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COMO LIDAR COM

JOVENS
INFRATORES DE 14
A 16 ANOS
COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 3
1- O MENOR INFRATOR E A SOCIEDADE 5
2- MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS 20
3- ASSISTÊNCIA A JOVENS INFRATORES 24
4- REINTEGRAÇÃO DO INFRATOR À SOCIEDADE 34
5- O ATO INFRACIONAL 37
6- ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE 48
REFERÊNCIAS

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INTRODUÇÃO

Em tempos atuais, onde a palavra de ordem é punir, parece salutar um debate acerca
das questões que envolvem adolescentes infratores. É, pois, nesse intuito que busca –
se o cerne da questão, a fim de tentar elucidar alguns pontos desse assunto.

A questão do Adolescente infrator tem se mostrado bem polêmica, encerrando debates,


por vezes bem acalorados. O Estado nesta celeuma tem dado sua resposta que, para
muitos, ainda não satisfaz os interesses da sociedade. Esta, por sua vez, tem
demonstrado seu desvalor acerca do assunto, exigindo respostas, por parte do Estado,
cada vez mais severas. Cabe ainda destacar o papel da imprensa na construção do
pensamento da sociedade.

O problema da criminalidade juvenil tem se mostrado bem complexo não havendo por
ora soluções convincentes, razão pela qual, deve – se repensar não só as políticas
públicas, como as políticas sociais, e até mesmo, a percepção atual acerca da questão.

A fim de disciplinar a situação dos menores, foi instituído pela lei 8069/90, o ECA - O
Estatuto da Criança e do Adolescente. Prevê o referido diploma que, são crianças, as
pessoas com idade de até 12 anos incompletos e adolescentes, as pessoas de 12 anos
até 18 anos incompletos.

O ato infracional é a conduta praticada pelo adolescente que corresponde, no Código


Penal a Crime ou Contravenção. Logo, não receberá o adolescente uma pena e sim uma
medida sócio – educativa. Dentre as medidas sócio – educativas, está a de internação
em estabelecimento educacional, que não deixa nada a desejar aos estabelecimentos
prisionais para maiores, em que pese o discurso de proteção ao adolescente. Tal medida
é aplicada quando o adolescente comete um ato infracional, considerado de maior
potencial ofensivo.

A situação em que se encontram os adolescentes infratores é similar a do sistema


prisional para maiores de 18 anos. A maioria é composta por homens, da classe baixa,
em péssimas condições de assistência familiar, com pouca ou nenhuma perspectiva de
futuro promissor, foram apreendidos na prática de atos infracionais, correspondentes a

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crimes contra o patrimônio e possuem baixa escolaridade. Vê – se, portanto que há um


estigma do delinqüente. Desta forma, delimitou – se o público – alvo, facilitando a
atuação Estatal nas condutas selecionadas.

Tem sido muito comum, o clamor pela repressão mais severa, por parte do Estado, nas
condutas dos adolescentes infratores. Tal endurecimento parece ser a saída mais
enfatizada pelos adeptos da tolerância zero. Contudo, a realidade tem demonstrado que
tal saída não tem sido a mais adequada, visto que não tem resolvido o problema do
aumento da criminalidade, em especial, a praticada por adolescentes.

Ainda, no que tange as políticas de repressão, tem sido em demasia defendida, a


redução da maioridade penal como uma forma de coibir a criminalidade adolescente.
Convém, contudo, destacar que não haveria grandes mudanças no panorama da
criminalidade, pois como medida de repressão, não estaria atuando no cerne da questão.
Primeiro se reduziria a maioridade para 16 anos, depois para 14 anos e fazendo uma
alusão à Lombroso, com o homem delinqüente, chegaria a um ponto em que estariam
prendendo os bebês dentro da barriga das mães, sob o discurso de proteção social.

A solução de conflitos através do Direito Penal, exclui as outras vias de solução de


conflitos. Não se pode conceber uma solução Penal para um problema que é de ordem
eminentemente social. Não faz sentido atuar pela repressão, pois não se está resolvendo
a causa do problema.

Admitir, contudo, que através de leis cada vez mais rígidas não se consegue combater
a criminalidade, é admitir o fracasso do Estado, sobretudo em suas políticas sociais, as
quais são a razões do problema. Não há políticas de prevenção, somente atuando pela
repressão.

O Estado não conseguiu fazer com que o adolescente se subordinasse à sua autoridade
e agora quer puni-lo pelos próprios erros, ou seja, o Estado não cumpre seu papel,
educando e provendo condições de vida adequada aos jovens, que por sua vez, não se
subordinam a suas regras, sendo punidos pela prática de atos que ofendem a valores
que nunca conheceram.

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1- O MENOR INFRATOR E A SOCIEDADE

Os interesses da criança e do adolescente sempre existiram, mas nem sempre


tiveram dimensão suficiente para fomentar o reconhecimento de que suas relações
pudessem interessar ao Direito, como explica Paulo Afonso Garrido de Paula (2002, p.
11):

Seus interesses confundiam-se com os interesses dos adultos, como se fossem


elementos de uma simbiose onde os benefícios da união estariam contemplados pela
proteção jurídica destinada aos últimos. Figuravam, em regra, como meros objetos da
intervenção do mundo adulto, sendo exemplificativa a utilização de a velha
expressão pátrio poder, indicativa de uma gênese onde o Direito tinha como
preocupação disciplinar exclusivamente as prerrogativas dos pais em relação aos filhos,
suas crias. Não existia a diferenciação de criança e adolescente, sendo inicialmente feita
uma distinção que atualmente conhecemos como sendo de direito civil.

Antes de 1988, o Brasil contava com o Código de Menores, documento legal


para a população menor de 18 anos e que visava especialmente à questão de menores
em “situação irregular”, de vulnerabilidade social. A visão tradicional da época era de que
crianças e adolescentes eram incapazes e consideradas um problema para o Estado e
autoridades judiciárias. O ECA foi criado pouco depois da promulgação da nova Carta
Magna, a Constituição Federal de 1988, também conhecida como “Constituição Cidadã”,
por prever novos direitos fundamentais aos brasileiros.

No art. 2, do Estatuto da criança e do Adolescente faz uma distinção entre


criança e adolescente: “considera-se criança, para os efeitos da Lei, a pessoa até doze
anos de idade incompletos, e adolescente, aquele entre doze e dezoito anos de idade”.
Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente o ECA às pessoas entre
dezoito e vinte e um anos de idade. Associando-se ao disposto no Código Civil, torna-se
adulto, para fins civis, o ser humano que atinge a idade de 18 anos. O Código Penal fixa
em dezoito anos a idade da responsabilidade para fins criminais. O art. 228 da CF diz
que “são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da
legislação especial”, neste caso, o Estatuto da Criança e do Adolescente. Diante disso,
aplica-se o conteúdo da Lei 806990, como regra, à pessoa com até dezessete anos
completos.

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A Constituição Federal de 1988 proporcionou a criação das condições


necessárias para a elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),
afastando-se da doutrina da situação irregular para se vincular à doutrina da proteção
integral, pela qual toda criança ou adolescente é considerado sujeito de direitos e por se
encontrar em fase especial de desenvolvimento, necessita, portanto, da proteção do
Estado, conforme o art. 4º da Lei nº 8.069/90:“ É dever da família, da comunidade, da
sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação
dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
familiar e comunitária”.

Com a publicação do ECA em 1990, surge uma nova doutrina de entendimento


com relação ao adolescente infrator, pois essa legislação considerada uma das mais
modernas do mundo, institui uma série de mecanismos legais de constituição e formação
desse sujeito interligadas entre os vários campos do saber científico, (direito, psicologia,
medicina, biologia, pedagogia, educação) os quais produzem as suas próprias verdades
diante desse adolescente, gerando efeitos em toda a sociedade.

Os princípios fundamentais do ECA afirmam que crianças e adolescentes são


prioridade absoluta, sujeitos de direitos e pessoas em fase especial de desenvolvimento.
A prioridade absoluta engloba a primazia de receber proteção e socorro em todas as
circunstâncias, a precedência do atendimento nos serviços públicos ou de relevância
pública, a preferência na criação e execução das políticas sociais públicas e a destinação
privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas à proteção da infância e da
juventude.

1. MENOR INFRATOR
É na adolescência que o adolescente se encontra numa fase desorientada
pelas diversas transformações sofridas, as quais ocasionarão consequências para o
mesmo. É neste contexto que ele desenvolverá a busca da sua identidade, princípios
éticos, por meio de influências familiares, sociais e econômicas, desenvolvendo sua
relação com o mundo.
Para que haja a apuração do ato infracional, é necessária, a atuação de vários
órgãos do Judiciário, Ministério Público, sendo imprescindível uma total integração entre
estes, com intuito de que os direitos e garantias do adolescente não sejam violados.
O adolescente autor da prática de qualquer “infração penal” (pois legalmente o
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ECA atribui esse termo jurídico para o jovem com menos de 18 anos que comete “crimes”
assim tipificados pelo código penal) é visto como um delinquente, um marginal, ou um
“anormal” conforme Michel Foucault, como àquele que se desvia da norma, que precisa
ser normalizado, controlado, disciplinado por este Biopoder, o qual sujeita os corpos a
um tipo de controle determinado pela norma, pela lei.
E para tanto, segundo Foucault, essa governamentalidade estigmatiza e coloca
estereótipos nesse jovem delinquente, com o discurso do indivíduo marginalizado
socialmente, que mora na favela, não alfabetizado, sem estrutura familiar, pobre, já
diagnosticado pelas ciências do saber humano, como um potencial problema a ser
corrigido.
1.2 O ATO INFRACIONAL
A fundamentação teórica é embasada na Lei n.º 8.069/9 Art. 103. Considera-
se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.
Art. 104. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas
previstas nesta Lei. Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a
idade do adolescente à data do fato.
O ato Infracional pode ser conceituado sobre os aspectos material, formal e
analítico. O aspecto material é o que busca estabelecer a essência do conceito, ou seja,
o porquê de determinado fato ser considerado criminoso e outro não. Portanto, sob esta
ótica o crime pode ser definido como todo fato humano que, propositada ou
descuidadamente, lesa ou expõe a perigo bens jurídicos considerados fundamentais
para a existência da coletividade e da paz social.
Em seu aspecto formal, o conceito de crime resulta de mera adequação da
conduta ao tipo legal, logo, considera-se infração penal tudo aquilo que o legislador
descrever como tal. Vale ressaltar que para considerar a existência de um crime, deve-
se levar em conta a sua essência ou lesividade material, ao contrário estaria constituída
uma afronta ao princípio constitucional da dignidade humana.
O aspecto analítico é aquele que busca estabelecer elementos estruturais do
crime. A finalidade deste enfoque é propiciar a correta e mais justa decisão sobre a
infração penal e seu autor, fazendo com que o julgador ou intérprete desenvolva o seu
raciocínio em etapas. Sob esse ângulo, crime é todo fato típico e ilícito/antijurídico.
Primeiramente deve ser observada a tipicidade da conduta. Conforme Capez, fato típico
é
O fato material que se amolda perfeitamente aos elementos constantes do modelo
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previsto na lei penal” e constitui quatro elementos: conduta dolosa ou culposa; resultado;
nexo causal; tipicidade), caso a conduta seja típica, verifica-se se a mesma é ilícita ou
não. Sendo o fato típico e ilícito, tem-se uma infração penal. Depois há de ser apurado
se o autor foi ou não culpado pela sua prática, isto é, se o autor deve ou não sofrer um
juízo de reprovação pelo crime que cometeu.
2. MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS
As medidas socioeducativas encontram-se no artigo 112 da Lei Federal 8.069, de
treze de julho de 1990, denominada Estatuto da Criança e do Adolescente, e são
aplicáveis aos menores que incidirem na prática de atos infracionais. Tal rol é taxativo,
sendo vedada aplicação de qualquer medida diversa daquelas enunciadas. O legislador
pátrio facultou ainda no inciso VII, do referido artigo, a aplicação, cumulativa ou não, de
qualquer uma das medidas protetivas previstas no artigo 101, inciso I a VI.
2.1 OS DIREITOS E GARANTIAS DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES.
As medidas socioeducativas foram criadas com o objetivo educacional e
sancionatório quanto aos jovens que se envolvem em ato infracional, quando trata dos
cuidados essenciais que devem orientar a aplicação das medidas socioeducativas: em
que são estabelecidas regras próprias para o Poder Público lidar com esses jovens sem
desrespeitar os direitos legalmente garantidos, como à vida, educação, dignidade,
convivência familiar, tutelados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e diretamente
relacionados com a Constituição Federal.
No ECA que se encontra na lei 8069-90 nos fala dos direitos da criança ECA,
junto da analise jurisprudencial, afim de verificar se Estatuto está em acordo com os
preceitos da Constituição Federal ou não. O método de procedimento foi o monográfico
e o de abordagem, o histórico sociológico, utilizando-se, para tanto, da pesquisa
bibliográfica e jurisprudencial.
Uns dos artigos mais importante nessa lei e na vida de uma criança e um
adolescente são os artigos 3 e 4 do ECA onde fala do convívio familiar que é a maior
garantia da criança e do adolescente e aborda um dos direitos fundamentais.

