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Humanismos contemporâneos
1
HORKHEIMER, Max. Eclipse da Razão. 7 ed. São Paulo: Centauro, 2002, p. 7.
2
KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. 2 ed. São Paulo: Abril
Cultural, 1984, p. 141 (Coleção Os Pensadores).
Desafios: novas formas de escravidão, massificação, destruição da natureza
entre outros. Nesse aspecto, todo esse processo tem implicitamente em sua
base uma concepção de universo e de ser humano.
Materialismo: normalmente e apresentada como visão científica do mundo e do
universo. Todavia, em última instância trata-se de uma cosmovisão porque está
alicerçada numa metafísica do mundo e do universo enquanto identificação
com a matéria3. O ser em seu todo é explicado é inteligível enquanto matéria,
ele é matéria. Nesse sentido Alvin Plantinga reflete: “para essa posição, as
respostas são cristalinas: somos também seres fisicamente estruturados,
animais com um modo peculiar de vida, não há Deus, não faz o menor sentido
esperar uma vida após a morte4”.
3
Cf. OLIVEIRA, M. Araújo. O novo humanismo segundo o Papa Francisco. In: GUIMARÃES,
Dom Joaquim Giovani Mol [et al.]. O novo humanismo: Paradigmas civilizatórios para o século
XXI a partir do Papa Francisco. São Paulo: Paulus, 2022, p. 336)
4
PLANTINGA, Alvin. Where the conflict Really Lies: Science, Religion and Naturalism. Oxford:
Oxford Unviersity Press, 2011, p. 336.
5
OLIVEIRA, 2022, p. 337
6
Cf. BOSTROM, Nick. A History of Transhumanist Trought. Jornal of Evolution and Technology,
Hartford, v. 14, n. 1, p. 1-25, April 2005 e também; VILAÇA, Murilo Mariano; DIAS, Maria Clara
Marques. Transumanismo e o futuro (pós) humano. Physis, Rio de Janeiro, v. 24, n. 2, 2014, p.
341-362).
7
LACROIX, Xavier. O corpo reencontrado. Perspectiva teológica, Belo Horizonte, v. 46, n. 129,
2014, p. 247-226.
8
OLIVEIRA, 2022, p. 338.
Busca-se diferenciar o transumanismo do humanismo por ele implicar
modificações radicais na base natural humana: trata-se, de fato, do ideal de um
enorme aprimoramento da vida humana para eliminar todo tipo de sofrimento
pela libertação de nossas cadeias biológicas9.
9
Cf. YOUNG, Simon. Designer Evolution: A transhumnist Manifesto. Nova York: Prometheus
Books, 2006, p. 32.
10
Cf. HABERMAS, Jürgen. O futuro da natureza humana. São Paulo: Martins fontes, 2004, p.
27.
11
Cf. OLIVEIRA, 2022, p. 339.
absolutização da subjetividade 12. Disso temos a subordinação da natureza ao
Eu; é a dominação do sujeito ao não humano;
A morte de Dom Phillips e Bruno são reflexo do problema pela qual estamos
atravessando14. Nesse aspecto as relações humanas baseadas na confiança
são suplantadas por uma concepção pragmática imediatista 15. Nesse contexto,
a falta de novas narrativas 16 e o medo do futuro, crise ambiental e desconfiança
nas relações são a marca dessa sociedade.
Importante salientar que a produção mundial de bens nunca foi tão expressiva
como nos últimos dois séculos. O número de bilionários cresceu
exponencialmente na pandemia19 ao passo que a pobreza e a fome se
agravaram entre os mais vulneráveis 20. A priori, podemos argumentar que o
mercado por si mesmo não pode dar conta das questões complexas que
envolvem o pleno desenvolvimento humano. Nesse contexto, a ideia
meritocrática é perigosa e incapacita os desfavorecidos de questionarem a
própria miséria da qual são vítimas21.
17
KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. 2 ed. São Paulo: Abril
Cultural, 1984, p. 139 (Coleção Os Pensadores).
