Você está na página 1de 3

Faculdade de Arquitetura e Urbanismo | Universidade de São Paulo

AUH0154 | História e Teorias da Arquitetura III


Resenha 1
Julia Nariçawa | N°USP 12505454
___________________________________________________________________________

LEFEVRE, José Eduardo. Do ecletismo do fim do século ao Art-Déco e ao modernismo:


transformações espaciais da avenida São Luiz em São Paulo. In: FERNANDES, José Manuel;
PINHEIRO, Maria Lucia Bressan (Org.). Portugal, Brasil, África - Urbanismo e Arquitectura
do Ecletismo ao Modernismo. Lisboa: Caleidoscópio, 2013, pp. 69-86.

José Eduardo Lefevre é um arquiteto e urbanista graduado pela Faculdade de Arquitetura e


Urbanismo da Universidade de São Paulo, sendo atualmente professor doutor aposentado pela
mesma universidade. Durante sua vida acadêmica, dedicou-se principalmente à área de História
da Arquitetura e Urbanismo, trabalhando com temas como Preservação do Patrimônio Cultural,
Arquitetura Moderna, Ambiente Urbano, Projetos de Desenho Urbano. Atuou também como
servidor público do Município e Estado de São Paulo, trabalhando em órgãos de preservação do
patrimônio histórico, cultural e artístico.

O texto analisado de José Lefevre faz parte da produção bi-nacional do conjunto de atas do
Colóquio Internacional Portugal-Brasil-África, um evento onde se reuniram professores e
acadêmicos das mais renomadas universidades do Brasil e Portugal para debaterem, de forma
articulada, sobre três realidades geo-histórico-culturais diferentes, a partir do tema da Arquitetura
e Urbanismo dos séculos XIX e XX. A partir dessa temática, Lefevre, em seu texto, faz um
apanhado rápido sobre o processo histórico de desenvolvimento de São Paulo, desde seu
assentamento como missão jesuítica até o início do século XIX, momento que a cidade passava
por uma série de modernizações. Diante desse panorama, o autor traça uma avaliação crítica, sob
o viés da arquitetura, das transformações sofridas por um recorte reduzido, neste caso, a Rua São
Luiz, que se repetia por outras áreas do centro novo de São Paulo. Nesse sentido, através de uma
série de análises de diferentes obras arquitetônicas que foram surgindo na rua analisada, o autor
busca compreender os motivos por trás de determinadas decisões de projeto de diferentes
arquitetos que atuaram na metrópole paulistana.

Logo no início do texto analisado, Lefevre destaca a importância de identificar as temporalidades


