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Escola Freudiana de Belo Horizonte - IEPSI


Curso de Psicanálise - Diagnóstico



Semestre II, 2022


Nara França Chagas

Andrea Chagas Libânio de Freitas

Uma criança é espancada



Uma contribuição ao estudo da origem das perversões sexuais

Sigmund Freud, 1919

Aluízio Quintão
Out/Nov 2022
Sala de aula na Europa - 1918
Crianças durante a 1ª Guerra Mundial

De Julho de 1914 a Novembro de 1918
Uma criança é espancada - Uma contribuição ao estudo da origem das perversões
sexuais - 1919, Freud


Nota do Editor Inglês - Imago


A presente tradução inglesa é versão corrigida da publicada em 1924. Numa
carta a Ferenczi, datada de 24 de janeiro de 1919, Freud anunciava que estava
escrevendo um artigo sobre o masoquismo. O artigo foi concluído e recebeu o
presente título em meados de março de 1919, e foi publicado no verão do
mesmo ano. A maior parte do artigo consiste em um inquérito clínico muito
detalhado sobre um tipo particular de perversão. As descobertas de Freud
elucidaram particularmente o problema do masoquismo, e, como está implícito
no subtítulo, o artigo era também destinado a ampliar o nosso conhecimento
sobre as perversões de um modo geral. Desse ponto de vista, pode ser
considerado como um complemento ao primeiro dos Três Ensaios sobre a
Teoria da Sexualidade (1905d). Além do mais, no entanto, o artigo inclui uma
exposição, à qual Freud atribuiu considerável importância, dos motivos que
colocam em ação a repressão, com especial referência às duas teorias sobre o
tema, propostas respectivamente por Fliess e por Adler.
”As pessoas não são
francas em matéria sexual.
Não mostram livremente
sua sexualidade; usam, isto
sim, um espesso manto de
mentiras para escondê-la,
como se fizesse mau
tempo no mundo da
sexualidade.” (FREUD,
1909-1910).

Autorretrato Desnudo - 1910



Tela de Egon Schiele, pintor
expressionista austríaco
I

✓ Pesquisa de Freud com vários pacientes em tratamento para histeria ou neurose obsessiva;
✓ Fantasia frequente: "Uma criança é espancada";
✓ Fantasia + sentimentos com alto grau de prazer associados e, por isso, era
reproduzida com frequência;
✓ Clímax da fantasia: satisfação masturbatória (genitais), inicialmente voluntária e,
depois, involuntária com características de obsessão;
✓ Tratamento analítico ➙ resistência ➙ essa fantasia ➙ culpa e vergonha;
✓ Freud estabelece que fantasias dessa natureza foram nutridas muito cedo, antes da
idade escolar;
✓ Tais fantasias despertavam ou se reforçavam, quando, na escola, o paciente via
outras crianças sendo espancadas pelo professor;
✓ A influência da escola era tão clara que os pacientes tendiam a relacionar,
exclusivamente, tais fantasias de espancamento à vida escolar;
✓ MAS não conseguiam manter essa posição ➙ as fantasias já existiam antes disso;
✓ Quando jovens mais crescidos, os livros construiriam, neles, fantasias e
sentimentos semelhantes de punição e disciplina contra as traquinagens e mau
comportamento da idade;
“As pulsões sexuais são
capazes de ludibriar a
intenção do recalque,
forçando sua
representação por
formações substitutivas
perturbadoras.”

- Freud 1919

Female phallus statuette



Arte Marajoara
Amazônia
✓ Freud observou nos pacientes que: a fantasia de uma criança espancada ➙ era catexizada
com alto grau de prazer ➙ descarregada em um ato de agradável satisfação erótica;
✓ Então, na escola: a criança espancada na escola ➙ fonte de prazer?
✓ A criança espancada na escola ➙ sentimento peculiar de excitação mista ➙
repugnante e intolerável;
✓ Nas fantasias dos anos posteriores o castigo à criança não causaria dano mais sério;
✓ Perguntas sem respostas relevantes - quem espanca, apanha, adulto ou criança?
Qual o sexo da criança que cria a fantasia e da criança que é espancada?
✓ Nessas circunstâncias, ainda não era possível determinar se o prazer relacionado
à fantasia de espancamento seria descrito como sádico ou como masoquista;
II
✓ À luz do seu conhecimento da época, Freud elabora que: 

