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Entrevista – Dr.

Abner Apolinário da Silva

Durante seis anos, Dr. Abner Apolinário da Silva, 85 anos, foi Juiz da Vara da Infância
da Juventude no Cabo de Santo Agostinho e na capital. Hoje, como Juiz Titular da 4ª
Vara da Capital, no Fórum São Tomás de Aquino, diz por que é a favor da redução da
maioridade penal.

Nós vemos na Constituição que aos 14 anos o adolescente não pode trabalhar a não
ser na condição de aprendiz. Por sua vez, o tráfico de drogas termina recrutando-
os nessa faixa etária. Isto não seria um paradoxo?

Partindo da primícia de que eu apanhei muito, levei muito cacete do meu pai e hoje eu
sou um homem de bem, e que eu tenho duas filhas que nunca apanharam e hoje são
mulheres de bem. Quer dizer, essas afirmações servem para maquiar e mascarar uma
verdade maior. Não é pelo fato de que o estado não reconhece o menor como
trabalhador e o bandido está recrutando que isso se justifica. Pois na verdade, com 11,
12 e 13 anos, o menino precisa estar brincando, estudando e com a cabeça “desgrilada”
pra chegar aonde eu cheguei. Tudo ao seu tempo e eu vou dizer o por quê. A fruta vem,
quando sai no cacho, se você for comer ela vai estar travada, porém, no tempo certo ela
estará madura e doce. É todo um processo e a natureza nos dá essa lição todos os dias.
Eu não nasci bandido e nunca serei. Temperamento a gente herda, é a nossa marca, mas
o caráter é aprendizado. Com o salário mínimo hoje a R$ 880,00, para uma criança de
12, 13 anos é uma fortuna e ele logo pensa “estou rico”. Logo, esse dinheiro é um
engodo e um atraso na vida desse jovem. Estudar dá trabalho e vou exemplificar: Existe
aqueles dias em que os adultos estão exaustos depois de um dia inteiro de atividades,
“os problemas de adultos” e que nada entra na cabeça. Agora, substituindo esse
exemplo por uma criança de 12 anos, com todas as responsabilidades do dia a dia, a
probabilidade de este querer estudar é praticamente nula. Levando em consideração as
condições peculiares da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.

Quais são os trâmites legais pelos quais passam os menores infratores desde que
eles são apreendidos?

Após ser apreendido, primeiramente o promotor de justiça entra com uma


representação. Por exemplo, um homicídio, e o que eu não concordo, o legislador
brasileiro afirma que ele não comete homicídio, ele comete “ato infracional semelhante
a homicídio”. Ele comete ato infracional semelhante a furto, ato infracional semelhante
a latrocínio. Continuando, o promotor entra com a representação e ele será processado
junto ao Juiz da Vara da Infância e da Juventude. No final, se o juiz entende que ele
cometeu ato infracional, aplica-se, por exemplo, se for o caso de um homicídio, um
latrocínio, ele poderá ser internado, quando eles são levados à FUNASE. Aplica-se a
medida socioeducativa de internação. No caso da conclusão de 3 (três) anos de
internação e o psicólogo relatar que o menor infrator não está maduro, pode-se dar uma
nova medida, como a semi liberdade ou a medida socioeducativa de liberdade assistida.
O Juiz designa uma pessoa para estar guiando e assistindo ele em um espaço aberto.
Essa situação ocorre quando não há representação e referência de pai ou mãe por parte
do socioeducando. Este profissional está encarregado de repassar todas as informações
ao Juiz.
Nos Estados Unidos da America o adolescente infrator é julgado como adulto. As
leis brasileiras e até mesmo o ECA são lenientes com a criminalidade entre os
menores?

O problema que se chama atenção, e eu concordo em partes com o legislador brasileiro.


Me chamam de franco atirador, porque eu fui da Vara da Infância e Juventude e
concordo com a redução da maioridade penal para 16 anos da seguinte forma: E eu já
me considero um Bin Laden da infância e a juventude porque não se espera que um juiz
tenha um entendimento desse tipo. O erro de quem trabalha nessa área de criança e
adolescente é dizer que o Estatuto é algo divino e eu costumo dizer que não. Tem alguns
defeitos miseráveis que eu não concordo com ele de jeito nenhum.

No caso de jovem que cometeu homicídio um dia antes de completar a maioridade


perante a lei brasileira, ele não é burro, não está em fase de desenvolvimento, era para
ele ser tratado como se trata o verdadeiro bandido. Crimes atrozes, crimes com
superabundância de hediondez, requintes de perversidade e não há nada de tolo, bobo e
imaturo. No meu entender, o legislador diz que eu posso ser um pai de família aos 16
anos de idade, porque não responder ao crime? Agora, há exceções. A solução para não
ficar junto com bandidos, cria-se um novo espaço com uma estrutura profissional
adequada com psicólogos e assistentes sociais para dar auxilio, mas permanece com a
pena de 20 anos.

Um exemplo fácil: Um homem estupra uma criança de três anos de idade. É apreendido,
cumpre a pena de 20 anos e quando ele retorna à sociedade ele cometerá o mesmo crime
novamente. Em comparativo com um leão, passa e come uma criança também de três
anos. Qual a sentença? Jaula no leão! 20 anos depois é aberta a jaula, e quando ele sair e
encontrar outra criança ele vai comer? Vai. Ora, se esse leão não foi tratado? Tira do
meio de circulação e oferece equipe de profissionais para tratá-lo. Eu entendo que a
maioridade penal tem que ser reduzida nesses casos. Já no caso de furto, estelionato são
situações diferentes. Por isso digo, em partes.

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