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Capítulo 91

O edifício lógico e o aprender "sobre"

Sobre o edifício lógico propriamente dito já falamos o suficiente até agora.


Minha sugestão, portanto, é a de que analisemos aqui suas possibilidades e seus limites,
referindo-o ao conhecimento psicológico e à formação de psicólogos, e enfatizando os
lugares onde esses limites criam espaço para outras formas de aprender, dessa vez já
abordando a forma que tem a Oficina de Criatividade hoje.
Partindo finalmente para a recuperação dos dados mostrados no início do livro,
pretendo fazer isso começando por tentar entender os sujeitos-alvo da atividade.
A Oficina destina-se, como já foi dito, a alunos de 5º ano de psicologia, que
chegam a nós em condições específicas, sobre as quais podemos nos deter.
Vêm de uma experiência, na Licenciatura e Graduação, calcada primordialmente
no aprender "sobre" (as pessoas, as teorias e técnicas, etc.), salvo as exceções feitas por
algumas disciplinas nas quais participam de alguns contatos com situações que simulam
atendimentos (como o treinamento para aplicação de testes), ou que os colocam na
fímbria da situação clínica, sem dela participar ainda (como no caso do estágio em
hospitais psiquiátricos, oferecido em Psicopatologia).
Este aprender "sobre" se dá por meio de aulas em diferentes formatos definidos
pelos recursos da didática, leituras variadas, seminários e avaliações ditas objetivas, por
meio de provas e trabalhos escritos, nos quais predominantemente prevalece a exigência
de reproduzir o conhecimento recebido, permeado em maior ou menor grau pelas
opiniões ou reflexões do estudante.
Todos esses recursos, melhor ou pior administrados, constituem o que viemos
definindo como um saber que está aí, à disposição do sujeito para uso, que com ele
estabelece duas condições de encontro. Por um lado, há um encontro positivo com um
saber que, disponível, desvela inúmeras possibilidades, e que guarda uma certa aura
mágica frente à compreensão dos demais. Começar a aprender psicologia significa
maravilhar-se com as várias facetas da existência humana, cujas manifestações agora
podem começar a ser entendidas numa trama infinita de articulações possíveis.
Significa aprender mais sobre si mesmo, descobrir teorias e autores com os quais se
identificar, compartilhar com outros visões de mundo e de como são as pessoas.
Tomados por outro ângulo, no entanto, esses mesmos aspectos deflagram um
encontro com esse saber disponível que se dá mais ao modo de um encontrão, de um
confronto com uma série de desconfortos pelos quais os futuros psicólogos não serão
abandonados nunca mais.
Esse mesmo encontro que propicia algum apoio naquilo que se conseguiu
aprender, propicia o desencontro diante da possibilidade de articular cada fragmento do
que é aprendido num todo organizado. Conhecimentos que permitem ao aluno
desenvolver um embrião de direcionamento diante das diferentes abordagens
apresentadas, mas que não oferecem, em contrapartida, razões sólidas que sirvam de
critérios para que optem por uma coisa e não outra. Configura-se todo um campo de
possibilidades que o estudante, via de regra, não consegue articular completamente.
O que os alunos aprendem nos primeiros quatro anos de faculdade, proveniente
dos recursos apontados acima, converge para a familiarização2. Ao longo desse tempo

1Cupertino, C. M. B. Criação e formação: fenomenologia de uma oficina. São Paulo: Annablume, no


prelo.
eles convivem no que podemos chamar de uma estrutura de contenção do
estranhamento, que visa criar os meios para que, quando confrontados com o
inexplicável, tratem de por em ação aquilo que aprenderam, tornando-o explicável
através do recurso aos fundamentos que definem o que aquilo é.
Os alunos são convencidos, por um lado, pela demonstração lógica à qual são
expostos por meio de textos articulados, que por sua vez se remetem a outros; de
discursos expositivo-demonstrativos emitidos (com maior ou menor competência) por
professores; do acesso a exemplos (imaginados ou relatados) nos quais os conceitos
aprendidos podem ser observados; de discussões acadêmicas com professores e colegas.
Aproximam-se do conhecimento enquanto podem submetê-lo à prova, desdobrá-lo e
torná-lo familiar, usando a lógica.
Num desdobramento desse tipo de pensamento, realizam outras operações pelas
quais visam constituir dispositivos de intervenção futuros quando, por exemplo,
antecipam limites e possibilidades de alcance para o que está sendo apresentado, pela
via do pareamento imaginário entre o conteúdo aprendido e comportamentos
observados (deles mesmos ou de pessoas conhecidas) ou exemplificados nos livros.
Estas formas de pensar, entretanto, encontram-se fortemente permeadas pelo que
podemos chamar de pensamento axiológico, ou aquele através do qual definimos o que
é desejável, para nós e para os demais, com base no que acreditamos como indivíduos.
Ao longo de sua vida acadêmica, então, os alunos constituem seu aprendizado
acreditando (ou não). Em última instância, acreditam na possibilidade de um
conhecimento acumulado e, dentro dele, em maior ou menor escala, no que dizem os
professores e os livros. Identificados com alguns professores, passam a acreditar nas
posições por eles defendidas, à primeira vista refratárias às incoerências, uma vez que
são transmitidas pela via da organização e não das dissonâncias.
Com base no pensamento axiológico, transformam suas visões de mundo em
critério de credibilidade, avaliando e incorporando aquilo a que vão sendo expostos a
partir da discriminação com relação a qual abordagem está, para cada um, melhor ou
pior articulada em sua sistematização de conceitos, assim como de que maneira o
cabedal de instrumentos, procedimentos e técnicas formam um conjunto compatível
com os pressupostos, tornando-se, assim, passíveis de adoção.
Acompanhar tais movimentos experimentados por nossos alunos oferece-nos a
possibilidade de observar alguns tipos de conhecimento que se articulam,
simultaneamente, no(s) fazer(es) psicológico(s), e que devem ser por eles aprendidos.
O saber psicológico3 constitui-se a partir do que Figueiredo (1995a), a partir da
obra de M. Polanyi, identifica como os conhecimentos explícito, tácito e subsidiário.
Sobre esses tipos de saber gostaria de estender-me aqui, assumindo que a Oficina de
Criatividade pretende incidir sobre os últimos, instituindo um espaço para reflexão e
crítica do primeiro.
O primeiro deles, relativo ao que os alunos aprendem pela via da transmissão, é
o conhecimento explícito ou representacional, que pode ser definido como o que se
torna disponível na forma de sistemas de representação. É o que aprendemos nos livros,

