais amplitude na obra de J h e r í n g ,
A lu ta p é lo d ir è tto , 3.» ed., pags. 34 e 35.
(64) Em Roma, èsse caráter individual da lei se entende^ com a família ou com
.í; v . 'i,
46 RUDOLF V O N J H E R I NG
(7 5 ) S ô b r c is t e c o n f l i t o d o p a s s a d o d o d i r e i t o , i s t o é , d o s d i e r i t o s q u e ê le fez
s u rg ir, com o d i r e i t o a t u a l , v e ja - s o J h e r i n g , .4 l u t a p e l o d i r e i t o , t e r c e i r a e d i ç ã o v p a g s .
29 e 30.
0 E S P ÍR IT O DO D IREITO ROMANO 51
dos a m ora de sua divida, quér pela diminuição dos juros ven
cidos, quér pela impútação, regulada dé antemão, do pagamen
to sobré o capital, etc., traziam um prejuízo sensível aos direi
tos privados. Se se as julgar sob um ponto de vista completa
m ente abstrato, sem conhecer as circunstâncias que as ocasio-
main e legitimam, só se as póde condenar; mas tomam outro
'aspecto, quando examinadas sob seu verdadeiro momento his
tórico. Eram sinais, periódicos que tornav)am necessárias as
congestões do organismo social, cuja necessidade tinha, sem
dúvida, origem em um defeito do organismo; mas o defeito era
tão profundam ente inerente ao organismo social de Roma, que
nenhum poder humano poude curá-lo. ' Roma tivera que deixar
de ser Roma! Todas as medidas que tinham por fim a reform a
econômica, por exemplo, o meio duvidoso de proibir em abso
luto os juros, eram necessariamente impotentes. O defeito con
sistia na desgraça e na incerteza da sorte econômica das classes
haixas (88), que, arruinadas pela concorrência do trabalho dos
-escravos, e reduzidas a um mesquinho salário, tinham dificul
dade, .mesmo no tempo de paz, de ganhar o necessário para á
s u a subsistência. Uma interrupção de trabalho, como a m iúde
¡acontecia, por motivo de frequêntes guerras, um a colheita m á,
tim a calamidade pública, bastavam para arro jar homens livres
nas garras dos onzenários. Se se recordar, além disso, o au
m ento de juros, que na antiguidade se impunha, compreender-
se-á que, apezär da mais severa economia e do aniquilam ento
d a s forças, um empréstimo adquirido em momento de apertura,
p odia chegar a ser o abismo que devorasse o devedor e a toda
sua fam ília. Somente assim se explica o aumento colossal da
-dívida das4classes pobres e a espantosa sorte sob a qüal gemiam,
A dívida era a maldição e a acusação mais am arga que se levan
tav a contra o sistema do inundo romano, resultando disso, para
o Estado, um a situação política extremam ente grave. Oprimi
do pela dívida, o devedor, não somente perdia a sua indepen
dência ej ã sua fortuna privada, mas, também; a espontaneidade
c independência políticas. Devia votar como seu credor lhe*
ordenasse (alguns usurários dispunham, assim, de centenas de
v o to s). Mas, ainda fazendo caso omisso deste facto, a sorte mi
serável de um a fração numéricamente" muito im portante do po
vo romanq^fcnstituia, justam ente por não ser merecedora, um a
afronta e um perigo para a comunidade. A tão decantada sa
gacidade política dos romanos fora totalm ente defeituosa, não
procurando o remédio, quando o mal chegou a atingir propor
ções ameaçadoras. O Estado adiantava dinheiro aos necessita
dos (89) ; mas, como não estava sempre em condições de fazê-lo,
-a simples mudança de credor não aliviava a posição dos deve-
(95) Durante todo òste período, foram eleitos entre os senadores. Somente o
arbiter, no sentido antigo, tal como nô-lo indica a lei das XII tábuas, isto é, o perito
que não tem que resolver questões de direito, senão puras questões de Tacto (avalia
ção de fa^os na r c i v i n d i c a t i o , distribuição dc curso dáguas, divisão de sucessões c
de propriedades), podia ser da plebe.
(96) O. Büi.ow. na sua teoria sôbre as exceções. G i e s s e n , 1868, pags. 285-296, o
primeiro reduz essa divisão do processo in jure c in judicio a uma distinção simples
e perfeitamente fundada, ao nosso ver. (Distinção entre a rcccptibilidadc do processo
e o exame dc seu fundo).
55 ^R tiD Ò trP VON J H B R I N G
(97) Cic. pro T u ll., § 3 8 ... in JUDITIO queri PRJETORIS IN¡QUATEM, quod
injuria (in formula) non ADDIDERIT.
(98) Çellius, 20, 1, 7.
(99) A lei Valeria do^tno 305; Trro L ivio , UI, 55.
-O E S P íR JT Ô ^ ;b ó M R E ÌT O ROMANO 57
(100) L. 49, § l.° de jud*. (5, 1 ) . . . COGI proñuntiare. Nos ju ditia legitima, que
depoi§ da lei Julia judiciaria ampliou para um ano e meio (G aio . IX, 104), quando o
'retardamento era devido por culpa do juiz, considerava-se como um facto litem suam.
O Pretor podia também fixar um prazo ainda mais curto; arg. L. 32, ibid.
(101) Tal era o caso quando o juiz não correspondia â formula, porque lhe fal
tava então a força que assegurava ao Pretor com sua fórmula. Segundo os principios
-do processo romano, o demandante nêste caso estava destituido de todo o direito. Efe-
tivamenté, o juiz não podia, uma vez pronunciada a sentença, retificá-la, nem o- de
mandante intentar uma nova ¿ação. Era então o mesmo juiz declarado responsável,
•colocando-se no lugar da parte adversa. Gaio, IX, 52.
(102) L. 5, § 4 de O. e> A. (44, 7).
(103) A in ju s vocatio não er a possível con tra e le s , sem seu co n sen tim én to . Gel -
iu ü s, 13, § 4.
(104) Veja-se P u c h ta , Cours d ’Institutes, T. 2, § 180, in f. Seria difícil encontrar
um entrave contra as funções do juiz na suspensão temporal de audiência que ordena
o tribuno, no caso mencionado por C icero pro cluenció', c. 27. Não conhecemos nenhum
-outro caso em que um tribuno pu um magistrado tenham turbado o curso do processo
perante o judex. (O PRETOR podia fazê-lo em virtude de seu direito de vigilância,
ou inspeção, mas islo não contradiz o que acabamos de indicar). Os textos que se
•citam (K leller , Rôm. C io ilp r. . . ( Processo civil romano ) , § 82, nota 987) não fala
absolutamente de tribunais civis, mas de magnus imperium IN EADEM JURISDICTIONS.
A lei Rubia, XX, vers. 51, proibe expressamente a intercessão em u mainstancia civil.
.Ainda se i$rae acrescentar que numa questiò perpetua era, pelo menos, inaceitável na
fórma. (Geib, Criminalprozess, pag. 289) se não estava absolutamente proibida pela
¡propria lei. (V., por exemplo, a lex Acilia, c. 21).
58 RUDOLF VON JHBRING
(105) - E* certo que aqui se confirma novamente a verdade, de que não ha hem
que o abuso não pòssa converter em um mal. Compare-se, por exemplo, o caso citado*
por T ito L ivio, VI, 27, em que os tribunos se opuseram, copi um fim politico, a toda
a execução pessoal, oferecendo assim um dia de descanso à justiça. O Senado tinha o
mesmo poder, e dele usou para acalmar uma efervescência popular: decretou: “nc q u is
m a g istra tu s, q u o d b e lla tu m es^et, jju s de pecu n ia c r e d ila diceret**. Tiro Livio, VI, 31, ou
melhor: u t p r a e t o r e s ... re s in d ie m tr ic c s sim u m d iff e r r e n l, ,iionec, etc. T ito Livio*
XXXIX, 18.
(106) Já demos, mais acima, (§ 17), a nossa opinião sôbre a causa histórica dêsse-
fenómcno. Veja-se, também, III, 337 (edição alemã).
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 5$
(107) Em várias leis que criaram uma actio popularis, dizia-se’ abertamente : PO
PULO dare damnas esto, e ejus pecunias PETITIO ei sit, qui volet.
(108) Póde-se, como nós (§ 15), reconhecer o aspecto militar,' religioso ou po
lítico dos créditos protegidos pela pignoris capio, ou, pelo menos, como Degekkoi.v (Die
lex Hieronica, Berlim, 1861, pag. 97), falar do caratcr püblicd da ação dos arredantá-
rios dc impostos, sem se pôr, por isso, çm contradição com a doutrina que sustenta
mos. O publicano sequestrava para si, como as outras pessoas designadas por G aio,
IX, 28, e não no interesse do Estado; não o fazia um funcionario público, e o processo
entre êle e o devedor de impostos não coristituia um processo entre o Estado e um
particular. Quando B k th m a n n H o l l w e g , § 10, nota 37, diz: “O publicano não agia
por mandato judicial contra o devedor de contribuições, mas por sua própria auto
ridade”, insistimos nas nossas explicações sobre esta espécie de legis odio, expostas
no § 15. Ali crêmos haver estabelecido que essa ação não tranca, de ^mòdo algum,
as vias judiciais ao deyedor declarado; mas só êle tinha o inconveniènte de obrigá-lo
a apresentar-se como demandante no processo. Se essa legis actio não contivesse üma
jurisdição judicial eventual, teria passado por uma espécie de processo da legis actio.
O pig nus capere entrava também nas atribuições do magistrado; mas como não tinha
então processo civil ulterior, não se contava, para èsse caso, e coçn razão, entre as
aplicações da pignores capio PER LEGIS ACTIONEM. Tanto assim, que se pôde expli
car que por, desde á introdução do processo formulário, essa legis adio póde trans-
formar-se em uma actio fictitia ordinária. Gaio, IV, 32.
(109) Sobre essa ação,-veja-se Cícero em Varrão, III, 11; G aio, IV, § 28, 32. Tit.
Fand de pubi. (39, 4).
ÒÔJ R lf b O L'F V ON J H E*R I Ñ G
. . , V.
jurídica dös cidadãos O10) . Mas não sucedeu o mesmo, na épo
ca dç que nos ocupamos, nem em Roma, nem na Ita lia . 'Q ualquer
qde seja, além disso, o facto da subordinação jurídica Úó regime
dös impostos à justiça, subsiste e não apresenta, por essá razão,
menos interesse,
0 Estado procurava., igualmente, no que e ra possiyeí; còlo-
c ar nas mãos de um a pessoa privada a arrecadação dè outros
créditos que tinha contra diversos p articu lares., Agia assim no
interesse próprio e pai-a evitar embaraços não no interesse do
devedor, se bem que obtivesse p ara éste a vanfágem dá igualda
de, como seu adversário. Mas se êste não era o objeto, pelo me
nos era um a conseqüência digna de atenção. A pessoa do con
cessionário de créditos públicos (pr&diator) (n i ), substituindo
o funcionário público, representante do Estado,'dazia desapare
cer a preponderância que a presença déste pudesse influir na ba
lança. —
" O Estado, tam bém , fazia ó mêsmo, quando recusava receber
trabalhos^ de em preitada. A obra era, nêste caso, concedida de
növo, com as despezas ocasionadas pelò prim eiro empreiteiro, é
o segundo acionava éste pelas vias ordinárias do direito civil,
afim de cobrar o seu crédito.
O Estado, da m êsm a fórjna, não intervinha na arrecadação
das ordens que dava sobre o aes m ilitare e hordearium, cobran
ça, que ficava a cargo daqueles a quem se confiava (110*112) . Em
todo caso, apezar dà origem, ou do caráter público do crédito,
o devedör tinha" a possibilidade de demandar* seguindo as vias
do; processo civil ordinário, contra um a pessoa privada* que lhe
-era completam ente igual. Verdade é que existiram certos ca
sos em que a autoridade pública executava, po r si mêsma, suas
pretençdes contra um a pessoa privada; assim, por exemplo, as
m ultas da p arte condenada no processo per sacramentum, , as
penas disciplinares (mu/íae), as m ultas penais (ptenae pecunia-
rite), p ara o tributum e as cònfiscações (11314) . Conhecemos, tam
bém,. outro caso, em que p Estado tinha que se socorrer das fôr
mas ordinárias ^do processo civil, isto é,* das demandas sobre a
propriedade O*4) .
(110) Quanta audacias, escre v e U lpÌ ano , fa la n d o d e s u a ép o ca (2 .1 2 ^ p r . de
p u b l ic .) , quanta tem eritatis sint publicanorum factiones, nemo est qui nesciat; iccirco
P ra to r ad compesccndam eorum, audaciam heç edictum p ropo su it. {
7 (IH ) P rades vendere se relaciona à esta especie de venda de créditos do E&tador;
V. sobre éste assunto, R u d o b ff , E ,st. rom .. Il, 308.
(11 2 ) G àio, IV, 2 7 . f ' N
(113) Veja-se, sobre éste caso, B e th m a n n H o l lw e g , l. c ., pags. 95 a 09 a Ru-
sòBFF, l. c., pag. 307; sobre a jurisprudência administrativa romana cm geral. T h .
M om m sen, Rôm. S taatsr., 1, pags. 119 a 121. A realização das totalidades confiscadas
se fazia por m eio da venda de pessoas privadas {sectores), R u d o b f f ,' i . c .
(114) Assim resulta das vin dica secundam poputum . F estu s , veja-se vindicice.
Igualmente sucede com os litígios sôbre as*lindes. B etelmann H olweg, l . c ., pag. 100,
nota 53. 1
f
O. S P Ì R I T O DO DIREITO ROMANO 61
Espirito de Igualdade
A e q u ita te c o n stitu e n d a su m m o s cu m
in fim is p a ri ju r e v e tin e b a t. Jus e v im
se m p e r e s t qucesitu m cequabile, ñ eq u e
e n im a lite r e s s e t ju s .
Cíe. de off. n , 12.
(%2iy\ \jEquitas, qp.se. 'paribus in causis paria jura desiderai. Cíe. Top., c. 4.
(122) Annal. Ill, 27. No mesmo sentido, segundo Trro L ivio , III, 84, os decen-
viros apiicavam a, lei das XII tábuas: se omnibus summis infimisque jura. ÊXAEQUASSE-
' (Ì23) Cfic. de off. I, 10, 32-: ...E x quo ilu di summum jús ' summa injuria jam
triium sermone proverbium , ou como diz Colu&ela, I, 7: summum*jus antiqui sum
mum putabant crucem . ‘ /
■'(124) Sobre 6 caxater relativo da noção de equidade, veja-se ThoL, Einleitung.. r
¡Introdução ao direito privado alemão), § 18).
O'ESPIRITO D Ò DIREITO JROMÄNO 65
■í-
% • */
o seu espírito, e o período de justiça arbitrária patriarcal (nota
29), que havia precedido à lei das XII tábuas, lh£s imbuirá tão
profundam ente essas idéias, que as desvantágens ineludíveis ao
sistema foram valorosamente suportadas.
Daí, pois, — e eáfa é um a parte característica do direito an
tigo, comparado ao direito novo*— o d o m in ic i atai da régra ábs-
trata, a repulsa decidida à toda indiuidualização em direito.
igualdade perante a lei teria ficado, por esta razão, asse-
guracfa? Certamente, que não. vAinda que se opuzéssem obs
táculos a que, em ^um caso particular, um a desigualdade; uma
exceção à régra pudésse produzir-se, a introdução de uma desi
gualdade geral perante a lei, como, por exemplo, em^favôr, ou
em detrimento legal de certas classes* não era impossível que
se realizasse. Daí resultou uma distinção importante": a das di
ferenças e desigualdades jurídicas. E* evidente que a lei póde
e deve dar a conhecer às diferenças jurídicas de certas distin
ções naturais, existentes éntre os homens e éntre as pousas. A
condição da m ulher reclam a outrás medidas de direito* que a do
homem; a creança, não póde, juridicamente, ser tratada dá mês-
m a m aneira que o adulto; a diferença natural* do objeto, por
exejnplo, sua movibilidade ou imovibilidade, nunca deixará de
ter influência no direito. O mêsmo sucede nas relações politic
cas, necessitando-se uma falta completa de discernim ento e de
conhecimentos históricos para desconhecê-lo. Mas é preciso es
tabelecer a distinção éntre essas diferenças jurídicas e as. desi
gualdades perante a lei. Estas últimas são desvios da régra de
direito, e nao de causas m ateriais, nascidas p ara bem do Estado,
ou de diferenças intrínsecas. Só tendem a privilegiar (130) uma
classe de pessoas em prejuizo de outras, e sua razão suprem a
consiste, únicamente, na preponderância social que esta classe
soube exercer sôbre o poder legislativo e que explora no interes
se egoístico.
Fácil é de vêr que essas irregularidades chocam-se contra a
idéia de justiça; e constituem uma parcialidade e um a tirania
perfeitamente idênticas às de que o juiz poderia tôrnar-se cul-
pável. Se éste não póde favorecer a ninguém, como o poderia
fazer o legislador? Êste, também, não poderia usar do poder
senão no interesse da justiça. Como a igualdade poderia ser
a régra mais elevada e o fim do poder judicial, se não fosse,
também, para o poder legislativo?
Esta distinção éntre as desigualdades e as diferenças jurídi
cas não é m eram ente ideal; vive, de facto, no sentimento intimo
dos povos, que delas pódem fazer aplicações m uito diversas. A
(13.0) Para abreviar, não falaremos no texto, mas sóinente dos privilégios {privi
legia favorabilia) por mais que se aplicasse igualmente aos direitos constituidos (pri
vilegia odiosa).
68 RUDOLF y Ê i* 1J H B- R r N G*
# ,
lei posterior Verá desigualdades irritantes perantré a lei, na dife-
rènça jurídica qúe, em época anterior, parecia surgir de motivo^
internos e externos. A^razáo consiste na dupla, antítese, que
anteriormente assinalámos, já peta diferença m aterial do aspee-
toldas relações Mu vida, já pela irritabilidade e sensibilidade in
dividuais do sen ta le n to jurídico. Sób este aspecto, nenhum -
povo foi tãd bem dotado de inteligência como os antigos rom a
nos* onde exféte a m ais completa igualdade, em principo, no
direito privado, é sem distinção de cidade, ou de país, de riqUe-r
za, óu dé penúria, ¿de elevação, ou de hum ildade (131) . A régra
estabelecida não cedia a nenhum motivo ou consideração (assirh*
pôr exemplo, a execução pessoal continúa contra òs parentes*
com o mêsmo rigor que contra os extrânhos) ; as exceções às re
gras são quasi de$Conhecidas ilo antigo direito. Todas as opi
niões seguidas pelos romanos e chegadas até nos, são ecos desta
impressão de igualdade que ressalta do antigo direito e espe
cialmente d a lei dás XII tálmas í 132) .
% O espírito de igualdade dêsse direito e éste é o segundo
elememo p a ra determ iná-lp — se m ánifesta aiiida m ais pela stia
tendência à generalização, nà mais am pla proporção, do mésmo
modo que p o r sua extrem áda repugnância em particularizará
Enquanto que outros direitos, por exemplo, o germânico, tem
mais em vista o elemento da particularidade e d a .especialidade^
descuidando-se do da generalização, o Direito *ròm aho antiga
age em sentido contrário..
Examinemos* no entanto, mais de perto e em seús detalhes,
a igualdade rom ana, prim eiro sób seu carater político é, depois,
em relaçao com o direito privàdo. Dê amboá os pontos de vista*,
a história da lu ta de-patrícios è plébéus contem im portantes en^
siham entos. Quasi não existe um a só página da história d a
direito antigo; onde esta luta não b a já deixado seus traços; acre
ditamos haver descoberto a sua càusa. A reação foi necessà
riam ente violenta contra á opressão qüe á preponderância pa
tricia fez pesar, por muito tempo, sobre os pleheus. Amarga
mente sentida, a desigualdade veio a dar força nova ao sentia
(131) O direito eclesiástico reclamava para a. v irg o v e s ta tis e o fla m e n djialis uma
modificação do direito privado, consistente na independência do poder, paterno seni.
c a p itis d e m in u tio . — A divindade não consentia impedimentos em seus servidores e,.
?pór isso, não podià tolerar que um poder extranho pesasse sobre êles.v 0 áí, dispen-
sar-se às vestais da tutela à que estayam sujeitas, as outras mulheres (expressamente
vista pela lei das X n tábuas. Gaio, I, 145), e a sua exclusão da sucessão ab in te s ta to ,
tanto ativa como passiva. G e li.., I, 12, 18; mas, ein troca, se lhes reconhecia o direito
dç outorgar testamento. G e l l . , I, 12, 9, è VI, 7. Silencia sobre os privilégios extra-
nhoS. ao direito privado. A situação dessas pessoas faz com que Sen., ad Aen.. XI,
206, diga: le g ib u s n o n té n e tu r .
(132) Remetemos aos textos, já citados, de Cicero^ T ito L ivio è T acito (epigrafe
déste parágrafo e nota 1 2 2 ),
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO
(133) T ito L ivio, XXXIX, 40: omites patricios plebeios que n obilissim arum fa m i -
liaram , M. Porcius longé an tiebat. In hoc viró tanta v is anim i ingeniiqne, ut quocun-
que loco natus esset, fortunam sib i ipse fucturus, fuisse videretur. Quanto às resis
tencias que encontrava um homo noviis, veja-se, por exemplo, T ito L ivio, IX, 4f>;
XXXII, 57. i. .
