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Resenhas

Avaliação qualitativa de riscos químicos: princípios básicos para o con-


trole das substâncias nocivas à saúde em fundições
RIBEIRO, Marcela Gerardo; PEDREIRA FILHO, Walter dos Reis; RIEDERER, Elena Elisabeth. São Paulo:
Fundacentro, 2007. 88p. Publicação eletrônica. Disponível em: http://www.fundacentro.gov.br/CTN/
ManualRiscosQuimicos_FundiçãoWeb.pdf

Difícil tarefa a que fui solicitada. Descrever sobre do Trabalho (OIT), por meio do programa Safework
este livro inaugural da “Coleção Toolkit” que torna re- (Programme on Safework and Health at Work and the
alidade um sonho de muitos higienistas ocupacionais, Environment). Essa abordagem vem para preencher
não só do Brasil, mas de todos que estão preocupados uma grande lacuna em nosso conhecimento e capa-
em melhorar a qualidade dos ambientes de trabalho. cidade para avaliar e gerenciar exposições no local
Este primeiro passo é significativo para um caminhar de trabalho.
direcionado, pois a saúde ocupacional das pequenas e
médias empresas não pode ficar à deriva. O ICCT, como qualquer avaliação qualitativa de
riscos, necessita de informações relativas às proprie-
No Brasil, ao verificarmos as notificações relativas dades perigosas inerentes às substâncias químicas e
às doenças ocupacionais devido aos agentes quími- ao perfil da exposição dos trabalhadores a essas subs-
cos, nos diversos bancos de dados, encontramos nú- tâncias, pois, lembrando, risco é a probabilidade de
meros tão ínfimos quando comparados a outros países ocorrência de dano quando a exposição é considera-
que nos leva a duas perguntas: sub-notificação devido da em combinação com os dados relativos ao perigo
ao diagnóstico não realizado? Conhecemos os perigos potencial. Fundamentalmente, a avaliação de risco é
dos produtos químicos ou conhecemos apenas os pro- expressa pela fórmula: Risco = perigo x exposição.
dutos químicos perigosos?
A identificação do perigo (hazard), segundo esta
Considerando que não damos importância àqui- metodologia, foi planejada para incorporar informa-
lo que não conhecemos, é imprescindível adquirir ções prontamente disponíveis sobre os perigos e teria
e disseminar esse conhecimento, como se propuse- que ser simples e transparente, de modo que possa ser
ram os autores. entendida sem dificuldade por pessoas não especiali-
Aceitei o convite, com honra e prazer, movida pelo zadas. Como a regulamentação do Health and Safety
contato gratificante com a obra cujo tema, complexo, Executive, UK (HSE) incorpora as frases R da diretiva
carregado de preconceitos e de armadilhas, é tratado 67/548/CEE do Conselho das Comunidades Européias,
pelos autores de forma clara e objetiva. O livro apre- estas foram adotadas.
senta linguagem não exclusivamente técnica e descre- As frases R provêm dos perigos da utilização da
ve o procedimento passo a passo e com muita ilus- substância e/ou produto químico, isto é, descrevem a
tração, facilitando o entendimento de quem não está natureza dos perigos de uma substância ou preparado
familiarizado com essa abordagem. perigoso, indicando os efeitos à saúde devido à expo-
Considerem este livro não apenas uma leitura, sição única ou repetida, sua intensidade e a via de ex-
mas uma referência para se iniciar trabalhos de pre- posição. Há ainda outros perigos, como liberar gases
venção de riscos ocupacionais e principalmente como tóxicos em contato com água, e outras propriedades
uma estrutura base para desenvolvermos discussões a toxicológicas independentes da classificação, como
respeito do assunto e a partir daí concretizar conceitos provocar sonolência e vertigens, ressecar a pele, ter
essenciais para uma comunicação mais fluida entre os efeitos cumulativos. Considerando que, se o fator de
diversos profissionais no Brasil. Esta proposta, apesar risco não é identificado adequadamente ou o consen-
de já ser boa, com certeza será continuamente desa- so sobre o perigo não está definido de forma clara, a
fiada, testada, ajustada e expandida para cobrir novas avaliação de risco com certeza falhará.
operações e aplicações.
O HSE desenvolveu seu desenho de classificação
Os autores se dispuseram a iniciar, no Brasil, a im- de perigo utilizando as frases R e qualificou-os em
plementação de um novo processo de gerenciamento bandas. Estas foram avaliadas por comparação com
qualitativo de risco, em que a avaliação da toxicidade substâncias químicas que possuem Limite de Expo-
e uns poucos fatores de exposição conduzem a um pla- sição Ocupacional (LEO) conhecido. Esta etapa de le-
no de controle de exposição – International Chemical vantamento de informação de perigos já alerta empre-
Control Toolkit (ICCT), promovido e disseminado in- sários ou trabalhadores para a possibilidade de risco
ternacionalmente pela Organização Internacional e é por si só importante para a conscientização dos