2É importante assinalar aqui que não estou entrando no mérito do quanto isso é desejável ou não,
o que é uma questão bastante debatida hoje em dia, quando se pensa na organização dos
currículos em psicologia. O trajeto para o familiar, aqui, é reconhecido como um dos trajetos
possíveis numa formação composta de muitas outras alternativas, melhor ou pior administradas,
dependendo da instituição onde se desenvolvam. Ele foi escolhido entre os muitos possíveis
porque é o caminho que pretendemos trilhar, pela contramão, na Oficina de Criatividade.
3Tomo essa expressão no singular consciente de toda a polêmica quanto a usá-la dessa forma ou
obrigatoriamente no plural, já que a condição múltipla da psicologia permite que pensemos não
apenas em um saber e um fazer únicos, mas em diferentes saberes e fazeres.

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ou por qualquer outra forma de transmissão explícita, ordenada, sistematizada.
Considerado o representante da parte objetiva de um conhecimento qualquer, é sobre
ele que podemos fazer incidir nossas avaliações e correções. É importante assinalar,
entretanto, que apesar de aparentemente ancorado em referências que poderíamos
considerar mais sólidas, não está isento de problemas diante dos questionamentos
referentes ao potencial universalizante do conhecimento científico que evidenciam
algumas lacunas, que nos cursos de psicologia são deixadas, obrigatoriamente para
serem preenchidas pelos próprios alunos.
Pretendendo apresentar a eles um conhecimento organizado, deparamo-nos com
a impossibilidade de fazê-lo porque tal nível de organização e universalidade não é
possível. Frente aos limites do conhecimento explícito, ficam para ser
convenientemente equacionadas perguntas com relação, por exemplo, a quais
abordagens privilegiar na definição do mínimo necessário a ser transmitido para que
possamos afirmar, com a consciência tranqüila, que nossos alunos sabem psicologia.
Vivemos um eterno conflito sobre o que devemos impor, considerando que eles não têm
experiência nem conhecimento suficiente, ou o quanto podemos permitir que eles
escolham seus próprios caminhos, elegendo currículos personalizados.
Constituída, portanto, sob o signo da multiplicidade, a Psicologia, para ser
ensinada, descortina vários níveis diferentes a serem abordados e exige articulações em
diferentes planos. Do ponto de vista da formação de psicólogos, estamos lançados no
desafio de proporcionar, ao mesmo tempo, um eficiente saber circunscrito ao campo do
representável e uma dose equivalente de traquejo para lidar com aquilo de que o
conhecimento explícito não dá conta, que podemos identificar como um outro tipo de
saber: o tácito, pré-reflexivo, difícil de ser transformado em discurso transmissível: "O
conhecimento tácito é o conhecimento incorporado aos hábitos afetivos, cognitivos,
motores e verbais de um sujeito." (Figueiredo,1995a:87).
É uma disposição para o uso e/ou incorporação de determinadas habilidades,
parte do que sabemos sem saber que sabemos. Difícil também de ser considerado
apenas subjetivo, já que por ser pré-reflexivo antecede a cisão sujeito-objeto, este
conhecimento está lá, não à disposição, mas como disposição, refratário às tentativas de
explicitação.
"A dificuldade de 'fazer falar o tácito' advém do fato de que o conhecimento
pessoal existe num plano da experiência em que sujeito e objeto ainda não se
constituíram como entidades relativamente independentes uma da outra." (idem:87).
E ainda temos, semelhante, mas não igual, um outro conhecimento, o
subsidiário. Pano de fundo para a apreensão focal e temática de aspectos particulares do
mundo, os quais organiza e reúne, dando-lhes configurabilidade, "...o conhecimento
subsidiário resiste à representação já que por sua natureza é o que existe no registro do
implícito e do disperso." (idem:90). É ele que dá sentido ao explícito, focal.
Conhecimento focal e subsidiário alternam-se como figura e fundo, levando-nos
a uma associação com a diferença ontológica heideggeriana entre ser e ente
intramundano, uma vez que "embora o fundo esteja fora de foco e possa passar em
grande medida desapercebido sabemos que é esta apreensão não temática do fundo que
garante as possibilidades de formação e significação das figuras. Em outras palavras:
nós possuímos conhecimentos focais significativos porque somos possuídos pelo
conhecimento subsidiário em que vivemos" (idem:89). Retornamos, portanto, à questão
do acesso ao enigmático, ao que, no humano, permanece como implícito, perguntado-
nos se este fundo, apesar de impossível de ser tornado explícito, pode ser posto em
movimento.
Voltando à idéia do fundo sem fundo heideggeriano, a partir de onde as coisas
são o que são, podemos pensar (livremente) que um fundo sem fundo não oferece apoio