(134) A Única exceção que déste ponto oferecem as pessòas eclesiásticas, foi, mais
acima, reconhecido (nota 131). O estado m ilita r, mais tarde, tão ricamente dotado de
privilégios, não .existia como tal nesta época, porque cada cidadão era soldado e o
^ d ireito não tinha-motivo para tratá-los mais favoravelmente, quando estavam cm ar
mas, que em tempo de paz. O teslam entum in procincto não foi um privilégio, mas um
testamento perante o povo (sob as bandeiras) ; o privilégio da pignoris cap io, reconhe
cido no interesse do serviço aos ees m ilitare, equestre, hordearium, existia, além disso,
com outros fins. As particularidades do direito comercial romano nascem cm sua
maior parte de uma época posterior. (Por exemplo, o agerc cam com pen saton e do
argentarius. Gaio, IV, § 04 ; o act. rceeptitia dada contra êle, T h op hii.u s, IV, 0, § 3;
a actio contra o socius do argentárius, Auct. ad Heren., II, c. 13; o direito particular
das sociedades de publícanos, L. 59, pr. L. C3, § 3 pro cocio, 17, 2; a actio etcerci-
loria e insti tutoria).
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO W 71
:W-
ser satisfeita; cada classe, cada profissão estava apta a orga
nizar livremente e segundo as suas necessidades, um a esfera
jurídica, na qual tinha plena liberdade de movim ento. Era
uma conseqüência do princípio de autonomia, reconhecido, em
Roma, em sua mais am pla extensão. O interesse das famílias
nobres exigia, por exemplo, vantagens hereditárias em proveito
dos filhos sôbre as filhas, do primogênito sobre os filhos ime-
diatos;_um testamento feito em cada geração, pelo pai "de fam í
lia, bastava para assegurar aquêlq interesse. Necessjtava-se,
para as relações comerciais, um vinculo obrigatório muito mais
rigido,» pois os contratántes proviam, por si sós, esta necessidade,
fazendo dela a sua convenção. As corporações que julgavam
dever, se reger pelas régras especiais, eram livres para estabe
lecê-las apelos seus estatutos (133). Se os esposos, ou outros pa
rentes próximos, opinavam que á comunhão de bens era o regi
me que melhor convinha ao estreitamento de seus laços, não en
contravam nenhum obstáculo em traduzir seu desejo sob a fôr
ma de uma societas om nium bonorum (135136137) . Póde-se, pois, ad
m itir que, na antiga Roma, os diversos interesses dè hierarquia,
classe, profissão, etc., procuravam e obtinham, cada um pòr.seu
lado, a respectiva satisfação jurídica; de sorte que o direito,
igual para todos em tese geral, tomava nas relações um aspec
to típico distinto, segundo a m edida dessas diferentes situações.
Mas esta fecundidade de autonomia, que se lim itava somente às
relações jurídicas concretas e necessárias, apezar da uniformi^
dade de sua reprodução, não produzia régras jurídicas abstra
tas. Os romanos estabeleciam distinção claríssim a éntre o di
reito e o uso, éntre o direito, no sentido objeto e o direito, em
sentido subjetivo, ao adm itir um direito de tal classe, ou de tal
profissão, etc.
Foi preciso, entre êles, um a lei,-dürante a época antiga (m ),
para erigir em direito próprio de uma classe os seus usos e cos
tumes jurídicos. Mas as tendências igualitárias, o próprio es
pírito do direito antigo, eram contrários à aplicação dêsse meio.
Por que a legislação não se imiscue nos interesses momentâneos
das corporações, ou dos particulares? Por que, por sua própria
força, êsses interesses chegavam a realizar-se em sua fórm a ne
cessária?
As diferenças jurídicas das pessoas, que se encontram no
direito antigo, têm, sôbre tudo, por fim, como já o dissemos, as
(138) In servo tu m c o n d ii ione n ulla est differen do. , § 5 , I, de jure pers. (1, 5).
Veja-se S c h iù d e r , sobre Inst, de exh. lib . ( 2 , 1 3 ) , especialmente: 1.® 4Des-
(1 3 9 )
herdação: L. 4. Cod. dè lib . (6 , 2 8 ) . Scim ùs ANTÈA. om nes interexheeredatos scribere
esse concessum . 2.® Preterição: Seu efeito não estava claramente decretado, diferindo,
na época de C i c e r o . C ic, de orat., I, 3 8 . ^
(140) “ T i l i n s U l p i a n . , X, 1 . . . id enim lex XII ta b . ju b e t patre liber esto.
Como a lei só menciona o f iliu s r entendia-se para as filhas e os. netos sómente uma
venda. Veja-se, além disso, § 49.
■5* O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO /73
(143) Assim se conciúe da expressão sexagenarias e (da lenda dos senes depontani ,
que a ela se junta (B e c k e r , Handbuch der r o m ., alterh 1 1 , pag. 216). Nessa, idade
cessava, na antiguidade, a obrigação do esrviço miliatr. Veja-se B e c k e r , ib id ; D ireita
novo; 50 anos, veja-se S en eca de brevit vitae, c. 20) ; pelo direito novo, o tempo de
serviço dos senadores. (B e c k e r , 1 1 , 2, pag. 407), a obrigação de casar-se, para os ho
mens, segundo a lei Papin Poppéa (50 anos para as mulheres) e o pessoal de atender
a conservação dos caminhos e asseio das ruas, segundo a lei Col. Jul. Genet., c. 98
Nesta idade, segundo V arrão (frag, do Nonius et Mere , 523, -ed Gerlach e Rotch, pag:
358), cessava a obrigação de todo serviço público e se obtinha, segundo Anet. ad ,Ibe-
renn, 11, 13, 20, a faculdade de se fazer representar na justiça por um cognitor. A
fixação da idade de setenta anos parece pertencer ao direito novo, e os privilégios que
concedia eram: a dispensa da tutela (L. 2, pr. de exens , 27-1), a imunidade dos en
cargos comunais pessoais (muñera personalia, L. 2, § 1, de vocat . 50, 5 e L. 5 pr.
de ju re sum m um , 50-6; L. ib id ., L. 2, § 1 de v o ca t ; L. 2, § ult. de decur, 50-2>,.
com exceção do decuriato, de que se eximem na idade de 55 anos, L. 2, § ult. e
L. 11, ib id .
(144) Assim é como se precisa entender Keller, C ivilp ro zess, § 54, a representação
pro tutela das In stitutos (pr. Inst. de iis per quo, 4,10). Omitimos a opinião contrária,
que anteriormente indicámos. Mas se não há necessidade dc admitir a representação
para a infancia m ajor, será isso admissível? Duvidamos, porque no direito antigo não
há nada que seja inútil.
(145) Tal era a idéia da bonorum possessio mencionada nas Pandectas, 35,3, de
bonarum possessione ju rioso, enfanti sunto surdo cteco com petente.
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 75
(146) Nesse direito, mais do que em nenhum outro, o direito ¡mobil se erige em.
sistema. Gu n d e r m a n n , Engl. Privatrecht, voi. I, introdução, XVI e XVII.
(147)- Veja-se, por exemplo, Gerber, deutsches Privatrecht (Direito privarlo-
alemão), § 74. A propriedade romana, ao contrário do usocapião, da hipoteca, etc.
aprelenta, exatamente, as mesmas idéias, tanto para os móvies como para os im óveis.
O que há de mais significativo é que o direito hereditário não fica inteiramente iscntn
de influência desta distinção.
(148) Veja-se c terceiro sistema. Não queremos indicar senão alguns detalhes r
1.® A apreensão clandestina dava, primitivamente, a posse das coisas móveis como das
coisas imóveis; mais tarde, não se deu senão a das coisas móveis, L. 7,47, de poss.
(4í,2). S av ig ny , Possession, § 31,2. 2.°. Um furtum também era possível, primitiva
mente, para as coisas imóveis (G aio, II, § 51). Geijlius , XI, 18, § 13, &gundo uma
referência de S a b in u s , de furtis: sed fundi quoque et sedium fieri furtum ); no direito
posterior, não o foi. 3.® Proibição de alienar: FUNDUS dotalis, PR/EDIA rustica e
suburbana de pessoa sob tutela. 4.® Necessidade da presença da coisa na imancipação.
abolida mais tarde nas coisas imóveis (G aio, I, § 1 2 1 ... preedia vero abstentia SOLENT'
mancipari) . Voltaremos sobre este ponto, quando tratarmos dos atos jurídicos.
EÜD^OL F V ON JH HR I N G
(149) Nas ações pretoriánas: restitutio in integrum e bon. possessio. E*; bem
certo que èsse procedimento favoráyel já existiá. na vida, especialmente na cretio viil-
.garis (Ulp. 22, 31, 32). Mais tarde também passim às leis; veja-se, por exempio, a
Tab.e Salpensana, c. 27, triduo prozum o, quam appéllatio facta erit POTERITQUE
intercedi'. ^
Q56) Por ( xemplo, com relação à* execução; direito da lèi das XII tahuas:
G e l l u j s , N. A ., 20, c ., 1 (30 e 60 d ia s). Direito novo: U l p i a n o , L. 2, de re jud.
24,1) : qui pro Tribunali cognoscit, non semper tempus judicati seruat, sed nonnunquam
■arctat nonnunquam prorogai PRO CAUSAE QUALITATE ET QUANTITATE \E L PER
SON ARUM OBSEQUIO VEL CONTUMACIA.
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 77“
-diante um pacto sobre o valor taxativo da coisa que devia servir^m ais adiante, a
base, por exemplo, no dos (aestimatió taxationis causa), c, também, ainda quet ra
ramente, na socie tas, no commodatum, deposition, etc. L. 52, § 3, pro socio (17,3).
L. 7, § 5. L. 52 de don. V. e U. (24,1).
(154) Por exemplo, na fnictus Ucitatio dos interdicta retinendae possesiorìfs
•(Puchta, ínstit. T. 2, § 169); nas estipulações pretoriana«, que os juristas recomendam
muito, se redigem, fixando somas determinadas, L. ult. de praet. stip. (4C,5) :
Quoniam dífficitis ptobatio est, quanti cujiisqiie in tersit.
(155) Encontram-se, no antigo direito, somas fixadas de antemão e iguais para
todas as pessoas* e coisas. Por exemplo, na legis actio sacramento, 50 e 100 asses; na
Lex Furia, 1.000 asses. Não há necessidade de fazer notar que a aparente igualdade/
que se vè nisto, conduzia, de facto, à mais extrema dosdguaIdade. Nada indica: tanto
essa tendência à igualdade abstrata c mecânica do antigo direito, como a circunstância
<le que assim <v*mais ricot como o mais pobre havam de pagar ou receber 25 asses por
uma injúria, sem que a maior ou menor importância das fortunas não exercesse in
fluência no máximo dos legados, limitado pela lei Furia.
(156) Segundo a lei das XII tábuas, 25 asses pelas lesões corporais graves, 300
asses, se se tratava de um homem livre e 150 asses, se de um escravo.
(157) Vinte e cinco asses, segundo a mesma lei. P l í n i o , H. N . , c . 1. — O di
reito novo serve-se, igualmente, em muitos casos, dêsse oportuno meio de tarifa, por
-exemplo, L. 42 de aed. act (21,1); L. 3, pr. de term, moto (47,21), etc.
80 äru D O DÊ V ON J H E R I N G
(158)
O d u plu m , trip lu m , quajdruplum . Por exemplo, na actio fu r ti nec m an ifesti ,
concenti et o b la ti, f u r ti m a n ifesti, e nas ações contra usurarios (Cato
fu r ti
de rè rust. Proacm.), nà D edican o re i religiöses. L . 3, de lintig. (4 4 ,6 ) . (G aio, l i v .
-6 ad Leg.. XIr tab ö l.), etc.
(159) Por exemplo.: na a c tio ■ le g is . A q u ilia n ee, que, em sua origem, não procura
obter perdas e danos senão ao vaÍÕr o b je tiv o do último ánoi, ou no vencimento dò
último mês, § 16, J. ad. leg. Aq. (4,3) . ì l l i i d n o n e x v e r b is le g is , s e d EX INTER
PRETATIONS PLACO IT, etc., que poderia, independentemente, concluir por outros
motivos dos indicados. As usuree r e i ju d icà tse , aoexpirar o prazo dé 4_mêses, subiam,
antes d e J u s t i ñ ía n o , a 24 por cento. L. 2, Cod. de usur. rei jud, (1,54).
(160) 0 dôbró dó valor das coisas parecia aos romanos ser um, equivalente com
pleto das perdas e danos, tanto na época antiga como na época posterior. Lembra«
remos, por exemplo, a . cautio duplas alterum tàntúm , c as. disposições tã'ó conhecidas
do patrimônio sobre o d u p lu m , na venda e na disposição da tex JiiHa de adu lt., na
L. 27, pr. ad leg. Jul. (48,5). Isto nos explica-a defesa das usureé su p ra alteru m
tantum , e a disposição bém conhecida de J u s t in ia n o sobre o duplum; cm matéria de
pêrflas e danos (L. un. Cod. de sent, quie co, (7,47),
J161) Não era. uma ação penala mas reipersecutória. L.- 55, § 1, de admin, tut..
(26,7), S a v íg n y , O bligations, I, pag. 207. A ação contra os publícanos para a cobrança
^de censos indevidos, tinhà q rrìesmo caraterà L. 5, 6 , de public. (39,4). A actio d e
p o sit, da qual P a u lo (Ree, Sent. II, 12, § 11) diz que, segundo a lei d a s-XII tábuas,
dava o dobro, tinha um çarater especial. V. J h e r in g , Schuldm om enf, G ie s se n ,
pagina 32.
(162) VArrão, "dé re ru st., c. -10; Paul, Sent, ree., II, 17, § 3: s i eòineatuf,
àu cìprìtaiìs ven d itó r dupUótenus o b lig a iu r. Cicero de offic.. Ill, 16. Nam çum ex
XII tabules sa tis esset ea preestapi, q iix es sent lingua nüncupata ., guee qui esset in fi-
~ tiatu s d u p li pcenam su b irei: Assim; também, não só ao que nega, mas ao que na
nuncupatio falou falsamente, ou afirmou falsamente. R ú d o r f f , Z eitsch , fü r gesch.
R esch tsw . (R evista de ju risp ru d ên cia histórica,) , T. 14, pags. 423-455, afirma, com
evidência, que esta lei não se refere, de nenhum modo, ao caso de^condenação por
perdas e danos da ’ denegação.
(163) Assim na detio ad exhibendum , veja-se B a c h o fe n , P fan drech t , t. I, pag..
214, nota 6 - Na antiga pign oris copio, a quantia pela qual se devia resgatar o penhor
- foi mais elevada que a importância originária da dívida. Assim, ao menos, parece
se concluir de Gaio , IV, 32.
(164) Déste riúmero são, por exemplo, a actio depensi da caução contra o deve
dor, a act. ju,dicati, o nexum , o legado p e r dam nationem , o dam núm in ju ria datu m ¿
G aio, VI, § 171. .J á procuramos explicar, mais acima,, esta condenação no dobro.
O ESPIRITO DO DIREITO ROMANO 81
«esclarecer, com exatidão, tal sucessão com a act. fu rti, especialmente sobre o conflito
<juc se nota entre a avaliação objetiva e relativa (ef. L. 50, pr. de furti» (4 7 ,2 ) e
I,. 27, L. G7, § 1, 80, § 1, ibid.), mas deixaremos de explicar agora èsse ponto aces
sório. C'itaremõs, além disso, o interd. uti possidentis, no qual S k r v iu s toma o quanti
■ea res est no sentido objetivo, enquanto que os juristas posteriores atribuiram-no ao
•prejudicado. C . 3 , § 11 uti poss. ('#3,16). T M o m m s e n . í .c ., pag. 4 8 . Citaremos,
finalmente, a act. de servo corrupto (comp. L. 9, § de Serv corr Ut.?,) e L. 14, § 7
id .). Èstes exemplos de passágem da avaliação objetiva à relativa dão mais força à
«opinião defendida, no texto», sçm que tenhamos necessiddac de justificá-la.
CAPÍTULO III
(173) S eneca., de benef., III, desinit res esse honesta, si necessaria est.
88 RtJDOLF VON J H E RING
$
onipotência do Estado, tudo absorvendo e criando tudo p ara si
mesmo, não é nem póde ser outra cousa senão ó produto ver
dadeiro da arbitrariedade e dá teoria do despotismo, pouco im
portando que esta seja aplicada p o r um a assemblèa, ou pôr um
m onarca absoluto.
A dm itir ^semelhante teoria, é, p a ra o indivíduo, um a perfí
dia que se volta contra seu destino, e um suicídio m oral! A
personalidade, como seu direito à ,liv r e atividadè criadora, se
realiza tanto pela graça de Deas, como pelo Estado. Não é so
m ente um direito, é um dever sagrado para o indivíduo, reivin
dicar e exercer essà atividade. Mas a personalidade não existe
por si só . Provem de um organismo m oral mais elevado, o qual
repousa, nem mais nem menos que o seu, na instituição divina,
tendo igualmente recebido a sua missão de Deus: o Estado. Am
bos se lim itam, mas não se excluem. Não recebem os seus di^
reitos um do outro; nem o Estado os tom a do indivíduo, como
■ensinava antigam eníe a teoria do direito natural, nem o iiídiví-
duo os recebe do Estado.
A missão m oral do Estado ! Esta palavra elástica não re
conhece ao Estado a guarda, a vigilância da religião, da m oral,
do bem-estar, da educação artística e cientifica, etc., em suina,
de tudo aquilo que o povo é apaz de ser ,ou cfhegar a aleánçar, ou
perder? Certam ente; mas tudo, depende da m aneira por que o
Estado procura cum prir essa missão, o qüe nos condús áo ponto
que já abordam os. O Estado póde compreender a súa m issão
de tal modo, que acredita dever seguir à força e como poder
público èsse fini supremo da vida social, ou por meio de dispo
sições positivas. E’ contra isto que protesta o princípio da liber
dade pessoal, porque se vê assim constrangido a cumprir, pela
força, um trabalho em cuja execução liare consiste, precisam ente,
o dever e a honra. Tal é o sistema, que se opôs ao da liber
dade, que anteriorm ente se definiu. Nêste, o Estado se lim ita
a tornar possível e a facilitar êsses fins, deixando-o seguir o li
vre movimento do espírito m oral e a própria atividade d a 'in te
ligência nacional e individual. Nêsse sistema, a idéia do Esta
do e dã liberdade, são concordes. Realiza o ideal absoluto, que
qualquer povo deve procurar atiñgir.
As explicações, que antecedem, tiveram por fim demons
tra r a im perfeição do regime da tirania. Mas aquilo que não
é perfeito, póde ser relativam ente legítimo; como por exemplo,
um povo ainda não educado p a ra a liberdade, porque sem a
perfeição necessária, o sistema da liberdade não tem nenhum a
legitim idade m oral. Nêsse sentido, tanto se dá com os povos,
como com os indivíduos; necessitam, também, ser disciplinados
na sua m aioria. Essa disciplina consiste, precisamente, na opres
são. Graças ao sentimento intuitivo de sua fraqueza e de suas
necessidades, certos povos, longe de considerar èsse sistema um
encargo, acham-no natural e necessário. O sentimento jurídico
O ESPÍRITO í) 0 DIREITO ROMANO 89
sião uai além do limite de suas forças, não lhe sendo possível
com preender a legitimidade do sistema oposto. Os povos Orien
tais-se acham nêsse caso, porque a noção da liberdade pessoal,
que toma suá origem do próprio indivíduo, nunca se lhes reve
lou; parecia-lhes mesmo abominável em muitas de suas aplica
ções, por exemplo, em m atéria religiosa.
Criticando e* repelindo o sistema da opressão, temos justi
ficado o sistem a oposto. E’ preciso, nò entanto, acrescentar um a
obsérvaçãp.
Ao estabelecermos que, precisamente, a m oral verdadeira
é a que reclam a a m aior liberdade, não; significa isto, de mòdo
algum, que por onde quer que èsse sistema se mostre, na histó
ria, procede sempre de um respeitável conceito m oral. Póde,
ao contrário, ser o resultado de um a apreciação inteiramente
oposta, e não ser mais do que a expressão da grosseria, da hum i
lhação, da impudência m oral. 0 homem m oral deseja a liber
dade, porque deseja fazer .o bem por si m esm o; o perverso, por
que quer poder entregar-se livremente aos máus pensamentos.
Éste odeia à opressão, porque o compele à ordem e ào bem;
aquêle, porque a isso é forçado. Assim, pois, o sistema da liber
dade se encontra, tanto na fase menos avançada da civilização
c da m oralidade, como no período m ais brilhante, oférecendo
um a sucessiva série de matizes em que se póde vêr o quadro
mais variado: o da grosseria moral,: da ignorância política, da
indiferença econômica e o de um adm irável desenvolvimento
completo na órdem moral, política e econômica. Num e nou
tro caso, os princípios morais e as idéias elevadas não são vi
síveis nas leis: no primeiro, porque o povo delas carece; no
outro, porque não têm necessidade de auxílio da lei. No p ri
m eiro caso, o regime da liberdade é inferior ao da opressão,
enquanto que, no segundo, é grande a sua superioridade sòbre o
otitro sistem a. E’ um a escada, na qual, o primeiro degráu é
a arbitrariedade e a barbárie, o do centro, a disciplina e a opres
são, e. a verdadeira liberdade fórm a os últimos degráus.
