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Doi: 10.11606/issn.2317-0190.

v3i1a101986

ARTIGO
ORIGINAL
Falsos Negativos, Falsos Positivos
e Controvérsias no Diagnóstico
Neurofisiológico das
Radiculopatias

Anthero Sarmento Ferreira*

RESUMO
Embora as radiculopatias sejam uma das patologias mais freqüentemente
encaminhadas para a realização de Eletroneuromiografia (ENMG), seu diagnóstico
nem sempre é confirmado neurofisiologicamente, e muitos pacientes com dor irradiada
tipo lombociatalgia e cervicobraquialgia apresentam exames normais. Existem também
controvérsias entre os próprios neurofisiologistas quanto à validade de utilização
das várias técnicas disponíveis para seu diagnóstico. O objetivo deste artigo é discorrer
sobre os mecanismos envolvidos na avaliação neurofisiológica das radiculopatias e
sua relação com as patologias existentes na coluna vertebral e músculos que a
circundam e delimitar as limitações e vantagens de sua utilização.

UNITERMOS
Radiculopatias, Eletroneuromiografia, Potencial evocado somatossensitivo,
Neurofisiologia

ABSTRACT
Although the radiculopathies are one of the most frequently conducted pathologies
to the Eletroneuromyography (ENMG) realization, its diagnosis is not always
neurophysiologically confirmed and many patients that have got irradiated pain show
normal survey results. There are also controversies among the neurophysiologists
themselves as to the several techniques available for diagnosis, concerning its
utilization validity. This article aims to discuss the mechanisms involved in the
radiculopathies neurophysiologic evaluation and its relationship to the existing
patologies at the vertebral column and at the surrounding muscles and to delimitate
its utilization advantages and limits.

KEY WORDS
Radiculopathies, Electroneuromyography, Somatosensory evoked potentials,
Neurophysiology

Introdução
As radiculopatias são a maior causa de encaminhamento para
exames eletroneuromiográficos nos EUA4. Apesar desta grande
utilização da ENMG no diagnóstico destas patologias, observa-se,
na prática, que o diagnóstico neurofisiológico na investigação das
radiculopatias não é tão sensível como no de outras doenças como
a Síndrome do Túnel do Carpo, por exemplo.
Vários fatores estão envolvidos nesta particularidade, desde a
existência de outras doenças que também causam dor irradiada para
um membro até aspectos técnicos do exame, que são controversos

* Especialista em Fisiatria e Neurofisiologia Clínica pela A.M.B. Mestrando do curso