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para que nada se mova. O que está vazio não tem movimento. Todavia, como nos
lembramos, esse vazio tomado como ausência de sentido, pode também ser
compreendido como o lugar de onde tudo pode vir a ter sentido, como um vazio pleno
de sentidos possíveis. Ao retomarmos, ao mesmo tempo, a possibilidade de um trânsito,
de um dar a ver, percebemos que as próprias palavras que utilizamos pressupõem um
movimento, apesar de sabermos que nada está lá.
Concretizar um pouco mais essa idéia, trazendo-a para o contexto específico do
atendimento psicológico leva-nos de volta a algumas afirmações interessantes,
apresentadas por Stern (1990) já superficialmente mencionadas, e às quais voltaremos
novamente. Stern desenvolve sua argumentação a partir da apresentação da idéia de
"pensamentos, sentimentos e percepções inesperados", cujo caráter é o de algo que "está
passando" por nós, e dos quais nos apropriamos posteriormente ao seu surgimento.
"Saber que somos os autores de nossos próprios pensamentos não ajuda a
desmistificar a experiência bastante comum de que simplesmente os registramos.
Pensamentos, imagem ou sentimentos inesperados parecem vir a nós: sentimo-nos como
conduites" (1990:452). Essa capacidade, presente em todos nós, constitui-se, segundo
Stern, num recurso imperdível para a aprendizagem.
Dirigimo-nos às situações esperando alguma coisa delas. Lá, na situação, somos
surpreendidos por um pensamento inesperado, que não vem da decisão de dar sentido,
nem dos encadeamentos lógicos que podemos fazer sobre ela. Desvinculados da
condição de produção deliberada, tais eventos teriam como prerrogativa nos
surpreender, contrariando as expectativas que temos. Frequentemente desconfiamos da
veracidade desses pensamentos, uma vez que não conseguimos precisar exatamente sua
correspondência com os fatos presentes. Se não estabelecemos um distanciamento
frente ao princípio de razão, consideramos esses acontecimentos como acidentes de
percurso. Se procuramos ajustá-los à sua eventual proveniência pelo caminho da lógica,
explicitando essa correspondência, vemo-nos incapacitados de fazê-lo. Esses
pensamentos acontecem, simplesmente, no nível da experiência, como saber
subsidiário. Oferecem-se a nós como um trânsito a ser explorado em suas ramificações
que estão por vir, mais do que pela análise das razões de seu aparecimento. São os
vetores em potencial para o que, dependendo das circunstâncias, pode se transformar
em fala fenomenalizadora, aquela que apenas nos aponta um sentido para, se estivermos
abertos para essa possibilidade.
Em nossa abertura para a surpresa, para nos deixarmos contrariar em nossas
expectativas criamos, então, uma condição de conhecimento pelo intervalo, ou lacuna,
entre o que esperamos e o que, inesperadamente, nos aparece por acaso. Aqui vamos
nos deter, momentaneamente, no que se apresenta como a possibilidade de
perseguirmos os pensamentos inesperados, criando situações que possam, elas mesmas,
nos surpreender, uma vez que, apesar de parecer um processo basicamente passivo pelo
qual "...somos observadores da produção de nossos próprios modos de compreender o
mundo" (p. 454), podemos desdobrá-los, inserindo-os novamente em uma trama.
Ainda segundo Stern, "quando esse pensamento - talvez apenas uma inclinação
para pensar, um protopensamento - aparece, consciente, um esforço deliberado é
usualmente necessário para avaliá-lo, burilando-o e estendendo suas ramificações. Mas
o original, para ser uma contribuição real, tem que chegar tanto como intenção quanto
como uma parte da vivência do que está fora dos limites da reflexão ou do controle.
Percepções autênticas não são desveladas ou entendidas" (idem:455).
As ressonâncias do pensamento heideggeriano novamente se fazem ouvir,
quando fazemos referência a uma inclinação para pensar, ou ao que está fora dos limites
do controle e do entendimento racional.

