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ORFANDADE MENTAL
Mamãe neném
- Já sei namorar.
pra amar
Mamãe eu te quero pra amar
da vida. Esta vulnerabilidade não é genética nem evolutiva, é estrutural. Há uma ruptura
traumática e precoce.
subjugado.
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suas marcas no registro Icc. Há um vazio na mediação afetiva do processo histórico e nos
imagem dos pais, mas, de fato, à imagem do Supereu deles; ele torna-se o representante da
tradição, de todos os juízos de valor, que subsistem assim através das gerações.
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o horror terrorífico. Freud, em 1937, sustenta que não significa qualquer supervalorização
mística da hereditariedade, crê que mesmo antes do Ego existir, já estão traçadas as suas
linhas de desenvolvimento, suas tendências e as reações que o Ego exibirá mais tarde.
O abandono não é o dado anacrônico de uma história passada, ele se perpetua nas
O bebê intruso, não legitimado pelo desejo, não sonhado, nem nomeado, está
uterinas (Wilheim, 1989; 1996; 1997). Os estudos de Bion sobre o psiquismo fetal
primitivos da mente.
apud Abram, 2000), seja como força emocional da pré-concepção edípica, ou como espaço,
(Rousillon, 1995) sobre a origem da vida. Nela, a criança assiste à sua própria concepção,
não como criação sublime reflexo de EROS, mas como obra de THANATOS: vida que não
era para ser. Na OM, ao invés da criança perceber que é sujeitada pela história sinistra (ela
não escolheu a esses pais), numa inversão ativa, ela pode se erguer como agente da
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desgraça. A crença em uma origem do sinistro “lugar nenhum” permeia com culpa os
remetem a esse “não lugar” explorado por Freud na novela familiar (1909). O “não lugar”
habita o mundo alucinatório na tentativa de driblar a dor. Este “não lugar” “traduzido em
ato” é repetido.
irreconhecível atrai como ímã mentiras e segredos. O futuro é asfixiado sem projetos
1962; 1963).
parentalidade e da filiação, num espaço inóspito. OM jaz na origem da vida psíquica intra-
psíquicos são os elos compartilhados. Sugiro que este modelo parasitário de relação
primária intra-uterina, entre a mãe biológica e o infans, (♀.♂), imprime efeitos nas
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atrofiada. Ainda afirmo que na OM o tropismo de criação - objeto a criar e ser criado - na
substituto”. Os tropismos sãoa matriz da vida mental e precisam ser resgatados do vazio
afirmar que para ser criado o objeto, ele precisa antes ser encontrado.
real, destaco as funções desse vínculo primordial que transcende o biológico na catástrofe
nos vínculos, desde a origem da vida. Ao invés de uma aproximação estética ante a beleza
indiferenciação entre o Sujeito e o Objeto. O Édipo é uma pré-concepção que busca uma
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(Bion, 1961).
Ante o vazio vivido como absoluto, surge o apelo defensivo para preencher
fanaticamente esse vazio com coisas em si mesmas ao invés das experiências emocionais
que nutrem a mente e abrem o portal do conhecimento. Amar e odiar alguém antecedem o
origem e o molde primário do espaço que caracteriza o psíquico (Delouya, 2001). Nas
dependência do outro, enaltecido como líder, idolatrado como Deus, é a conseqüência para
morais.” (Freud, 1895). O trauma do nascimento é uma vivência arquetípica, que gera
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O terror é vivido, mas como não tem registro, não pode ser recordado. Com
dimensões teóricas diferentes, Freud, Bion, Winnicott e Meltzer postulam que quem
Bion (1976, 1977, 1978), por sua vez, enfatiza não só a onipotência para a suposta
externo, sujeito da cultura e da história com papel decisivo nos destinos do infans. O outro
funções que se supõe que o infans possua no inconsciente, como potencialidades a serem
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C.f. REZENDE, A. M. (2006) – “Novas perspectivas para a psicanálise atual a expansão do universo mental
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amado murcha, assim como a incipiente experiência emocional. Ante o terror surgem as
manobras defensivas.