Art. 3º A criança e ao adolescente gozam de todos os direitos


fundamentais inerentes à Parágrafo único. Os direitos enunciados
nesta Lei aplicam-se a todas as crianças e adolescentes, sem
discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça,
etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal de

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desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica, ambiente


social, região e local de moradia ou outra condição que diferencie as
pessoas, as famílias ou a comunidade em que vivem. (incluído pela
Lei nº 13.257, de 2016)

Parágrafo único. Os direitos enunciados nesta Lei aplicam-se a


todas as crianças e adolescentes, sem discriminação de
nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça, etnia ou cor, religião
ou crença, deficiência, condição pessoal de desenvolvimento e
aprendizagem, condição econômica, ambiente social, região e local
de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias
ou a comunidade em que vivem. (incluído pela Lei nº 13.257, de
2016)

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e


do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação
dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação,
ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção


à infância e à juventude. Art. 4º

É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar,


com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;


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c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção


à infância e à juventude.

Essas garantias são invioláveis;

O art. 5º, caput e inciso I, da CF e art. 100, par. único, incisos I e XII,
do ECA. Apesar de dizer aparentemente o óbvio, o presente
dispositivo traz uma importante inovação em relação à sistemática
anterior ao ECA, na medida em que reconhece a criança e o
adolescente como sujeitos de direitos, e não meros “objetos” da
intervenção estatal. Art. 5º, da CF 88, que ao conferir a todos a
igualdade em direitos e deveres individuais e coletivos, logicamente
também os estendeu a crianças e adolescentes.

O verdadeiro princípio que o presente dispositivo encerra, tem reflexos não


apenas no direito material, mas também se aplica na esfera processual, não sendo
admissível, por exemplo, que adolescentes acusados da prática de atos infracionais
deixem de ter fielmente respeitadas todas as garantias processuais asseguradas aos
acusados em geral, seja qual for sua idade (vide comentários aos arts. 106 a 111, do
ECA.

A condição de crianças e adolescentes como sujeitos de direitos


torna ainda obrigatória sua oitiva sempre que em jogo estiver a
necessidade de salvaguarda de seus direitos, seja por parte dos pais
ou responsável, seja por parte do Estado, em especial quando da
aplicação das medidas de proteção relacionadas no art. 101, do ECA
desde que, logicamente, a criança ou adolescente tenha condição
de exprimir sua vontade, tal qual expresso pelo art. 12, da
Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança, de 1989 e art. 100,
par. único, inciso XII, do ECA. 6 Vide Princípios 1º e 2º, da
Declaração dos Direitos da Criança, de 1959 e arts. 1º, 4º, 6º e 15 a
18, do ECA. 665

Sua Lei 12.59410, sancionada em 18 de janeiro de 2012, que dispõe sobre o


Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), regulamenta a execução
das medidas socioeducativas destinadas a adolescente que pratique ato infracional
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A Constituição Federal vigente deixa claro sua importância em seus dispositivos,


ela tem supremacia legal, mas isso não significa que ela será aplicada de forma isolada.
As leis e princípios devem fazer parte da interpretação para que se chegue a uma
solução que não traga violação ao mais importante: os Direitos Humanos. A lei SINASE
dispõe sobre um levantamento de dados que deve ser feito de forma anual sobre
adolescentes em conflito com a lei que busca controlar e fiscalizar o assunto no país,
mesmo com essa previsão o último levantamento que foi divulgado no ano de 2018, é
referente ao ano de 2016 - o que já é uma falta de respeito com a previsão legal e com
a causa - A responsável por essa divulgação foi a Secretaria Nacional do Direito da
Criança e do Adolescente e do Ministério dos Direitos Humanos

Ademais, o SINASE também determina uma atenção do Estado para


com a família e a comunidade, trazendo como orientação
fundamental, a participação delas durante a aplicação das medidas
socioeducativas. Orienta que as atividades sejam programadas para
que proporcione momentos objetivando fortalecer os vínculos na
medida da realidade familiar BRASIL, 2012. Estas atividades
destinadas às famílias, segundo os profissionais entrevistados
durante este estudo, ocorrem, mas não com muita frequência, a
maioria em datas comemorativas, como a páscoa, o natal, o dia das
mães, são momentos gerais. O motivo relatado como principal é a
distância, a dificuldade financeira dos parentes e o surgimento das
facções no ambiente juvenil, o que obrigou a Unidade a ser mais
cautelosa quanto à programação de atividades fora da rotina diária
dos meninos (SOCIOEDUCADOR 1, 2 e 3, 2019).

Desta forma, seguido de outros artigos da Constituição Federal e das leis aqui
citadas resta comprovado que a revogação destes institutos do Estatuto da Criança e do
Adolescente seria uma medida de garantir ainda o princípio da proteção integral a todos
os adolescentes, visto que estes não podem estar à mercê do poder punitivo estatal, do
contrário, devem estar amparados de políticas públicas que possibilitem seu
desenvolvimento em sociedade.
2.3 AS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVA E SEUS EFEITOS PARA RESSOCIALIZAÇÃO
DO ADOLESCENTE.
As medidas socioeducativas são sanções aplicadas aos adolescentes que
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cometem ato infracional e estão previstas no Capítulo IV do Estatuto da Criança e do


Adolescente (ECA). Ou seja, o Estatuto não traz apenas os direitos das crianças e
adolescentes, mas também seus deveres, devendo os adolescentes serem
responsabilizados pelos seus atos.
O adolescente autor de ato infracional é responsabilizado por determinação
judicial a cumprir medidas socioeducativas, que contribuem de maneira pedagógica,
para o acesso aos direitos e para a mudança de valores pessoais e sociais dos
adolescentes. De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, as medidas
socioeducativas podem acontecer em liberdade, em meio aberto ou, com privação de
liberdade, por meio de internação. São medidas socioeducativas:
A família é segundo a Constituição Federal a base da sociedade. O dever de
proteção previsto nos artigos 226 e 227, não é obrigação exclusiva do Estado e da
sociedade, mas, também da família. É na família, que encontramos a vida, o amor, o
afeto, a dedicação, lar, itens estes que são indispensáveis e que comprometem o
desenvolvimento da criança e do adolescente, quando estes não os encontram.
É sabido que falar sobre família é complexo, mas um assunto necessário. Isso
porque, na maioria das vezes, a culpa e responsabilidade são sempre da família. Assim,
é válido salientar que, conforme ocorrem as evoluções na sociedade, como a quebra de
dogmas colocando hoje a mulher em um papel de empoderamento trabalhista e pessoal,
também sofreu alterações o significado de família.
Sendo assim, o jovem infrator encontra no processo de ressocialização,
identificando-se como pode ser dado o apoio necessário às famílias para que estas doem
o devido suporte à boa e completa ressocialização do menor infrator. Portanto, no
decorrer do trabalho, será demonstrada a definição de menor infrator e de ato infracional,
além da compreensão sobre o que é a família, sua importância e influência na
problemática das infrações e, por fim, as medidas socioeducativas disponibilizadas pelo
Estado.
A família constitui grande riqueza social", assim disse o Papa Francisco no
Congresso Latino americano da Pastoral Familiar no Panamá em 06 de agosto de 2014.
Indubitavelmente essa riqueza social que constitui a família não é proveniente só da
"família tradicional", patriarcal, cristã, formada por pai, mãe e filhos e sim por qualquer
dos "tipos" de família conhecidos e defendidos pelo direito.
Ter quem abraçar, incentivar, ouvir e repreender no âmbito da família, sem dúvida
é um grande passo para a formação do caráter de uma criança ou adolescente. Assim,
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onde é parco o exemplo e incentivo da família em relação à educação e sua importância


é regra o aumento da evasão escolar e o descaso em face da figura do educador e até
mesmo de outras autoridades.

Então a família se apresenta como primordial ponto de partida para a


ressocialização tendo em vista que é no âmbito familiar que a criança aprende as
primeiras normas de convivência e desenvolve suas primeiras capacidades de
comunicação. É o no seio familiar que o individuo cresce e desenvolve seus sentimentos,
onde tem os primeiros contatos com as recompensas e até mesmo com as punições. É
também onde cria as primeiras imagens de si mesmo, onde experimenta os primeiros
modelos de comportamento que moldarão seu caráter para o futuro.

Procedimentais aplicados perante a o processo a ser instituído na vara da infância


e juventude na apuração de atos infracionais, bem como ainda quanto a atuação do
conselho tutelar na comarca em auxílio ao juízo.

A escolha do tema se deu em razão do grande número de questões envolvendo


crianças e adolescentes na esfera criminal, onde os jovens estão procurando meios
delituosos, seja por acharem que esse é o caminho mais fácil, seja por qualquer outro
motivo. Tem como contribuição científica utilizada no trabalho doutrina pertinente ao
tema, leis relativas ao menor como Estatuto da Criança e do adolescente, Constituição
Federal, bem como artigos e boletins jurídicos.

Nos tempos remotos, as práticas ilícitas do menor foram alvo de grandes discussões
em meio à sociedade, pois não haviam leis específicas para sua punição, sendo que
estes não poderiam ser punidos sem que tivessem atingido um certo grau de
desenvolvimento. Diante de tais acontecimentos, os menores eram castigados sem uma
punição específica, chegando por vezes a perderem sua própria vida, até que fosse
legalizada tal situação a fim de que se estabelecesse uma penalização compatível com
sua idade e o delito praticado.

A primeira legislação penal específica voltada para os menores, teve sua origem no
Direito Romano, onde nesta legislação fazia-se uma distinção entre menores púberes e
impúberes, sendo que no caso de menores impúberes o juiz deveria aplicar uma sanção
mais branda, em razão de sua idade ser inferior COLPANI, 2003

No ano de 1923, Mello de Mattos foi o criador do juizado de menores, tendo sido
também o primeiro juiz de menores da América Latina. O primeiro documento legal para
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estabelecer regras criminais à população menor de 18 anos, foi promulgado em 1927,


sendo denominado de Código Mello Mattos, o qual visava estabelecer diretrizes claras
no regramento da infância e juventude.

O Decreto n° 17.943 A (Código de Menores), de 12 de outubro de 1927, trazia em


seu bojo o seguinte: “O menor, de um ou outro sexo, abandonado ou delinquente, que
tiver menos de 18 anos de idade, será submetido pela autoridade competente às
medidas de assistência e proteção contidas neste código”.

A primeira norma protetora do menor foi regulamentada pela Constituição Federal


de 1937 em seu artigo 124, sendo estabelecido como princípio jurídico de defesa da
família, o qual colocava a unidade familiar sob a tutela especial do Estado. Já a
Constituição de 1946 permaneceu dando amparo à mesma proteção a família e aos
filhos, mantendo a obrigação do Estado de prestar assistência à maternidade, à infância,
à adolescência e à família de prole numerosa art. 163 a 165 da Constituição Federal de
1946.