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É importante, também, pararmos um pouco sobre a idéia da composição dupla
do que assinalamos acima como uma contribuição original. Podemos fazê-lo a partir da
extensão dessas idéias para o contexto psicológico, analisando esse processo diante de
sua necessidade e utilidade na prática psicológica. Essa idéia está presente num excerto
já referido, do qual agora enfatizo alguns aspectos:
"Paciente e analista trabalham com percepções inesperadas rotineiramente. As
mais significativas percepções dos outros - e de nós mesmos também - chegam a nós
sem intenção consciente. Vêm de outro lugar, disfarçadas em sintomas ou sonhos. São
eventos que caem fora das expectativas, embora às vezes assustadores e freqüentes. E,
embora psicanalistas possam às vezes aprender sobre pacientes de forma mais
conscientemente planejada (por exemplo, extrapolação consciente da teoria ou
expectativas de desenvolvimento), grande proporção de observações analíticas, e as
mais significativas, são da espécie comum humana." (idem:455).
Assitimos aqui à explicitação da manifestação dos conhecimentos que vínhamos
apontando acima. Por um lado, temos acesso ao representável, constituindo "um
aprendizado de forma conscientemente planejada". Por outro lado, é apenas no
abandono ao imprevisível, capacidade "da espécie comum humana", que o planejado
adquire configurabilidade, transformando-se em intervenção aproveitável.
Com isso finalizo um segmento através do qual espero ter demonstrado, em
primeiro lugar, o espaço e a necessidade do conhecimento acumulado garantido através
do edifício lógico. Além disso, espero ter conseguido deixar claros os limites deste
mesmo conhecimento que, por mais objetivo e concreto que pareça, sofre
atravessamentos que tendemos a considerar, se não inúteis, pelo menos indesejáveis,
sempre que não soubermos como contar com eles, ou antes, se não soubermos que
temos que contar com eles. Podemos passar a analisar, a seguir, o lugar dos discursos
teóricos e o lugar da experiência pessoal.
É aí, nesta lacuna, que se instala a pertinência de um lugar e um tempo para que
possamos, por meio do que não é sistemático, submeter aquilo que o é à prova,
tornando-o mais familiar, incorporado, através do acesso à sua incompletude original,
do acesso ao estranhamento. Um espaço onde o que não é sistemático possa ser
momentaneamente instaurado como experiência que flui, desatrelada do conhecimento
sobre ela. Alheio ao contexto do demonstrável, o estranhamento é viável, entre outras
coisas, a partir do pensamento axiológico, tornando-se acessível por meio da
explicitação e análise das crenças e valores, processo pelo qual o indivíduo, ele
também, põe-se à prova, revendo-os.
Recebemos para estágio, em resumo, alunos que foram apresentados à parte do
saber acessível pela via da sistematização, vertente que, mesmo que tivesse sido
exaustivamente trabalhada, depende de um outro tipo de conhecimento que lhe serve de
dispositivo acionador, e que não é acessível pela representação. É possível e viável,
nesse momento, apresentar-lhes uma alternativa para isso. Afinal, é em parte disso que
vêm cuidar na clínica: de desenvolver esse outro lado, apropriando-se do conhecimento
adquirido pela via do exercício, como o aprendiz de artesão, que burila aquilo que sabe
por meio do fazer.
Eles chegam até nós ambivalentes. Acostumados a lidar com as representações,
algumas das quais já consideradas familiares, imaginando poder projetá-las sobre os
futuros clientes, vêm, por um lado, confiantes, até por sua inexperiência, na
transparência e aplicabilidade daquilo que aprenderam. Diante daquilo a que tiveram
acesso acreditando, podemos instituir um espaço intermediário, onde essas crenças
assumam um caráter provisório para, suspensas, serem confrontadas, podendo aí ser
assumidas na forma de incorporação.

