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EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUIZ (ÍZA) DA VARA FEDERAL DA SUBSEÇÃO
JUDICIÁRIA DE SANTA CRUZ DO SUL, RS.

DELTASUL UTILIDADES LTDA., pessoa jurídica de direito privado, CNPJ nº


98.102.924/0001-01, estabelecida na Avenida Presidente Castelo Branco, 1025, Distrito
Industrial, no município de Santa Cruz do Sul, RS,, vem, por seus procuradores, perante Vossa
Excelência para impetrar

MANDADO DE SEGURANÇA

contra ato do Ilustríssimo Sr. DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SANTA CRUZ DO
SUL, RS, cujas atividades são de interesse da UNIÃO – FAZENDA NACIONAL, que deve ser
intimada, pela Procuradoria Seccional da Fazenda Nacional de Santa Cruz do Sul, RS, a integrar o
feito como parte interessada, o que faz com base nos substratos fáticos e jurídicos adiante
aduzidos
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I – DOS FATOS.

A Impetrante é pessoa jurídica de direito privado, que atua basicamente no comércio


varejista de eletrodomésticos, materiais de construção e móveis em geral.

No exercício de sua atividade, a Impetrante adquire mercadorias de fornecedores para


a posterior revenda, auferindo “receitas”, as quais, salvo as mercadorias sujeitas a alíquota zero,
isentas ou com suspensão, sofrem a incidência das contribuições do PIS e da COFINS previstas
nas Leis 10.637/02 e 10.833/03.

Grande parte das mercadorias comercializadas pela Impetrante está sujeita ao regime
de substituição tributária do ICMS (ICMS-ST), regime segundo o qual, nos termos autorizados
pelo art. 150, § 7ª, da CF1, a lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a
condição de responsável pelo pagamento antecipado do imposto (contribuinte substituto), cujo
fato gerador deva ocorrer posteriormente, isto é, ICMS relativo nas operações subsequentes.

Na maioria dos casos de substituição tributária, a legislação estadual do ICMS,


especificamente por meio de Convênio e Protocolos de ICMS, estabelece que o imposto devido
na operação de venda a ser realizada pela Impetrante não deverá ser por ela apurado e
recolhido, mas sim ser calculado e pago antecipadamente pelo seu fornecedor (contribuinte
substituto), com base em fato gerador presumido (Margem de Valor Agregado - MVA)
determinado pelo ente público que pretende captar a dimensão econômica da operação de
venda que poderá ocorrer no futuro.

Nesse regime de substituição tributária do ICMS, o recolhimento do imposto é


realizado de forma antecipada e a Impetrante figura como contribuinte substituído, de modo
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que, quando da entrada desses bens (mercadorias sujeitas ao regime da substituição tributária)
em seu estabelecimento comercial, já está incluído no preço de aquisição e, por conseguinte no
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Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
§ 7º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo
fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador
presumido.

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preço de venda, o montante econômico do ICMS que seria devido por ela quando vier a
revendê-los.

Posto isso, é importante para o caso concreto, dizer que no regime da substituição
tributária existem dois sistemas de apuração e recolhimento do ICMS relativo ao imposto das
operações subsequentes.

O primeiro e mais usual é quando o ICMS-ST já vem destacado nas notas fiscais do
fornecedor. Nesses casos, a Impetrante, como contribuinte substituída, ao realizar a aquisição
de mercadorias sujeitas ao regime de substituição tributária para revenda, paga ao substituto
tributário (fornecedor) o preço do bem adquirido com a inclusão do ICMS-ST destacado no
documento fiscal, o qual, na operação de saída (operação subsequente), acaba compondo o
montante da sua receita/faturamento auferida.

Mas, há ainda outra situação, no qual os contribuintes, também, caso da Impetrante,


adquirem mercadorias sujeitas ao regime da substituição tributária, em que, contudo, não
existe, por falta de acordo (Protocolos de ICMS), entre o Estado remetente (fornecedor) e o
Estado destinatário (adquirente), obrigatoriedade por parte do remetente (fornecedor) de
destacar no documento fiscal o imposto (ICMS-ST) relativo às operações subsequentes no
documento fiscal.

Nessa situação, caberá ao destinatário (adquirente), o recolhimento do ICMS


antecipado relativo às operações subsequentes, em que a Impetrante – será, ao mesmo tempo,
contribuinte substituto e substituído. No Rio Grande do Sul, RS, isto está previsto no art. 9º, II,
do Livro III, do RICMS/RS2.
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Art. 9° - Na condição de substitutos tributários, são responsáveis pelo pagamento do imposto devido nas operações subseqüentes promovidas
por contribuintes deste Estado com as mercadorias referidas no Apêndice II, Seções II e III, os seguintes contribuintes, deste Estado, que a eles
tenham remetido as mercadorias: [...]
II - o estabelecimento que recebeu as mercadorias oriundas de outra unidade da Federação, salvo se estas tiverem sido recebidas com
substituição tributária;

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Em síntese, a Impetrante adquire e comercializa (revende) mercadorias sujeitas ao


regime da substituição tributária nas quais: a) o ICMS-ST vem destacado no documento fiscal do
fornecedor (contribuinte substituto) relativo às operações subsequentes o qual repassa o valor
ao ente público como mero depositário; ou b) o ICMS-ST não vem destacado no documento
fiscal do fornecedor, cabendo, contudo, a Impetrante nessa situação o recolhimento do imposto
relativo nas operações subsequentes.

Em ambas as situações – tanto quando o ICMS-ST vem destacado no documento fiscal


pelo fornecedor e recolhido por ele como mero depositário, como quando a própria Impetrante
é obrigada a recolhê-lo quando o imposto não vem destacado pelo fornecedor –, de acordo com
§ 1º do art. 1º das Leis 10.637/02 e 10.833/03, combinado com o art. 12 do Decreto-Lei
1.598/77 (redação dada pela Lei 12.973/14), a Impetrante paga o PIS e a COFINS as ditas tendo
como base de cálculo o total das receitas auferidas, incluído aí todo o valor do ICMS-ST
embutido, já que a ela não é permitida excluir o ICMS, recolhido anteriormente relativo as
operações subsequentes.

Fica claro que o ICMS, conhecido como ST, em razão de que deve ser apurado e
recolhido de forma antecipada é embutido no valor de venda da mercadoria e acaba,
consequentemente, compondo, ainda que indevidamente, a receita bruta/faturamento,
tributada pelo PIS e a COFINS, já que a Impetrante deve pagar as ditas contribuições, tendo
como base de cálculo o total das receitas auferidas, incluído aí todo o valor do ICMS nelas
embutido.

Assim como as mercadorias não sujeitas ao regime da substituição tributária, o ICMS-ST


não pode ser considerado receita, porque também não se traduz em resultado econômico da
atividade empresarial e tampouco acréscimo patrimonial. O ICMS-ST, em realidade, não é outra
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coisa senão o montante do ICMS que seria devido pela própria Impetrante, caso inexistisse o
regime de substituição tributária.

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Contudo, a Receita Federal não vem admitindo que a Impetrante exclua da base de
cálculo do PIS e COFINS o valor de ICMS pago e recolhido antecipadamente e que está, sim,
embutido no preço dos bens adquiridos. Eis a posição exarada pela Autoridade Fiscal sobre o
assunto:

SOLUÇÃO DE CONSULTA DISIT/SRRF02 Nº 2004, DE 13 DE MARÇO DE 2017


(Publicado(a) no DOU de 22/03/2017, seção 1, página 57)
ASSUNTO: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins
EMENTA: NÃO CUMULATIVIDADE. CRÉDITOS. ICMS. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA.
O valor do ICMS-Substituição Tributária (ICMS-ST) pago pelo adquirente de
mercadorias na condição de substituído, não pode ser computado para fins de
cálculo de créditos relativos à Contribuição sobre o Financiamento da Seguridade
Social - Cofins, no regime não-cumulativo. Nesse contexto, também é incabível
deduzir o valor do ICMS-ST da receita auferida por ocasião da venda das
mercadorias adquiridas com a incidência desse imposto. SOLUÇÃO DE CONSULTA
VINCULADA À SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 106, DE 11 DE ABRIL DE 2014.
DISPOSITIVOS LEGAIS: Constituição Federal, Art. 150, § 7º; Lei nº 10.833, de 2003,
art. 3º; Parecer Normativo CST nº 77, de 1986.
ASSUNTO: Contribuição para o PIS/Pasep
EMENTA: NÃO CUMULATIVIDADE. CRÉDITOS. ICMS. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA.
O valor do ICMS Substituição Tributária (ICMS-ST) pago pelo adquirente de
mercadorias na condição de substituído, não pode ser computado para fins de
cálculo de créditos relativos à Contribuição para o PIS/Pasep, no regime não-
cumulativo. Nesse contexto, também é incabível deduzir o valor do ICMSST da
receita auferida por ocasião da venda das mercadorias adquiridas com a incidência
desse imposto. SOLUÇÃO DE CONSULTA VINCULADA À SOLUÇÃO DE CONSULTA
COSIT Nº 106, DE 11 DE ABRIL DE 2014. DISPOSITIVOS LEGAIS: Constituição
Federal, Art. 150, § 7º; Lei nº 10.637, de 2002, art. 3º; Parecer Normativo CST nº
77, de 1986.