Em 01 de Dezembro de 1964, foi criada a Fundação de Bem-Estar do Menor –


FUNABEM conforme a Lei 4.513/64. A Fundação do Bem-Estar do Menor tinha como
objetivo formular e implantar a política nacional do bem-estar do menor. A FUNABEM
propunha-se a ser a grande instituição de assistência à infância, cuja linha de ação se
baseava na internação, tanto dos abandonados e carentes como dos infratores
LORENZI, 2007.

A constituição posterior, ou seja, de 1967, dentre seus artigos manteve a mesma


ideia que a constituição anterior e, posteriormente, com a Emenda Constitucional de
número 1 de 1969 não fez nenhuma alteração substancial quanto à tutela do menor
infrator, apenas determinou que a matéria fosse regulada por legislação especial
MARTINS, 1988, p. 42

O ano de 1979 foi considerado o ano internacional da criança, e foi neste mesmo
ano que foi promulgado a Lei n° 6.697, vindo ela a apenas a reformular o Código de
Menores já existentes, o chamado Código Mello Mattos.

O Código de Menores não exauriu a matéria todo referente aos menores,


omitindo, como por exemplo, na condução de educação moral e seu controle junto às
escolas, cujas atribuições legais estão hoje vinculadas à legislação estadual sobre
ensino, não se contribuindo um corpo de normas de caráter nacional. A atual
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Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 228, traz a condição de


inimputável ao menor infrator, fazendo a previsão que este deverá obedecer a regras a
serem estabelecidas em legislação especial, a qual foi criada no ano de 1990, sendo ela
a atual a regulamentar os atos criminosos praticados por menores.

A legislação atual que estabelece regras relativas aos menores é a chamada ECA
que foi promulgada em 13 de Julho de 1990, consolidando uma grande conquista da
sociedade brasileira na produção de um documento de direitos humanos em respeito
aos direitos da população infanto-juvenil, em seu art. 2, distingue a ‘criança’ (menor de
12 anos do ‘adolescentes’ entre 12 e 18 anos Somente para este ultimo é que prevê
‘garantias processuais’

art. 110. Para a criança, só fala em ‘medida de proteção’ arts. 99 a


102 e 105. STJ – 6 T. – O presente estatuto visa tutelar todos os
direitos relativos aos menores, não se referindo apenas na esfera
penal, mas sim a tudo o que lhe possa se relacionar, observando
sempre na sua aplicação a menoridade do indivíduo.( Brasil, 1990)

Dessa forma, acontece que, independentemente de a medida ser cumprida em


meio aberto ou fechado, para que o objetivo seja atingido e este jovem não volte a
delinquir, o atendimento às famílias é de suma importância, tornando-se na verdade
imprescindível. Como já salientado, problemas no âmbito familiar são um dos principais
fatores que levam um menor a cometer um ato infracional e a intervenção estatal deve
sempre responsabilizar os pais perante seus filhos no que couberem.

A ausência da família na participação das medidas socioeducativas leva a


reincidência, tendo em vista que, quando esses jovens voltam do cumprimento de uma
medida os pais não sabem lidar com eles. O que deve ser entendido é que cabe aos
governantes criar e desenvolver os projetos destinados à proteção do adolescente em
meio aberto, por exemplo prestação de serviços à comunidade e liberdade assistida.

A partir do momento em que forem implantadas novas propostas de medidas de


prestação de serviço à comunidade, essas serão extremamente eficazes e eficientes
dentre as outras medidas previstas no ECA. Isso porque, a tendência é que as famílias
assistidas evitem que seus filhos menores voltem a cometer novo ato infracional.

No estado de Rondônia no ano de 2009 foi lançado o programa ‘Conhecer para


Defender’ desenvolvido pela Seção de Atendimento lançado pelo Juizado da Infância e
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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

Juventude da Comarca de Porto Velho. Este projeto teve como objetivo a divulgação
para a sociedade do funcionamento das medidas socioeducativas previstas no ECA para
a sociedade e promover a reflexão do adolescente que cumpre medida socioeducativa
em meio aberto de forma a incluir a família do socio educando e ele mesmo na
sociedade. O foco principal dessa divulgação foram entidades públicas, igrejas
associações, etc.

2.3 EFICÁCIA DAS MEDIDAS NA RESSOCIALIZAÇÃO DO MENOR INFRATOR.


Atualmente podemos ver que os jovens estão na criminalidade cada dia mais cedo
e que precisam de certa reeducação com a finalidade de retomarem uma vida saudável
e darem continuidade a seu desenvolvimento psicológico e mental.

Quando o jovem entre doze e dezoito anos comete algum delito o termo utilizado
não é pena e sim medida socioeducativa, no qual ele tem diversos tipos de medidas a
serem adotadas, todas de acordo com a gravidade do ato infracional, isto é existe a
advertência, a obrigação de reparar o dano quando o jovem agride algum tipo de
patrimônio), prestação a serviço da comunidade medida alternativa à internação, onde o
jovem presta serviços gratuitamente à sociedade, a liberdade assistida o jovem é
supervisionado por uma autoridade, a semiliberdade reintegra o jovem à sociedade de
forma gradual, no qual ele trabalha e estuda durante o dia e à noite recolhe-se ao
estabelecimento de atendimento e a internação tem efeito punitivo e pedagógico,
principalmente nas medidas restritivas à liberdade.

Com base em todas as informações podemos verificar que o jovem passa por
diversas etapas antes de ter sua liberdade privada, inclusive muitos deles tem a
oportunidade de se redimir perante o ato cometido e de ter sua ressocialização. Porém
segundo Capani 2003, vai depender muitas vezes da gravidade da situação, o grau de
participação as circunstâncias em que ocorreu o ato; sua personalidade, a capacidade
física e psicológica para cumprir a medida e as oportunidades de reflexão sobre seu
comportamento. O que na prática em alguns casos acaba não ocorrendo, pois o jovem
não está aberto a integração social, ou muitas vezes não tem a contribuição da família e
da sociedade em que está inserido, acaba tendo até a carência por parte das políticas
públicas o que gera uma certa probabilidade de retorno a criminalidade de tal modo que
chega à última instância de punição. O objetivo das medidas socioeducativas acaba
perdendo o efeito se não tem esse amparo e existe uma grande lacuna a ser preenchida
no que se refere a ressocialização do jovem infrator.
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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

Portanto esse projeto tem o objetivo de orientar sobre a possibilidade de adotarem


essas medidas de maneira eficaz, principalmente em regiões onde não há o básico, ou
seja, em parceria com as Ongs proporcionar oportunidades de auxílio e com isso diminuir
os índices de violência praticadas por jovens e tentar garantir a eficácia das medidas
sócio-educativas previstas pelo art. 112, inciso IV do Estatuto da Criança e do
Adolescente. Visando também a recuperação da autoestima dos jovens e
proporcionando a retomada dos vínculos familiares e com a comunidade. Como relatado
anteriormente existem diversos tipos de medidas sócio-educativas para os jovens, cada
uma adotada diante da gravidade do delito cometido, porém todas com a finalidade de
reeducar esse jovem e garantir que o ato infracional não seja cometido novamente.

Para muitos especialistas a forma mais humana e pedagogicamente a mais


promissora de abordagem educativa aos jovens infratores é o regime de liberdade
assistida, isso se dá pelo fato do jovem poder ser educado e ainda permanecer em
convívio social.

O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), instituído pela Lei


12.594, de 18 janeiro de 2012, tem por escopo a organização da execução das medidas
socioeducativas a serem aplicadas aos adolescentes que praticaram ato infracional ,
conforme a legislação do Estatuto da Criança e do Adolescente, cujo órgão responsável
pela articulação daquele sistema com as instituições do Sistema de Justiça é a Secretaria
de Direitos humanos da Presidência da República.

Cumpre destacar que como sistema integrado, o SINASE tem por objetivo
assegurar a real eficácia e efetividade na execução das medidas socioeducativas de
restrição e privação de liberdade impostas ao adolescente em conflito com a lei. Assim,
articula tal sistema em todo o território nacional políticas setoriais básicas para tanto,
alicerçado na natureza pedagógica da medida socioeducativa com fulcro na proteção
aos direitos humanos, priorizando, portanto, as medidas em meio aberto e não as de
semiliberdade ou internação, como será demonstrado ao longo deste estudo.

Quanto ao método de procedimento, utilizou-se o bibliográfico, vez que


empregados diversos instrumentos a fim de proporcionar o enriquecimento do conteúdo
do presente trabalho acadêmico. Desde as melhores doutrinas, prelecionadas por
renomados autores na seara do Direito da Criança e do adolescente, como também,
importantes artigos e periódicos divulgados em endereços eletrônicos oficiais,

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

produzidos por ilustres juristas, além de decisões proferidas pelos tribunais, foram meios
aplicados para propiciaram o desenvolvimento do presente estudo.

A implementação do SINASE objetiva primordialmente o desenvolvimento de uma


ação socioeducativa sustentada nos princípios dos direitos humanos. Defende, ainda, a
ideia dos alinhamentos conceitual, estratégico e operacional, estruturada,
principalmente, em bases éticas e pedagógicas.

Descarte, é ‘’ o SINASE constitui-se de uma política pública destinada à inclusão


do adolescente em conflito com a lei que se correlaciona e demanda iniciativas dos
diferentes campos das políticas públicas e sociais. Essa política tem interfaces com
diferentes sistemas e políticas e exige atuação diferenciada que coadune
responsabilização (com a necessária limitação de direitos determinada por lei e aplicada
por sentença) e satisfação de direitos

Ademais, no que diz respeito à coordenação do SINASE, esta será de


incumbência da União, sem prejuízo da integração pelos sistemas estaduais, distrital e
municipais, que terão liberdade de organização e funcionamento. A gestão e as funções
executivas, por sua vez, competem à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da
República, SDH. O Plano Nacional de Atendimento Socioeducativo, a cargo da União,
em parceria com Estados, Distrito Federal e Municípios, conterá, em conformidade com
a Lei, o diagnóstico da situação do SINASE, as diretrizes, metas, objetivos, prioridades,
formas de financiamento e gestão das ações de atendimento socioeducativo para os
decênios seguintes.

Portanto, é importante que a criança ou adolescente que cometeu um ato


infracional seja acolhido sem preconceitos pela sociedade em que faz parte e que tenha
as mesmas oportunidades que os demais jovens, uma vez que já foram sancionados por
sua conduta delituosa. Assim, com um bom convívio social, sem discriminação, o menor
poderá desenvolver sua capacidade interpessoal, melhorando seu respeito com o
próximo. Em seguida, se tem a educação, que é peça fundamental no quebra-cabeça da
ressocialização do menor infrator. Desde que realizada com seriedade, compromisso e
afeto, a frequência à escola proporcionará ao menor que cometeu ato infracional, além
de novas futuras oportunidades de emprego, uma sociabilidade efetiva, uma rotina diária
e ainda regras de convivência.
O apoio e incentivo do Estado também é fundamental na ressocialização dos
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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

jovens que foram levados pelos caminhos tortuosos do crime, com a criação de projetos
que reeduquem esta clientela, através da prevenção e do acolhimento. Além disso, este
deveria ser o responsável por fornecer infraestrutura a todos os meios ressocializadores
citados, com o fornecimento de uma educação de qualidade, apoio às famílias, entre
outros.
Diante do exposto, observa-se que existem vários meios de mudar a trajetória
dos jovens infratores. A sociedade e a família devem se unir para acolher de maneira
digna o infrator, que mesmo diante de suas ações negativas, são seres em processo de
desenvolvimento e que necessitam de atenção, afeto e proteção. O Estado também deve
investir mais na área da educação, com a prevenção da prática de atos infracionais. Por
fim, se tem a inserção destes menores no mercado de trabalho, afastando esta clientela
do mundo do crime.

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

2- MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

Em tempos de debates eleitorais, surge e ressurge o mesmo assunto: o debate sobre


maioridade penal. A idade limite atualmente prevista na legislação brasileira para ser
penalmente imputável por conduta típica e antijurídica é de 18 anos:

Art. 27. Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos
às normas estabelecidas na legislação especial.