O desenvolvimento do gráu de m oralidade póde variar m ui
to, no sistema da liberdade, cabendo à história descobri-lo em
cada caso concreto. Para chegar a isso, dever-se-á tomar em
onsideràção o carater, a civilização, as idéias religiosas e m o
rais do povo, e especialmente os seus usos (174), porque êstes têm
im portância infinitamente m aior que o sistema da tirania, como
tivemos oportunidade de vêr, no antigo direito rom ano. Os
(174) Depreende-se disto como é falso deduzir que, não não terem tomado êsses
principios a fórma de leis ou de regras de direito, fôram desconhecidos e extranhos
ao povo, ou, pelo menos^ que não os reconheceu como necessários para êle. Sêbre
esta conclusão defeituosa se apoiam tantas opiniões errôneas que se imitaram acêrca do
pretendido caráter imoral do Direito, romanó antigo.
2 ÍL RUDOLF VON JHBRING
SISTEMA ROMANO
A . — SITUAÇÃO DO INDIVÍDUO
D e s e jo im o d e r a d o d e d o m in a ç ã o d o s r o m a n o s . — L ib e r d a d e p o lít ic a
e p e s s o a l. — L ib erd a d e j u r íd ic a a b s t r a t a d o in d iv íd u o e s u a d e p e n d ê n c ia
e f e t i v a . — O s u s o s e o p o d er d a o p in iã o p ú b lic a e m R o m a . — S i s t e m a
d e a u t o n o m ia ju r d ic a p r iv a d a e m s u a s d iv e r s a s p a r t e s .
(175) Chamamos a atenção sobre o conceito dado por Santo Agostinho do orgulho
e da ambição dos romanos (I, 357: pro isto uno v itio — multa alia vitia comprimentes.
(176) Temos plena convicção de que é exata a opinião antiga, quando afirma que
era o povo que escolhia os funcionários »enquanto que a opinião nova, atribuia a pre
ponderância ao funcionário que dirigia os comácios eleitorais, o qual» depois de ter
consultado o povo, nomeava os novos funcionários. O apoio que encontrava esta opi-
O ♦ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 93
cravos não eram válidas contra os seus senhores (Geib, pag. 142) A tendência de
cidida da época posterior (não se p ó d e dizer a mesmo da lei das XII tábuas) à sua
vidade das pepas ( P i . a t n e r , qiuest. de jure crim. Ròm., pag. 75-82), foi assinalada
jpelos próprios romanos; por exemplo, por T i t o L iv io , I, 28: nulli gentium m itiores
placuisse paenas ; Cic. pro Rabir., c. 3. . . vestram libertatem non acerbitate su plicioru m
infestam , sed lenitale legiim mu nit am esse voluerunt.
(183) Denominação de um ditador, S etu m : videant cônsules, ne quid detrim en ti
-capiat republica.
(184) Rccordc-se que o censor podia pedir conta, por exemplo, pela negligência
da cultura, por abusos económicos, por luxo e gastos exagerados, faltas contra as
quais, no fim do século VI, quando o poder do censor não era suficiente, a legislação
viu-se forçada a coibir por meio das célebres leges sumtuariee.
(185) Era das atribuições do Senado, que as delegava, em caso de necessidade,
aos funcionários. Valer. Max. I. 3., de peregrina religione rcjccta. T ino Livio, IV,
30: datum inde negotium ted il ib us, ut anim udoerterent, ne qui nisi rom ani d ii neu quo
3alio more quam patrio colerentur, XXV, 1; XXXIX, 13 s.
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 95
(187) Quanto tempo não decorreria antes que a lex Canuleia, que permitiu os ma
trimonios entre patrícios e plebeus, fôra uma verdade! Nenhum patrício dava a mão-
a um plebeu, c quando isso sucedia» os nobres de sua fam ília o excluiam das sacra..
T ito Livio, X, 23.
0 . ESPÍRITO- DO D IG IT O ROMANO Q7
(188) T acito disse: Plusque vaJgnt ibi boni mores, quam a libi bonee leges.
(189) Por exemplo, na Inglaterra, na América do Norte, onde foi preconizada
quasi sempre pelos apóstolos da liberdade abstrata com uma simplicidade e com
placência assombrosas.
98 RUDOLF VON J HERING
(190) Por éste motivo, Cicero, pro Roscio Com. e . 6 . . . chamou a questão da
infâmia, uma questão de existência: Summee existimationis et poene dica al capitis
causa, pro Quint., cl r , de capitis causa.
(191) A agitação e a cólera, por éstos motivos» no povo, levou-o até a amotinar-se.
T ito L ivio , II, 23, 27, V ili, 28. Gellius , XXI, §25, diz, falando da antiga execução
pessoal: Swuitia isia poente contemni quita nón est.
(192) Casos flagrantes desta espécie podiam ¿exasperar o povo a tal' ponto que não
esperava mah que o dia do julgamento para dar curso a seus sentimentos. Veja-se,
por exemplo, S eneca de dementia, I, c. 14: Erixonem equitem Homanum memoria
nostra, quia filium suiim ftagellis acciderat, populus in foro graphiis confodit. Vix
ilium Augusti Ceesaris auctoritas infestis tam patrum, quam filiorum manibus eripuit.
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 99
sêiicia não é), comò uma cousa que não tem nenhuma correla
ção com as propriedades vizinhas (tais são as cousas móveis),
haveria uma contradição entre esta situação do proprietário e a
idéiar^abs trata de seu poder. Mas isto não enfraquece em nada
o que dissemos (19920) . A* liberdade da propriedade privada* our
de ùm mòdo mais geral, o principio de autonomia ilimitada das
relações privadas, verifica-se com as aplicações seguintes:
1. — No direito absoluto de alienar a propriedade. 0 di
reito antigo ignora, compleamente, a instituição híbrida que me-
deia entre a propriedade e o usufruto criado pelas interdições
legais de alienar, ou seja á paralisação de um a parte da proprie
dade, que deixa ao proprietário o direito de gozar e de reivin
dicar, mas que o impede o de dispor. Ninguém póde impugnar
uma alienação feita" pelo proprietário, nem os credores, nem os
herdeiros mais próximos. Ninguém póde proibi-la, ou dificul
tá-la, nem mesmo a própria autoridade. Seria monstruoso aos
olhos dos romanos, reconhecer a quem quer que fosse como pro
prietário, e declarar, âo mêsmo tempo, nulo o ato que praticasse
nessa qualidade. O único impedimento à faculdade de alienar*
conhecido no antigo direito, é a proibição de consagrar uma cau
sa litigiosa ao templo (20°), que acarretava penas, mas não nuli-
dado. As únicas pessoas, às quais foi proibido alienar, eram as
que estavam sob tutela; mas, nesse caso, não era que a proprie
dade estivesse limitada, eram as pessoas que se encontravam
diminuídas em seus direitos. A tutela dava, também, o m eia
jurídico de coibir o pródigo qúe não ouvia as advertências do
censor. Mas o direito antigo jam ais poderia conceber uma usur-
pação parcial da idéia da tutela sobre a liberdade da proprie
dade, tal como contêm, por exemplo, a proibição de alienar c*
fundus dotalis, ou o fideicomisso da fam ília. Quem era pro
prietário, o era completamente, sem obstáculo da lei. O abuso
do direito reprim ia-se por outros meios, mas não pela proibição;
assim, por exemplo, a alienatio ih fraudem creditorum podia
acarretar a execução pessoal; más não ocorreu senão quando
perdeu o carater terrível, e tornou necessária a actio Pauliàna*
2. — A divisibilidade ilimitada de bens de raiz é, também*
uma aplicação do princípio da liberdade absoluta de alienar as
cousas imóveis, que nunca esteve, que saibámos, limitada pelas
leis de Roma. Não seria, no entanto, impossível que a institui
ção do registo do cênso excluísse o desmembramento de fundos
originàriamente inscritos como um todo; só assim se explicaria
<199) Ocupaino-nos várias vêses dessa diferença, que resulta da natureza das coisas
móveis ou imóveis. Jahrbücher. . . VI, pag. 83 s .; sobre a garantia da liberdade da
propriedade territorial contra o perigo dos imposto« exeessivos. Veja § 38.
(200) L. 3, de litig. U ,S) .
O ESPIRITO DO DIREITO ROMANO 103
(204) Manus injectio tendendo ao quádruplo (volume IV, § 62) e acusação pública
por usura, Trro Livio, X, 23.
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 105
-------------------------------------
(207) Seja de serviços particulares momentâneos, que não afetam, de modo algum,
a sua liberdade, seja de um estado permanente de servidão, que sustava o exercício de
seus direitos políticos. V arrão, de re rut. I, 17, diz que nuuitos escravos se empre
gavam na agricultura, sendo pagos por día, como pessoas livres, ou ii quôs abaratos
(al. obararios, sendo èstes os condenados adjudicados a seus devedores como pena, de
seu atrazo) nostri pocitaverunt et etiam nunc- sunt in Asia atque Egipto et in llìyrica
complures. V arrão, L. L. 7, 5, § 105; Liber1 qui suas o-peras IN SERVITUTE pro pecunia
quadam debebat dum- solveret, NEXUS vocatur ut ab aere abeeratus. Também tomavam-se
os filhos dos devedores, T ito L ivio, II, 2 4 ... neue liberos nepotesve m oraretur; VIII, 28r
cum ob ees d ’.ienum paternum se nexum dedisset e liberumque suorum respectó.
Existe certa analogia exterior entre èsse estado 'permanente de servidão, fundado
sobre um pacto feito para prevenir a ekecução (pacto "que é preciso não con
fundir com a verdadeira mancipação), e a qualidade passageira do devedor, sem obri
gação de servir, que sc encontra no antigo processo executório. Vê-se nêle o cativeiro
da lei das XII tábuas, mas, ' no fundo, existe a diferença radical de qué o pacto que
tratamos se apoia no jus pacisccndi legalmente reconhecido. A lex Peetelia Papiria
(T ito LiviOb VIII, 28).aboliu o nexum néste sentido (mas conservou-o para p caso dê
divida líquida). Os tèrmos bona debitoris, non corpus abnoxium esset, de T ito L ivio ,
não se devem referir à execução, mas ao jus paciscendi, que podia ter por objeto a
fortuna do devedor, mas não a sua pessôa. Quando, depois desta lei, os devedores pa
gavam suas dívidas com serviços feitos ao credor, coisa que ninguém lhes podia im
pedir de fazer, tomavam-se livres, conservando o gozo de seus direitos políticos,
podendo, se o credor os tratava mal, deixar em qualquer momento de prestar os seus
serviços. B urchatdi, Lehrbuch des rõm Rechts (Curso de direito romano), 2.» parte,
i 129, é da mesma opinião.
11 SECÇÃO. — O Poder Doméstico
refugiuid atque receptaculum sit cumque, qui inde in /u s vocaret, vim inf erre videri.
L. 3?1 ib id . Sed etsi qui domi est interdum vocari in jus polest, tame de domo sua
nemo exirahi d eb et."
(212) Gf. ir , G esch ... ( História do processo criminal de Roma), p a g . .3 5 4 ; Os
e x e m p lo s s ã o d a èp oca de C icero, m as n ad a in d ic a q ue an tes e freq u en tem en te f o s s e m
d e o u tr o m o d o .
(213) Gaio , III, .186 s. A lei conhece duas formas: a forma moderna, ou não«
solene, pela qual o investigador vestia as suas roupas usuais e que acarretava a pena
do triplum quando a investigação descobria as. coisas roubadas dct. fu rti' concepii ;
veja-se GAWyrlf 186, 191) ; uma forma mais antiga ou incômoda para o investigador,
era a. que devia atuar nú, cingido por um avental de couro) e munido de uma escúdela
(III, § 53); (per- licium et lancem) e que acarretava«, a pena do quadruplum. Gaio , §
192, 193 forma que data provávelmente da època primitiva dos povos indogermánicos,
porque se encontra, não só entre os gregos, com o, também entre os povos dó Norte; J .
Gr im m , Revista histórica de S avigny , II, pag. 91; mas que deveu nascer sob a zona
tropical, porque fora impossível cumprí-la nà Groenlândia ou na Islândia. «Na Noruega
o avental era substituido por uma camisa (G r im m , I. c .)., indicação interessànte para
elucidar a questão do centro originário dos povos e da familia indogermànica. O
acusado' podia reclamar a forma antiga, mas podia-se di&suadi-lo disso, agregando à
.torma, moderna de urna pena mais branda, forma que era, por assilli dizer,, uma pro-
' postá de acôrdo que podia «substituir sem se expor ao act. furti prohibiti, enquanto
-que se expunha a èie quando se opunha ao que era para as duas partes o direito ri
goroso. Nada, tinha de extranho, além disso, que Gaio , que não tinha diante de si
essa progressão histórica, encontrasse tota lege ridicula.
(214) ^G aio , ì l i , 192.
(215) Por exemplo. Gaio, III, «196, 191, loe. cit.
(216) P e n à ^ e p e n dente d o p len o p o d e r d o a cu sa d o r (G eib , l. - e ., p a g . 285).
IVO RUDOLF VON J. H E R I N G
(217) Cic., In Vcrr., 4, 6 6 ... Ule contraxUcere. . . quid malta? nisi oehementius
ho mìni minatus' essem. nisi legis SA NCTIONEM P(ENAMQUE recitassem, tabularum
m ihi potestas facta nan esset.
(218) V. em Apuleo, Met., lib . 9, f. (ed. Bip., I, 222), um exemplo dos
•meios de contender, tirado da época posterior... obstinate denegantem. Immissis itaque
lictoribus ceterisque publicis m inisteriis.
(219) Intra domum inter te ac filius taos, si qtiee controversi* oriuntur, terminari,
L. 4, Cod. de pat. pot. (8-47).
(220) O Ôí^ta lov o íx v o u iv ó v dos grêgos. T r e n dei.kn b u r g _ Natar r . ( Direito natu
ral), 2.« ed., pag. 301. x
.(221) Familia, no sentido geral, designava o lar doméstico, em ' seu conjunto, e,
num sentido mais limitado, .sómente o patrimônio (por exemplo, famlliee. eriscundx
judicium, ex família Cassia. Trro L ivio , II, 8, 15, 41), ou sómente família. Veja-se
R ossbach , Untersuch... (Investigações sobre o matrimônio romano, pag. 14), a eti
mologia exata da palavra. (Sáncrito: dhá, assentar ;d/t aman, assento, morada,, casa,
mudando dh cm /„ corno em /era: <de ’Orjo) • Familia, pois, designaba sociedade do
méstica, o estado da casa; familiaris e fámulos referem-se aos habitantes e aos amigos
»da casa. O grêgo ten\, também, as expressões oí%OÇ que significa a casa, e, em se
gundo lugar, o patrimonio; oíxéxai» a mulher, os filhos e os escravos. Emprega-se
na mesmo sentido que familia*. domus res mea. T ito L ivio , XXII, 53, enumera essas
três expressões, referindo-se a uma formula imprecatoria, acompanhada de juramento.
(222) Os romanos conciliavam o sentido das palavras dominus e- domus. Ve
ja-se, por exemplo, L. 195, § 2, de V S. (50,16), paterfamilias qui in domo d o m in iu m *
haber. E n n iu s em Cíe. de off. I, 39: O, domus antiqua, heu, quam dispari dominare
domino; nec domo dominus, sed domino domus honestanda; de finib.. L 18: nec in
discordia dominorum domus. Os filólogos clássicos modernos, que seguimos nas
■édições anteriores, fazem derivar .dominus de dom us; mas os recentes trabalhos da
linguistica comparada estabeleceram que essas palavras nada tem de comum entre si.
Dominus, derivado da raiz dam, õá^ôü) = domo; no alto alemão antigo zam — do-
uñado, domctticado; no sànstcrito dami tas = domitus, domare, domitor, dom inus.
O ESPIRITO DO DIREITO ROMANO m
signavam, de facto, a propriedade; potestas, empregada princi
palmente para indicar ó carater pessóal, isto é, a Telação entre
o chefe supremo e seus subordinados (223224), particularm ente no
que concerne aos filhos (patria potestas) e aos escravos. Mas
eètè tèrmo compreendia, também, outras relações de poder so
bre as pessoas e as cousas (225) . Temos, finalmente, a expres
são inarms, e nesta palavra, ármenos que as aparências nos enga
nem, encontra-se a expressão originária que designa o conjun
to do poder do chefe da casa sobre a sua fam ília, pessoas e cou-
sas. Mais tarde, é certo, essa expressão, em seu uso técnico, fi
cou lim itada a uma única parte do poder doméstico, ao poder
m arital (226) . Mas a sua significação geral prim itiva se reflete
ainda mais claram ente nos compostos que o novo uso lingüístico
conservou para designar as outras relações de seu> dominio:
emancipare, para os filhos, manum itiere, para os escravos e m an-
cipium . Esta unidade de expressão supõe a unidade originária
de idéias, não sendo nós os prim eiros em adm itir (227) que as
diversas fôrm as das relações absolutas de domínio, a proprieda
de das cousas e dos escravos, o poder m arital e paternal não são
mais que desenvolvimentos de uma só e m esm a idéia prim itiva
que form aram outras distintas e independentes. Manus e fa m i
lia eram correlativas. Familia designava o dominio do poder*
manus o símbolo e o instrumento do poder, ou seja o poder em
si mesmo; um a e outra abrangiam tudo aquilo que havia na casa,
pessoas e cousas, séres livres e escravos. As pessoas destas duas
categorias eram alieni juris; o chefe da fam ília não exercia so
mente o direito sobre elas, mas tinha-as sob o seu poder,' como
tudo a que possuiam, produziam e ganhavam . Desta subordi-
Segundo F estu . , Vubcnus apud antiquos dicabatur, qui p une dominus. E* preciso
lê r 1dumenus, segundo L. L a n ge . Domus, pelo contrário, derivado da raiz dem, donde
òéfAiu* edifica, ÔÓM-OÇ» edificação. Veja-se G. C u r tiu s , Griechesche etimologie* 4.» ed.,
pags. 231-233.
(223) Ñ as o b ra s d e P lauto, o s escravos d ã o sem p r e ao seu sen h o r o n o m e d e
f ie r a s ; ta m b ém d é le se u sa n a lex Aquilia (L. 11, § 6, a d le g . Aq. 9,2), m a s ra ra
m en te se em p rega p ara d e sig n a r o m a rid o . Catulle , l. c ., p a g s . 281-283
(224) • Saucer patis, senhor, esposo. Grêgo jfocnç» esposos, Ô£0jtÓTT)> senhor;
Lat., potessum, possum, potior, potens. Esta palavra nada tem de comum, etimológi
camente falanda, com potus, bebida (o que nutre, p o tis ) . Os últimos trabalhos da
ciência, não deixam dúvida sôbre isto. C axulle , LXXXI, 116.
(225) Por exemplo, a fortuna, empregada nêsse sentido na lex Atilia sobre o
usocapião de res fu r tiv a : in potestatém reverti. L. 4, § 6, de usurp. (44,3), a tutela
(vis ac patestas in capite libero, § 1, I, de-tutela, (í,13), o poder material (in potes-
latem viri cedit. Sw ad Aen., 4, 103). Veja-se R ossbach , i. c ., pag. 28.
(236) Para o uso ordinário da vida encontra-se tambéip cm sua generalidade ori
ginària. Veja-se as pa&ságens citadas por R ossbach , c.
(227) O mérito de haver sido o primeiro que com energia sustenta essa opinião
cabe a J. C h r i s t i a n s e n , Vio W issenschaft.. . (A ciência da história do direito romano),
tomo I, pag. 136, R o s s b a c h , /. c ., pags. 10 e 41 ; defendeu a mesma opinião, se bem
que conhecesse a de seu predecessor.
naçaçT absoluta a sua vontade, originava-se á igüaldade: de tocMÉ
enfre si ; é preeisam.ente o que exprim e o vocábulo m anus. ;Se iíõM
fá s^ p ^ rm itid a - penetrar m ais profundam ente as nossas vistas nati
dà propriedade rom ana, p o derla^
' nio Sy p r ovay elm en te, não só atingir, -mas ainda resolver1afirma^
divam ente a questão. de se a m anus no processo (manujn cornea
r¿£¡¿), e as vrés; mancipi, bèm corne a m a n c ip a tio foram àpénas
fragm entos dq- antigo sistema da marnis i 228) ; Éste extenso po
der do chèfe da fam ilia não lem, de resto, nada de especificamen-
lé rom ano; o que. nêle há de rom àno, é que se manteve* em Roma,
m ais tempo que em qualquer parte, na sua fórm a e vigor ori
ginários. E 9 um a emanação de idéias patriarcais, que rem on
tam à mais alta antiguidade. São reconrecidas em outras le^
gislações, especialmente no direito germânico antigo, onde têm*
com o poder doméstico rom ano, uma tão incontestável identi
dade, que nêle se deve ver um resto da comunhão jurídica origi
n ária dos povos indo-gérmânicos (229230) .
A identidade originária da idéia de poder não supõe, de
fórm a algumà, que se ignorassem as diferenças originadas, neces
sàriam ente, da própria natureza dòs objetos. Podiám ter-se m ui
tos filhos e muitos escravos, m as não muitas m ulheres; um es
cravo podia ter muitos senhores, m as um filho só podia ter
um p ai; a propriedade dos escravos e a manus sobre a m ulher
nasciam pelo usus, m as o üsus jám ais poderia criar o pátrio po
d er; legavam-se os escravos* m as não a mulhêr, nem o filho. O
conhecimento destas diferenças dá a convicção de que, além d a
id éia geral dò poder absoluto, segundo os diferentes ^objetos aos
quais êste se aplicava, podia apresentar-se sob aspectos diversos.