Logo, como o ICMS-ST é o imposto relativo à operação de saída da Impetrante, a ele


deve ser aplicado o mesmo entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no
julgamento do RE 574.706/PR, no qual se decidiu de modo favorável ao contribuinte, de que o
ICMS não poderia ser enquadrado no conceito constitucional da ‘receita’, na medida em que
esse imposto estadual seria uma despesa arcada pelo contribuinte, não representando um
ingresso que poderia caracterizar uma receita da empresa.
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E, se há sim não fosse, para os contribuintes que comercializam mercadorias sujeitas ao


regime da substituição tributária (caso da Impetrante), de nada adiantaria o conceito definido

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pelo STF, em sede de Repercussão Geral, de que o ICMS não deve fazer parte da base de cálculo
do PIS e COFINS.

II – DO DIREITO.
II.I – Da apuração do ICMS-ST.

Conforme previsto no artigo 150, § 7º da CF, o regime da substituição tributária “para


frente” consiste na técnica de arrecadação pela qual se atribui ao contribuinte substituto a
obrigação de recolher, de forma antecipada, o ICMS que seria devido, e, por conseguinte
destacado se não fosse recolhido de forma antecipada, na operação de revenda. Isto é, o
contribuinte substituto se responsabiliza, antecipadamente, pelo cálculo e pagamento do
montante do tributo da operação própria e das sucessivas, desobrigando os contribuintes
subsequentes do seu recolhimento. E, em não havendo a obrigatoriedade do recolhimento do
ICMS relativo às mercadorias sujeitas ao regime da substituição tributária, não há destaque do
ICMS no documento fiscal relativo a operação da Impetrante (revenda).

Muito embora seja o contribuinte substituto – que na grande maioria das situações é o
fornecedor, mas podendo ser a própria Impetrante – quem se responsabiliza antecipadamente
pelo cálculo e recolhimento do montante do ICMS, não há dúvida de que ao revender as
mercadorias sujeitas ao regime da substituição tributária, é a Impetrante quem efetivamente
arca com o ônus econômico da imposição, porquanto desembolsa, por antecipação, o
dinheiro destinado ao pagamento do imposto relativo às operações subsequentes. O
substituto tributário se posiciona como mero repassador da quantia retida.

Em outras palavras, a substituição tributária progressiva (“para frente”) é apenas uma


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técnica de apuração e pagamento do ICMS, no qual o imposto estadual é recolhido de forma


diferenciada.

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Desse modo, o ICM-ST recolhido antecipadamente ao Estado relativo às operações


subsequentes, que deveria tratar-se de uma operação meramente de reembolso, faz incidir
tributação de PIS e COFINS pela Impetrante. Isso se comprova facilmente, na revenda de
mercadorias sujeitas ao regime da substituição tributária, em que a base de cálculo para a
apuração do PIS e COFINS é o valor total da nota fiscal, embutido aí, todos os tributos que
fizeram parte da composição do preço de venda, incluído aí, o ICMS pago antecipadamente.

Já não bastasse a Impetrante ter que recolher de forma antecipada o ICMS relativo às
operações subsequentes ao ente público, é ainda lhe retirado o direito de excluir da base de
cálculo do PIS e COFINS esse valor, que é repassado diretamente aos cofres públicos, que nada
tem haver com “receita”, ou menos ainda, caracteriza acréscimo patrimonial.

Tanto é ilegal incidir PIS e COFINS sobre a parcela do ICMS-ST, que por determinação
legal, o contribuinte substituto, responsável por repassar o imposto ao Estado não está
obrigado a fazer incidir COFINS e PIS sobre a parcela de ICMS-ST, uma vez que é considerado
mero depositário. Eis a redação do art. 12, do Decreto-Lei 1.598/77:

Art. 12. A receita bruta compreende: [...]


§ 4o Na receita bruta não se incluem os tributos não cumulativos cobrados,
destacadamente, do comprador ou contratante pelo vendedor dos bens ou pelo
prestador dos serviços na condição de mero depositário.

Veja-se, o ente público dá com uma mão ao excluir o ICMS-ST da base de cálculo do PIS
e COFINS do mero depositário (contribuinte substituto), e retira com duas mãos, primeiro ao
exigir do contribuinte substituído que apure e recolha o PIS e COFINS sobre o valor total do
preço de venda constante do documento fiscal (incluído ai o ICMS-ST recolhido
antecipadamente), e duas, ao não permitir que o contribuinte substituído sequer possa se
creditar do PIS e COFINS sobre a parcela do ICMS recolhido antecipadamente.
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Nesse contexto, importante relembrar a evolução da jurisprudência do STF no que


tange a base de cálculo de incidência do PIS e da COFINS.

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(e-STJ Fl.10)

Inicialmente, em 27 de março de 2006, a matéria relativa à inclusão do valor relativo ao


ICMS na base de cálculo das contribuições para o PIS e para a COFINS recebeu importantíssima
atualização jurisprudencial por parte da Suprema Corte, quando, diante da sua nova
composição, entendeu por bem renovar o julgamento do RE 240.785/MG, que se encontrava
suspenso há quase sete anos, em razão de pedido de vista formulado pelo Ministro Nelson
Jobim. Retomado o julgamento, embora não em sede de Repercussão Geral, o Min. Marco
Aurélio, Relator do feito, afirmou que a expressão ‘faturamento’, utilizada para definir a
competência tributária da União, deve ser tomada em seu sentido técnico:

Óptica diversa não pode ser emprestada ao preceito constitucional, revelador da


incidência sobre o faturamento. Este decorre, em si, de um negócio jurídico, de
uma operação, importando, por tal motivo, o que percebido por aquele que a
realiza, considerada a venda de mercadoria ou mesmo a prestação de serviços. A
base de cálculo da Cofins não pode extravasar, desse modo, sob o ângulo do
faturamento, o valor do negócio, ou seja, a parcela percebida com a operação
mercantil ou similar. O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia
que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à
prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções
próprias ao que se entende como receita bruta.

A partir deste conceito de faturamento, o Ministro Marco Aurélio afirmou que


“descabe assentar que os contribuintes da Cofins faturam, em si, o ICMS”, na medida em que “o
valor deste revela, isto sim, um desembolso a beneficiar a entidade de direito público que tem a
competência para cobrá-lo” e que “se alguém fatura ICMS, esse alguém é o Estado e não o
vendedor da mercadoria”.

Ainda, concluiu o Ministro, pela impossibilidade da incidência da COFINS sobre o valor


referente ao ICMS, na medida em que tal incidência importaria “na incidência do tributo que é a
Cofins, não sobre o faturamento, mas sobre outro tributo já agora da competência de unidade
da Federação”, implicando “a incidência da Cofins sobre o ICMS, ou seja, a incidência de
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contribuição sobre imposto, quando a própria Lei Complementar nº 70/91, fiel à dicção
constitucional, afastou a possibilidade de incluir-se, na base de incidência da Cofins, o valor
devido a título de IPI”. Aduziu, ainda, que o valor correspondente ao ICMS “não tem a natureza
de faturamento”, não podendo, portanto, “servir à incidência da Cofins, pois não revela medida

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(e-STJ Fl.11)

de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea ‘b’ do inciso I do artigo 195 da
Constituição Federal”.

Em relação à mesma matéria, o STF, em 08 de março de 2017, entendeu por reiniciar a


discussão apreciando, em Plenário, o RE 574.706 (Tema 69), no qual houve reconhecimento de
Repercussão Geral, tendo o processo sido julgado, por maioria, de modo favorável à postura dos
contribuintes, pacificando-se o entendimento no sentido de ser inconstitucional a inclusão do
ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS:

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. EXCLUSÃO DO


ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E COFINS. DEFINIÇÃO DE FATURAMENTO.
APURAÇÃO ESCRITURAL DO ICMS E REGIME DE NÃO CUMULATIVIDADE. RECURSO
PROVIDO. 1. Inviável a apuração do ICMS tomando-se cada mercadoria ou serviço
e a correspondente cadeia, adota-se o sistema de apuração contábil. O montante
de ICMS a recolher é apurado mês a mês, considerando-se o total de créditos
decorrentes de aquisições e o total de débitos gerados nas saídas de mercadorias
ou serviços: análise contábil ou escritural do ICMS. 2. A análise jurídica do princípio
da não cumulatividade aplicado ao ICMS há de atentar ao disposto no art. 155, §
2º, inc. I, da Constituição da República, cumprindo-se o princípio da não
cumulatividade a cada operação. 3. O regime da não cumulatividade impõe
concluir, conquanto se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do
ICMS, não se incluir todo ele na definição de faturamento aproveitado por este
Supremo Tribunal Federal. O ICMS não compõe a base de cálculo para incidência
do PIS e da COFINS. 3. Se o art. 3º, § 2º, inc. I, in fine, da Lei n. 9.718/1998 excluiu
da base de cálculo daquelas contribuições sociais o ICMS transferido
integralmente para os Estados, deve ser enfatizado que não há como se excluir a
transferência parcial decorrente do regime de não cumulatividade em
determinado momento da dinâmica das operações. 4. Recurso provido para
excluir o ICMS da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS. (RE 574706,
Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 15/03/2017,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-223 DIVULG 29-09-
2017 PUBLIC 02-10-2017).

