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CCH – 12º ano

Ano letivo 2022-2023

RESUMO CRÍTICO DE Memorial do Convento, de José Saramago

Capítulo I: Caraterização das personagens reais – descrição altamente caricata do ato


sexual entre o rei e a rainha, cuja relação protocolar e sem amor sai ridicularizada; o rei
promete a frei António de S. José - que se faz passar por virtuoso e milagreiro -
construir um convento para franciscanos, em Mafra, caso a rainha engravide e dê à luz,
no prazo de um ano. O capítulo termina com os sonhos de ambas as personagens reais: a
rainha tem mais um sonho erótico com o cunhado, o infante D. Francisco, e o rei sonha
que é descendente de Jesus e que, por isso, o convento se tornará realidade.
Capítulo II: Narração de milagres vários, com o intuito de demonstrar que a conceção
da rainha não foi milagre, como quiseram fazer parecer os franciscanos, principais
interessados na construção de um convento, em conluio com a rainha, que, pela religião
tudo faz, inclusive esconder o segredo ao rei, seu marido.
Capítulo III: Depois do Entrudo, época de excessos, vem a Quaresma, época de
mortificações, e é com a descrição da procissão de penitência que o narrador nos traça
um retrato “da pocilga que é Lisboa”. O retrato que o narrador nos dá do povo é de
completa alienação, uma vez que numa manifestação de cariz religioso, abundam sinais
de erotismo e sexo em tudo contrários à mortificação da carne. Tais desbragamentos
estão, contudo, vedados às rainhas, e, nomeadamente, a D. Maria Ana, que está grávida
e se deitou cedo, sonhando, mais uma vez com o que lhe é proibido na vida real: com o
infante, seu cunhado, que “de cada vez chega mais perto”.
Capítulo IV: Apresentação de Baltasar Mateus, o Sete-Sóis, que foi expulso da guerra
contra os espanhóis, por nela já não ter serventia, desde que ficou sem a mão esquerda,
que teve de ser amputada pelo pulso. Para suprir a falta da mão, Baltasar manda fazer
um espigão e um gancho a um ferreiro e assim se mete ao caminho em direção a Lisboa,
onde trava amizade com outro antigo soldado, João Elvas.
Capítulo V: Descrição do auto de fé em que Baltasar conhece o Padre Bartolomeu
Lourenço de Gusmão e Blimunda, Sete-Luas, que ali foi despedir-se de sua mãe,
Sebastiana Maria de Jesus, condenada a ser açoitada em público e a oito anos de
degredo, por supostas atividades de feitiçaria e por ser marrana. Mais uma vez – à
semelhança da procissão da Quaresma – há lugar para a descrição de um povo alienado,
cujo comportamento envergonha o narrador, embora mais forte seja a crítica à
Igreja/Inquisição e às suas práticas cruéis de condenação e tortura de inocentes. É neste
capítulo que o narrador nos apresenta o encontro entre Baltasar e Blimunda como algo
predestinado, daí que a primeira relação sexual tenha lugar pouco tempo depois do
conhecimento. O capítulo termina com Blimunda a prometer a Baltasar que “nunca o
olhará por dentro”, sem que, no entanto, aquele saiba ainda o que quer ela dizer.
Capítulo VI: Baltasar tenta perceber a cor dos olhos de Blimunda, misteriosos como
misteriosa é a personagem. Caraterização do Padre Bartolomeu Lourenço, cuja alcunha,
“O Voador”, é explicada pelo seu intento de construir um artefacto que permita ao
homem voar. Assim se tornara amigo de Sebastiana Maria de Jesus, que procurara na
esperança de os seus poderes o poderem ajudar na sua empresa. Baltasar tenta saber
pelo Padre qual a razão por que Blimunda come pão antes de abrir os olhos, pela manhã,
mas somente fica a saber que é um “mistério maior do que voar”. O Padre convida
Baltasar a acompanhá-lo a São Sebastião da Pedreira, onde está a máquina de voar, “a
passarola”; lá chegados, o Padre propõe a Baltasar que o ajude a construí-la, ao que este
anui, após ficar convencido de que, mesmo sem a mão esquerda, conseguirá fazê-lo,
uma vez que o próprio Deus é maneta da mesma mão, como lhe diz o Padre. Com esta

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comparação entre Deus e Baltasar, o narrador começa a construir o percurso de
descrença do Padre Bartolomeu Lourenço em relação aos dogmas da religião e a Deus.