de Pós Graduação em Clínica Médica da UFRGS

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entre os próprios profissionais da área, e que finas ao nível da raiz nervosa, gerando dor e sem
podem gerar um diagnóstico equivocado. envolvimento de fibras nervosas de grosso calibre,
Passaremos a seguir a discorrer sobre as uma vez que sabe-se que nas radiculopatias
diversas causas da existência de falsos positivos e compressivas apenas uma minoria de axônios da
falsos negativos no diagnóstico neurofisiológico raiz é comprometida11, e portanto, com avaliação
das patologias radiculares. neurofisiológica normal.
As lesões nervosas dividem-se naquelas que
afetam a bainha da mielina ou o axônio, havendo,
Falsos Positivos e Falsos Negativos muitas vezes, acometimento de ambos.
Nas lesões mielínicas ocorre uma desmielini-
Um teste diagnóstico está correto quando é zação focal que causa uma diminuição da
positivo na presença da doença e negativo em sua velocidade de condução nervosa ou um bloqueio
ausência. Está incorreto quando é positivo na de condução no local da lesão. Não existe, neste
ausência de doença (falso positivo) ou negativo caso, alteração na eletromiografia, mas apenas nas
quando a doença está presente (falso negativo). neuroconduções. Ao contrário dos nervos
No caso do diagnóstico das radiculopatias não periféricos, onde podemos estudar sua neurocon-
existe um “padrão ouro” que tenha condições de dução segmentarmente, como na Síndrome do
realmente afirmar se a doença existe ou não, uma Túnel do Carpo, onde dada a grande sensibilidade
vez que provavelmente seria necessário realizar da velocidade de condução nervosa sensitiva
uma biópsia e análise histológica da raiz nervosa realiza-se o diagnóstico precoce desta patologia
para confirmação de sua lesão. quando a lesão é apenas mielínica, a localização
Os métodos neurofisiológicos que estudam a muito proximal da raiz nervosa impede a
função da raiz nervosa apresentam algumas
utilização do estudo de neurocondução através
limitações em sua investigação que veremos a desta na detectação de lesão mielínica.
seguir, e os testes radiológicos (RX, Mielografia,
É importante salientar que a Eletromiografia
Tomografia Computadorizada e Ressonância
de agulha, quando detecta alterações no repouso
Nuclear Magnética) estudam apenas a parte
muscular, é o método mais sensível e específico
anatômica da coluna lombossacra e não avaliam
função. no diagnóstico neurofisiológico das radiculo-
patias1. Alterações caracterizadas pela presença de
Desta forma, os dados obtidos dos testes
citados acima devem ser julgados à luz da clínica potenciais de fibrilação e ondas positivas
e exame físico do paciente, para que apresentem observados em um determinado miótomo
uma maior sensibilidade (proporção dos indicam tratar-se de uma lesão axonal motora.
indivíduos com doença que têm um teste positivo) Ainda em relação à utilidade da Eletromio-
e especificidade (proporção de indivíduos sem a grafia, ocorre que os potenciais de fibrilação e
doença que têm um teste negativo). ondas positivas apresentam uma cronologia de
aparecimento, levando em torno de 3 a 4 semanas
para serem observados na musculatura dos
Falsos Negativos no Diagnóstico membros, surgindo inicialmente na musculatura
proximal e em seguida na distal, em função de
Neurofisiológico das Radiculopatias decorrer um tempo mínimo para que a
Geralmente resultam das limitações naturais degeneração axonal (Walleriana) se processe e
dos vários procedimentos neurofisiológicos em apresente repercussão nos músculos estudados.
relação à resposta fisiológica do sistema neuro- Desta forma, exames realizados muito
muscular à lesão. precocemente podem apresentar falsos negativos.
Os testes neurofisiológicos avaliam apenas as Sabe-se que a musculatura paravertebral,
fibras grossas mielinizadas que, quando lesadas, dada a sua maior proximidade com o local da
apresentam sintomas e sinais sensitivos tipo lesão, apresenta alterações mais precoces, em
parestesias e alteração de sensibilidade vibratória torno de 7-10 dias. Porém, como não apresenta
e posição articular e motores como paresia e especificidade segmentar como a musculatura dos
alteração de reflexos tendinosos. Não avaliam as membros, pela sobreposição de inervação desta
fibras finas mielinizadas e não mielinizadas que musculatura e por poder apresentar alterações
mediam a sensação de dor e que muitas vezes é o eletromiográficas em uma ampla gama de outras
único sintoma em um paciente com dor tipo patologias que serão discutidas a seguir, também
radicular10. pode apresentar erros diagnósticos.
Eventualmente pode haver comprometi- Convém lembrar que muitos autores obser-
mento de determinados fascículos contendo fibras vam alteração apenas na musculatura paraverte-