Destarte, considerando a tese firmada pelo STF, no sentido de que o “ICMS não
compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS”, deve ser destacado que, diante
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disso, a Impetrante não pode ser obrigada a continuar arcando com esses pagamentos
indevidos, haja vista que, da mesma forma que o ICMS relativo ao débito próprio, o ICMS pago
por substituição tributária não é receita do contribuinte, mas do próprio Estado Federativo.

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(e-STJ Fl.12)

Assim como o ICMS próprio, o ICMS-ST também não pode ser receita do Estado e, ao
mesmo tempo, receita do contribuinte, sob pena de violação ao que foi decidido pelo STF no
julgamento do RE 574.706/PR.

O TRF4, aplicando o que decidiu o STF em sede de Repercussão Geral, tem entendido
que o que deve ser excluído do PIS e da COFINS é o “ICMS destacado nas notas fiscais de
venda”:

EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. LIMITES DO PEDIDO. OBSERVÂNCIA.


OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. PRONUNCIAMENTO EM MOMENTO PROCESSUAL
POSTERIOR. INCABIMENTO. CRÉDITOS DO PIS E DA COFINS NÃO CUMULATIVOS.
PREQUESTIONAMENTO. 1. Não procede a alegação de que o julgado embargado
desbordou dos limites da decisão em sede de Repercussão Geral, pois a Turma
concluiu que o Supremo Tribunal Federal, quando da análise do RE nº 574.706,
definiu a modalidade de ICMS a ser excluída, qual seja o destacado, motivo pelo
qual, alinhando-se ao comando daquele Tribunal, também determinou a
exclusão do ICMS destacado nas notas fiscais. [...]. (TRF4 5014924-
35.2017.4.04.7000, SEGUNDA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado
aos autos em 20/02/2019).

EMENTA: TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES PARA PIS E COFINS, BASE DE CÁLCULO,


EXCLUSÃO DO ICMS. TEMA 69 STF, JUÍZO DE RETRATAÇÃO. 1. O ICMS não compõe
a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da Cofins. Supremo Tribunal
Federal, tema 69 de recursos repetitivos em recurso extraordinário (repercussão
geral). 2. O ICMS a excluir da base de cálculo das contribuições para PIS e COFINS
é o destacado nas notas fiscais das operações de venda da contribuinte.
Precedente desta Corte. (TRF4 5066146-72.2013.4.04.7100, PRIMEIRA TURMA,
Relator MARCELO DE NARDI, juntado aos autos em 13/02/2019).

No entanto, no caso concreto, de revenda de mercadorias sujeitas ao regime da


substituição tributária, de acordo as legislações Estaduais, não haverá destaque do ICMS nos
documentos fiscais de saída em razão de que o imposto já foi recolhido antecipadamente
conforme disposição do art. 28, L II, do RICMS/RS3.
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Para dirimir qualquer dúvida de que o ICMS-ST recolhido antecipadamente ao ente


público, é relativo ao ICMS das operações subsequentes, foi criado um CST (Código da Situação

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Art. 28. O contribuinte substituído, na operação que realizar com mercadoria recebida com imposto retido, emitirá documento fiscal, sem
destaque do imposto, contendo, além das demais indicações:

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(e-STJ Fl.13)

Tributária de ICMS) próprio para as mercadorias sujeitas ao regime da substituição tributária,


em que os contribuintes, caso da Impetrante, devem informar no documento fiscal:

- 060 - ICMS Cobrado Anteriormente por ST.

Essa compreensão, de que o ICMS-ST recolhido anteriormente faz parte do


faturamento da Impetrante, e, por conseguinte, da base de cálculo do PIS e COFINS, fica ainda
mais clara a partir da vigência do Decreto Estadual nº 54.308/18 (01.01.2019), em que o Poder
Executivo exigiu dos contribuintes varejistas na venda a consumidor final que fosse informado
no XML (documento fiscal gerado a partir da concretização da venda) o valor efetivo do ICMS da
operação envolvendo mercadoria sujeita à substituição tributária.

Como visto, não há dúvida de que o valor do ICMS-ST integra a base de cálculo do PIS e
COFINS nas vendas realizadas pelo contribuinte substituído de mercadorias ou serviços em que
esse imposto foi anteriormente apurado e recolhido pelo regime de substituição tributária.

Logo, nas operações praticadas pelo substituído, em que o ICMS foi anteriormente
apurado e recolhido pelo substituto tributário esse imposto também não deve compor a base
de cálculo do PIS e da COFINS.

Há quem diga que o ICMS-ST não é calculado por dentro, mas sim por fora, isto é, sobre
uma base relativa ao preço de venda, ao contrário do ICMS próprio, e que, por isso, não poderia
ser excluído da base de cálculo do PIS e COFINS, contudo, entende-se equivocado esse
entendimento.

Isso porque, nas operações internas, em que o remetente e o destinatário são


estabelecidos na mesma unidade federada, o valor do ICMS-ST é calculado sobre todo o
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montante da operação, isto é, valor de venda da mercadoria (aí incluído o ICMS próprio
calculado por dentro), mais o IPI - se devido -, mais o frete - se destacado no documento -,
enfim todos os valores que compõe o valor total da nota fiscal.

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(e-STJ Fl.14)

Portanto, a base de cálculo do ICMS-ST o qual se aplicará a Margem de Valor Agregado


(MVA) imposta pelo ente público, não é somente o preço de venda das mercadorias, mas sim o
total da operação, inclusive sobre o IPI, que se quer faz parte da base de cálculo do ICMS
próprio do contribuinte substituto.

A compreensão de que o valor do ICMS-ST é calculado por dentro, fica mais nítida se
analisarmos nas operações interestaduais.

A título exemplificativo, vamos tratar de uma operação de venda de um refrigerador


tipo doméstico (NCM 8418.29.00), de origem nacional, oriunda do Estado de Santa Catarina
para o Estado do Rio Grande do Sul, em que o preço total constante do documento fiscal seja de
R$ 1.000,00. Importante ainda dizer que, nessa operação, a alíquota, por se tratar de uma
operação interestadual é de 12% e que a alíquota interna é de 18%.

Verificando-se a referida mercadoria no RICMS/RS, constata-se que, por se tratar de


uma operação interestadual de mercadoria nacional (alíquota de 12%), a MVA a ser aplicada
para a apuração da base de cálculo do ICMS-ST, conforme determinado pela legislação estadual,
é 59,31%. Para se chegar a MVA de 59,31%, inevitavelmente deve ser calculado o ICMS-ST por
dentro.

Corroborando esse entendimento, o STJ, no julgamento REsp 1.454.184/MG,


reconheceu que “o ICMS/ST não é um tributo diferente do ICMS próprio” e que “não há como
julgá-los e entende-los de maneira diversa”. Eis a ementa do julgado:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUPOSTA OFENSA AO


ARTIGO 535 DO CPC/1973. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO NO ACÓRDÃO RECORRIDO.
ICMS POR SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA (ICMS/ST). INCLUSÃO NA BASE DE
CÁLCULO.
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1. [...].
2. A controvérsia dos autos, gira em torno da possibilidade ou não da inclusão do
valor do ICMS por substituição tributária (ICMS/ST), em sua própria base de
cálculo.