18
OLIVEIRA, 2022, p. 346.
19
Na pandemia, mundo ganhou um novo bilionário a cada 26 horas, diz Oxfam | Exame
20
Relatório da ONU: ano pandêmico marcado por aumento da fome no mundo (unicef.org)
21
SANDEL, Michael. A tirania do mérito: o que aconteceu com o bem comum. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2020, p. 120 (recurso digital).
22
SANDEL, 2020, p. 377-387.
como fim último da vida se instaura uma reviravolta dos valores onde aqueles
que possuem mais são os vitoriosos, dignos por merecimento da melhor vida
enquanto os outros, abandonados à própria sorte se desesperam, pois nada
podem esperar23. Nesse cenário é importante salientar que não há uma crise
humanitária e ambiental separadamente, mas uma única crise socioambiental.
Questionando o antropocentrismo
Tal postura considera a natureza apenas como volume, extensão e figura sem
ontologia ou teleologia. Mesmo assim, caso se pretenda pensar em termos
teleológicos, se restringe apenas ao que é “útil” para o ser humano; a natureza
passa a ser compreendida enquanto mero recurso ao mundo produzido pelos
humanos. Tudo o que se toca transforma-se em produto para o consumo
semelhante ao mito do Rei Midas.
No intuito de repensar essa postura é fundamental refletir sobre a importância
de abertura a alteridade, deixar que o outro – aqui não apenas o outro humano
e sim todas as formas orgânicas e inorgânicas – se manifeste e se
comunique29.
27
É verdade que em Kant há uma reserva fenomênica quanto a essa questão. A coisa em si
não pode ser conhecida, mas apenas como se revela para nós. A realidade se doa a nós, mas
ainda fica algo que ultrapassa nossa compreensão. A finitude é a marca do ser humano e tal
postura pode abrir espaço para pensar o homem enquanto ser que conhece parcialmente a
realidade; ele não pode e nem é capaz de conhecer tudo. Essa questão será trabalhada na
terceira crítica por meio do juízo reflexionante.
28
OLIVEIRA, 2022, p. 359.
29
Husserl pensa essa questão em sua fenomenologia ao abordar o outro enquanto alter-ego.
(cf. HUSSERL, Edmund. Meditações cartesianas e conferências de Paris. Rio de Janeiro:
Abrir-se ao outro numa postura de diálogo pressupõe renunciar a certezas ou
pré-compreensões acabadas sobre as diversas compreensões de mundo. Não
que a pré-compreensão seja um problema, mas ao partir dela, permitir que o
conhecimento fecundo do outro e de mim mesmo se manifeste. “Quem busca
compreender está exposto a erros de opiniões prévias que não se confirmam
nas próprias coisas”30. Aqui se apresenta uma possibilidade ímpar para o
problema abordado no texto. Os gregos, não obstante as limitações inerentes à
sua visão de mundo, já apresentam o diálogo como elemento fundamental para
o estabelecimento da democracia.
Do mesmo modo que o ser humano é fim em si mesmo – eis aqui uma
conquista teórica importante da modernidade – também esse princípio deve ser
alargado para toda natureza. Pensar em termos de uma ética da
Conclusões
32
OLIVEIRA, 2022, p. 368
Por fim, sem coragem e convicção pessoais fortes não é possível transformar
nada, a começar por nós mesmos. Acreditar e se empenhar por meio de
atitudes que repensem o antropocentrismo contemporâneo é o caminho
principal. Em suma, essa chamada final é um alerta à repensar nossas atitudes
mais básicas, pois pensar na mudança do outro é mais fácil do que na minha.
Mas é preciso cuidado, pois se pode cair em uma nova forma de
individualismo, onde basta que no meu particular eu faça a diferença e tudo se
resolverá. Não é bem esse o caminho. Sem o horizonte do bem comum, ou
seja, a comunidade humanidade em conjunto com a natureza, as ações
particulares podem cair no esquecimento ou perder sua capacidade de adesão.