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A cidade percebida como forma é aquela caracterizada por prédios, casas, ruas, avenidas, viadutos,
carros, poluição, congestionamento, multidão etc. Entretanto, estas formas visíveis se sobrepõem ao real
significado da cidade, aquele vinculado ao trabalho social. Isso ocorre porque a cidade atende às
necessidades de reprodução do capital, sendo o sujeito que a produz capturado pelas necessidades de
consumo.
Como você viu na aula passada, o espaço é muito mais que um elemento físico, visto que é construído
pelos homens a partir de suas necessidades. Assim, o conceito de espaço é in-dissociável dos seres
humanos que o constrói e o modifica nas suas relações cotidianas. Logo, o espaço é também humano e a
sua essência está no trabalho social, sendo palco de mudanças desencadeadas pelas relações sociais
que, por sua vez, seguem um enredo de ação.
As estruturas e as formas espaciais que compõem a cidade não são apenas suporte e reflexo, mas um
produto da dinâmica histórica da sociedade.
A cidade reflete e reproduz a dinâmica histórica da sociedade. A organização espacial das cidades
capitalistas é bastante complexa e contraditória com diferenças nas condições e nos modos de vida, o que
acarreta os movimentos sociais urbanos. Na realidade, a cidade tem-se constituído historicamente no
principal palco das lutas sociais e dos conflitos entre capital e trabalho, visto que a diferenciação na
organização espacial das cidades não revela apenas a heterogeneidade entre modos de vida, mas
também formas de apropriação diferenciada dos espaços e, principalmente, as contradições da sociedade
de classes.
A diferenciação na organização espacial das grandes cidades brasileiras é notável. Existem áreas
residenciais habitadas por uma população de alto nível de renda e com excelente infraestrutura e serviços
urbanos, que estão localizados nos setores de amenidades da cidade. Portanto, são áreas de alto preço
da terra, chamadas zonas nobres da cidade.
Em oposição a estas áreas, existem outras habitadas por uma população de baixo poder aquisitivo,
constituída por trabalhadores com baixa qualificação. Esses trabalhadores, em geral, são empregados do
setor terciário, subempregados e desempregados que vivem em favelas dispersas pelo espaço da cidade,
em conjuntos habitacionais ou em loteamentos irregulares, com casas autoconstruídas pela própria
população nas horas de lazer.
Pois bem, é nesse contexto, de apropriação e usufruto desigual dos bens materiais e imateriais dos
espaços, que surgem os movimentos sociais pelo direito à cidade, os quais não se restringem à luta pelo
acesso às estruturas urbanas. Todas as pessoas têm o direito de encontrar na cidade as condições
necessárias para sua realização política e social, portanto, para o exercício pleno da sua cidadania. Esse
direito, no entanto, não está garantido a todos. Dessa forma, a cidadania estará comprometida pela falta
de acesso não apenas à moradia digna, mas à educação, à saúde, ao trabalho, à justiça oficial, ao
transporte, à cultura e ao lazer.
Vale dizer que as favelas são um problema secular na dinâmica da urbanização do Rio de Janeiro. Ao
longo de sua existência, foram objetos de intervenções públicas, representando um dos principais desafios
para a sociedade carioca. Nos anos de 1920 e 1930, as favelas eram criticadas e consideradas manchas
na paisagem urbana da cidade, sendo recomendada a sua extinção. Os planos e regulamentos
urbanísticos as situavam fora da legalidade urbana e orientavam a sua remoção sob argumentos
inspirados no sanitarismo e nos aspectos funcionais e estéticos.
Nos anos de 1940, a história das favelas cariocas é marcada por intervenções pontuais e
desarticuladas, com propostas de construção de bairros operários para abrigar a população moradora de
favela, por exemplo, cujos projetos não foram desenvolvidos.
Nos anos de 1960 e 1970, configurou-se e desenvolveu-se um projeto para a erradicação das favelas por
meio da política de remoção de famílias para conjuntos habitacionais na periferia da cidade, como os de
Vila Kennedy, Vila Aliança e Vila Esperança.
Ao final da década de 1970, foi instaurada uma polarização no debate sobre o problema das favelas,
sendo o modelo de remoção contrastado à proposta de urbanização das favelas. A década de 1980 marca
a inversão do rumo das ações relativas às camadas populares. Desenvolveram-se projetos de
urbanização de favelas que estabeleciam uma metodologia que seria aperfeiçoada, possibilitando o
desenvolvimento do programa Favela-Bairro na década seguinte.
Os problemas das cidades brasileiras levaram o atual presidente da República do Brasil, Luiz Inácio Lula
da Silva, a dedicar um ministério exclusivamente para as cidades, responsável pela política nacional de
desenvolvimento urbano no país. Grosso modo, esse ministério tem como proposta construir uma cidade
com justiça social, por meio de políticas públicas de infraestruturas da moradia e de transportes, além de
permitir a troca de experiências e projetos bem-sucedidos nas cidades brasileiras. Junto com a criação do
Ministério das Cidades, também se constituiu o Conselho Nacional das Cidades, o qual tem o objetivo de
discutir parcerias entre os municípios, buscar soluções para o desenvolvimento das cidades e definir
diretrizes para a distribuição dos investimentos daquele ministério. Quanto à sua composição, integram o
Conselho representantes dos poderes municipal, estadual e federal, movimentos populares, entidades
empresariais e profissionais, sindicatos de trabalhadores, ONGs e instituições de ensino e pesquisa.