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bral em aproximadamente 30% dos pacientes com se na distribuição de um dermátomo, uma vez que
diagnóstico neurofisiológico de radiculopatia5. estas estruturas recebem sua inervação do mesmo
É possível haver comprometimento exclusivo segmento espinhal que a própria raiz9:
da raiz sensitiva3 e a Eletroneuromiografia não a 1) Articulação Facetária;
avalia adequadamente. 2) Ligamentos Posteriores (supra e interespi-
Os testes neurofisiológicos que poderiam nhoso);
avaliar a condução através da raiz sensitiva 3) Ligamentos Longitudinais (anterior e pos-
(Reflexo H e Potencial Evocado Somatossensitivo) terior);
avaliam uma via muito grande e não exclusiva- 4) Musculatura paravertebral;
mente a raiz nervosa e podem apresentar falsos 5) Dura-Máter;
negativos e positivos. 6) Porção externa do ânulo fibroso.
Assim, é comum encontrarmos pacientes com
suspeita de radiculopatia com sintomas exclusi-
vamente sensitivos e de longa duração com Dor Pseudo-Radicular
ENMG normal, tanto pela possibilidade de
comprometimento exclusivo da raiz sensitiva Origina-se na divisão primária posterior do
como pela possibilidade de as fibras musculares nervo espinhal ou no nervo recorrente sinuverte-
terem sido reinervadas, desaparecendo os bral, distal ao forame intervertebral, podendo cau-
potenciais de fibrilação e ondas positivas, persis- sar dor irradiada, simulando uma radiculopatia8.
tindo alterações sensitivas e dor.
Dentre os falsos negativos evitáveis
citaríamos o exame de poucos músculos, podendo Nervo Sinuvertebral
deixar de detectar potenciais de desnervação em
Nasce do nervo espinhal após o gânglio
musculatura proximal em uma lesão mais aguda sensitivo. Penetra no canal raquidiano e inerva o
ou em músculos mais distais em uma lesão com
ligamento posterior, dura-máter e ânulo fibroso.
um tempo de evolução maior.
Também a baixa temperatura cutânea pode
inibir o aparecimento dos potenciais de fibrilação
e ondas positivas e deve ser controlada e mantida
Ramo Primário Posterior
entre 32-34oC. É a divisão posterior do nervo espinhal. Seu
Eventualmente pode haver comprometi- ramo medial inerva a articulação facetária e a
mento do gânglio da raiz dorsal no forame musculatura paravertebral.
intervertebral, especialmente na coluna cervical,
havendo alteração na velocidade de condução
nervosa sensitiva, que normalmente não ocorre Dor Miofascial
nas radiculopatias, uma vez que a raiz nervosa
situa-se proximalmente ao gânglio da raiz Descrita por Travell em 1952, consiste em
sensitiva, sugerindo erroneamente tratar-se de pontos gatilhos localizados em uma banda espessa
uma plexopatia ou neuropatia periférica12. de fibras musculares responsáveis pela sensação
de dor e parestesias à distância.
Os sintomas são reproduzidos por pressão
digital ou pela penetração do ponto gatilho com
Falsos Positivos no Diagnóstico uma agulha. O território de distribuição da dor
Neurofisiológico das Radiculopatias não é dermatomérico, embora possa simulá-lo,
estando o exame neurológico também normal.
Existe uma série de patologias que causam
dor irradiada nos membros e não se originam de
disfunção na raiz nervosa e que podem, Síndrome do Piriforme
dependendo de sua apresentação clínica, levar à
supervalorização de achados neurofisiológicos. A compressão do nervo Ciático pelo músculo
Também existem, entre os próprios neurofisio- Piriforme poderá causar dor irradiada pelo
logistas, maneiras diferentes de interpretar e membro inferior, sugerindo uma dor radicular.
valorizar achados neurofisiológicos que podem Normalmente a compressão do nervo é
resultar em falsos positivos. dinâmica e não apresenta repercussões neurofi-
Citaremos outras estruturas inervadas da siológicas.
coluna vertebral, além da raiz nervosa, e Quando ocorre lesão do nervo haverá
potencialmente fontes de dor, que poderá irradiar- alterações nas neuroconduções dos nervos