➙ a fantasia de causas acidentais, na primitiva infância ➙ propósito de satisfação
auto-erótica = traço primário de perversão;

✓ Os caminhos da perversão infantil na vida adulta:



➙ frequentemente recalcada, substituída por uma formação reativa ou transformada pela
sublimação; - - - se os processos acima não ocorrem ➙ perversão, fetichismo ou inversão;
✓ Se o componente sexual que se soltou prematuramente é o sádico, podemos
esperar, com base no conhecimento derivado de outras fontes, que a sua
subseqüente repressão resultará numa inclinação para a neurose obsessiva;
III


“É na infância, entre os dois e os
quatro ou cinco anos de idade, que
os fatores libidinais congênitos
são despertados pela primeira vez
pelas experiências reais e se ligam
a determinados complexos. As
fantasias de espancamentos que
agora estamos considerando, só se
mostram mais para o final desse
período, ou após o seu término.
Assim, pode muito bem ser que
tenham um histórico anterior, que
atravessem um processo de
desenvolvimento, que
representam um resíduo e não A Família

uma manifestação inicial;” - Egon Schiele, 1918, pintor
Freud, 1919. expressionista austríaco
VI
✓ 2 teorias opostas que tratam da relação entre o recalcamento e o caráter sexual

✓ 1ª Teoria - Anônima: constituição bissexual dos indivíduos e a luta entre os


caracteres sexuais é o motivo do recalcamento;
✓ - o sexo mais fortemente formado e dominante recalca para o inconsciente a
representação mental do outro sexo subordinado;
✓ - o núcleo do inconsciente - material recalcado - seria aquilo que nela existe do sexo
oposto;

✓ 2ª Teoria - de Alfred Adler - bases sociológicas - “protesto masculino”;


✓ - todo indivíduo resiste a se manter na linha feminina, inferior, aspirando à linha
masculina, a única satisfatória;
✓ - o agente do recalcamento seria sempre uma pulsão masculina e o material
recalcado um pulsão feminina;
✓ - o sintoma seria resultado de uma pulsão feminina - já que a natureza do sintoma é
ser um substituto do material recalcado que se impôs apesar do recalque;
"O núcleo do
inconsciente
psíquico é formado
pela herança
arcaica do ser
humano, e tudo que
é deixado para trás,
por se tornar inútil,
incompatível com o
novo ou prejudicial
a ele, à medida que
se avança para
novas fases do
desenvolvimento, é
Operários
 submetido ao
Tarsila do Amaral, 1933 recalque.”

Freud 1919
Casos da pesquisa de Freud sobre a fantasia de espancamento - Fantasia, Sadismo e Masoquismo
1ª Fase 2ª Fase 3ª Fase
Inconsciente, masoquista, a própria
Fantasia consciente, sádica, meninas
Consciente, sádica, crianças criança (meninas) espancada pelo
transformam-se em meninos
espancadas, pai substituído pai + carga libidinal + culpa
espancados por homem, pai
Meninas
 por figura de categoria (transforma sadismo em
substituído por figura de categoria
(+) paterna, rancor ciumento, masoquismo) + significado genital
paterna - mesmo sexo - menina
desejo incestuoso objetal que evoluiu p desejo incestuoso de
transforma-se em homem sem se
com o pai ser amada pelo pai + atitude
tornar ativa
edipiana “normal”
Modifica a figura e o sexo da pessoa
Sou amado pelo meu pai + sou que bate, colocando a mãe no lugar
Masoquista + masturbação + espancado pelo meu pai + fantasia do pai - sexos opostos - atitude
Meninos
 atividades genitais + fantasias passiva + Complexo de Édipo feminina sem escolha

(-) masoquistas + desejo invertido (pai tomado como objeto homossexual de objeto - o
incestuoso com a mãe de amor), substituição da atividade menino burla o seu homossexualismo
pela passividade ao reprimir e remodelar a fantasia
inconsciente