Capítulo VII: Descrição jocosa da gravidez da rainha e do nascimento da Infanta,
Maria Xavier Francisca Leonor Bárbara, que foi a batizar no dia de Nossa Senhora do
Ó. Os festejos são grandiosos e na sua preparação está Baltasar que, ao fim do dia, vai
assistir às luminárias com Blimunda, que lhe segura a mão direita, enquanto os reis
assistiram à missa, cada um em sua cadeira - a dele mais alta que a dela - sem que, entre
eles tivesse havido um gesto de carinho e proximidade como os que existem entre
Baltasar e Blimunda. Morte de frei António de S. José, num dia que não ficou na
história, apesar de ter sido ele a convencer o rei a construir o convento.
Capítulo VIII: Descrição da vida em comum entre Baltasar e Blimunda. Baltasar
descobre o segredo de Blimunda: a capacidade de ver as pessoas por dentro. Incrédulo
com a revelação, aceita sair com Blimunda, no dia seguinte, e finalmente percebe o que
lhe quis ela dizer no dia em que se conheceram, quando lhe prometeu nunca o olhar por
dentro. Em seguida, o narrador apresenta-nos o infante D. Francisco numa das suas
distrações prediletas: disparar contra os marinheiros que trabalham nos barcos, ferindo e
matando por puro desporto. O intuito é claramente crítico em relação a uma nobreza
ociosa, cuja prepotência e crueldade faz dela uma classe desprezível, mas não se fica
por aqui, estendendo também a sua crítica ao clero, cujos vícios carnais são em tudo
contrários ao juramento de abstinência sexual que prometeram respeitar e seguir. Destas
considerações profundamente críticas escapa, porém, o povo, cujas más ações são
justificadas pelo narrador, nomeadamente quando fala dos soldados que se passam para
o lado do inimigo castelhano, por uma questão de sobrevivência. Chegada do cardeal D.
Nuno da Cunha, rodeado do luxo mais ostensivo e de um séquito desnecessariamente
numeroso que o leva à presença do rei, de quem receberá o barrete cardinalício vindo
expressamente de Roma pelas mãos de um enviado do Papa. Entretanto, Baltasar
continua à espera da sua tença, que nem com a intercessão do Padre Bartolomeu
Lourenço se concretiza. Nascimento do segundo filho do casal real – o infante D. Pedro
- batizado pelo recente cardeal. O final do capítulo leva-nos a Mafra com o rei, que ali
vai escolher o lugar onde será erigido o convento: o Alto da Vela. Com a palavra
“Oremos” se encerra este capítulo, como se o narrador/autor, descrente, necessitasse de
exorcizar o Mal que se lhe entranhou na pele, depois de ter descrito a desumanidade, a
vaidade e os vícios das duas classes que mais poder detêm sobre a vida dos que nada
podem.
Capítulo IX: Baltasar e Blimunda vão viver para a abegoaria da Quinta de S. Sebastião
da Pedreira, onde o narrador nos põe ao corrente do dia a dia de trabalho do casal, bem
assim como do amor que os une, em tudo diferente da relação entre D. João V e D.
Maria Ana. É aqui que percebemos as alcunhas de ambos, dadas pelo Padre Bartolomeu
Lourenço: Sete-Sóis, porque vê às claras; Sete-Luas, porque vê às escuras. É também
aqui que sabemos que o rei mantém relações extra-conjugais com freiras de mosteiros e
que as engravida. Entretanto, a passarola vai ganhando forma, mas, para voar, o Padre
terá de se deslocar à Holanda para adquirir éter, a substância sem a qual o seu sonho não
se realizará. Pausa para a narração de um episódio caricato de um motim desencadeado
pelas freiras de Santa Mónica, em protesto contra o decreto real que as proíbe de receber
outros homens que não os seus familiares, para assim pôr cobro aos comportamentos
escandalosos que são falados e recriminados por toda a capital do reino. Todavia, as
freiras saem vitoriosas da contenda, aproveitando o narrador para, mais uma vez,
exercer crítica social, embora desculpabilizando as freiras que só pecam porque são
obrigadas a professar, salvaguardando assim a estrutura social vigente, sempre a favor
do homem. No seguimento deste episódio acontece mais um auto de fé, em que o

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narrador enumera os “pecados” dos condenados, querendo demonstrar que pecados não
são, mas virtudes, embora não para o Santo Ofício. Partida do Padre Bartolomeu
Lourenço para a Holanda e de Baltasar e Blimunda para Mafra, onde ficarão enquanto o
Padre estiver ausente. De passagem por Lisboa, assistem a uma tourada e, de
madrugada, partem enfim para Mafra.
