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História das Instituições Jurídicas e

Políticas
História das Instituições Jurídicas e Políticas Romanas
José Pina Delgado
Prof. Graduado de Teoria do Direito & Direito Público
Juiz do Tribunal Constitucional

José Pina Delgado - HIJP - História das


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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas
Sumário
• PLANO
1. Introdução geral
- Importância da religião
- Sabedoria prática romana
- Expansionismo Territorial e Cultural
2. Características gerais
- Forma mista de legitimação do poder
- Forma limitada de exercício do poder
- Processo Legislativo Complexo
- Mecanismos evoluídos de defesa da Constituição
- Sistema Criminal Duro e Complexo
- Sistema Jurídico-Privado marcado por alguma desigualdade de Estatuto
- Notório Desenvolvimento no Direito das Coisas (Direitos Reais)
- Criação de um Sistema Jurídico-Obrigacional Extremamente Evoluído
- Esquematização de um Processo Civil

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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas
1. Importância da religião – Os romanos tinham um atitude paradoxal em relação à
religião; por um lado, eram relativamente tolerantes, porque aceitavam normalmente
os Deuses de outros povos e, em certa medida, os seus próprios foram moldados em
divindades alheias (gregas e etruscas); por outro lado, permitiam que a religião tivesse
uma grande influência na modelação das instituições públicas, designadamente no
que toca à legitimação do poder e mesmo ao seu exercício, influenciado a ideia de
equilíbrio que marca de modo indelével o desenvolvimento jurídico-político de Roma.
2. Sabedoria prática romana – Os romanos eram igualmente dotados de uma
sabedoria prática notável, que lhes facilitava a transladação de ideias abstractas em
realidades concretas ou alternativamente o aperfeiçoamento de modelos e
instituições políticas, jurídicas, militares, religiosas, etc. Assim sendo, não se estranha
o grande desenvolvimento queJosé o seu Direito- HIJP
Pina Delgado conheceu
- História dase a notoriedade que os seus
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juristas tiveram, vincando ainda mais aPolíticas
Instituições separação
e Jurídicasentre
Romanas a filosofia e o Direito.
3. Expansionismo Territorial e Cultural- Sem embargo dos
méritos intrínsecos, o protagonismo de Roma dependeu
em larga medida da criação de um Império relativamente aberto, que
abarcava praticamente todo o Mar Mediterrâneo (Mare Nostrum) e a
parte Ocidental da Europa. Com o Império seguiu o modo romano de
viver (a romanitas) a sua cultura, as suas instituições, o que
evidentemente incluia o seu Direito, que passou a ser o Direito de todo o
Império. Facilitou igualmente a complexificação da sociedade, o que é
sempre determinante, particularmente para o desenvolvimento do
Direito Privado
3. Fases de Expansão Territorial: 1) Itália; 2) Mediterrâneo Ocidental
(Cartago); 3) Mediterrâneo Oriental e Europa Ocidental (Bretanha e
Gália) + 3 Fases de evolução institucional: a) Monarquia; b) República: c)
Império
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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas
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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas
Características gerais das Instituições Romanas
1. Forma mista de legitimação do poder
- A filosofia geral de equilíbrio de força que caracterizava a sociedade
romana e que ramificava, num certo sentido, para alguma moderação
institucional, justificava a forma como o poder era legitimado. Em parte
isso dá origem a formas mistas de legitimação do poder que agregam um
elemento religioso (a bênção de Júpiter) a uma legitimação mais ampla
(conferida ou pela generalidade ou pelo menos por parte dos governados)
2. Forma Limitada de Exercício do Poder
Dentro dessa mesma lógica de base, os romanos acreditavam que o Estado
deveria ser organizado de tal sorte a representar os diversos interesses e
grupos sociais, cada um tendo certos espaços de expressão. Neste sentido,
há uma clara rejeição do modelo democrático ateniense em que o povo
governava directamente, optando-se, antes, por uma ideia de Governo
dos mais aptos sufragado e controlado pelo povo através de eleições, e
uma rejeição do modelo monárquico, particularmente o absoluto imposto
pelos Etruscos

