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CASO PRÁTICO
Que especificidade tem este caso para ser de DIP? Temos aqui contactos relevantes com mais
do que um ordenamento jurídico – francês, alemão, português e espanhol. Isso faz com esta
situação seja objeto da nossa disciplina (as relações privadas internacionais – plurilocalizadas).
Os vários ordenamentos jurídicos aqui referidos dão soluções diferentes a este problema.
Sendo competente, qual o segundo problema? Qual a lei que o juiz vai aplicar, quais os
critérios jurídicos de decisão do litígio? É o problema do conflito de leis ou o problema da lei
aplicável. Há vários métodos de solução deste problema. Neste primeiro caso prático vamos
utilizá-lo para ver o chamado método clássico/método conflitual/método tradicional.
Como funciona este método? Para cada matéria o legislador deve ter uma regra/norma que
escolha a lei aplicável, e a essa norma chama-se regras de conflitos. Com que critério é que o vai
fazer? Através da lei que tenha uma ligação mais forte/estreita. Neste caso, o juiz vai utilizar,
assim, uma regra de conflitos, que vai escolher a lei aplicável mas apenas de entre as leis que
tenham uma ligação ao caso (princípio da não transatividade).
Porquê ter este problema e não submeter todos os casos à jurisdição portuguesa, já que
estamos em Portugal? O princípio da territorialidade tinha vantagens, nomeadamente a
diminuição do erro judiciário, mas isto cria instabilidade das relações privadas internacionais. Se
cada país aplicasse a sua lei, a circulação das pessoas e coisas implicava uma mudança de
estatuto, porque se cruzasse uma fronteira os testamentos que eram válidos passavam a
inválidos, casamentos também, etc. Portanto, não vigora este princípio da territorialidade.
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No art. 46º CC está a regra de conflitos sobre este caso, escolhendo a lei que vai dar solução,
pois é uma norma de segundo grau.
NOTA: quanto ao facto de as regras de conflitos serem normas de segundo grau isto é assim
para a Escola de Coimbra. Mas há divergências quanto a isto.
Em terceiro é a consequência jurídica, que é a aplicação da lei que foi indicada pelo
elemento de conexão, mas apenas à matéria delimitada pelo conceito-quadro. Neste
caso, a consequência jurídica é a aplicação da lei portuguesa à matéria da posse,
propriedade e demais direitos reais.
CONCLUSÃO: Mobiliza-se, assim, a regra de conflitos e conclui-se que a regra portuguesa vai
regular este caso. Todavia, não podemos dizer apenas isto. Temos de a aplicar, significando que
não podem contruir até à extrema e abrir janelas. Temos sempre de testar a resolução do caso.
CASO PRÁTICO
Estamos a discutir este caso nesta disciplina pois isto não é uma situação puramente interna,
há contactos com mais do que um ordenamento jurídico. Esta é uma relação privada
internacional.
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Qual a primeira questão que o conservador tem de colocar a si próprio? Se tem competência
internacional ou não. Este problema não é estudado na nossa disciplina, mas, já agora, ele tem
competência se as partes quiserem.
Depois de se pressupor a competência, o segundo problema é a lei aplicável. À luz de que lei
vai o conservador apreciar a capacidade nupcial? Vamos estudar apenas as regras gerais e não
as concretas regras de cada matéria. O enunciado no exame vai indicar a regra de conflitos que
vigora na respetiva matéria – art. 49º CC, neste caso. Isto é assim exceto numa matéria, que
vamos dar a parte especial, que é relativamente aos contratos.
Quanto ao elemento de conexão, o artigo está a mandar aplicar a lei pessoal, e fazemos
sempre uma remissão para o art. 31º/1 CC, que diz que a lei pessoal é a lei da nacionalidade de
cada um deles, mas eles têm diferentes nacionalidades. Esta regra de conflitos está, assim, a
chamar mais do que uma lei (uma para regular a capacidade do Belmiro e outra para regular a
capacidade da Antónia) – conexão múltipla distributiva.
Relativamente à Antónia ela tem duas nacionalidades, é austríaca e saudita. E agora? Este
problema do direito da nacionalidade é objeto do DIP? Não, mas há problemas de nacionalidade
que são questão prévia ao DIP, os chamados conflitos de nacionalidade (positivos ou negativos),
por isso temos de saber resolver esta questão.
O nosso problema é um conflito positivo de nacionalidade, que significa que alguém tem mais
do que uma nacionalidade. Qual a nacionalidade que conta? Para isso temos duas normas, o art.
27º da lei da nacionalidade, que nos diz que quando alguém tem duas ou mais nacionalidades e
uma delas é portuguesa, em Portugal essa pessoa considera-se portuguesa (preferência da
nacionalidade do foro). Subsidiariamente há o art. 28º da lei da nacionalidade, que nos diz que
se alguém tiver duas nacionalidades e nenhuma for portuguesa mas residir num dos países em
que é nacional, conta a nacionalidade do país onde reside. Contudo, neste último caso, pode
acontecer não residir em nenhum dos países em que é nacional, e diz o art. 28º/2ª parte da lei
da nacionalidade, que vale a nacionalidade do país com que tenha a ligação mais estreita.
Estamos perante um conceito indeterminado, parece que o legislador desistiu, por isso quem
vai dar o critério é o julgador, no nosso caso o conservador – a isto se chama a consagração
judicial do princípio da proximidade. Isto é um efeito da flexibilização do DIP. O DIP hoje é mais
flexível, atribuindo mais poderes ao julgador.
Ela reside num dos estados de que é nacional? Sim, na Arábia Saudita. Portanto, em Portugal,
considera-se a lei saudita. Assim, o conservador não pode casá-los, pois ela não pode casar com
18 anos sem a autorização do pai, só a partir dos 21 anos.
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tiver duas nacionalidade e uma for de um estado membro da UE, o DUE opõe-se a que a pessoa
seja considerada nacional de um estado terceiro. Portanto, o DUE não deixa inteira liberdade
aos estados para resolver a plurinacionalidade (determinar qual é a nacionalidade relevante),
pois se estiver em causa um direito conferido pelos tratados aos cidadãos europeus, prevalece
a nacionalidade do estado membro. Na prática, significa que o art. 28º da lei na nacionalidade
nem sempre pode ser aplicado, pois há situações em que temos de o desaplicar e aplicar antes
o DUE. Consideramos a pessoa como cidadão europeu.
Há outro problema que não é do DIP mas que habitualmente se dá nesta disciplina, que é o
problema dos estrangeiros.
No problema da lei aplicável vimos que havia um método clássico – o método conflitual, que
utiliza regras de conflito para escolher a lei aplicável.
Pessoais ou reais;
Os reais são aqueles que olham à localização física do objeto da relação jurídica.
Outro elemento real que podem existir é o local da situação das coisas.
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Factuais ou jurídicos;
Nos factuais, para os concretizarmos, para sabermos para que lei é que eles apontam, só
precisamos dos sentidos, vamos ver a relação jurídica olhando apenas para os sentidos.
Nos jurídicos precisamos de aplicar normas para saber para que lei é que eles apontam.
Os elementos jurídicos podem variar de sistema para sistema, por isso são preferíveis os
elementos de conexão factuais, pois são universais.
Art. 45º CC – conceito-quadro: responsabilidade extracontratual por factos ilícitos, pelo risco
e por factos lícitos → remissão para o regulamento Roma II, pois aplicamos este regulamento a
factos lesivos que ocorreram depois de 17/01/2009; elemento de conexão: local onde ocorreu
a atividade danosa, ou seja, o local onde ocorreu o facto que gerou o prejuízo, e este é real, pois
não olha para os sujeitos, e é factual.
Art. 62º CC → remissão para o art. 31º/1 CC e para o regulamento europeu das sucessões,
que se aplica a pessoas que tenham morrido depois de 17/08/2015. O conceito quadro: sucessão
por morte; elemento de conexão: lei da nacionalidade, e este é pessoal e jurídico, pois para
sabermos a nacionalidade temos de aplicar normas.
O local da celebração é um elemento factual. O local em que a obrigação devia ser cumprida
é um elemento jurídico.
Móveis ou imóveis.
Os móveis podem ver alterar a lei para que apontam. Pode hoje mandar aplicar uma lei e
amanhã outra.
Os imóveis não veem alterar a lei a que apontam, mandam aplicar sempre a mesma lei, não
é possível alterar-se a lei que eles indicam.
Quanto ao local da situação da coisa depende da coisa, se for uma coisa imóvel é um
elemento imóvel, mas se for uma coisa móvel é um elemento móvel.
Quando o legislador utiliza elementos móveis pode criar-se um problema jurídico. Vejamos
o art. 52º CC – conceito quadro: relações entre os cônjuges; elemento de conexão: lei da
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Por vezes o legislador utiliza elementos de conexão móveis mas transforma-os em imóveis,
ou seja, cristaliza-os. Art. 53º CC – conceito quadro: convenções antenupciais e regime de bens;
elemento de conexão: lei da nacionalidade comum dos nubentes ao tempo da celebração do
casamento. Qual o efeito deste expediente do legislador? Mesmo que os cônjuges mudem de
nacionalidade isso não vai ser relevante. A isto dá-se o nome de cristalização ou imobilização
do elemento de conexão móvel.
SISTEMAS DE CONEXÃO
As regras de conflitos podem ter só um elemento de conexão, caso em que se diz que
utilizam um sistema de conexão única ou simples, mas também podem utilizar sistemas de
conexão múltipla, significando isto que uma regra de conflitos tem vários elementos de
conexão que depois se vão conciliar de maneira diferente.
Art. 62º CC – conceito quadro: sucessão por morte; elemento de conexão: lei da
nacionalidade. Este é o único elemento? Sim, este artigo utiliza um sistema de conexão única ou
simples.
Todavia, o legislador, às vezes, não está apenas preocupado em escolher a lei mais próxima.
O legislador conflitual preocupa-se também com outros interesses além deste, e é nessas
alturas que ele utiliza sistemas de conexão múltipla.
O legislador chama duas ou mais leis, mas o julgador aplica apenas uma. “Ou” é sinónimo
desta conexão.
Por qual lei é que o julgador vai optar? Por aquela que satisfizer o interesse/objetivo
anunciado pelo legislador.
Art. 65º CC – conceito-quadro: forma das disposições por morte (testamentos e pactos
sucessórios); elemento de conexão: OU a lei do local da celebração (elemento real e imóvel),
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A regra de conflitos chama duas ou mais leis e o julgador aplica todas aquelas que foram
chamadas.
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Batiffol diz que as conexões múltiplas cumulativas prometem mais do que dão. Prometem
chamar duas ou mais leis e aplicar todas elas, mas, na prática, se todas não aceitarem a
produção do mesmo efeito, só se aplicaria uma lei, a mais exigente e restritiva. Por exemplo,
o caso do art. 60º CC, em que se uma lei disser que sim à adoção, e outra disser que não, não
poderíamos aceitar a adoção, aplicar-se-ia a lei que não admitia.
O legislador chama duas ou mais leis e o julgador vai aplicar apenas uma. Isto também é
assim nas conexões alternativas, com a diferença de que nestas não há hierarquia, enquanto
que nas subsidiárias há uma hierarquia, pois o legislador indica uma preferência. Portanto,
chama várias leis, mas numa relação de subsidiariedade.
A e B celebraram um contrato, regulado pelo CC, e querem saber a lei aplicável a este
contrato, um contrato de compra e venda. A regra de conflitos que vamos utilizar é o art. 41º
CC – conceito-quadro: obrigações provenientes de negócio jurídico; elemento de conexão: lei
que os respetivos sujeitos tiverem designado. E se as partes não escolherem? O legislador diz
no art. 42º/1 CC (critério supletivo) que, na falta de escolha, isto é, na falta de determinação da
lei competente, aplica-se (no caso dos contratos) a lei da residência habitual comum das partes.
O legislador indicou a lei que preferia, mas quando esta falha indica uma conexão subsidiária. E
se não residirem no mesmo país? Neste caso, o legislador indicou outra conexão subsidiária no
art. 42º/2 CC, sendo aplicável a lei do local da celebração.
Porquê que o legislador utiliza conexões múltiplas subsidiárias? O legislador utiliza-as para
obviar a falta de lei aplicável, evitando a não concretização do elemento de conexão.
Estas conexões, em princípio, são utilizadas para evitar a falta de lei aplicável, mas podem
ser também utilizadas para atingir um certo resultado material.
Art. 45º CC – conceito quadro: responsabilidade extracontratual por factos ilícitos, pelo risco
e por factos lícitos; elemento de conexão: local onde ocorreu a atividade danosa. Imaginemos
que o senhor A em Espanha disparou um tiro contra o senhor B que estava em Portugal. Em
Espanha a responsabilidade extracontratual tem um prazo de prescrição de 6 meses e em
Portugal é de 3 anos. Aplica-se a lei espanhola, pois foi o local do facto, do tiro. Se se aplica a lei
espanhola o prazo já passou. Todavia, o art. 45º/2 CC não é uma conexão única, mas sim
subsidiária, dizendo que, se a lei do estado onde se produziu o efeito lesivo considerar
responsável o agente, mas não o considerar como tal a lei do país onde decorreu a sua atividade,
é aplicável a primeira lei. Portanto, esta regra subsidiária vai ser utilizada se a lei espanhola não
responsabilizasse mas a lei portuguesa sim.
Portanto, o legislador às vezes utiliza conexões subsidiárias para atingir um certo resultado
substantivo que ele considera mais justo.
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A regra de conflitos aqui chama duas ou mais leis e o julgador aplica-as todas, mas o
legislador divide a relação jurídica e aplica uma lei diferente a cada parte ou aspeto da relação
jurídica.
Art. 49º CC (único exemplo no CC) – conceito-quadro: capacidade para casar, capacidade para
celebrar convenção antenupcial e ainda o regime da falta e dos vícios da vontade dos
contraentes; elemento de conexão: lei da nacionalidade de cada um dos nubentes. Quantas leis
se está aqui a chamar? Duas, pois a cada nubente se chama uma lei pessoal (lei da
nacionalidade).
Porquê que o legislador utiliza conexões múltiplas distributivas? Permite-se uma maior
justiça formal, no sentido em que se deve escolher a lei mais fortemente conectada, ou seja,
a lei mais próxima, e com conexões distributivas permite-se escolher para cada parte a lei que
é mais próxima dessa parte da relação jurídica. Além disso, facilitam a constituição das
relações jurídicas, pois aplicam os impedimentos de certa lei apenas a uma parte da relação
jurídica.