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(e-STJ Fl.15)

3. Firmou-se a jurisprudência do STJ no sentido de que o ICMS integra a sua


própria base de cálculo, sendo, portanto, legal a sistemática do "cálculo por
dentro" para aferição da base de cálculo do ICMS, nos termos do art. 13, § 1º, I, da
LC n. 87/96.
4. A dúvida dos autos é se essa mesma regra aplica-se para o ICMS substituição
tributária. A substituição tributária se trata de mecanismo de arrecadação no qual
um terceiro sujeito se insere na relação jurídica entre o fisco e o contribuinte de
modo a antecipar o pagamento devido por este, cabendo o ressarcimento
decorrente do regime plurifásico.
5. O ICMS/ST não é um tributo diferente do ICMS próprio. A base de cálculo do
ICMS não sofre modificação quando se trata de arrecadação mediante
substituição tributária, como ocorre na hipótese em exame. [...].
6. O ICMS e o ICSM/ST são o mesmo tributo, portanto, não há como julgá-los e
entende-los de maneira diversa, pois trata-se apenas de aplicar um regime
diferenciado para simplificar a tributação e fiscalização. Assim sendo, é insito
que a base de cálculo do ICMS substituição tributária seja integrado pelo
montante do próprio imposto. Do contrário, não seria ICMS, mas outro tributo.
7. Recurso especial não provido.
(REsp 1454184/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA
TURMA, julgado em 05/05/2016, DJe 09/06/2016).

Considerando, a alíquota interna de 18% e a alíquota interestadual de 12%, aplica-se a


seguinte fórmula: 1 - 0,12 (alíquota interestadual) / 1 - 0,18 (alíquota interna) = 1,07317

Em outras palavras, divide-se 0,88 / 0,82 = 1,07317.

A partir desse índice, se obterá a MVA disposta no RICMS/RS de 59,31%, em que se


aplica o índice 1,07317 x 48,45 (MVA original), o que deixa claro que o ICMS-ST é calculado por
dentro.

Ainda de que o ICMS-ST não esteja destacado no documento fiscal, o imposto estadual
deve ser excluído da base de cálculo do PIS e COFINS da Impetrante.

II.II – Da ofensa ao art. 195, I, ”b”, da Constituição Federal.


Documento recebido eletronicamente da origem

De acordo com o texto original da Constituição de 1988, a competência tributária


relacionada ao PIS e COFINS encontrava os limites para o seu exercício no artigo 195, inciso I,
que delimitava a competência da União para instituir as contribuições sobre o faturamento.

13
(e-STJ Fl.16)

Posteriormente, com o advento da Emenda Constitucional 20/98, a hipótese de incidência


dessas contribuições restou ampliada, de modo a alcançar a receita ou o faturamento.

Em nível infraconstitucional, tanto a contribuição para o PIS quanto a COFINS


apresentavam, originalmente, como aspecto quantitativo das suas respectivas regras
tributárias, o faturamento, definido e compreendido, dentro deste contexto constitucional,
como “a receita bruta das vendas de mercadorias e serviços de qualquer nat ureza”.

A definição da base de cálculo das contribuições do PIS e da COFINS foi mantida,


respectivamente, pelas Leis 10.637/02 e 10.833/03, introduzidas após o advento da Emenda
Constitucional 20/98, que preveem que as contribuições são cobradas sobre “o total das
receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação
contábil”.

Mais recentemente, a Lei 12.973/14, fruto da conversão da MP 627/13, determinou


expressamente que fossem incluídos os tributos incidentes em operações de venda no conceito
de receita bruta, exceto, como já referido, quando o contribuinte é mero depositário, caso do
substituto tributário, relativamente ao ICMS-ST.

Conforme se vê, a definição da base de cálculo do PIS e da COFINS sempre esteve


associada ao faturamento, definido como “a receita bruta das vendas de mercadorias e de
mercadorias e serviços de qualquer natureza”, ou ao “total das receitas auferidas pela pessoa
jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil”.

Para isso, importante definir o conteúdo dos conceitos de faturamento e de receita, a


fim de verificar quais os valores podem ser incluídos na base de cálculo da contribuição para o
Documento recebido eletronicamente da origem

PIS e da COFINS.

Há que se ter em conta que a classificação contábil atribuída às rubricas recebidas ou


pagas pelo contribuinte assumem valor secundário na definição da natureza dessas quantias

14
(e-STJ Fl.17)

para fins de incidência do PIS e da COFINS. Isso porque, tais qualificadores contábeis se
encontram sempre subordinados ao âmbito de significação que se faz presente na regra de
competência tributária prevista na Constituição Federal.

Os conceitos jurídicos de receita e faturamento extraídos diretamente da Constituição


Federal que definirão quais fatos estarão abarcados no âmbito de tributação da contribuição
para o PIS e da COFINS, e não o modo pelo qual as ciências contábeis determinam sejam tais
parcelas qualificadas na escrita contábil do contribuinte. É a contabilidade, por conseguinte, que
se coloca em situação de subserviência diante da natureza dos fatos qualificados pelo Texto
Constitucional, e não o inverso.

Sobre a irrelevância da classificação contábil para a compreensão das parcelas que


formam os conceitos de receita e de faturamento, cabe transcrever o ensinamento de Marco
Aurélio Greco4:

A incidência da contribuição deverá alcançar todas aquelas figuras que


correspondam a efetiva receita ou faturamento, qualquer que seja a sua forma de
contabilização. Não o inverso! Primeiro é preciso ter a natureza da receita ou
faturamento; depois a forma de contabilizar é irrelevante. Mas, não é a forma de
contabilizar que irá determinar se algo é, ou não receita ou faturamento. Estes são
conceitos qualificados constitucionalmente e que preexistem à forma contábil
adotada.

Nesse mesmo sentido, é o conceito estabelecido por José Antonio Minatel5:

Evidente que não se pode atribuir aptidão ao registro contábil para qualificar ou
desqualificar determinado evento como receita. Pelo contrário, a Ciência Contábil
utiliza-se da linguagem própria para formalizar registros de fatos com repercussão
econômica, seguindo metodologia própria para classificá-la segundo a natureza
implícita, tendo presente finalidade determinada: apuração de resultado. Vale
dizer, é a contabilidade que se curva à natureza revelada pelos fatos, e não o
contrário, cujo registro deve utilizar linguagem compatível que evidencie aquela
Documento recebido eletronicamente da origem

natureza, tendo em conta seu peculiar objeto, isto é, exteriorizar em linguagem


uniforme e competente o conteúdo da demonstração do resultado da entidade
empresarial.

4
GRECO, Marco Aurélio. Revista Dialética de Direito Tributário nº 50. São Paulo, pag; 131.
5
MINATEL, José Antonio. Conteúdo do Conceito de Receita e Regime Jurídico de sua Tributação. São Paulo, pag. 197.

15
(e-STJ Fl.18)

Tal noção, encontra-se positivada em importante regra de interpretação jurídica que


dimensiona especificamente a base de cálculo do o PIS e da COFINS, identificada no art. 3º,
parágrafo 1º, da Lei 9.718/98, no art. 1º da Lei 10.637/02 e no art. 1º da Lei 10.833/03, que
determinam que as receitas da pessoa jurídica serão submetidas à incidência destas
contribuições “independentemente de sua denominação ou classificação contábil”.

Tem-se, pois, nessas normas tributárias, a positivação de regra de exegese que impõe a
priorização do conceito jurídico de receita e de faturamento sobre a classificação formal
impostas pelas instruções contábeis e aplicadas pelos sujeitos passivos da obrigação tributária
em seus livros comerciais. É, por conseguinte, o conceito jurídico de ‘receita’ e de ‘faturamento’
que merecerá observância para a adequada resolução do presente feito.

O uso e a extensão que se deve dar a estes vocábulos deverá estar de acordo com as
definições que o próprio direito, em outros ramos, lhe dá - não se interpretam isoladamente
textos jurídicos, mas sempre o sistema jurídico -, em consonância com o que dispõe a Carta
Maior, bem como de acordo com as funções com que os mesmos são por ela recebidos. Não se
pode simplesmente presumir que o constituinte utilizou a linguagem normal, desvinculada de
seu sentido, numa Constituição onde este cuidado aparece a todo momento, evidenciando a
prévia ciência dos constituintes sobre deletérios efeitos que a inobservância daquela técnica
poderia acarretar, tendo, aliás, o Código Tributário Nacional disposição expressa neste sentido
(arts. 107, 108 e parágrafo único, 109 e 110 do CTN).

Entendimento contrário, venia concessa, é fazer letra morta a esses princípios


norteadores do Direito Tributário, pois não teria sentido algum a Constituição Federal consagrar
em seu texto dispositivos que tenham por objeto exatamente a proteção dos contribuintes e
das relações jurídico-tributárias e, ao mesmo tempo, deixar tais dispositivos ao sabor do
Documento recebido eletronicamente da origem

legislador ordinário, de sorte a ampliar a base de cálculo de qualquer tributo ou contribuição.

Como o legislador atual elegeu a alternativa ‘receita’ como fonte de incidência


tributária das contribuições (PIS e COFINS) é de se atentar ao seu conceito, posto que, por

16
(e-STJ Fl.19)

disposição constitucional e legal, a incidência de tais contribuições não pode ser sobre quantias
que não correspondam a uma efetiva receita.