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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas
• Esta concepção vai justificar a adopção de um princípio constitucional do
equilíbrio, assente num governo das elites externamente legitimado.
• Também se espraia sobre a forma como os romanos organizaram o poder,
especialmente no período republicano, com uma multiplicidade de órgãos de
Estado, destinados a precisamente garantir espaços de representação para as
elites (as magistraturas e o Senado) e para o todo o povo (as Assembleias)
Órgãos do Estado Romano no Período Repúblicano.
O nome oficial de Roma derivava entre a fórmula mais ampla – Magistratus,
Senatus, Populusque Romanus – ou mais sintética – Senatus, Popolus Que
Romanus [SFQR] – Isso representava, no fundo, os órgãos do Estado Romano
no período republicano, os quais, de um ponto de vista mais geral, ascendiam
a 15, se os desdobrarmos nos seus mais ínfimos pormenores.

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Órgãos do Estado Romano –
Período Republicano
• Havia várias magistraturas, caracterizadas, regra geral, pela sua
colegialidade; anualidade; electividade e gratuidade
A – Populares Ordinárias (Representavam todo o povo e tinham
funcionamento permanente): Censorado; Consulado; Pretorado;
Edilado Curul; Quaestorado (cursus honorum)
B- Populares Extraordinárias (representavam todo o povo, mas
tinham funcionamento intermitente): Dictator; Magister Equitum,
Interrex
C- Plebeias: Tribunato da Plebe; Edilado Plebeu
• Para além do Senado,
• havia quatro Assembleias: Comicia Curiata; Comicia Centuriata; Comicia
Tributa; Concilia Plebs

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Mag. Populares Ordinárias
• Censurado 2: colegial – (fazer o censo;
fiscais da ordem pública), eleito pela CCe a
cada cinco anos de entre os cidadãos
romanos que já tivessem exercido o cargo
de cônsul para um mandato de 18 meses).
• Consulado (2: colegial – poder executivo;
chefes militares), eleito pela CCe de entre os
cidadãos romanos que já tivessem exercido
o cargo de pretor para um mandato de 12
meses. Acrescem poderes de iniciativa
legislativa e de convocação das Assembleia
em matéria legislativa (Ius agendi cum
populus e ius agendi cum senatus).
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• Pretorado (2+2+4), poder judicial com competências civis e de
presidir aos tribunais criminais; dividido entre praetor urbanus e
praetor peregrinus, com o primeiro a ter jurisdição sobre casos
que envolvessem exclusivamente cidadãos romanos e o outro
sempre que tivesse um elemento estrangeiro (peregrinus); fora da
cidade, o pretor acumulava funções. Tinha o Jus agendi cum
popolus para convocar a assembleia em questões judiciais. Eleito
pela CCe de entre os cidadãos romanos que já tivessem exercido
funções como Edis.
• Edilado Curul (1+1), inicialmente arquivistas dos documentos
públicos, mais tarde passaram a ter funções de gestão
• da cidade –saneamento; segurança; abastecimento;
divertimentos designadamente com jurisdição sobre
• os litígios ocorridos nos mercados. Eleitos pela CT de
• entre os cidadãos romanos que já tivessem
• desempenhado o cargo de quaestores

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Mag. Populares Ordinárias
• Quaestorado (8), acusadores públicos e fiscais da legalidade; exerciam a
acção penal em Roma acusando nos Tribunais Populares e fiscalizando o
exercício de funções das autoridades romanas na províncias. Eleitos pela
CT sem condições especiais; regra geral, início da carreira política de um
romano.