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Peroneal, Tibial e Sural, além de alterações verdade são potenciais de lesão ou reflexo
eletromiográficas restritas aos músculos inervados de uma excitabilidade membranosa normal.
pelo Ciático. Não ocorrem alterações nos Em outra situação existe de fato uma
músculos Glúteo Maior e Menor e Tensor da atividade de inserção aumentada, em que mesmo
Fáscia Lata. após a cessação da atividade do eletrodo de
agulha, persistem alguns potenciais de ondas
positivas. Este aumento de atividade de inserção
Plexopatias é sugestivo de uma patologia incipiente, porém é
prudente correlacioná-lo com a cronologia da
Podem causar dor irradiada simulando uma lesão e eventualmente repetir o exame em tempo
radiculopatia. adequado, para de fato confirmar a presença de
Neurofisiologicamente observa-se alteração desnervação.
nas neuroconduções sensitiva e motora, e a O correto ao considerar um potencial como
distribuição das anormalidades eletromiográficas sendo de fibrilação ou onda positiva é que ele se
não segue um padrão miotomérico. mantenha disparando por no mínimo 50 ms3 ,
logicamente apresentando as características
morfológicas e freqüência de disparo destes
Neuropatias Periféricas potenciais, e que aparecem em mais de uma região
Não é incomum observarem-se pacientes com do músculo.
mononeuropatias periféricas, especialmente na S.
do Túnel do Carpo, com queixas de dor proximal.
Convém lembrar que uma lesão radicular Potenciais Polifásicos
pode predispor ao aparecimento de neuropatias
periféricas (Double Crush). Ex: radiculopatia Outro aspecto polêmico na avaliação
cervical associada com S. Túnel do Carpo e neuro- neurofisiológica das radiculopatias é a avaliação
patia ulnar no cotovelo7. dos potenciais de ação da unidade motora.
Sabe-se que em uma neuropatia ocorre um
remodelamento das unidades motoras em função
Aspectos Técnicos da reinervação. Os potenciais tornam-se polifá-
sicos devido ao chamado ”Brotamento Colateral”
Quanto aos aspectos técnicos que podem de axônios sadios para as fibras musculares de
levar a falsos positivos na avaliação das axônios lesados. Estes potenciais aparecem após
disfunções radiculares, cabe salientar alguns: algumas semanas da lesão, mas é discutível firmar
• O exame de poucos músculos pode levar a o diagnóstico de uma radiculopatia exclusiva-
erro diagnóstico ao observarem-se poten- mente baseado na presença destes potenciais.
ciais fisiológicos de placa mioneural Como existe uma variação no percentual
registrados como ondas positivas. normal destes potenciais de músculo para
• A presença de uma Síndrome de atividade músculo, haveria a necessidade de uma
de inserção anormal, caracterizada pela Eletromiografia quantitativa para realmente
presença de trens de ondas positivas em afirmar que existe um número patológico de
todos os músculos examinados, de todos os potenciais polifásicos, restritos a um miótomo.
membros, sem repercussão clínica, pode ser
Por outro lado, é comum a sobreposição de
confundida com desnervação se forem
dois ou mais potenciais de ação de unidade
examinados poucos músculos.
• Presença de potenciais voluntários com a motora normais (bi ou trifásicos), simulando um
forma de ondas positivas simulando potencial polifásico.
desnervação. Uma alternativa é a utilização de uma linha
• Hipervalorização da atividade de inserção: de atraso e um “trigger”, quando podemos
reside aqui um dos pontos mais polêmicos individualizar as unidades motoras e avaliar sua
na avaliação neurofisiológica das morfologia e mesmo sua instabilidade (variação
radiculopatias, dada a subjetividade que na morfológica da unidade motora a cada disparo
existe nos critérios de aceitação da existência indicando uma lesão aguda) ou estabilidade (na
ou não de potenciais de fibrilação ou ondas lesão crônica não existe esta variabilidade).
positivas. Muitas vezes a simples atividade Também cabe lembrar que foram descritos
de inserção fisiológica pode gerar a presença potenciais polifásicos precoces (1 semana de
de um ou mais potenciais que sugerem evolução), que se deveriam a transmissão efática
tratar-se de ondas positivas, e que na e que apresentam valor também discutível6.

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Falsos Positivos na Eletromiografia da voluntários e involuntários, devido a uma