A CLÍNICA:
T. chegou ao abrigo com um ano de idade. Foi enviado por ordem judicial após um
contaminou T. As informações sobre os cuidados com ele, durante o primeiro ano de vida
mãe com um companheiro com o qual viveu durante cinco anos. Esse relacionamento foi
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rompido após o pai de T. ter descoberto, a partir de inúmeras internações deste filho, que a
mulher era portadora de HIV. Sua mãe teve um casamento anterior do qual nasceram cinco
filhos, sendo que três deles, de 16, 13 e 11 anos moravam com esta segunda família
nove meses. Até hoje é muito raro T. mencionar as palavras pai e mãe e poucas vezes ele o
fez. Aos dois anos de T., os pais foram presos por uso e tráfico de entorpecentes e no ano
restritas. Com quatro anos e meio estabeleceu-se o controle esfincteriano noturno, mas, até
hoje, ele é acordado de duas a três vezes por noite para ir ao banheiro. O controle diurno
deu-se em torno dos quatro anos. A chupeta e mamadeira noturnas foram tiradas aos três
anos. Aos quatro anos teve catapora que motivou uma internação de 10 dias. Tem os
tímpanos perfurados por reincidências de otite, cerca de uma vez por mês, com indicação
Gosta muito de tomar banho, passar perfume e creme e de estar arrumado. Procura a
gerente do orfanato perguntando se está bonito. As cuidadoras acham que T. não se liga a
ninguém e não quer ser amado, nunca se referindo à sua família de origem. Durante uma
das situações de adoção de outra criança, T. perguntou quando chegaria uma família para
ele.
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T. – 8 anos
1ª Hora de Observação
cuidadora.
Apresento-me a ele e à cuidadora na sala de espera. Ela diz que está à disposição, se
eu precisar de alguma coisa, ou quiser falar com ela. Eu lhe agradeço e peço-lhe que
assustado.
- T., eu marquei esse encontro com você aqui para te conhecer. Você pode usar
T. vai até a pia, olha cada um dos brinquedos; pega em cada um, deixando-os em
seguida. Retorna à mesa onde estava disposto o material gráfico. Estou sentada numa
T. examina a caixa de lápis, olha para mim, examina os pincéis, a cola, olha para
- É, é cola colorida?
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Pega uma folha de sulfite e arruma sobre a mesa. Traz um banco bem próximo de
Aponta o lápis grafite sem tirar os olhos de mim. Depois de um tempo dá um grande
sorriso aberto.
- Eu tô pensando...
Continua a sorrir.
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Ele ri.
Vai olhando o giz de cera e desenhando, faz lentamente a cabeça de um urso e deixa
Ele vai em direção à pia e enche a bacia com água, joga o jacaré e a vaca. Fica
da pia e fica fascinado com isso. Enche a pia e faz um cumprimento para ele mesmo no
espelho. Coloca todos os bichos dentro da água e diz que é uma cachoeira e todos vão
nadar. Comenta que seria bom se tivesse um buraco na parte superior da pia, para a água
escoar.
Vai até a mesa pega o bebê e chega bem perto de mim. Põe o bebê no rosto e diz: -
Bonitinho, não?.
Põe o bebê na mesa novamente volta para a pia e diz: - Tá faltando um leão aqui.
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- É assim: você joga essa bolinha na bacia, se fizer cesta você tem que vir e fechar
o olho para escolher uma cor. Se pegar um desse grupo ganha um ponto e se pegar do
outro grupo perde pontos. Ele separou alguns dos gizes de cera em dois grupos,
primordialmente pelas cores primárias, enquanto o que perde pontos é constituído por cores
escuras secundárias. Algumas cores foram excluídas, entre elas o azul e o rosa.
Eu jogo, depois ele joga e vibra muito, quando fecha o olho para pegar a cor.
- Sou só eu.
T. cativa a analista.
Discussão:
apresentado, pela cuidadora, pelo negativo. A suposta timidez seria a justificativa para que
ela se autorize a entrar também na sessão. Sua intervenção é reveladora das manobras para
Super proteger T. Ele entra ora assustado, ora ressabiado, e muito curioso. T. é
quando ele pode então se permitir ser diante da resposta sorridente da analista, que o
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pensar. Ele, então, revela a capacidade de contato psíquico consigo próprio e sua vitalidade
conversa, indaga, sorri, se aproxima para desenhar, pede hominhos, brinca, não quer a
apresentando aí? É a cola colorida disponível? É possível selar contatos com a cor da
emoção? Em nível transferencial podemos expressar sua fantasia de cura desta forma:
“Colado a você posso vivenciar aqui a simbiose amputada; ter a oportunidade de vivenciar
a continuidade na existência, ser olhado e me encontrar nos teus olhos refletido, sorrir e
provocar teu sorriso, te conquistar, sonhar, pensar quando te encontro de várias formas”.