Capítulo X: Chegada do casal a Mafra, a casa dos pais de Baltasar – João Francisco e
Marta Maria – onde ficam a viver. A irmã de Baltasar, Inês Antónia, e seu marido,
Álvaro Diogo, vêm visitá-los, trazendo os dois filhos. A propósito do mais novo – o
“anjinho” – que ficamos a saber que morrerá em três meses, o narrador aproveita para
estabelecer a comparação entre o seu funeral e o do infante D. Pedro, que também
morrerá: o que prevalece é, mais uma vez, a fraternidade, a união e o amor entre os
familiares do primeiro – membros do Povo – e o protocolo, a frieza e o distanciamento
entre os do segundo – membros da nobreza –, tal como vemos acontecer entre o casal
popular e o casal real. Entretanto, o narrador concentra a sua atenção na rainha, “devota
parideira”, solidarizando-se, porém, com a sua condição de enganada, que a impede de
frequentar o Convento de Odivelas, que é onde está a amante do marido, Madre Paula.
Aquele, por sua vez, anda doente, e, para se curar, vai para Azeitão, não deixando,
porém, que sua mulher o substitua no governo do reino. Na ausência do rei, o infante D.
Francisco faz a corte à rainha, que, finalmente percebe que o cunhado não a ama e que
só a quer para ser rei, caso o irmão morra. Assim se acabam os sonhos eróticos da
rainha com o cunhado.
Capítulo XI: Regresso do Padre Bartolomeu Lourenço da Holanda, após três anos de
ausência. Passadas algumas semanas, parte para Coimbra para completar os seus
estudos, passando por Mafra, para encontrar Baltasar e Blimunda, e é então que lhes
explica o que aprendeu sobre o éter: dentro de cada homem existe vontade e alma; esta
retira-se com a morte, enquanto a vontade, ou se separa do homem, estando ele vivo, ou
se separa dele com a morte, e é a vontade que é o éter. Assim, pede a Blimunda que,
com o poder que tem de ver as pessoas por dentro, faça a recolha das vontades,
explicando-lhe que, para o fazer, terá de abrir um frasco que contém âmbar amarelo,
substância que atrai o éter, enquanto a Baltasar pede que construa a máquina. Depois de
estas missões cumpridas, encontrar-se-ão para, enfim, voarem.
Capítulo XII: Baltasar e Blimunda decidem que vão voltar para Lisboa, depois da festa
de lançamento da primeira pedra do convento, para a qual virá o rei em pessoa.
Blimunda, depois da missa onde foi em jejum, retira-se para o campo e aí confessa a
Baltasar, que a seguiu, que viu na hóstia uma vontade humana, pelo que conclui que o
mistério da morte e ressurreição de Cristo não tem lógica, numa clara indicação do
ateísmo do autor/narrador. No dia da inauguração – 17 de Novembro de 1717 – Baltasar
e Blimunda conseguem entrar na igreja construída propositadamente para o dia e ver o
rei a lançar a primeira pedra. Uma semana depois, partem para Lisboa e para a
abegoaria, a fim de levar a cabo as tarefas de que o Padre os incumbira.
Capítulo XIII: Baltasar e Blimunda constroem uma forja e o Padre arranja os foles que
serão precisos para elevar a máquina, juntamente com duas mil vontades, que Blimunda
terá de recolher. Assim, aconselha-a a ir à procissão do Corpo de Deus, onde haverá
uma grande multidão, podendo, por conseguinte, recolher muitas vontades. Descrição
da procissão, em que o rei fala da sua amante, Paula, uma esposa do Senhor, que
“serve” a el-rei.