Assim sucede com os ram os que dêle nascem e que acabamos de
exam inar: a propriedade, o pátrio poder m arital^ O poder do
senhor sobre o escravo; se subordina à idéia da propriedade, m as a
analogia entre o escravo e a cousa, resultante dessa subordina-
cao, não se podia levar ao extremo rigôr (23° ) . À essaS três re
lações dè poder sobre a m plher, filhos e escravos, jùntou-se a
riiáncipium, como relação de poder momentâneo e, por isso mês-
mó, lim itado de um mòdo especial.
Acreditou-se, muitaà; v êses, encontrar a expressão da re
lação originário, de que acabámos de falar, dizendo que p di-
(228) Voltaremos sobré esta questão, quando nos ocuparmos da história da pro
priedade (3.» parte).
(229) À manus romana corresponde, o facto, e,. segundo a etimologia da palavfca*
alemã mu/tf, m u n d iú m — mão;' às duas tiveram originàriamente a mesma significação;
e o nièsmo objeto. J. G r i m m , Deutsche'Recktsalth. . . (Antiguidade do direito romano*)*..
pag. 447 “O matrimônio, fundado no mundium do marido, tém todós os efeitos da
conventio in tnanum de., Roma” Pag. 450: “De seu~ mundium sobre a mulher de
correm intuitos direitos; podia castigá-la, ven)dê-la, matá-la, tal como a seus domésticos
e - seus frlhos’*..
(230) Por ' exemplo, pelo statuliber. V. mais adiante.
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 1)3
(245) L,. 17 de statuì. (40,7).. htec mens fuit consíituentium, ut quasi EX PA-
■'TRIMOÑIO suo dandi eo nomine servo potestas esset.
(246) Por exemplo, pára saber se entre êles existia alguma dívida., L. 49, § 2
-de pee; (Í5 ,l). Ut .debitor vel servus domino vél dominus servo intelligatur, exr
cansa c ivili computandum e s t ... nuda ratio (a simples conta, isto é, o facto de levaxr
-a divida à sua conta, ou a manifesta vontade de se reconhecer devedor) eum non facit
'debitorem. Para adquirir as coisas que necessitam da tradição, segundo a L. 8 ibid
=e L. 21 p . de statuì. (40,7).
(247) Factum magis demonstramus, quam ad ju s civile referimus obrigationem~
L. 41 de pec. (41,1).
(248) Ulp. fr. II, § 4. emptori. dando pecuniam ad libertatem. perveniet idque
$ex X ll tab. ju bet. L. 25, L. 29, § 1 de statuì. (40,7).
(249) Oùtra relação, na qual se reconhecem direitos aos escravos, é a dos servi
jm b lici, que podiam dispor, por testamento, da metade de seus haveres, Ulp. fr. XX,
§ 16,'e até contrair matrimônio com mulheres livres. T h. Mo m m sen , Rom Staatsrecht,
J, 253). Mas difícil é admitir que essa capácidaed já existisse no direito antigo.
118 RUDOLF VON JHERI NG
rado e tratado como um membro dessa fam ília (260) . Nêste es
tado de cousas, não há necessidade de advertir, que o poder do
minical não podia ter o cara-ter odioso (261), que se lhe atribúi
atualmente, apezar da repulsa da crítica sã.
Se tal era a verdadeira situação, e a história não deixa ne-
nhum£ dúvida a êste respeito, fácil é compreender como a opi
nião pública receberia a crueldade e a deshumanidade, usadas
com os escravos. Com efeito, via nisso, não um ato indiferente,
um simples uso do poder dominical, mas um abuso dêsse poder,
tão condenável, sob o ponto de vista m oral, como no do interes
se público. A instituição da censura dá-nos a prova mais con
cludente disso, porque o censor exigia do senhor o motivo de seu
procedimento deshumanó tf262) . Uma série de influências, de
considerações e de circunstâncias, agiam p a ra conduzir, na rea
lidade, à prática perfeitamente razoável. O temor à opinião pú
blica, um a certa circunspeção ante os escravos, impediam, na
época antiga, muitos atòs, que o senhor desejasse poder fazer e
que até juridicam ente poderia praticar. O uso estabelecera cer
tas regras das quais não se podia afastar, sem se expor ao vitu
pèrio público, por exemplo, com . relação áos alimentos (263) e
ao vestuário dos escravos (264) . Os scriptores rei rusticce conti
nham, sobre o tratam ento e a sorte dos escravos, empregados na
agricultura, muitos ensinamentos dignos de atenção. Por toda
parte se recom endava o tratam ento justo, conveniente e cheio de
(260) Nó primeira dia do ano, era servido na mesa pela mãe de família, e nas
saturnais* pelo senhor. Macrob., Sat., I, 12. Comiam com a família na própria mesa.
Beker, l. c ., pag. 117. Rossbach, l. c ., pag. 24, relata- outras provas, encontrando-se
:nã sua obra uina apreciação exata desta matéria, o que não se póde dizer de Be k e r .
Rossbach ocupa-se especialmente da situação do escravo na família romana, sob o
ponto de vista religioso. Por exemplo, o escravo podia oferecer sacrifícios, fazia a
¡usíratio do campo, e a villica (mulher do capataz dos ecravos) fazia, em determinados
dias, sua oração aos deuses; Diana era a protetora dos escravos, e a sepultura destes
chegava a ser, muitas vêses mohumentos darte. Vejam-se as inscrições de Ordii
(Corp. inscr. I, c . 9) eram locus religiosus, enquanto que a do inimigo nunca foi
.assim considrada. R. Elvers, de reb. relig. Gott., 1851. L. 2, p. de relig. {11,7 ).
V arrão de L. L. 6,24). O filho do escravo* não era considerado como fruetus, mas
bonae fidei 'possessor, e o usüfrutário devia restituí-lo conjuntamente com a mãe, afim
de não o separar dela (dura separatio), L. 12, § 1 de instr. leg. {33,7): L. 10, § 2
de J. D. (23,3). L. 17, § 1 R. V; (6,1), etc.
(261) Macrob., Saturn. 1,11. Majores nostri omnem dim inis invidiam, omnem
servis contumeliam detrahentes, dominum pairem fam ilias, servos familiares appella-’
-veruni. Os escravos, que voltavam à pátria, conservavam relações de correspondência
-e amisade com os que haviam sido seus senhores. T ito L ivio , II, 22.
(262) D io n isio ; 20,3.
(263) Por exemplo. Catão de re rustica, c. 57, sobre a ração do vinho. Val. Max.,
4,37, (relativamente à sua época) : a servis vix impetrari potest, ne earn supellectilem
fastidiala, qua tunc consul uti non erubuit. As rações eram bastante grandes, para
que um escravo pudesse fazer economáas, vendendo o supérfluo.
(264) Por exemplo, L. 15, § 2 de usufr. (7,1); suff identer aut em diere et vestire
■debet (usufructuarias secundum ordikem et dignitatem m a nc ipio rum .
122 RUDOLF VON JHBRI NG
(265) V arrão s . 17. Col um ., 1,8. O senhor devia tratá-los familiarmente, diri
gindo-lhes pilhérias, pedir-lhes conselhos e até convidar o administraidor para a refeição
nos dias de festa, etc., que para o escravo deveriam ser de descanso. Cic. de off.
1,13. Deve ser considerado como um diarista remunerado {meçcenarius). Podem
vêr-se as idéias da época posterior, em Señera, epístola 47, que as combate.
(266) De re rust.., c. 143.
(267) Assim é como se póde explicar que èie deixasse pecùli , quando era ven
dido. V arrão, 2, c. 10, peculium solet accedere; tão habitual era isso nas manumissões,
que se erigira em presunção jurídica.
(268) Para a familia rústica, V arrão, 1, 17, acon selh a o sen h or p e r m itir a o escravo-
a p o ssa r -se de u m a cabeça d e g a d o .
(269) S eneca , e p ls t. 80; peculium suum quod comparauerunt ventre fraudato-
pro capite numerant; T erentio , Phormio, I, 1, 9-12, L. 39 «le pcc. {15,1 ) .
(270) L. 29, pr. de J. D. (23,3).
(2 7 1 )Veja-se, por exemplo, V i r g ii .i o , Egloga, 1 ,3 3 , nec spes lìbertatis erat nec
ao contràrio, era urna prova de capaoidade; P l a u t u s , Asm., 2 , 4 , 9 1 ; frugi tarnen surrr
cura peculii. Cic., in Ver., 3 ,2 8 . Plautus, Casin., 2 , 3 , 39, 4 0 ; uni grande pecùlio;,
nec potest peculium enumerari.
(272) D ai a relação d a spes libertatis c d o peculium cop io na p a ssa g em _ d a n o ta
p reced en te e no statuliber.
(273) Hor. Sat. 2, 7, 79. Vicarius est, qui servo paret. Vcja-sc B e k e r , l. c .r
pags. 94, 95. Havia escravos tão ricos, que tinham mais despezas que, na atualidader
qualquer fucionório público, por elevado que seja o cargo exercido no Estado. B ek k r ,.
p. 20.
O ESPÍRITO DQ DIREITO ROMANO \23>
(279) Foi introduzida com essa previsão. Tito Livio, VII, 16: Patres, quia ea lege
HAUD PARVUM vectigal INOPI aerarium additum foisset, auctores fuerunt. Èsse
dinheiro (¿urum vicessim arium ) conserva-se no aerarium sançtius, para os casos ur
gentes. No ano de 543, tira-m-se déle nada menos de que 4.000 libras de ouro. T ito
L ivio , XXVII, 10.
(280) Para os romanos, da época posterior, a patria potestas era uma instituição
especial, que somente entre éles existia (G aio, I, 54)¡, enquanto que o poder sobre os
escravos lhes parecia coisa comum em todos os povos. (G aio, /, 5 ). A restrição, que
mais tarde se impôs à escravidão, foi considerada, para éles, um' progresso muito
romano (G aio, I, 53).
.,(281) Quanto à liberdade. Dai o nome de liberi, livres, dado aos filhos, em opo
sição aos escravos. Essa diferença só se manifestava, durante a vida do pai, relativa
mente ao direito público, que considerava o filho independente^ podendo-se citar um
exemplo célebre, em C icero de invent., II, 17. A distinção aparecia no direito privado,
por morte do pater fam ilias, porque os escravos continuavam no seu mês mo estado;
O ESPIRITO DO DIREITO ROMANO 12S
enquanto qué os filhos, ao contrário, tomavam-se sui juris, e como tais, se o pai não
lhes havia desherdado, continuavam em familia, à qual, até então, pertenciam de ura
jtnódo positivo.
(282) Não somente não podiam ter nenhum patrimônio, como também nenhum poder
sobre as pessoas, o que não oferece dúvida quanto à patria potestà*, ainda que se negue
com relação à manus, perdendo de vista a afirmação de Gellius , 8, 6, 9: quee in m ariti
manu mancipioque AUT IN EJUS., in cujus maritus, manu mancipio.que esset, quoniam
nön in matrimonium tantum, sed in familiam quoque m ariti et in sui heredis locum:
venissct (passágem literalmente reproduzida em Servíus ad Aen. IX, 476, mutilado em
n o n de d iff. verb. 422, 9: in fam ilia mancipioque sit PATR1S, etsi in MARITI matri
monio s it), e esquecendo que é impossível que quem está submetido ao pòder alheio,
tenha domínio sobre outras, pessôas. Quando se fala de manus do filho' família sobre
sua mulher, por exemplo, em Gaio , II,~ 148, IU, 3. Ülp. fragni. XXII, 46, deve en
tender-se que o filho que temos sob o nosso poder, contratou matrimônio com manus,
mas não que possa, por isso, cònsiderar-se detentor da manus. O efeito principal da
manus, ou seja o da disposição dos bens, era impossível "sem o senhor que o exercesse.
W alter, R.R.G. (História do direito romano) 3.a ed., II, § 504, acha essa opinião.ex
travagante, mas poucas palavras bastam para justificá-la. A proposição anterior:
aquele, que esta ^ob o poder alheio, .não pode ter outro sob o seu poder, não resulta
súmente da natureza do poder do chefe de família, m as'está expressamente enunciado
na L. 21 ad. L. Jul. de adult. (48,5) : in sua potèstaté videtur non h a b e r e qui non e st
suse potestatis. O marido, que se achava sob poder, tinha o ju s necis ac v ite sobre a
mulher? Não; arg. L. 21 ç i t .. Era o dono de sua fortuna? Não. Podia,,
judicialmente, reivindicar a manus? Também n.o. Que era, pois? Nada. Se
se quizer aplicar a êsscs casos insignificantes, a êsses pequenos nadas, o-
nome de manus> não nos oporíamos, absolutamente. Vejamos, no entanto, a situação
da mulher com rela'ção ao sogro.' Sabe-se que seu dos entrava para o patrimônio déle;,
ninguém porá em dúvjda que todá sucessão não lhe pertencia, nem também que tivesse
sua jurisdição doméstica sobre ela. Depois da morte do filho, se ela não estivesse sob
o poder do sogro, sua relação com êste cessaria. Era èsse o caso? Não. Ela era
herdeira. Gaio, II, 159). Veja-se tambeiri Gaio, III, 41), e êle podia nomear-lhe um
tutor em seu testamento (Gaio, I, 148). Voigt opõe-se igualmente (se bem que não nos
cite), a esta opinião: Die lex Meenia de dote. Leipzig, 1866, pags. 75-77.
(283) Segundo Dion ., 2, 27. Paut. num. 17, o filho casado não podia ser ven
dido, na época antiga.
126 f i UDOLF VON JHERI NG
(284) Não cessava o domínio pleno, como admitimos nas edições precedentes.
Gaio , com efeito, diz (I, 140) : invito eo, cujus in mancipio sunt, censu libertatem
conseqiii POSSUNT. Sobre éste ponto, estamos de ac.ôrdo com A. S:\h id t : Das Hauskiad
im müncipacium). Leipzig, 1879, pag. 16), mas não podemos, nos pontos restantes,
participar dc sua opinião. Sc o pai pudésse vender, definitivamente, o filho, de que
serviria limitar a trêSj o número de vendas? W alter, Röm. R. G., II, § 50S, nota 58,
admite, como Gaio, no principio do § 140, que não é mancipado, mas sóinente dicis
cau$a,' enquanto que nós aplicamos esta« palavras — excepto co, quem pater ea lege
mancipio debit, ut sibi remanciperetur. Senão, qual scria o sentido dessas palavras e
que quereria dizer da verdadeira mancipatio? O direito mosaico continha um dispo
sitivo análogo. O hebreu que era vendido como criado, tornava-se livre no fim de
sete anos, independente do efeito libertador, que para ele, igualmente, se realizava no
ano do jubiliu. Moisés, 5, 15, 12 s. S c h n e l l , Israel Rechf., pags. 29-8 0 . Veja-se na
L. 20, cod. de posti, revers. (8 ,5 ), de H onorio e T eodosio, uma nova aplicação deste
período de escravidão de cinco anos, o direito antigo: o prisioneiro resgatado (re-
aentus) tornava a ficar livre opere quinquennii, quando não podia pagar o preço da
venda. No direito saxão, o direito de vender foi limitado pela influência da Igreja.
(2 8 5 ) S e a n t e s j á t iv é s s e m o s c o n h e c i m e n t o d ê s te s ato«s e s e e n tã o p o s s u í s s e m o s m e io s
p a ra os e x e c u ta r, c o m o se p o d e ria c h e g a r ao s u til ro d e io d o s te rm o s d a le i d a s XII
tá b u a s , que, n ê s tc c a s o , a b s o lu ta m e n te n ã o sc a p l i c a m ? (G a io , I, («»a io , I, 1 3 2 ) .
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 127
(290) P l a u t . , Rem. c. 22. R ossb ach , p a g . 134, n o ta 450, não quis aplicar os-
term os d essa defeza. à m a n c ip a tio , mas, ù n ica m en te, a o r e p ú d io .
O^ÉSPíáíTÔ DO DIREITO ROMÀNO IÍ9
4
*0 m atrim ônio com mantis era um áto im portante «para ä
ihúíher sui juris; im pottántèf não sómèDtê pafcà ela, coniç^tainT
bém, p a ta seus tutores legítimos. Cefo - efeito, -a capitis demi-
àutiõg qtie sofria a mulher, pela m am isf-tinha por fini dissôlvèr
a tutela; e traii$itíitia ao m arido o patrimônio da mulher; — pá*
trimônio que, pbr morte desta, passava aos tutores, é cuja cón-
séS^ac|[q era o íin i principal dá tu te la i291) . Quanto à mtílhèr*
ÍÔ i^ e /^ essa troca lhe e ra até, de certo m ó d o ,# ^
\D fa% ^5^rcjue, pela sua m orte, ou a de seu'm arido, transm itia
a sà s Mlfôs a fortuna, da qual, sem éste, se apoderariam òs
tutored na qualidade de agnados mais próxim os.' Êstes tenham*
pois, o m aior interesse em que a mulher não contraísse, de módoi
algum, m atrim ônio com m anus; como sua autoritas. e ra neces-
sária^para sancionar semelhante união (292293), e como não podiaift
ser obrigados a.^ dá-la C298), dependia déles, únicamente, im pedir
èsse matrimôiíiiíí (294) .
Nenhuma saída melhor para esse conflito dos interesses dos
agnados e de sua pupila, que o matrimônio sem m anus. Não
:ê^a^mitir um a hipótese ousada (295)> crêr que' a prim eira apa^
ricão désta fórm a de m átrim ônip teve lugar pela pDópíia fórca
dás , óonsasT e ênâ* circunstâncias de imprèscindível necessida
de (296) . Onde se encontraria,, senão na origem desm atrim onio
sem j^flniis? Ònii timos a á sse rô ã ç ^ ^ %que a diferença entre o
matrimônip, çóihr pu sem manus, tinha um a origem ética» pór-
que-etfa ^ s p ro v |d a de provas (297) . Resta um a opinião, que
m érec^ ser examinada, ê a que o matrimônio sem manus, nas-
cêra da« asfdraçÕes do bèlo sexo, para um a independência mais
%ompl|ta, ö^que fãz supôr que essa fórm a de m atrim ônio intro.
J|qliu,,na situação da^mulher, maior* soma de liberdade. Mas
4stõ, que* é exalo para^af época em que .a tutela das mulheres
.perdera o seu antigo ttgôr, não se realizou antes, porém no ad-
«yento do sistema seguinte. Esta opinião, quando se refire à
ép^ca antiga; apô ia-se num erro. Tão dependente, no matri-
mônáo sem mànus, como no matrimônio com manüs, a mulher
^ ó ^ n ço n trav a nêste uma, diferença: a de que, ño primèvo,: não
élíavá, com çelação a seus bens, na dependência d ^ ^ ^ iíia a rid o ,
mas de outras pessoas, como seu pai, ou tutores. ^
0 gráu de independência, de facto, que gósava, obedecia* nos
dois,casos, à ascendência, que ela sabia ter sobre o seu senhor.
Os agnados, pela sua avidez, submetiam-se fácilmepte, a esta
influência, como o marido? A mulher, com plena liberdade de
escolha, podendo depender de seus tutores, ou de seu marido,
decidir-se-ia, pela autoridade déste, ou pela daqírête? Delinear
a questão é resolvê-la.
Para ir além do exame da situação da mulher casada sem
manus,ié necessário distinguir se ela se achava sob o poder do
pai, bu sob tutela. No primeiro caso, perm anecia^com o filia
familias; o poder paterno não sofria modificação nenhuma pelo
matrimônio, é. em caso de um conflito éntre o direito dò pai e
o do marido, triunfava ©<pVhrfèiro, porque tinha, por exemplo,
p direito de dissolver o matrimônio, contra a vóntadf^dos^ P o
sos (208) . As fontes, que possuímos, não nos dãô ihdícios exatos,
t l ? exercício do jus necis ac vitce sobre a m ulíier. ^ Podfam, o
pai e o m arido, conjuntamente, usar dêsse direito, ou Somente
"um. déles era investido dêsse poder? Ainda, nêsse caso, o poder
,do marido devia, logicamente, inclinar-se diante da patria po
testad, Ä
Èsse direito incontestável do pai devia, certamente, tornar
difícil, ar posição de ambos, e repugnar às leis da època antiga
sobre á*soberania dom éstica. Era um poder extranho que vinha
aumentar a sua autoridade dentro da casa romana, contrarian
do o poder do m arido, e póndo em dúvida a própria existência
do casamento. Por que esta anomalia? Tratava-se de garantir
o interesse do pai, quanto à fortuna da mulher. Isto não nos
merece a núnipia atenção. Ainda admitindo que tudo o que a
mulher adqum sse, como filia familias, chegasse a ser do pai, o
interesse em jogo era diminuto, porque as doações entre os es
posos eram nulas, e as aquisições feitas, graças às liberdades de 298
(299) A filia familias, não podia receber nada ab intestato em vida de seu pai.
-As disposições testamentària« de um terceiro eram muito raras (eram sempre feitas em
favôr do pai). Somente ficam, em absoluto, as duas fontes *de adquirir, mencionadas
por P lauto, Casin. III, 2, 2 S ... quia viro sub traba t ant stupro inverenit. A célebre
preesumptio Muciana, que impunha à mulher a. prova de.qualquer aquisição que pre
tendesse ter durante o matrimônio, basea-se em que a mulher não mdquire igualmente
senão pelo e para o marido.