Imaginemos um senhor português que tem 17 anos e quer casar com uma senhora espanhola
que tem 18 anos. Residem ambos em Espanha. Fazendo funcionar o nosso art. 49º CC vai-se
chamar duas leis, ou seja, a lei da nacionalidade respetiva a cada um dos nubentes. Quanto à lei
portuguesa, esta diz que a partir dos 16 (com autorização dos progenitores ou tutores, ou,
faltando esta, do conservador do registo civil) se pode casar. Na lei espanhola só há capacidade
para tal a partir dos 18 anos. Assim, eles podem casar, uma vez que se aplica a lei portuguesa ao
senhor português (pressupondo aqui que ele teria o consentimento exigido) e a lei espanhola à
senhora espanhola e ambos preenchem os respetivos requisitos da idade. Se o legislador
utilizasse uma conexão única, por exemplo a da residência, aplicar-se-ia, neste caso, a lei
espanhola à capacidade dos dois, e o senhor português não teria capacidade e, por isso, não
poderiam celebrar o casamento.
Imaginemos que A e B casaram em 1965. E hoje põe-se o problema de saber a lei aplicável ao
regime do casamento. Vale a lei que vigorava à data da constituição do casamento (código de
Seabra) ou a atual (código de 1966)?
Nem sempre o julgador, o decisor, se vai ter de preocupar com este problema. Isto porque
o legislador, por vezes, resolve-o, no sentido em que quando ele muda a regra de conflitos,
estabelece um regime transitório e resolve assim esta questão de saber se aplicamos a lei
velha ou a lei nova. Por exemplo, o art. 28º regulamento Roma I resolve esta questão quanto
aos contratos celebrados após 17 dezembro de 2009, na medida em que, aos contratos
celebrados após esta data aplica-se este regulamento. Já quanto aos contratos que foram
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celebrados antes daquela data aplica-se o código civil, nomeadamente os arts. 41º e 42º. O
critério é, portanto, a data de celebração.
O problema põe-se quando o legislador conflitual não tem um regime transitório, coisa que
aconteceu com o código de 1966.
A e B quando casaram vigorava a regra de conflitos do código de Seabra e hoje vigora a regra
de conflitos do art. 52º CC.
A conceção clássica ou tradicional (talvez até maioritária), defendida por Zitelmann, diz que
temos de aplicar a regra de conflitos antiga, do código de Seabra, sob pena de retroatividade.
Não deve aplicar-se a regra de conflitos nova, pois esta não estava em vigor no momento de
celebração do casamento. Aplicar a regra de conflitos nova a um casamento antigo é aplicar uma
regra retroativamente.
Mas pergunta-se, para a Escola de Coimbra este raciocínio não pode ser posto em questão?
Pode. O problema é o de saber se de facto aplicar a regra de conflitos de 1966 é fazer uma
aplicação retroativa da lei, ou seja, trata-se efetivamente de uma aplicação retroativa da nova
regra de conflitos? Não, pois o art. 52º do atual CC não regula aquele casamento.
Neste sentido, Kahn sustentou outra opinião, dizendo-nos que o princípio da não
retroatividade não é aplicado às regras de conflitos porque estas são diferentes das normas
materiais, uma vez que as primeiras são normas sobre normas, não estão a regular situações
passadas, estão apenas a dizer qual é a lei aplicável, estabelecendo um juízo de proximidade.
Ou seja, uma regra de conflitos não é uma norma substantiva (é uma norma de 2º grau), por
isso não regula o casamento.
Por conseguinte, a este casamento deve ser aplicado a regra de conflitos nova.
O Dr. Ferrer Correia e o Dr. Batista Machado concordam com Kahn. Em princípio, não se fala
em proibição da retroatividade, aplicando-se a lei nova. Mas, dizem eles, que isto pode ter um
problema, pois quem pode ser surpreendido pela aplicação da lei nova são as partes, já que
elas podiam estra a contar com a lei velha, a de 1960. Nesta medida, isto vai contra as
expetativas das partes.
Assim, em princípio, aplica-se a regra de conflitos nova, salvo se houver expetativas das
parte na vigência da regra de conflitos antiga. E como é que se sabe se as partes contavam ou
não com a regra de conflitos antiga? Há um critério quanto a esta questão: se no momento da
constituição da relação jurídica havia um contacto com o foro, presume-se que as partes talvez
tenham contado com a lei do foro daquela altura; se não tinham nenhum contacto, não é
crível que contassem com a aplicação da lei antiga.
Imaginemos dois brasileiros que em 1960 casaram, mas residiam em Portugal. A este
casamento devemos utilizar que regra de conflitos? Quando se casaram havia um contacto com
Portugal, por isso podiam expectar que lhe fosse aplicada a regra de conflitos antiga.
Vamos supor agora que duas pessoas brasileiras casaram em 1960 quando residiam na
Argentina e nunca tinham vindo a Portugal, mas agora estão em Portugal, pondo-se aqui o
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problema da lei aplicável a este casamento. Segundo o Dr. Ferrer Correia e o Dr. Batista Machado
aplica-se a lei nova, porque quando eles casaram em 1960 não tinham contacto com Portugal,
então é evidente que nunca contaram com o código de Seabra, não tinham nenhuma expetativa
na aplicação da regra de conflitos antiga.
Para a Escola de Lisboa (Dr. Lima Pinheiro), as regras de conflito são normas
materiais/substantivas, simplesmente são de regulação indireta. Logo, aplica-se sempre a
regra de conflitos antiga, pois se as veem como normas materiais, estas são insuscetíveis de
retroatividade.
Mudaram as normas materiais da lei competente (lex causa). Quais as normas dentro da lei
competente que aplicamos?
Imaginemos que A e B casaram no ano 2000. São brasileiros residentes em Portugal. A lei não
mudou, mas o problema é que em 2000 vigorava um código civil brasileiro e desde 2002 vigora
outro. Aplicamos qual código civil?
A regra de conflitos não mudou, por isso, nos termos do art. 52º CC, continua a ser aplicável
às relações entre os cônjuges a lei da nacionalidade comum que, neste caso, é a lei brasileira.
Mas qual lei brasileira, a que vigorava antes de 2002 ou a que vigora agora?
Isto não é um problema da nossa disciplina, pois trata-se de um problema de conflito de leis
no tempo de um só ordenamento jurídico.
O que o legislador vai fazer é ir ver o direito transitório brasileiro – é um problema próprio
da lei brasileira, temos de o resolver com as regras transitórias (regras intertemporais) do
direito brasileiro.
O DIP não tem nada que ver com isto, pois elegeu a lei aplicável e o resto é um problema de
direito transitório.
Assim, à partida aplicamos o direito brasileiro nos termos definidos por ele.
Neste caso não muda nem a regra de conflitos nem as normas materiais. O problema coloca-
se na concretização do elemento de conexão indicado pela regra de conflitos.
Este problema só se põe naquelas regras de conflito que utilizam elementos de conexão
móveis, aqueles em que pode mudar a lei para que apontam. Neste sentido, no art. 53º CC este
problema nunca se põe, pois o legislador aqui cristalizou o elemento de conexão,
transformando-o de móvel para imóvel – “ao tempo da celebração do casamento”. Mas no art.
52º CC já se põe esta questão.
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A primeira é a de um francês chamado Pillet, que vem dizer que este problema deve orientar
se pelo princípio do reconhecimento de direitos adquiridos, ou seja, se a lei antiga dava um
direito e a lei nova não, nesse caso aplica-se a lei antiga; já se a lei antiga não der um direito
mas a lei nova sim, opta-se pela lei nova. Isto quer dizer que entre as duas leis manda-se aplicar
aquela que reconhecer o direito que se discute. Trata-se de tutelar as expetativas das partes.
Não há nenhuma decisão judicial que adote esta tese em Portugal.
A segunda é de um autor belga que se chama Rigaux, que vem dizer que o objetivo da regra
de conflitos é escolher a lei mais próxima, sendo que a atual é que é a lei mais próxima. Por
isso, escolhe se sempre a lei nova. Quanto a esta proposta também não há nenhuma decisão
que adote esta tese em Portugal.
A terceira é de Batifoll e é seguida pelo Dr. Batista Machado, em que diz que este problema
na prática é muito parecido com o segundo problema que nós já vimos (sucessão de normas
dentro da lei competente). É certo que aqui não se muda o código, mas na prática eles estavam
regidos pela lei da nacionalidade A e agora estão regidos pela lei da nacionalidade B. E é um
problema tão parecido que deve ser resolvido exatamente da mesma maneira, isto é, temos de
ver a resposta na lex causa. Portanto, vamos ver qual a lei nova e vamos ver ao direito
transitório da lei nova se ele aceita a aplicação retroativa. O grande problema desta tese é que
o direito transitório tende a aplicar a lei nova, pois parte do pressuposto que a lei nova é mais
favorável. A sucessão de leis no tempo tende a favorecer a aplicação da lei nova, isto porque
quando muda a lei no tempo dentro de um ordenamento, em princípio, a melhor é a nova. Mas
este raciocínio vale para o conflito móvel? Não, porque não mudaram as leis, não há grande
razão para propiciar a lei nova. Logo, não devemos usar os critérios do direito transitório.
A quarta tese, seguida pelo Dr. Ferrer Correia, diz que isto não é um problema de conflito de
leis no tempo. O conflito móvel não tem nada que ver com conflitos de leis no tempo, pois não
mudaram nem as regras de conflito, nem as normas materiais. Houve uma deslocação da
relação jurídica e, portanto, temos é de ver qual a lei que a regra de conflitos quis indicar como
determinante. Em primeiro, não é aqui aplicável o direito transitório. Em segundo, a solução
procura-se nas regras de conflitos, temos de ver se o legislador quer a lei nova ou a velha. Mas
como é que o juiz retira isto da regra de conflitos? Se estivermos a discutir a validade de uma
situação constituída no passado o que o legislador quer é aplicar a lei antiga; já se estivermos
a discutir os efeitos atuais de uma relação jurídica duradoura, aplica-se a lei da nacionalidade
atual.
Imaginemos A e B que eram brasileiros quando casaram e agora são portugueses. Discute-se
o regime de administração do património comum. Como estamos a discutir que poderes têm
eles hoje em relação à administração dos bens, trata-se de efeitos atuais de uma relação jurídica
duradoura. Aplica-se a lei nova.
Todavia, há regras de conflitos que às vezes mandam aplicar a lei nova e outras vezes a velha.
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Art. 46º CC – é aplicável ao regime da posse, propriedade e demais direitos reais a lei do
Estado em cujo território as coisas se encontrem situadas, ou seja, a lei da localização da coisa.
Pensemos numa coisa que está agora em Portugal mas nem sempre esteve aqui, a situação da
coisa mudou, e hoje há uma ação em Portugal sobre a questão de saber que poderes tem o
senhor A sobre essa coisa. Poderes de propriedade da lei nova ou velha? Nova, porque é um
efeito atual da relação jurídica. Outro exemplo é, imaginemos que alguém adquiriu uma coisa
por usucapião e quando invocou a coisa estava em Espanha. A usucapião é válida ou não? Vamos
resolver este problema à luz da lei antiga ou lei nova? Antiga, porque o que está em causa é a
validade de uma situação já constituída.
CASO PRÁTICO
Esta situação tem contacto com vários ordenamentos jurídicos, por isso é uma situação
plurilocalizada e, consequentemente, é um problema resolvido pelo DIP.
O segundo problema do DIP é saber qual a lei aplicável a esta situação, que regula esta
situação. Para tal, há vários métodos de resolução deste problema de determinação das regras
aplicáveis. Em Portugal vigora um pluralismo metodológico, pois embora a base do sistema seja
o método conflitual (não o do século XIX, mas o moderno), temos o método do DIP material e
temos ainda influências da revolução americana, como normas de aplicação necessária e
imediata. Portanto, no fundo, segue-se um método conflitual que está complementado por
várias influências de outros métodos.
A lei reguladora do contrato é a lei australiana, pois foi a lei escolhida pelas partes. Assim, a
lei aplicável ao contrato é a lei australiana.
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E se as partes não tivessem escolhido? O art. 4º diz que na falta de escolha é aplicável ao
contrato de compra e venda de mercadorias a lei do país em que o vendedor tem a sua
residência habitual. O legislador utiliza aqui uma conexão múltipla subsidiária.
Depois de se saber a lei aplicável o problema está resolvido? Não, falta aplicar a lei. O DIP hoje
interessa-se pelo resultado material (materialização do DIP).
Aplicando a lei australiana, o contrato é válido pois não há nenhuma lei que proíba a
comercialização dos dentes de elefante. Assim, condenar-se-ia o B em responsabilidade
contratual, sendo obrigado a entregar os dentes de elefante ou a pagar uma indemnização, se
tal não for possível.
Contudo, temos de ter em consideração que a Austrália não tem interesses político-
legislativos nos dentes de elefante, por isso percebe-se que não proíba a comercialização dos
mesmos. Todavia, como já sabemos, hoje o DIP preocupa-se com interesses político-legislativos,
aproximando-se das propostas de Currie e Ehrenzweig (politização do DIP – o DIP hoje preocupa-
se com as políticas legislativas das várias leis envolvidas, ou seja, com a ratio legis, a intenção do
legislador ao estabelecer certa norma).
O Quénia tem interesse em regular esta matéria e tem, inclusive, uma norma que proíbe a
comercialização dos dentes de elefante. Além das regras de conflitos, existem hoje normas
espacialmente autolimitadas, que são normas materiais. Estas, por sua vez, dividem-se entre
normas de aplicação necessária e imediata e normas espacialmente autolimitadas em sentido
restritivo.
Se olharmos para o caso, o Quénia tem uma norma de aplicação necessária e imediata, ou
seja, uma norma material que proíbe a comercialização e estabelece o seu próprio âmbito de
aplicação, aplicando-se necessária e imediatamente. Isto é um desvio ao método conflitual.
Normalmente estas normas são da lei do foro. É necessário ver se a lei do foro tem alguma regra
de aplicação necessária e imediata que nos permita passar por cima da nossa própria regras de
conflitos. Não havendo, significa que o nosso legislador não se preocupou com a política
legislativa nesse sentido. Será que devemos aplicar normas de aplicação necessária imediata
estrangeiras e que não sejam da lei competente (como a norma de aplicação necessária e
imediata do Quénia)? Portanto, o julgador deve obediência se for a lei do foro, mas neste caso
temos um problema, pois a norma necessária e imediata é estrangeira e não do foro.
A tese mais tradicional, a tese do estatuto obrigacional, diz-nos que aplicamos as normas
necessárias e imediatas do foro e também aquelas estrangeiras que sejam da lex causa, da lei
competente. A lei competente, neste caso, é a lei australiana.
“A tese do estatuto obrigacional dilui a natureza necessária e imediata das normas”. Esta
afirmação é verdadeira. Isto quer dizer que esta tese faz com que não consideremos que aquelas
normas sejam tratadas como devem, não relevando o facto de serem necessárias e imediatas.
Não estamos a considerar a natureza delas, pois nós já íamos aplicar a lei australiana de qualquer
maneira, ou seja, as normas de aplicação necessária e imediata da lei australiana já se iam aplicar
independentemente de serem normas de aplicação necessária e imediata ou não, porque nós
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já íamos aplicar a lei competente, a australiana. Tratamos estas normas como tratamos as outras
normas.