A legislação especial a que faz referência o Código Penal é o Estatuto da Criança e do


Adolescente (1990), com a recente adição da Lei 12.594/2012.
O Estatuto da Criança e do Adolescente é uma lei extremamente abrangente, de cunho
mais garantista do que punitivista, sendo aplicável para jovens de até 18 anos. Essa
importante lei veio substituir o ultrapassado e punitivista Código de Menores.

Medidas socioeducativas

As medidas socioeducativas são medidas repressivas previstas no Estatuto, aplicáveis


para jovens de 12 a 18 anos que cometerem ato infracional.

Estão previstas nos arts. 103 a 128, e também na Seção V, do art. 171 ao
art. 190 do ECA. Além do ECA, a Lei 12.594 de 2012 veio instituir o Sinase, Sistema
Nacional de Atendimento Socioeducativo, a fim de regularizar o funcionamento das
unidades de internação.
A definição de ato infracional está prevista no art. 103 do Estatuto:

Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção
penal.

As medidas previstas, a ser aplicadas pelo juiz considerando inúmeros aspectos,


principalmente a gravidade do ato infracional, são:
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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar
ao adolescente as seguintes medidas:
I - advertência;
II - obrigação de reparar o dano;
III - prestação de serviços à comunidade;
IV - liberdade assistida;
V - inserção em regime de semi-liberdade;
VI - internação em estabelecimento educacional;
VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

Não obstante as inúmeras garantias previstas no ECA, a aplicação das Medidas


Socioeducativas na prática converteu-se em um Direito Penal Juvenil, com todas as
mazelas do sistema prisional para adultos.

Sobre medidas socioeducativas, leia também


A própria Lei 12.594, na intenção de regularizar o funcionamento dos milhares de
estabelecimentos educacionais, converteu-se em verdadeira LEP para jovens internos,
com previsão de visita íntima e regime disciplinar para os internos que cometerem
faltas:
Art. 71. Todas as entidades de atendimento socioeducativo deverão, em seus
respectivos regimentos, realizar a previsão de regime disciplinar que obedeça aos
seguintes princípios:
I - tipificação explícita das infrações como leves, médias e graves e determinação das
correspondentes sanções;
II - exigência da instauração formal de processo disciplinar para a aplicação de
qualquer sanção, garantidos a ampla defesa e o contraditório;
III - obrigatoriedade de audiência do socioeducando nos casos em que seja necessária
a instauração de processo disciplinar;
IV - sanção de duração determinada;
V - enumeração das causas ou circunstâncias que eximam, atenuem ou agravem a
sanção a ser imposta ao socioeducando, bem como os requisitos para a extinção
dessa;
VI - enumeração explícita das garantias de defesa;
VII - garantia de solicitação e rito de apreciação dos recursos cabíveis; e
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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

VIII - apuração da falta disciplinar por comissão composta por, no mínimo, 3 (três)
integrantes, sendo 1 (um), obrigatoriamente, oriundo da equipe técnica.
Art. 72. O regime disciplinar é independente da responsabilidade civil ou penal que
advenha do ato cometido.
Art. 73. Nenhum socioeducando poderá desempenhar função ou tarefa de apuração
disciplinar ou aplicação de sanção nas entidades de atendimento socioeducativo.
Art. 74. Não será aplicada sanção disciplinar sem expressa e anterior previsão legal ou
regulamentar e o devido processo administrativo.
Art. 75. Não será aplicada sanção disciplinar ao socioeducando que tenha praticado a
falta:
I - por coação irresistível ou por motivo de força maior;
II - em legítima defesa, própria ou de outrem.

Recentemente, foi notícia a decisão do STF de conceder Habeas Corpus coletivo aos
internos de uma unidade no Espírito Santo. Dada a superlotação de uma unidade, a
Defensoria Pública impetrou o Habeas Corpus coletivo, e a matéria chegou ao
Supremo, que fez história com a excelente decisão.
A leitura atenta do ECA mostra que o legislador não pretendia repetir os erros do
ultrapassado Código de Menores, no que diz respeito à punição de jovens infratores. A
realidade mostra que mudam as legislações e permanecem os mesmos erros.
As antigas Febens, sigla para Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor, foram
igualmente criadas a fim de dar um acolhimento institucional a crianças e jovens em
situação de rua. Na prática, eram verdadeiros presídios para crianças e jovens em
situação de miséria, com maus-tratos, violência física, psicológica e sexual entre os
internos. A realidade mostrou que não há muita diferença entre as antigas Febens e as
atuais unidades de internação para jovens infratores.

Gilberto Dimenstein abordou o assunto no hoje clássico “O cidadão de papel”:

Não são poucas as coincidências entre os períodos, começando pela educação


pública. Quando surgiu o decreto de Repressão à Ociosidade, em 1888 – com a criação
de instituições do tipo da Febem para garotos que perambulavam pelas ruas -, o

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

deputado Rodrigues Peixoto discursou no Parlamento. Ao questionar a eficácia


dos asilos correcionais, disse:
‘Poderemos, é verdade, prescindir desses meios, e chegar ao mesmo resultado por
outro caminho, talvez mais nobre, mas essa estrada seria demasiadamente longa; só
atingiríamos essa meta depois de muito tempo e de havermos despendido largas
somas. Quero falar de educação popular. Se nós pudéssemos educar melhor a nossa
mocidade, se pudéssemos incutir-lhes as grandes qualidades que tornam um cidadão
útil e o fazem compreender os seus direitos e deveres, poderíamos então prescindir de
meios artificiais (...). Temos, é verdade, grandes estabelecimentos de instrução
superior, alguns dos quais podem enfrentar aqueles que possuem os povos mais
civilizados da Europa, mas quanto à instrução primária e secundária, estamos
completamente atrasado.' (p. 149).

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

3- ASSISTÊNCIA A JOVENS INFRATORES

A partir da instituição do Sistema Único de Assistência Social - SUAS [nota 1],


consolidado pela Lei nº 12.435/2011 [nota 2], passaram a surgir alguns questionamentos
acerca do atendimento prestado a crianças e adolescentes (incluindo adolescentes
autores de atos infracionais), pelos Centros de Referência de Assistência Social - CRAS
e pelos Centros de Referência Especializados de Assistência Social - CREAS, em todo
o Brasil.

Se, de um lado, é inquestionável que tais equipamentos não podem deixar de atender
crianças e adolescentes, inclusive aqueles acusados da prática de atos infracionais
(além, é claro, de suas respectivas famílias), é também evidente que este atendimento
não pode ser prestado nos mesmos moldes que o efetuado junto a outras demandas a
cargo de tais serviços, como é o caso de pessoas com deficiência, idosos, mulheres
vítimas de violência e outros munícipes que se encontram com seus direitos violados.

Como melhor veremos adiante, reputa-se absolutamente imprescindível que os


CRAS/CREAS (assim como outros serviços públicos ou de relevância pública), elaborem
um plano de ação diferenciado e mesmo criem estruturas próprias para o atendimento
das peculiaridades inerentes às diversas demandas sob sua responsabilidade, com
ênfase para as crianças e adolescentes acolhidas, vítimas de violência, abuso e
exploração sexual, bem como de adolescentes em cumprimento de medidas
socioeducativas em meio aberto e suas respectivas famílias.

A necessidade da elaboração e implementação de uma proposta de atendimento


diferenciada e da criação de uma estrutura própria destinada ao atendimento de
crianças, adolescentes e suas respectivas famílias não apenas decorre de questões
técnicas elementares (como a constatação elementar que as demandas na área da
infância e da juventude não podem ser tratadas da mesma forma com que são tratadas
demandas envolvendo idosos), mas também encontra amplo respaldo no ordenamento
jurídico vigente, não sendo razoável seu atendimento conjunto com as demais demandas
a cargo do CRAS/CREAS.

Com efeito, é de se invocar, antes de mais nada, o princípio da prioridade absoluta à


criança e ao adolescente, insculpido no art. 227, caput, da Constituição Federal, que por
força do disposto no art. 4º, par. único, alínea "b", da Lei nº 8.069/90, garante, no que diz

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

respeito ao atendimento à população infanto-juvenil, a "precedência dos serviços


públicos ou de relevância pública", como é o caso do atendimento prestado pelos CRAS/
CREAS [nota 3].

Como resultado da aplicação de tal princípio, bem como do disposto no art. 259, par.
único, da Lei nº 8.069/90 (que impõe aos municípios a adequação de seus serviços e
programas aos princípios e diretrizes estabelecidas pelo Estatuto da Criança e do
Adolescente), cabe ao CRAS/CREAS disponibilizar um
atendimento diferenciado e prioritário para crianças, adolescentes e suas respectivas
famílias, de modo que os exames, perícias e avaliações e que se fizerem necessárias
sejam realizados com o máximo de celeridade, por intermédio de uma equipe
interprofissional habilitada [nota 4], e que o tratamento recomendado seja iniciado de
imediato, com o acompanhamento devido, até a efetiva (e definitiva) solução do
problema respectivo (que, desnecessário dizer, é o objetivo precípuo da intervenção
realizada [nota 5]).

O atendimento de crianças, adolescentes e suas respectivas famílias prestado pelos


CRAS/CREAS ou por qualquer outro serviço público, portanto, não pode seguir o mesmo
"padrão" empregado para as demais demandas sob sua responsabilidade, devendo
primar pela celeridade e pela especialização (o que por sua vez demanda
a qualificação dos profissionais responsáveis e o planejamento de abordagens
específicas, que contemple, inclusive, a atuação em conjunto com outros programas e
serviços, como é o caso dos CAPs [nota 6]), não sendo admissível, por exemplo, que
sejam aqueles submetidos à mesma estrutura e sistemática destinada ao atendimento
de usuários adultos, de modo a aguardar no mesmo local e nas mesmas "filas" que estes
a realização de exames ou tratamento, máxime por técnicos que não possuam a
qualificação profissional devida.

Os problemas enfrentados por crianças e adolescentes não podem esperar [nota 7],
devendo ser enfrentados e solucionados com o máximo de urgência possível, evitando
assim o agravamento da situação e dos prejuízos por aqueles suportados, sendo certo
que a omissão do Poder Público os coloca em grave situação de risco (cf. art. 98, inciso
I, da Lei nº 8.069/90), tornando o agente público responsável passível de punição (cf.
arts. 5º c/c 208 e 216, da Lei nº 8.069/90).

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

Se já não bastasse tal constatação, a necessidade de um atendimento


diferenciado também abrange o espaço físico onde este deve ser prestado, não apenas
para tornar o ambiente mais agradável e propício ao acolhimento de crianças e
adolescentes (estimulando seu retorno, nos casos de exames múltiplos ou de um
tratamento prolongado), mas também para colocá-los a salvo de situações
potencialmente vexatórias ou constrangedoras, que podem resultar da utilização do
mesmo local destinado ao atendimento de outras demandas.

A propósito, o art. 5º, da Lei nº 8.069/90 estabelece que "nenhuma criança ou


adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou
omissão, aos seus direitos fundamentais", dispondo o art. 18, do mesmo Diploma Legal
que "é dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a
salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou
constrangedor". O art. 70, também da Lei nº 8.069/90, por sua vez, reafirma que "é dever
de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do
adolescente".

Tais normas, no caso em exame, se aplicam com especial intensidade no que diz
respeito à preservação do direito ao respeito que, na forma do art. 17, da Lei nº 8.069/90,
compreende "...a inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do
adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos
valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais".

Com efeito, não resta dúvida que, a título de exemplo, o atendimento de crianças e
adolescentes vítimas de violência sexual, ou de adolescentes acusados da prática de
ato infracional, no mesmo espaço destinado ao atendimento de idosos ou de outras
demandas envolvendo o público adulto acabaria por expô-los a uma situação vexatória
ou constrangedora, que seguramente serviria de desestímulo à continuidade do
tratamento que se fizesse necessário.

Vale repetir que o atendimento prestado a crianças, adolescentes e suas respectivas


famílias deve ser especializado e diferenciado, e que todos os servidores envolvidos (a
começar pelo encarregado da portaria ou mesmo o responsável pela segurança do
estabelecimento), devem receber uma formação/qualificação profissional adequada, de
modo a evitar que, por palavras ou pela simples forma de se portar diante daqueles,

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

constranjam e/ou contribuam para criação de "barreiras" que comprometem a solução


dos problemas por eles enfrentados.