Capítulo XIV: Regresso do Padre Bartolomeu Lourenço, agora também de Gusmão,
formado em cânones, de Coimbra. Fica a viver nas varandas do Terreiro do Paço e vai
amiúde ao paço, prometendo ao rei que, um dia, voará. Enquanto lá está, assiste à lição
de música de D. Maria Bárbara, com nove anos, que aprende a tocar cravo com um

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professor italiano, vindo expressamente de Londres: Domenico Scarlatti. O Padre
Bartolomeu Lourenço e Domenico Scarlatti tornam-se amigos, e vão juntos a S.
Sebastião da Pedreira, ficando o italiano na posse do segredo da passarola. Após a
partida do músico, o Padre ensaia o sermão que proferirá na festa do Corpo de Deus,
indo-se apercebendo, a pouco e pouco, que o que diz é contrário aos ensinamentos
cristãos, nomeadamente, ao sugerir que o homem é Deus porque o tem dentro de si – é o
padre a medir forças com o divino, na sua caminhada de descrença.
Capítulo XV: Domenico Scarlatti traz um cravo para a abegoaria e, enquanto Baltasar e
Blimunda trabalham, toca. Um dia, o Padre Bartolomeu chega à quinta, dizendo que
grassa uma grande doença em Lisboa, havendo já morrido muita gente; então sugere a
Blimunda que vá, com muito cuidado, recolher as vontades dos que se vão, ao que esta
acede, embora Baltasar não a deixe fazê-lo sozinha. Ao fim de um mês, tinham
recolhido mil vontades, pelo que a Blimunda lhe é entregue o segundo frasco que
elevaria a outra esfera, mas, após o fim da epidemia, Blimunda cai doente. Durante a
estranha doença, Domenico Scarlatti vem muitas vezes à quinta até que, um dia, pega
no cravo e toca-o toda a noite e ao longo de uma semana. Lentamente, começa
Blimunda a renascer para a vida, até que, finalmente se cura. Entretanto, como o Padre
deixara de aparecer por receio de ter sido ele o culpado da enfermidade de Blimunda ao
mandá-la recolher vontades em meio a uma epidemia, o casal vai a Lisboa em busca
dele, encontrando-o transtornado. Dão-lhe, porém, a notícia de que a máquina está
pronta, as vontades recolhidas e de que só faltará pô-la a voar. O Padre, como que
receoso de que alguém os oiça, diz-lhes que irão experimentar a máquina antes de
mostrar ao rei o seu invento, prometendo-lhes que em breve irá à quinta para que tal se
realize. No final do capítulo, ao pedido de Blimunda para que o Padre os abençoe,
responde ele que não o pode fazer, dado que não saberia em nome de que Deus o faria,
parecendo, assim, que, atingido o fim da tarefa a que se propôs, chega também ao fim a
sua fé.
Capítulo XVI: O capítulo inicia-se com críticas à Inquisição e com a morte do infante
D. Miguel, irmão do rei, quando vinha da caça com o infante D. Francisco que, na
opinião do narrador, era quem deveria ter morrido. Fica a saber-se que el-rei perdeu
uma acção contra o Duque de Aveiro, pelo que vai ter de lhe restituir vários bens, entre
eles, a quinta de S. Sebastião da Pedreira, onde está a passarola. Ficam os três
preocupados, sobretudo o Padre que sente o cerco do Santo Ofício a fechar-se sobre ele.
