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O comunicado às autoridades de
suspeitas ou ocorrências de violência
contra crianças e adolescentes e o
papel dos diversos órgãos do Sistema
de Garantia de Direitos (SGD)1
Introdução
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Escuta Protegida de crianças e de adolescentes vítimas ou testemunhas de violências: aspectos teóricos e metodológicos
profissionais que atuam nas áreas de atenção, estabelecida pelo Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA):
Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos contra
criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Con-
selho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras provi-
dências legais. (BRASIL, 1990)
A Lei nº 13.431, no seu Artigo 15, insta o Poder Público a criar serviços de atendi-
mento, de ouvidoria e resposta para receber denúncias de violações de direitos de crianças
e, neste mesmo artigo, determina comunicação simultânea das denúncias para autoridade
policial, Conselho Tutelar e Ministério Público.
Essa obrigação legal, contudo, encontra sua razão fundamental na necessidade pro-
teção das crianças e dos adolescentes vítimas de violência: o ato de notificar tais casos às
autoridades responsáveis pode contribuir para interromper o ciclo da violência sexual que,
reiteradas vezes, vem sendo transmitido de geração para geração. Em casos extremos, a decisão
de não notificar pode acarretar sérias consequências para a vida de crianças e de adolescentes,
como já demonstrado no Capítulo 4.
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Capítulo 6 – O comunicado às autoridades de suspeitas ou ocorrências de violência contra crianças e adolescentes e o papel dos diversos órgãos do Sistema de Garantia de Direitos (SGD)
contribuir para redução dos potenciais danos, de maneira que este não provoque maiores
sequelas em crianças e em adolescentes sexualmente abusados.
Além de ser um dever moral e humanitário do educador, outra razão de igual impor-
tância para fazer a notificação de casos suspeitos é a obrigação estabelecida no mesmo ECA:
As razões para o exercício desse dever legal, moral e humanitário são, em resumo:
Em geral, faz-se uma distinção entre denúncia e notificação dos casos de violência
contra crianças e adolescentes. Enquanto uma denúncia, no sentido amplo do termo, é uma
comunicação realizada a um serviço ou diretamente às autoridades competentes de uma
“potencial ou testemunhada” violação de direitos; a notificação é uma comunicação formal
por parte de profissionais, em geral vinculados ao sistema de proteção, obre uma suspeita
ou ocorrência de violência de casos atendidos ou por eles contatados.
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Capítulo 6 – O comunicado às autoridades de suspeitas ou ocorrências de violência contra crianças e adolescentes e o papel dos diversos órgãos do Sistema de Garantia de Direitos (SGD)
O Disque 100 funciona diariamente, 24 horas por dia, inclusive nos fins de semana
e feriados. As denúncias podem ser realizadas anonimamente, sendo garantido o sigilo.
Depois de recebidas, são analisadas e encaminhadas aos órgãos de proteção, defesa e respon-
sabilização, de acordo com a competência e as atribuições específicas: Conselho Tutelar,
unidades de polícia e Ministério Público. Lembrando ainda que os cidadãos podem dirigir
suas denúncias diretamente a qualquer um dos órgãos mencionados.
Notificação às autoridades
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As medidas de proteção às crianças e aos adolescentes são aplicadas com base a estudo
psicossocial realizado no Centro de Atendimento Integrado. É preciso lembrar aqui que,
segundo a Lei nº 13.431/2017, a entrevista sobre os fatos ocorridos referente à violência
sofrida é definida como depoimento especial.
Nas cidades onde há Conselho Tutelar, este órgão deverá aplicar outras medidas,
tanto as de proteção à vítima, quanto as pertinentes aos pais ou aos responsáveis previstas
no ECA, nos Arts. 101 e 129 (BRASIL, 1990). Nas cidades onde não existe Conselho
Tutelar, cabe ao juiz aplicar as medidas de proteção pertinentes, entre elas, o afastamento
do autor da violência sexual, caso este seja um membro da família que vive sob o mesmo
teto da vítima, ou a colocação em unidade de acolhimento institucional de criança ou de
adolescente, ou o seu encaminhamento para o serviço psicológico, quando este for necessário
e existir na cidade.
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lar (BRASIL, 1990). Para que isso aconteça, o Conselho Tutelar pode representar o caso
ao Ministério Público, que instaura um inquérito solicitando o afastamento do autor de
violência sexual e encaminha o processo para o juiz que, por sua vez, determina, à polícia,
o cumprimento do procedimento legal. Na impossibilidade de a criança ou do adolescente
voltarem para suas residências, devem ser providenciados seus encaminhamentos para uma
unidade de acolhimento institucional. O Conselho pode também solicitar a medida de
acolhimento institucional. Contudo, esta só pode ocorrer por determinação judicial, como
último recurso.