Desnecessário dizer que, em qualquer caso, não basta o atendimento meramente


"formal" e "burocrático" de tais demandas, mas sim é fundamental que as intervenções
realizadas estejam verdadeiramente comprometidas com a efetiva solução do problema
apresentado pela criança, adolescente e/ou família individualmente considerada, para o
que devem ser definidas (se necessário com o apoio de outros profissionais, programas
de serviços), "estratégias" das mais variadas, que compreendam visitas
domiciliares e/ou atividades em outros equipamentos públicos ou mesmo particulares,
como entidades de acolhimento, escolas, "Centros para Juventude" e outros espaços de
lazer etc., tudo da forma que se mostre mais eficaz para efetiva solução do problema
apresentado.

No planejamento das ações a serem desenvolvidas, é importante jamais perder de vista


que o CRAS/CREAS se destina ao atendimento de crianças e adolescentes vitimizadas
(e também àqueles que, ao menos em tese, assumem a posição de "vitimizadores" -
como é o caso dos acusados da prática de ato infracional), que são em regra, no seu dia
a dia, alvo de preconceito e discriminação, bem como da negligência dos adultos com
as quais têm contato, sejam seus pais, professores e/ou mesmo autoridades públicas.

Mais do que natural, portanto, que tais crianças e adolescentes apresentem alguma
"resistência" em se submeter ao tratamento que se faz necessário, o que somado à
omissão (ou falta de autoridade) de seus pais ou responsável, torna imprescindível que
os profissionais que os irão atender saibam como lidar com tal realidade (através da
mencionada qualificação técnica adequada), bem como desenvolvam "estratégias"
voltadas ao "resgate" dos recalcitrantes e à orientação de suas respectivas famílias, a
partir de uma análise individualizada e criteriosa de cada caso, que deve ser alvo de um
"plano de ação" específico [nota 8], elaborado preferencialmente sob a
ótica interdisciplinar (daí porque, especialmente nos casos mais complexos, a
"integração operacional" com profissionais que atuam em outros programas e serviços,
como os CAPs, é fundamental) e com respeito aos princípios relacionados no art.
100, caput e par. único, da Lei nº 8.069/90, que norteiam toda e qualquer intervenção
estatal junto a crianças, adolescentes e famílias.

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

Todos estes fatores evidenciam a necessidade de uma adequação do serviço prestado


pelo CRAS/CREAS [nota 9], de modo a prestar um atendimento diferenciado,
individualizado e especializado a crianças, adolescentes e suas respectivas famílias,
com o desenvolvimento de uma metodologia própria para o enfrentamento das diversas
demandas e situações peculiares que irão ocorrer, tendo sempre por norte o princípio da
proteção integral à criança e ao adolescente, que se constitui na razão de ser da
intervenção estatal.

Tal sistemática diferenciada deverá necessariamente contemplar instalações físicas


adequadas, em local diverso (ou isolado) daquele destinado ao atendimento das outras
demandas a cargo do CRAS/CREAS (sem prejuízo do mencionado atendimento
domiciliar e/ou em outros equipamentos públicos ou particulares), de modo a preservar
a imagem, a identidade e a intimidade das crianças e adolescente atendidas [nota 10];
a qualificação profissional de todos aqueles que atuam no setor, além da articulação de
ações/integração operacional com outros órgãos municipais e autoridades encarregadas
do atendimento e/ou defesa dos direitos de crianças e adolescentes, como o Conselho
Tutelar, o Ministério Público, a Justiça da Infância e da Juventude, os órgãos policiais
encarregados de atendimento de crianças e adolescentes vítimas de crime, bem como
de adolescentes acusados da prática de ato infracional (dentre outros).

Importante também não perder de vista que para o planejamento e implementação de


tal estrutura de atendimento deve ser observado o referido princípio constitucional da
prioridade absoluta à criança e ao adolescente (art. 227, caput, da Constituição Federal
c/c art. 4º, caput e par. único, da Lei nº 8.069/90), inclusive no que diz respeito
à destinação privilegiada de recursos públicos provenientes do orçamento dos setores
responsáveis pela execução das ações correspondentes (cf. arts. 4º, par. único, alíneas
"c" e "d" c/c 87, incisos I e II e 88, inciso III, da Lei nº 8.069/90), que logicamente não
podem se restringir à área da assistência social.

É também fundamental compreender que a implantação dos CRAS/CREAS, de modo


algum, pode levar à "extinção" de equipamentos diversos, destinados ao atendimento de
demandas específicas na área infanto-juvenil, como é o caso dos programas
socioeducativos em meio aberto destinados ao atendimento de adolescentes acusados
da prática de atos infracionais.

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

Muito embora, de acordo com as normas relativas ao Sistema Único de Assistência


Social - SUAS, os CRAS/CREAS sejam naturalmente encarregados do atendimento de
adolescentes autores de ato infracional e suas respectivas famílias, não é correto nem
razoável, à luz das disposições da Lei nº 8.069/90, que o CRAS/CREAS seja
"confundido" com um programa socioeducativo e/ou que "execute" as medidas em meio
aberto previstas em lei (notadamente a liberdade assistida e a prestação de serviços à
comunidade), como se fosse o único equipamento para tanto disponível.

Com efeito, tanto a liberdade assistida quanto a prestação de serviços a comunidade, na


forma da Lei nº 8.069/90 e do Sistema Nacional Socioeducativo - SINASE, pressupõem a
existência de um programa específico destinado a definir sua forma de execução, como
se dará a seleção (e qualificação) dos responsáveis pelo acompanhamento deste (os
chamados orientadores, no caso da liberdade assistida e os responsáveis pelas
entidades que irão receber o serviço comunitário prestado pelo adolescente vinculado à
prestação de serviços à comunidade), e outras peculiaridades do atendimento prestado.

Os referidos programas devem estar devidamente registrados junto ao Conselho


Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente - CMDCA local (cf. art. 90, caput, da
Lei nº 8.069/90 [nota 11]) e seguir as normas aplicáveis para sua execução, incluindo
aquelas definidas pelos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente (inteligência
do art. 90, §3º, da Lei nº 8.069/90), o que inclui a estrita observância das disposições
relativas ao SINASE, acima referido, como parte de uma política pública mais
abrangente (a chamada "política socioeducativa"), que deve contemplar não apenas a
ação de "um", mas sim de vários programas e serviços públicos articulados entre
si (valendo neste sentido observar o disposto nos arts. 86 e 88, inciso V, da Lei nº
8.069/90).

Assim sendo, deveras evidente que, se por um lado, o CRAS/CREAS tem o dever de
atender adolescentes acusados da prática de ato infracional e suas respectivas famílias
(atendimento este que deve ser prestado de forma espontânea, desde sempre, mediante
simples encaminhamento efetuado pela autoridade policial ou Conselho Tutelar, sem a
necessidade da "aplicação" de qualquer medida pela autoridade judiciária [nota 12]), não
é correto que "faça as vezes" e/ou "substitua" os programas socioeducativos
propriamente ditos, que devem ser mantidos - ou criados, caso ainda não existam
- independentemente da existência dos CRAS/ CREAS, embora com estes, como visto,

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

devam articular ações, na perspectiva de proporcionar o atendimento mais


eficaz possível.

A propósito, importante não confundir este atendimento prestado pelo CRAS/CREAS


(que além de ser realizado na perspectiva de proteção do adolescente [nota 13], encontra
respaldo no art. 88, inciso V, da Lei nº 8.069/90), com a "execução de medida
socioeducativa" que, como dito, deve ficar sob a responsabilidade de um (ou mais)
programa(s) socioeducativo(s), especificamente planejado(s) e estruturado(s) com esta
finalidade.

A necessidade de coexistência entre o CRAS/CREAS e os programas socioeducativos


propriamente ditos, portanto, decorre da sistemática idealizada pela Lei nº 8.069/90 (e
melhor explicitada pelo SINASE) para o atendimento de adolescentes em conflito com a
lei (que como visto pressupõe a elaboração e implementação de uma política pública
socioeducativa mais abrangente), sendo a extinção ou "absorção" destes por aquele
decorrente da interpretação equivocada das próprias disposições relativas ao SUAS,
pois jamais foi intenção deste retroceder ao modelo vigente à época do "Código de
Menores" (há mais de 20 anos revogado), que relegava o atendimento de crianças e
adolescentes a "instituições totais", vinculadas unicamente à área da assistência social,
com todas as mazelas daí decorrentes.

E não foi, evidentemente, a intenção do SUAS transformar o CRAS/CREAS numa


"instituição total", responsável - sozinha - pelo atendimento de adolescentes autores de
ato infracional e de todas as demais demandas na área da infância e da juventude (além
de outros segmentos que também são de responsabilidade do serviço), mas em
apenas mais um dos equipamentos públicos destinados a proporcionar a almejada (e
tão sonhada) "proteção integral" infanto-juvenil, cabendo-lhe somar e se integrar aos
demais existentes, sem prejuízo da especialização do serviço por ele próprio prestado,
nos moldes da exposição supra.

Em outras palavras, se é verdade que os CRAS/CREAS sem dúvida


devem integrar a política socioeducativa a ser instituída no âmbito de cada município, a
execução desta não pode se resumir ao encaminhamento de adolescentes para
atendimento junto a estes serviços, máxime sem que haja um adequado planejamento
das intervenções a serem realizadas junto a tais adolescentes e seus pais/responsáveis
(tanto no plano coletivo quanto individual [nota 14]) e sem a oferta de programas e

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

serviços alternativos (e/ou complementares), capazes de apurar e neutralizar, de


maneira efetiva e definitiva (além de prioritária), os fatores determinantes da conduta
infracional.

Assim sendo, e partindo do princípio elementar de que a municipalização do atendimento


prestado à criança e ao adolescente (cf. art. 88, inciso I, da Lei nº 8.069/90) importa na
elaboração e implementação, em caráter prioritário, de políticas públicas
intersetoriais destinadas à plena efetivação dos direitos infanto-juvenis (cf. arts.
4º, caput e 86 a 88, da Lei nº 8.069/90 e art. 227, caput, da Constituição Federal), cabe
aos municípios articularem e promoverem a adequação dos CRAS/CREAS e seus
demais programas e serviços públicos ao atendimento especializado de demandas nesta
área, incluindo crianças e adolescentes vítimas de violência, abuso e exploração sexual,
afastados do convívio familiar, além, é claro, de adolescentes autores de atos
infracionais e suas respectivas famílias [nota 15], passando assim a integrar a "rede de
proteção" infanto-juvenil que tais entes federados têm o dever de instituir e manter.

Notas do texto:

1 Por intermédio, primeiramente, das Resoluções CNAS nºs 145, de 15/10/2004 (que
aprovou a nova Política Nacional de Assistência Social - PNAS); 130, de 15/07/2005 (que
aprovou a Norma Operacional Básica do Sistema Único de Assistência Social -
NOB/SUAS) e 269, de 13/12/2006 (que aprovou a Norma Operacional Básica de
Recursos Humanos do Sistema Único de Assistência Social - NOBRH/SUAS) e normas
posteriores.

2 Que incorporou, em caráter "oficial", as disposições relativas ao SUAS no texto da Lei


nº 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS).

3 Vale dizer que a Lei nº 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social) também dispõe
sobre a matéria em seu art. 23, §2º, inciso I, onde consta de maneira expressa que, na
organização dos serviços da assistência social, serão criados programas de amparo às
crianças e adolescentes em situação de risco pessoal e social, em cumprimento ao
disposto no art. 227 da Constituição Federal e na Lei nº 8.069/90.

31
COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

4 A interdisciplinaridade e o profissionalismo são da essência da sistemática de


atendimento preconizada pela Lei nº 8.069/90.