Se vigorasse esta tese não poderíamos aplicar a lei do Quénia, pois não é a lei competente. O
contrato seria válido, logo haveria um incumprimento e o B seria condenado em sede de
responsabilidade contratual.
A segunda tese é a da conexão especial, seguida pelo Dr. Moura Ramos, que vem dizer que
devemos aplicar as normas de aplicação necessária e imediata do foro, as da lex causa, e
também as do país estrangeiro que tenham uma ligação forte ao caso, ou seja, aquelas que
tenham uma ligação ao caso que fosse suscetível de integrar um elemento de conexão (a
residência, nacionalidade, local da celebração, local do cumprimento). Isto é assim em nome da
harmonia jurídica internacional, para aplicarmos as mesmas regras que se aplicariam no Quénia.
Nesta tese aplica-se a lei do Quénia se houver uma ligação especial do Quénia a este contrato,
e há, porque foi lá que o contrato foi celebrado. Por isso, aplica-se a lei do Quénia e o contrato
seria nulo.
Há uma variante desta segunda tese, defendida pelo Dr. Lima Pinheiro, que diz que só se
aplica a lei do país que tiver uma especial ligação ao caso se houver autorização legal expressa.
Há ainda uma terceira tese, a da tomada em consideração, que diz que o julgador não pode
aplicar normas necessárias e imediatas estrangeiras, mas tem de as ter em consideração no
modo como aplica a lei competente. Não se pode aplicar a lei do Quénia, mas o juiz quando
aplica a lei competente, a australiana, tem de se lembrar que existe uma norma necessária e
imediata do Quénia. Assim, quando ele vai aplicar a lei australiana, o contrato seria válido. Mas
ao aplicar a lei australiana, vai apreciar pressupostos da responsabilidade de B e tem de se
lembrar que havia uma norma do Quénia. Em que pressuposto isto pode fazer toda a diferença?
Na apreciação da culpa, pois o juiz ao aplicar a lei australiana vai considerar não culposa a
violação do contrato. Ao considerar não culposa, não há indemnização.
Qual é a tese que devemos seguir? É uma opção do julgador escolher qualquer uma das três
grandes teses, mas há alguns instrumentos de DIP que têm uma solução para isto, e um dos
casos é precisamente o regulamento Roma I. Este regulamento tem uma solução para este
problema, no seu art. 9º. No nº 1 temos uma definição de uma norma necessária e imediata,
mas este número não é uma norma necessária e imediata. O nº 2 trata do problema de saber se
podemos aplicar as normas necessárias e imediatas do foro (no nosso caso prático é Portugal),
dizendo que as disposições do regulamento não podem limitar a aplicação das normas de
aplicação imediata do país do foro. No nº 3 é que temos uma solução para a aplicação de normas
necessárias e imediatas estrangeiras no domínio do contratos, referindo que pode ser dada
prevalência (o juiz é que decide, há uma discricionariedade jurisdicional) às normas de aplicação
necessária e imediata da lei do país onde o contrato deva ser executado e se elas tornarem o
contrato ilegal – “pode ser dada prevalência às normas de aplicação imediata da lei do país em
que as obrigações decorrentes do contrato devam ser ou tenham sido executadas, na medida
em que, segundo essas normas de aplicação imediata, a execução do contrato seja ilegal”.
Como sabemos o país onde o contrato devia ser executado? Como sabemos se é o Quénia?
Qual a lei que nos vai dizer qual a lei de cumprimento do contrato? É a lei que regula o contrato
que nos diz a lei do lugar do cumprimento do contrato, ou seja, é a lei australiana que nos vai
dizer.
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Qual das teses é que o regulamento consagrou? A da conexão especial (Dr. Moura Ramos),
mas com autorização conflitual expressa (Dr. Lima Pinheiro).
PROBLEMA DA QUALIFICAÇÃO
A qualificação está para as normas de conflito como a hipótese está para as normas
materiais.
O método de qualificação consagrado no art. 15º CC escolhe uma regra ou várias regras de
conflito em simultâneo? Escolhe várias. Não escolhemos uma porque não fazemos uma
qualificação primária. Utilizamos várias regras de conflito e vamos ver qual a lei competente
para cada uma delas. Aplicamos as leis correspondentes às matérias de cada uma das regras,
ou seja, aplicamos a lei 1 à matéria x e a lei 2 a matéria y.
CASO PRÁTICO
Qual a diferença entre as alíneas a) e b)? A primeira pede-nos para resolver o caso com o
método de qualificação prescrito no art. 15º CC, e a segunda com o método de qualificação
tradicional.
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a) Quid iuris, tendo em conta o disposto nos arts. 40.º, 41.º, 42.º e 52.º do CC, sabendo
que o DIP dinamarquês manda aplicar aos negócios jurídicos a lei do local da celebração
e às relações familiares a lei da nacionalidade comum dos cônjuges?
Os arts. 41º e 42º CC foram substituídos pelo regulamento Roma I, mas não totalmente. Qual
o conceito-quadro do regulamento Roma I? As obrigações contratuais, provenientes de um
contrato. Já o conceito-quadro do art. 41º CC é as obrigações provenientes de negócios jurídicos.
Há dois tipos de negócios jurídicos: unilaterais e bilaterais (contratos). Quanto aos contratos,
utilizamos o regulamento Roma I, mas quando estamos perante negócios unilaterais utiliza-se
os arts. 41º e 42º CC.
Como se vai resolver este caso? Bom, vamos ter de escolher a lei aplicável.
Não podemos perguntar-nos que tipo de problema é este para nós, ou seja, para a lei
portuguesa, e resolver assim o caso, pois não resolvemos isto com a qualificação primária. É-nos
indiferente saber como a lei portuguesa resolve a questão.
Primeiramente, isto é um problema do DIP? Sim, pois é uma situação plurilocalizada, tem
contacto com vários ordenamentos jurídicos.
Primeiro problema, o tribunal português tem competência para resolver este caso? Neste
disciplina presumimos sempre que sim.
Segundo problema, saber qual a lei aplicável segundo o método conflitual, que,
tendencialmente, tem por critério razões de proximidade ao caso.
Será que isto é um problema de direito da família? Será que é um problema de prescrição?
Não é a lei do foro que vai decidir. Vamos aplicar em simultâneo várias regras de conflito e
aplicamos a cada matéria só as normas das várias leis chamadas.
Primeiro vamos identificar os conceitos-quadro de cada uma das regras de conflitos. São estas
as regras de conflito:
→ Art. 52º CC – conceito-quadro: relações entre os cônjuges. Podemos utilizar esta regra
de conflitos para determinar a lei aplicável a sujeitos que tenham uma união civil
registada? Sim, pois fazemos uma interpretação autónoma e teleológica. Trata-se de
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um instituto afim. Cônjuges para efeitos do art. 52º CC abrange os cônjuges da lei
portuguesa e outras figuras parecidas, é um conceito amplo.
Vamos ter uma lei aplicável para cada uma das regras de conflitos. Aplicamos várias leis
diferentes para cada matéria diferente, ou seja, aplicamos a cada uma das matérias identificadas
a lei competente na parte a que dizem respeito.
Depois de elencarmos as regras de conflitos, temos de determinar a lei que cada uma delas
está a designar, olhando para o elemento de conexão.
→ Art. 40º CC – elemento de conexão: lei que regular a obrigação que eventualmente
prescreveu. Esta artigo utiliza um elemento de conexão dependente. A lei que regula
a obrigação é a lei portuguesa, por isso a lei que regula a prescrição é também a lei
portuguesa;
→ Art. 41º CC – elemento de conexão: escolha das partes. Qual o negócio jurídico aqui
em causa? Uma promessa pública. Mas a Anna não escolheu a lei aplicável;
Perante isto, vamos agora ver o art. 15º CC, que diz que “a competência atribuída a uma lei
abrange somente as normas que, pelo seu conteúdo e pela função que têm nessa lei, integram
o regime do instituto visado na regra de conflitos”. Portanto, o art. 40º CC, cujo conceito-quadro
é a prescrição e caducidade, está a mandar aplicar a lei portuguesa, mas só as normas
portuguesas que pelo seu conteúdo e função que tenham na lei a que pertencem sejam relativas
à prescrição e caducidade; não vamos convocar todo o ordenamento jurídico. Os arts. 41º e 42º
CC mandam aplicar a lei portuguesa, mas só uma parte, só aquelas normas relativas às
obrigações provenientes dos negócios jurídicos. O art. 52º CC manda aplicar a lei dinamarquesa,
mas só as normas (materiais) relativas a relações entre os cônjuges.
Numa segunda fase, temos de elencar as normas materiais dos vários ordenamentos jurídicos
que estão a ser chamados, ou seja, dos vários ordenamentos jurídicos conectados, e que
resolveriam o problema, as normas materiais em que as partes baseiam as suas respetivas
pretensões.
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→ Art. 318º/a) CC – a que lei é que esta norma material pertence? À lei portuguesa. O
que é que ela faz? Suspende a prescrição durante o casamento;
→ Art. 309º CC – é uma norma da lei portuguesa e estabelece o prazo geral da prescrição
em 20 anos;
→ Art. 459º CC – é uma norma da lei portuguesa e estabelece que a promessa pública é
fonte de obrigações;
A seguir a termos identificado as normas materiais, vamos agora olhar para as várias normas
materiais e perceber, atendendo ao conteúdo e função que têm na lei a que pertencem, se são
normas do regime da prescrição, dos negócios jurídicos ou das relações entre os cônjuges.
Vamos perceber que tipo de normas são estas, para saber se são ou não aplicáveis. Vamos então
qualificá-las e integrá-las num sistema jurídico.
→ Art. 309º CC – qual o seu conteúdo e função, ou seja, qual a política-legislativa desta
norma? Esta norma estabelece o prazo geral de prescrição em 20 anos, sendo este o
seu conteúdo, e a sua função principal é garantir a segurança e certeza das relações
jurídicas. Além disso, há aqui um incentivo ao credor de rapidamente (em tempo útil)
exercer os seus direitos. Atendendo a este conteúdo e função, esta é uma norma
relativa à prescrição. Por conseguinte, vai subsumir-se ao conceito-quadro do art. 40º
CC. Por sua vez, o art. 40º CC manda aplicar a lei portuguesa e o art. 309º é da lei
portuguesa. Assim, esta norma é aplicável;
→ Art. 459º CC – prevê um negócio jurídico unilateral que gera obrigações (conteúdo),
a promessa pública, e fá-lo para vincular/obrigar aquele que profere a promessa
(função). Atendendo a este conteúdo e função, esta é uma norma do regime das
obrigações negociais. Por conseguinte, vamos subsumir esta norma no conceito-
quadro dos art. 41º e 42º CC. Estes artigos mandam aplicar a lei portuguesa, e como
o art. 459º CC é uma norma portuguesa, ela é, assim, aplicável;
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O negócio é vinculativo ou não? Sim, por força do art. 459º CC, que já vimos que se aplicava.
Isto significa, na prática, que Anna está obrigada aos 500 euros.
O prazo já prescreveu? Não, pois vamos aplicar a norma portuguesa, o art. 309º CC, sendo o
prazo de 20 anos.
Esteve suspenso o prazo de 20 anos durante o casamento? Não, pois não aplicamos o art.
318º/a) CC.
Temos de ver qual é a norma do foro que resolveria o problema, pois é esta que nos diz a
natureza jurídica do problema.
Vamos encontrar apenas uma regra de conflitos e vamos aplicar apenas uma lei.
Se este caso fosse puramente interno, qual a norma-chave que resolveria sem mais este
caso? Art. 318º/a) CC. Para a lei do foro esta é uma norma sobre as relações entre os cônjuges.
Assim, utilizamos a regra de conflitos do art. 52º CC e a lei dinamarquesa é a lei competente.
A doutrina da qualificação lege fori diverge sobre a questão de se saber como se faz a
qualificação secundária. Aplicam-se todas ou só algumas normas? Segundo Ago, aplicam-se
todas as normas, faz um chamamento indiscriminado. Segundo Robertson, chamamos só
algumas normas, faz um chamamento circunscrito.
Para Ago, chamamos todas as leis dinamarquesas. Se pusermos o caso à luz de toda a lei
dinamarquesa, o negócio não é vinculativo, mas mesmo que fosse já prescreveu (prazo de 5
anos) e não há suspensão por força do casamento. A solução neste caso seria que a Anna tem
razão e seria absolvida.
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Este método é muito mais simples que o da alínea a). Contudo, tem quatro problemas graves
[aulas teóricas].
CASO PRÁTICO
Isto é um problema do DIP, pois é uma situação que está em contacto com vários
ordenamentos jurídicos (italiano, austríaco, alemão e português). É uma situação
plurilocalizada.
Vamos agora concretizar as regras de conflito e perceber para que lei é que apontam.
→ Art. 3º/1 regulamento Roma I – elemento de conexão: lei escolhida pelas partes e
elas escolheram a lei portuguesa;
→ Art. 46º CC – elemento de conexão: lei da situação da coisa e a coisa está em Berlim,
o que significa que manda aplicar a lei alemã.
→ Art. 408º/1 CC – estabelece o modo de sistema dos direitos reais, que é o sistema de
título: os direitos reais transmitem-se por mero efeito do contrato (princípio da
consensualidade);
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A seguir a termos identificado as normas materiais, vamos agora olhar para as várias normas
materiais e perceber, atendendo ao conteúdo e função que têm na lei a que pertencem, à luz
do art. 15º CC, a que regime é que pertencem. Vamos perceber que tipo de normas são estas,
para saber se são ou não aplicáveis.
→ § 873 BGB – tem como conteúdo a exigência do registo para a transmissão dos
direitos reais, e como função o facto de o legislador ter querido criar um sistema de
modo na transmissão dos direitos reais. É uma norma sobre direitos reais, por isso
reconduz-se ao conceito-quadro do art. 46º CC. Em matéria de direitos reais
aplicamos normas alemãs e esta norma é alemã, por isso aplica-se. Nós mandamos
aplicar a uma lei estrangeira e ela considera-se competente? Sim;
CONCLUSÃO: aplica-se a lei alemã, o que significa que a propriedade transmite-se com o
registo, por isso a coisa é do vendedor, pois ainda não houve registo da compra e venda.
CASO PRÁTICO
Segundo a lei portuguesa, nos termos do art. 1987º CC, depois de decretada a adoção já não
é possível estabelecer a filiação natural do adotado. Temos de verificar se é aplicável o disposto
no art. 1987º CC.
Os arts. 56º e 60º CC têm as regras de conflitos convocadas para o caso. As regras de conflito
espanholas dizem que “o DIP espanhol submete a adoção internacional à lei da residência do
adotado”.
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Como não fazemos qualificação primária, é indiferente saber para a lei do foro se estamos
perante um problema de adoção ou não. Não vigora o método de qualificação tradicional (lege
fori), pois tal 1) violaria a harmonia jurídica internacional; 2) bloqueia perante institutos jurídicos
desconhecidos; 3) viola a paridade do tratamento das ordens jurídicas; 4) esta qualificação é
desnecessária, pois é a própria regra de conflitos que escolhe a lei competente.