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Ansiosos por colocar tudo isso em prática, os alunos não vêem a hora de
atender. É isso que farão nas outras áreas de estágio, que são o lugar por excelência para
exercitarem suas habilidades. Lá estão reunidas, em princípio, a teoria e a prática,
favorecendo todos os intercâmbios entre elas. A iminência do atendimento, no entanto,
se por um lado fascina, por outro amedronta. Esse início é marcado pelas inseguranças
ocasionadas pelo compromisso duplo que assumem. Ao atender, os estagiários têm um
compromisso com o cliente à sua frente, do qual devem cuidar e diante de quem têm
que mostrar alguma competência, e outro com o arcabouço de conhecimentos
acumulados, ao qual devem se reportar obrigatoriamente, e que será avaliado por um
supervisor. Expostos diante desses outros têm que aprender a desenvolver as diferentes
escutas, têm que dar respostas imediatas ou exercitar a suspensão. Demonstrar
inadequação acarreta consequências que podem determinar sua reprovação.
Sentem-se incapazes de um relacionamento natural com os futuros clientes, por
perceberem-se aprisionados pela obrigatoriedade de lançar mão dos instrumentos
aprendidos corretamente. Acreditam pouco em si mesmos porque, principiantes, estão
suspensos na iminência de construir uma experiência profissional, a ser desenvolvida ao
longo do resto de suas vidas, e que nesse momento apenas se inicia. Acreditam pouco
em si mesmos porque foram ensinados, ao longo dos quatro anos antecedentes, a
encobrir seu senso comum por constructos sistematizáveis, aprendendo a desconsiderar
o que vem da observação da "espécie comum humana".4
Pressionados por terem que se mostrar competentes, tendem a amenizar a
sensação de estarem perdidos, por um lado, pelo recurso às explicações rápidas demais,
obtidas pela via da compreensão entendida como encaixar o cliente naquilo que sabem
através do que aprenderam. Quando esse encaixe não é possível, acabam por parear as
manifestações do cliente com sua própria experiência de vida, o último refúgio seguro
ao qual podem se reportar. Têm medo de errar e sabem, ao mesmo tempo, que de agora
em diante grande parte do que vai acontecer depende, ali, na hora, deles mesmos. É
nessa travessia que pretendemos ajudá-los.
Ambivalentes também somos nós, supervisores, neste contexto. Constituimo-nos
como o polo da experiência, ditada pelo fato de sermos, o mais do tempo, mais velhos,
e por trabalharmos há mais tempo. Isso também pode constituir-se numa forma de
aprisionamento instaurada por um dos entendimentos possíveis do que "experiência"
quer dizer, como aquilo que se adquire ao longo da vida e que nos aplaina o espírito,
tornando-nos descrentes.
"Em nossa luta por responsabilidade enfrentamos um mascarado. A máscara do
adulto chama-se "experiência". Ela é inexpressiva, impenetrável, sempre igual. O que
experimentou esse adulto? O que pretende provar-nos? Antes de tudo um fato: também
ele foi jovem, também ele desejou outrora o que agora queremos, também ele não
acreditou em seus pais; mas a vida também lhe ensinou que eles tinham razão. E ele
sorri com ares de superioridade, pois o mesmo acontecerá conosco."
(Benjamin,[1913]1984:23)
Aqui há uma analogia possível com o "apoiar-se na tradição" heideggeriano, em
sua vertente mais limitadora, de temor diante da possibilidade da não existência
(próxima, já que somos mais velhos): o modo da adesão às possibilidades, do deixar-se
viver no mundo perdido no disponível (Heidegger,1988). Eminentemente retrospectiva,
essa experiência não nos inclina a nada, por ser composta do que se deixou para trás: a

4Quanto a isso, já tive a oportunidade de assinalar, em outro trabalho (Cupertino, 1995), o quanto
é freqüente que a transmissão se dê orientada pelo sucesso, trazendo-nos a sensação de que
qualquer falha só pode ser atribuída à má aplicação da técnica por parte de um indivíduo mal
preparado.

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juventude, os ideais, e a capacidade de deixarmo-nos surpreender. Constitui-se na
comemoração de cada novo fracasso, pois ele demonstra, ainda como quer Benjamin,
que o adulto sempre teve razão.
Há, ao contrário, uma outra experiência possível, característica da juventude
segundo Benjamin, que é aquela pela qual se passa, vívida e estimulante, de desafio ao
estabelecido, de movimento para um vir-a-ser descomprometido com a responsabilidade
desesperançada da desilusão progressiva.
"Tudo o que tem sentido, que é verdadeiro, bom, belo está fundamentado sobre
si mesmo - o que a experiência tem a ver com tudo isso? ...a experiência se torna para
ele (o adulto) a mensagem da vulgaridade da vida (enquanto que) cada uma de nossas
experiências (as outras, vivas) possui efetivamente um conteúdo, conteúdo que ela
recebe de nosso próprio espírito."(Benjamin,[1913]1984:24)
O que é bom, belo e verdadeiro é porque sim. Essa experiência que é porque sim
dá sentido a si mesma, e "somente para o indivíduo insensível a experiência é carente de
sentido e imaginação. Talvez ela possa ser dolorosa para aquele que a persegue, mas
dificilmente ela o levará ao desespero." (idem:24)