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perigos inerentes a determinados produtos químicos. multifuncionais que exercem a função de gerentes
A maioria dos trabalhadores não tem idéia dos perigos de produção, de venda, de pessoas (recursos huma-
a que estão expostos. nos), da contabilidade e ainda gerenciam questões
de saúde, segurança e meio ambiente.
O perfil de exposição – o outro fator de risco – é
determinado para uma faixa de controle baseando-se É importante lembrar que o auxílio especializado é
em três determinantes: quantidades utilizadas, forma indispensável, tanto para treinar inicialmente as pes-
física (volatilidade e índice de empoeiramento) de soas que irão executar esta metodologia no local de
cada produto químico e os controles já existentes. Ob- trabalho, como para fornecer o apoio técnico-científi-
servar que a volatilidade e o índice de empoeiramento co que for necessário.
indicarão a capacidade dos agentes em se propagarem
A metodologia pode também ser usada para ava-
pelo ambiente de trabalho.
liações qualitativas realizadas para mostrar o perfil
Por fim, combinando os dados obtidos: a) a toxi- da exposição em determinada tarefa. O resultado
cidade do agente – grupos A a E, de acordo com as dessas avaliações pode antecipar controles para ex-
frases R e grupo S (dano à pele e/ou aos olhos); e b) a posições perigosas, para reavaliação de exposições
possibilidade de exposição – quantidade utilizada e controladas e, estrategicamente, em um programa de
forma física, verifica-se, na tabela fornecida, o resulta- avaliação de exposição a substâncias que não possu-
do desta combinação e obtém-se a medida de controle am limites de exposição ocupacional. Lembrem-se de
a ser adotada, que é uma entre quatro estratégias de que a American Conference of Industrial Hygienists
controle recomendadas, além das fichas específicas: (ACGIH) contém menos que 1000 limites de exposi-
ção e a nossa NR-15 estabelece limites para menos
1) uso de boas práticas de Higiene Ocupacional;
que 150 substâncias.
2) uso de sistema de ventilação local exaustora;
3) enclausurar o processo; e A clássica avaliação qualitativa não será substi-
tuída. Este método é uma nova ferramenta que pode
4) recorrer à recomendação de um especialista. A
mestria não será substituída. O conhecimento de ser usada por pessoas não especializadas em Higie-
instruções operacionais específicas e o julgamento ne Ocupacional. Tem a vantagem de não ser conta-
profissional são requeridos para a implementação minada por juízos de valores, percepções de risco
da melhor combinação factível de controles para subjetivas e culturais durante a determinação da
minimizar riscos aos trabalhadores. exposição, na qual o especialista seria isento. Só um
especialista é capaz de separar o que é importante
Esse sistema de gerenciamento de risco padroni-
do que é impressionante.
zado foi desenvolvido pelo HSE e implementado em
1998, no Reino Unido. Desde então, várias organi- E a implementação desta metodologia no local de
zações vêm estudando este modelo. O método para trabalho será uma excelente oportunidade para edu-
avaliação qualitativa de riscos químicos apresentado cação em Higiene Ocupacional, tanto aos proprietá-
nessa publicação é totalmente baseado na abordagem rios, como aos trabalhadores e favorecerá a tomada de
pragmática ICCT, resultante da colaboração entre a ações pró-ativas por parte destes.
OIT, a International Occupational Hygiene Association
Estas abordagens, que utilizam códigos de procedi-
(IOHA) e o HSE. O objetivo é incentivar e apoiar os
mentos práticos, facilitam a tomada de ações preven-
países a concentrarem a maior parte de seus esforços
tivas sem a necessidade de avaliações quantitativas,
em prevenir exposições a agentes perigosos em vez de
que são difíceis de serem realizadas, dispendiosas e
direcionar orçamentos para avaliações quantitativas.
exigem um profissional especializado.
Mas não esqueçamos que existem muitos casos em
que avaliações quantitativas são necessárias, como O grande diferencial desta técnica é o fato de
também são indispensáveis para a própria validação usar as frases R da diretiva 67/548/CEE do Conselho
de qualquer abordagem pragmática. das Comunidades Européias, que derivam dos peri-
gos da utilização da substância e/ou produto quími-
O propósito destas abordagens que utilizam có-
co. Ao mesmo tempo, este é um obstáculo para nós,
digos de procedimentos práticos é fornecer um guia
no Brasil, pois informação sobre os perigos de uma
simples e direto para que indivíduos sem formação
dada substância e/ou produto químico expresso por
em Higiene Ocupacional possam controlar os pe-
uma frase R só é fornecida por quem adota o sistema
rigos no local de trabalho, indicando uma solução
de classificação, embalagem e rotulagem da Comu-
preventiva com base em testes previamente reali-
nidade Européia.
zados e validados que permitem estimar a exposi-
ção em determinadas situações específicas e bem Se for uma substância química constante do Ane-
definidas e propor técnicas de controle adequadas xo I da diretiva 67/548/CEE, pode-se acessar bancos
a cada caso. Esta metodologia supera também a ca- de dados europeus, como o European Chemicals
rência de higienistas ocupacionais, carência ainda Bureau (ECB), em que se encontrarão as frases R nas
maior dos especializados em riscos químicos. A in- diversas línguas dos países pertencentes à União
tenção principal era e ainda é atingir os proprietá- Européia. Mas, se precisarmos da classificação de
rios de pequenas e médias empresas, profissionais um produto químico (mistura de substâncias), a