Desde logo, temos de identificar o caso como um problema do DIP, uma vez que estamos
perante uma situação plurilocalizada, que convoca o ordenamento português e o ordenamento
espanhol.
Em segundo, temos de determinar a lei aplicável, isto é, a lei à luz da qual o juiz vai avaliar o
problema da perfilhação. Se não fazemos uma qualificação primária, aplicamos várias regras de
conflitos em simultâneo, ou seja, para cada matéria vai ser aplicada uma regra de conflitos, que
convoca determinada lei a aplicar, e desta lei aplicamos apenas as normas em relação às quais
o seu conteúdo e função sejam relativos àquela questão.
Vamos identificar e concretizar as regras de conflitos, ou seja, saber qual a lei para que elas
apontam.
A nossa regra de conflitos, ao mandar aplicar uma lei estrangeira, pode acontecer um conflito
de sistemas, ou seja, a lei espanhola não se considerar competente nesta matéria e reenviar a
questão para outra lei. Nesses casos, temos de verificar se é aceitável o reenvio. Aceitamos o
reenvio se tal favorecer a harmonia jurídica internacional (posição pragmática do reenvio –
reenvio-coordenação)
A lei espanhola manda aplicar a lei da residência da criança. Neste caso, a criança reside em
Espanha, por isso a lei espanhola considera-se competente, logo não há o problema do reenvio.
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Por força do art. 56º CC, só aplicamos as normas portuguesas que pelo seu conteúdo e função
sejam relativas à matéria da filiação. E, por força do art. 60º CC, só aplicamos as normas
espanholas que pelo seu conteúdo e função sejam relativas à matéria da adoção.
Importa agora escolher e qualificar as normas materiais potencialmente aplicadas neste caso.
Qualificar a norma é saber qual o seu conteúdo e a sua função (levar em conta a política
legislativa das normas), de forma a sabermos qual o regime jurídico que se aplica.
→ Art. 1987º CC (lei portuguesa) – tem como conteúdo estabelecer uma exceção ao
princípio fundamental da constituição da filiação (princípio da verdade biológica) e
tem como função proteger a adoção. Temos claramente uma norma sobre a matéria
da adoção, o que significa que se vai subsumir ao art. 60º CC. Por sua vez, o artigo 60º
CC considera competente, em matéria de adoção, a lei espanhola, e como esta é uma
norma portuguesa não vai ser aplicada.
CONCLUSÃO: não se aplica o art. 1987º CC, que diz que é proibido perfilhar a criança, ou seja,
a solução é que se permite perfilhar a criança.
Note-se que é preciso ter em consideração que a aplicação de leis diferentes pode levar a
resultados chocantes e como tal temos sempre ainda de testar o resultado. O expediente do art.
32º CC (ordem pública internacional) permite afastar o DIP quando os resultados sejam
chocantes para os nossos princípios fundamentais.
CASO PRÁTICO
Isto é um problema de DIP, pois é uma situação plurilocalizada, estando em contacto com
vários ordenamentos jurídicos.
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→ Art. 25º CC – conceito-quadro: aqui temos a regra geral, que foi esvaziada pelos
artigos seguintes, logo só vale para o estado dos indivíduos e capacidade das pessoas;
→ Art. 52º CC – elemento de conexão: lei da nacionalidade comum dos cônjuges. Mas
como estamos perante uma conexão múltipla subsidiária, não tendo os cônjuges a
mesma nacionalidade, é aplicável a lei da sua residência habitual. Ambos residem em
Portugal, logo, é aplicável a lei portuguesa. Não temos um problema de reenvio,
porque aplicamos a nossa lei;
Aplicamos agora o art. 15º CC. Segundo o art. 25º CC, em matéria de capacidade aplicam-se
as normas italianas que pelo seu conteúdo e função sejam relativas à capacidade. Segundo o
art. 52º CC, em matéria de relações entre os cônjuges aplicam-se as normas portuguesas que
pelo seu conteúdo e função sejam relativas às relações entre os cônjuges. Segundo o art. 21º
Regulamento UE 650/2012, em matéria da sucessão aplicam-se as normas italianas que pelo seu
conteúdo e função sejam relativas à matéria da sucessão.
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→ Art. 59º CC italiano – regula a capacidade em geral e tem como conteúdo a plena
capacidade para repudiar sem o consentimento do cônjuge do sucessível. Esta norma
é sobre a capacidade, por isso subsume-se ao art 25º CC. O art. 25º CC considera
competente a lei italiana, e sendo esta norma italiana significa que se aplica.
Estas duas normas aplicam-se, por isso estamos face de um conflito positivo de qualificações.
Aplicamos leis diferentes a matérias diferentes, mas as normas italianas em matéria de
capacidade são incompatíveis com as normas portuguesas sobre a relação entre os cônjuges.
Isto acontece porque as fronteiras entre as várias matérias nem sempre são estanques. As
normas sobre a capacidade acabam por produzir efeitos nas relações entre os cônjuges, e vice-
versa.
O sistema tradicional é muito mais simples e nunca gera conflitos de qualificações. O sistema
de conflitos português gera estes problemas, mas muito raramente.
Se há soluções incompatíveis vamos ter de hierarquizar as regras de conflitos (arts. 25º e 52º
CC). O Dr. Ferrer Correia prevê alguns critérios de hierarquização:
Como não é possível resolver ao nível do DIP/regras de conflitos, vamos resolver entre as
normas materiais incompatíveis. Se houver normas gerais e especiais, devemos escolher as
especiais. É o nosso caso, pois temos normas especiais que regulam o repúdio da herança entre
os cônjuges e normas gerais sobre a capacidade. Preferimos as normas especiais, que são as
portuguesas.
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Primeiro, na qualificação primária, qualificamos os factos à luz da lei do foro para escolhermos
uma regra de conflitos e uma lei competente. Aplicar-se-ia o art. 1683º CC: norma sobre relações
entre os cônjuges, que prevê uma ilegitimidade conjugal. Para a lei do foro trata-se de um
problema de relações entre os cônjuges, logo vamos utilizar a regra de conflitos do art. 52º CC
e, como tal, a lei competente é a lei portuguesa.
Este método não coloca um problema de conflito de qualificações, porque só escolhe uma lei
a aplicar.
A doutrina portuguesa refere que a dupla qualificação tem quatro problemas mais graves do
que o problema dos conflitos de qualificações.
CASO PRÁTICO
a) Quid iuris? Cfr. artigos 46.º CC e arts. 21.º e 22.º do Regulamento (UE) 650/2012.
Este caso interessa ao DIP? Sim, pois é uma situação plurilocalizada, tendo contacto com
vários ordenamentos jurídicos.
Qual a lei aplicável? À luz de que regras se vai determinar a solução do caso? Há vários
métodos de resolução do conflito de leis. Em Portugal, vigora um pluralismo metodológico, mas
o sistema parte via de regra do método conflitual.
O que é o método conflitual? Através de regras de conflitos vamos escolher a lei, de entre as
aplicáveis ao caso, que aparece como sendo a mais próxima do caso.
Põe-se o problema de saber qual a/as regras de conflitos que devem ser mobilizadas perante
este caso. A este problema chama-se o problema da qualificação. Como vai funcionar? Não
vamos perguntar à lei do foro que tipo de matéria é esta, não fazemos uma qualificação lege
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fori, ao invés, vamos utilizar várias regras de conflitos em simultâneo e aplicamos a cada matéria
só as normas das várias leis chamadas.
Primeiro vamos saber quais as leis competentes para cada matéria, elencá-las e concretizá-
las, e depois numa segunda fase fazemos a qualificação de normas materiais.
Que regras de conflitos devemos utilizar aqui? Elas são dadas no caso prático.
→ Arts. 21º e 22º do Regulamento UE 650/2012 (substitui o art. 62º CC para as pessoas
que tenham morrido depois de 2015) – conceito-quadro: sucessão.
Vamos concretizar as regras de conflitos. É aqui que pode surgir um problema de reenvio.
→ Art. 46º CC – elemento de conexão: lei da situação da coisa, ou seja, a lei inglesa.
Como a nossa regra de conflitos considera aplicável uma lei estrangeira temos de ver
se esta se considera competente ou remete para outra lei. Que lei é que o direito
inglês manda aplicar? No enunciado diz que o DIP inglês tem opções conflituais iguais
à nossa, ou seja, ele manda aplicar também a lei da situação da coisa, logo, considera-
se competente, pois remete para ele próprio. Assim, não temos nenhum problema
de reenvio para resolver;
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→ Norma inglesa – a Coroa/o Estado inglês tem um direito real de ocupação das pessoas
que morram sem familiares.
Temos aqui soluções diferentes por isso importa saber qual a norma a aplicar. Para tal, temos
de saber o seu conteúdo e função e perceber se são relativas a direitos reais ou a sucessões.
Temos de saber qual o regime jurídico que integram.
→ Norma inglesa – conteúdo: atribui ao Estado um direito real de aquisição (direito real
de ocupação) sobre os imóveis situados em Inglaterra; função: serve para não haver
imóveis sem dono. É uma norma relativa aos direitos reais ou à sucessão? É uma
norma do regime dos direitos reais, não tem preocupações sucessórias. Se é uma
norma jurídico-real subsume-se no art. 46º CC. Consequentemente, em matéria de
direitos reais são aplicadas as normas inglesas, por isso esta norma aplica-se.
O que fazemos quando isto acontece? Vamos tentar hierarquizar, escolher apenas uma.
Vamos escolher entre normas materiais ou regras de conflitos? À partida, devemos escolher
entre regras de conflitos. Só quando isso não for possível é que temos de escolher entre normas
materiais. Algum dos três critérios serve? Sim, temos um conflito aplicável aos direitos reais e à
sucessão (uma das matérias elencadas no art. 25º – estatuto pessoal). Neste sentido, fazemos
prevalecer a qualificação dos direitos reais face à qualificação sucessória, pois a ligação da coisa
ao estado em que se situa (isto vale apenas para imóveis) é maior do que a ligação da pessoa ao
estado em que reside, uma vez que a coisa não pode mudar de sítio, enquanto que as pessoas
podem mudar de residência ou nacionalidade. Além disto, também por razões de efetividade,
uma vez que se aplicássemos a lei das sucessões, o Estado português ficaria com o bem, e a
sentença portuguesa corria o risco de não ser reconhecida no país em que queremos que
produza efeitos, ou seja, no país da situação da coisa (Inglaterra). Com estes dois argumentos,
deve prevalecer o art. 46º CC.
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Em matéria de direitos reais, vale o art. 46º CC, que tem como elemento de conexão a lei da
situação das coisas, e os bens estão em Portugal, por isso aplica-se a lei portuguesa. Pode haver
reenvio? Não, pois não mandámos aplicar uma lei estrangeira.
Vamos ao art. 15º CC, e em matéria de direitos reais aplicamos a lei portuguesa, mas só
algumas normas, aquelas que sejam relativas a direitos reais; em matéria de sucessões aplica-
se a lei inglesa, mas só algumas normas, aquelas que sejam relativas à sucessão.
O art. 2152º CC é uma norma sobre sucessões, por isso subsume-se ao regulamento das
sucessões. Esta norma aplica-se? Não, pois a lei competente para as sucessões é a lei inglesa.
A norma inglesa é uma norma sobre direitos reais, subsumindo-se no conceito-quadro do art.
46º CC. Esta norma aplica-se? Não, pois a lei competente é a lei portuguesa.
Afinal, para quem vão os bens? Estamos perante um conflito negativo de qualificações, pois
as leis que estamos a chamar para cada matéria não têm normas do regime jurídico pela qual
foram chamadas e isso provoca um vácuo jurídico, não há regras para resolver. Contudo, o juiz
não pode deixar de resolver o caso, por isso o que ele tem de fazer é recorrer a uma forma de
adaptação, pois o sistema bloqueou. Permite-se ao juiz que ele modique o sistema.
Segundo o Dr. Ferrer Correia e o Dr. Batista Machado este problema resolve-se da seguinte
forma. Numa primeira fase, temos de saber qual a qualificação que vai ser hierarquicamente
superior, aquela que deve prevalecer e, para isso, utilizamos os critérios de hierarquia das regras
de conflitos. Neste caso deve prevalecer a qualificação real, ou seja, o art. 46º CC. Isto permite-
nos saber qual a solução, pois em matéria de direitos reais aplica-se a lei portuguesa, por isso
tem de ser ela a dar a solução. De seguida, temos de determinar qual seria a norma que o
sistema português aplicaria caso fosse uma situação interna. A norma que se aplicaria seria o
art. 2152º CC, e o bem iria para o Estado português como herdeiro. Contudo, não estamos a
conseguir aplicar esta norma pois ela tem natureza sucessória e nós chamámos a lei portuguesa
para a matéria dos direitos reais. Perante isto, numa segunda fase, vamos ficcionar uma solução
(qualificação subsidiária), ficcionando que aquela norma tem natureza relativa aos direitos reais,
subsumindo-se no art. 46º CC e, nesse caso, dizemos que em matéria de direitos reais aplicam-
se normas portuguesas, podendo então aplicar esta norma.
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CASO PRÁTICO
Neste caso o que falta aqui? Faltam as regras de conflito. Nos exames vão sempre aparecer
as regras de conflito, mas nas aulas práticas vamos procurá-las.
Pergunta-se no caso se ele tem ou não capacidade para casar? Não se nos pede para dar
solução ao caso, pergunta-se apenas qual a lei aplicável.
Qual a regra de conflitos sobre capacidade nupcial? É uma matéria em que ainda não houve
unificação das regras de conflito a nível europeu. É o art. 49º CC, cujo conceito-quadro é a
capacidade para contrair casamento ou celebrar a convenção antenupcial e ainda o regime da
falta e dos vícios da vontade dos contraentes. O elemento de conexão é a lei da nacionalidade
de cada um dos nubentes. O sistema de conexão aqui presente é uma conexão múltipla
distributiva, manda aplicar duas leis diferentes, uma para cada parte da relação jurídica. Neste
caso, como estamos apenas a discutir a capacidade de A, aplica-se a lei brasileira.
Contudo, mandámos aplicar uma lei estrangeira por isso temos de ir ver o DIP dela, pois pode
acontecer que ela não se considere competente, entrando em conflito com o nosso sistema.
Pode haver um problema de reenvio.
Em matéria de reenvio temos posição pragmática, pelo que quando manda aplicar a lei
brasileira, não quer dizer que se aplique mesmo essa, temos de ver o DIP brasileiro, que lei seria
lá aplicável.
Sobre o DIP brasileiro precisamos da sua regra de conflitos e também da sua posição em
matéria de reenvio. O elemento de conexão brasileiro é o domicílio, e o domicílio deste senhor
é Portugal, por isso entra em conflito connosco. A sua posição em matéria de reenvio é de
referência material. Portanto, lei 1 remete para lei 2 (brasileira), e lei 2 remete para a lei 1, com
referência material, o que significa que aplica a lei 1 desconsiderando as regras de conflito dela
(retorno direto). Temos um conflito negativo de sistemas, pois a lei 2 não se considera
competente.
