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DIREITO POLÍTICO/DIREITO CONSTITUCIONAL

1ª AULA

1 – Plano de curso
1.1 – Direito Político ou Direito Constitucional – a questão terminológica.
1.2 – O Direito Constitucional como Direito Público e instância legitimadora de todo o
Direito. Referência a Kelsen e à pirâmide normativa (Teoria Pura do Direito).
1.3 - A importância da Constituição como lei fundamental do Estado, na definição dos
direitos e deveres dos cidadãos e na regulação do exercício do poder.
1.4 – O advento do constitucionalismo e a experiência constitucional portuguesa a
partir dos séculos XVIII e XIX. As revoluções francesa e norte-americana.
1.5 – O estudo comparado de outros sistemas constitucionais (Reino Unido, EUA,
França e URSS/Rússia).
1.6 – A Constituição de 1976. Sua sistemática. Análise geral das suas quatro partes.
Referência às revisões constitucionais.

2ª AULA

1 – O conceito de Constituição
1.1 – Estado e Constituição.
1.2 – Constituição e direitos humanos. Direitos humanos de 1ª, 2ª, 3ª e 4ª geração.
1.3 – Espécies de Constituições. Escritas e consuetudinárias. Rígidas, semirrígidas e
flexíveis.
1.4 – Constitucionalismo e Estado de Direito. A “Rule of Law” anglo-saxónica.
1.5 – Constituição formal e Constituição material. Exemplos: princípios da culpa (artigo
1º da CRP) e da confiança (artgo 2º da CRP).
1.6 – Normas e princípios constitucionais. A estrutura das normas e a vinculação aos
princípios.

2 – O Estado como entidade jurídica e social


2.3 – Elementos do Estado: Povo, território e poder soberano.
2.4 - Estado e outras sociedades políticas.
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2.5 – Formas primitivas de organização social (família patriarcal, gens, clã, fratria
grega, gentilidade ibérica, senhorio feudal).
2.6 – Sociedades básicas (esquimós, bosquímanes, pigmeus).
2.7 – Sociedades infra-estaduais (regiões autónomas, Estados federados).
2.8 – Sociedades supra-estaduais (ONU, UE, CPLP). Os compromissos internacionais
e a receção do Direito Internacional e o Direito Comunitário (artigos 7º e 8º da
CRP).

3 - O advento do Estado
3.3 – Formação por via legal ou revolucionária; pacífica ou violenta. O caso português.
3.4 – Conquistas, migrações, agrupamentos, evolução social na origem do Estado. Por
que não se considera o Daesh um Estado.

4 – Caraterísticas gerais do Estado


4.3 – Complexidade organizacional (centralização do poder, diferenciação de funções,
pluralidade de órgãos, separação de poderes, enquadramento das pessoas com
atribuição de direitos e deveres).
4.4 - Institucionalização do poder (dissociação da autoridade política da pessoa do seu
detentor e persistência do poder para além da sua circunstancial titularidade,
fundamentação do poder no Direito, subordinação do poder ao bem comum).
4.5 – Territorialidade (sociedade política sedentária, fixação do povo e do poder
político).

5 – Tipos de Estado
5.3 – Quanto ao modo e relações de produção de bens (análise marxista) – despótico,
esclavagista, feudal, capitalista e socialista; o materialismo dialético e a luta de
classes.
5.4 – Classificação tradicional (Jorge Miranda) – oriental, grego, romano, medieval e
moderno.
5.5 – O Estado Oriental – teocracia, monarquia, ordem social inigualitária, grande
extensão territorial (médio oriente, com exceção de Israel).
5.6 – O Estado Grego – prevalência do fator pessoal sobre o fator territorial, as
Cidades Estados, o fundamento religioso da comunidade, a inexistência de
liberdade fora da Cidade (o processo de Sócrates), a Democracia Ateniense.
5.7 – O Estado Romano – Desenvolvimento do conceito de poder político e do Direito,
separação entre poder público e privado, distinção entre direitos políticos e direitos
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cívicos, extensão territorial (o Mediterrâneo como mare nostrum), expansão das


instituições e da língua, tolerância quanto aos povos dominados.
5.8 – O Estado Medieval – Invasões e reconquista, insegurança, senhorio feudal e
dissolução da ideia de Estado, propagação do cristianismo.
5.9 – O Estado Moderno – Concentração do poder no Rei (a França de Luís XIV e
Portugal de D. João II), o Estado-nação, a fixação do território, a secularização do
poder (com persistência do cristianismo como religião oficial), a soberania como
poder real ilimitado.