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MAGISTRATURAS POPULARES EXTRAORDINÁRIAS

Dictator: Funcionava somente quando a República estava em perigo. Era uma


magistratura singular eleita pelo Senado sob proposta de um cônsul com a
missão de salvar o Estado. Para tal tinha plenos poderes para fazer o
necessário salus republicae suprema lex est) num prazo de seis meses,
mandato que cessava antes se se desse por concluída a missão
•Magister equitum (Mestre de Cavalaria) – auxiliar do dictator, escolhido por
ele, seguia o seu mandato e as condições de exercício integralmente
•Interrex –figura que podia ser utilizada quando houvesse um vazio no poder
executivo da cidade (consulado). O Senado escolhia (cooptava) um dos seus
para exercer esse poder enquanto não eram eleitos novos titulares. Mandato
de 5 dias no máximo ou até José
que fossem
Pina eleitos
Delgado - HIJP - Históriaos
dasnovos titulares
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Magistratura Plebeias

• Tribunato da Plebe 2+2… 10 (Protector da Plebe)- Eleito de entre os


cidadãos plebeus pela Consilia Plebs; mandato de um ano; inamovível e
inviolável (qualquer pessoa que atentasse contra a sua vida, integridade física
ou liberdade era considerada Homo sacer, podendo ser sacrificada por
qualquer pessoa que lhe conseguisse deter); tinha poderes
predominantemente negativos (de bloqueio), designadamente o veto
preventivo (PROHIBITIO) e o sucessivo (INTERCESSIO), bem ainda como
poderes de AUXILIUM (PROVOCATIO AD POPULUM) contra actos executivos
(administrativos) dos magistrados populares– Recurso aos tribunais
populares. Também detinha poderes positivos de convocação da Assembleia
da Plebe e de propositura dos Actos Normativos da Plebe
• Edil Plebeu (2) – Exercia as mesmas funções do Edil Curul, mas com a
limitação às questões plebeias. Arquivava os seus documentos.
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SENATUS

- Pêndulo e Órgão mais importante da República


- 300 integrantes na fase de maior estabilidade
- O cargo era vitalício e era preenchido adoptando-se como critério a
importância objectiva da carreira política do candidato em
comparação com as dos outros.
- Poderes: normalmente consultivos, mas poderes de intervenção
geral em situações de instabilidade política ou militar
- Competências próprias – Política Externa e de Segurança (Militar):
a fixação dos efectivos anuais do exército romano; destino a dar ao
território e às populações conquistadas-
- Financeiro/fiscal: autorização para a realização de despesas públicas;
lançamento de tributos Instituições
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Políticas e Jurídicas Romanas
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Assembleias
• Curiata: criada na vigência da constituição arcaica e absorvida pelas outras;
base clânica; funções predominantemente religiosas (que presidiam) e
associadas e à preservação dos interesses dos clãs (e.g., uma relação de
adopção entre pessoas de clãs diferentes).
• Centuriata: criada no quadro da ‘Constituição Etrusca’; base militar, destarte
dividida por unidades militares (centurias) com composição diversificada;
competências eleitorais (Censorado; Consulado; Pretorado); legislativas
(aprovação das Lex mais importantes) e judiciais (crimes puníveis com a morte
e outras penas duras)
• Tributa: criada no período da Constituição Patrício-Plebeia; base territorial;
competências eleitorais (Edilado Curul; Quaestorado); legislativas (aprovação
das Lex menos importantes) e judiciais (crimes puníveis com penas mais leves
– multa, etc.)
• Consilia Plebs: criada pelos plebeus antes do advento da Constituição Patrício-
Plebeia; excluvisa dos plebeus; competências eleitorais (Tribunos da Plebe e
Edis Plebeus); legislativas José
(Actos normativos da Plebe- Plebiscitum)
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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas
3. Processo legislativo complexo
1. Aprovação de Actos Normativos do Povo Romano
(Lex): Iniciativa (1 Cônsul) – Parecer Senado
Senatusconsultum); Recolha Pública de Contribuições –
Eventual novo Parecer do Senado – Comicia
Centuriata/Tributa – Publicitação
2. Aprovação de Actos Normativos da Plebe Romana
(Plebiscitum): Iniciativa (1Tribuno) – Sem Parecer –
Consilia Plebs – Eventual Ratificação pelo Senado daria
força obrigatória geral aos Plebiscitos.