(30P) Assim st conclui de um texto de Gaio, I, 190 (que contém, ao par de. sua
•opinião, o ensinamento de que: mulieres, qux perfectae aetatis su ut, ipsx sibi negotia
iractant, et in qaibustìam causis dicis gratia tutor in terpon i autotitççtem) . T ito Livio, IV,
9, menciona um litigio perante a autoridade de uma mãe e o tutor *de uma filha sobre
a escolha do marido. Mas os factos passavam-se em Andréa, e não em Roma, e seria
temerário deduzir que o mesmo' houvesse sucedido em Roma. R o ssba ch , l. c ., pag. 400.
(301) Z im m er n , R. R. G. (História do Direito romano), t. 2, § 140.
(302) Coemptio fiduciae causa.
(303) Serv. ad Virg. Georg. 1, 31; usu, si mitlier anno uno cum viro LICET SINE
LEGIBUS fuisset (isto é, sem contrair matrimônio, segurfdo a moda antiga, por coemptio
ou confarreatio). O consentimento do pai era necessário. R ossbacii, l. c.,* pag. 147,
pensa afirmativamente.
pm . Ä Ö L F ' T O Ñ ::■&J H E R I Ñ G: r
-
em ségtmdo^
k *3045
(304) Lembraremos ás idéias tão eonhecidas píelos romanos sobre as mulheres sent
dóte. Vejarse, por exempio, P l a u t ., Trinum, III, '2 , 6 4 ... i n f a m is ne s i m . . . in
c o n cu b ira tu m sic s in e ’ d o te d e d isse m agis quam in m a tr im o n iu m . Sucedia às vezes,,
quê o Senado constituía um dote, no tesouro público, em favoi; das filhas dos cidadãos
pobres* que s e haviam distinguido por Seus feitos, Val. Max., 4,10.
(305) Cícero, pro. F la ç c o , c . 34.
V
■M
%■
4L
&2.-&àT'
III SgCÇÃQ. Aspecto exterior das relações ,de fam ilia env
sua vida íntim a. * *
Fim e sentido da p a tr ia p o t i s t a s na f a m i l i a . A paznc>lar romano.
— Vida familiar. — Condição da mulher e dos filhos. — Tribunal dê
familia. 4?
.
Q u a n to la tiu s o fficio ru in ; qvqrrißiii-
ris p a te t re g u la . Quarrt? m u lta p i& ß £
h u m a n ita s, líb e ra lita s, ju s ti ti a , fid é s
e x ig u n t, quce o m n ia e x tr a p u b lica s t u -
b u la s s u n t.
# Séwteca de ira, n , 27.
(307) L. 16 dc furt. (47,2). Ne cum flio familias patcf furti agere possit, non
juris constitute, sed natura rei impedimento est, quod NOV MAGIS CUM HIS, QVOS
IN POTESTATE HABEMUS, QUAM NOB1SCUM AGERE POSSUMUS.
(308) S eneca , -de benef., 3, 11.
^ (309) C íc e r o , de Senect. 11. Quatuor robustos filios, quinqué filias, tantam
domum, tantas clientelas Appius regebat et SENEX et CJECUS... Jenebat non modo
auctoriiatem, sed etiam imperium in suos, metuebant servi, verebantur liberi, carum
omnes habebant; vigebat-Ulla in domo patrius most et disciplina.
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMÀNO 135
<314) Totaque dojnus, quee espèctdt ih nos neqiie aliúd habere potest perfugium.
(315) Era possível*/em Roma, iima ação do filho em ancipado; á lógica' exigiu
conccdê-la- sem restrições, mas os sentimentos de piedade e de.conveniência fôram mais
fortes, em Roma, qué ia própria lógica. As ações contra os pais precisavam a autoria
zaçãò expressa do pretor, L. 4, § 1, L. 6-8, pr. de in jüs voc. (2,4) ; c ainda quando
os filhos tivessem algum motivo de queixa, ou de ressentimento, não tihham a cer
teza de- serem atendidos, porque os romanos. prèferiam ver os filhos, sofrer uma-injus
tiça, por parte dos pais, que a estes citados perante a justiça, a pã** ser por motivos
imperiosos.
(316) Por parte dos juristas, habituados a se aterem às abstrações do dircitó, não
é de'extranhar; m as. os filósofos e as filólogos deveriam antes* ver ?a verdade. Nada
mais errôneo, por exemplo, que se diga como H egel, P hilos. Çpltosrofia da História),
O ESPÍRITO DO -DIREITO R flA ^ ÍO 137
'- i r
S
consultos, nas apreciações.sobre a vida dá*família rom ana. A
p rió ri, negou-se que a sirríulação da patria potestas e dá manas
^ocultassem uma figura hum ana. Certamente, se se fundaste a
<^pinião únicamente, no carater e na conduta pública do povo ro
m ana, sobre a. sua impiedade para com os inimigos e povos do-,
.-¿sobre;a su á fa lta de consideração nas relações civis, etc.,
^ispensár-se-ia de examinar a questão de saber se disso se podé
éoncluir,-razoavelmente, a existência dò direito de fam ília, a-de
um a suave pida doméstica. Mas, é um fenômeno frequentevbem
conhecido, qpü as naturezas fortes são as que sabem reunir dois
aspectos distintos: um, enérgico, áspero, rude, que m ostram ao
m úúdo exterior, e outro, terno e sentimental, que resfrvam para
as relações dé intimidade, ou, o que é o mesmo, uma rude, apa
rência envolvendo umá intenção cheia de doçura! O^sentimen-
to se esconde por trás das recónditas dobras da vida^de^fami liá,
à m edida que encontra exteriorm ente menos oportuniàade dé se
m anifestar. Esta compreensão do sentimento é, precisam ènte,
que lhe dá, a miude, no pequeno espaço em que se encontra re
fugiado, ,/uma intimidade, um a intensidade, um a surpreendente
delicadeza de expressão, que inútilm ente se ençontra entre esáas
naturezab em que o sentimento se manifeste.
O romano, exteriormente, isto é, na vida dos negócios e na
vida política, e o romano no recèsso do lar, são homens com
piei amen te;>diferen tes • Exteriorm ente, não conhecia a piedade;
o seu,"egoismo seguia, sem consideração, o caminho que se tra-
çára. Mas, no lar, vê-lo-emos, sob um aspecto reconciliador,
restabelecendo, vitoriosameñte, o equilíbrio m oral com- outros
povos, por exemplo, com os grêgos.
Manter a união comum dos meínbros da fam ília, salva'-
'guardar èsse laço,de união, eis o que constituiu, na.antiguidade,
a ação fundamental do caráter romano (317) . Vimos,, na cons
tituição da geiitilidade, descrita no volume precedente, que esta
idéia era um princípio essêncial do direito público^ Não se
2.a od., pag. 348: “Na vida dos grêgos, o amor e os laços de fam ilia tinham exigências.
A grosseria selvagem das origens da vida romana, exclunido os sentimentos de
naturaci moralidade, faz nascer a rudêsa que nelsL reina na<s relações de família, rudêsa
agoística, de futuro, o carater fundamental dos uso« e das leis de R o m a ...” E na
pagina 350: “assim são desnaturados e pervertidos os princípios fundamentais, da mo
ralidade” Análogas observações se encontram nos filósofos. R úpperti , H a n d b u c h d e r
R õ m . A l t e r t h ü m e r , ( M a n u a l d e a n t i g u i d a d e s r o m a n a s ) i l .a parte, pag. 270, diz: “A vida
da família era impotente para despertar e reanimar a delicadesa dos sentimentos,
p o r q u e o la ç o d e l ic a d o do a m o r n ã o u n i á o s m e m b r o s d a f a m l l i a : { \ ) o pai era o
d o m i n u s ; o senhor de sua casa” Compreende-se esta opinião, conhecendo a incoe
rência' deste autor. Mas quando um observador profundo e conhecedor exato da an
tiguidade romana',como Re in (ná 2.a edição de Gaio , de B ecker, tomo II, pag. 47Ó),
não se pode desprender desse habitual prejuizo quanto à p a t r i a p o t e s t a s , prova quanto
èsse prejuizo está^ enraizado.
(317) A vida em cojnum,^ em uma só casa, mencionada por Val. Max., 4, 4, 8,
<e o mais belo exemplo ?■
138 S íP ÍS ô Ì, F VON J H E R I N G
£ *
póde conceber êrro mais grosseiro, qne o de falar, como já dis-
sfemos, da indiferença" dos romanos pela fam ilia, de sua as'piß-
reza, nas relações domésticas! E issò se dizia de Roma, onde à
fäiiiilia era, precisamente, considerada como a síntese de tpda
a' existência moral, e onde a saída do membro de urna familia,,
para^fazer parte de outra, implicava num a capitis deminutio?
ÌEèi Boma, onde os usos asseguravam aos pais uma influência da
qual nós, que com tanto agrado enaltecemos a satisfação de
nossa vida privada, nem ao menos delatem os um ajrem ota idéia f
Mas, diz-se, faltava, na família rom anàf'o elemento do amor!
Como se á organização, na época mais rem ota, não tivesse por
base o afeto, a felicidade, em uma palavra, o amor; como se,
depois de tudo isso, o amor se devesse demonstrar nas leis! Fi-
xando-nos nelas, é claro que não se póde encontrar traços de
atppr no sistema de que tratamos agora (quce omnia, como disse
SÉÑECA,‘na passágem que nos serviu de epigrafe, extra publica
tabula suntffy as leis não se atêm sómente à pessoa abstrata.
ainda que seja uma questão de direito, a continuidade das
r^ças e ä coesão da família, o principal objetivo dêsse direito
consiste em expór, em toda a sua pureza, a personalidade ato
mistica, entregue exclusivamente a si mesma, não com ò fim de
povoar o m qndo romano de abstrações que lhe conduzisse, ime
diatamente, a prejuízos, mas para entregar à livre ação do espí
rito moral, o que a legislação, por si só, não podia' conseguir.
São, pois, aos, usos que se deve consultar. Ora, se se nos
perguntasse como era organizada a-fam ília, poderíamos respon-
sem recèio, com o que sabemos da época antiga, e mesmo
^quando aquelas fontes não pudéssem responder, bastaria a obser-
^vação de que se desenvolveu perfei tarnen te pura e ao abrigo da
c rític a / A fam ília é a escola moral do indivíduo, dos esposos e
dos filhos e, por isso mesmo, a fonte em que o espirito e a força
moral do povo vêm se retem perando. Se a fonte está envene
nada, traiísmite, irremediavelmente, o virus a todo o organismo;
mas j^e esta é sã, póde-se deduzir que a família, também, será
sã e p u ra. E^ar correlação, entre a m oralidade nacional e a fa
mília, é evidente na aiitiga Roma. A m aior parte de suas^
primitivas virtudes, — economia, simplicidade, amòr à órdem,.
castidade, fideldade —, têm precisamente, relação íntima com a
vida doméstica, e encontram, na família, a sua causa moral, 0 =
sep ponto de partida, ó seu meio revivecente.
Mas, não era possível, objetar-nos-ão, que, em vês de ser 318
(318) O escrito acima citado (nota 295), de L aboulaye, Investigações sobre a con
dição civü e politica das mulheres, Paris, 1842, foi inspirado sob a influência da
Idéia jurídica abstrata, e comprás-nos poder provar que a opnião já acima desenvol
vida, exerceu uma influência decisiva em outra nova obra francesa sobre a mesma
matéria, a de P aul G ide (nòta 295), que merece um lugar de destaque, ao lado de
L aboulaye .
O E S P Í R I T O DO- D IR E IT O ROJÈ^AggJÕ
•* # 1
um esposo leal e um b o m b a i, o chefe da fam ília rom ana fòsse
um tirano doméstico que inspirasse terror, e que, nêsse único
aspecto, a franqueza' e a alègria do lar se dèsvanecessem; que„
com mão de ferro, a opressão, por um lado, e a obediência céga
por, outro, dominassem sempre, afugentando o am or e tudo o quç^
corittitúi o encanto da fam ília, a confiança, a intim idade, á cal
ma, a simplicidade e a doçura das relações privadas. Com efei
to* a tristè experiência confirm a que essa imágem do tirano do
méstico se apresenta a quem lê as exposições abstratas que d a
direito da fam ília rom ano se escreveram, tais como ainda estão
em voga (318) . Vejamos se à essa imágem podemos opor outra,-
que seja menos repugnante. Figuremos, desde logo,*"a situação
da m ulher romana, na fam ília e na sociedade. Se o homem
fosse o déspota que se nos pinta, a condição da m ulher seria,,
não a de um a esposa, mas, como no Oriente, a de um a escra^ja,.
ou, como na Grécia, a de uma criada, ou concubina. Oraf eh*
verdade, a m ulher rom ana era a companheira de seù marido, na
m ais ampla acepção da palavra. Nenhum povo do m undo anti
go, sem excetuar o grêgo (319), deu à m ulher lugar tão honroso
na sociedade, como os rom anos. Duvidamos mesmo que, entre
os mais civilizados povos modernos, a m ulher goze de estima e*
rç^peito tão elevados, como na antiga Roma, em que estava sob<
a manus do marido e da tutela de seus parentes. A mulher, se
gundo a cohcepção dös romanos, era somente igual ao homem,
-sob o ponto de vista social (320), em oposição ao que se verifica
va éntre os outros povos anteriores aos romanos, mas gozava
mesmo de grande respeito e era considerada superior ao homem ^
O rigor que se tinha com o decorò, foi observado somente áji^
consideração às m ulheres (321)> porque foi por elas inspira
do (322*K A suscetibilidade que se m ostrava sobre este última*
#tám saneia* vincula non minus q u a m 'in -aliqúo* sacrato loco nudare se n efa s'esse ere-
%d^bc^ir. V. ainda ibld. 6, 1 ,8 : promissorum ma tri fam ilias nummorum gratia (stru-
.jjTösa mente) diem ad populum dixit eumque hoc uno crimine daipnado..
(823) O orientai exigia tariibém a castidade de sua éSposa, não pelo interesse
-desta, mas. pelo seu pròprio- interesse. Exigia-se, em Roma, em favor da mulher, a
-castidade e a sua perda considerava-se ainda mais grave que a da vida. Por isso, c
que Virginius matou a sua filha e o seu exemplo foi imitado. Veja-se, por ^templo,
V al. Max., 6, 1. 3, 6. Neste sentido é qué S éneca designa (fragm. XIII; 70, ed. Haase,
v o i. Ill, pag;. 43) a época antiga como um sèculum, quo iiiipudicitia monstrum erat,
(324.) Estátuas elevadas às mulheres, "veja-se P in ., H. Ñ . 34, 11, 13,' 14. Á so-
Jemnis post^nortei^audaiio. Trro L ivio , V, 50. S uetonio , Caes. 6. JPresença das mulheres
nas festas, nota. 219f e T ito L ivio , V, 31; XLV, 2. Convocação e deliberação das mulheres.
(325) 'Os romanos tinham a perfeita conci ência dessa predileção. Catão, senior,
a quem não se póde censurar -de' ênCüsiasta do sexo feminino, assim o declara» em suas
Origens (T ito L ivio , XXXIV, 5), com apoio numa série de exemplos. Nos debates sobre
a abrogação da lei Oppia (T ito L ivio , ib. 2-7), foi condenadò. a empreender a luta com
-sejqjS adversários, com armas tiradas de seus própriós árgumenots. P aulo Gide , nota,
cilÉ razão: “que essas heroinas da antiga Roma não são, como na Grécia, cortezãs, mas
virgens' púras, esposas fieis e mães cheias de abnegação, que juntam à. sua inviolabi
lidade a prática dos mais modestos ideveres e as mais humildes virtudes que cons
tituent a sua grandesa”
(3 2 6 ) P e t e r , . G e s e ll. Rõms. (História de Roma), to m o I, 148, d iz , c o m razão , que
essa le n d a a t e s t a o a l t o c o n c e i t o q u e t in h a m , o s . r o m a n o s d a d i g n i d a d e d a ^ . m u l h e r , c,
s o b re tu d o , a g ran d e c o n s id e r a ç ã o e a - in f lu ê n c ia q u e g o z a v a a m ã e (dtáf f a m í l i a .
CoaioLANo n ã o p o d i a d a r m a i o r p r o v a d o c u l t o à sua m ã e , s e n ã o r e c o n h e c e n d o , a lé m
.d e l a , o a m o r à p á t r i a . * * "
O ESPIRITO DO DIREITO ROMANO 14?
i
, m anas, quando já todos- os outros meios, para apaziguá-lo, fô-
jTam inúteisv Um dos acontecimentos mais importantes da Re
pública, ö acesso dos plebeus ao consulado, cujo cargo se ^dèii ã
’LìCÌnius Stola, teve por causa um motivo pessoal, õ dVorgullro
de suã jrnulher (327) . A memória dos dois Gracòs é inseparàvél
da de juta mãe, que os edücou. Outro exemplo ,curióso da in-
jiu eñ eia que exerceu o sexo feminino* foi a obrigação da lei
•Ö^jpia (sôbré *0 luxo das mülheres) ; a própria autoridade de
•Gatão se quebrou com esta influência (328) ; E’ impossível epie
urii poyo, qüe colocava em semelhante lugar a mUlheT, pudéss%
pelo casamento, como no Oriente, Tazer <dela uma escrava. Em
'p a rte alguma, à influência da m ulher se .exèrceü, còrno no reces
so do lar. O respeito, que .se tinha pela mulhèr-, em considera
ção a seu sexo, era mais profundo ainda para a^ e s p o s te p a ra
a m ãe. Roma não podia, como se nos quer fazer erér, desco
nhecer o carater do matrimônio; mas, ao contrário, dêvia pêlte
ver um conceito mais digno e mais puro, que em nenhum outro
ip o v o . E assim era, efetivamente. Esqueçamos, por um^fristan-
*(e, o aspecto jurídico abstrato da relação; considçrémó-lo em sua
m anifestação exterior e ínátériàl, e evoquemos a idéia natural que
os próprios romanos lhe ligavam.. 0 çasánreníò cônstitüiá um a
relação sagrada; fundava uma comunhão religiosa éntre os dois
esposos* e, por êste, moitvo, recebia a consagração divina, logo
que era celebrado (329) . A èsse casamento antigo aplicava-se a
(327) T ito Livio, VI, 34. A tradição refere um facto análogo, de Xanaquilda, esr -
posa de Tarquinio, o velho. Tito Livio, I, 34. V. támbem a história de Tarqui*^,^*» :ü
Soberbo, Tito Livio, I, 46: initium turbándi omnia À F&MINA ortum est. Amte todos'*"
ésses factos,^ se se pensar que involuntariamente á questão chagou a ser proverbiai,
— onde está a mulher*
(328) Veja-se o alegre quadro da agitação idas mulheres, em Titó Livio, XXXIV,. 1.
Matronee nulla nee auctoritate nec verecundia. NEC IMPERIO VIRORVM contìneri .lim ine
poteranl; omnes vias urbis aditusque in forum obsidebant. . . etiam éxoppidis concilia-
bulisque conveniebant. Jam et cónsules preteeresque et alios magistratus adire et
rogare audébanU c. ^8__ aliquanto major frequentici mntierum ¡postero die sese in pii-
blioum effudit, uno que agmine omnes tribunorum januas; obsedèrunt, qui collegarum
rogationi intercedebant, nec ante abstiteruntf quam remissa intergessio ab, tribu n is-
essétt' Recomendamos a leitura da. passagem de. T ito Livio a tódos aquélés que se
compadecem da suposta opressão em que viveram, as mulheres de Róma. Bela/ pò-
der-se-ia tirar a consoladora convicção 'de que os rojnanps não podiam escapar; nó qüe
diz respeito ao poder material, do que nos ensina a disposição biblica: **e-êle será.
teu Senhor” . T ito L ivio, c . 3, diz, pela boca de C a tã o : recensete muliebria jura,
quibus omnibus constrictas vix tarnen continere potestis; c. 4 : ' simul lex rnodàyn
sum tibus uxoris tuse facere desierit, tu numquqm facies! Vejamrse também os con^
selhos aos homens casados e as indicações sobre a conduta com as mülheres, em P l a u to , "
Astir., I, 1, 73, 5, 2, 49; Ãulul., 3, 5, 14 a 62. Cie., Paraxf., 6, 2: Ule liber, cui tnulier
,imperat, cui leges imponit, preescribidit, jubet, vetat, e, sobré tudo, as palavras' atri
buidas a Catão por Plutarco (Reg. Apoph. Cato. 3), segundo ás quais ein. toda parte
eram òs homens que governavam as mulheres; mas: em Róma, qué domiiiávã o mundo
inteiro, as^mulheres èram as -que governavam os homens.
(329) ' Èsse carater religioso não se limitava somente à cónfarréaiid. Veja-se
a êste respeito^ R ossbach , i.[ sect IV, pags. 254/328.
142
(340) Não somente o indicam as expressões propinqui amici, cognati, etc., mas
.é evidente com relação ao tribunal da família, convocado pela mulher in manu, no quäl
não se podia omitir os parentes da linha desta, como agnados.
