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Raquel Rolnik: O Futuro das Cidades – 20 minutos entrevista

Na entrevista que dá ao canal Opera Mundi, a professora e arquiteta Raquel


Rolnik fala sobre os problemas habitacionais atuais que afligem o Brasil, sobretudo as
grandes capitais como São Paulo.
A urbanista começa a entrevista falando sobre seu livro O Futuro das Cidades,
apontando que quando se fala sobre o assunto é preciso pensar em “futuros”, plural,
uma vez que as cidades abrigam pessoas de diferentes classes sociais e que atuam
em diferentes áreas, cada uma precisando de um tipo diferente de assistência urbana.
Desta forma, cada cidade apresenta uma proposta de futuro ideal diferente de outra,
pois seus moradores têm interesses e vidas diferentes uns dos outros, eles são
múltiplos e individuais, o futuro ideal para uma cidade do interior é muito diferente
daquele de um grande metrópole.
É debatido também a forma como as políticas públicas atuam na questão
habitacional e o impacto da pandemia no crescente aumento de desabrigados. A
pandemia do covid-19 elucidou a quão desgastada estava a relação das pessoas com
a vida e com a organização do espaço onde vivem. Ela surgiu como resultado de
inúmeras crises ambientais e trouxe à tona as crises políticas das cidades, sua
organização, sua infraestrutura, a capacidade de oferecer proteção e saúde a seus
moradores, entre outras. Junto a esta grande crise mundial, ocorre em grandes
capitais, tal como São Paulo, um boom imobiliário nunca visto antes, aumentando as
taxas de pessoas sem moradia e sem qualquer política habitacional que funcionasse
em função de reverter ou até mesmo controlar esse processo.
Este boom se deu em diferentes classes sociais, e Raquel explica de forma
clara a diferença entre sua ocorrência em moradias de baixo padrão e nas de custo
mais alto. Enquanto a primeira gera a grande falta de moradia da população mais
carente em decorrência da diminuição de renda na quarentena e a falta de uma
solução pública eficiente que suprisse este déficit, a outra está diretamente ligada a
uma dinâmica financeira de realocação de capital, um processo que acontece
ciclicamente em diversos lugares do mundo de tempos em tempos.
A professora fala também sobre o processo de “expulsão” da população menos
rentável do núcleo das cidades. As casas e apartamentos nos grandes centros
urbanos possuem preços astronomicamente altos em função de espaços pequenos,
fazendo com que a parcela pobre dos moradores da cidade migre para as zonas
periféricas, onde os preços são mais baixos, mas precisem pegar inúmeros
transportes para conseguir se locomover todos os dias, seja para ir ao trabalho ou
acessar algo dentro das cidades. Este processo vai criando um ciclo que impede que
seus usuários consigam sair, pois para tal seria preciso juntar dinheiro para um local
mais próximo dos centros, mas como fazer isso com um salário baixo e a necessidade
de gastar todos os dias com um transporte público caro e desestruturado? Entretanto,
apesar de parecer difícil, este processo não é completamente irreversível, todo este
ciclo é fruto de políticas urbanas e como tal pode ser revertido por novas políticas
urbanas que busquem romper com esse sistema desigual. Para isso seria preciso
analisar quais estruturas tem garantido que o ciclo se perpetue e quebrá-las sem
demora. Um dos pilares apontados por ela é o próprio mercado imobiliário, que visa
o máximo lucro sem se importar com as pessoas.
Quando questionada sobre projetos governamentais que buscam dar fim a
crise habitacional, como o “Minha Casa, Mina Vida”, a professora explica como eles
tem funcionado no momento e as mudanças que precisam. Estes projetam continuam
perpetuando o problema das periferias ao redor das cidades, uma vez que – buscando
um menor custo – fazem as construções de suas casas afastadas dos polos urbanos,
e não se preocupam em criar ao redor dos novos bairros escolas, farmácias, hospitais,
mercados, e demais serviços primordiais para a vida de seus moradores ali, fazendo
com que tenham que continuar presos neste ciclo de dependência de transportes
públicos que não os atende corretamente e só gera mais caos e desgaste para os
grandes centros.
As políticas habitacionais não estão diretamente ligadas a criação e distribuição
de mais casas para quem não tem moradia, ela pode se dar através da realocação em
locais desocupados, políticas para regulamentação de aluguéis, assistência técnica,
entre outros. Na visão de Raquel, ações emergenciais já deveriam ter começado a ser
colocadas em prática para solucionar este grande índice de desabrigados, e apenas
não teve início ainda por uma questão racista, baseada na visão que se tem de que
pessoas pobres e não brancas não devam pertencer às áreas centrais das cidades.
Raquel Rolnik nos traz sua visão especializada de que para se conseguir
caminhar rumo a cidades realmente funcionais e confortáveis a todos seus moradores
é preciso que a discussão sobre habitação saia das mãos dos bancos e de grandes
construtoras. É preciso começar a ouvir aqueles que tem ficado do lado de fora da
sala nos últimos séculos, mas que são os únicos a viver com as consequências e
resultados das políticas habitacionais, os únicos capazes de afirmar o que é
necessário para que a população urbana se sinta confortável e viva com dignidade; o
próprio povo.

Yasmim Silva Campos


2° Período de Arquitetura e Urbanismo
História da Arquitetura, da Arte e da Cidade II

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