5 Valendo neste sentido observar o disposto nos arts. 1º, 6º e 100, par. único, inciso I,
da Lei nº 8.069/90.

6 A atuação em "rede" e a integração operacional entre os diversos órgãos, programas


e serviços co-responsáveis pelo atendimento (e pela "proteção integral") de crianças,
adolescentes e suas respectivas famílias, além de expressamente previsto em lei
(valendo neste sentido observar o disposto nos arts. 86 e 88, incisos V e VI, da Lei nº
8.069/90), é verdadeiramente fundamental.

7 Além da determinação legal e constitucional relativa ao atendimento preferencial, é


preciso também considerar que crianças e adolescentes são pessoas que se encontram
"em condição peculiar de desenvolvimento", sob o ponto de vista físico, emocional, moral
etc., sendo que eventuais problemas enfrentados nessa fase crítica podem ter
conseqüências desastrosas para o resto de suas vidas.

8 Razão pela qual, a título de exemplo, o art. 101, §4º, da Lei nº 8.069/90 fala da
necessidade de elaboração de um "Plano Individual de Acolhimento" para as crianças e
adolescentes inseridas em programas de acolhimento institucional e o Sistema Nacional
Socioeducativo - SINASE, aprovado pela Resolução nº 119/2006, do CONANDA
também prevê a necessidade de elaboração de um "Plano Individual de Atendimento"
para adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas.

9 Mais uma vez com base nos citados arts. 4º, caput e par. único, alínea "b" e 259, par.
único, da Lei nº 8.069/90 e art. 23, §2º, inciso I, da Lei nº 8.742/93.

10 Sem prejuízo da elaboração de propostas diferenciadas para o atendimento de


crianças e adolescentes vítimas de violência em relação ao atendimento de adolescentes
em conflito com a lei (que poderia ocorrer no mesmo prédio, porém em local separado,
inclusive como forma de evitar sua exposição perante os demais, o que poderia resultar
em afronta ao disposto nos arts. 17, 18, 143 e 247, da Lei nº 8.069/90) e de outros casos
de crianças e adolescentes atendidos pelo CREAS. A separação dos casos atendidos,
de acordo com sua natureza, deve ser efetuada com cautela, de modo a evitar a
"rotulagem" da criança ou adolescente, em razão do setor ou ala para qual este é
encaminhado. Qualquer ordenamento (ou reordenamento) institucional a ser realizado,

32
COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

portanto, deve levar em conta a necessidade de preservação da imagem, identidade,


privacidade e intimidade dos casos atendidos.

11 Sem prejuízo de seu eventual registro junto ao Conselho Municipal de Assistência


Social - CMAS.

12 O atendimento no "viés" eminentemente "protetivo" independe da "aplicação de


medidas" por quem quer que seja, sendo um dever elementar dos órgãos públicos co-
responsáveis, que como dito têm que atender as demandas na área da infância e
juventude de forma espontânea e prioritária.

13 Não dependendo assim da prática de ato infracional para ser prestado, bastando a
constatação da presença de alguma das situações relacionadas no art. 98, da Lei nº
8.069/90.

14 Devendo tal planejamento de ações ser efetuado (e posteriormente executado)


por profissionais qualificados, com estrita observância dos princípios relacionados no art.
100, caput e par. único, da Lei nº 8.069/90.

15 Cuja necessidade de atendimento "intensivo" e especializado foi ainda mais


enfatizada pela Lei nº 12.435/2011 (e consequentemente pela LOAS).

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

4- REINTEGRAÇÃO DO INFRATOR À SOCIEDADE

Primeiramente, é necessário entender quais os fatores que levam os adolescentes à


marginalização, pode-se afirmar que a desigualdade social no Brasil possui papel
fundamental no conjunto de problemas sociais.

As condições subumanas em que vivem grande parte das famílias brasileiras, tornam
o ambiente familiar desequilibrado, tendo o adolescente crescer meio as crises entre
os pais, alimentando dentro de si um sentimento de culpa, acreditando ser o
responsável por mudar a realidade familiar, deixando para trás sua adolescência, e
saindo em busca de trabalho para que possa trazer dinheiro para o seio familiar, não
conseguindo emprego formal, muitos optam por vender produtos nas ruas, em
semáforos, fator que muitas das vezes faz com que este adolescente, seja tratado
como chacota na escola, sendo essa discriminação o estopim para que ele opte pelo
afastamento do meio educacional.

Dito isso, o jovem criado meio ao caos, se sente deslocado socialmente, e precisa
encontrar um grupo que o aceite, dessa forma acaba por entrar em pequenos grupos
de infratores, que possivelmente, devido a falta de estrutura familiar, educacional,
social, também possuem desvio de conduta, por esse motivo, acabam por cometer atos
infracionais. Estando por definitivo às margens da sociedade, esfriando vínculos
familiares, escolares e com a comunidade em geral.

Devemos lembrar que estes adolescentes no seu cotidiano são vítimas de violência,
fato que os torna ainda mais truculentos em seus atos, sendo preocupante a sociedade,
pois já vivem uma violência, sejam eles como vítimas ou agentes.

O Brasil tem a população estimada em 20,8 milhões de adolescentes, somente 10 em


cada 10 mil praticam algum delito que resulte numa medida socioeducativa e destes,
70% cometem delitos contra o patrimônio. Estas estatísticas mostram o equívoco das
falsas soluções da redução da maioridade da idade penal, do agravamento de penas
aplicadas a adolescentes, ou de outras propostas que tem em comum o fato de não

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

perceber a pratica de atos infracionais no contexto dos diversos problemas sociais no


país.

O Brasil foi o primeiro país a implantar legislação reconhecida internacionalmente como


uma das mais avançadas em termos de proteção à criança e ao adolescente.
Representa a luta de vários movimentos e entidades a favor dos direitos da criança e
do adolescente. Contudo, ainda com esse aparato legal do ECA retarda-se a efetivação
de um projeto de cidadania que resgate a vida social para com as crianças e
adolescentes pobres do país.
Em 1964 os militares tentaram amenizar as problemáticas de cunho social, criando a
Fundação do Bem-Estar do Menor em 26 abril de 1976 o nome foi alterado para Febem.
Atualmente o nome foi alterado para FUNDAÇÃO C.A.S.A. O atendimento inicial, é a
entrada da instituição, destinado a prestar o primeiro atendimento a todos os
adolescentes autores de atos infracionais. A unidade acolhe adolescentes pelo prazo
máximo de 72 horas, antes de sua apresentação ao sistema de Justiça, podendo
ocorrer a internação provisória, até que ocorra a imposição da medida socioeducativa
cabível para o ato cometido. O adolescente é cadastrado e pode ficar com restrição de
liberdade pelo prazo máximo de 45 dias. Sendo caso e internação o adolescente é
privado de liberdade com sentença judicial, podendo o prazo de internação alcançar 3
anos. A semiliberdade é destinada aos adolescentes infratores com transição para o
meio aberto, onde esse poderá trabalhar ou estudar fora da instituição, devendo
retornar para sua instituição à tarde para dormir. Da liberdade assistida, onde o
adolescente e sua família são acompanhados por assistentes sociais e psicólogos
durante um período determinado, devendo comparecer à instituição, juntamente com
seus familiares, para uma avaliação periódica, até que complete o cumprimento das
medidas socioeducativas.

Com isso, pode-se concluir que o Estatuto da Criança e do Adolescente, além de


garantir direitos, atua na busca pela reintegração dos adolescentes infratores,
aplicando medidas socioeducativas em casas de internação separadas aos adultos,
onde estes cumprem as medidas impostas em função dos atos que cometeram, sem
estarem meio ao abuso e ao crimes organizado do mundo das casas prisionais, porém,
é sabido que as instituições que recebem os adolescentes com medidas
socioeducativas de internação, muitas das vezes não recebem a atenção
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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

governamental necessária, o que acaba por dificultar a reintegração do jovem infrator,


instituições sem o suporte necessário para conter a agressividade de alguns infratores,
por este motivo, a sociedade tem papel fundamental na reintegração do jovem,
devendo compreender que a exclusão, não é o caminho para o combater este desvio
e, que é possível criarmos referenciais positivas para a constituição da identidade dos
jovens adolescentes reintegrados, dependendo de uma mudança de atitude social no
sentido de acolhimento e buscando junto aos entes públicos melhores condições e
fiscalização das casas de internação que recebem os jovens infratores.

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

5- O ATO INFRACIONAL

A definição de "Ato Infracional" está previsto expressamente no artigo 103 do


Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)

É comum escutarmos em nossa rotina diária algumas pessoas (que


desconhecem o mundo jurídico) falarem em alto e bom som algo como "aqui no
Brasil o menor de idade pode fazer o que bem entender, cometer vários crimes,
já que não nenhuma temos punição". Mas será que essa informação é
verdadeira?

1) As crianças e os adolescentes podem cometer crime?

A resposta é não. Mas calma, isso não significa que caso eles cometam algum fato
descrito como crime não haverá responsabilidade ao menor infrator.

É necessário antes de qualquer abordagem mais profunda entendermos o exposto


junto ao artigo 228 da Constituição Federal, bem como o artigo 27 do Código Penal, in
verbis:
Art. 228 (CF/88)- São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos
às normas da legislação especial.
Art. 27 (CP) - Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando
sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial.

Pela simples leitura, é forçoso concluir que os menores de 18 anos, na data do


cometimento da infração penal (teoria da atividade), não cometem crime ou
contravenção penal, eis que inimputáveis para fins penais, o que exclui o elemento da
culpabilidade e consequente imputação de crime sob o prisma da legislação ordinária
penal.

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

Isso porquê o nosso Código Penal adotou o critério biológico nesta situação específica,
que leva em conta apenas o desenvolvimento mental do agente independentemente
se tinha, ao tempo da conduta, capacidade de entendimento e autodeterminação. É
fato que, como regra, adotamos o critério biopsicológico como forma de auferir a
imputabilidade do agente, mas essa exceção é adotado na inimputabilidade em razão
da idade.
Contudo, isso não quer dizer que crianças e adolescentes poderão infringir a legislação
criminal e saírem ilesos. Na verdade, em que pese eles não cometerem crimes ou
contravenções propriamente ditos, eles cometem o que a legislação penal chama de
“ato infracional”, que passaremos a expor a seguir.

2) O que é um ato infracional?

O ato infracional é uma definição simples e clara descrita junto ao artigo 103 do Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA):
Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção
penal.

Em outras palavras, um ato infracional nada mais é que uma conduta descrita na lei
como crime ou contravenção penal praticado por criança (até completar 12 anos) ou
adolescente (entre 12 anos completos e 18 anos incompletos). Sendo assim, na
prática, o ato infracional é o "crime" cometido por um menor de idade.

Se a lei ordinária diz que a ação é um crime para aquele que é imputável e um
adolescente, com 17 anos e 364 dias de idade comete tal, estará, na verdade, sendo
punido não por um crime, mas sim por um ato infracional.

Em um exemplo claro, imaginem a seguinte situação: Duas pessoas, um de 18 anos e


outro de 16, decidem assaltar um mercado juntos, sendo a ação esgotada
perfeitamente todos os passos do inter criminis. Na fuga, a Polícia consegue alcançar
estes dois jovens, sendo ambos encaminhados à Delegacia. Neste caso, o cidadão de
18 anos cometeu um crime (art. 157 do Código Penal), enquanto o menor de idade,
cometendo a mesma figura penal do roubo, cometeu um ato infracional (também do
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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

art. 157 do Código Penal, mas por lhe faltar imputabilidade, não estará sujeito ao
procedimento comum previsto no Código de Processo Penal).
Neste nosso caso, a competência para o maior de idade será o Foro Criminal da
Comarca X. Já o julgamento do menor de idade se dará pela Vara da Infância e da
Juventude da mesma Comarca, e não por um juiz da Vara Comum.

Percebam, portanto, que é equivocado dizer que um menor de idade pode fazer o que
quiser e não será castigado, já que, conforme determinação expressa em nossa Lei
Maior, estará sujeito à legislação especial (no caso, o ECA).

3) Mas então somente os menores de idade cometem Atos Infracionais?

Sim, é exatamente isso. Somente crianças e adolescentes, ao tempo da ação ou da


omissão, podem cometer atos infracionais, ao passo que, o maior de idade (18 anos
completos) cometerão crimes ou contravenções penais.