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4. Mecanismos evoluídos de defesa da
Constituição
• Que perpassam toda a história de Roma, desde o regifugium do período
monarquico até ao senatus consultum ultimum da República tardia,
passando pela Ditadura e pelo Jus Fetiale.
• Regifugium – Obrigava o rei a simular uma fuga da cidade todos os anos
por cinco dias, momento no qual o poder voltava ao seu poder originário, o
Conselho de Patres, que decidira pela sua devolução ou não
• Ditadura – Nomeado para salvar a República de ameaças (v. órgãos do
Estado Romano)
• Senatusconsultum ultimum- Estado de excepção; suspensão da
Constituição; declaração do inimigo do Estado (Hostis); inibição dos direitos
dos cidadãos; perda de nacionalidade; utilização de meios militares em
limites. Foi utilizada para conter os levantamentos populares contra os
optimates, designadamente os liderados pelos Tribunos Caius e Tiberius
Graccus
• Publius Scipio Nasica – Pontifex Maximus e Senador (criador)

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Cont.
• Jus Fetiale – Direito Público da Guerra- Garantia de que Roma só fazia a
guerra se tivesse causa justa (Bellum iustum), a qual dependia da existência
de uma conduta danosa dirigida a Roma e de ser um recurso de última
instância quando mais nada pudesse garantir a reparação a R. Processo com
um órgão religiosos no seu centro. Era o Colégio dos Fetiales (20), liderado
pelo Pater Patratus. Este dirigia-se portando vestes religiosas ao território
inimigo para fazer uma demanda de reparação às autoridades ou a qualquer
cidadão através de orações pré-estabelecidas e concedendo-lhes 33 dias
para cumprir: caso não o fizessem deslocava-se uma segunda vez,
declarando-os povo ímpio não temente aos Deuses. Voltava a R. e informava
um cônsul. Este, seguindo o processo legislativo de aprovação de leis,
submetia um projeto para aprovação da guerra à C. Centuriata. Caso
aprovada, o PP dirigia-se à fronteira e ainda dentro do território romano
atirava para dentro do solo inimigo uma lança embebida em sangue. Assim
que caísse no solo começava a haver por presunção um estado de guerra
entre ambos com causa justa para R, o que significava que, no fim do
processo, esta podia apropriar-se dos bens do Estado inimigo (território,
objetos e pessoas). José Pina Delgado - HIJP - História das
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5. Sistema Criminal Duro e Complexo
Parte Geral
• O crime, directa ou indirectamente, era sempre uma conduta contra os
Deuses (Pecatum) ou pelo menos contra o Estado .
Os Crimes mais graves eram os crimes contra as divindades e, sobretudo,
contra o Estado (República/Imperador). Ver Caso de Jesus Cristo; Espártaco e
os escravos revoltosos.
• Neste sentido, o crime (delicta) seria sempre a violação de uma lei moral e
a pena uma forma de expiação para aplacar os Deuses

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Crimes
• A contribuição romana nesta matéria é mais linguística e particular do que
sistémica, o que se nota na nomenclatura em relação aos tipos de crimes:
- Crimes contra o Estado: perduellio (danos ao Estado); Proditio (traição);
ataques contra a Constituição Republicana; heresia (depois da cristianização)
- Crimes contra a pessoa:
a) homicídio - + grave parricídio (parricidium)- privação da vida de familiares
b) Ofensas corporais (injuria)
- Crimes contra a moral pública: incesto (incestus); adulterium (só esposa);
strupum (agressão sexual); lenocinium (exploração da própria esposa ou
tolerância da sua infidelidade); pederastia (conjunção carnal entre dois
homens)
- Crimes contra a propriedade (subtração de coisa alheia): Pública
(Peculatum); religiosa (Sacrilegium); privada (Furtum)

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Penas
• Penas Duras: Principais:
Morte (Suplicium)- poena capitis- gradada de acordo com a sua forma de
execução para corresponder à intensidade do mal cometido. Em alguns
casos permitia-se que a própria vítima ou os seus familiares executassem
a pena; o condenado tb podia escolher a forma em certas situações.
• Formas de execução:
a) Decapitação (Capitalis); b) crucificação: crux+fixus- amarrado ou
pregado) ; c) afogamento; d) cullens ou poena cullei (saco com animais e
introduzido no Rio Tibre); e) precipitação; f) fogueira; g) emparedamento
(mulheres); h) espectáculos públicos (circo); espancamento etc.