Será que devemos aplicar a lei que tínhamos escolhido (lei 2) ou devemos abdicar da lei que
tínhamos escolhido para aplicar a lei que o sistema que considerámos competente aplica (lei 1)?
Por outras palavras, devemos aceitar o reenvio para outra lei? A nossa posição em matéria de
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Começamos sempre por ver primeiro o que fazem as outras leis, sendo que só decidimos o
que fazer depois disso. Vamos ver que lei seria aplicável no DIP brasileiro, pondo-se o juiz
português “na cadeira” do juiz brasileiro para ver a sua regra de conflito e a sua posição na
matéria de reenvio, para saber que lei é que ele aplicaria. O DIP brasileiro manda aplicar as
normas materiais portuguesas, desconsiderando as regras de conflito portuguesas – manda
aplicar a lei do domicílio com referência material. Se o caso se colocasse em 2, ou seja, se a
questão da capacidade nupcial deste senhor fosse colocada no Brasil, seria aplicada a lei
portuguesa. Assim, do ponto de vista da harmonia jurídica internacional, queremos aplicar a lei
que tínhamos indicado ou aceitar o reenvio? Devemos aceitar o reenvio.
Temos autorização legal para aceitar o reenvio? Vamos ver ao art. 18º/1 CC (pois isto é uma
situação de retorno) qual o requisito para podermos aceitar o reenvio – “Se o direito
internacional privado da lei designada pela norma de conflitos devolver para o direito interno
português, é este o direito aplicável”. Portanto, se o DIP da lei 2 estiver a aplicar a lei portuguesa,
é o direito português que devemos aplicar. Assim, podemos aceitar o reenvio e consideramos
que a lei aplicável é a lei portuguesa, conseguindo, assim, a harmonia jurídica internacional.
O caso terminou aqui? Não, pois estamos em matéria de estatuto pessoal, uma vez que
mandámos aplicar a lei da nacionalidade. Nestes casos, aceitar o reenvio envolve um risco, o
risco de aplicar uma lei que a pessoa não conhece, que não tem conexão com a pessoa. Por isso,
quando aceitamos o reenvio nos termos do art. 18º/1 CC em matéria de estatuto pessoal, o
nosso legislador vai ter mais cuidados, pois vai exigir a harmonia jurídica qualificada, ou seja, vai
aceitar o reenvio apenas se as duas leis mais importantes para a pessoa (residência e
nacionalidade) estiverem de acordo em aplicar a lei a que nós chegámos. Para tal, vamos olhar
ao art. 18º/2 CC, pelo que o reenvio só se mantém “se o interessado tiver em território
português a sua residência habitual ou se a lei do país desta residência considerar igualmente
competente o direito interno português”. Assim, mantém-se o reenvio se, das dou uma, o
interessado residir em Portugal ou residir em país que considera aplicável a lei 1, a lei
portuguesa. Neste caso preenche-se um dos requisitos adicionais, pois o interessado reside em
Portugal, por isso podemos aceitar o reenvio. Isto porque ao preencher-se um dos requisitos,
significa que há harmonia jurídica qualificada.
De qualquer maneira vamos verificar se realmente existe harmonia jurídica qualificada. A lei
da nacionalidade, que é a lei 2, aplica a lei 1; A lei da residência, que é a lei 1, aplica também a
lei 1. Temos aqui harmonia jurídica qualificada, pois a lei da nacionalidade e a lei da residência
estão de acordo, daí deixarmos funcionar o reenvio.
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CASO PRÁTICO
• A, alemã e com residência habitual em Espanha, pediu uma indemnização por danos
sofridos à sua honra e consideração em decorrência da publicação, num jornal
português e em Julho de 2018, de um artigo escrito por B, espanhol e residente em
Espanha. Sabendo que a lei espanhola considera aplicável a lex loci delicti e pratica a
devolução simples, que lei considera aplicável?
1- Sabendo que a lei espanhola considera aplicável a lex loci delicti e pratica a devolução
simples, que lei considera aplicável?
Pede-se a lei aplicável à responsabilidade civil, que é determinada pelo art. 45º CC. O art. 45º
CC remete para o Regulamento Roma II (fenómeno de europeização das regras de conflitos),
para factos ocorridos depois de janeiro de 2009, que é o caso, pois o artigo foi publicado em
julho de 2018. Contudo, este regulamento não substitui a 100% o art. 45º CC, deixando de fora
a responsabilidade civil por violação de direitos de personalidade; aí utiliza-se na mesma o art.
45º CC.
O art. 45º CC manda aplicar que lei? A lei do local onde ocorreu o dano, e este ocorreu em
Portugal, pelo que manda aplicar a lei portuguesa. Contudo, nos termos do seu nº 3, que contém
uma cláusula de exceção, quando o agente e o lesado têm a mesma residência, a lei a aplicar é
a lei da residência comum, que é o caso, por isso aplica-se a lei espanhola.
Ao mandarmos aplicar uma norma estrangeira temos de ver se ela se considera competente
ou remete para outra lei. A lei espanhola considera aplicável a lei do local onde ocorreu o dano,
e ele ocorreu em Portugal. Assim, remete para a lei 1, para a lei portuguesa. Qual a sua posição
em matéria de reenvio? É de devolução simples (referência global – favorável ao reenvio).
Isto é um retorno, então só aceitamos o reenvio se se cumprirem os requisitos do art. 18º CC.
A nossa posição de reenvio é pragmática, por isso temos de ver que leis é que os outros
sistemas consideram aplicáveis. O tribunal espanhol aplicaria a lei 1, a lei portuguesa, com
devolução simples, o que significa que não vai necessariamente aplicar a lei portuguesa, mas
sim aquela que a regra de conflitos de 1 estiver a aplicar. Assim, se o caso se pusesse em Espanha
aplicar-se-ia a lei 2, a lei espanhola.
Perante isto, nós queremos aceitar o reenvio ou não? Não seria útil aceitar o reenvio porque
nós já tínhamos escolhido a lei 2. Mas para isso temos de mostrar que não se preenche o
requisito do art. 18º/1 CC. O DIP da lei 2 está a mandar aplicar o direito material português?
Não, está a mandar aplicar a lei espanhola. Logo, não se preenche o requisito do art. 18º/1 CC,
por isso vamos para a regra do art. 16º CC, que nos manda fazer uma referência material (não
aceitar o reenvio) e vamos aplicar a lei 2, a lei espanhola, aquela que já tínhamos indicado.
Precisamos de ir ao art. 18º/2 CC ver os requisitos adicionais? Não, pois para isso é preciso
estarmos em matéria de estatuto pessoal (lei da nacionalidade), que não é caso, mas mesmo
que estivéssemos nessa matéria não faria sentido irmos ao nº 2, pois para isso teríamos de ter
aceite o reenvio nos termos do art. 18º/1 CC.
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2- A sua resposta seria a mesma caso os danos tivessem sido originados por um acidente
de viação ocorrido em Portugal?
Neste caso trata-se de um acidente de viação, pelo que a regra conflitos já não será o art. 45º
CC, mas sim o Regulamento Roma II, mais especificamente o art. 4º. Trata-se de uma regra de
conflitos de fonte europeia, pelo que o sistema de reenvio não será o nosso, mas sim o sistema
determinado pelo próprio regulamento.
O art. 4º do Regulamento Roma II manda aplicar a lei do local onde se produziu o dano.
Contudo, como o lesante e o lesado têm a mesma residência, aplica-se a lei da residência
comum, tal como dispõe o art. 4º/2. Assim, a lei 1 manda aplicar a lei da residência comum, que
é a lei espanhola, sendo esta a lei 2.
Ao remeter para uma lei estrangeira temos de ver o DIP dessa lei, neste caso o DIP espanhol.
No entanto, estamos perante um regulamento da UE, aplicável em todos os estados-membros
– caracterizam-se os regulamentos pelo seu caráter geral e obrigatoriedade em todos os seus
elementos, diretamente aplicável a todos os estados-membros e pessoas. A Espanha é um EM,
logo, o regulamento aplica-se lá.
Usámos o Regulamento Roma II, indicámos a lei espanhola, pelo que se o caso se colocasse
em Espanha, aplicar-se-ia também a lei espanhola, por isso esta considera-se competente, uma
vez que o regulamento se aplica aí e este considera competente a lei espanhola no caso.
CASO PRÁTICO
Relativamente ao problema da lei aplicável, há regras que o juiz vai mobilizar e quanto a isto
há vários métodos, e nós vamos utilizar como base o método conflitual (utiliza regras de
conflitos para escolher uma lei, atendendo a critérios de proximidade).
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Note-se que temos um pluralismo metodológico, uma vez que temos método conflitual mas
também funcionam normas materiais e normas de aplicação necessária e imediata.
Não aparecem aqui normas materiais, só se está a perguntar a lei para que se manda aplicar
as sucessões.
A regra de conflitos aplicável às sucessões é o art. 62º CC (regra de conflitos interna), e não o
regulamento europeu das sucessões, pois este só se aplica no caso de pessoas que tenham
morrido depois de 17/08/2015. O elemento de conexão é a lei da nacionalidade do autor da
sucessão ao tempo da morte deste (elemento móvel mas o legislador cristalizou-o).
A nacionalidade é francesa, por isso é aplicável a lei francesa. Isto deixa-nos em alerta? Sim,
pois ao mandarmos aplicar uma lei estrangeira pode haver reenvio. Se o DIP francês remeter
para outra lei há um problema, que é o de saber se devemos aplicar a lei francesa ou a lei que o
DIP francês manda aplicar. Neste caso há ainda uma segunda razão para alerta, porque estamos
em matéria de estatuto pessoal e por isso o legislador é mais exigente no que diz respeito a
aceitar o reenvio, porque isso significa deixar de aplicar a lei mais próxima para aplicar outra, e
isso pode ser perigoso. Só aceita o reenvio se houver harmonia jurídica qualificada, ou seja, um
acordo entre as duas leis mais importantes para a pessoa (nacionalidade e residência).
Como sabemos se vai ou não haver reenvio? Temos de ir ver o DIP francês e saber a sua regra
de conflitos e a sua posição em matéria de reenvio. Ele manda aplicar a lei da situação da coisa,
por isso remete para uma lei 3, a lei brasileira, com devolução simples (posição de referência
global – favorável ao reenvio). Ao termos uma lei 3 temos de saber o DIP da lei 3, ou seja, o juiz
deve oficiosamente ir procurar o DIP da lei 3. A lei brasileira aplica a lei do domicílio, a lei 1, com
referência material (não aceita o reenvio).
Temos aqui um conflito negativo, pois a lei que indicámos como competente remeteu para
outra, ou seja, o DIP francês entra em conflito com o nosso e considera competente outra lei.
Nestes casos, devemos insistir no nosso sistema ou fazer o que fazem os outros, sendo
reenviados pelo sistema francês para outra lei? Depende da harmonia jurídica internacional,
pois temos um sistema pragmático. A harmonia jurídica internacional é um acordo entre os
vários sistemas quanto à lei aplicável. Porquê que o nosso legislador abdica de aplicar a lei que
tinha escolhido se com isso promover essa harmonia? Para a estabilidade das relações jurídicas.
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reenviados para outra, pois ao sermos reenviados para a lei 1 aplicamos a mesma lei que os
outros aplicam e garante-se assim a estabilidade das relações jurídicas.
Temos autorização legal para aceitar o reenvio? Vamos ao art. 18º CC, pois isto é uma situação
de retorno. Se o DIP da lei 2 devolver, direta ou indiretamente (estendemos teleologicamente o
18º/1 CC, de modo a abranger também o retorno indireto), para o direito material português,
isto é, para a lei 1, então é este o direito aplicável. Temos de ver se em 2 se está a aplicar a lei 1.
Isto verifica-se, por isso temos autorização para aceitar o reenvio.
Todavia, não podemos ficar por aqui, pois estamos em matéria de estatuto pessoal. Nestas
matérias quando aceitámos o reenvio com base no art. 18º/1 CC, temos de ver os requisitos
adicionais do art. 18º/2 CC, em que só é preciso preencher-se um. O reenvio só se mantém se o
interessado residir habitualmente em território português ou se a lei do país da residência
considerar aplicável a lei portuguesa. Preenche-se o primeiro requisito, por isso o reenvio pode
manter-se, pois temos harmonia jurídica qualificada. Tanto a lei da nacionalidade como a lei da
residência consideram competente a lei 1, havendo então um acordo entre as duas leis mais
importantes para a pessoa.
CASO PRÁTICO
Quanto ao problema da lei aplicável, utilizamos o método conflitual via de regra. Vamos
escolher uma das leis em contacto com uma regra de conflitos.
Vamos utilizar o art. 62º CC, que manda aplicar a lei da nacionalidade ao tempo da morte. A
nacionalidade de A é inglesa, por isso mandamos aplicar a lei inglesa. Estamos a aplicar uma lei
estrangeira por isso temos de ver o problema do reenvio, ou seja, temos de ver o DIP inglês,
qual a sua regra de conflitos e a sua posição em matéria de reenvio. Além disso, temos de ter
em consideração que estamos em matéria de estatuto pessoal.
O DIP inglês manda aplicar a lei da situação da coisa, ou seja, a lei portuguesa, por isso remete
para a lei 1, com dupla devolução (posição favorável ao reenvio, posição de reenvio total – teoria
do tribunal estrangeiro).
Se o caso se pusesse em 2, o juiz inglês aplicaria a lei que o DIP português aplica mas nós ainda
não sabemos qual lei vamos aplicar, porque primeiro precisamos de ver que lei é que aplicam
em Inglaterra. Chegamos a um impasse. Estes dois sistemas, o sistema da dupla devolução e o
reenvio-coordenação (que é o nosso), criam um problema, pois ambos precisam de ver o que é
o que o outro país faz para decidir a lei aplicável.
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Há duas formas diferentes de ver isto. O Dr. Ferrer Correia diz que o nosso sistema tem uma
regra que está no art. 16º CC (referência material), e duas exceções que estão nos arts. 17º e
18º CC, que só se utilizam quando é necessário para a harmonia jurídica internacional. Segundo
ele, temos de ver se o reenvio é necessário para a harmonia jurídica internacional; se não for
não aceitamos. Se nós não aceitarmos o reenvio aplicamos a lei 2, e se fizermos isso, o sistema
inglês vai aplicar também a lei 2. Ou seja, o reenvio não é necessário, e se não o é, não estamos
no domínio das exceções, e vamos para a nossa regra geral. A grande vantagem desta tese é que
aplicamos a lei mais próxima, pois nós é que escolhemos a lei aplicável. A desvantagem é que
estamos a aplicar uma lei estrangeira e podíamos ter aproveitado para aplicar a nossa lei (pois
se aplicássemos a lei 1, o juiz de 2 também o faria), garantindo o princípio da boa administração
da justiça.