De facto, a meio de setembro, depois de uma longa ausência, o Padre aparece,
transtornado, dizendo que têm de fugir do Santo Ofício e, para tal, há que dar os últimos
retoques na máquina. Feitos os preparativos, a máquina eleva-se nos ares com os seus
três artífices dentro – a Santíssima Trindade Terrestre: Pai (Padre Bartolomeu
Lourenço), Filho (Baltasar) e Espírito Santo (Blimunda). Assim voam sobre o mar,
sobre Lisboa, sobre a abegoaria, onde fabricaram a máquina, sendo avistados por
Domenico Scarlatti, que os vê levantar voo e desaparecer no ar. Por precaução, lança o
cravo pelo qual tocara, a um poço, de forma a que ninguém viesse a saber do que ali se
passara. Entretanto, a máquina sobrevoa Mafra e é avistada pelos que trabalham nas
obras do convento, instalando uma enorme confusão. No entanto, o Padre sabe que,
quando o sol se puser, a máquina cairá, violentamente, mas, quando tal começa a
acontecer, Blimunda, primeiro, e Baltasar, depois, cobrem as esferas com o seu próprio
corpo e assim a passarola desce, suavemente, poisando numa serra que, na altura,
nenhum sabe qual será. Blimunda e Baltasar comem do que trazem no alforge, mas o
Padre, estranho e silencioso, não partilha da refeição. É quando, já adormecidos,
acordam de um pesadelo e veem o Padre a deitar fogo à máquina; correndo para ele,
conseguem evitar a destruição da passarola, que o Padre justifica, dizendo: “Se tenho de

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arder numa fogueira, fosse ao menos esta.”; depois disso, desaparece e não mais o
encontram. Baltasar e Blimunda, no dia seguinte, resolvem deixar a máquina escondida
por ramos e descem a serra, que ficam a saber por um pastor que é a Serra do
Barregudo, e que o monte é Monte Junto. Levam dois dias a chegar a Mafra, porque têm
de fazer crer, aos que os veem, que vêm de Lisboa. Chegados a Mafra deparam-se com
uma procissão de agradecimento a Deus pelo prodígio de ter feito o Espírito Santo voar
por sobre as obras da Basílica…
Capítulo XVII: Álvaro Diogo, cunhado de Baltasar, acompanha-o às obras do
convento, para o ajudar a arranjar trabalho nela, e, após algumas hesitações do capataz
devido ao facto de Baltasar não ter uma mão, este é aceite nos carrinhos de mão. Segue-
se uma descrição dos trabalhos de construção e das condições deprimentes em que os
trabalhadores são obrigados a viver, ainda por cima, longe das suas terras. Num dia de
descanso na obra, Baltasar vai a Monte Junto ver a máquina de voar, encontrando-a na
mesma. Um dia, ao voltar do trabalho, encontra Blimunda agitada, dizendo-lhe que o
senhor “Escarlate” está em casa do visconde. O músico tinha vindo, afinal, contar-lhes
que o Padre Bartolomeu morrera em Toledo, louco, mas encoraja-os a continuar a
cuidar da passarola. No seu regresso a Lisboa, Baltasar e Blimunda vão despedir-se dele
ao caminho, e em todos os três há uma grande tristeza.
Capítulo XVIII: O capítulo inicia-se com a descrição, em tom de ironia, da “extrema
riqueza” que o rei D. João V possui e que faz dele um “imperador” maior do que o foi o
Infante D. Henrique, que teve, “deveras, o globo mundo na mão”. O rei medita sobre os
custos da obra e conclui que os materiais e os artistas virão da Europa, já que de
Portugal só pode vir a pedra, o tijolo, a lenha para queimar e a força bruta, e tudo em
prol da Santa Madre Igreja e da admiração do mundo. Noutro mundo, encontramos
Baltasar e Blimunda e é que o primeiro deu em beber desde que soube da morte do
Padre e por se lembrar da passarola que talvez já tenha sido encontrada por
contrabandistas ou pastores. É também a este mundo que pertencem os companheiros de
Baltasar, que, cada um à vez, vão contando as vidas miseráveis que levaram e levam
agora, enquanto trabalhadores nas obras do convento: Francisco Marques, José
Pequeno, Joaquim da Rocha, Manuel Milho, João Anes e Julião Mau-Tempo.