Os conceitos de ‘faturamento’ e de ‘receita’ podem ser definidos a partir dos conceitos


técnicos consagrados pela doutrina e pela jurisprudência, e tacitamente incorporados ao texto
da Carta Magna. Essa, aliás, foi a premissa de que partiu o Ministro Marco Aurélio, quando da
prolação de seu voto no RE 240.785/MG, em que consignou que “as expressões utilizadas no
inciso I do artigo 195 em comento hão de ser tomadas no sentido técnico consagrado pela
doutrina e jurisprudencialmente”.

Pois bem, iniciando-se pelo conceito de receita, tem-se que, para que determinada
quantia possa ser qualificada como receita, esta quantia deve — necessária e obrigatoriamente
—, incorporar-se, de forma definitiva, ao patrimônio da pessoa jurídica, como elemento novo,
representando uma alteração do patrimônio líquido. Receita representa um ingresso que
incrementa positivamente o patrimônio da pessoa jurídica que pratica o ato ou negócio jurídico,
com a intenção de permanência, a qual deverá, ao final, influenciar a apuração do eventual
lucro obtido na atividade empresarial. Sendo a receita, necessariamente, uma espécie de
ingresso, de pronto excluem-se dessa conceituação as despesas e os custos, os quais, excluídos
do campo dos ingressos, não podem ser tributados como se receitas fossem. Veja-se que a
Constituição Federal em momento algum autorizou a tributação sobre parcelas referentes a
despesas e custos assumidos na prática empresarial, que reduzem o patrimônio da empresa.
Aliás, tal consideração é uníssona na doutrina de Marco Aurélio Greco6:

O elemento ‘ingresso’ acentua o caráter positivo da figura, o que implica afirmar


que não estão abrangidas pelos conceitos utilizados pela norma de competência
do art. 195, I, ‘b’, as figuras que não se refiram a uma eventualidade que se
acrescente aos elementos positivos do patrimônio da empresa. Ou seja, não está
abrangido pela competência constitucional o conjunto formado por aquelas
Documento recebido eletronicamente da origem

figuras que digam respeito a ‘despesas’ da pessoa jurídica.

6
GRECO, Marco Aurélio. Revista Dialética de Direito Tributário nº 50. São Paulo, pag; 130.

17
(e-STJ Fl.20)

O mesmo raciocínio tem Gisele Lemke7: “Receita é elemento positivo de acréscimo


patrimonial. Para seu cálculo não se levam em conta as despesas”.

Logo, não são todos os ingressos no caixa da empresa que podem ser qualificados
como receitas, como bem ilustra Sólon Sehn8 no seguinte excerto:

Nem todo ingresso constitui receita. Esta pressupõe a ocorrência de um ato ou


fato jurídico de alteração do patrimônio líquido ou uma entrada que se incorpora
ao patrimônio daquele que a aufere, como elemento novo, ao passo que o
ingresso reflete apenas um fluxo neutro de recursos financeiros.

Desta forma, os ingressos abrangem, além das receitas, também aquelas quantias que
correspondem a meros fluxos financeiros que transitam temporariamente pela contabilidade da
pessoa jurídica, mas que, em verdade, são da titularidade de terceiros. Os ingressos
representam, pois, gênero mais amplo que abrange todos os valores que contabilmente
transitam pela empresa, alcançando tanto as receitas propriamente ditas quanto as somas que
apenas representam movimentação financeira temporária, que incrementam o patrimônio de
terceiro. Tem-se, então, os seguintes traços essenciais que deverão estar sempre presentes na
identificação de uma determinada quantia, para que ela possa ser considerada como receita: a)
positividade patrimonial; b) titularidade e disponibilidade; c) definitividade; e d) potencialidade
de lucro.

Como a ‘receita’ é um ingresso novo que incrementa positivamente o patrimônio da


empresa, para seja qualificado como ‘receita’, o valor registrado na contabilidade da pessoa
jurídica deve contribuir para um aumento no patrimônio da pessoa jurídica. Como bem ensina
Gisele Lemke, “não se podem considerar como receitas valores que integram o caixa da
empresa, mas que em momento algum poderão contribuir para o acréscimo patrimonial.” 9
Documento recebido eletronicamente da origem

7
LEMKE, Gisele. Imposto de Renda – os conceitos de renda e de disponibilidade econômica e jurídica. São Paulo; pag. 60 e seguintes.
8
SEHN, Sólon. Revista Dialética de Direito Tributário nº 127; pag. 98.
9
LEMKE, Gisele.

18
(e-STJ Fl.21)

Por tal razão, não se pode qualificar como receitas as quantias recebidas pela pessoa
jurídica que juridicamente pertencem a terceiros e que, por obrigação contratual ou por dever
legal, deverão ser repassadas aos seus efetivos titulares.

Com isso, entende-se que a receita representa ingresso que incrementa, em definitivo,
o patrimônio da pessoa jurídica, com a intenção de permanência, sem qualquer obrigação de
repasse futuro. Ou seja, para que se tenha receita, o valor deve ingressar no patrimônio da
pessoa jurídica com intenção de definitividade.

Nesse sentido, José Antonio Minatel10 expõe a importância da definitividade para que
determinada entrada seja qualificada como ‘receita’, bem como a sua necessária relação com os
critérios da titularidade e disponibilidade:

Nem todo ingresso tem natureza de receita, sendo imprescindível para qualificá-lo
o caráter de definitividade da quantia ingressada, o que não acontece com valores
só transitados pelo patrimônio da pessoa jurídica, pois são por ela recebidos sob
condição, ou seja, sob regime jurídico, o qual, ainda que lhe dê momentânea
disponibilidade, não lhe outorga definitiva titularidade, pelo fato de os recursos
adentrarem o patrimônio carregando simultânea obrigação de igual grandeza. O
mesmo acontece com os valores recebidos na qualidade de mandatário, por conta
e ordem de terceiros, ou recebidos a título de empréstimo, de depósito, de
caução. Há momentânea disponibilidade, é inegável, mas não com o definitivo
animus rem sibi de titular, de dono, de proprietário, e sim com animus de devedor,
de responsável, de obrigado. [...] A definitividade do ingresso, aqui registrada
como imprescindível para identificar a existência de receita, não se refere ao
tempo de permanência no patrimônio da pessoa jurídica. Tem a ver com a
titularidade e disponibilidade dos valores ingressados [...].

Outrossim, ‘receita’ é o incremento patrimonial que manifesta potencial de


lucratividade, na medida em que possui aptidão de contribuir para a formação da eventual
renda da pessoa jurídica, depois de excluídos os custos e as despesas da atividade empresarial,
somente poderão receber a qualificação de ‘receita’ aquelas parcelas que possuem aptidão para
Documento recebido eletronicamente da origem

contribuir na apuração do lucro na atividade empresarial.

10
MINATEL, José Antonio. Conteúdo do Conceito de Receita e Regime Jurídico de sua Tributação. São Paulo.

19
(e-STJ Fl.22)

O raciocínio extraído do julgamento do RE 574.706/PR, Relatora Ministra Cármen Lúcia,


é no sentido de que a presença simultânea desses quatro elementos (positividade patrimonial;
titularidade e disponibilidade; definitividade; e potencialidade de lucro) essenciais que formam
o conceito técnico de ‘receita’, não pode se discrepar do significado mínimo previsto pela
Constituição ao prever tal base econômica como passível de tributação por meio da
contribuição ao PIS e da COFINS.

Pelo que se conclui que o ICMS-ST não se enquadra nos moldes de receita ou
faturamento, configurando-se como mero ingresso na contabilidade da Impetrante do valor já
repassado antecipadamente ao Estado, não podendo ser incluído na base de cálculo do PIS e da
COFINS.

Além do mais, por força do comando contido no art. 110 do CTN11, não se admite que
as bases econômicas enunciadas nas normas de competência tributária sejam alargadas pelo
legislador infraconstitucional, mediante manipulação dos institutos, conceitos e formas
empregados pelo constituinte ao redigir o texto da Constituição Federal.

O objetivo dessa norma geral de Direito Tributário é garantir segurança jurídica ao


contribuinte contra a livre manipulação conceitual, que possa ser realizada pelo legislador
tributário, com o intuito de, artificialmente, incluir, em um âmbito de significação, fatos que não
manifestam com ele qualquer compatibilidade semântica, impondo, com isso, tributação que
não condiz com os limites traçados na norma constitucional que define os campos de incidência
tributária. Relativamente a esse ponto, cabe relembrar o alerta promovido pelo Min. Marco
Aurélio, no voto proferido por ocasião do julgamento do RE 150.764:

É certo que podemos interpretar a lei, de modo a arredar a inconstitucionalidade.


