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Caso Prático 1

Amílcar celebrou com Bernardo, a 25 de Maio de 2016, um contrato de compra


e venda de uma coleção de selos pelo valor de 20.000 euros por um mero documento
particular assinado por ambos, segundo exigia a lei vigente. O valor seria pago em 20
prestações de 1.000 euros, sendo que a primeira vencer-se-ia no primeiro dia útil de
julho de 2016 e as restantes em igual dia dos meses subsequentes.

Todavia, a 15 de Outubro de 2016 foi publicada uma nova lei que exige escritura
pública para os contratos do mesmo tipo que Amílcar e Bernardo celebraram.

Deverá o contrato entre Amílcar e Bernardo ser considerado inválido em face da


entrada em vigor da lei nova?

Tópico de Resolução:

1. Início de vigência da lei nova será no 5.ª dia após a sua publicação -
vacatio legis supletiva – art. 2.º, n.º 2 da Lei 42/2007 – no silêncio da Lei
nova.
2. Lei nova não é retroativa – art. 12.º, n.º 1, 1.ª parte + art. 12.º, n.º 2, 1.ª
parte – lei nova fala sobre condições de validade formal.

Caso Prático 2

Imagine que António foi intercetado pela Brigada de Trânsito enquanto conduzia
com uma taxa de alcoolémia de 1,2 gramas por litro de sangue, o que atualmente
consubstancia a prática de um crime punível com pena de prisão até 1 ano ou multa até
120 dias, para além da inibição de conduzir por um período de 3 meses a 3 anos.

António é submetido a julgamento por esse facto, sendo que entretanto surge
uma lei que refere que só consubstancia a prática de crime a condução sob efeito do
álcool acima de 1,5 g/ por litro no sangue.

Esta lei aplica-se a António? Justifique legalmente a sua resposta.


Tópico de resposta:

A lei penal, por regra, nunca é retroativa – art. 29.º da CRP

Neste caso, é retroativa porque é mais favorável a António – retroatividade in


mitius (n.º 4)

Pag. 229 do manual do Baptista Machado

Caso Prático 3

Albino vendeu a Berta, no dia 30 de Janeiro e na Praia de Ribeira de Ilhas, um


jet ski, da marca Kawasaki, pelo preço de 4.000,00 euros. Albino entregou de imediato
o jet ski a Berta.

Todavia, acordaram que Berta só pagaria a Albino o montante acordado no dia


25 de Fevereiro.

A lei em vigor no momento da celebração do contrato estipulava que o lugar de


pagamento, na falta de estipulação das partes, deveria ser o lugar da celebração do
negócio.

A 3 de Fevereiro de 2016,foi publicado em Diário da República uma lei que


refere que, na falta de estipulação das partes, o lugar para pagamento seria o domicílio
do credor.

Berta, apercebendo-se que ela e Albino nada estipularam acerca do local de


pagamento, quer agora saber qual a lei aplicável à sua situação.

TÓPICOS DE RESOLUÇÃO

A situação descrita no caso prático é exatamente igual à situação descrita no


manual indicado para estudo da unidade curricular: Baptista Machado, “Introdução ao
Direito e ao Discurso Legitimador”.

A situação do caso prático é a mesma que consta no referido livro, na página


221, exercício IV – 1.
A solução é também fornecida pelo dito manual para o exercício na página 233,
no penúltimo parágrafo.

Assim, aos alunos bastaria referir aquela solução acrescentando o seguinte


enquadramento de resposta:

- Princípio da não retroatividade da lei como princípio geral – art. 12.º, n.º 1, 1.ª
parte.

- Retroatividade a existir será em grau mínimo e definir em que consiste este


grau e a sua consagração no art. 12.º, n.º 1, 2.ª parte.

- Situar a situação descrita no caso prático no art. 12.º, n.º 2, 2.ª parte – definir
em que consiste o “conteúdo das relações jurídicas”.

Identificar nesta situação que a lei nova regula o conteúdo da relação jurídica
mas não se abstraindo dos factos que deram origem à relação jurídica – pois é o
que sucede no domínio dos contratos, se a lei nova versar sobre normas dispositivas
supletivas ou dispositivas interpretativas.

A nova norma da lei nova versa sobre o lugar de cumprimento da obrigação de


pagamento.

Mencionar que se trata de uma disposição supletiva – pois apenas se aplica se as


partes não tiverem estipulado o local de cumprimento, que foi o que sucedeu. Aliás, foi
uma situação dada em aulas para ilustrar um exemplo de uma norma dispositiva
supletiva.

Desta forma, como a lei nova não se abstrai dos factos que deram origem à
relação jurídica, deve aplicar-se a lei em vigor no momento da celebração do contrato e
não a lei nova.

Deve ainda o aluno mencionar que a lei nova entraria em vigor no 5.ª dia após a
sua publicação no Diário da República – art.º 2, n.º 2 do Anexo da Lei 42/2007, que se
reporta à republicação da Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro1.