Capítulo XIX: Descrição das dificuldades inerentes aos trabalhos de construção do
convento. Baltasar, entretanto, sobe de posto e conduz agora uma junta de bois, ao lado
de José Pequeno. É então que sobrevém a notícia de que é preciso ir a Pêro Pinheiro
buscar uma “pedra muito grande, destinada à varanda que ficará sobre o pórtico da
igreja” – “a varanda da casa a que se chamará Benedictione” – para o transporte da qual
serão necessárias “duzentas juntas de bois, muitos homens e mais de vinte carros para
levar os petrechos para a condução”. O narrador enumera, então, os nomes daqueles que
irão executar tal empresa, numa homenagem aos esquecidos da história oficial, e, num
dia de calor, em Julho, parte a comitiva para Pêro Pinheiro. Lá, veem a pedra que o
narrador descreve, pormenorizadamente, e à qual Manuel Milho chama “a mãe da
pedra”. Começam os preparativos para colocar a pedra no carro chamado “nau da
índia”, porque, para tal pedra é preciso um carro de grande capacidade, mas a viagem
começa mal, pois um trabalhador, distraído, deixa ficar o pé debaixo da roda. Colocar a
pedra no carro leva o dia todo e no primeiro dia de viagem não se avança mais do que
quinhentos metros. À noite, antes de dormirem, Manuel Milho começa a contar uma
história sobre uma rainha e um ermitão, que o narrador vai intercalando com as agruras
do transporte da pedra: o mistério da história adensa-se, assim, à medida que aumentam
as dificuldades da viagem, de tal maneira que, a certa altura, diz o narrador: “Deve-se a
construção do convento de Mafra ao rei D. João V, … vão aqui seiscentos homens… e
eles é que pagam o voto, que se lixam,…”. A certa altura, surge uma curva que exige tal

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esforço dos homens que – nas palavras do narrador que assim critica violentamente os
poderosos – até o diabo, que assiste, pasma “da sua própria inocência e misericórdia por
nunca ter imaginado suplício assim para coroação dos castigos do seu inferno”. E é aqui
que acontece a morte de Francisco Marques, que, distraído por um momento, fica
debaixo do carro; em seguida, a plataforma parte as pernas a dois animais que têm de
ser mortos à machadada, mas estes, felizmente, servem de refeição a quem dela precisa.
Baltasar e os amigos de Francisco Marques vão velar o seu corpo, à noite, e, no dia
seguinte, como se nada se tivesse passado, prossegue a viagem até Mafra que, ao todo,
durou oito dias, tal como a história de Manuel Milho. No entanto, ninguém percebe a
lógica da história, uma vez que não se sabe o que acontece às personagens, tal como
Baltasar também não vê lógica na necessidade de uma pedra tão “grande” para uma
basílica tão “pequena”, visto que o objeto da vontade de um rei não se compara ao
trabalho esgotante de um povo que, para o servir, passa agruras maiores do que as que o
diabo tem no inferno, e, enquanto isso, o primeiro fica na história e o segundo para
sempre esquecido.
Capítulo XX: Baltasar resolve ir inspecionar a máquina de voar à Serra do Barregudo,
mas, desta vez, Blimunda acompanha-o, daí que Baltasar tenha de alugar um burro para
que a caminhada, que é dura, não custe tanto à mulher. Ao pai, João Francisco, que está
à morte, Baltasar revela aonde vão, explicando-lhe que foi a máquina de voar que foi
vista em Mafra, e não o Espírito Santo, ao que o pai responde que acredita. Lá
chegados, consertam a máquina e, na manhã seguinte, regressam por outros caminhos,
de forma a não correrem riscos – este episódio é pleno de lirismo, de poesia e de
emoção, pela descrição da comunhão plena dos corpos e destes com a beleza exuberante
da natureza que, com a Primavera, explode de perfumes e de cores. Num dia igual a
tantos outros, ao chegarem do trabalho os homens, morre João Francisco, após dar a sua
bênção ao filho.
Capítulo XXI: O capítulo inicia-se com o rei contemplando a miniatura da Basílica de