Mas interpretar interpretando e, não, mudando-lhe o texto e, menos ainda
Documento recebido eletronicamente da origem

criando um imposto novo que a lei não criou. Como sustentei muitas vezes, ainda
no Rio, se a lei pudesse chamar de compra e venda o que não é compra e venda,

11
Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados,
expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos
Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.

20
(e-STJ Fl.23)

de importação o que não é importação, de exportação o que não é exportação, de


renda o que não é renda ruiria todo o sistema tributário inscrito na Constituição.

No caso concreto, a tentativa de incluir, na base de cálculo da contribuição ao PIS


e da COFINS, o valor do ICMS-ST incidente nas operações realizadas pela Impetrante, representa
clara deturpação dos conceitos técnicos utilizados pela Constituição Federal para definir a
competência da União à instituição da contribuição para o PIS (CF, art. 239) e da COFINS (CF, art.
195, inc. I, “a”), em frontal agressão ao disposto no art. 110 do CTN. Essa foi a conclusão
alcançada pelo Ministro Marco Aurélio, em seu voto, no RE 240.785-2/MG:

Há de se atentar para o princípio da razoabilidade, pressupondo-se que o texto


constitucional mostre-se fiel, no emprego de institutos, de expressões e de
vocábulos, ao sentido próprio que eles possuem, tendo em vista o que assentado
pela doutrina e pela jurisprudência. Por isso mesmo, o artigo 110 do Código
Tributário Nacional conta com a regra que, para mim, surge simplesmente
pedagógica, com sentido didático.

A partir do que concluiu o STF no RE 574.706, diversos Tribunais Regionais do país têm
reconhecido que o ICMS-ST, por não se enquadrar como faturamento/receita, também não
pode compor a base de cálculo do PIS e da COFINS do contribuinte substituído – caso da
Impetrante:

Ementa: TRIBUTÁRIO. EXCLUSÃO DO ICMS E DO ICMS-SUBSTITUIÇÃO (ICMS-ST)


DA BASE DE CÁLCULO DAS CONTRIBUIÇÕES AO PIS E DA COFINS. CABIMENTO.
1. O art. 195 da Constituição Cidadã, na sua redação original, outorgava
competência à União para instituir contribuição dos empregadores sobre o
"faturamento". Atualmente, com a redação da EC n. 20/98, o inciso I, alínea b,
possibilita a instituição de contribuição dos empregadores, empresas ou
equiparados sobre "a receita ou faturamento". Desde, então, o constituinte tornou
viável instituir as contribuições ao PIS e a COFINS sobre a receita ou faturamento,
ampliando, assim, a base econômica das exações em questão.
2. Como bem leciona Leandro Paulsen (in Curso de Direito Tributário, 8ª edição, p.
438), "(...) embora o conceito de receita seja mais largo que o de faturamento,
nem todo ingresso ou lançamento contábil a crédito constitui receita tributável. A
Documento recebido eletronicamente da origem

análise da amplitude da base econômica ‘receita’ precisa ser analisada sob a


perspectiva da capacidade contributiva".
3. Em que pese a inexistência de comando normativo legal que exclua o ICMS da
base econômica das contribuições ao PIS e da COFINS, a vedação se extrai da
previsão do art. 195, I, "b", da Lei das Leis de nosso ordenamento, que definiu
como base de cálculo das aludidas contribuições a receita ou faturamento, sendo

21
(e-STJ Fl.24)

esse o alcance exato que pode ser conferido à legislação tributária de regência
(Leis n. 9.718/98, n. 10.637/2002 e 10.833/2003 e 12.973/2014), à luz do art. 110
do CTN. A legislação tributária, diga-se, não pode alterar a definição, o conteúdo e
o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa
ou implicitamente, pela Constituição Federal.
4. O ICMS, não se incorpora ao patrimônio do contribuinte como receita e, dessa
forma, não pode integrar a base de cálculo dessas contribuições (PIS e COFINS),
que são destinadas ao financiamento da seguridade social, conforme o
entendimento firmado pelo STF quando da apreciação do RE n. 574706, no regime
de repercussão geral.
5. O ICMS--ST é tributo recuperável, uma vez que vai ser embutido
(contabilizado) no preço praticado pelo contribuinte substituído quando da
revenda do produto ao consumidor final. Assim é que, analisada a operação de
venda ao consumidor final, fica evidente a necessidade de se dar ao ICMS--ST o
mesmo tratamento conferido ao ICMS destacado na nota fiscal fora do regime
de substituição tributária, uma vez que, num caso como no outro, o valor
relativo ao ICMS (ou ICMS--ST) constitui ônus fiscal que não integra o patrimônio
do contribuinte substituído. Não se trata, pois, de receita ou faturamento do
contribuinte (substituído), ainda que tenha sido embutido no preço da
mercadoria.
6. A mesma inteligência do raciocínio aplicado pelo STF quando do julgamento
do RE 574.706, para fins de exclusão do ICMS da base de cálculo das
contribuições ao PIS e da COFINS, aplica-se, sem dúvida, ao ICMS-Substituição
(ICMS-ST).
7. Apelo interposto por MARBRASA MÁRMORES E GRANITOS DO BRASIL LTDA
provido para 1 assegurar ao contribuinte o direito à exclusão do ICMS e do ICMS-
ST da base de cálculo das contribuições ao PIS e da COFINS, bem como a
compensar o respectivo indébito tributário.
(TRF2, 3ª Turma Especializada, Apelação 2015.50.01.126064-5, Rel. THEOPHILO
ANTONIO MIGUEL FILHO, julgada em 26/10/2018, publicada no DJ em
30/10/2018).

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HIPÓTESES DO ARTIGO 1.022 DO CPC/2015.


OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO. REDISCUSSÃO
DO MÉRITO DO ACÓRDÃO EMBARGADO. INADEQUAÇÃO. RECURSO
PROTELATÓRIO. MULTA. EXCLUSÃO DA PARCELA REFERENTE AO ICMS-ST DA BASE
DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. COMPENSAÇÃO DO INDÉBITO AUTORIZADA,
NOS TERMOS DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 74 DA LEI N. 9.430/1996, 170-A DO
CTN, E 26, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N. 11.457/2007, ACRESCIDO O PRINCIPAL
DA TAXA SELIC. EMBARGOS DA UNIÃO FEDERAL REJEITADOS, COM APLICAÇÃO DE
MULTA. EMBARGOS DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE ACOLHIDOS.
[...]
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3. No tocante aos embargos de declaração da parte contribuinte, assiste-lhe


parcial razão, uma vez que o acórdão embargado omitiu-se em relação ao pedido
de exclusão do ICMS-ST da base de cálculo do PIS e da COFINS, quanto ao prazo
prescricional quinquenal para recuperação dos valores indevidamente recolhidos,
e no tocante à utilização da taxa SELIC para a atualização dos valores devidos.

22
(e-STJ Fl.25)

4. Embora o Supremo Tribunal Federal não tenha enfrentado a controvérsia


atinente ao regime tributário adotado para a arrecadação do ICMS por ocasião
do julgamento do RE nº 574.706, tal questão não pode servir de óbice à
aplicação do referido precedente quanto à exclusão do ICMS recolhido
antecipadamente pelo substituto tributário em nome do contribuinte
substituído, notadamente se considerada a circunstância de que tais
antecipações do ICMS serão computadas no custo dos bens adquiridos pelo
substituído e, por conseguinte, integrarão a sua receita bruta na etapa
subsequente.
5. Na espécie, cabe a reforma da sentença, para reconhecer a inexigibilidade da
tributação, e autorizar a compensação do indébito, que deve observar o regime da
lei vigente ao tempo da propositura da ação, aplicando-se a prescrição quinquenal,
nos termos da LC 118/2005, tendo em vista que a ação foi ajuizada em 10/09/2015
(fl. 02), e, quanto aos tributos compensáveis, o disposto nos artigos 74 da Lei
9.430/1996, 170-A do CTN, e 26, parágrafo único, da Lei 11.457/2007, acrescido o
principal da taxa SELIC, exclusivamente. [...]
(TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2274107 - 0006306-
78.2015.4.03.6130, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CECÍLIA MARCONDES,
julgado em 18/12/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/01/2019 ).

No julgamento da Apelação 2015.50.01.126064-5, o TRF2 concluiu: “Assim é que,


analisada a operação de venda ao consumidor final, fica evidente a necessidade de se dar ao
ICMS--ST o mesmo tratamento conferido ao ICMS destacado na nota fiscal fora do regime de
substituição tributária, uma vez que, num caso como no outro, o valor relativo ao ICMS (ou
ICMS--ST) constitui ônus fiscal que não integra o patrimônio do contribuinte substituído. Não
se trata, pois, de receita ou faturamento do contribuinte (substituído), ainda que tenha sido
embutido no preço da mercadoria”.