Diferentemente, o Dr. Batista Machado diz que no nosso sistema (que é complexo) não há
nenhuma regra nem nenhuma exceção, o nosso sistema está contruído como um princípio geral
no art. 16º CC, que é a maioria dos casos, e depois há casos nos arts 17º e 18º CC em que há
reenvio. Este caso não está previsto nem no art. 16º CC, nem no art. 18º CC, porque do ponto
de vista da harmonia jurídica internacional é indiferente a lei que vamos aplicar. O juiz inglês
aplica exatamente a mesma lei que nós aplicarmos, seja a lei 1 ou a lei 2. O que quer que nós
façamos o sistema inglês vai fazer o mesmo. Logo, se o princípio mais preponderante do DIP
está salvaguardado (o princípio da harmonia jurídica internacional) podemos fazemos funcionar
os outros princípios que são mais subsidiários, nomeadamente o princípio da boa administração
da justiça, em que vamos escolher a lei que o juiz conhece melhor, diminuindo assim o erro
judiciário. Para o Dr. Batista Machado, aceita-se o reenvio e aplica-se a lei 1. Mas como estamos
em matéria de estatuto pessoal, temos de atender ao art. 18º/2 CC e ver se se verifica a
harmonia jurídica qualificada. Está preenchido um dos requisitos, já que o interessado residia
em Portugal, por isso podemos manter o reenvio.
A tendência dos tribunais de 1ª instância é aplicar a tese do Dr. Batista Machado, já o Supremo
Tribunal de Justiça tem preferido a posição do Dr. Ferrer Correia.
CASO PRÁTICO
a) Sabendo que o direito brasileiro remete, nesta matéria, para a lei do último domicílio
do de cuius e é hostil ao reenvio, e que a lei francesa considera igualmente competente
a lei do seu último domicílio, quid iuris?
Vamos utilizar aqui o art. 62º CC e não o regulamento das sucessões, porque ele morreu antes
de agosto de 2015. Este manda aplicar a lei da nacionalidade ao tempo da morte, ou seja, a lei
brasileira.
Estamos a mandar aplicar uma lei estrangeira, por isso pode acontecer um conflito de
sistemas. O DIP brasileiro remete para a lei do último domicílio com referência material (hostil
ao reenvio), ou seja, a lei francesa, lei 3. O DIP da lei 3 remete para a lei do último domicílio, ou
seja, para a lei 3, considerando-se competente. Temos aqui um caso de transmissão de
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competência simples, pois não há retorno para a lei portuguesa e acaba na lei 3. Como estamos
perante um caso de transmissão é aplicável o art. 17º CC.
Contudo, temos de ver se temos autorização legal para tal, no art. 17º CC. Se o DIP da lei 2
remeter para uma lei 3 e esta se considerar competente para regular o caso considera-se
aplicável essa lei. Assim, aplica-se a lei 3.
No entanto, estamos em matéria de estatuto pessoal, por isso temos de atender ao art. 17º/2
CC, já que estamos perante uma matéria mais sensível. O nº 2 tem duas causas de cessação
(diferentemente do nº 2 do art. 18º CC, que tem requisitos adicionais). Cessa a aceitação do
reenvio se estivermos em estatuto pessoal e o interessado residir habitualmente em Portugal
ou se o país da residência estiver a aplicar a lei da nacionalidade. O interessado não reside em
Portugal, nem o país da residência, a lei 3, está a aplicar a lei 2, por isso o reenvio mantém-se, o
que significa que há harmonia jurídica qualificada.
Vamos verificar se há mesmo harmonia jurídica qualificada. A lei da nacionalidade, lei 2, aplica
a lei 3. A lei da residência, lei 3, aplica a lei 3. Há acordo entre as duas leis mais importantes, por
isso percebe-se por que é que legislador deixou funcionar o reenvio em matéria de estatuto
pessoal.
Aqui muda a regra de conflitos, pois deixa de ser o art. 62º CC e passa a ser o regulamento
europeu das sucessões, que manda aplicar a lei da residência ao tempo da morte, ou seja, a lei
francesa.
Ao ser uma lei estrangeira temos de ter em conta o DIP francês, pois pode acontecer que este
remeta para outra lei. O DIP francês sobre a sucessão das pessoas que morreram depois de
agosto de 2015 também aplica o regulamento europeu das sucessões, pois os regulamentos da
UE vinculam todos os estados-membros.
Assim, o sistema de DIP francês não entra em conflito com o nosso sistema, uma vez que se
considera competente.
O sistema de reenvio do CC apenas se aplica perante regras de conflitos de fonte interna, não
no caso de fonte europeia. Os regulamentos de DIP da UE têm uma posição de referência
material, porque é hostil ao reenvio. Contudo, há apenas um que tem reenvio, no art. 34º do
regulamento das sucessões [mas não vamos ver isso].
Este regulamento das sucessões é uma exceção ao caráter geral, pois não vigora em todos os
estados-membros, há três deles que, para efeitos deste regulamento, são tidos como estados
terceiros, a Dinamarca, Reino Unido, e Irlanda, estes não estão vinculados pelo regulamento. As
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CASO PRÁTICO
Quanto à lei aplicável, a regra de conflitos a utilizar é o art. 25º CC, que tem como conceito-
quadro o estado dos indivíduos e a capacidade das pessoas. Relativamente ao elemento de
conexão, aplica-se a lei pessoal que, por remissão para o art. 31º/1 CC, é a lei da nacionalidade,
ou seja, a lei tailandesa.
Mandámos aplicar uma lei estrageira, por isso o sistema de DIP da Tailândia pode entrar em
conflito com o nosso sistema. Temos de ver o DIP tailandês. O DIP tailandês remete para a lei do
local de celebração, isto é, para a lei do Madagáscar, a lei 3, com referência material. Por sua
vez, o DIP do Madagáscar remete para a lei da situação da coisa, a lei do Quénia, lei 4, com
referência material. O DIP do Quénia considera-se competente, pois manda aplicar a lei da
situação da coisa.
Vamos ver se em concreto o reenvio promove a harmonia jurídica internacional. Para tal,
vamos ver primeiro o que fazem as outras leis. Se o caso se pusesse em 4, aplicar-se-ia a lei 4.
Se o caso se pusesse em 3, aplicar-se-ia a lei 4. Se o caso se pusesse em 2, aplicar-se-ia a lei 3.
Não se consegue a harmonia jurídica internacional. Como tal, aplicamos a lei 2, a que tínhamos
escolhido. Na transmissão de competência em cadeia é necessário que a lei 4 se considere
competente e que a lei 2 tenha um sistema de referência global.
Todavia, estamos em matéria de estatuto pessoal. Não aceitámos o reenvio, por isso a
harmonia jurídica qualificada não intervém aqui como limite. Mas como estamos em estatuto
pessoal, vamos ver qual a posição conflitual das duas leis mais importantes para a pessoa. O país
da nacionalidade é a Tailândia, a lei 2, e aplica-se em 2 a lei 3, por referência material. O país da
residência é a Tanzânia e manda aplicar a lei do local da celebração, ou seja, a lei 3, por
referência material. Conseguimos desta forma harmonia jurídica qualificada. As duas leis mais
importantes para a pessoa estão de acordo quanto à lei aplicável, a lei 3.
Posto isto, será que não devemos nestes casos aceitar o reenvio para a lei 3, não por causa
da harmonia jurídica internacional, mas sim por causa da harmonia jurídica qualificada? Para a
Escola de Lisboa, não, pois não há autorização legal. Já para a escola de Coimbra, sim, pois a
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harmonia jurídica qualificada está no sistema como princípio estruturante, funcionando não só
como limite mas também como fundamento do reenvio.
CASO PRÁTICO
1- Supondo que A faleceu a 1 de Agosto de 2015, qual a lei competente para reger a sua
sucessão, sabendo que: - o direito francês aplica à sucessão dos bens imóveis a lex rei
sitae e pratica a devolução simples; - o direito italiano manda aplicar à sucessão dos
bens imóveis a lex patriae e é hostil ao reenvio; - a lei paraguaia, que em matéria de
reenvio pratica a referência material, aplica à sucessão a lex domicilii, salvo quanto aos
bens imóveis situados no Paraguai, caso em que considera competente a lex rei sitae.
Quanto ao problema da lei aplicável, temos de saber quais as normas que o juiz vai mobilizar.
Neste caso só temos a parte da concretização da regra de conflitos. Contudo, no exame temos
sempre de tratar do problema da qualificação.
Utilizamos o art. 62º CC e não o regulamento, pois morreu antes de 17 de agosto de 2015.
Para onde é que aponta este artigo? Para a nacionalidade ao tempo da morte, ou seja, remete
para a lei francesa. Como o nosso sistema de reenvio não é de referência material, o caso não
termina aqui.
O nosso sistema é pragmático, não rejeitamos a aceitação do reenvio, começa com uma
posição de princípio no art. 16º CC (referência material), mas nem sempre é assim, pois o nosso
sistema está disposto a deixar de aplicar a lei francesa, aceitando o reenvio, se este promover a
harmonia jurídica internacional, isto em nome da estabilidade das relações jurídicas. Quando
mandamos aplicar uma lei estrangeira temos de ver se o DIP dela se considera competente ou
remete para outra lei.
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Temos de ver a regra de conflitos e o sistema de reenvio do DIP francês. Está a aplicar a lei da
situação dos bens, que estão no Paraguai. Assim, a lei 2 não se considera competente, e remete
para a lei 3 com devolução simples (remete para as normas materiais e para as regras de
conflitos do Paraguai, aplica a lei que o Paraguai estiver a aplicar). Por sua vez, o DIP do Paraguai
considera-se competente, pois quanto aos bens imóveis situados no Paraguai considera
competente a lex rei sitae, ou seja a lei da situações dos bens, que estão no Paraguai. Temos
aqui um conflito de sistemas na modalidade de transmissão de competência simples, aplicando-
se, quanto ao reenvio, o art. 17º CC.
A nossa posição de reenvio depende da harmonia jurídica internacional, por isso temos de
verificar se em concreto o reenvio promove essa harmonia. Se o caso se pusesse em 3, aplicar-
se-ia a lei 3, pois considera-se competente. Se o caso se pusesse em 2, aplicar-se-ia a lei 3, pois
aplica a lei que a regra de conflitos de 3 está a apontar. Assim, faz sentido aceitar o reenvio e
aplicar a lei 3, pois dessa forma conseguimos a harmonia jurídica internacional e,
consequentemente, a estabilidade das relações jurídicas.
Temos autorização legal para aceitar o reenvio? Vamos ao art. 17º CC. O art. 17º/1 CC tem
como requisito para aceitar o reenvio que a terceira lei se considere competente (direta ou
indiretamente) para regular o caso. A lei 3 neste caso considera-se competente? Sim, portanto
ao cumprir-se o requisito legal podemos aceitar o reenvio para a lei 3.
Todavia, como estamos em estatuto pessoal, o caso não termina aqui. O nosso legislador vai
ser mais cauteloso e vai preocupar-se com a harmonia jurídica qualificada, só aceitando o
reenvio se as duas leis mais importantes quiserem aplicar a lei 3, senão aplica a lei 2. A harmonia
jurídica qualificada vai funcionar como limite.
Quando aceitámos o reenvio em matéria de estatuto pessoal, não podemos ficar pelo nº 1,
temos de ir ao nº 2. No art. 17º/2 CC temos duas causas de cessação do reenvio, bastando que
uma delas se preencha para que façamos parar o reenvio. Cessa a aceitação do reenvio “se a lei
referida pela norma de conflitos portuguesa for a lei pessoal e o interessado residir
habitualmente em território português ou em país cujas normas de conflitos considerem
competente o direito interno do Estado da sua nacionalidade”. O interessado reside em
Portugal? Não, reside em Itália. O país da residência está a aplicar a lei da nacionalidade? Vamos
ver o que faz o DIP italiano. Este manda aplicar a lei da nacionalidade com referência material,
remetendo para a lei 2, a lei francesa. Portanto, se o caso se pusesse em 4, aplicar-se-ia a lei 2.
Ora, preenche-se a segunda causa de cessação do reenvio, por isso vamos parar este reenvio. O
legislador estragou a harmonia jurídica internacional, deixando de aplicar a lei 3, porque não
havia harmonia jurídica qualificada, e aplica assim a lei que entende ser a mais próxima.
Contudo, falta olhar para o art. 17º/3 CC. Temos aqui uma causa de reativação do reenvio,
sendo preciso o preenchimento cumulativo de três requisitos. Tem de ser uma das matérias
elencadas, ou seja, tutela e curatela, relações patrimoniais entre os cônjuges, poder paternal,
relações entre adotante e adotado e sucessão por morte (preenche-se, estamos em matéria de
sucessão); a lei da nacionalidade tem de estar a aplicar a lei da situação dos bens imóveis
(preenche-se); e a lei da situação dos bens tem de se considerar competente (preenche-se).
Cumprindo-se estes três requisitos, vamos reativar o reenvio, e vamos aplicar a lei 3.
Porquê uma reativação do reenvio? Em nome do princípio da maior proximidade, que diz que
quando estamos a escolher uma lei para regular a universalidade de bens, às vezes faz sentido
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destacar alguns bens imóveis e submetê-los à lei da situação deles. Isto para não corrermos o
risco da nossa decisão não produzir efeitos lá, de forma a garantir a efetividade da nossa decisão
no país onde interessa a produção dos respetivos efeitos, que é onde eles estão situados. Temos
uma afloramento do princípio da maior proximidade no art. 17º/3 CC.
Quando se deve fazer isto? Na aceção material é quando a lei da situação da coisa tem um
regime especial para aquele tipo de bens. Na aceção conflitual é quando a lei se considera
competente para regular aquele caso. Qual das aceções está no art. 17º/3 CC? A aceção
conflitual. É uma afloramento indireto pois verdadeiramente quem quer aplicar a lei da situação
da coisa é a lei 2, a lei da nacionalidade, aquela que nós indicámos. Logo, o art. 17º/3 CC aceita
indiretamente o princípio da maior proximidade.
2- Suponha agora que A faleceu a 1 de Agosto de 2019. Qual a lei competente para a
sucessão?
Aqui o que muda é a regra de conflitos, pois será aplicável o regulamento das sucessões.
Todavia, aqui não há conflito de sistemas entre os estados-membros, pois aplicam a mesma
regra de conflitos e, por isso, a mesma lei ao caso.
CASO PRÁTICO
No nosso sistema quando é que reconhecemos situações a constituir? Quando forem válidas
para a lei competente. Mas temos de saber, à luz da regra de conflitos, qual a lei
aplicável/competente para ver se é válida para ela.
A regra de conflitos é o art. 49º CC, e este manda aplicar duas leis (conexão múltipla
distributiva), pois a cada um dos nubentes aplica-se a sua respetiva lei da nacionalidade. Neste
caso, a lei da nacionalidade é só uma, a lei inglesa, pois ambos têm a mesma nacionalidade.