(341) Algumas vezes intervinham. as pessoas de alta hierarquia e -os parentes afas
tados; por exemplo. Augusto, no caso citado por Séneca- de ciem. 1, ,Í5. Val. Max.,
5, 9, mencionando um caso, em que até se chega a convocar uma grande parte do Se
nado. Também se convocavam os manumitidos da familia, L. 22, de his quae ut (34,9),
libertis patris. instantibus. Segundo Klenze (na Revista Zeitschr. für gesch., R. W .
YI,^pag. 31), o tribunal de família tomou fórma fixa, quando teve regras certas sobre
o ofício do juiz. Como se aí se tratasse de uma coisa fixa, ou de uma instituição
jurídica!
(342) Serão, inúteis os testemunhos em apoio déste facto. Consulte-se Klenze,
loc. ç i t tomo VI, pag. 25 e Geib, Gesch. . . (História do processo criminal emi Roma),
pag. 84*.
146 RUDOLF VON JHERING
<343), Sobre isto, há que se considerar mais de perto as relações da Tida, que a
questão puramente jurídica, para saber quem, em cada caso especial, tinha- direito
de exercer a jus necis ac-vitee, e o dever de reunir os parentes cm tribunal. Assim,
por exemplo, no caso citado por Cic. de fin ib ., 1, 7, o pai que tinha dado seus
filhos em adoção era quem pronunciava a sentença, em vês do possuidor casual da
potestas. Mais ainda, a mulher casada e os que dela dependiam se encontravam tam
bém sob a patria potestas (do pai desta, c por conseguinte fora da manus do marido;
sem dúvida, é provável que êste último convocasse mais frequentemente o tribunal,
7 que o primeiro.
(344) Não há dúvida que juridicamente não era obrigado a seguir seu conselho;
pôr em dúvida èsse ponto conduziria a um juizo errôneo dc toda a matéria; mas, ao
mesmo tempo, é notório que, em| regra geral, o julgamento dos parentes era que decidia,
de facto, toda a questão.
(345) Val. Max., 2, 9, 2. Os censores expulsaram do Senado um indivíduo que
omitiu essa norma. Por issò, nó caso citado por Plauto (Stichus, I» 2, 71), o pai
que queria, em virtude de sua patria potestas, dissolver o casamento de sua filha, de
clarava: m iht AUCTOKES ITA SUNT AMICI, ut vos hiñe abducam domum.
(346) Cic. ad Quint. 2, 6. Appian, bell, civ ., 4, 30. T ito L ivio , II, 3G.
(347) Exerciam singularmente «ua vigilancia sobre o tutor, e faziam por meio
do act. suspecti tutoris a proposta do encargo; evitando assim ao Estado o trabalho
de se ocupar disso, propondo, no interesse do filho do osbanjador, o estabelecimento
da curay prodigi, etc.
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 147
RERTATIS -INFRINGINTUR. W ihl. Sellh, Die L e h re ... (Teoria das condições impos
sív eis), pag. 139 a. V. L. 1 de bon., lib . (38,2), uma exceção para os manumitiidoa
«obre o patrão.
(359) Por Antonio Pio. V. Capito! in vita'A n t. P ie., 8. A generalidade da
proibição foi abolida nòvamente por Justiniano, que restabeleceu assim o direito an
tigo, segundo o qual era o carater da ação, imposta ao herdeiro, quey decidia da va
lidade dos legados. A opinião de que Antonio não «omente extendeu e até criu essa
proibição, é errônea; Sabinus já a conhecia, § 36, I« de leg. (2,20 ) .
(360) L. 134, p. de V. O.. (45,1). Inhonestum visum est vinculo peense m atri
m onia ob string i sive futura sine jam contracta. L. 2. Cod. de inut stip. (8, 39).
Libera m atrimonia esse antiquitus placuit. L. 14.. Cod. de nupt. (5,4). L. 19. L .
71, § 1, de V. O. (45,1).
(361) A confirmação indireta para as arras foi possível, dias é preciso não vêr
nela uma exceção; a eficácia dêsse meio não reclama a intenção da ação. L. 38, p .
de R. N. (23,2). I sidor. Orig. IX, 8, § 4, 5.
(362) Com relação ao pai, pode invocar-se o testemunho de Y arrão, de L. L . VI«
§ 72; porém, mais adiante, veremos como era frágil a sua autonomia, nesta matéria.
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 153
(363) L . 2 de epon. (23,1)* tJÍp. Sponsalia dicta sunt a sp oadendo, nam m oris
j n it veteribus stipili ari et spondere sibi uxores futuras. V arrão de L . L . IV, 7 0 .
.Em P lauto estafé a forma regular; veja-se, por exemplo, Aul., II 2, 78, em cuja pas-
ságem e estipulação compreende também ilice leges cum illa dote, quam tibi d'ixi. Se
èsse acúmulo de convenções de interesse pecuniário e de promessas pessoais- era a
regra geral na v*dà comum, explica-se, pela fórma mais simples, como pôde nascer
a idéia (v ., por exemplo, P lauto, Aul. IV, 10, 6 3 : ut leges jubent. P lutarco , Cato
m in. 7 ) , de que os esponsais tinham uma força obrigatória. Mas, concluir disto que
na vida ordinária se serviam da estipulação para terminar na existência de uma
ação, é um êrro. A circunstância que Amobius menciona da estipulação, demonstra-o
(ad. gent., IV, 2 0 : habent speratas, habent pactas, habent INTERPOSITIS STIPULA-
T IONIBUS sponsas) . Está, pois, fóra de dúvida que, em seu tempo, nenhuma das
«stipulações sobre esponsais dava lugar a uma ação. L . 134, pr. de V . O. ( 4 5 ,1 ) /
(364) I sidoro, IX, 8, 3, parte igualmente da idéia de que a spondere fundava
mina obrigação jurídica, que se refere aos esposos e toma sponsores por sponsus (§ 6 ).
(365) Ge l l iu s , IV, 4, § 3 .
(366) V . M . V oigt, Do direito natural, II, p a g . 234 s .
(367) No que diz respeito aos outros motivos invocados em favôr da tese que
•combatemos, quando se saiba o que os romanos entendiam por fides (referimo-nos aos
fideicommissa, isto é, às disposições deixadas aos fóros da conciência e, por conse
qüência«, não obrigatórias em direito) ver-se-á, na passágem de F estu s — consponsos
■untiqui dicebant' fide mutua colligatos — a indicação exata do carater puramente moral
-dn relação. Mas dificilmente se compreende como um recente historiador do direito,
-de grande nomeada, pôde encontrar na fides mutua o indício das estipulações recí
procas. Não eram necessárias, no direito antigo, exceções contra uma suposta act.
ex sponsu, comò contra qualquer outra ação sem valôr ipso jure. E* verdade que
P aulo , na L. 134, p . ide V. O. (45,1), garante ao pai uma exceptio para a resolução
na justiça da pena convencionada. Mas é, como se sabe, inexato que uma estipulação
rS4 RUDOLF VON JHBRING
contra bonos moras (que c uma das que P aulo admite aqui) somente póde ser inva
lidada por èsse meio. (Suposição da qual resultaria que essa estipulação nunca po
deria existir no direito antigo. Gaio, IV, § 108). Em regra geral, era declarada d i
retamente nula. (Vèja-se. um exemplo» em matéria de matrimônio, na L. 19 ib id ).
Difícilmente póde admitir-se que o direito antigo, que não conhecia exceções, de
clarasse válidas todas as estipulaçõcs de uma pena convencional, sem distinção de
sua tendência.
(368) Ambulatoria est voluntas defuncti usque ad vitee supremum exitum . L.
4 de adm. leg. (34,4).
(369) L. 34, Cod. de transact. (2,4). L. 4, Cod. de inut. :;tigs.~ (8 ,3 9 ). L..
15, Cod. de pact. (2,3), LIBERTATEM testamenti faciendi. L. 61 de V. O. (45,1).
L. 17 p. ad. se. Tribell. (36,1) L. lã, § 1, ad. leg. Falc. (35,2). L. 5, Cdd. de pact,
cónv. (5,14). Constituição de uma sociedade com èsse fim: L. 52, § 9, pro soci
(17,2). Os contratos, segundo os quais algueni sé obriga de antemão a aceitar uma
sucessão futura, ou a renunciá-la, são igualmente nulos. L. 4. Cod. leg. (38,16); mas
a idéia de que a liberdade da resolução do herdeiro de inut. stip. (8,39). L. 3, Cod.
de co-llat. (6,20). L. 16 de suis et leg. (38,16); mas a idéia de que a liberdade da
resolução do herdeiro não podia ser entabulada,, era o motivo decisivo dessa nulidade?'
Não o sustentaremos nunca, mas há, além disso, outro motivo. V o i..4.°, § 63.
(370) Póde citar-se o que diz respeito à pòsse. V. L. 12 de precar. (43,26):
Cum. precario aliquid datur, si convenit, ut in Calendas. Julias precario fossideat,
numquid exceptione adjuuandus est, ne ante ei possessio auferatur? SED NULLA VIS
EST IiUJlS CONVENTIONIS, ut rem alienam domino invito possidere licet. Eis^
a conseqüência do raciocinio: a pòsse contém o direito de excluir qualquer um;,
tal é a liberdade que tem a pòsse; por conseguinte, um pacto em que se renuncia essa
liberdade, é nulo do xponto de vista da pòsse. L. 2, § 2 ibdi.
O ESPIRITO DO DIREITO ROMANO 155.
(372) Não pôde ser causa a hipoteca no antigo direito, porque a fiducia contem
uma transferência de propriedade; e o antigo pignus, que era um gravame sobre a
propriedade, dificilmente poderia encontrar-se. na propriedade das terras. Seria melhor
citar-se a subsignaiio tios fundos e o mrarium, por parte dos devedores <do Estado.
&ACHOFBX, Pfandrecht, tomo I, p a g .. 217 s .
(373) A respeito da duração, existe uma diferença, fundada na durabilidade
diversa - dos preedia rustica e urbana. Em ambos os casos, a extinção do prédio
dominante, por exemplo, o incêndio da casa, acarreta, como conseqüência, a extinção
da servidão, arg. L. 20, § 2 de S. P . ü . (3,2). Se se quizer dar à servidão de uma
caísa uma seru. altius non toll., uma existência independente da destruição da casa,
é necessário estabelecê-là 6Ôbre o solum, em vês de agregá-la à superfícies (L. 3
de serv. (3,1), e, ao contrário, podia atingir a superficies uma servüdão, porque pela
regra gerai pertencia ao- solum (L. 13, p . de S. P . R ., (3,31), por exemplo, uma servidão
de passágem. A conseqüência disso era que a servidão cessava com a extinção da
casa. Se não se estipulou o que as partes quizeram fazer (por exemplo, o possuidor
de uma casa abria um caminho pelo jardim visiñho: a serviéão respectiva, pertencia
ao solum, ou à superficies?), presumia-se, segundo as circunstâncias, tanto num caso
como noutro, e a prática administra certas regras, estabelecendo a classificação das
servidões possíveis, que atualmente também temos com- o nome de seroitutes
prcediorum et urbanorum. Tal era, ao nosso vêr, o fim prático désta distinção.
O mesmo sucedia, quando era constituida uma destas servidões, sem que se indicasse
sé pertenceria^ dum modo absoluto, a quem tinha o direito (como servidão pesoal),
ou somente na qualidade de proprietário 'do prédio, decidindo-se, quasi sempre, os
romanos por esta última presunção. Atribuímos a- razão disto, a que a divisão da
servidão se apoia numa necessidade prática, que se manifesta em toda parte. Não
é este o momento de entrar em maiores detalhes, m as pedimos a todos que queiram
comprovar a nossa opinião, que não esqueçam as conseqüências da teoria romana sobre
bs servidões, ou seja que a S. P. U. deve .cessar com o praed. urbanum e que
estabelecer essa S. P. U ., entre os romanos - eqüivalia limitá-la à (duração de um
edifício.
Entre nós, a conseqüência de que com a casa deve desaparecer também, a ser-
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 157
vidão, -que lhe é inerente, passou à prática^ na dúvida, todas as servidões são tra
tadas como S'. P. Rust, e só temos S. P, Urb.« onde se possa comprovar que a»
partes quizeram estabelecer a servidão para uni determinado edifício, durante todo
tempo que exista. A atual jurisprudência, segundo ent.ende a distinção de S. P-
Urb. e S. P. Rust., não teria nenhuma expressão para designar uma semelhante
6ervidão.
(374) L. 56 de usup. (7 ,1 )... proprietas inutilis semper abscente usafructu
esset futura.
158 RUDOLF VON J HERI N. G
prédios) (375) . Êstes são os dados que a prática fixa como ob
jeto possível das servidões (376) .
Os progressos realizados, sem dúvida, nessas relações, afetam
m ais especialmente, em sua origem, os çasos de uma necessida
de propriam ente dita, (servidões de vigilância e de escoamento
dáguas) ; mais tarde, a servidão extèndeu-se, à medida desta ne
cessidade, com mais amplitude.
D urante séculos, a servidão foi a única instituição que per
m itiu ao proprietário romano lim itar a liberdade de sua pro
priedade. Somente no bom direito é que a linguágem expressa
um estado dé liberdade de cousa (servit pradium, serititus), e
na extinção da servidão menciona o restabelecimento da liber-
dade (usucapió libertatis, prcedium liberum ). A faculdade de
dispor, do proprietário, estava encerrada em limites tão estrei
tos, que a propriedade não se via ameaçada de nenhum dano
sério. Finalmente, o proprietário não tinha poder sobre a ver
dadeira liberdade da propriedade; podia mesmo abrigar-se e
arruinar-se, mas não arruinar a propriedade, nem a do futuro
proprietário. 0 ‘direito que tinha de dispor, por testamento,, li
mitava-se, únicamente, à relação do proprietário com-a proprie
dade. Podia legar seu direito, se quizesse, e, nesse ponto, era
completamente livre; mas fora do estabelecimento de servidões,
não podia diminuir o valor absoluto da propriedade. O herdei
ro recebia a propriedade livre; o seu direito ficava intacto (377).
Resumindo o que precede, únicamente numa proposição, eis
em que sentido os romanos conceberam a idéia da liberdade e
a aplicação a suas diversas instituições:
A liberdade, como condição do desenvolvimento moral, é,
para o homem, uma lei suprema, um bem que não pôde juridi
camente diminuir, nem para si, nem para seus sucessores.
(375) Podia-se renunciar por deductio a essas condições, pelo menos a primeira c
a terceira, no estabelecimento das servidões prediais, consideração que confirma a
que antecede. Com efeito, nesse caso não se fazia um pacto entre visinho-s, mas o
proprietário, em virtude de seu direito, impunha unilateralmente restrições à coisa,
com as quais passava a mão<s extranhas. Èsse caso é de uma lex rei suee dieta.
Veja-se sôbre éste caso, as explicações de J h er in g , em sua Revista, tomo X, pags. 549-554.
(376) E . Zaçhariae v . L in g en th a l , Ueber die Untersch.. (Sobre as distinções
das servidões prediais e rurais). R. E lvers, Die S ervit. (Teoria das servidões)
tomo I, pags. 1-16, e neste trabalho, voi. IV, § 70.
(377) Assim, o testador podia tirar-lhe o direito dc vender a coisa (L. 114,
§ 14 de leg. (í,30): talem legem testamento non possunt dicere), de manumitir o
escravo (L. 61, § 4, de man. test.. (40,4) e dc que cessasse uma indivisão.
y SECÇÃO. — A questão social e o Estado.
(379) Vejii-se, sobré éste ponto, por exemplo, Böckh, Staatshaushaltung.. . (Eco
nomía politica dos atiehses), tomo I, livro 1, § 15. ~
(380) B ö c k h , I. demonstrou-o a Grécia. Em Athenas, onde o meditane
custava um dracma, no tempo de Solon, ‘elevou-se, de repente, a 16. Para Roma,
C.. T L . S c h u l t z , Grundlegung.. (Idéias fundam entais . da história do direito pú
blico de Romfl), pag. 502 e s., sustentou o contrário', nías sem razão pelo qué diz
respeito à época antiga. E’ certo que mais. tarde, à medida' que Roma dilatou seu
impèrio e que, por isto mesmo, o- comércio de cereais ganhou em firmeza, exterior
mente, e cm extensão geográfica, se estabeleceu um equilíbrio exterior de preços; mas,
ainda nessa época a história menciona flutuações de preços altos. No ano de 544,
segundo P o l ib io , Reliq. 9 , 44, o medimke (6 m odii) do grão de Sicilia custava, ém
Roma, 15 dinheiros. O modius, qtie d esd e'o inicio, vália' 16 asses, custava 40 asses.
Seis anos-imds tarde, o mercádo de Roma era tão abarrotado ( T ito L iv io , XXX, 38),
que, pelos fretes, se entregava aos hoteleiros, a carga. O preço pelo qual >Sicilia '
devia entregar o grão aos romanos, era de 3 a 4 sextercios pelo m odius. Na dis
tribuição pública de trigo, dava-se o modius ,por um as e mesmo mais barato^ (ve
ja-se mais adiante). C'ic., de o ff., II, 17, conta que um edil, C. Sejus, manteve
èsse preço numa crise, e não sofreu, por isso, grandes pèrdas. No ano 314, chegou
o preço, por circunstâncias especiais ( T it o L iv io , IV, 12, 16) do mercado, durante três
dias consecutivos, a baixar até a um as ( P l í n i o , Hist. nat.18,4). Um caso.
análogo tornou-se a apresentar mais tarde. Vejá-se Niebuhr, Röm. G. (História ro
mana), tomo I, 4.a ed., pag.' 483. A baixa de preços externos de cereais, na Prussia,
em 1815 a 1860, foi de 1 á 4, c isto por uma só espécie de frutos.
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO 163
(381) P l in ., H ist. nat., 18, 4, assinala a sua influência nociva sob êste aspecto,
.■latifundio, singuiorum arcentium uicinos. E nào. é surpreendente que disso resulte
u m estado quasi equivalente a da proibição. T ito L ivio , II, 34, caritas annonae EX
JNCVLTIS per secessionem AGRIS, famZs deinde, QUALIS CLAUSIS FORET.
(382) X ito L ivio . IV, 4, 12. . . regno propebper largitionis dulcedinem in cervices
<acepto. Tal era, também, a intenção de Coriolàno . T ito L ivio , II, 34: Si annonam
meterem volimi, jas pristinum feddant Patribus. Para compreertdcr a resignação e a
apatia politica que, às vêses, manifestava a plebe, é preciso não perder de vista a
influência dêsse meio de opressão.
(383) T ito L ivio , 8 , II, 12, 16. O mesmo sucedeu em outras circunstâncias, por
exemplo, com Sp. Cassius, Mr. Manlius. Não eram as tendências políticas que mo
tivavam essa explosão de ódio,’ mas as ambições sociais e bs prejuízos materiais des
prendidos de suas inovações. Acreditava-se estar o Estado ameaçado, quando o in
teresses materiais eram os únicos que estavam em jogo.
(384) Ainda atualmente se encontra essa relação na cultura da vinha, com a
•diferença de que as causas que aqui dão ao grande produtor uma preponderância
importante sobre o pequeno, tem sua basq, não nass relações exteriores, mas em a
natureza dá cultura ‘d a videira e do comércio do vinho.
(385) Veja-se, por exemplo, T ito L ivio , VI, 32: Parvo intervallo ad respirandum
■debitoribus dato, postquam quieta res ab hostibus erant, celebrari de integro ju ris-
,dictio et tantum abesse spes. veteris lev ondi foenoris, ut tributo novum fxnus
•iontraJieretur.
grande proprietária sobre, o pequeno: a de que, o
prim eiro, era o único qué-podia evitar a concurrencia do según-
sdo, I m p ^ i n d o ^ coinpletaniénte^ de participar das vãntá-
gètj^ áp qgçfi pà b licm . Mà^, independents
giö, a prepóriderancia jâ era muito sensível p ara explicar o fació
c ó rS ^ d ó , d e q u e a ;p ) ^ ^ não se . podia m a n te r
a© *l a d o d a ^ á ^ d ^ p ó r q d e . por ser absorvida (^8é) : ,O
paliativo q n é a ^ introduzir, foi insuficiénteí por
que as cousas chegaram a um à situação, erti que não haviá rem e
dio^ Jòssíyel; p a ra debelar o mal.. Nao hayia outro meid de
evitar a . catástrofe senão a proibição de cultivar com o auxilio
dos escravos, m as èsse meio e ia im praticável ; fora preciso, p a ra
isso, abolir a pròpria escravidão.' A disposição da lei, que pres-
creviá o emprego de certo núm ero de pessoas Jivres, em concur-
rência com os escravos, veio oferecer algum a utilidade, assegu
rando^ pelo menos, trabalho a um a p a rte do proletariado dos
campos, e tornou mais operosa a adm inistração dos grandes do
m inios. Dominou, dêase mòdo, se bem^què ligeiramentê, a pte?-
pqúdêrahcia^ dd 8 grandes ^proprietários, em cóncurrênciâ}éóiñ¿ a.
pequena «pri>priedäde.-- Mas, repetim os, não destruía .completa
m ente ó m al. O cultivo^ coni a ajü d a dos escravos, conservava
sem pre a d upla vantàgem, que riinguém pódia equiribrar: —- o
menor: preço d a mão de. obra, e, consequentemente, da produ
ção; circunstância què áe tornou patente" e à que se atribuiu a
m aior im portância; porqué um a gueijra lançaria a desordem
.entre os peqúèpôs lavradõres^m as não alteraria sensivelmente ó
cultivo dos grandes proprietários (*387) . Pouco importava, p ara
ô pònto capital da! questão, qué a L e x Licinia estabVÌecfe$se o
máximo^ de propriedade territorial (500 jugeras) e do rébanho
(100 cabeças de gado grande e 500 do p equeno). Sem elhante
proprçdade. já constituía um grande patrim ônio, ño sentido que
lhe damos (388>; a sua extensão, além desses limites, não. aum en
taria as^consequências, não; podendo,; afinal d e contas, a m edida
aproveitar senão às grandes propriedades. Além dissó, o ex-
cedènte das terras vendidas, ein ; pequenos lotes, aos pobres, se
gundo a lei acim a declarada, devia dividir-se novamente em
grandes porções de 500 júgeraji., A um etnar o número de gran-
des proprietários, im pelir os ireos, em benefício das classes me
nos abastadas, colocar, sua fortuna em bèns de raiz, tais foram ,
em conclusão. Os únicos resultados que òbfivéra a Lex Ltçinial
(3JT6) P l i n i o , H. N'., 18 7. A ppian, 1,-7; Veja-se em Cic-, de off., 2, 21, as palavras dbs>
tribunos : n o n e ss e in c iu ita te d u o m i l i á h o m i um q u i rem h a b e r e h t. T ito L iv io , VII,
.22: s ó lu tio eeris a lie n i m u lta r u m r erù m m u lta o e r u n t d o m in o s .