Musculatura Paravertebral (patologias que modulação flutuante do sistema nervoso central.
Também cabe lembrar que o Reflexo H pode
também apresentam potenciais de fibrilação e ondas
encontrar-se ausente bilateralmente em idosos,
positivas nesta musculatura) após cirurgia discal, e inibido em indivíduos
normais devido à interação entre influências
1) Esclerose Lateral Amiotrófica segmentares e supra-segmentares do sistema
2) Polimiosite nervoso central, conforme comentado.
3) Carcinoma Metastático afetando o ramo Por outro lado, pode ocorrer um falso
primário posterior (RPP) negativo em que exista uma radiculopatia de S1,
4) Pós-punção lombar ou mielografia inclusive com alterações eletromiográficas, e um
5) Pós-operatório de Hérnia discal Reflexo H normal, uma vez que é necessário haver
6) Entrapment do ramo medial do RPP sob o um comprometimento mínimo de fibras nervosas
ligamento mamilo-acessório na raiz para que ocorra alteração em sua latência.
7) Proliferação óssea facetária lesando o RPP Uma vantagem do Reflexo H em relação à
Eletromiografia é que este pode apresentar
alteração tão logo ocorra o dano neural, não
Falsos Positivos na Eletromiografia da havendo necessidade de aguardar que o processo
Musculatura dos Membros (músculos que de degeneração axonal se processe.
podem apresentar alterações decorrentes do Assim, quando utilizado criteriosamente, é
um método válido no diagnóstico neurofisiológico
envelhecimento ou por características próprias)
das radiculopatias.
1) Extensor Curto dos Dedos - fibrilações
2) Abdutor do Hálux e Gêmeo Interno -
fasciculações Resposta F
3) Iliopsoas - Descargas Repetitivas Com-
plexas A exemplo do Reflexo H, também consiste em
4) Gastrocnêmio, Abdutor do Hálux e uma resposta tardia, mas, ao contrário do Reflexo
Abdutor do Quinto Dedo - padrão não H, não é um reflexo e sim uma descarga recorrente
interferencial dos motoneurônios do corno anterior da medula
5) Músculos intrínsecos dos pés - alterações a partir da estimulação supramáxima das fibras
neurogênicas crônicas em idosos. alfa.
Teoricamente a avaliação da resposta F tem
utilidade no diagnóstico das radiculopatias por
avaliar os segmentos mais proximais da unidade
Reflexo H (Hoffmann) motora mas, conforme veremos a seguir, na
É um reflexo monossináptico, equivalente ao prática, não é um método sensível e específico no
reflexo de estiramento dos músculos fásicos, em diagnóstico desta patologia.
que o arco aferente consiste nas fibras sensitivas Na disfunção radicular pode haver aumento
Ia do fuso muscular e no arco eferente das fibras na latência da resposta F, especialmente quando
motoras alfa. comparada com o membro contralateral ou com
outro nervo do mesmo membro, ou um reduzido
Dentro da via avaliada estão as raízes
número de respostas evocadas em relação ao
sensitivas e motoras, não as avaliando especi- número de estímulos utilizados.
ficamente, e podendo estar alterado em outras Dado o curto segmento lesado (no caso a raiz
patologias, no caso de estimulação do n. Tibial, nervosa) em relação à longa via percorrida pelo
como nas neuropatias periféricas, plexopatias estímulo elétrico, a resposta poderá ser normal na
sacrais e lesão dos n. Ciático e Tibial. vigência de uma radiculopatia, pois ocorre uma
Na prática, é útil para avaliar as raízes C6/ diluição do atraso ao longo do resto da via
C7 e S1 através da estimulação elétrica dos nervos examinada.
Mediano e Tibial, respectivamente. Também pelo fato de que para obtermos a
O critério de anormalidade é o aumento de resposta F estimulamos um nervo periférico que
latência no lado afetado comparativamente ao é constituído de várias raízes nervosas, pode haver
lado assintomático, o que torna difícil sua uma resposta normal, mesmo que exista a lesão
utilização em quadros bilaterais. de uma raiz nervosa devido a uma compensação
A valorização da amplitude do Reflexo H não por parte das raízes íntegras.
é fidedigna, uma vez que esta pode ser significati- Como, em geral, as lesões radiculares
vamente alterada por uma ampla gama de fatores envolvem apenas um determinado número de