das influências e transferências externas para compreender o processo de projeto e construção das
cidades em um determinado momento. Sob essa mesma ótica, Lefevre traz o enfoque para a
cidade de São Paulo, contextualizando a década de 1870, período de um crescimento urbano
acelerado em que assentos vernaculares (taipa de pilão) foram sendo substituídos por edifícios de
tijolos de alvenaria de barro, tipicamente ecléticos. Esses, por sua vez, a partir da década de 1930
foram dando lugar para edifícios em altura, os quais adotaram elementos do Modernismo e do Art
Deco.
A fim de analisar essas mudanças ocorridas da arquitetura brasileira, o autor faz uma
contextualização histórica e geográfica sobre o processo de desenvolvimento de São Paulo,
trazendo importantes referências de estudiosos como o geógrafo Aziz Ab’Saber, o historiador de
arquitetura Carlos Lemos, como também do arquiteto Benedito Lima de Toledo.
Lefevre inicia, então, sua linha de raciocínio temporal discorrendo sobre o assentamento jesuítico,
em um local de topografia estratégica e no entroncamento de caminhos fluviais e terrestres
indígenas, do qual no futuro se originou a cidade de São Paulo. Mais adiante, salienta que foi
apenas com a cultura do açúcar e do café em meados do século XIX que São Paulo passou a
crescer mais rapidamente, o que implicou quase diretamente em transformações na arquitetura da
cidade e no desaparecimento das construções e dos traçados urbanos anteriores ao século XIX.
Em decorrência do crescimento da riqueza do café, aliado a uma série de outros fatores, a partir
da segunda metade do século XIX houve um boom de industrialização na cidade, trazendo para
cidade famílias mais abastadas de outras regiões do país.
A partir desse panorama, na tentativa de avaliar as transformações arquitetônicas sofridas pelo
centro novo de São Paulo, Lefevre escolhe a Rua São Luiz como recorte de análise. Nesse
raciocínio, o autor escolhe diferentes edifícios que foram surgindo nessa rua, sobretudo entre o
final do século XIX e meados do século seguinte, buscando compreender determinadas soluções
projetuais de diferentes arquitetos frente ao desafio de construir em meio a uma paisagem já
edificada.
Lefevre inicia sua análise discorrendo sobre os primeiros palacetes da rua São Luiz construídos
nas duas últimas décadas do século XIX, a partir do loteamento da Chácara Velha pertencente ao
Brigadeiro Luiz Antônio. As residências, cuja linguagem era eclética e eram inspiradas em
palacetes europeus, foram construídas com tijolos e materiais importados, além de serem soltas
no lote, com amplos jardins e quintais. Ainda, até a década de 1930, diversos outros palacetes
ecléticos foram construídos nessa rua.
Ele segue seu raciocínio destacando que, a partir de 1930, com o desejo pela modernização,
houve uma intensificação da verticalização e do alargamento das ruas da área central de São
Paulo. As antigas casas, implantadas em lotes gigantescos, passaram a ser substituídas por
edifícios grandes em altura que apresentavam linguagens arquitetônicas diversificadas, como Art
Déco, Modernismo e alguns resquícios do Ecletismo. Entretanto, a partir da década de 1950, os
novos edifícios construídos são, em sua maioria, modernos.
Lefevre discorre, então, sobre seis edifícios, dando destaque às dificuldades de aplicar cinco os
princípios modernos, pensado para blocos isolados para novos edifícios a serem inseridos na
cidade já construída. Tais princípios, delineados por Le Corbusier (1926), seriam estruturas
independentes, pilotis, janelas em fita, terraço jardim e planta livre.
Nesse ínterim, o primeiro exemplo que o autor traz é projeto dos arquitetos Álvaro Vital Brazil e
Adhemar Marinho para uma grande gleba que foi dividida em dois lotes por uma rua. De um lado
do lote, o Edifício Esther (1936-1938), um bloco totalmente isolado que cumpria os princípios de
Le Corbusier, sendo o primeiro prédio moderno de São Paulo e para o outro, um prédio que
arremata a volumetria da quadra, o Edifício Arthur Nogueira. Ainda, ambas as construções
apresentavam elementos de Art Déco.
A próxima construção analisada por Lefevre é a Biblioteca Municipal Mário de Andrade,
(Jacques Pilon, 1938-1941), construída onde ficava a sede da Chácara Velha. Lefevre destaca a
situação de destaque do edifício, devido principalmente a sua implantação em um terreno grande,
de forma afastada das demais construções o que permitia que fosse visto por todos os lados.
Já o edifício Moreira Salles, outro prédio moderno, do arquiteto modernista Gregori
Warchavchik, substitui duas casas geminada da rua São Luiz e teve seu projeto condicionado
tanto pela localização do lote no meio da testada da quadra, quanto pela legislação urbanística
vigente, combinado com a tentativa de aplicação dos princípios modernos. Lefevre ressalta a
opção de Warchavchik por uma solução formalista de combinar elementos de vidro em balanço
com uma alvenaria mais recuada.
Mais a frente, o autor traz o foco para o Edifício Ouro Preto do arquiteto Franz Heep. Lefevre
destaca a qualidade do projeto desse prédio residencial de médio-alto padrão, ressaltando
aspectos como a rigorosidade funcional e a formalidade bem resolvida, que respeita sempre os
recuos exigidos por lei.
Ademais, uma antiga construção entre a Rua São Luiz e a Praça D. José Gaspar deu lugar ao
Conjunto Metropolitano, um projeto que, segundo Lefevre, destaca-se por sua exímia inserção na
paisagem. Isso ocorreu pela constante preocupação com a manutenção da visibilidade integral,
questão que motivou diversas decisões projetuais, como a incorporação dos volumes das caixas
d’águas e das torres de elevador ao volume do edifício.
Por fim, o sexto e último marco arquitetônico da Rua São Luiz, analisado pelo autor, é o Edifício
Itália (1953), construído no local de uma das residências de uma importante família Paulista.
Desenvolvido por Franz Heep, a expressiva monumentalidade do prédio, tanto em altura como no
quesito de inserção na paisagem, carrega consigo uma carga simbólica para a coletividade italiana
em São Paulo.
Por fim, Lefevre reforça que o cenário fervoroso de transformações e confluências pelo qual a
cidade de São Paulo estava passando durante os séculos XIX e XX contribuiu para a grande
diversidade de manifestações de estilos arquitetônicos na cidade. Nesse sentido, conclui que
através dos exemplos selecionados por ele, é possível perceber a engenhosidade e criatividade
dos arquitetos frente a dificuldade de projetar uma arquitetura de qualidade conforme intenções e
necessidades específicas.

Pode-se perceber, ao longo da leitura do texto, que Lefevre se valeu de uma gama diversa de
fontes de pesquisa para desenvolver, trazendo uma bibliografia rica que aborda diferentes campos
acadêmicos como Geografia, História da Arquitetura e do Urbanismo, História do Brasil. Além
do mais, Lefevre, com objetivo de quantificar alguns processos históricos, traz dados estatísticos
fornecidos pelo IBGE. Ainda, a iconografia encontrada foi retirada de acervos como o
LAP-FAUUSP, o Círculo Italiano e o C.S.B. Julien. Outras imagens, como a fotografia do
Conjunto Metropolitano, foi tirada pela Agência do jornal O Estado de São Paulo, assim como
outras fotos foram tiradas pelo também professor da FAUUSP, Hugo Segawa.
Tratando mais especificamente sobre a bibliografia, durante o panorama sobre surgimento e
desenvolvimento de São Paulo, Lefevre faz referência a obras de importantes estudiosos para
embasar seu raciocínio, tais como os geógrafos Aziz Ab’Saber, Aroldo Azevedo; historiadores
como Maria Thereza Petrone e também os historiadores de arquitetura e urbanismo, como Carlos
Lemos, Maria Cecília Homem, etc.

Você também pode gostar