(387) N'a Idade Média, a relação era precisamente em sentido inverso. O' grande
proprietário^ què tinha- sobre si todos es encargos, da guerra, seria arimi nado pelo
pequeno, se não se houvesse réstabelecido, por outros meios, o equilibrio.
(388) Cultivado por escravos. A medida normal da pequena propriedade, era;
homo é sabido, de 7 jugeras, e aia época màis antiga, de 2 .sómente.
O ÊSPíRÍTajy<y ^R isrfò ROMÀNO 165
(389) A p p i a n ., 1, 8.
(390) Sobre os diferente^ sistemas de airendamento qué existiam ha época da
República«' veja-se *K. AV. N itzsch , Die Gracchen. . . (Os Gregos e seit precedentes
Imediatos),: Berlim, 1847, pags. 188-190. ^
(391) . Os. romanos-não eram partidários do arrendamento. Veja-se, por exemplo,
C olumela , I, 7, que iião o queria assinalar seiião excepcioniBfliente e apenas em con
dições especiais.
(392) T ito L ivio , II, 4 2 ... malignitate palriini, qüi m ilitem preèda fraudavere.
fóde-se lêr em T ito L ivio , XLII, 32, como esta fonte de lucro era abundante: quia
Jocupletes videbant, etc., e 10, 25: mihi cordi est ut omites locupletes reducam.
ífô ^ HÚDOLP VON J H ERING
respondiendo à pergunta: quid fenerctri? por esta ... outra: quid hominem occídere?
Havia certos assuntos em que as corporações pretendiam ter sido fundados por Nuna.
Plutarco, Num«, c. 71. Huschke, V e rf... (Constituição de Servius Tullius), pag. 149,
«* s. Th. Mommsen, de coíicgiis et sodaliciis Romanorum, Kil., 1843, pag. 37 e s.
Disso se pôde deduzir a ansiedade dessas corporações, mas não a exatidão da origem.
As centúrias de artesãos 'da Constituição Servia (Tibicines, Cornicines, Fabri), não
eram corporações- de operários, mas correspondiam a nossas associações de artesãos
atuais e não a bandas de música militares, como indica o fim militar dessa Constituição.
(394) V Gaio , de B ecker , t. 2 e 3, ed. Rien. V. em P etronio , Satiricon, c. 38,
uma fina ironia dirigida contra èsse estado (de coisas :Nec est, quod putes, ilium
quidquam emere, omnia domi nascuntur, etc.
liraeàr a facilidade de uma vida efe ócios j)ela posição hum ilde
:güe lhe cria va semelhante condição. > —
.^ ^ e m p r^ : se íreçeiava à transição dum gráu social elevado a
yowírò inferior* vÀtua:lmentev o nobre; empobrecido julga mais.
?digno yegètar como proletário aristocrata* que *sç dedicar,: comò
cla$Se média, ao tr á b a lh o ^ ^
dfridüós que,^O Tper^^ bòh f amílta, pfeferem a vidá de
hõ^hêMio à existência de artesão. O mésmo acontecia- nã antiga
JRoima.
J?ara qualquer lado que o hom em livre se dirigisse, em bus
ca de trabalho, encontrava ó mesmo inimigo hereditário — o es
cravo., Encontrava-o na m arinha (395), no comércio (396), na or
ganização de impostos (397398), até mesmo nos empregos iiiferiores
da adm inistração do Estado, o u -d a copníunidade (servi publici)
(39* ). A todas estas causas favoráveis â suprem acia do trabalho
barato dos escravos , e dós irabalhádòres livres, é preciso acres
centar o u tra circunstância da, inferioridade destes últimos. Se
gundo os princípios de direito antigo, era lícito adquirir pór in
termédio de. pessoas subordiniadas de sua fam ília, más não pela
m ediáção de pessoas livres. Resultava disto* que. em todas as rela
ções que exigiam a*conclusão de atos jurídicos, por meio d e ln te r-
médiáriós^ a emprego do escrava tinha a preferência, por sua
própria .qualidade de escravo Podia-se obter o mesmo resul
tado com um\ subterfúgio; mas, a via direta apresentava, não
somente a yaiitágem de simplicidade, como, também, de grande
certeza, Á subrogàção do direito adquirido, por um interm e
diário livre, exigia um ato de própria vontade déste último, que
podia, po r conseqüência, ser retardado, rêcusádo ou impossível,
etc. A intervenção do escravo fazia-se em virtude dúm ato pró
prio. A ,intervenção dó homem liv re „era um direito.de dispor
daquilo que adquiria; o escravo, no entanto, não adquiria ne
nhum direito .
Assim, pois, até nó terreno do direito, o homem livre su
cumbi ã na luta, pela concurrência do escravo!
Resultava, assim, que na antiga Romà sé tornava impossi-
(395) Não sóméntè se Jevàyani os escravos como marinheiros (ainda que para os.
berços, de guerra. T ito L ivio , XXIX, 11, XXVI, 35), nías se escolhiam, também, para
capitães dos. mesmos, segundo se depreende da act. exercitoria.
(396) £íão sómeñte, tambcm, o pessoal de serviço se: compunha' quasi sempre
de. escravos {act. institoria), como estes exerciam por conta própria um pequeuo co
mércio (act. tributaria), tirando-lhes, no primeiro caso, o pósto <de; trabalhadores livres
e' fazendo-lhes», em segundo, uma perniciosa concorrência^
(397) . Esta organização exigia um numeroso pessoal inferior, e, naturalmente os
publicaiios / encontravam mais vantagens 'em se servirem dos esclavos (fò m ite pubìi-
canorum ).
(398) Existia, por exemplo, para o serviço da condução das águas, em Roma, sob
o Império* uma fam ilia publica de 240 escravos e uma fam ilia Cmsaris de 460; o.
mesmo sucedia para o serviço e conservação doS templos. Sobre o serviço público,
compare-se ,.Th. Mommsen,. Röm, Staatsrecht (Direito publico de Roma), I, 350-359.
O ÉSRíRITO DÖ DIREITÓ^ ROMANÓ itò
(-399) P e t e r , Gesch. . . (História romana), tomo I, pag. 103, nota, com razão, que
se póde vèr na-renovação do censo do Servius T ullius,.como, em sua época, já-existia
uma desigualdade bem grande nas fortunas. O tèrmo médio da última classe coin
as classes superiores era de 1 a 10; mas havia muitos cMadãos cuja fortuna não
chegava ao mais baixo lim ite da classe inferior, e que excedia, em muito, dos bens
assinalados, à primeira classe.
J?GÍ R U D O E F VON J H'ÍS R I Ñ G
4
(405) Decreta in earn rem pecunia e pecunia m uliatitia. Veja-se, por exemplor
T ito L ivio , X, 23, 47; XXXI, 50; XXXIII, 42; XXXVIII, 35 ; XXXIX, 44.
(406) Como diz C icero, de o ff. 2, 16: intelligo in nostra civitate inveterasse jam
BONIS TEMPORIBUS, ut splendor, eed&itatum ap optim .is viris postuletur. T ito Livio,
XXXII, 7; XXXIII, 25.
(407) O facto deu-se e podemos citar alguns exemplos: a entrega de trigo e azeite
ao povo por um preço vil. T ito L ivio , XXXI, 50; XXXIII, 42. P l in io , II. H. N.
15, 1. — Pftóentes de dinheiro aos soldados. T ito L ivio, XXXIII, 23, etc. — Esta
belecimento de 170 banhos às expensas do edil, P l in io , II, H. N . 36, 15, e de teatros,
Veli. Patere., 2, 130 (Muera Pompejij„ etc. Em muitos casos os historiadores men
cionam a liberalidade, mediante a qual os edis obtinham a gratidão do povo, e se
bem que não digam que as faziam ai expensas próprias, pddemos admitir que assim se
deve entender, porque, essa particularidade constituía o mérit© para os historiadores.
(408) Distribuição de cereais, T ito L ivio , IV, 43. Viscerationes (Distribuição de
carne), T ito L ivio , VIH, 22; XXXIX, 46. Auct. de vir. ill., c. 32. Liberdade dos
detidos por dividas, Dionis., 4, 9, 10; T ito Lrvio, VI, 20. Veja-se uma coleção de
exemplos tirados de insicrições, em Kuhnr über die M uñera... (Espetáculos públicos
e comuns do povo rondano) ; na revista Zeitschrift fü r Alterthum swiss, 'de Cesar, 1854;.
liv . 1, pags. 11-15.
ís ^ ã ò s ocuparemos no Jivro seguiu té, por Jiao ser áiújda tempo
■j .çst 3. m atéria. ' .
¡fe V-oitémos, entretanto, à pergunta que apontámos inais 'açi-
‘ m a; J u | fazia o Estado para suavisar a sorte rilaterial das clas
ses inferiores? Podemos, desde logo, assinaiaér como medidas
j^rincipais, p á ra a assistência púbMca, as segümtés:
, Concessão de térras as classés pobrés; qiier p a ra á f u n -
dáèão de colonias, quer como concessão do ager publicus En
tre todos os meios, este foi o prim eiro, tanto eiii sua relação
' prática coirio na social, poíqüe desim pedia a cidade düma gran
de parte da pobreza turbulenta* dando-lhe a base de urna eristen-
cia m oral. Os romanos consideravam a formação de um a colô
nia como um a sangria social (40í>), e se o sistema dessas san
grias periódicas continuasse, Roma não seria, mai$ tarde, vítima
de seus" próprios vícios. A aplicação do sistema de colônias re
m onta aos tempos mais antigos (410)>j^ como durante a Repú
blica ás cònquistas aum entaram na j ^ f m a proporção que o pro
letário, foi sem pre possível a elas récorrer. ^
2. A introdução da soldada foi oütra m edida anállogáí
"Quando as guerras cessaram por longo tempo* crescerám mais
os tributos, impostos à parte mais pobre do povò. Não se po
diam m odificar as circunstâncias que produziam este estado de.
«cousas; m as a soldada subministrou o meiò de nivelar, até cèrto
ponto, á desproporção que disso resultavá, diminuindo, em de
term inada proporção, as suas conseqüências. No anó de 348*, o
jpartido dom inante cedeu, neste particular, às reclamações da
^classe pobre (411) .
3. Á questão de cereais (412) tinha grande im portância. 409
(409) Do mesmo modo que o saneamento dos exgotos. Cic. de leg. ãgr. 2, 26 inf.
urbaham plebem exhauriendam esse; hoc verbo usus quasi de aliqiia sentina. Veja-se
também T ito Liyio, XXIV* 29, sentinam quondam urbis rati exhaustam. T igo L ivio , X«,
6, Roma quoque píebem quietam et exoneratam deducía in colonias multitudo prces-
itabat. V, 24— m ultiplex seditio erat, cujus leñiendae causa cotóñiam in Voléeos. quo
3.000 civium Kom . scriberéñtur, deducendam censuerant. Wachsmuth, die m í. Ge-;
js.eçli.. (Historia antiga da Estado romano), pag. 326 s.
^ (410) E ngelpregt de leg. agrariis ante Gracchos. Lugd. Bat., 1842, pag. 31.
(411)- T ito L ivio , IV, 59. A introdução da soldada; a divisão do agei publicus c
sa expedição de èolóriias èram, nèsse tempo, o desideratum e atrativo do povo. Trro>
Livio, IV, 36: Agri publici dividendi colorirumque deduccndarum ostentai s p e s ...
ip Stipendium , m ilitum .erogandi oeeris.
'(412) Vejam-se as obras citadas por Marquardt, ein Becker, H an db... (Manual de
.antiguidades rom anas), 3.* parte, 2.* secçãq, pagina 88, entre as -.quais recomendamos,
a E. Nasse,' Maletémata de publica cura annonae apud Romanos. Bonn. 1851.; veja-sé
também Rudorff. ' R. R. G. (História do Direito romano), I, § 18,. e Rubino, de Ser
vian i census sum m is disputatio partic, 1, Marburgs 1854, donde o ^utor demonstra;
entré outras, cousas, que o .preço indicado em á3cs, nas leges, frumentarise, deve ser en
cendido pelò as urna libra, que calculado na práticá conforme a taxa inuito módica,
-é equivalente a um sèxtérçio. O preço tão baixo, que parece até inacreditável, é citado’
nas passagens reproduzidas na nota 416, infduz a Schutz (Grundlegung. . . .pag. 509)
za. propôr arbitrariamente lêr, em vez de seris, sestertiis ; mas Rubino dá a explicação
verdadeira, nao sendo êsté' o menor mérito dêsse pequeno, mas precioso escrito. 4
Ó É3PíÍtÍTO DO D IR U T O ROMANO
(4Ì3) Punindo, criminalmente os- açambarcadores.. T ito L ivio ,- XXXVIII, '35; TV,
12 : étjoibjiàendo irse pòpuli flamèntàrios:. Bein, Kriminàlr. (Direitó^criminal dos
manos) , pag... 329, -òu fazendo-lhes - baixar ps preços com a concorrência criada pelas
/distribuições ao povo, P ljn io , H . N . XVIII, 4. T iberio obrigou um diav aos comer
ciantes dè séreais.a vender por um preço médio, suprindo êle à diferença:^ Tac. Ann..
11, 37 ,
(4i4) Num caso, extremos, # um Prefectos annona empregou uin meio violento,, mas
inteiramente inútil, ., para èsse, fim, como sucede com todas', as intromissões dessa
pécie. Ordenou que todo o mundo fizésse a daclaração de suas provisões e vendesse,
tudó p que excedesse do necessário' para o consumo^ dum mês. T ito L ivio , iy , 12'.
(415Í Plinio, .IT. N,,- 18, 4..,. frumentoni pópulo in modios assibus donavit .;
^ £416) Outro dos exemplos da nota 380, veja-se T ito. Li'vioJ XXX, 2G; XXXÍ, .4 {qua-
Jertiis aerís, 4/12 de as) ; XXX, 50^ e XXXIII, 42 (binis aeris, 2/12 de as). Epitoriie 60;
(lex frumentaria) de C. Gracchus: ut semisse et tríente i,3/6 .dé as) frumerititm* plebi
.daréntúr¿
O preço era muito ppùcd elevado, porque o da venda do trigo chégavá, nos tempos
favoráveis, até seis sextércios o m odius; três vêses mais que o preço 'à* que se vendia
ao p o y o ,-contandò-sè o as livre por um sextércio. De c0nformidade .com a- plhusivel
suposição de Rubino (l. c. nota 5)(, e^sa moderada avaliação do aes .grave se produ
ziu, ‘pela primeira vês, precisamente, em virtude da distribuição dos sereais. Com um
inódius^ um adulto podia sustentar-se durantç uma semana, mesmo 'tomando uma- pé-«
quêna quantidade de outro alimento. Os soldados Tecebiam todos, os mêses 4 modius,
os cidadãos» nas distribuições da ^época posterior, 5, os escravos, no inverno, 4, é np
trabalho intenso, 4%; o villicus somente 3, porque o outro alimento era de qualidade
melhor. Cato. de ru st.,. Polibiò, 6, 39. O as tinha antigamente um valór mínimo, que
foi diminuindo sucessivamento; ias é imposssivel entrar-agora em maiores detalhes" sobre
o assunto.
(417) T ito'L ivio, II, 9 (246 antes de J.-C .), 34 (año 262: Si veterem annonam
voiunt) . Dionis., 4, 22. Auct. de Vir. ili., c. 7^ —
^reéndéii-se, fácilmente, que o Senado não autorizasse o auxí-
^ lio áo ceráriüm senão em circunstâncias urgentes e cobrando, de
so ís, êsse fayôr (418*^ . Foi, pois* um benefício sensível, para as
^ á ã ^ s /ib fè rio re s , -quando* mais tarde, os edis cederam, por conta
própria, çéreais a baixos preços. Além dessas distribuições, da-
J ya-s^ gratùitamente pão a todo aquele que sé refugiava no tem-
de certo .biodo, a sede oíiçial dós edis (412>.
De? resto, a- solicitude das autoridades públicas sé extendía,
tam bém, a outros objetos de utilidade m ateriál, como, ]k>r exem
plo. o sal* o azeite, os anhos, a condução dágua'e os m ateriais
de construção f420) . Com relação ao sal, instituiu-se, especial
mente, desde *òs prim eiros anos da República, o monopólio, não
•com o intuito- de criar um a nova fonte de receita para o
Estado, mas para reprim ir a especulação do comércio com èsse
artigo (421) . No século VI, dois censores (um dos quais M. Li-
vius, foi, por èsse motivo, alcunhado de Salinator), estabelece
ram um imposto sob as bases de que a venda do sal a varejo
estava arrendada por preços" que variavam nàs diversas regiões
•da. Itália, mantendo ó seu antigo custo em Roma (422423) .
4. A questão da divida. Já indicámos que a dívida tinha,
*ein Roma, unia im portância social extraordinária. Semelhante
questão, atualriiènte, não póde ter mais ö mesmo interesse. Não
existe, em nossa sociedade, classe que corra ò perigo de estar
.totalmente endividada, nein classe -qüe pòssa tirar proveito dás
adiyidás de outra. De mòdo diferente acontecia em Roma, onde
ra dívida toitìou um caratér de verdadeira epidemia, devastàndo
até as ínfimas camadas sociais, que pela sorte precária de sua
..situação econômica, eram quasi exclusivamente dominadas pela
•dívida. Está invadia, não isoladamente os particulares, mas a
toda uma classe, e is»to com irritante e periódica regularida
d e C123).
(418) Tal era o firn »da proposição de Coriolano. Tito Livio, II, 44, 35; ibid. IV,
'12, regnò prope per largitiónis dulcedinem in cerotees accpplo.
(419X_ Non. Marc, de progr., sem i., 1, § 2(g. ^ Veja-se prenderé.
(420) T ito L ivio , V, 35; VI, 4. "T;
(421) T ito L ivio , IÍ, 9: Salís quoque uendendi arbitrium, quia iijipenso pretio
üenibat, in publicum omni sumiu ademtum privqtis. T ito L ivio náo se podia exprimir
-com maior clareza, e seu texto não necessita de esclarecimentos; mas' é incrível como
foi tão mal^ interpretado e a finura com que se tem desvirtuado esse autor. Veja-se ^
’D backenborch sobre esta passagem. Atribue-se a A nco Martius o imposto sobre o sal.
Àuct. de nir i l l . . . c. 5, assim como o primeiro estabelecimento de salinas, e pri
meiro presente de sal ao público. P lin ., H. N. 31, 41.
(422) T ito L ivio, XXIX, 37. Não vemos em que se apoia a afirmação de R uperti,
H antfb... (Manual de antiguidades romanas) 2.a palie, pag. 383, de que o monopólio
•do sal foi abolido, na Italia, porque náo se funda em .nenhuma prova.
(423) T it o L iv io , VI, 36. Gregatim quotidie de foro addictos duci et repieri vi-
.nctis nobiles domos.
O ESPÍRITO %0 DIREÍTO ROMANO 175*
«ão, tirando-Ihe todo Risentivo que pòssa ter para desem penhar
*essas funções; política funesta, que transpôs os limites do absur
do, dispondo que o chefe dum exército em frente ao inimigo se
colocasse sob as ordens e autoridade duma chaincelaria distante,
-qúe lhe proíba empreender a batalha, antes de ser aprovado o
plano^concebido pela sua m entalidade guerreira.