No TRF4, ainda que a matéria não esteja totalmente pacificada, para o Desembargador
Federal Sebastião Ogê Muniz, o ICMS-ST também deve ser excluído da base de cálculo do PIS e
COFINS do contribuinte substituído, “pois ele deve ter o mesmo tratamento fiscal assegurado
aos contribuintes que recolhem o ICMS fora do regime de substituição tributária”:

Para o contribuinte substituído, a compra de mercadorias com a substituição


tributária do ICMS, a cargo do fornecedor, não constitui fato gerador do PIS e da
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COFINS.
Indaga-se, então, acerca da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e das
COFINS, nas vendas de produtos sujeitos ao regime de substituição tributária,
realizadas pelo contribuinte substituído.
A solução da controvérsia depende do entendimento acerca da natureza do
regime de substituição tributária.

23
(e-STJ Fl.26)

É ele final, ou seja, dali em diante nada se apura, ou ele permite a apuração de
eventual excesso do valor pago pelo substituído ao substituto (para repasse à
Fazenda), nas vendas por ele promovidas.
[...]
Se assim é, o valor do ICMS incluído no preço das mercadorias pelo contribuinte
substituído também deve ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS, nos
moldes definidos pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº
574.706.
Assim, sendo relevante a fundamentação do impetrante, ora agravante, e
concorrendo o risco de dano irreparável ou de difícil reparação, pois ele deve ter o
mesmo tratamento fiscal assegurado aos contribuintes que recolhem o ICMS fora
do regime de substituição tributária - assiste-lhe o direito à medida liminar que lhe
foi negada pela decisão agravada.
(TRF4 5021496-21.2018.4.04.0000, SEGUNDA TURMA, Relator para Acórdão
ANDREI PITTEN VELLOSO, juntado aos autos em 17/09/2018).

Esse também foi o entendimento exarado pelo Desembargador Federal Amaury Chaves
de Athayde, da Primeira Turma do TRF4, ao conceder tutela provisória de evidência para
reconhecer o direito do contribuinte de excluir o valor do ICMS-ST da base de cálculo do PIS e da
COFINS, nos termos da decisão, conforme trecho abaixo colacionado:

Impende, pois, seja analisada a possibilidade de concessão de tutela provisória sob


o espeque da evidência. A tutela de evidência é a tutela provisória concedida sem
a exigência da comprovação de dano grave ou de difícil reparação, ou seja, apenas
pelo fato de estar evidente o direito postulado, o que significa dizer que a defesa
da parte contrária será, de todo modo, inconsistente. Nessa senda, impõe-se
considerar que o pedido de tutela de evidência ora formulado encontra arrimo no
art. 311, inciso II, do CPC, (...) Com efeito, ao menos a primo ictu oculi, creio que
estão configurados os requisitos apregoados pelo dispositivo supracitado,
porquanto, além de haver comprovação nos autos da imposição tributária ora
vergastada, não há olvidar a existência de precedente obrigatório do Supremo
Tribunal Federal, à luz do art. 1.036 do CPC, reconhecendo que "o ICMS não
compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS" (RE 574.706).
Ainda que, até o presente momento, não tenha havido a publicação do acórdão
paradigma, faz-se forçoso atentar que, ex vi do parágrafo 11 do art. 1.035 do CPC,
a súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, que será publicada
no diário oficial e valerá como acórdão. Dessarte, considerando que a ata do
julgamento já foi publicada (Ata n.° 6, de 09/03/2017. DJE n.° 52, divulgado em
16/03/2017), não vejo empeço à aplicação do julgado desde logo. Consigno que,
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conquanto se possa cogitar de futura modulação temporal dos efeitos da decisão


proferida pelo Supremo Tribunal Federal, tal circunstância apenas poderia ser
considerada como óbice, a princípio, ao imediato reconhecimento da suspensão
da exigibilidade de competências passadas. Situação essa, ressalto, diversa da
hipótese em testilha, já que a impetrante visa justamente a que lhe seja
assegurado o seu direito líquido e certo de não ser compelida a incluir o valor do

24
(e-STJ Fl.27)

ICMS incidente nas vendas de mercadorias na base de cálculo das contribuições


PIS e COFINS, devidas nos períodos vincendos. Dessarte, considerando que não se
trata de singular entendimento jurisprudencial, mas, sim, de movimentação do
Judiciário no sentido da uniformização da jurisprudência, mediante requisitos
legais e determinado procedimento, ensejando precedente obrigatório aos demais
Tribunais, ex vi dos arts. 926 e 927 do CPC, impende seja concedida, desde já, a
tutela de evidência. Por fim e não menos importante, faço menção a recente
julgado desta Turma aplicando o entendimento firmado no RE 574.706:
"TRIBUTÁRIO. COFINS. CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS. INCLUSÃO DO ICMS NA BASE
DE CÁLCULO. INCONSTITUCIONALIDADE. COMPENSAÇÃO. 1. O Plenário do STF, no
julgamento do Recurso Extraordinário 574706, com repercussão geral
reconhecida, entendeu que o valor arrecadado a título de ICMS não se incorpora
ao patrimônio do contribuinte e, dessa forma, não pode integrar a base de cálculo
dessas contribuições, que são destinadas ao financiamento da seguridade social.
(...). 3. O disposto no art. 74 da Lei no 9.430/96 não se aplica às contribuições
sociais previstas nas alíneas "a", "b" e "c" do parágrafo único do art. 11 da Lei no
8.212/91, e às contribuições instituídas a título de substituição, conforme
preceitua o art. 26, parágrafo único, da Lei nº 11.457/2007. (TRF4, AC/REO nº
5015679-97.2015.404.7107, 1ª Turma, rel. Des. Federal Jorge Antonio Maurique,
unânime, j. aos autos em 06/04/2017) Isso posto, defiro a tutela provisória de
evidência, para reconhecer o direito da impetrante de excluir o valor do ICMS-ST
da base de cálculo do PIS e da COFINS, atinentes a períodos vincendos. Abra-se
vista à agravada para contrarrazões. Comunique-se o Juízo a quo. Intimem-se.
(TRF4, AG 5019314-96.2017.4.04.0000, PRIMEIRA TURMA, Relator AMAURY
CHAVES DE ATHAYDE, juntado aos autos em 01/05/2017).

De nada são válidos os argumentos de que a Impetrante não teria direito de excluir os
valores correspondentes ao ICMS-ST da base de cálculo do PIS e da COFINS, porque “o
substituído não recolhe o imposto ao Fisco”. Isso porque, o ICMS-ST compõe diretamente o
custo da mercadoria adquirida para revenda, sendo o ônus tributário repassado para a
Impetrante, contribuinte substituída.

Tanto é, que em determinados ocasiões, quando adquire mercadoria em operação


interestadual em que não há Protocolo de ICMS entre o estado emitente e o destinatário, a
responsabilidade pelo recolhimento do ICMS-ST passa a ser da própria Impetrante (art. 9º, II,
do Livro III, do RICMS/RS), que em sua apuração, deve informar o valor como débito de
Documento recebido eletronicamente da origem

imposto a ser recolhido em favor do Estado.

O valor do ICMS-ST fica, invariavelmente, integrado à receita bruta do contribuinte


substituído, que serve como base de cálculo do PIS e da COFINS, sendo que apenas o

25
(e-STJ Fl.28)

contribuinte substituto, por determinação legal, está autorizado de excluir tais valores da base
de cálculo dessas contribuições.

A diferença na forma de recolhimento do ICMS em nada pode alterar o raciocínio


adotado pelo STF no julgamento do RE 574.706, em sede de Repercussão Geral.

Dessa forma, conclui-se que a inclusão do ICMS-ST, incidente nas operações praticadas
pela Impetrante, na base de cálculo do PIS e da COFINS, acaba por deturpar os conceitos
jurídicos de receita e faturamento contidos na Constituição Federal que define a competência
tributária para instituir as citadas contribuições, em clara violação ao art. 110 do Código
Tributário Nacional.

II.III – Da ofensa aos Princípios Constitucionais (Capacidade Contributiva e Isonomia).

Além disso, cabe lembrar que, da mesma forma, o princípio da capacidade contributiva
obsta a submissão dos valores relativos ao ICMS-ST, pago pela Impetrante, na base de cálculo
do PIS e da COFINS. Com efeito, a competência para a instituição de tributos, conferida pela
Constituição aos entes federados, não é absoluta, encontrando limites jurídicos que devem ser
obrigatoriamente respeitados pela legislação infraconstitucional. Entre os limites invioláveis da
competência tributária está o princípio da capacidade contributiva, expresso no parágrafo 1º do
art. 145 da CF, que determina:

Artigo 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão


instituir os seguintes tributos: [...]
§ 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados
segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração
tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar,
respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os
rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
Documento recebido eletronicamente da origem

De acordo com esse preceito constitucional, a norma tributária que pretender fazer
incidir imposto sobre fato que não revele capacidade contributiva, estará extrapolando os

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(e-STJ Fl.29)

limites postos pela Constituição à competência tributária dos entes federados e atraindo para si
a pecha de inconstitucional.