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Outras Penas: Flagelação; Desterro/Expulsão
(Exilium); Perda da Cidadania; Perda de Bens
(Confisco); Trabalhos Forçados; Perda do
Direito de Exercer Cargos Públicos.
Acessórias: Aplicadas juntamente com as
principais: Flagelação; Encarceramento; Perda
do Direito ao Luto e à Memória.
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Processo Penal
• 3 Tipos de Processo Penal
A – Publicum: Anquisitium (centralizado numa autoridade pública, um
magistrado (Cônsul/Pretor): fazia a investigação, determinando os factos
puníveis, ouvia o acusado e aplicação uma sanção (administrativa)- não
havia direito a defesa, o que veio a se introduzido posteriormente com o
provocation ad popolum.
Procedimentos: 1. notificação do arguido (chamamento compulsório ao
processo, com obrigação de comparência)- 2. Anquisitio (instrução
sumária): pública- apresentação sumária dos elementos inculpatórios
(factos e provas)- interrogatório e recolha de testemunhos- a permissão
de advogado (advocatus) era decisão livre do magistrado. 3. Prolatação da
sentença. Sujeita, no período republicano, ao provocatio ad populum.

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• Com a introdução da figura do provocatio se ela fosse uma pena dura
(mesmo de multa, desde que elevada) permitia-se o recurso ao Tribunal
Popular- levava à suspensão da execução da pena – a acusação tinha que
ser redigida a escrito e a audiência marcada com o mínimo de 24 dias de
antecedência. O processo então passava para uma Comicia, podendo o
arguido antes do voto decisivo admitir culpa, sendo condenado ao exílio.
• B . ACUSATIO – Predominantemente privatizado, surgido já no período do
Império. Assim sendo, era mais técnico e menos politizado – Baseava-se
numa acusação particular arbitrada pelo Estado. 1) acusatio (acusador
privado)- 2) Notificação do acusado (citação por funcionário público:
confissão levaria a aplicação de uma pena + leve); 3) Constituição do Júri
(50: entre senadores e + tarde outras pessoas ilustres da cidade- as partes
podiam recusar alguns jurados; 4) Debate entre acusado e acusador
(apresentação das provas)- possibilidade de utilizar a tortura (tormenta);
5) decisão-por jurados; sentença em tese insusceptível de apelação, mas
condenado podia ser perdoado pelo- HIJP
José Pina Delgado Imperador.
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• C- Cognitio- período do Império (Dominado), processo com magistrado
único (instrução e decisão). Sujeito a recurso hierárquico ao Prefeito do
Pretório (Líder dos Pretores).
• Justiça Criminal nas Províncias: estava nas mãos de um pretor ou, caso
não houvesse um na província, ao próprio Governador (Rector Provinciae,
Gubernatur ou Proconsul), desde que implicasse em castigos corporais ou
na aplicação da pena de morte. A justiça local tinha jurisdição nos casos
menos graves e se se tratasse de cidadão romano de origem nem sequer o
Governador ou o Pretor podia aplicar a pena de morte; deveria enviá-lo
para a cidade de R. para ser julgado.