S. Pedro em Roma e a meditar na possibilidade de construir, em Portugal, uma igual.
Para saber dessa possibilidade, chama o arquiteto de Mafra, João Frederico Ludovice,
que, mais realista do que o rei, o aconselha a não empreender tal empresa, pois que
levará tanta fazenda e tantos anos de construção que, por certo, nem el-rei nem os filhos
nem os netos, bisnetos, trinetos e tetranetos a verão. Para compensar, manda, então, o
rei aumentar a capacidade do convento de oitenta para trezentos frades e, imediatamente
começam as reformas. Conversa o rei com o seu tesoureiro acerca de dinheiros e o
segundo afirma que está o reino pobre, o que não é, porém, entrave a que as obras
prossigam, numa crítica mordaz aos reais desígnios, insensatos e baseados num desejo
imenso de eternização da sua vida e obra. No entanto, o rei ficou a matutar na curteza
das vidas e, com receio de morrer antes de ver a sua obra pronta, manda que a sagração
da basílica seja no dia vinte e dois de Outubro, dia do seu aniversário, a um domingo. E
assim ordena que se arranjem os trabalhadores necessários, ainda que os tenham de
retirar, por violência, dos seus mesteres, “porque nada está acima da vontade real, salvo
a vontade divina, e a esta ninguém poderá invocar, que o fará em vão, porque
precisamente para serviço dela se ordena esta providência”. Aqui se vê a opressão
exercida pelo poder real para acelerar os trabalhos de construção do convento, pois vão
buscar-se trabalhadores a todo o país, à força, de tal forma que estes procedimentos
servem para o narrador lembrar as críticas de Camões à “glória de mandar” e à “vã
cobiça” de um rei infame e de uma pátria sem justiça. O “cortejo dos miseráveis” chega
e Blimunda vem olhar aqueles que, no dia seguinte, serão ou não escolhidos para
trabalhar, “como os tijolos”. O capítulo termina, portanto, com uma das mais duras

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críticas ao poder real, que violenta e mata o seu povo, faminto, sujo e impotente perante
a injustiça.
Capítulo XXII: Descrição da troca de princesas, entre Espanha e Portugal: de lá vem
Mariana Vitória, para casar com o José de cá; de cá, Maria Bárbara, para casar com o
Fernando de lá, casamentos arranjados de há muito, como é hábito entre os nobres. A
troca é combinada no rio Caia e, a seguir o rei vai João Elvas, antigo companheiro de
armas de Baltasar. A comitiva do rei é enorme e João Elvas vê-a passar, até que
consegue satisfazer melhor a sua curiosidade, por via de um “caridoso” fidalgo que com
ele entabula conversa; no entanto, após a passagem da comitiva, João Elvas não tem
outro remédio que juntar-se “à tropa de vagabundos” que segue o cortejo, para ver, mas
sobretudo para tirar a “barriga de misérias”. A chuva, contudo, insistiu em cair, com
fúria, alagando caminhos e atolando carros, pelo que a rainha, que segue atrás do rei,
juntamente com a noiva, tem de aguardar que arranjem as estradas. É aqui que aproveita
para transmitir à filha os últimos conselhos de mãe, sendo a imagem que nos fica desta
conversa a de uma mulher profundamente desiludida com o casamento, mas ciente da
sua impotência perante uma sociedade que vê nas mulheres meros fantoches e
recipientes de filhos. João Elvas conhece, entretanto, Julião Mau-Tempo, chegando
ambos à conclusão de que foram companheiros de Baltasar, do qual nenhum sabe. D.
Maria Bárbara, pelo caminho, vê uma série de homens atados, que fica a saber vão
trabalhar, obrigados, para o convento que não conhecerá, afinal, mas, como lhe diz a
mãe, “só a vontade do rei prevalece, o resto é nada”, daí que terá de se conformar.
Enfim, em Évora, está o rei e o povo à espera e, no dia dezasseis, quer o rei quer a
rainha saem para Elvas, de onde, após três dias de negociações com o rei espanhol,
saem em direção ao rio Caia, local da troca das princesas. João Elvas continua presente
e entra na casa onde decorrerá a cerimónia mas, a esta, somente assistirá o fidalgo com
quem já falara, e é ele que lhe descreverá o que lá se passou, pois João Elvas não seria
autorizado a misturar-se com os nobres. No final, ouve-se a música “delgadinha,
suavíssima” que João Elvas não sabe que está a ser tocada por Domenico Scarlatti, que
acompanha a princesa para Espanha.