O sistema romano apresenta, comparado ao sistema modera
no, absoluto contraste. Os romanos sabiam qúe o Estado pode
roso exige -membros vigorosos; que o Estado m anietado não póde
conseguir nada dé grandioso e que nem o temôr dum abuso pos
sível, nem o de excesso de liberdade, deviam impedir-lhes dotar
a sua m agistratura de faculdades onímodas. Habituados sempre
a um desdobramento de força, não suportariam, na sua comu
nidade, ã fraqueza, nem a impotência. 0 povo não exigia, de
•seus funcionários, a submissão, tím ida e modesta, m as lhe com-
prazia vê-los agir imperiosam ente; que refletissem o poder e a
p ró p ria magestade do. Estado, para cujo efeito se lhes conferia,
■de bom grado, o poder e as faculdades necessárias. P o l i b i o nota,
com razão, que o Estado romano, considerado pelo carater de
«eus magistrados, dá a impressão dum a m onarquia (427) . A ple
nitude de poder, da qual os “seus funcionários estavam antigam en
te investidos, não foi diminuida, desde o século IV até os fins da
"Republic'a, nem foi objeto de nenhum a censura. A democracia
não se comprazia, como atualm ente, em hum ilhar o poder do go
verno, nem a autoridade dos funcionários, a pretexto do interesse
d a soberania do povo, o que indica quão form al era o poder livre
d e seus funcionários, e como só em Roma foi possível que magis
traturas nascidas em princípios do século IV, pudéssem, por sua
p ró p ria autoridade, sem nenhum a intervenção do poder legisla
tivo, extender, muito além dos limites primitivos, o círculo de
suas atribuições.
Êste respeito inato dos rom anos para com a autoridade, seu
^sentimento natural de disciplina e de subordinação, explicajn,
«uficientemente, sem que seja necessário rem ontar à m onarquia,
a popularidade que, em Roma, cercava o poder e a autoridade de
q u e gozavam os funcionários públicos.
Certa escola, como é sabido, considerava o poder rom ano
scorno um a instituição teocrática, isto é, como um a espécie de
alto sacerdócio (428), e não adm itindo que a idéia necessária da
au toridade pudésse nascer do simples conceito natural e m oral
das relações sociais, chamou a Monarquia em seu auxilio p a ra
poder coroar a m agistratura, sua herdeira, com o auréola dum a
consagração divina. Mas, ainda mesmo que compartilhássemos
dêsse modo de vêr o poder real, não poderíamos consentir que *423
(429) Va l . Max ., 3, 7, 3: Tacete quseso, Quirites, plus enim ego, quam vos, quieta
Teipublicee expediat, intelligo. Ibid. 6. 2» 3. C. 4, 1, 2. Auct., de Vir. ill., 58, | 8 0
O ESPIRITO DO DIREITO ROMANO i¿t
(430) Quanto âs sessões do Senado, eles- se ajustavam aos usos. Veja-se mais
¡adiante.
(431) P o r ex e m p lo , L iv iu s S a lín ator, estab eleceu o im p o sto d o s a l.
(432) Veja-se T ito L ivio , II, 56, e III, 26. O proprio Senado facilitou a usurpação
-dêstes, que também intentaram, segundo refere G e lliu s , XIII, 12, amparar-se no jus
¿uocationis, pertencente aõs magistrados que tinham o Im p eriu m , usando, outrossim,
-exercê-lo contra os cónsules ; m as a usurpação caiu e a uocatio não lhes foi nunca
•concedida. —
(433) V al . Max ., 6, 3, 2. 9, 5, 2. C icero dé leg., 3, c. 9. Aur, Vict. de Vir. ill.,
4)6, § 9.
182, RUDOLF YON j HERING
(434) Poderíamos agora 'lembrar a tutela do antigo direito, da qual ainda não»
tivemos oportunidade de falar. A tutela, como sc vê, era, no antigo direito, uma re
lação de poder ( j u s i n c a p i t e l i b e r e ), e, portanto, uma relação juridicamente livre..
O tutor não estava sujeito a nenhum limite ou restrição, e não podia sér cha mdo
a prestar contas de seu encargo senão quando resignava as suas funções.
435) De lag. 3, c. 10. S e d i n i q u a e s t in o m n i r e a c c u s a n d o p r & ' t c r m i s s i s b o n i s
m a lo ru m en u m eran o v itio r u m q u e selectio. S ani isto q u id e m m o d o vel con sulatn s vi
t u p e r a b a i s est, s i c o n s t u l u m , q u o s e n u m e r a r e n o l o , p e c c a t a c o f l e g e r i s .
(436) Vcja-se a epigrafe deste paràgrafo.
O E S P ÍR IT O DO D IR EITO ROMANO 183
(446) Há grande exagero cm e rig ir, com o n a h is tó ria dos romanos*, d e G erlach c
B achofen (tom o I, 2.a p a rte , p ag . 208), os precedentes como base ú n ic a do estado posr__
te rio r e com o ú n ica re g ra p a ra ju lg á -lo . Se sem elhante estado p u d é ss e conceber-se,
onde q u e r que fosse, o povo em q u e sucedesse, m ereceria s e r c o m p a ra d o ao re b a n h o
d e P a n ú rg io ; mas,*'até h o je esse povo sóm ente ex istiu nas visões, n o tu rn a s d u m en tu
sia s ta da im o b ilid ad e a b so lu ta, e n ã o seria p o ssív el, nem m esm o em sonho, tra n s p o r-
tá -lo a Roma, a quem h a ja estu d ad o , a in d a que su p erfic ia lm en te, a civilização d a
q u e le povo. Que seria ôsse fetich ism o , segundo o que preccdq, sen ão o q u ietism o cu l-
pável, a a p a tia vergonhosa, a su b o rd in a çã o cega d a vo n tad e de to d a s as -épocas se
g u in te s, ao julg am en to d a p rim e ira , e, ao m esm o tem po, d a ú ltim a pe9sôa que recioci-
n a sse ? V ejam -se exem plos, em c o n trá rio , em T ito L ivio, XXXI, 9 : toties a n te . . . dc
pecunia certa, ii prim i de incerta; XXXI, 48, 49; V, 16: novo exem plo; patres . . . aucto-
res fuerunt; VIII, 16: petitum a consulibus ut extra sortem Corvi ea provincia esset;
o m esm o X, 24: omnes ante se sortitos; V ili, 23, ,26 i. f . : prorogatio im perii non ante
in itilo facto; IX, 3 0 ... quod traditum ab antiquis erat; X, 37: novo exem plo; XXXVII,
11; XLV, 21, etc. V cja-se a n o ta 4540 e s.
(447) Tal é a objeção que p o d eríam o s fazer, especialm ente a L aboulaye, ì . pag.
73, que, de resto, c aracterisa, cm excelentes tèrm o s, a situ ação . “ Em d ire ito , diz ele,
o m agistrado era enérgico; m as o costum e o e streitav a n u m circ u lo d e precedentes, do
mùito aos rom anos que somente assim sê agisse, quando,;,
'¿gexigiám razões e necessidades imperiosas. Afastar-se, de um '
% d ò irref fetido* sem causa ponderável, do uso estabelecr/lo, era
^ ím facto raro na épóca antiga, que exercia no povo tanta in-
dignação como a da violação da Je i (448) .
Isto induzia o funcionário a exam inar, em cada caso, se se-
r ia m ais conveniente ,e vantajoso, em benefício dò Estado, aban
donar, ou seguir a tradição. Assim, devia ponderar cuidadosa-*
m ente todàs as circunstâncias e ter/ em ,conta a - diversidade do
valor intrínseco das regras seguidas em um a longa prática. Cer
tas regras podiam parecer-lhes simples hábitos do povo, indife
rentes quanto ao fundo (por exemplo, a órdem nos votos do Se
nado) ; outras, ao contrário, eram a expressão de um a necessi
dade política (por exemplo, a execução dos decretos do Senado).
Por outro lado, o peso das razões, que podiam ser postas na ba
lança para justificar um a derrogação em tal ou qual caso, era
igualmente variável. Compreende-se, também, que a persona
lidade dos funcionários, a sua timidês ou resolução, as suas ten-*
dências e opiniões políticas, deviam, exercer grande influência.
Mas o m agistrado jám ais podia deixar de ter em vista, que se
afastar do uso era um ato que chamava a atenção pública, e
havia necessidade de justificar que o fazia com a m aior boa fé,
porque, de outro modo, se não fosse logo. atingido pelo oprobio,
estaria sujeito à acusação, e, depois, a um a pena. Considerações
pessoais dêsse gênero, não podiam, certamente, hesitar àquêle
que nutria um verdadeiro amor à pátria, sem necessidade e sem
razões decisivas; m as èsse mesmo amor obrigava-o a ter cuidado
de não rom per abertam ente com o uso estabelecido. Quantas
regras puderam observar-se* durante séculos, sem serem derro-
gadas, até que um a extraordinária complicação de circunstâncias
perm itiu ao m agistrado delas se afastar! Se a prática se reves
tisse de força obrigatória absoluta, semelhante ação constituiria
um a ilegalidade, à que o m agistrado não se exporia , sem o assen-
timento^do Senado. O modo pelo qual os escritores romanos
-mencionavam exemplos desta órdem, bem como as circunstân
cias em que se produziam , prova que sem elhante idéia era ex-
tran h a aos rom anos. Tráta-se, no entanto, de dem onstrar a ve
racidade da opinião que se acaba de desenvolver. Poder-se-ia
tentar opor à generalidade dos tèrmos mos e mores majorum.
(456) T ito L iv io , IX, 46. Quum MORE MA JORUM negaret n isi consulem aut im -
qieràtorem posse lem plum dedicare. oa
(457) P o r exem plo. C icero in V at., c . 14: ln om ni m em oria omnino inau ditu m .
T ito Livio, XLV, 21. Novo mcdoque exem plo.
(458) P o r ¿ennuplo, p a ra sab e r se o consul p o d ia, sem um decreto do Senado,
receber ou ro d o E r á r io . P o lib ., 6, c. 12, § 5, c. 15. Zo rn a r., 7, 13. Como n ó ^ o s autores
m odernos n ão tiv e ra m em conta a observação acim a re fe rid a , a divergencia entre êles,
neste assunto , com o em ta n to s outros (veja-se R u b in o , Investigações, pag. 178. B ec k er ,'
J f a n d b ... (Manual d a s antiguidades romanas., tom o II, seg u n d a p arte, pag. 110). Todos
os esforços feitos p a ra co n ciliar as contradições a p aren tes dos textos, im pediram ,
p o r, m uito tem po, a c e ita r o ponto de v ista p o r nós estab elecid o .
(459) Seria em preza m e ritó ria, p ara os tra b a lh o s so b re o d ireito público de Roma,
p re c isa r todas as co n tro v ersias existentes, em vês de nos esfo rçar, como até aq u i se
tem feito, em d eso o b rir, p o r to d a p arte, p rin cip io s d eterm in ad o s e certos. Não nos é
possível m en cio n ar a q u i todos os m ateriais que reu n im o s, sem contar ain d a os que
estão incom pletos, m as podem os asseg u rar, desde já , a q u em se quizer ocu p ar de se
m elhante tra b a lh a , u m a o p u len ta colheita.
(460) Q uasi to d a s as regras expostas so b re o Senado, são devidas, ao nosso vêr,
à p rá tic a e aos uso s, p o r exem plo, a obrigação de co n v o car o Senado e de seguir um a
certa ordem na em issão do voto, o efeito que tin h a o *enatus au toritas de g a ra n tir contra
um a acusação ao fu n c io n á rio que se conform a, etc.
Ö E S P ÍR IT O 9 Ì$ì
(4 6 7 ) V e j a - s e e m A p p i a n o d e b e ll o c i J, 1 9 . T it o L iv io , X e n i , 2 ; R u b i n o , 1.
pag. 128, n o ta 3 , c L a b o u l a y e , p a g . 3 4 , 3 6 .
(4 6 8 ) P o r e x e m p lo , c o n t r a P o s t u m i us-„ n o ta 4 5 2 , o u M e te llu s . 'A u ct. d e y i r . i l l u s t r . ,
c . 4 5 : quum per calumnian* triu m p h u s ei a Senatu nogaretur, dc sua sententiá in A lbano -
m onte tr-ium phavit. T it o L iv io , V II , 1 7 .
(4 6 9 ) C o m p a r e -s e , p o r e x e m p l o , o c o n f l i t o q u e te v e o - c o n s u l M .. P o p í l l u s com o .
S e n a d o . T i t o L iv io , X l I I, 8 -1 0 , 2 1 , 2 2 . *
(4 7 0 ) V e ja -s e o u tr o e m T i t o L i v io , X L II. 1 0 . Macedoniam decréturos neganí, ni
de M. P opillio refera iu r. P o stu la n tib u s ..deinde, ut novos .exercitas 'se rib eret, ut $np~
piem entum veterilús licerci, utrum que negatum est; V II, 1 7 , om nique Qpe im pedieban t ,,
ne qu id dictatori ad id bellu m decernereiur p a ra retiirve.
(471) J T ito L iv io , XXX , 24.
O ESPÍRITO DO DIREITO ROMANO m
(472) Trro L ivio , IV, 26: ut dìctatorem dicere cónsules pro potestete Destra cogatis.
Os tribunos derairi » ordem mencionada aqui, pelo Senado, a possibilidade de extender
seu prensio contra os cónsules. Trro L iv io , V. 9: et colleges aut fcùcient, quod censet
senatus aut si pertinacias tendet, dictatorem extemplo dicam, qui eos abriré magistrata
cogat. As origens mencionam diferentes casos de demissão forçada. T ito L iv io , Vo 31;
V ili, 3, epit. 19, etc.
(473) Por exemplo. A p p ia n ò de bello civ ., I, 65.
194 RUDOLF VON J HERING
(474) Veja-se, por cxemploi, em T ito L ivio , III, 26, a atividade dos cónsules, re
lativamente ao jus prensionis, reclamada pelos tribunos. Se, nesta época, outros homens
estivessem investidos dessa função, certamente repeleriam a arrogante pretensão do
tribunos. Que diferença no modo pelo qual muitos cónsules se utilizavam da autori
zação que lhes havia dado o povo, ou o Senado para firmarem a paz! Alguns con
cluíam o tratado sobre as bases que julgavam convenientes, sem reservas e sem se re-
ferir, desde logo, ao Senado (Vejam-se os exemplos em R ubino , /. c.„ pags. 267, 268),
enquanto que os outros não ousaram fazer usò de seus plenos poderes, senão reser
vando ao povo a decisão final. T ito L ivio,, XXX, 43, 44.
(4 7 5 ) T it o L iv io , XXVII, 8 , dá um exemplo muito interessante. O flamon dialis
tinha, desde a antiguidade, assento e voto no Senado. Durante muito tempo não se
tinha feito uso desse direito ob indignitatem priorum f lami num, até que uma persona
lidade respeitada e decidida se investiu no cargo e sc atreveu fazer uso desse direito,
triunfado a oposição que desde logo se lhe fez. Somente com èsse direito que recon
quistou, conseguiu realçar infinitamente o caráter da função. Não houve mais uma
voz para proclamar, como refere T it o L iv io , que s ó a personalidade do flainen decidiu
.a questão (magis sanctilate vitae, qíiam sacerdotii jure obitinuisse) . Veja-se também o
exemplo de Scipião. T it o L iv io , XXXVIII, in. f ., de Cesar., S'uetonio, Coesar, 2 0 .'
(476) T ito L ivio , IV, 8, atribùi aos patrícios, desde que se introduziu a censura,
a seguinte reflexão: futurum ... ut mox OPES EORUM, QUI FR/EESSENT ¡PSI HONORl
JUS MAJESTATENLQUE ADJICERENT Catão era um homem dessa tempera: a consi
deração de sua personalidade deu-lhe a vitória sobre todos os concorrentes dft pres
tigio (T ito Livio, XXXIX, 40, 41), que não se. podiam comparar com êlc (ibid. c. 44).
As vezes, sem dúvida, a energia degenerava também cm obstinação audaciosa, como
.aconteceu com Appius Claudius. T ito L ivio , IX, 33, 34.
R Ü D O L F~ VON JHERÌNG
(485) G. Lek z , Ueber die Gasch.. Entsteh. (Sobre a origem histórica do direito).
Greifst e Leipzig, 1854.
E’ incontestável que idéias e considerações tão vârias, tàis;
como o interesse do bem público, da m oralidade, etc.,, póssaip|
prevalecer na criação legislativa dum a relação de poder. Mas§:
juridicam ente falando, a influência que semelhantes idéias proi.
curaram exercer, não consiste em confundir, com outra relação
de poder, um elemento que lhe seria extranho; e que m udaria
qualitativamente o seu objeto, sempre que o podei; dá vontade
pòssa produzir outro resultado que o de se justapor às relações
jurídicas, para lim itar a sua ação. Q conceito m oral de um a
instituição, varia segundo as épocas; as transformações, que nela*
se introduzem» podem m odificar completamente o seu aspecto
jurídico.- Juridicam ente falando, só se póde form ular èsse facto,
deste mòdo: a diversidade na soma de poder contido ha institui
ção. Assim, as diferenças sobre a tutela, a autoridade do pai so
bre os filhos, e do m arido sóbre a mulher, no antigo direito e no
direito atual, se reduzem, quando se lhes quer qualificar juridi
camente, a uma diferença quantitativa do conteúdo potencial
dessas relações e à introdução de outro poder que aspira as mes
m as vantágens (o do m enor, do filho, da m u lh er). Seria crássa
ignorância dizer, qüe essas relações não são mais que de autori
dade, e que a idéia prosàica de poder, cedeu a um a idéia mais
nobre, desconhecida dos rom anos.
Não se deve perder nunca de vista que a finalidade da rela
ção teve sempre como objetivo a própria utilidade do titular
do direito. O funcionário exercia o poder, únicamente, como re
presentante do Estado. Poderia èie, por èsse motivo» im pugnar
o poder, em toda sua plenitude? O tutor da antiga Roma, zelava
pelòs interesses de seu pupilo, e às disposições legais obrigaram -
no à cum prir èsse dever (postulatio suspecti tutoris, actio ratio-
nibus distrahendis, infâm ia) (486) ; apezar, no entantoi(*dessas li
mitações, a tutela era definida: jus ac potestás in capite libero.
P or isso, o direito atual confia ao pai um poder sóbre os filhos,
apenas no que diz respeito a sua educação; m as se opõe á que
faça uso de instituições contrárias a èsse objetivo. Em verda
de, essa autoridade é essêncialmente restrita, quando com parada
com a da patria potestás rom ana. Não se pode, entretanto, de-
finí-la de outro mòdo, senão como um poder, de tal ou qual ex
tensão, a que se está subordinado com tais ou quais restrições,
etc. O poder se concilia p e ri ertamente com o dever. O funcio
nário, o tutor, têm um poder, mas, tam bém , um dever de usá-lo
no interesse do Estado, e do m enor . — Esta proposição em nada
repugna às nossas atuais idéias.
Mas onde a concepção rom ana antiga diverge das idéias mo
dernas é em não conseguir ju n tar, na mesma pessoa, o poder e o
dever.
(486) O act. tutela pertence a uma época posterior, como o temos sempre provado.
O ^SPÌRITO DO DIREITO ROMANO '201
rocha; cada romano podia, no recaiito da terra, que lhe era desig
nado por sorte, considerar-se ao abrigo de qualquer agressão, e
um verdadeiro soberano. Eis, ao nosso vèr, o que o direito ti
nha de mais precioso e bèlo, de que o romano podia orgulhar-se.
A altives, que se apòia no sentimento da liberdade, é per-
feitam ente legítima; não era simplesmente a posse o único gozo
da liberdade, que estimulava; mas, sim, os próprios méritos da
liberdade. A liberdade não é um presente dos deuses, m as o
bem que um povo conquista, e que só prospera na razão direta
de sua força e de sua dignidade m orais. Somente, o amor à li
berdade não basta, mesmo quando é capaz de sacrifícios (e não
póde ser de outra fórm a). P ara que èsse amor seja fecundo, se
exige outra condição essencial, — é a de possuir a arte de saber
usar da liberdade. Nisso consiste a dificuldade. A prim eira
regra dessa arte é a m oderação. Nenhum bem concita a tantos
excessos, nenhum se perde tão fácilmente, tão irrem ediavel
m ente, pelo abuso, como o mais precioso de todos: — a liber
dade. Tem-se falado, com pertinácia, em nossa época, de povos
sem aptidões ainda para a liberdade, fixàndo-se, para isso, no
gráu dê cultura dèsses povos e de suas qualidades piorais. Se
se tratásse, únicamente, de ter a compreensão da liberdade, os
povos mais ilustrados deveriam ser os mais aptos, quando, pelo
contrário, é o progresso da civilização que acompanha sem pre o
declínio dessa aptidão. Roma deu-nos um exemplo curiosis
simo .
Nião podemos deixar de insistir sobre a capacidade m oral, do
antigo povo romano, pela liberdade. Todo o nosso sistema vi
veu, e com èie caiu:
Moribus antiquis stat res ramano, uirisque.
A decadência da m oralidade foi, ao mèsmo tempo, a deca
dência da liberdade rom ana. À possibilidade prática de todas
as relações da liberdade, tanto do direito público como do di
reito privado, tinha como condição necessária, que estivessem
anim ados dum verdadeiro espírito de liberdade. Desde que èsse
espírito se enfraqueceu, desde que a arbitráridade, o capricho»
a indisciplina, nela se amparou, perderam o seu sentido e a sua
legitim idade em vês do espírito livre, que não se deixava do
m inar, apresentou-se a lei e a tirania. Tanto assim, que quem
quizesse julgar o sistema da liberdade da época antiga e com
preender o sentido e o fim de suas instituições, não podia per
der de vista, um só instante, a antiga m oralidade e o gênio da
quela época. O uso foi a chave indispensável para com preen
der o direito antigo; se éste nos mostrou a liberdade abstrata,
o outro nos fez ver a restrição da liberdade por si m esm a, res
trição que era a condição tácita de todo direito.
T ácito gabou os antigos Germanos, porque entre êles o uso
r Oí* Pv- y O l f J H E R IN G
F IM DO II V O L U M E