Dessubjetivação

Sujeito reduzido ao extremo

Redução a 2 personagens

Lacan
 A relação amorosa da menina Fantasia perversa (Aniquilar o desejo
- fantasia incestuosa que a criança
As com o pai está em jogo e ela do outro) Sadismo

apanha do pai e se precipita
fantasias fantasia ser a eleita (Aniquilar o desejo do sujeito)
rapidamente para a 3a fase
Masoquismo

Dissolução do sujeito

Lacan: Reorientação de Freud sobre a perversão - "O problema da constituição de toda perversão deve ser
abordado a partir do Édipo, seus avatares, da aventura, da revolução do Édipo.”
"A sexualidade
infantil sujeita ao
recalcamento é a
principal força
motriz da formação
de sintomas, sendo
a parte essencial do
seu conteúdo - o
complexo de Édipo
- o complexo
nuclear da neurose.”
- Freud 1919

Meshach

Genesis Tramaine, 2019
Fantasias de surras e devaneios - Anna Freud, 1922
Artigo escrito após várias discussões com Lou Andreas-Salomé - sobre os casos de fantasia de
surra pesquisados por Freud - apresentado à Sociedade Psicanalítica de Viena em maio de 1922.
✓ Fantasia de surra investida com alto grau de prazer e descarregada num ato de gratificação
autoerótica prazerosa;
✓ Em dois casos femininos de Freud tinha-se desenvolvido, sobre a fantasia masoquista de surra,
uma complexa superestrutura de devaneios de grande significação para a vida da paciente;
✓ Devaneio de uma jovem de 15 anos - construiu aos 5 ou 6 anos, uma fantasia de surra do tipo descrito
por Freud ➙ cada cena fantasiada era acompanhada por uma forte excitação sexual e terminava num ato
masturbatório. O sentimento de culpa que se ligou à fantasia é explicado por Freud ➙
✓ Freud afirma que a versão de fantasia de surra não é original ➙ é versão substituta, na
consciência, de uma fase inconsciente anterior;
✓ Porém não é essa a fase primária ➙ há uma fase mais precoce que pertence ao período de
maior atividade do complexo de Édipo, que ➙ por meio da regressão e do recalcamento foi
transformada na versão que aparece na segunda fase;
✓ Com o recalcamento dos anseios edipianos e a aurora do sentimento de culpa ➙ a punição é
voltada para a própria criança. Por outro lado, em consequência da regressão da organização
genital para a organização pré-genital sádico-anal, a situação de surra ainda poderia ser usada
como expressão de situação amorosa;
✓ A menina, então, se deparou com um livro de contos de um menino ➙ expandiu a história
como produto de sua fantasia espontânea e atribuiu a esse devaneio um lugar significativo nas
suas “histórias agradáveis” e suas cenas aprazíveis;
✓ A fantasia de surra representa o retorno do recalcado e as histórias agradáveis
representam a sublimação;
Lacan:

- É preciso não esquecer que a
paternidade para a psicanálise é
uma função simbólica e não
real;


- Duas categorias de sujeito:
sujeito do gozo (psicose), não
barrado pelo significante Nome-
do-Pai e sujeito do significante,
oriundo da limitação instaurada
por este (neurótica ou perversa);

Questão: Podemos associar a


fantasia de espancamento a um
processo subsequente, mas não
onipresente, pelo qual passa o
sujeito significante? A Reprodução Interdita - 1937

René François G. Magritte
(1898-1969)
Referências Bibliográficas

- FREUD, Sigmund. "História de uma neurose infantil e outros trabalhos - Uma


criança é espancada - uma contribuição ao estudo da origem das perversões
sexuais" (1917-1919). Rio de Janeiro: Imago, 1996

- _______ "Apresentação: Dois ensaios sobre fantasias de surra”. por Marco


Antônio Coutinho Jorge. 1856-1939. ”Bate-se numa criança”: contribuição ao
conhecimento da origem das perversões sexuais.

- Freud, Anna. "Fantasias de surras e devaneios". Tradução Kristina Michahelles,


Vera Ribeiro.


- Jorge, Marco Antonio Coutinho, 1952. "Lacan, o grande freudiano”. / Marco
Antonio Coutinho Jorge, Nadiá Paulo Ferreira. — Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
Ed., 2005

- Nasio, Juan-David. "O prazer de ler Freud”. Revisão técnica, Marco Antonio
Coutinho Jorge]. — Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1999

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