Capítulo XXIII: Cortejo das estátuas de santos que irão adornar o convento de Mafra;
vêm também os noviços do convento de S. José de Ribamar que irão estar presentes na
sagração da basílica, a pé desde Lisboa, e, encontram-se as duas comitivas no caminho,
chegando a Mafra ao mesmo tempo. Baltasar e Blimunda, à noite, vão ver as estátuas e,
enquanto sobem a ladeira do Alto da Vela, Baltasar anuncia que, no dia seguinte, vai
“ao Monte Junto ver como está a máquina”, recomendando-lhe Blimunda que tenha
cuidado com ela. Quando regressam, Blimunda leva Baltasar à barraca onde se guarda a
burra, faz amor com ele de forma desesperada e, ao amanhecer, prepara-lhe o farnel que
ele levará até Monte Junto. Lá chegado e entrando na máquina, “duas tábuas cederam,
rebentaram, afundaram-se” e Baltasar, tentando amparar-se, enfiou “o gancho do braço
na argola que servia para afastar as velas”, o que fez os panos arredarem-se, o sol
inundar a máquina, as bolas de âmbar e as esferas e, finalmente, subir, desaparecendo
no ar.
Capítulo XXIV: Blimunda, após verificar que Baltasar não vem, tenta, debalde dormir,
e, no dia seguinte, desassossegada, empreende o caminho que Baltasar seguiria, caso
estivesse a regressar, ao mesmo tempo que vai perguntando a quem via se o teriam
visto. Assim vai caminhando até Monte Junto, gritando o nome do seu homem, mas não
obtém resposta. E é ao chegar ao sítio da máquina, agora vazio, que se apercebe de que
sempre soubera que viria encontrá-lo assim. No chão, encontra o alforge do seu homem
com o espigão lá dentro; deita-o ao ombro e continua na sua busca pelas proximidades.
A certa altura, num “caminho largo, de carros”, ao dobrar uma curva, dá conta de que

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um frade dominicano caminha à sua frente. Depois de o frade lhe garantir que não vira
nem homem nem pássaro por aquelas bandas, Blimunda despede-se, mas o frade
adverte-a dos perigos da serra e recomenda-lhe que durma nas ruínas de um convento
que não chegou a ser construído. Hesitante, mas receosa pela crescente escuridão, pelo
frio que aumentava, pelos perigos que pressentia e pelo cansaço em que estava, resolve
seguir os conselhos do frade. Prestes a adormecer, ouve um rumor e, lentamente,
apercebe-se de que é o frade que encontrara no caminho que a procura para “saciar a
carne”. Blimunda imobiliza-se, procura o gancho de Baltasar e aguarda, até que, quando
o frade está em cima dela, lhe espeta o espigão, matando-o. Depois, retira o espigão e as
sandálias ao frade e foge daquele lugar. Regressa a Mafra na esperança de se ter
desencontrado de Baltasar, mas também aí o não encontra e, desesperada, esconde os
pertences do seu homem na barraca onde haviam ambos dormido, antes de Baltasar
viajar, e adormece profundamente. Entretanto, na vila, prepara-se a festa da sagração da
basílica – vinte e dois de Outubro de 1730 – coincidente com o quadragésimo primeiro
aniversário do rei. No dia, toda a família vai assistir às cerimónias, mas Blimunda,
embora presente, está ausente e é assim que, prometendo voltar, desce a ladeira, faz uma
trouxa e sai, com a “noite dentro de si”.
Capítulo XXV: “Durante nove anos, Blimunda procurou Baltasar”, perguntando a
quem vê se o teriam visto. Volta a Mafra, sabe que morreram Inês Antónia e Álvaro
Diogo, percorre o país de lés-a-lés, atravessa a raia de Espanha e é só à sétima vez que
passa por Lisboa que o encontra. Vem em jejum. Faz o mesmo itinerário de há vinte e
oito anos atrás e, de repente, sente o cheiro de carne queimada – é um auto de fé. “São
onze os supliciados”, entre eles António José da Silva, um dramaturgo da altura, e…
Baltasar, que ela reconhece pela falta da mão esquerda. No centro do seu corpo está
uma nuvem fechada. “Então Blimunda disse, Vem. Desprendeu-se a vontade de
Baltasar Sete-Sóis, mas não subiu para as estrelas, se à terra pertencia e a Blimunda.” É
um final disfórico e trágico para Blimunda, que assim perde o seu homem, mas é
eufórico para o Homem: é que o mais importante de tudo é o amor, único sentimento
capaz de nos dar a coragem para lutar contra as injustiças e vilezas do mundo, e é a
“vontade”, a centelha divina que o Homem possui dentro de si que o liberta de todo e
qualquer tipo de prisão.

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Professora. Ana Paula Duarte

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