Experiências dialógicas abortadas na sua vida. A analista edita, faz a inscrição primeira,
além de reedição, para dar figurabilidade e inscrever aquilo que no Inconsciente não tem
registro.
desejado. A tinta não é a cola. A discriminação, cara função mental é encorajada. Também
o interpreta como sendo capaz de suportar a não existência da cola colorida desejada. Então
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Quando a analista revela o seu legítimo interesse pelos pensamentos do paciente, ele
sujeira ancestral. Na realidade, ele transforma em poeira o nome da marca do giz. Que
sujeira ancestral marca o nome paterno que herda na história da história? Que sujeira
está inscrita nestes bastões? São formas proto-nuticias (o seio), proto-masculinas (o giz)? A
poeira pode estar sob seu controle, pode ser limpa. Talvez assim ele se defenda da
procura, sua curiosidade, a ousadia de querer ser reconhecido com direito a ser Homem
modelo oferecido pela analista de identidade masculina. Teme não poder realizar seu
projeto, seu sonho; alguns cisquinhos do lápis apontado aparecem, assim como as sujeiras
no chão. Ele precisa cuidar do objeto, na reversão da dependência. T., ao nascer, foi
abandonado e rejeitado. Como foram registradas estas vivências? Parece que como a
“sujeira” presente no chão de sua existência. Que fazer com estas vivências? Ao responder
cantando, no ritmo da melodia, a analista o autoriza SER e FAZER. Ela legitima seu direito
sinistro de coitado, doente, incapacitado, marginalizado órfão, aborto vivo. É preciso não
fazer sujeira para garantir a existência. Desenha para ser visto pela analista, no exercício
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da função especular. Na folha ambos se encontram refletidos. Ele copia o desenho do urso
que está no giz, fazendo uma apresentação da desqualificação existencial de si mesmo: feio,
urso inacabado, só cabeça. Ante a falta da relação primordial entre a mãe e o bebê, nos
prelúdios da vida simbólica, ele é o resto sem valor, despojo humano: “Me diz o que é que
eu faço!”, “Eu não sei desenhar”,”Nem sei em que estou pensando” Este menino, vítima
do destino, traz no urso as vivências do contato sinistro primitivo. Mesmo quando ele é
capaz de fazer, desenhar, pensar - só que ele não conhece suas potencialidades porque se
analítico. Continua com a fantasia originária do coito parental no encontro do jacaré com a
água, que gira e gira. É o movimento da vida? É na repetição do mesmo que busca a
da pia para a água poder escoar e evitar transbordamentos. Parece que ele assinala um
caminho terapêutico: como dosar as aproximações à verdade possível para modular suas
feminino. A percepção inconsciente que T. tem de seus pais biológicos caracteriza-se por
uma marcante disparidade, como a revelada entre duas espécies tão diferentes, que impede
na pia, acabando com a presença do casal. Na confusão não há ordem simbólica. Ele junta
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da selva de emoções. Ele reencontra o self infantil no bebê T., que quer ter um espaço
A água da cachoeira é a força das pulsões que precisa ter por onde escoar, pois ele
teme o descontrole. O bebê dentro dele pode vir a ser bonito se encontrar o outro, o objeto
No último movimento da sessão, através do jogo que propõe, T. traz uma reflexão
muito profunda: você pode acertar pela sua competência, mas de nada adianta, porque há
forças superiores arbitrárias que decidem o jogo. Observamos que o grupo de cores
primárias e mais vivas determina o veredicto positivo, enquanto que o grupo de cores
perda. Ele não tem o controle sobre o destino. Não basta limpar, reparar, atender os ideais.
No jogo da vida está presente o arbitrário e o azar, que o levam ao reconhecimento de sua
que ele se sente capaz de pensar, há espaço mental tridimensional. T. está numa profunda
relação emocional. Tem mente e vitalidade, que o fazem ir à procura do objeto. Nele há
predomínio de Eros.
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Observamos que T., marcado pela OM, não pôde realizar a experiência emocional
REFERÊNCIAS:
FREUD, S. (1895). Proyecto de una psicología. In: Obras Completas vol. I Buenos
Aires : Amorrortu Editores, 1976.
________. (1909) – Apéndice al análisis del pequeño Hans. , vol X. Buenos Aires:
Amorrortu, 1922.
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________. (1920) Mas allá del principio del placer. Obras Completas. vol. XVIII.
Buenos Aires: Amorrortu Editores, 1976.
KAËS, R. (1979) - Crisis, Ruptura y Superación. Ed. Cinco, Buenos Aires, 1979.
WINNICOTT, D.W. (1949). Mind and Its Relation to the Psyche-soma. Brit. J. Med.
Psicol.,1954.
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