Nesse sentido, cita-se o ensinamento de Sacha Calmon Navarro Coêlho12:

Em primeiro lugar, o princípio da capacidade contributiva, quando apresenta-se


constitucionalizado, tem por destinatário o órgão legislativo, fautor da lei fiscal. É,
assim, materialmente, norma sobre como fazer lei. Sendo assim, se a lei ofender o
princípio da capacidade contributiva, genericamente, dá-se uma hipótese de
inconstitucionalidade material, por isso que inexiste o fundamento material de
validez da lei. Neste caso, o Judiciário pode declarar a inconstitucionalidade da lei,
tanto nos encerros de uma ação direta de inconstitucionalidade (controle
concentrado), quanto no bojo de uma ação comum, incidenter tantum (controle
difuso).

Portanto, o princípio da capacidade contributiva impõe, por razões de isonomia e de


justiça fiscal, que a tributação seja graduada de acordo com o grau de riqueza que é
manifestada pelo particular quando da prática de determinado ato ou fato. Destarte, quanto
maior a riqueza extraída do fato praticado pelo particular, maior deverá ser a graduação da
imposição tributária; por outro lado, sendo menor a projeção de riqueza, menor deverá ser a
carga tributária que sobre ele recairá.

Sendo assim, diante do princípio da capacidade contributiva, naquelas situações em


que não é possível se extrair, de determinado fato típico, qualquer manifestação de potencial
riqueza, mostrar-se-á ilegítima toda e qualquer tentativa de se fazer incidir tributo sobre tal
complexo fático. Isso porque, nesses casos, a prática de tal fato simplesmente não apresenta
qualquer indício econômico positivo apto a demonstrar a possibilidade de o particular pagar
tributos. A tentativa de fazer incidir tributos sobre fatos que não são presuntivos de riqueza
representa sempre afronta ao princípio da capacidade contributiva.
Documento recebido eletronicamente da origem

Fixados tais pressupostos, percebe-se com clareza que o ICMS-ST incidente nas
operações realizadas pela Impetrante não constitui manifestação de riqueza, na medida em

12
NAVARRO COÊLHO, Sacha Calmon. Comentários à Constituição de 1988: sistema tributário; pag. 51.

27
(e-STJ Fl.30)

que, conforme já amplamente demonstrado, representa mero ingresso, em verdade, de


titularidade das entidades tributantes, únicas que experimentarão, de fato, algum acréscimo de
riqueza e que, portanto, poderiam manifestar capacidade econômica. Exatamente por isso, a
pretensão de incluir o ICMS-ST incidente nas operações praticadas pela Impetrante esbarra no
princípio da capacidade contributiva. Essa é a postura exegética adotada pelo Ministro Marco
Aurélio, quando da prolação de seu voto no RE 240.785/MG:

Difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda
que mediata, para o contribuinte, o que se dirá quanto a um ônus, como é o ônus
fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente a este último não tem a natureza
de faturamento. Não pode, então, servir à incidência da Cofins, pois não revela
medida de riqueza apanhada pela expressão contida no preceito da alínea ‘b’ do
inciso I do artigo 195 da Constituição Federal.

Por fim, deixar de reconhecer a exclusão do ICMS-ST da base de cálculo do PIS e da


COFINS também viola o princípio da isonomia, assegurado no art. 150, II, da Constituição
Federal, que diz respeito à garantia de tratamento uniforme, por parte do ente tributante, a
todos os contribuintes que se apresentem em condições iguais:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias ao contribuinte, é vedado à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...]
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação
equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou
função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos
rendimentos, títulos ou direitos.

O fato de determinada mercadoria estar sujeita a regime de recolhimento de ICMS


diverso, no caso a substituição tributária, não pode retirar do contribuinte o direito de excluir da
base de cálculo do PIS e COFINS, o valor referente ao imposto que não corresponde a
faturamento/receita.
Documento recebido eletronicamente da origem

Em decorrência da diferença nos regimes de recolhimento do ICMS, haverá


contribuintes que poderão excluir o ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, enquanto que
outros estarão impedidos, em virtude de que o ente federado (Estado) em que se encontra ter
optado por modificar o regime de recolhimento do imposto estadual, o que resulta,

28
(e-STJ Fl.31)

consequentemente, em alteração da base de cálculo da COFINS e do PIS e sua não uniformidade


no território nacional.

Nesse sentido é importante destacar o Estado de Santa Catarina, que desde o final do
ano de 2017, vem revogando do regime da substituição tributária em seu RICMS, a maioria das
mercadorias antes sujeitas a esse sistema. Nessa situação, além dos contribuintes poderem se
creditar, seja do ICMS, seja do PIS e COFINS na entrada da mercadoria, estarão albergados pelo
RE 574.706, eis que, poderão destacar o ICMS na revenda das mercadorias, e, por conseguinte,
excluir o ICMS da base de cálculo do PIS e COFINS.

Tal situação, certamente gerará uma nova guerra fiscal entre os entes federados, em
que aos contribuintes substituídos localizados no RS, caso da Impetrante, não será permitida a
exclusão do ICMS-ST da base de cálculo do PIS e COFINS, havendo, portanto, tratamento
diferenciado na revenda das mesmas mercadorias.

Exemplo prático dessa situação é o fato de o contribuinte ter um estabelecimento


localizado no RS e outro em SC: No Estado do RS, por determinada mercadoria estar sujeita ao
regime do ICMS-ST, em que o imposto não é destacado na nota fiscal de revenda, não poderá
excluir o ICMS-ST recolhido antecipadamente da base de cálculo do PIS e COFINS, enquanto que
em SC, onde a mercadoria não está sujeita à substituição tributária, o imposto é destacado no
documento fiscal da revenda e será permitido excluir o ICMS da base de cálculo das
contribuições.

Tem-se, desse modo, que a inclusão do valor do ICMS-ST na base de cálculo da COFINS
e do PIS dos contribuintes substituídos influenciará a quantificação dessas contribuições,
tornando-as mais ou menos onerosa, conforme o tratamento dado por cada Estado ao
Documento recebido eletronicamente da origem

contribuinte daquele imposto, e assim acabando por tratar contribuintes e não contribuintes do
ICMS, no que tange à quantificação da COFINS e do PIS, de forma diferente, apesar de estarem,
quanto às contribuições, em situação equivalente, o que fere o princípio da isonomia tributária.

29
(e-STJ Fl.32)

Portanto, o tratamento diferenciado aos contribuintes que revendem mercadorias


sujeitas ao ICMS-ST contraria o princípio constitucional da isonomia, pois dá tratamento
desigual, em virtude das múltiplas variantes do ICMS, a contribuintes que se encontram em
mesma situação perante a Seguridade Social e suas fontes específicas de custeio.

III – DOS PEDIDOS.

Ex positis, Excelência, a Impetrante requer:

a) seja notificada a Autoridade Coatora, o Ilmo. Sr. Delegado da Receita Federal do


Brasil para as informações de praxe;

b) seja dada ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica


interessada (art. 7°, II, da Lei 12.016/09);

c) ao final, seja concedida a segurança, para o fim de:

c.1) declarar o direito de a Impetrante excluir de sua receita bruta para a apuração da
base de cálculo do PIS e da COFINS, o valor ICMS-ST pago antecipadamente por ocasião
da aquisição de mercadorias submetidas ao regime de substituição tributário.

c.2) declarar o direito de a Impetrante compensar (Súmula 213 do STJ) os valores


recolhidos indevidamente a título de PIS e COFINS – isto é, os valores relativos a
inclusão do ICMS-ST respectivos a aquisição de mercadorias sujeitas ao regime de
substituição tributária na base de cálculo das contribuições –, nos últimos cinco anos,
corrigidos pela Taxa SELIC desde a data de cada recolhimento;
Documento recebido eletronicamente da origem

c.3) condenar a União ao pagamento das custas processuais.

Valor da Causa: R$ 289.455,02.

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(e-STJ Fl.33)

Santa Cruz do Sul, RS, 19 de junho de 2019.

Guilherme M. Wagner Renan Juliano da Silveira Godoy


OAB/RS 93.517 OAB/RS 68.928

DOCUMENTOS ANEXOS:

Doc. 01 – Procuração;
Doc. 02 – Contrato Social;
Doc. 03 – ICMS ST destacado NF-e Fornecedor e a respectiva NFC-e de Revenda;
Doc. 04 – ICMS ST sem destaque na NF-e Fornecedor e a respectiva NFC-e de Revenda;
Doc. 05 – DARF PIS e COFINS.
Documento recebido eletronicamente da origem

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