Conforme brevemente apontamos acima, quem define o que é criança ou adolescente


é o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente (e não poderia ser diferente):
Art. 2º: Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de
idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.

Como observa-se, a legislação adotou claramente o critério biológico do sujeito ativo


do ato infracional, de modo que, ao completar 18 anos e cometer uma (nova) infração
penal, será imputável (em regra).

4) O menor poderá ser preso por isso? Qual a consequência de uma condenação por
ato infracional?

É possível a restrição de liberdade a estes inimputáveis em razão da idade, contudo, a


expressão "preso" não é correta ao abordarmos o menor de idade, já que ao máximo
ele será "internado", e mesmo assim, somente ao adolescente infrator.

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

Há um leque vasto de consequência pela infração cometida. A criança estará sujeito


apenas às medidas protetivas, isto porquê é adotado o sistema da absoluta
responsabilidade a elas. Já aos adolescentes é adotado o sistema de responsabilidade
parcial, ou seja, recebe, além de algumas das medidas anteriores, também poderão
ser aplicadas as socioeducativas (que inclui até mesmo a internação).

O artigo 101 do ECA descreve quais são as medidas protetivas:


Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade
competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:
I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;
II - orientação, apoio e acompanhamento temporários;
III - matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino
fundamental;
IV - inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e
promoção da família, da criança e do adolescente; (Redação dada pela Lei nº 13.257,
de 2016)
V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar
ou ambulatorial;
VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a
alcoólatras e toxicômanos;
VII - acolhimento institucional; (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
VIII - inclusão em programa de acolhimento familiar; (Redação dada pela Lei nº 12.010,
de 2009) Vigência
IX - colocação em família substituta. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência

Percebam que a ideia das medidas protetivas é a manutenção do convívio familiar


harmônico ao menor de 12 anos. Tais medidas podem ser aplicadas de forma isolada
ou cumulativa e, da mesma forma, podem ser substituídas a qualquer tempo,
observadas as formalidades necessárias e desde que necessárias ao bom
desenvolvimento deste menor, podendo ser aplicada pelo Conselho Tutelar ou por um
Magistrado.

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

A título de curiosidade, destaca-se que tais aplicações não estão restritas somente ao
cometimento de atos infracionais, já que há mais duas possibilidades à aplicação:

Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que
os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:
I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;
III - em razão de sua conduta.

Já as medidas socioeducativas são aplicadas exclusivamente a aqueles com 12 anos


completos até 18 anos incompletos, ou seja, aos adolescentes, e exclusivamente após
a prática de atos infracionais.

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar
ao adolescente as seguintes medidas:
I - advertência;
II - obrigação de reparar o dano;
III - prestação de serviços à comunidade;
IV - liberdade assistida;
V - inserção em regime de semi-liberdade;
VI - internação em estabelecimento educacional;
VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

Tais medidas são de natureza puramente pedagógica, contudo, observamos que estas
são as que mais se assemelham a uma sanção penal que temos no ECA. Merece
destaque também a possibilidade de aplicação das medidas protetivas de I a VI do
artigo 101 da legislação específica.
A aplicação desta será feita por um juiz competente após cumprida as formalidades,
levando em conta a gravidade da infração cometida, conforme preceitua o primeiro
parágrafo do referido artigo.

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

5) Caso o adolescente necessite ficar internado, poderá ser no mesmo estabelecimento


prisional dos demais detentos adultos?

A internação é a medida mais próxima da prisão que é aplicada aos adultos, contudo,
é necessário observar algumas regras previstas junto ao artigo 185 do ECA:
Art. 185. A internação, decretada ou mantida pela autoridade judiciária, não poderá ser
cumprida em estabelecimento prisional.
§ 1º Inexistindo na comarca entidade com as características definidas no art. 123, o
adolescente deverá ser imediatamente transferido para a localidade mais próxima.
§ 2º Sendo impossível a pronta transferência, o adolescente aguardará sua remoção
em repartição policial, desde que em seção isolada dos adultos e com instalações
apropriadas, não podendo ultrapassar o prazo máximo de cinco dias, sob pena de
responsabilidade.

Como regra, o menor infrator deverá ser internado em estabelecimento próprio (a


chamada “Fundação Casa”), na Comarca em que cometeu o delito. Contudo, caso este
não disponha de tal, deverá ir para estabelecimento próprio em Comarca próxima.

Há, porém, um único (e específico) caso ao qual poderá o adolescente ficar no mesmo
estabelecimento dos adultos: Na ausência de estabelecimento próprio na mesma
Comarca ou em proximidades, poderá este ser recolhido a um presídio “comum”,
contudo, pelo prazo máximo de cinco dias e separado dos adultos, conforme
estabelece o § 2º do referido artigo.

6) Os pais podem ser punidos pelo ato infracional do menor?

A resposta é negativa, já que em nosso ordenamento jurídico vigora o princípio


constitucional da intranscendência, ou seja, a pena não será cumprida por ninguém
além do infrator:

Art. 5º, XLV (CF/88)- nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a
obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da
lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

patrimônio transferido;

Portanto, a responsabilidade penal não pode ser atribuída a outra pessoa que não o
condenado criminalmente (no caso do menor, o ato infracional). Contudo, a reparação
do dano pode ser suportada por outrem, já que esta é responsabilidade de outra
natureza (cível).

Há uma única "exceção" ao caso: Caso os pais desse menor de algum modo criem
uma situação diante de uma ação imprudente, negligente ou imperita (elementos da
culpa), poderá responder pelos chamados crimes comissivos por omissão (ou
omissivos impróprios), previstos no artigo 13, § 2º, do Código Penal, sendo estes
processados pela Vara Criminal e o menor de idade pela Vara da Infância e da
Juventude. Um exemplo para isso é de um pai policial militar que empresta a sua arma,
com munição, para seu filho brincar, e este acaba atirando no vizinho, que acaba
falecendo (neste caso, com a eventual imputação da alínea c do parágrafo acima
referido). A situação é rara e extremamente específica, mas não impossível, em vista
que já tivemos situações semelhantes envolvendo tal circunstância.

7) Como se apura um Ato Infracional?

O trâmite para a apuração do ato infracional está descrito a partir do artigo 171 do ECA.
Para melhor didática, separaremos em dois tópicos:
a) Caso a criança ou o adolescente não estejam em estado de flagrância (vide
Código de Processo Penal): Neste caso, a autoridade policial determinará o registro
do fato através de Boletim de Ocorrência (notitia criminis), colhendo a oitiva dos
presentes ali sobre os fatos, já que há a necessidade de indícios de participação do
adolescente na prática de ato infracional para prosseguir com as investigações.
Em eventual apresentação também do adolescente (raro são os casos em que é
apresentado este em estado de não-flagrância), este será liberando após também ser
ouvido, mediante termo de entrega aos pais ou responsável, ou, na ausência destes,
ao Conselho Tutelar ou Juiz.

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

A partir de então, se instaurará um procedimento investigatório, batizado na praxe


policial como Auto de Investigação de Ato Infracional (AIAI), muito parecido com
Inquérito Policial dos crimes.

Ao final das investigações, será encaminhado ao representante do Ministério Público


relatório das investigações e demais documentos para eventual representação
(“denúncia”).

b) Situações que há flagrância do menor de idade: O menor será, desde logo,


encaminhado à autoridade policial competente (em regra uma especializada no
assunto, contudo, na maioria dos casos, o encaminhamento se dá para uma Delegacia
com atribuições gerais por ausência dessas especiais em Comarcas menores).
Caso o ato infracional seja cometido mediante violência ou grave ameaça à pessoa
resultará na confecção do Auto de Apreensão em Flagrante de Ato Infracional (AAFAI),
nos termos do artigo 173 do ECA, procedimento muito semelhante ao auto de prisão
em flagrante para o adulto, contudo, sem a possibilidade encaminhá-lo em
compartimento fechado, vide artigo 178. Por outro lado, se a violência for cometida
contra objetos (ex: dano - art. 163 do Código Penal) ou contra animais (ex: maus-tratos
- art. 32. Lei 9.605/98), não será obrigatória a lavratura do Auto de Apreensão, pois se
permite a elaboração do Boletim de Ocorrência Circunstanciado (semelhante ao Termo
Circunstanciado de Ocorrência previsto na Lei nº 9.099/95).
Lavrado qualquer que seja os documentos acima, qualquer dos pais ou responsáveis
compareça ao local, o adolescente será prontamente liberado pela autoridade policial,
sob termo de compromisso e responsabilidade de sua apresentação ao representante
do Ministério Público, no mesmo dia ou, sendo impossível, no primeiro dia útil imediato,
exceto quando, pela gravidade do ato infracional e sua repercussão social, deva o
adolescente permanecer sob internação para garantia de sua segurança pessoal ou
manutenção da ordem pública, conforme prescreve o artigo 174 da legislação.

O Auto de Apreensão em Flagrante de Ato Infracional (AAFAI) já formam o


procedimento que servirá de base para manifestação do Ministério Público oferecer
eventual representação perante a Vara da Infância e Juventude, sendo desnecessária
a instauração do Auto de Investigação de Ato Infracional, abordado pouco acima.

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COMO LIDAR COM JOVENS
INFRATORES DE 14 A 16 ANOS

Eventuais diligências que o Promotor de Justiça considere imprescindíveis para instruir


o procedimento deverão ser requisitadas via ofício ao Delegado de Polícia competente.

Fato é que, não sendo caso de liberação do adolescente, este será encaminhado pelo
Delegado ao representante do Ministério Público, juntamente com cópia do auto de
apreensão, sendo procedida sua imediata e informal oitiva e, sendo possível, dos seus
pais ou responsável, da vítima e de eventuais testemunhas (art. 179 do ECA).
Em seguida, deve o promotor tomar uma das três providências previstas no
artigo 180 do ECA, isto é, o arquivamento dos autos, a concessão de remissão (perdão)
ou representar (“denunciar”) o menor ao Juiz.
Nas duas primeiras hipóteses, conforme prevê o artigo 181, será feito por termo
fundamentado pelo Parquet, que conterá o resumo dos fatos, sendo os autos conclusos
à autoridade judiciária para homologação (ato discricionário, já que poderá remeter os
autos ao Procurador-Geral de Justiça caso discorde).
Caso ação tomada seja a representação, além do dever de observar-se todas as
garantias processuais conferidas ao adulto na persecução penal, o Promotor de Justiça
desde já irá representar por alguma das medidas socioeducativas que entender
aplicável, cabendo ao juiz, nos termos do artigo 184, designar audiência de
apresentação do adolescente, decidindo, ainda sobre eventual decretação ou
manutenção da internação (que antes da sentença não pode ultrapassar 45 dias).

O adolescente e seus pais ou responsável serão cientificados do teor da representação


e notificados a comparecer à audiência, acompanhados de advogado, ratificando,
assim, as garantias constitucionais estabelecidas a todos aqueles que estão perante o
Poder Judiciário.

Portanto, em síntese, após instaurado o procedimento para aplicação de medida


socioeducativa, serão duas as oportunidades que o menor será ouvido – uma, na
audiência de apresentação (artigo 184, ECA), e outra, caso ainda seja necessário
algum esclarecimento, na audiência de continuação (artigo 186, § 4º, ECA).
Neste momento será possível à autoridade judiciária (Magistrado) conceder a remissão
ao menor, após oitiva do Ministério Público.

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Não sendo concedida, será designada a audiência em continuação, abrindo o prazo de


3 (três) dias para a defesa (constituída ou nomeada) apresentar sua resposta (defesa
prévia) aos fatos até então expostos e arrolar testemunhas capazes de corroborar com
a inocência do menor, conforme prescreve o § 3º do artigo 186 do Estatuto. Essa
audiência é similar à audiência de instrução do Processo Penal, já que será realizada
a oitiva das testemunhas da acusação e defesa, Promotor, Advogado, e, após, salvo
eventual remissão, a sentença pelo Magistrado.