De volta à Oficina de Criatividade

A Oficina de Criatividade é o momento que os alunos têm para dirigirem o olhar


para si mesmos, em princípio através da suspensão da necessidade externa (e da
ansiedade interna) de acertar, de avaliar um conhecimento que escapa a essa
possibilidade. É um lugar para o recolhimento, para que o pensamento se volte para si
mesmo, desobrigado de perseguir caminhos pré-estabelecidos, constituindo-se para
todos, supervisores e alunos, como campo para essa segunda espécie de experiência
descrita por Benjamin. Dessa forma, a Oficina pretende incidir, por meio de atividades
que se conectam umas às outras mais do que a qualquer conhecimento explicitável que
as anteceda, sobre os conhecimentos subsidiário e tácito.
Sabemos que eles não são atingíveis pela via da representação. Apenas supomos,
sem nenhuma certeza, que podem ser postos em movimento de outra maneira, que é a
da criação, neste caso deliberadamente, das lacunas a serem preenchidas.
Essa suposição traz novamente à cena os entraves quanto à possibilidade mesma
de fazer a análise à qual me proponho, que aparece como uma sensação de desconforto
quanto à utilidade e à pertinência de começarmos, agora, a pegar alguns itens
selecionados a partir do relato inicial da Oficina, submetendo-os a um destrinchamento
sistemático.
A possibilidade de análise, reduz-se a cercar de perto o que acontece na Oficina,
sem entrar hora nenhuma em contato com "os fatos". Sintomática recusa, a intenção de
fazê-lo configura-se para mim como uma redução simplificadora através do
estabelecimento de relações lineares, destinadas a empobrecer ou o relato explicativo,
ou a experiência relatada.
Ao mesmo tempo, sabemos que os acontecimentos gerados na ruptura e a partir
dela anunciados, devem ser reconduzidos a uma trama que pode, ela mesma ser re-
significada, sob risco de permanecerem órfãos, separados de seu potencial
transformador. "Um acontecimento é, de início, uma ruptura na trama das
representações e das rotinas; em outras palavras, de início o acontecimento é uma
quebra nos dispositivos de construção e manutenção do 'tecido da realidade'; mas um
acontecimento é também a transição para um novo sistema representacional"

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(Figueiredo,1994a:151-152)5. Essa transição é proposta aos alunos, quando são
solicitados a falar sobre suas experiências após vivê-las. O mesmo acontece comigo
nesse relato, vivido como um processo longo e estimulante de preenchimento de
lacunas, tentando reconduzir o que aparece como clareiras abertas a uma trama que faça
um mínimo de sentido para um leitor que eu pretendo que reconheça, a partir desse
trabalho, partes de si mesmo, podendo avaliar e incorporar o que nele lhe interessar. O
recurso aos dados, então, é inevitável, assim como escrever sobre o trabalho. A eles,
entretanto, reservo o espaço de exemplos, oferecidos quando considerados de utilidade
para compreensão desse cenário mais amplo de uma aprendizagem diferenciada,
calcada não mais apenas no conhecimento sistemático.
Voltando às lacunas (ou permanecendo nelas?), pretendemos, na Oficina de
Criatividade, estabelecê-las saindo momentaneamente do campo do representável, por
meio de atividades pouco habituais no contexto acadêmico, que se apresentam sempre
aos alunos como uma surpresa. Trabalhamos com experiências de outra ordem,
representáveis ao final, quando falamos sobre elas, mas que partem de uma outra
escuta, permitindo que nosso pensamento navegue desatrelado, detendo-se naquilo que
se constitui, em nós mesmos, como aspereza.
O plural aqui se aplica, porque do mesmo modo que solicitamos aos alunos que
falem sobre suas vivências, para que identifiquem nelas o que soou estranho, nós,
supervisoras, nos comprometemos a fazer o mesmo quanto à nossa própria experiência
dentro do mesmo contexto.
O tratamento dado ao que falamos pretende também, sempre que possível, evitar
a categorização imediata do que é dito com o intuito de inseri-lo num quadro de
referências organizado, que se desdobre diante de nós logicamente, ou numa retomada
de conceitos estudados, numa instrumentalização do aprendido na fase acadêmica
anterior. Nossas intervenções visam, quanto a esse aspecto fazer incidir a reflexão sobre
esse conhecimento sistematizado, a partir da experiência, identificando nele também
asperezas.6
Como exemplo (enfim!) dessa situação, podemos pensar na discussão
apresentada sobre a loucura, apenas uma das muitas que tivemos sobre o assunto.
Lembramos que ela é descrita no capítulo 2 a partir de uma atividade proposta pelos
alunos, que constava de um video que visava representá-la, seguida de uma discussão na
qual, escapando de definições precisas da loucura, cuja fragilidade já foi logo apontada
pela aluna que dizia que havia ficado na dúvida sobre qual delas trazer, criamos o
espaço para que fosse explorada uma forte resistência a ela por meio da experiência
pela qual acabavam de passar e de exemplos de fora, os casos encontrados pela rua. Ali,
através de uma maneira que não era nem o contato direto com um cliente concreto, nem
o "ouvir sobre", pudemos desencadear e trabalhar o medo e a rejeição frontal que os
alunos apresentavam frente àquilo que, podemos pensar, são as formas do existir
humano com a qual pretendem se envolver profissionalmente.

5 É importante assinalar que esta é uma referência explícita às formulações de Figueiredo


elaboradas em seu texto "Fala e acontecimento em análise", feita com a ressalva de que não ouso
conferir ao que se passa na Oficina de Criatividade o mesmo status atribuído pelo autor ao
"acontecimento". Entendo que o que acontece conosco não tem um caráter tão radical, ou não se
constitui como uma ruptura tão intensa quanto a apresentada pelo autor, "que destroça mundo e
funda mundo", que é "sempre uma prefiguração da morte" de intensidade equivalente ao trauma
psíquico. Se vivemos acontecimentos, ele acontecem numa versão mais "leve", se é que esse tipo
de fenômeno pode ser avaliado por esse prisma.
6 Há trechos neste capítulo que referem-se ao material recuperado a partir do Capítulo 2,
apresentado em alguns momentos, como esse, de forma resumida, e em outros literalmente.