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6. Sistema Jurídico-Privado marcado por alguma
desigualdade de estatuto
• - Sistema consolidado desde as origens de Roma de base escravocrata,
baseado em certa medida em concepções fortemente individualistas e
patriarcais.
- Disso resultava que nem todas as pessoas tinham a mesma capacidade
jurídica. Esta, na realidade, ia desde uma capacidade plena garantida ao
cidadão romano, portanto do sexo masculino, livre e não sujeito ao poder
paternal, até chegar ao escravo, equiparado em tese a uma coisa à luz do
Direito (embora não à luz da natureza, ao contrário do conceito grego ou o
que mais tarde veio a ser utilizado no quadro da escravatura negreira).
Mesmo assim, o sistema não era de liberdade total. Durante muito tempo
mesmo os homens e por maioria de razão as mulheres tinham que se casar.
Destarte, o celibato era ilícito para os homens entre 25 a 60 anos e as
mulheres entre os 20 e os 50, descontando aqueles que não podiam contrair
matrimónio, como os impuberes (sem maturidade); insanus (pessoa com
problemas mentais) e os impotentes (incapazes de ter uma erecção)
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• Assim sendo, o estatuto diferente era uma realidade para Mulheres
Também por motivos evidentes não tinham cidadania à luz do Direito Público
Romano. As mulheres, em princípio, salvo se atingissem o estatuto de matriarca
(matrona) tinham sempre que ser representadas por um elemento do sexo
masculino. No entanto, isso não impedia que tivessem uma influência considerável
no seio da sociedade romana. Não tomavam, neste quadro, decisões importantes,
nomeadamente ligadas ao matrimónio. Casavam-se por determinação do seu
representante legal numa cerimónia altamente informalizada, que inicialmente
dependia da mera coabitação estável e que só depois passou a ser ligeiramente
formalizada através da introdução pragmática da figura do conventio in manu
destinada a simbolizar a transferência da mulher do pai para o marido
das testemunhas em número de cinco (coemptio). Passou então a haver uma
distinção palpável entre o casamento (matrimonium) coabitação (união estável)
(concubinatum). José Pina Delgado - HIJP - História das
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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas
• O divórcio (Divortium) era também livre, podendo sem
qualquer motivação ser requerido por qualquer dos lados,
sendo certo, no entanto, que no caso da mulher quem o
decidia era a seu representante legal.
• A adopção (Adoptio) também era um fenómeno meramente
masculino.

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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas
• B) Filhos; Muito embora, verdade seja dita, muitas dessas limitações não eram
muito diferentes do estatuto de filho, submetido ao chamado pátrio poder (patria
potestas) até à sua morte ou a emancipação do filho (mancipatio), por acto
unilateral de vontade do pai. O que significa que, mesmo atingindo a maioridade
até os filhos homens mantinham-se sob domínio dos pais. Se é bem verdade que,
com o tempo, o chamado jus vitae nequisque, o direito de vida ou de morte, foi
abandonado, o facto é que os resquícios de uma concepção ditatorial da família
perduraram por muito tempo em Roma.
O sistema sucessório também era dado a injustiças, pois a liberdade de testar
durante muito tempo foi total, o que significava que nem sequer haveria que se
salvaguardar a legítima (uma parte do património para os familiares mais
próximos), o que, evidentemente poderia causar muitos transtornos. Neste caso, a
ordem sucessória só era aplicável para os casos em que o de cujus falecia sem
deixar testamento (ab intestato).
• Foi introduzida uma pequena salvaguarda depois para a família reduzindo-se a
liberdade de testar e fixando-se uma ordem sucessória baseada nos filhos
(naturais e adoptivos) sem qualquer distinção entre os sexos. Depois apareciam os
cônjuges.
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• Na realidade, mesmo o primeiro sistema sucessório de Roma tinha os seus
problemas, uma vez que, de facto, todas as pessoas que se tornavam
autónomas pela morte do falecido (de cujus) tinha o direito a herdá-lo e
em situação de igualdade com os demais, não se fazendo qualquer
distinção entre os membros da família nuclear e os mais afastados