Por outro lado, caso o adolescente, devidamente notificado, não comparecer,


injustificadamente à audiência de apresentação, a autoridade judiciária designará nova
data, determinando sua condução coercitiva, conforme estabelecido pelo
artigo 187 do ECA.

8) Qual o recurso cabível em eventual sentença?

Proferida a sentença de condenação ou absolvição, as partes poderão recorrer


seguindo as regras do Código de Processo Civil (sim, do CPC!), por expressa
determinação legal do Estatuto.
Todavia, diferentemente do Processo Civil, o preparo é dispensado, conforme
estabelece o artigo 198 e seguintes do Estatuto.

Conclusão

É equivocada a afirmação que menores infratores não estão sujeitos a qualquer tipo de
penalidade perante o nosso Poder Judiciário.

O que ocorre, na verdade, é que por não possuírem ainda a completa capacidade de
entender o caráter lícito ou ilícito de suas condutas, estarão sujeitas, por expressa
norma constitucional, às normas do Estatuto da Criança e do Adolescente, prezando,
acima de tudo, pelo melhor desenvolvimento possível destes.
O ECA é um marco de extrema importância em nosso ordenamento jurídico, ratificando
o objetivo do menor de idade deve ter, em regra, os mesmos direitos e obrigações
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como os demais cidadãos, mas com uma proteção especial, visando uma melhor
convivência perante a sociedade.

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6- ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

A Lei nº 8.069, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), foi criada
em 13 de julho de 1990. A norma que dispõe sobre a proteção integral à criança e ao
adolescente é bastante famosa no mundo inteiro, pela amplitude de seus preceitos e
pela forma como protege nossas crianças.

Por que foi criado?

Na década de 70, surgiu o Código de Menores, uma lei de proteção aos menores — ao
menos em teoria. De acordo com seu primeiro artigo, ele dispunha sobre assistência,
proteção e vigilância a menores de até 18 anos em situação irregular.

Fruto de uma época autoritária, visto que estávamos em plena Ditadura Militar, não
demonstrava preocupação em compreender e atender à criança e ao adolescente. De
acordo com o entendimento da época, o “menor em situação irregular é aquele que se
encontrava abandonado materialmente, vítima de maus-tratos, em perigo moral,
desassistido juridicamente, com desvio de conduta ou o autor da infração penal”.

Vê-se que não há diferenciação entre o menor infrator e o menor em situação de abuso,
o que uniformiza o afastamento deles da sociedade. Em outras palavras, o Código de
Menores objetivava apenas a punição dos menores infratores.

Constituição Cidadã

Com o advento da Constituição de 1988, também chamada de Constituição Cidadã,


difundiu-se os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, além do fomento à
participação popular. Como fruto dos movimentos sociais que realmente defendiam seus
direitos, nasceu o Estatuto da Criança e do Adolescente, que reúne normas para garantir
a tão sonhada proteção.

Qual é a sua importância?

A Constituição Federal estabeleceu a família, a sociedade e o Estado como responsáveis


pela formação e estruturação dos indivíduos, conforme dispõe o artigo 227:

 Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao


adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
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alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao


respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a
salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão.

É o reconhecimento das crianças e dos adolescentes como sujeitos de direitos


protegidos pela lei. A importância do ECA deriva exatamente disso: reafirmar a proteção
de pessoas que vivem em períodos de intenso desenvolvimento psicológico, físico, moral
e social.

Portanto, veio para colocar a Constituição em prática. Essa prática, conforme nossa Lei
Maior, dá-se pelo Estado, por meio da promoção de programas de assistência integral
à saúde da criança, do adolescente e do jovem, sendo também admitida a participação
de entidades não governamentais, mediante políticas específicas.

O que o ECA garante?

O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) é o documento que traz a Doutrina da


Proteção Integral dos Direitos da Criança, que coloca a criança e o adolescente como
sujeitos de direito com proteção e garantias específicas, como dito anteriormente. Para
que isso seja alcançado, estruturou-se em dois princípios fundamentais:

1. Princípio do Interesse do Menor: todas as decisões que dizem respeito ao menor


devem levar em conta seu interesse superior. Ao Estado, cabe garantir que a
criança ou o adolescente tenham os cuidados adequados quando pais ou
responsáveis não são capazes de realizá-los;
2. Princípio da Prioridade Absoluta: contido na norma constitucional (artigo 227), ele
estabelece que os direitos das crianças e dos adolescentes devem ser tutelados
com absoluta prioridade.

Considerando esses princípios, o ECA tenta garantir aos menores os direitos


fundamentais que todo sujeito possui: vida, saúde, liberdade, respeito, dignidade,
convivência familiar e comunitária, educação, cultura, esporte, lazer, profissionalização
e proteção no trabalho. Enfim, tudo para que possam exercer a cidadania plena.

Pela história de nosso regulamento jurídico sobre a condição do cidadão considerado


menor, foi percorrido um longo caminho, que cruzou muitas vezes com a injustiça
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colocada á frente do tratamento diferenciado que a criança e o adolescente mereciam,


e é por certo que eles precisam da devida proteção.
Não que o ordenamento legal não atendesse o que as leis e os costumes de cada
época lhe ditava, mas, mesmo com todos os rigores que eram penalizados os menores,
não suprimiram as infrações por eles praticadas, o que sempre se questionava uma
forma de procedimento judicial eficiente que atendesse esse público jovem.

O ordenamento brasileiro sofreu influência de organismo internacional em auxílio a


elaboração de legislação própria, interna, dedicada a menores, onde foi elaborado o
que hoje conhecemos como E.C.A.(Estatuto da Criança e do Adolescente), por ser
membro da ONU e aceitar as normas de suas convenções com consenso internacional.
Pelo pensamento de Focault (1997, p. 224) nos remete:

Essa governamentalidade estigmatiza e coloca estereótipos nesse jovem delinquente,


com o discurso do individuo marginalizado socialmente, que mora na favela, não
alfabetizado, sem estrutura familiar, pobre, já diagnosticado pelas ciências do saber
humano, como um potencial problema a ser corrigido.

Nesta mesma linha de raciocínio, vem também Damico (2011, p. 182) que nos lembra
que: “A norma no mesmo tempo que individualiza, remete ao conjunto dos indivíduos,
por isso, ela permite que esses indivíduos sejam comparados.”

Quando comparamos os adolescentes infratores, que são aqueles que o ECA atribui
um termo jurídico de delinquente classificando o jovem menor de 18 (dezoito) anos que
comete “crimes”, com todos os adolescentes desta mesma comunidade da sociedade,
tem-se a facilidade de excluir aquele indivíduo considerado diferente, não que seu
desvio de conduta seja considerado, pelos seus pares como algo merecedor de
repreensão, mas apenas porque ele passou do limite do aceitável.
Pelo entendimento de Souza e Espindula (2004, p. 02) que diz:

A adolescência a partir da ótica dos educadores sociais de adolescentes em conflito


com a lei propõe resultados, os quais fornecem subsídios para uma proposta de
intervenção a partir das discussões das práticas educativas cotidianas, de forma que
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haja um rompimento com a lógica de um determinismo biológico existente no modo de


os agentes de desenvolvimento social conceber a adolescência, sobretudo o
adolescente infrator.

Tem se seguido este mesmo raciocínio, que o meio ambiente que o menor encontra na
sua trajetória de convivência, influi no seu comportamento avesso a regras de
comportamento, o que lhe permite ser credenciado para pertencer aos quadros de
delinquente.

Como motivo que exemplifica este pensamento, a família, o programa escolar falho e
vários outros fatores na vida deste menor terá grande influência sobre seu futuro, pelo
que diz Gomide (2000, p. 69) que:

O método educacional (violento), a ausência de orientação e afeto devido,


provavelmente, ao problema emergente de sobrevivência com o qual o pai ou a mãe
se defrontava, o menor despreparado para assumir as funções provedoras legadas a
elas pelos pais- acrescidos da baixa autoestima, decorrente da desvalorização sofrida
em casa ou na escola, justificavam, em parte, a gradual procura da rua como meio de
sobrevivência alternativo e talvez mais promissor.

Para atender, normalizar e resgatar esse quadro formador de opinião, que influenciará,
negativamente, todo seu circulo de convivência, que o ECA indica as chamadas
medidas socioeducativas, visando a trazer a socialização a esse infrator.
Essas medidas socioeducativas fazem parte de um programa orquestrado no sentido
de política pública que visa devolver e fazer, esse adolescente infrator, entender sua
responsabilidade social e comunitária e por extensão trazer a responsabilidade aos
adolescentes que fazem parte de seu circulo de convivência.

Quando por ocasião de uma infração a lei, cometida por um menor, o ECA oferece
várias formas de recuperação do objeto jurídico violado, e entre essas formas está
medida de proteção que entende quando a criança ou o adolescente está em área de
risco, seja como vítima ou como medida protetiva á pessoa, levando em conta o artigo
106 do E.C.A.
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Art. 106. ECA nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante
de ato infracional ou por ordem escrita de autoridade judiciária competente.
Parag. único.- o adolescente tem direito à identificação dos responsáveis pela sua
apreensão, devendo ser informado acerca de seus direitos.

Com relação à criança, levando-se em conta a proteção integral e para distinguir e


definir a criança e o adolescente como seres em desenvolvimento e distintos, foi
elaborada normas diferenciadas para definir estes dois grupos, sendo apenas a medida
de proteção aplicada aos dois grupos, quando considerados grupos de riscos

Foi diferenciada a norma e a forma de aplicação, pois a criança não cabe a medida
socioeducativa, pelo critério biológico que foi adotado no campo penal, e sim aceito a
aplicação de medida de proteção à criança, com indicação em lei que define o momento
e a condição de realização de sanção, pelo art. 105 do E.C.A., cujo verbete nos leva
ao art. 101 do mesmo instituto legal, que diz: ao ato infracional praticado por criança
corresponderão as medidas previstas no art. 101”.

Urge que para dar suporte a pacificação do tema, apresenta-se a jurisprudência que
vem de instância superior, que diz: “sendo criança, por definição legal, ao menor não
se aplicam os dispositivos que regem a pratica de atos por adolescentes”.
Incabível, segundo Ishida (2015, p. 268): “Cabe tão somente as medidas do art. 101
do Estatuto, concedendo a ordem de habeas corpus. Não cabe também a detenção ou
apreensão em flagrante da criança.”

Encoraja-se a consciência dos que entendem que é matéria difícil de aplicar a letra da
lei a um caso concreto, para ser solucionado os conflitos envolvendo menores e
adolescentes, que a realidade expõe em circunstâncias nuas e cruas, e por todos os
obstáculos que o aplicador da lei ultrapassa, pois fica sempre a experiência, que aliada
a técnica de melhor interpretar a norma, se traduz em testemunho para trazer à luz, a
justiça que todos anseiam.

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REFERÊNCIAS

https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/3987/O-adolescente-infrator<acesso em
15/06/2022>

http://www.conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53615/menor-infrator-frente-aos-
desafios-na-sua-reintegrao-na-
sociedade#:~:text=A%20sociedade%20e%20a%20fam%C3%ADlia,da%20pr%C3%A
1tica%20de%20atos%20infracionais.<acesso em 15/06/2022>

https://canalcienciascriminais.jusbrasil.com.br/artigos/628629974/as-medidas-
socioeducativas-previstas-no-eca<acesso em 15/06/2022>

https://crianca.mppr.mp.br/pagina-1313.html<acesso em 15/06/2022>

https://fernando-silva5423.jusbrasil.com.br/artigos/1397150805/a-reintegracao-do-
adolescente-infrator-no-ambito-social<acesso em 15/06/2022>

https://fabiorabelloadv.jusbrasil.com.br/artigos/1139127174/o-que-e-um-ato-
infracional-e-quais-as-suas-consequencias<acesso em 15/06/2022>

https://www.tjac.jus.br/infancia-e-juventude/estatuto-da-crianca-e-adolescente-
eca/<acesso em 15/06/2022>

https://silviorussi.jusbrasil.com.br/artigos/590677371/menor-infrator-estatuto-da-
crianca-e-do-adolescente-e-as-medidas-socioeducativas<acesso em 15/06/2022>

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