1
É desnecessário referir as alterações que este diploma sofreu. Todavia, para efeitos meramente informativos, mencionam-­-se as
seguintes alterações legislativas àquele diploma: Lei n.º 43/2014, de 11/07; Lei n.º 42/2007, de 24/08; Lei n.º 26/2006, de 30/06 e
Lei n.º 2/2005, de 24/01.
Mas, salienta-­-se, esta informação é irrelevante para a grelha de correção e para a resolução dos casos práticos.
Caso Prático 4

Suponha que no dia 02 de Janeiro deste ano (2016) entrou em vigor uma lei que
estabelece entre os pressupostos para o exercício da profissão de assistente social que o
candidato não tenha sido condenado por violência doméstica nos últimos cinco anos.

António candidata-se para exercer a profissão. Sucede, todavia, que em 2012 foi
condenado por decisão transitada em julgado pela prática do crime referido. António
considera que a lei é retroativa e, como tal, não lhe pode ser aplicada.

Terá razão?

Tópicos de resolução:

Segundo o artigo 12.º, n.º 1, CCiv a lei só dispõe para o futuro. Atendendo que o
exercício da profissão ainda não estava regulado, temos uma lei nova. Esta, ao
estabelecer pressupostos de idoneidade para o exercício da profissão, abrange
necessariamente factos ocorridos no passado (que se prolongam para a atualidade) antes
de o exercício da profissão se podia ter iniciado. Na altura em que António foi
condenado não havia qualquer expectativa no sentido de ele poder exercer a profissão
em causa. A proibição da retroatividade visa proteger expectativas realizadas. Assim, a
lei nova é de aplicar a factos passados no caso em que o requerente António ainda não
tinha adquirido o respetivo estatuto, pois candidatou-se somente a seguir à sua entrada
em vigor. De resto, se não fosse assim ele seria beneficiado em relação a candidatos
que, depois da entrada em vigor, tiveram que pautar a sua conduta de acordo com a
nova lei. Nada obsta a que a nova lei assume como pressupostos impeditivos factos
ocorridos no passado para a aquisição da situação profissional atual. Caso contrário
seriam criadas situações de desigualdade. A nova lei pretende um tratamento igual para
o futuro. [Ver: J. Baptista Machado, Introdução, pp. 220, 222/223, 231- 235.] (A
situação é diferente da proibição da retroatividade da lei penal, da lei fiscal ou da
limitação de direitos fundamentais.)
Caso Prático 5

O artigo 2166.º do Código Civil prevê no n.º 1, alíneas a) a c), os fundamentos


para a deserdação. Suponha agora que uma nova lei surge e vem acrescentar ao n.º 1
daquele artigo uma nova alínea d), na qual se estipula como fundamento para a
deserdação ainda os maus tratos e abandono praticados contra o autor da sucessão
(falecido). Inácio faleceu em 31 de Março de 2015. A partilha foi feita em 30 de
Setembro de 2015. A nova lei foi publicada no Diário da República a 20 de Setembro de
2015, nada referindo acerca do seu início de vigência. Augusto, filho de Inácio,
preenche os pressupostos enunciados na nova alínea d) do art. 2166.º acrescentada pela
lei nova. Filipe, irmão de Augusto, sustenta que este não pode, por isso, ser herdeiro de
Inácio.

a) Terá Filipe razão?

b) E se a nova lei tivesse sido publicada em 20 de Março de 2015, a sua resposta


seria a mesma?

TÓPICOS DE RESOLUÇÃO:

[Reflexão prévia: Este caso prático versa sobre uma questão da aplicação da lei
no tempo (e não sobre uma questão do direito sucessório!). Assim, a tarefa do aluno é
considerar e resolver a situação de conflito entre a lei antiga (LA) e a lei nova (LN).] a)
Filipe teria razão se a LN, que incluiu no artigo 2166.º, n. 1, mais uma alínea com um
novo fundamento de deserdação se aplicasse na altura da partilha (30 de Setembro),
sendo esta o facto constitutivo do estatuto de herdeiro de Augusto. Como o enunciado
não refere quaisquer disposições transitórias sobre a entrada em vigor da LN, aplica-se –
conforme o artigo 5.º, n.º 2 – o disposto no artigo 2.º, n.º 2, da Lei n.º 42/2007 de 24 de
Agosto – vacatio legis – “na falta de fixação do dia, os diplomas entram em vigor no 5.º
dia após a publicação”. Isto vale para as alíneas a) e b) do enunciado. De resto, aplica-se
o artigo 12.º, n.º 1, que determina que a LN só dispõe para o futuro, embora possa haver
retroatividade em grau mínimo. A LN foi publicada a 20 de Setembro de 2015 e, de
acordo com o disposto no artigo 2.º, n.º 2, da Lei n.º 42/2007, entrou em vigor 5 dias
depois, ou seja, no dia 25 de Setembro de 2015. Contudo, Augusto constituiu-se
herdeiro já antes, justamente no momento da abertura da sucessão (artigo 2031.º), ou
seja, na altura da morte do seu pai Inácio, ocorrida em 31 de Março de 2015. Por isso, a
LN não o afecta no seu estatuto, na sua qualidade de herdeiro, adquirido já antes (artigo
12.º, n.º 2, 1.ª parte). [Em alternativa: Segundo o artigo 2166.º a deserdação é feita por
testamento. Como Inácio, na altura da entrada em vigor da LN, já tinha falecido não
podia ter invocado a nova alínea como fundamento da deserdação de Augusto, sendo
este herdeiro.] O resultado é que Filipe não tem razão; Augusto é herdeiro de Inácio. b)
Filipe tem razão se a aplicação da LN não colide com a proibição da retroatividade. No
caso a LN entrou em vigor em 25 de Março de 2015 (publicação em 20 de Março + 5
dias [artigo 2.º, n.º 2, da Lei 42/2007] = 25 de Março) e a morte ocorreu apenas 6 dias
depois, em 31 de Março. Na altura da entrada em vigor, Augusto ainda não tinha
adquirido o estatuto, a qualidade, de herdeiro; apenas tinha a expectativa de vir a ser
herdeiro. A LN, ao incluir o novo fundamento de deserdação, limitou-se a considerar
factos passados e não constitutivos (mas que podem revelar-se relevantes como
pressupostos de factos a constituir no futuro). Estes factos não são abrangidos pela
proibição da retroactividade, que não se aplica a “quaisquer” factos. [De resto, para
elucidar esta afirmação, podemos referir que não faz a mínima diferença se a LN entra
em vigor 6 dias ou 6 meses ou 6 anos antes da abertura da sucessão.] Nada impede que
a LN assuma como pressupostos impeditivos factos ocorridos no passado para obstar à
aquisição do estatuto de herdeiro no futuro. Em conclusão: agora Filipe tem razão;
Augusto ainda pode ser deserdado por Inácio e, neste caso, já não será herdeiro dele.
Ver: J. Baptista Machado, Introdução, pp. 222, 233-237; Sumários desenvolvidos das
aulas dos dias 3 e 4, 10 e 11 de Dezembro de 2015.

[Observação complementar (não teria de se expor na resolução do caso, serve


apenas para informação): Como ainda se vai aprender na disciplina de Teoria Geral do
Direito Civil, uma finalidade do direito privado é a proteção de interesses privados que
mereçam tutela. O meio mais forte para o efeito consiste na atribuição de um direito
subjetivo. Mas a lei pode também proteger interesses privados sem a atribuição de um
direito subjetivo; temos aqui os interesses legalmente protegidos. Por outro lado, o
direito privado não protege reflexos de um direito subjetivo de outrem e, ainda menos,
meras expectativas (por exemplo, a expectativa de fazer um bom negócio ou de vir a ser
herdeiro) - com uma única exceção, aliás de duvidosa justificação, que é a proteção do
herdeiro legitimário contra negócios simulados que foram praticados pelo autor da
sucessão com o intuito de o prejudicar. De resto, o direito privado também não protege
expectativas no sentido de, enquanto as expectativas não se tiverem concretizado em
factos constitutivos de direitos, não poder haver alterações da lei (o que seria absurdo)
ou de não poder ser livremente revogado um testamento.]

Caso Prático 6

Joaquim considera-se citado no dia 10 de Outubro para apresentar a sua contestação, no


âmbito de um processo judicial que fora contra si intentado por Susana, dispondo de um
prazo de 30 dias para o efeito.

Diga, com base em cada uma da hipóteses abaixo mencionadas em que dia terminará o
prazo para Joaquim apresentar a sua contestação, justificando legalmente a sua resposta.

a) Uma lei nova entrou em vigor a 25 de outubro de 2016 dispondo que o prazo
para apresentar contestação é de 40 dias;
b) Uma lei nova entrou em vigor a 28 de outubro de 2016 dispondo que o prazo
para apresentar contestação é de 15 dias;
c) Uma lei nova entrou em vigor a 17 de outubro de 2016 dispondo que o prazo
para apresentar contestação é de 15 dias;

Tópicos de resolução:

Conflito de lei no tempo – pressupostos.

Enquadramento legal da questão – art- 297.º do CC.

Para contagem de prazo, atender ao disposto no art. 279.º als. b) e e) do CC.

Pela lei antiga, o prazo terminaria a 9 de novembro de 2016.

Na alínea a), a LN aumenta o prazo – art. 297.º, n.º 2 – o prazo terminará a 19 de


novembro, aplica-se a lei nova.

Na alínea b), a LN encurta o prazo – art. 297.º, n.º 1, 2.ª parte – o prazo termina a 12
de novembro, aplica-se a Lei Antiga, pois com base nela falta menos tempo para o
prazo terminar, seria um contrassenso que a lei nova que visa encurtar o prazo, em
virtude da sua aplicação, ainda concedesse mais prazo a Joaquim.
Na alínea c), a LN encurta o prazo – art. 297.º, n.º 1 – o prazo termina a 1 de
novembro de 2016, aplica-se a Lei Nova.

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