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A Oficina é o lugar para exercitar um abandono consentido do que é
sistemático, e nisso talvez esteja o último resíduo que permite que ainda a chamemos de
Oficina de Criatividade, entendendo aqui o criativo quase que do ponto de vista amplo
do senso comum, como o que se opõe ao sistemático. As atividades desencadeiam
processos, mais de modo aleatório do que previsível, e abrem o campo para discussão
não só (mas basicamente) dos processos experimentados pelos alunos, mas também das
projeções que eles fazem desses mesmos processos sobre os clientes: por passarem pela
experiência, tornam-se capazes de falar a respeito de como esta ou aquela vivência
atinge as vidas humanas, deles ou dos outros.
Um outro aspecto pertinente à discussão, e que ilustra a composição dupla do
saber psicológico diz respeito à condição de representação dos trabalhos propriamente
ditos.
Muitas vezes formulamos as instruções para a tarefa a ser realizada através da
expressão "façam um trabalho X, que represente tal ou qual aspecto de sua vida". É
inevitável, diante dessa solicitação, que nos reportemos ao caráter projetivo que
conferimos a ela: na verdade, acreditamos que ao fazer uma colagem, por exemplo, o
aluno está de alguma maneira mostrando algo de si, quando sabemos que acreditar que
o trabalho representa alguém pressupõe que imaginemos que esse alguém se constitui
em algo estático, ou que há uma essência da pessoa a ser representada. Nesse caso, esse
pedido visa justamente criar as condições de confronto entre a pretensão de podermos
dizer alguma coisa sobre os outros tomando como referência produções isoladas. Põe
em suspenso essa pretensão.
Difíceis de fazer, os trabalhos exigem que os alunos parem para pensar sobre si
mesmos, reduzindo-se ao que consideram como o mais significativo a ser mostrado.
Estabelecem um trajeto de revisão a respeito de características pessoais, permeado por
um processo de escolha daquilo que vale a pena mostrar, que por si só já vale a sugestão
da tarefa. Defrontados com a complexidade irrepresentável de si mesmos, tendem a
amontoar figuras que "representem" o máximo de coisas possível, caindo na
generalidade. São tanta coisa que podem ser qualquer coisa. Podemos, já aí, discutir o
quanto é difícil esse tipo de redução, pelo lado do quanto é difícil ver-se reduzido. São
apresentados à sua própria irredutibilidade, e aprendem a por em suspenso a
possibilidade de virem a fazer o mesmo com seus clientes.
A partir da apresentação anônima dos trabalhos, introduzimos o problema de ter
que identificar os demais apenas por meio do produto feito, tarefa para a qual têm que
lançar mão de sua sensibilidade, daquilo que já sabem sobre o outro, e de algumas
articulações superficiais na linha mesma da interpretação dos recursos projetivos ou das
tão atuais práticas alternativas. Estão acionados os vários tipos de conhecimento, numa
manifestação do mais puro ecletismo prático, em alguns casos de forma mais bem
sucedida que em outros, cuja articulação pode então ser trabalhada.
Do confronto com a interpretação feita pelos outros, ou da possibilidade de
tentar a identificação de alguém mais, surge a questão do quanto a produção é genérica,
se pretende mostrar mesmo alguma coisa. E a conseqüente pergunta: será que é possível
mesmo mostrar tão completamente qualquer coisa a partir de um exemplo único, de um
objeto desvinculado de qualquer contexto, mesmo considerando uma produção mais
específica? E mais: há sentido em se pedir uma coisa assim, em princípio impossível?
A discussão posterior evidencia aquilo a que se pode chegar: o diálogo como
condição de negociação dos entendimentos possíveis. Trabalhamos com eles a
impossibilidade de uma apreensão globalizante, de ver a totalidade de uma vez. Quando
pretendemos fazer isso, fica tudo igual, o relevo se achata, as nuances e sutilezas se
perdem. Recuperá-las significa perseguir o que aponta para (não tão) determinadas
direções, apreensíveis por meio de recursos variados, mas sempre discutíveis, no