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obtenção da informação, infelizmente, não estará Considerando que o GHS foi adotado pela Orga-
prontamente disponível. nização das Nações Unidas (ONU), uma coerência
global será possível na classificação de produtos quí-
Para superar esta lacuna, o responsável pela ava- micos. Essa harmonização possibilitará o desenvolvi-
liação deverá obter as informações de perigo nas Fi- mento e a adoção do projeto ICCT em qualquer lugar
chas de Informação de Segurança de Produto Químico do mundo. Aqui no Brasil, a adoção dessa ferramenta
(FISPQs) ou solicitá-las junto ao fabricante ou distri- por diversos setores da sociedade será mais um fator
buidor do produto e, então, convertê-las em frases R de incentivo à implementação do GHS no Brasil.
para ser capaz de avaliar a faixa de perigo. Essas infor- Dada a importância do entendimento dessa nova
mações podem ser advindas de qualquer sistema de metodologia (ICCT), os autores reservaram as pri-
classificação, de qualquer lugar do mundo, pois, no meiras 50 páginas para apresentá-la e colocaram as
Brasil, não temos nem adotamos qualquer sistema de orientações específicas para o trabalho em fundições
classificação de produtos químicos quanto aos perigos no Anexo 5.
à saúde, exceção feita aos agrotóxicos e ao transporte Esse anexo é composto de oito fichas, com dese-
terrestre de produtos perigosos, que não se aplicariam nho igual ao do modelo proposto pelo ICCT da OIT1,
neste contexto. contendo os itens: abrangência, acesso ao local de tra-
Essa limitação só será suplantada com a imple- balho, sistemas de ventilação, testes e manutenção,
higiene e manutenção da limpeza no local de traba-
mentação do Globally Harmonized System (GHS) no
lho, equipamento de proteção individual, acompa-
Brasil. GHS é um sistema globalmente harmonizado
nhamento médico, treinamento e supervisão.
de classificação e rotulagem de produtos químicos
que conceitua os perigos e estabelece a classificação e O conteúdo apresenta informações adaptadas à
a comunicação da informação sobre os perigos em ró- nossa realidade, cultura e necessidades, presentes em
tulos e fichas de informação de segurança por meio de diversas fundições brasileiras.
palavras de advertência, frases de perigo (hazard), fra- Nelí Pires Magnanelli
ses de precaução e pictogramas padronizados. Como é
Graduada em Farmácia e Bioquímica,
um sistema conceitualmente semelhante ao da União especialista em Administração de Instituições de Saúde e especia-
Européia, não haverá conflito com a adoção das futu- lista em Higiene Ocupacional.
ras frases H que substituirão as atuais frases R. nelimagna@yahoo.com.br

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http://www.ilo.org/public/english/protection/safework/ctrl_banding/toolkit/main_guide.pdf)

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