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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas
• ESCRAVOS: A escravatura em Roma era legítima, desde que
presentes certos títulos jurídicos de redução de uma pessoa
natural à condição de uma coisa (res) especial. Previam-se:
A -títulos originários: a captura em guerra justa, travada
conforme o jus feciale, aplicação de sanções criminais; durante
algum tempo, o inadimplemento de obrigações contratuais (+
tarde abandonado em relação ao cidadão romano). A esses
juntavam-se os B - títulos derivados, que os pressupunham
como a transmissão do escravo intervivos (compra e venda;
doação; aluguer) ou mortis causa (como legado ou herança); o
nascimento do escravo.
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7-Notório Desenvolvimento no Direito das
Coisas (Reais)
• Definição das espécies de propriedade, bem como a forma de sua
aquisição/transmissão/perda, enquadradas numa distinção de base entre
propriedade (título jurídico) e posse (domínio de facto)
Espécies de propriedade: pública (res publicae); religiosa (res divinis iuris);
privada (privata); comum (comunes omnes); de ninguém (nullius)
Formas de aquisição e transmissão: Originária: criação (criatio); ocupação
(ocupatio) da coisa de ninguém; apropriação de tesouro (coisa de valor
escondida e de proprietário desconhecido) ou da res dereclitae (coisa
abandonada intencionalmente- difere de esquecida)
Derivada: causa mortis (herança); inter-vivos: compra e venda; doação e
outras formas de transmissão contratual
Perda de Propriedade: Sanção Criminal; Transmissão; Usucapião (Usucapio),,
exigindo-se, neste caso, para além dos pressupostos da posse mansa e
pacífica, dois anos para coisa imóvel e um ano para coisa móvel.
Previsão de institutos importantes como a enfiteuse, o direito de superficie
ou as servidões, etc.
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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas
8. Criação de um Sistema Jurídico-Obrigacional
Extremamente Complexo
• Construído a partir da concepção jurídica da existência de uma relação a
envolver um credor (creditor) e um devedor (debitor) que se
consubstancia numa obrigação (obligatio)
• Composto por vários tipos de contratos (tractum; contractum) a principal
fonte das obrigações:
a) Mutuum (Empréstimo pecuniário e oneroso de coisa fungível)
b) Comodatum (empréstimo gratuito de coisa não-fungível)
c) Depositum (entrega de coisa móvel para custódia gratuita)
d) Emptio Venditio (compra e venda; com prestações simultâneas ou
deferidas no tempo, seja do vendedor (sinal), seja do comprador (crédito))
e) Donatio (Doacção)- transmissão gratuita de propriedade de coisa

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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas
• f) Locação (Locatio conductio) uma forma contratual geral
caracterizada pela cessão temporária de coisa mediante
remuneração que cobria diversas situações, designadamente
coisa móvel (aluguer) e imóvel (arrendamento no sentido
estrito) ou da pessoa (serviços) ou obra (materiais e pessoas),
nos últimos casos devendo-se honorários.
• g) Sociedade (Societas), correspondendo à utilização de
meios comuns para atingir fins lucrativos comuns.
- Baseava-se na manutenção de um consenso permanente dos
sócios (soci).
- Base para o surgimento das sociedades comerciais. Quotas
baseadas em valores patrimoniais ou em trabalho.

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9. Esquematização de um Processo
Civil
• Característica de base: Indistinção relativa entre Direito Privado Material
e o Direito Processual, com a grande consequência de no DPC Romano
para cada direito basicamente havia uma acção diferente, o que
evidentemente não permite uma análise mais pormenorizada.
• Princípios gerais
• a) Imparcialidade do Juiz; b) soberania das partes na marcha do processo;
• c) Oralidade; d) imediação; e) publicidade; f) audição das partes.
Legis Actio- 3 fases:
1ª In Jure: ocorre junto ao magistrado (Pretor)
Este decide se há ou não protecção jurídica para um direito ou interesse
legítimo invocado (no fundo tenta saber se há uma acção de tutela
correspondente à posição jurídica arguida). Não havendo nega cabimento,
declarando o pedido inadmissível; havendo, aceita o pedido e indica a
actio correspondente e nomeia um Iudex (Juiz) para decidir o mérito.
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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas
- Ao mesmo tempo estabelece o direito a ser utilizado, disso decorrendo a
denominação de Iurisdictio – Determinação do programa processual.
2ª fase – In Iudex – Face ao Juiz
As partes produzem prova e ocorre a prolatação da sentença. Marcada por
um grande formalismo, no sentido de que havia a obrigação de se usar
certas fórmulas pré-estabelecidas.
3ª fase – Execução
- Pessoal, permitindo a execução patrimonial, uma vez que a pessoal (perda
da liberdade do devedor) já não era possível. Permitia-se, assim, a
apreensão de bens do devedor por parte do credor.

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Instituições Políticas e Jurídicas Romanas

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