Assim, a lei 1 remete para a lei 2, lei inglesa. Teríamos de determinar dentro do Reino Unido
qual o sistema relevante, pois não há nacionalidade inglesa (a Inglaterra faz parte do Reino
Unido), a nacionalidade é britânica, pelo que teríamos de ver lei de que parte.
Quando mandamos aplicar uma lei estrangeira temos de ficar em alerta, pois pode não se
considerar competente e aplicar outra lei. Além disso, estamos em matéria de estatuto pessoal.
Temos de ver o sistema do DIP inglês. Este manda aplicar a lei do local da celebração, a lei do
Canadá, lei 3, com dupla devolução (tese do reenvio total). Quanto ao DIP da lei 3, da lei do
Canadá, esta também considera competente a lei do local da celebração, remetendo para ela
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A lei inglesa considera o negócio válido e a lei canadiana considera o negócio inválido.
Temos autorização legal para aceitar o reenvio? Vamos ao art. 17º/1 CC e aceitamos o reenvio
se a lei 3 se considerar competente. Neste caso, cumpre-se esse requisito, por isso aceitamos o
reenvio.
No entanto, existe ainda outro princípio a considerar, o princípio do favor negotii. Se com a
aceitação do reenvio invalidámos um negócio jurídico, o nosso sistema tem uma salvaguarda no
art. 19º CC. Em nome das expetativas que as partes depositaram na validade do negócio
paramos o reenvio. O que este artigo estabelece é que cessa a aceitação do reenvio quando por
causa da aceitação do reenvio um negócio é nulo (preenche-se) mas seria válido se tivéssemos
seguido a regra do art. 16º CC, ou seja, se tivéssemos aplicado a lei inglesa, que considera o
negócio válido (preenche-se). Preenchendo-se os dois requisitos, paramos o reenvio e aplicamos
a lei 2, a lei que tínhamos indicado e com isso o negócio torna-se válido.
Contudo, com isto estamos a prejudicar a harmonia jurídica internacional, por isso a Escola
de Coimbra determina que não bastam aqueles dois requisitos, são precisos mais dois. A ratio
legis do art. 19º CC é a proteção das expetativas das partes, pelo que a Escola de Coimbra
considera que este artigo só deve funcionar se houver legítimas/verdadeiras expetativas, só aí
se deve prejudicar a harmonia jurídica internacional.
O primeiro requisito adicional é que seja um negócio jurídico já celebrado e não a celebrar,
porque se não celebraram ainda não há expetativas a salvaguardar e não se justificaria
prejudicar a harmonia jurídica internacional (preenche-se). O segundo requisito é que existam
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verdadeiras expetativas das partes na aplicação da lei que torna o negócio válido, da lei 2, e
neste caso só podemos presumir que elas existam quando no momento da celebração do
negócio havia algum contacto com a ordem jurídica portuguesa, com a ordem do foro, pois é a
única que manda aplicar a lei 2, a lei inglesa. Preenche-se este segundo requisito? Alguma das
partes residia em Portugal? Não. Eram nacionais portugueses? Não. Celebraram o negócio em
Portugal? Não. Por isso não é verosímil que eles contassem com a aplicação da lei 2.
Não funcionado o art. 19º CC, não cessa o reenvio. Não vale a pena prejudicar a harmonia
jurídica internacional para proteger expetativas porque as partes não as tinham.
CASO PRÁTICO
• A, brasileiro e residente em Portugal perfilhou B em Portugal, sendo este ato nulo face
ao direito português mas válido face ao direito brasileiro.
a) Quid iuris sabendo que o direito brasileiro manda aplicar às questões de filiação a lei do
domicílio com referência material?
É uma situação a reconhecer, pois já perfilhou. Precisamos na mesma das regras de conflito
pois só reconhecemos esta perfilhação se for válida para a lei competente.
O art. 56º CC é a regra de conflitos da perfilhação. Este manda aplicar a lei da nacionalidade
à data do estabelecimento da perfilhação (o legislador cristalizou o elemento móvel), ou seja, a
lei brasileira. Como mandou aplicar a lei da nacionalidade estamos em matéria de estatuto
pessoal.
Temos de ver o sistema do DIP brasileiro e este manda aplicar a lei do domicílio, a lei 1, isto
é, a lei portuguesa, com referência material. Há aqui um retorno direto, por isso aplica-se o art.
18º CC. Só aceitamos o reenvio se promover a harmonia jurídica internacional.
A lei brasileira diz que a perfilhação é válida, e a lei portuguesa diz que é inválida.
Todavia, como estamos em estatuto pessoal temos de ter em conta o art. 18º/2 CC, que tem
requisitos adicionais alternativos. Exige-se que o interessado resida em território português ou
que a lei da residência esteja a aplicar a lei portuguesa. Preenche-se o primeiro requisito por
isso deixamos funcionar o reenvio.
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jurídico, mas fazemos uma interpretação autónoma e teleológica dos conceitos, que abrange
não só os negócios jurídicos para a lei portuguesa mas também todas as figuras afins. Os
requisitos do art. 19º CC estão preenchidos? Sim, mas a Escola de Coimbra exige mais dois
requisitos, que o negócio já tenha sido celebrado (esta perfilhação já foi celebrada) e que haja
verdadeiras/legítimas expetativas das partes na aplicação da lei 2. Presumimos que havia
verdadeiras expetativas se houver algum ponto de contacto com a nossa ordem jurídica, pois é
a nossa regra de conflitos que manda aplicar a lei brasileira. Existe alguma conexão? Sim, pois
reside em Portugal e perfilhou a criança em Portugal.
Por conseguinte, neste caso cessamos o reenvio e aplica-se a lei que nós tínhamos indicado,
a lei 2.
CASO PRÁTICO
Isto é uma situação plurilocalizada? Sim, tem contacto com vários ordenamentos jurídicos,
nomeadamente o português e brasileiro.
Utilizamos as regras de conflitos para situações a constituir, mas também para as situações a
reconhecer, pois só reconhecemos uma situação jurídica se ela for válida à luz da lei competente.
Neste sentido, temos de determinar a lei competente
Os herdeiros invocam normas materiais. O art. 1720º CC é uma norma relativa ao regime de
bens, sendo a lei competente a portuguesa por isso aplica-se. O art. 1762º CC é uma norma que
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tutela o regime imperativo da separação de bens, e aplica-se, porque é uma norma sobre regime
de bens e é uma lei portuguesa.
Contudo, o caso não acaba aqui. O nosso DIP não é totalmente formal, temos de nos lembrar
do princípio do favor negotii, que protege as legítimas expetativas que as partes tenham
depositado na validade de um negócio já celebrado. A e B contavam que a doação fosse válida,
pois a lei onde residiam diz que a doação é válida.
Devemos invalidar a doação uma vez que no país da residência esta é tida como válida? Nas
matérias do estatuo pessoa, o nosso legislador consagrou o instituto do reconhecimento dos
direitos adquiridos, segundo o qual permite reconhecer negócios jurídicos que não são válidos
para a lei competente, para a lei que nós escolhemos. Isto desde que sejam válidos para a lei da
residência – art. 31º/2 CC. O nosso legislador escolheu como mais próxima a lei da
nacionalidade, mas não deixa de reconhecer a proximidade da lei da residência.
Como funciona este artigo? Tem quatro requisitos literais e três doutrinas e jurisprudenciais.
O segundo é que só funciona para negócios jurídicos já celebrados. Isto é assim porque é um
mecanismo de proteção da expetativas das partes e elas ao celebrarem um negócio depositaram
nele determinadas expetativas – princípio do favor negotii (preenche-se, a doação é um negócio
bilateral, um contrato).
O quarto é que o negócio tem de ser válido para a lei da residência (parte substantiva) e esta
tem de se considerar competente (parte conflitual) (preenche-se).
O primeiro é que o negócio já tenha sido celebrado há algum tempo, estando já consolidado
e ter já produzido efeitos (preenche-se, desde 2013 que ela administra os bens como se fossem
seus).
O segundo é que ainda não haja decisão judicial estrangeira sobre este assunto, pois se
houvesse passaríamos para o problema do reconhecimento das sentenças estrangeiras
(preenche-se).
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O terceiro é que a questão seja suscitada a título principal e não a título incidental (preenche-
se), não como exceção dentro de outro processo, pois há outro mecanismo da lei aplicável à
questão incidental, o mecanismo da questão prévia.
CASO PRÁTICO
Isto é uma situação plurilocalizada? Sim, pois tem contactos com mais do que um
ordenamento jurídicos.
Quanto ao segundo, à luz de que regras se vai determinar a lei competente? À luz das regras
de conflitos. Isto é uma situação já constituída, mas para sabermos se reconhecemos ou não
uma situação já constituída no estrangeiro, temos de saber qual a lei competente, pois esta só
é reconhecida de for válida à luz da lei competente.
O art. 53º CC é a regra de conflitos, que manda aplicar a lei da nacionalidade comum dos
nubentes ao tempo da celebração do casamento, que remete para a lei espanhola. Atenção que
estamos em matéria de estatuto pessoal (se houver reenvio vai ser mais rigoroso e se
invalidarmos um negócio jurídico nesta matéria podemos mobilizar o instituto do
reconhecimento dos direitos adquiridos).
Como mandámos aplicar uma lei estrangeira, temos de ver ir o DIP espanhol pois pode
acontecer que este remete para outra lei e tenhamos um problema de reenvio. O juiz tem de ir
procurar oficiosamente o direito espanhol. Este remete para a lei da nacionalidade, a lei 2, então
considera-se competente. Não há reenvio para resolver.
Quanto estamos em matéria de estatuto pessoal acaba por ser relevante duas coisas. Em
primeiro, o que faz a lei da residência? Residem na Argentina, e esta manda aplicar a lei do
domicílio comum, ou seja, considera- se competente. Além disso, temos de ver se os resultados
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materiais de cada uma destas leis aponta para a validade ou invalidade do negócio jurídico. Para
a lei portuguesa a cláusula é inválida; para a lei espanhola esta cláusula é inválida; para a lei
argentina esta cláusula é válida.
Reconhecemos situações já constituídas quando forem válidas para a lei competente. A lei
competente é a lei espanhola e esta diz que a convenção é nula.
CASO PRÁTICO
Há três problemas que compete ao DIP resolver: competência internacional, lei aplicável e
reconhecimento de sentenças estrangeiras.
Só reconhecemos situações já constituídas se forem válidas para a lei cometente, por isso
precisamos na mesma de ver a regra de conflitos para determinar qual a lei competente.
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A regra de conflitos é o art. 49º CC (conexão múltipla distributiva, convoca duas leis, uma para
cada nubente), que manda aplicar a lei da nacionalidade dos nubentes, que é comum aos dois,
a lei peruana. A lei 1 remete para a lei 2, a lei do Perú. Note-se que estamos em matéria de
estatuto pessoal, por isso se invalidarmos o negócio jurídico à luz da lei competente, temos de
ter em conta o instituto do reconhecimento de direitos adquiridos do art. 31º/2 CC.
Como mandámos aplicar uma lei estrangeira temos de ver o DIP da sua lei, pois pode
acontecer que ele remete para outra lei e que venhamos a aceitar o reenvio. Este manda aplica
a lei do local da celebração, a lei portuguesa. A lei 2 remete para a lei 1. Além disto, ainda temos
de ver a posição do Perú quanto ao reenvio. O DIP do Perú tem um sistema complexo, utiliza o
reenvio como mecanismo de lexforização, aumentando o campo de aplicação da lei do foro. Ele
aceita apenas o reenvio no caso de retorno, quando a lei que ele manda aplicar remete de volta
para a lei do Perú. Perante isto, temos um conflito de sistemas na modalidade de retorno direto
e isto é relevante para sabermos a norma de aceitação do reenvio, que é o art. 18º CC.
Decidimos aplicar a lei 2, não aceitando o reenvio, por isso não vale aqui o art. 18º/2 CC
quanto à matéria de estatuto pessoal.
Contudo, uma vez que estamos em matéria de estatuto pessoal, vamos ver a posição da lei
da residência. Eles residiam em França, e o DIP da lei francesa manda aplicar a lei da
nacionalidade, a lei 2, a lei peruana, com devolução simples (posição de referência global, aceita
o reenvio, manda aplicar a regra de conflitos que a lei para a qual remeteu estiver a aplicar).
Além disso, vamos ver os resultados materiais quanto à validade do negócio jurídico. É válido
para o direito português; é inválido para o direito peruano; é inválido para o direito francês.
Vamos tentar salvaguardar as legítimas expetativas das partes, mas não vale aqui o art. 19º
CC (pois não aceitámos o reenvio), mas sim o art. 31º/2 CC – instituto do reconhecimento de
direitos adquiridos. Vamos verificar se se preenchem os requisitos. Quanto ao primeiro
preenche-se. Quanto ao segundo preenche-se. Quanto ao terceiro não se preenche, mas
fazemos uma flexibilização teleológica, pois o que importa para a teleologia do art. 31º/2 CC é
no país da residência o negócio ser válido. Quanto ao quarto requisito, o sistema da residência
considera competente a lei 2, com devolução simples, o que significa que aplica a lei que as
regras de conflitos que o sistema de 2 estiver a indicar. Assim, ele aplica a lei 1 e não a lei 2 (seria
a lei 2 se fosse dupla devolução). A lei da residência considera o negócio inválido e não se
considera competente. Este quarto requisito não se preenche, mas toda a doutrina e
jurisprudência propõem que se faça uma interpretação extensiva (extensão teleológica),
abrangendo uma situação que não prevê para se poder cumprir a sua finalidade, pois a lei da
residência aplica a lei 1 que considera o negócio válido. O quarto requisito passa a ser que no
país da residência se esteja a considerar o negócio válido, seja aplicando a sua lei ou outra.
Quanto aos requisitos doutrinais e jurisprudenciais todos se preenchem.
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CASO PRÁTICO
A regra de conflitos é o art. 49º CC, que manda aplicar a lei da nacionalidade, a lei de NY.
Note-se que estamos em estatuto pessoal.
Como mandámos aplicar uma lei estrangeira, temos de ver o DIP de NY. Este manda aplicar a
lei do local da celebração, que a é a lei do Canadá, a lei 3, com referência material. Perante isto,
temos de ir ver o DIP do Canadá. Este manda aplicar a lei do local de celebração, por isso
considera-se competente, remete para ela própria, para a lei 3. Temos aqui um conflito de
sistemas. Será que devemos aplicar a lei que tínhamos escolhido ou sermos reenviados para
outra? Temos uma transmissão de competência simples e isto é relevante porque se aceitarmos
o reenvio temos de ter em conta o art. 17º CC.