Apesar das iniciativas mencionadas, a democratização da cidade passa pelo combate aos mecanismos de
espoliação urbana, fundados na desigualdade e na segregação socioespacial. Isso pressupõe mudanças
estruturais nos padrões de produção e consumo e nas formas de apropriação do território e dos recursos
naturais, questões que representam um dos principais desafios à nossa sociedade. Indicam, ainda, a
necessidade de se repensar as políticas e o modelo de gestão urbana, de modo a produzir cidades mais
humanas e menos segregadas, devolvendo aos cidadãos o direito à cidade em que habitam.
Como consequência, o mercado de trabalho teria se alterado, evidenciando uma estrutura sócio-
ocupacional em cujo topo estariam situadas categorias profissionais superiores, altamente qualificadas e
bem remuneradas, em contraste com uma base constituída por categorias profissionais inferiores,
compostas por pessoas em empregos formais e informais de baixa remuneração ou desempregadas.
Assim, a estrutura social das grandes cidades tenderia à dualização, ou seja, ao aumento da distância
entre as duas posições sociais, inferiores e superiores, e a contração das camadas médias. Por sua vez,
o impacto espacial da dualização social configuraria áreas demarcadas por padrões sociais diferenciados
que levariam, de um lado, à apropriação exclusiva dos espaços mais valorizados e, de outro, à
configuração de espaços exclusivos da pobreza. A idéia de dualidade estaria baseada, portanto, na
diferenciação social e espacial entre as áreas centrais prósperas, onde se localizam os grupos sociais
mais abastados, e os enclaves, próximos geograficamente, onde haveria concentração de pobreza.
Nesse contexto, constata-se a expansão de novas formas de produção dos espaços urbanos, indicando
mudanças na organização e no padrão de ocupação em áreas das grandes cidades, marcadas pelas
novas formas de segregação espacial, tanto em áreas centrais quanto em áreas periféricas. De acordo
com estudos recentes sobre as principais cidades latino-americanas, essas novas formas de segregação
urbana estariam sendo estimuladas pelo aumento das desigualdades sociais e corresponderiam a uma
diminuição da distância física entre ricos e pobres. Tal fenômeno tornaria os mecanismos de separação
social mais evidentes, causando novos problemas ou possibilidades inéditas de interação social.
Os habitantes da cidade formal, preocupados com a violência e com a proximidade física dos pobres,
utilizam mecanismos de apartação social, como muros, grades e guaritas, além de equipamentos de
controle e de segurança, que se espalham nos grandes centros urbanos.
Os espaços públicos passam a ser substituídos por complexos fechados e bairros controlados pela
vigilância eletrônica, verdadeiras “cidadelas” que garantem que os mais pobres fiquem de fora da
vizinhança. Com isso, observa-se a expansão de espaços residenciais e comerciais exclusivos, com a
privatização de espaços públicos, já que há o fechamento de ruas e de praças para garantir a segurança
de setores da população ameaçados pelas “classes perigosas”.
É importante ressaltar que, embora os mecanismos de separação social dependam da cidade, de suas
especificidades e história locais, da sua mistura de classes e mesmo da vida cotidiana, este cenário vem
expressando uma tendência de aumento da segregação urbana que atravessa tanto as áreas centrais
quanto as áreas periféricas. Na realidade, o acirramento das formas de segregação representa um dos
traços mais expressivos da urbanização contemporânea da sociedade.
Você já sabe que o turismo consome de forma elementar o espaço, impondo uma dinâmica à
organização espacial das localidades, que são alvo da exploração turística. Na realidade, o turismo se
constitui hoje em um dos principais vetores da reorganização socioespacial das regiões, tendo em vista a
necessidade de alocação de infraestrutura básica e empreendimentos turísticos, voltados para o avanço
da atividade como construções de aeroportos, aberturas de rodovias, obras de infraestruturas urbanas e
de embelezamento, hotéis, restaurantes, pousadas, parques temáticos, centros comerciais etc.
Nesse sentido, em que medida o turismo e o lazer podem acentuar os mecanismos de segregação social
nas cidades? Podemos destacar vários exemplos de formas de segregação em complexos turísticos,
espaços de lazer e entretenimento como os parques temáticos e aquáticos, resorts, clubes privativos e
centros comerciais, os chamados shoppings centers. Assim como os condomínios fechados, esses
empreendimentos turísticos buscam pessoas com um poder aquisitivo que as permita consumir os seus
produtos e serviços. Desse modo, a criação e o uso desses espaços estão intimamente relacionados ao
poder de compra dos consumidores, visto que buscam atingir um público-alvo previamente definido, isto é,
aqueles com as mesmas condições financeiras de usufruir o que esses espaços oferecem como
segurança, conforto, opções de consumo e lazer de alto padrão de qualidade, por exemplo.