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axônios na raiz nervosa, podem ser poupados plurissegmentares originados de múltiplas raízes,
alguns axônios de condução rápida, que tornam tornando difícil detectar alteração em uma só raiz.
a latência da resposta F normal. Para melhorar a capacidade diagnóstica dos
Também como a resposta F só avalia a via PESS nas radiculopatias, tem-se utilizado a
motora, pode haver uma resposta normal em uma estimulação de nervos sensitivos ou dermátomos
lesão radicular exclusivamente sensitiva. que apresentam maior especificidade segmentar
A exemplo do Reflexo H, a Resposta F do que ao estimular nervos mistos.
também encontra-se alterada em neuropatias Normalmente não se valoriza a amplitude das
periféricas e plexopatias, podendo gerar erros na respostas isoladamente, já que mesmo em
interpretação dos achados. indivíduos normais pode haver uma variação de
50-70% entre uma série de estímulos e a outra em
um mesmo nervo ou ao comparar um lado com
Estimulação de Raiz Nervosa outro. Por outro lado, ao utilizarmos o retardo da
latência como critério diagnóstico, ao se utilizar 3
Através de um estímulo elétrico realizado por desvios padrões de intervalo de confiança,
uma agulha monopolar localizada próxima ao teremos uma variação do normal de 12 ms para a
processo espinhoso de uma determinada vértebra latência do nervo tibial (39,1 + 3,9 ms), que é uma
e registro em um músculo específico, obtém-se um variação muito grande. Além disso, comparações
potencial de ação motora.
lado a lado podem atingir 8,8 ms de diferença em
Permanece controverso se a estrutura indivíduos normais6.
estimulada é a raiz nervosa ou o nervo espinhal. Devido a esta larga variação de valores
Caso de fato o último seja estimulado, o método
normais é difícil identificar uma anormalidade, a
não apresentaria nenhuma vantagem em relação
menos que a resposta esteja marcadamente
à avaliação da velocidade de condução nervosa
anormal ou ausente.
motora convencional6.
Estas peculiaridades praticamente restringem
Também é importante salientar que esta
a utilização dos PESS ao diagnóstico de lesões
técnica avalia apenas a raiz motora e que muitos
graves, limitando sua utilização em detectar lesões
pacientes não toleram a intensidade do estímulo
da raiz ou do nervo espinhal. iniciais ou incipientes.
Vários autores concluíram que a utilização
dos PESS não é capaz de ser mais útil que a própria
Potencial Evocado eletromiografia no diagnóstico neurofisiológico
das radiculopatias4.
Somatossensitivo (PESS)
A exemplo do Reflexo H, é uma técnica capaz
de avaliar a raiz sensitiva. Conclusão
Potenciais evocados são registros eletro-
fisiológicos que representam discretas respostas A utilização da ENMG e dos PESS, por ser
elétricas do cérebro à estimulação sensorial um método eletrofisiológico, complementa os
específica. demais métodos diagnósticos anatômicos
Estas respostas são obtidas repetidamente e, (radiografia, mielografia, tomografia computa-
por serem muito pequenas, necessitam ser dorizada e ressonância magnética).
promediadas através de um computador para que Como é um exame que, além de ser isento de
sejam isoladas, ou do próprio EEG, no caso de complicações e altos custos financeiros, pode ser
respostas corticais e de ruídos musculares e realizado ambulatorialmente, deve sempre que
interferências, de maneira que possam ser possível preceder os demais.
analisadas. Os PESS têm recebido recentemente Por outro lado, os métodos diagnósticos
especial atenção como um novo método radiológicos podem não indicar a severidade da
eletrofisiológico na avaliação das disfunções lesão radicular e nem o prognóstico da mesma.
adiculares, permanecendo controversa porém sua Além disso, os achados radiológicos podem não
real sensibilidade e especificidade. ter significância clínica.
Um dos motivos é que pode haver Através das técnicas de diagnóstico
normalidade das respostas na vigência de lesão neurofisiológico é possível detectar a presença,
radicular por causa do curto segmento lesado na severidade, prognóstico e, fundamentalmente, a
via estudada (no caso a raiz sensitiva), que é relevância funcional de uma lesão anatômica.
diluído pelo longo comprimento da via normal. Em pacientes submetidos a cirurgia por
Por outro lado, os PESS rotineiramente são compressão radicular, a avaliação de queixas pós-
obtidos pela estimulação dos nervos mistos operatórias pode ser difícil, exceto por meios

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neurofisiológicos, especialmente se estes estudos Referências Bibliográficas


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Diagnóstico Neurofisiológico das Radiculopatias

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