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• Deve ser elaborado a partir de documentação remetida por outros serviços, pro-
gramas e equipamentos públicos, além do relato do acompanhante da criança ou
do adolescente (Parágrafo 1º);
• A autoridade policial priorizará a busca de informações com a pessoa que acom-
panha a criança ou o adolescente (Parágrafo 3º);
• Sempre que possível, a descrição do fato não será realizada diante da criança ou
do adolescente (Parágrafo 4º);
• A descrição do fato não será realizada em lugares públicos que ofereçam exposição
da identidade da criança ou do adolescente vítima ou testemunha de violência
(Parágrafo 5º);
• O registro do BO deve ser assegurando mesmo quando a criança ou adolescente
estejam desacompanhado (Parágrafo 2º) (Dec. no 9.603/2008, Art. 13). Para esses
casos, no espírito do documento de Parâmetros (MDH/SNPDCA, 2017), vale a re-
comendação para que a autoridade policial limite a perguntar o mínimo necessário
para não transformar o momento de registro do BO em uma fase da investigação.
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Vale ressaltar que o encaminhamento para o IML deve ocorrer somente para os casos
em que existem provas materiais a serem colhidas, devendo ser evitada a chamada perícia de
“descarte” (para descartar que o fato tenha ocorrido). Nesses casos, o delegado deve solicitar
provas do ato sexual (conjunção carnal), de lesões corporais (corpo de delito) e de autoria
do crime sexual. Por isso, é importante que os educadores orientem pais e vítimas sobre as
providências a serem tomadas depois de ocorrida a violência sexual. Uma delas é não eliminar
as potenciais provas (não tomar banho e não lavar as roupas, por exemplo).
A fase de apuração dos fatos pode prosseguir com a investigação para checar se houve
ou não o crime no ato denunciado. A Lei nº 13.431/2017 insta os órgãos policiais a envidar
esforços investigativos para que o depoimento especial não seja “o único meio de prova para
o julgamento do réu” (Art. 22).
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Os órgãos da rede de proteção devem estar atentos para o fato de que, nas situações
de violência intra e extrafamiliar, quando se inicia a fase de apuração da denúncia, o suspeito
autor do abuso sexual é intimado a depor. Nesse caso, podem ocorrer pressões familiares
sobre a criança ou adolescente para a retirada da queixa. Muitas vítimas são forçadas a negar
os fatos notificados, quando não ainda na fase de investigação, esta negativa pode ocorrer
na fase judicial, sobretudo quando as crianças possuem uma experiência de escuta negativa
nas organizações que compõem o Sistema de Garantia de Direitos.
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Após o término da apuração dos fatos, o delegado faz um relatório final e o envia
para a Central de Inquéritos do Ministério Público.
Ministério Público é o responsável pela fiscalização do cumprimento
da lei. Os Promotores de Justiça têm sido fortes aliados do movimen-
to social de defesa dos direitos de crianças e adolescentes. Em alguns
estados brasileiros, o Ministério Público criou o Centro Operacional
e as Coordenadorias da Infância, que vêm se mostrando instrumentos
eficazes na implantação e na fiscalização do cumprimento do ECA.
Segundo a Constituição Brasileira, toda pessoa acusada tem direito à defesa. As pes-
soas podem arcar com os custos de advogado, em geral contratando serviços de particulares.
Contudo, aquelas pessoas que não podem pagar um advogado têm direito à assistência
judiciária gratuita por meio da Defensoria Pública:
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O Poder Judiciário, estimulado pelo ECA, criou em todos os estados do país uma área
especializada para a infância e adolescência, denominada Justiça da Infância e Juventude.
Cada estado possui uma Coordenadoria da Infância e Juventude (CIJ). Os coordenadores
desses órgãos se congregam, em âmbito nacional, no Colégio de Coordenadores da Infância
e Juventude dos Tribunais de Justiça do Brasil.
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Depois dessa fase, o processo volta ao juiz para a aplicação da sentença (fase final) ou
para ir a julgamento, o que pode resultar em pena ou em multa para o autor da violência
sexual. Considerando-se a morosidade da Justiça, o trâmite desses processos nunca ocorre
dentro tempo satisfatório, podendo se prolongar por meses e mesmo anos. Por esse motivo,
é crucial haver acompanhamento permanente e cobrança firme na agilidade do seu trâmite
pelas partes interessadas.
Considerações finais
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Capítulo 6 – O comunicado às autoridades de suspeitas ou ocorrências de violência contra crianças e adolescentes e o papel dos diversos órgãos do Sistema de Garantia de Direitos (SGD)
capítulos, vamos descrever qual é o papel desses vários órgãos na escuta protegida de crianças e
adolescentes (escuta especializada e depoimento) e na atenção geral às crianças e adolescentes.
Vale ressaltar que a finalidade principal da Lei nº 13.431/2017 é reduzir o número de vezes
que a criança ou o adolescente deve falar sobre o fato ocorrido e prevenir a revitimização.
Referências bibliográficas
____. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente
e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/18069.
htm>. Acesso em: 21 out. 2013.
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