No entanto, não esquecer que estamos em matéria de estatuto pessoal, pelo que o legislador
só autoriza o reenvio se houver harmonia jurídica qualificada. Assim, temos de ver as causas de
cessação do art. 17º/2 CC. Cessa o reenvio se estivermos em estatuto pessoal e o interessado
residir habitualmente em território português (não é o caso) ou se o país da residência estiver a
aplicar a lei da nacionalidade (é o caso). Se caso se pusesse no país da residência, seria aplicada
a lei 2, a lei da nacionalidade, com referência material. Por conseguinte, cessa o reenvio, pois
não há harmonia jurídica qualificada.
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Mas note-se que temos de ter em consideração as expetativas das partes, o princípio do favor
negotii. Temos de ver se se preenchem os requisitos do art. 31º/2 CC. Não se preenche o
requisito três, mas fazemos uma flexibilização teleológica. Quanto ao quarto requisito, não se
preenche mas podemos fazer uma interpretação extensiva para cumprir a ratio do art. 31º/2
CC, em que o que conta é que no país da residência o negócio seja tido como válido. No país da
residência estão a aplicar a lei 2 mas esta diz que o casamento é nulo.
CONCLUSÃO: o casamento é válido para a Escola de Coimbra e nulo para a Escola de Lisboa.
CASO PRÁTICO
Isto é uma relação jurídica que interessa ao DIP? Sim, pois é uma situação plurilocalizada.
Tem contacto com vários ordenamentos jurídicos.
Isto faz surgir três problemas que não se põem nas situações internas: competência
internacional dos tribunais portugueses; regras mobiláveis (lei aplicável); reconhecimento de
sentenças estrangeiras.
Quanto ao segundo, há luz de que regras vai o juiz decidir? Vigora um pluralismo
metodológico, utilizando-se vários métodos em simultâneo, mas temos como base o método
conflitual, que utiliza regras de conflitos para escolher, das leis em contacto, apenas uma, neste
caso entre a portuguesa e a cabo verdiana (vão determinar a lei aplicável).
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O art. 337º CT regula a prescrição dos créditos laborais – prescrevem 1 ano a contar do fim
do contrato de trabalho. O contrato terminou em 2015 e já estamos em 2019. B entende que
a lei aplicável é a lei Cabo Verdiana, segundo a qual os créditos laborais não prescrevem.
Precisamos da regra de conflitos para a prescrição, que é o art. 40º CC. Este determina que
a prescrição é regulada pela lei que regular o direito cuja prescrição se discute – é uma conexão
dependente, em que para sabermos qual a lei competente para a prescrição temos de saber
qual a lei que regula aquela obrigação que eventualmente prescreveu, neste caso a obrigação
de pagar o salário. Temos de descobrir a regra de conflitos para as obrigações que decorrem
do contrato de trabalho. Aplicamos o regulamento Roma I ou o regime do CC (art. 41º).
Isto é um contrato? Sim, pois é um negócio jurídico bilateral, tem duas partes, o empregador
e o trabalhador. Além do mais, tem de ser um contrato em matéria civil ou comercial e que
não seja excluído. É um contrato de trabalho e não está excluído. Finalmente, é necessário
para que o regulamento se aplique, que vejamos se o contrato foi celebrado depois de 2009.
Foi celebrado em 2013. Portanto, estamos dentro do âmbito de aplicação do regulamento
Roma I.
Cabo Verde não é um EM da UE. Pode utilizar-se na mesma o regulamento Roma I? Sim, art.
2º – aplicação universal: o regulamento substitui as nossas regras de conflitos, quer em
relações intracomunitárias quer em relações extracomunitárias.
Se o regulamento estiver a mandar aplicar, por exemplo, a lei francesa pode vir a haver um
conflito de sistemas? Não, porque este vigora em todos os EM. Não se põe o problema do
reenvio, ele desparece nas situações intracomunitárias. Mas note-se, como o regulamento tem
natureza universal (aplica-se nas situações intracomunitárias mas também nas relações com
estados terceiros) pode acontecer que ele mand3 aplicar a lei de um estado que não seja da
UE. Pode surgir, nestes casos, um conflito de sistemas, e o que fazer? Aceita-se reenvio ou
não? Remissão do art. 2º para o art. 20º. Este último exclui o reenvio, ele utiliza o sistema da
referência material (sistema menos complexo em matéria de reenvio).
Qual a lei aplicável a este contrato de trabalho? O regulamento Roma I manda aplicar a lei
escolhida pelas partes (autonomia conflitual, em nome da segurança jurídica e da estabilidade
das relações jurídicas). Ora, que lei é que as partes escolheram? Não escolheram nenhuma.
Neste casos, o regulamento utiliza um sistema de conexão múltipla subsidiária mas mais
moderno.
Temos um sistema geral do regulamento (arts. 3º e 4º) mas que não se aplica nos contratos
em que haja uma parte mais fraca, havendo quatro regime especiais – os arts. 5º (não se utiliza
neste caso), 6º (não se utiliza), 7º (não se utiliza) e 8º (utiliza-se). Porquê um regime especial
para estes contratos? A autonomia conflitual pura no contrato de trabalho, havendo uma parte
mais fraca, ela também seria fraca para a própria escolha da lei, pois o empregador poderia
impor uma escolha de lei que só conviesse a ele próprio.
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É possível escolher-se a lei aplicável a estes contratos, pois rege-se pela lei escolhida pelas
partes, por isso há autonomia conflitual. Nos termos do art. 3º, é uma autonomia conflitual
ilimitada, pode-se escolher qualquer lei, tenha ou não contactos. Todavia, temos de ver o art.
8º/1, que diz que as parte podem escolher mas essa escolha não pode ter por efeito privar o
trabalhador da proteção que lhe seria dada pela lei que seria aplicável pelo art. 8º/2 e 3. É uma
conexão múltipla subsidiária. Portanto, essa escolha só é atendível na medida em que seja
mais favorável para o trabalhador do que a lei que seria aplicável caso eles não tivessem
escolhido. O jurista não pode olhar só para a escolha, tem de determinar também qual a lei
que seria aplicável na falta de escolha para ver se seria mais favorável. Ele tem de determinar
sempre as duas leis, a lei escolhida e a lei que seria aplicável na falta de escolha, para depois
fazer uma comparação e averiguar qual a que dá mais proteção ao trabalhador. Se a escolha
for menos favorável torna-se ineficaz.
No nosso caso, eles não escolheram a lei aplicável, por isso não temos de fazer esta dupla
operação. Temos apenas de utilizar os critérios do art. 8º/2, 3 e 4. O regulamento leva em
conta qual o tipo contratual e para o contrato de trabalho o ponto mais importante é a lei do
país em que o trabalhador presta habitualmente o seu trabalho em execução do contrato ou,
na sua falta, a partir do qual o trabalhador presta habitualmente o seu trabalho em execução
do contrato, o que significa que no caso em que o trabalho é prestado em vários países
diferentes vamos verificar se há algum local comum a partir do qual inicia e termina o seu
trabalho. Nos casos em que não há local fixo, o nº 3 manda olhar ao estabelecimento do
empregador. No nº 4 é possível que o juiz não aplique as leis indicadas pelos números 2 e 3
quando ele entenda que haja uma lei mais próxima. É uma cláusula de exceção formal, em que
o juiz corrige o juízo de proximidade do legislador, e é aberta, pois o juiz tem plena liberdade
em escolher a lei mais próxima (mecanismo de flexibilização do DIP). Isto significa que as regras
de conflitos do art. 8º não são rígidas.
Voltando ao caso, o contrato foi executado em Cabo Verde, então em princípio é aplicável
a lei Cabo Verdiana. Contudo, isto é um caso verídico e o STJ utilizou o art. 8º/4: todos os outros
elementos da relação jurídica são conectados com Portugal, exceto o local onde se executou
o contrato. Substituiu-se a lei que a regra de conflitos escolheu pela lei que o juiz considerou
como sendo a lei mais próxima. Contudo, este tipo de cláusulas introduz inseguranças jurídicas.
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CASO PRÁTICO
À luz de que regras vai o juiz decidir? Utiliza em simultâneo vários métodos embora parta
do método conflitual.
O art. 3º aplica a lei escolhida pelas partes (autonomia conflitual). Este contrato tem um
regime especial que está no art. 8º, que vai ser diferente do regime geral pois há uma limitação
da autonomia conflitual, sendo a escolha eficaz se for mais favorável à parte mais fraca. Temos
de determinar duas leis (a lei escolhida e a lei aplicável na falta de escolha) e saber se podemos
dar relevância à lei escolhida ou não.
Quanto à escolha, as partes apenas disseram que não queriam a lei portuguesa. Isso é
escolher a lei aplicável ao contrato ou não? Não. Elas podiam escolher qualquer lei estadual
(uma vez que nos termos do art. 3º a autonomia conflitual é ilimitada), por isso dizer que não
querem uma não é propriamente uma escolha da lei aplicável. Mas esta determinação talvez
nos possa ser relevante do ponto de vista jurídico, pois a escolha de lei não tem de ser expressa,
pode ser tácita. Será que olhando para o contrato conseguimos deduzir uma escolha tácita de
lei? Primeiro tem de resultar de forma clara do contrato, admitindo-se uma escolha tácita e
não hipotética (isto é, aquela lei que teriam escolhido se tivessem pensado nisso). Indícios: se
o contrato fizer referência expressa a disposições de uma certa lei; se as partes utilizarem um
instituto jurídico específico de uma certa lei; se as partes fizeram um pacto de jurisdição
(escolheram o tribunal). A doutrina discute outros mais duvidosos, como a língua e a moeda
do contrato.
Olhando para o contrato, temos escolha tácita? Os indícios parecem apontar para a lei
portuguesa, mas as partes disseram expressamente que não queriam essa lei. Isto significa que
não há nem escolha expressa nem escolha tácita da lei aplicável.
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Na falta de escolha, será aplicável o art. 8º/2. A lei que regulará o contrato de trabalho é a
lei da Arábia Saudita (lei do local onde o contrato de trabalho é executado), mas esta diz que
o despedimento é válido.
Temos de ter em atenção que temos um pluralismo metodológico, e o art. 53º CRP é uma
norma de aplicação necessária e imediata que proíbe os despedimentos sem justa causa,
aplicando-se independentemente das regras de conflitos. Estas dividem-se em normas
espacialmente autolimitadas, que autolimitam o seu âmbito de aplicação e são normas
materiais que não precisam de regras de conflitos, pois elas próprias dizem a que casos se
aplicam. Uma delas é precisamente o art. 53º CRP, que se aplica a trabalhadores portugueses,
que residam em Portugal ou aos contratos de trabalho executados em Portugal. Neste caso,
esta norma aplica-se? Algum destes casos se preenche? O A é português, por isso ela
determina o seu âmbito de aplicação, e o que o juiz faz é aplicar essa lei. Ela vai funcionar ao
lado da lei competente.
Será que o regulamento admite as normas de aplicação necessária e imediata? Art. 9º. No
nº 1 dá uma definição (discutível); no nº 2 é para as normas de aplicação necessária e imediata
da lei do foro (elas podem aplicar-se); no nº 3 é para as normas de aplicação necessária e
imediata estrangeiras (só nas condições aí descritas).
No nosso caso, o art. 53º CRP é uma norma do foro por isso cabe no art. 9º/2 e o
regulamento admite a sua aplicação.
CONCLUSÃO: é competente a lei da Arábia Saudita mas aplica-se a lei portuguesa (o art. 53º
CRP), logo este despedimento é ilícito.
b) Supondo que o direito da Arábia Saudita é competente, que posição deveria o juiz
português tomar se a sociedade não conseguisse provar o conteúdo desse direito?
Art. 348º CC – o juiz tem oficiosamente de ir procurar o conteúdo da lei estrangeira. Isto
através do Gabinete de Documentação e Direito Comparado que permite aceder ao conteúdo
da lei da Arábia Saudita. Se não conseguir, vamos ver se aquela regra de conflitos que estamos
a utilizar tem uma conexão múltipla subsidiária. Neste caso, estamos a utilizar a regra de
conflitos do art. 8º/2 do regulamento que tem essa conexão. Portanto, se falhar, o art. 8º/3
manda aplicar a lei do estabelecimento do empregador, a lei portuguesa.
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FDUC – Ano letivo 2019/2020
Direito Internacional Privado, 1ª turma – aulas práticas
Dr. Afonso Nunes Figueiredo Patrão
CASO PRÁTICO
a) Refira, fundamentando, qual a lei competente, face ao DIP vigente, para dizer se houve
efetivamente acordo negocial?
Quanto ao problema da lei aplicável, discute-se aqui a lei aplicável ao contrato de compra e
venda ou outra coisa diferente? Discute-se um problema prévio, o de saber se houve ou não
declaração negocial.
Nesta matéria dos negócios e contratos temos dois sistemas de DIP, o regulamento Roma I e
o CC. Qual vamos utilizar? Temos de ver qual regularia o contrato caso o contrato existisse. Se o
contrato, caso existisse, fosse regulado pelo regulamento vamos olhar à sua solução; caso fosse
regulado pelo CC utilizamos o regime do CC.
Neste sentido, temos de verificar três requisitos. Primeiro, se ele existisse, é contrato ou
negócio jurídico unilateral? É um contrato de compra e venda dos papiros. Segundo, é em
matéria civil ou comercial e é excluído? É em matéria civil ou comercial e não está excluído pelo
art. 1º/2. Terceiro, aconteceu depois de 2009.
A solução é-nos dada pelo art. 10º. O nº 1 significa que para sabermos se o contrato existe ou
não aplicamos a lei que se aplicaria se ele existisse, ficcionando que o contrato existe e
determinando a lei que o regula. Ora, ficcionando que o contrato existe, a lei que o regularia
seria a lei escolhida pelas partes (art. 3º). Que lei é que elas escolheram? Não escolheram
nenhuma lei, só apontou para o papiro. Não tendo sido escolhida, vamos para o art. 4º e vamos
procurar qual o elemento de conexão subsidiário e há vários critérios consoante o tipo
contratual. O critério do contrato de compra e venda está na primeira alínea e é regulado pela
lei da residência do vendedor. Portanto, se o contrato existisse seria regulado pela residência
do vendedor e este reside no Egito.
Por conseguinte, e a lei egípcia que dirá se aquilo é ou não uma declaração negocial. O que
diz a lei egípcia sobre este assunto? Diz que existe declaração negocial. Todavia, o nº 2 do art.
10º permite a um dos contraentes invocar outra lei, neste caso a lei da sua residência para
demonstrar que não deu o seu acordo, ou seja, só pode invocar a lei da sua residência se ela não
considerar aquele ato como uma declaração negocial. Ele reside em Portugal e apontar para
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uma coisa não é uma declaração negocial. Mas isto não chega, tem também de provar que não
seria razoável que ele soubesse que o seu comportamento estava a ser regulado pela lei egípcia.
Se ele demonstrar estes dois requisitos cumulativamente, passa a ser a lei da residência a
dizer se houve ou não contrato, isto é, vamos mudar a lei aplicável, passa a ser a lei portuguesa.
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