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sentido mesmo de terem que ser abertos à discussão, para que qualquer conhecimento se
constitua. Abre-se a impossibilidade de desvelar qualquer coisa que seja sobre o outro
fora dessa condição de intercâmbio propiciada pela escuta mútua constituída na lacuna
daquilo que reconhecemos não saber.
Experiências desse tipo devolvem os discursos teóricos a outro lugar que não
aquele de exclusividade obtido ao longo dos primeiros quatro anos do curso de
psicologia. Ou melhor, impedem que eles se cristalizem como verdades absolutas, como
ortodoxia.
Como?
Constituído, como vimos, na confluência de vários saberes, o conhecimento
psicológico se estabelece como um trânsito inesgotável de um a outro. "Penso que é
realmente necessário levar a sério a idéia de que a experiência incorporada, o
conhecimento tácito e pessoal, entranhado no corpo, não é totalmente transparente e
convertível em teoria. Mas, na direção inversa, é preciso também se resignar diante do
fato de que os sistemas representacionais nunca serão totalmente incorporados às
práticas, melhor dizendo, eles sempre serão compreendidos de acordo com as
possibilidades abertas pelos conhecimentos subsidiários." (Figueiredo,1995a:93)
Frente a essa condição dupla, concluímos que a falência da razão como recurso
único não a invalida devolvendo-nos ao senso comum, que nos atrela ao habitual, ao
rotineiro e nos desobriga da explicitação, como é freqüente observarmos nos praticantes
da psicologia e, mais ainda, nos estagiários.
O pluralismo e o atravessamento de diversas referências presentes no exercício
da psicologia, com as decorrentes inseguranças nas quais nos colocam, acabam por
depositar sobre o profissional a possibilidade de articulação. Nos diz Vorcaro (1995)
que uma prática apoiada numa multiplicidade de pressupostos faz com que caiba ao
clínico a junção de todas as referências, atribuindo a ele papel central nesse processo. A
confluência de possibilidades explicativas, que têm ainda um caráter difuso durante a
iniciação, torna esse aspecto problemático quando se trata de estagiários que ainda não
definiram claramente seus caminhos, que se sentem despreparados apesar de
teoricamente informados, e que tendem a lançar mão de todos os recursos possíveis
para articular suas compreensões, até como modo de testar cada um deles.
Privilegiando a relação como o que deve ser preservado a qualquer custo,
transformando-a num vale tudo de onde retiram as articulações possíveis, podemos
perceber que os estagiários, inundados pela multiplicidade de pontos de vista que ainda
não sabem manejar, pressionados a dar respostas, passam a tomar a si mesmos como
padrão.
É necessário, assim, que se estabeleça um nível ótimo de tensão entre os dois
tipos de conhecimento, no qual o discurso teórico teria um papel de "desalojar os
conhecimentos tácitos impregnados nas práticas mecanizadas, reintroduzindo nelas o
espaço do encontro com o inesperado..." (Figueiredo,1995a:94).
Ou seja, voltando à possibilidade de deixarmo-nos surpreender, de permitirmos
que a experiência contrarie o que esperamos em uma situação, condição entendida até
agora como o espaço por excelência do conhecimento pessoal, podemos inverter o
raciocínio, pensando que, diante de nossas disposições tácitas, o conhecimento
representacional possa emergir, ele também como possibilidade de quebra das
expectativas, como a condição de estranhamento. "...a função da teoria é a de abrir no
curso da ação o espaço da indecisão, do adiamento da ação, tempo em que podem
emergir novas possibilidades de escutar e falar. É nessa medida que, no campo da
clínica psicológica, representações e conhecimentos tácitos deveriam conservar-se a
uma respeitosa distância uns dos outros." (idem:94).

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Este nível de tensão devolve a seu devido lugar o discurso científico como busca
de um sentido dado, ou seja, de razões - o sentido da vida, a ordem pressuposta, a razão
de ser das coisas. Institui a necessidade da ruptura com os hábitos ditados pelo senso
comum, desalojando-nos pela reflexão e revelando que o sentido não está lá aguardando
nosso olhar para finalmente ser desvelado. O sentido se constrói, se faz, tanto faz com
que elementos, que podem ser os que escolhemos para nós, em nossas vidas
particulares, ou quaisquer outros. Diante dele temos que suspender as certezas, romper
com o habitual, arriscarmo-nos nas infinitas formas de vida. A tensão esvazia a teoria
de sua capacidade de gerar adeptos cada vez mais separados de suas experiências
próprias e, inversamente, reverte o movimento de apoiar-se estritamente sobre estas
últimas, ambos movimentos claramente observáveis quando tratamos com estagiários,
"...instaurando os espaços do desconhecimento nos quais podem ser acolhidas as
alteridades emergentes." (Figueiredo,1993:94).

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Referências bibliográficas

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CUPERTINO, C.M.B. O psicodiagnóstico fenomenológico e os desencontros possíveis. In
ANCONA-LOPEZ, M. (org.) Psicodiagnóstico: processo de intervenção. São Paulo: Cortez,
1995.
FIGUEIREDO, Luis Claudio M. Sob o signo da multiplicidade. In Cadernos de subjetividade, São
Paulo, vol 1, nº 1, mar/ago 1993.
____________________________ Escutar, recordar, dizer: encontros heideggerianos com a
clínica psicanalítica. São Paulo:Educ/Escuta,1994a.
____________________________ Revisitando as psicologias: da epistemologia à ética nos
estudos psi. S. Paulo: Vozes/Educ, 1995a.
91.
HEIDEGGER, M. Ser e Tempo. Petrópolis, RJ: 1988.
STERN, Donnell B.Courting Surprise. in Contemporary Psychoanalysis, v.26, n.3, 1990.
VORCARO, A. Compreender ou estranhar: incidências no psicodiagnóstico. In ANCONA-
LOPEZ, M. (org.) Psicodiagnóstico: processo de intervenção. São Paulo: Cortez, 1995.

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