3ª AULA

1 – O conceito de Estado
1.1 – A polis grega
1.2 – A civitas e a res publica romana
1.3 – O regnum medieval
1.4 – O Estado renascentista (status de Maquiavel, “O Príncipe”; o contributo desta
obra para a moderna Ciência Política).

2 – O Direito Público moderno e o Estado europeu


2.1 – Sistema político medieval – vínculos feudais, senhoriais e corporativos;
subordinação do rei ao Papa e ao imperador; o Ocidente como unidade de civilização
e de fé (Respublica Christiana)
2.1 – Substituição do sistema político medieval – despontar das nações nos séculos
XIV e XV (língua, vivência religiosa, interesses comuns e sujeição ao rei)
2.2 – Criação dos Estados europeus – centralização do poder; emancipação política
do Papa e do imperador (o Sacro Império Romano-Germânico de Carlos Magno)
2.3 – Soberania e organização do Estado – poder absoluto e perpétuo (Jean Bodin e a
teoria do Estado absoluto – Os Seis Livros da República – 1576); ligação direta e
imediata entre o Estado e os indivíduos; poder dirigido a toda a comunidade
2.4 – Aparecimento do Estado em vários momentos – Península Ibérica (Reconquista
cristã), Sicília e Inglaterra - séculos XII e XIII); França – séculos XIV e XV; Países
nórdicos – séculos XVI e XVII; Alemanha e Itália - século XIX
2.5 – Portugal – 1125 – Condado Portucalense; 1128 – Governo de Afonso Henriques;
1140 – título de Rei; 1143 – vassalagem ao Papa; 1179 – reconhecimento pela
Santa Sé; centralização do poder – D. João II (século XV)
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3 – Desenvolvimento do Estado Europeu


3.1 – Acontecimentos históricos e movimentos ideológico-culturais mais relevantes –
Renascimento, Reforma, Contra-Reforma, Humanismo, Racionalismo,
Romantismo, Realismo, Empirismo, progresso técnico, decadência da nobreza,
ascensão da burguesia, surgimento do operariado; revolução industrial
3.2 – Períodos de evolução segundo o critério cultural – Renascimento (séculos XV e
XVI), Iluminismo (séculos XVII e XVIII) e Romantismo (séculos XVII e XVIII)
3.3 - Períodos de evolução segundo o critério político e jurídico (organização e
exercício do poder) – Estado estamental (monarquia limitada pelas ordens);
Estado absoluto; Estado constitucional de Direito (fases: liberal, democrática e
social)
3.4 – Estado estamental – monarquia limitada; fase de transição que se sucede ao
Estado medieval; estamentos como corpos organizados; as assembleias
estamentais (dietas ou cortes); localização em Portugal – séculos XIV e XV
3.5 – Estado absoluto – máxima concentração do poder – França – Luís XIV; Portugal
– D. João II
3.6 Estado constitucional – Estado liberal e burguês; Revolução Gloriosa Inglesa
(1688); Revolução Americana (1775 – 1883); Revolução Francesa (1789)

4 – Caraterização do Estado constitucional


4.1 – A tradição é substituída pela ideia de contrato social (Thomas Hobbes, John
Locke, Jean-Jacques Rousseau – séculos XVII e XVIII)
4.2 – A soberania do príncipe identifica-se com a soberania nacional e a lei com a
vontade geral (Immanuel Kant – século XVIII)
4.3 O exercício do poder por um é substituído pelo exercício do poder por vários
(eleitos)
4.4 – A Constituição é o instrumento principal, consagrando o Estado de Direito, o
princípio da legalidade, a separação de poderes, as declarações de direitos e a
representatividade política; a Constituição determina a limitação do poder e um
novo sistema de valores da vida pública
4.5 – O Estado do século XIX é liberal e burguês porque assenta no liberalismo
político e económico (o artigo 1º da Constituição de 1822)
4.6 - O século XX – as duas guerras; as experiências totalitárias; o pós-guerra e a
consolidação da democracia na Europa; o advento Estado social; CECA,
EURATOM, CEE e União Europeia. A União como uma “pan-federação”: a moeda
única e as fronteiras comuns.
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4.7 – O século XXI – crise da democracia representativa e do Estado social?

4ª AULA

O constitucionalismo inglês e britânico

1 – Generalidades
1. 1 – É o mais antigo sistema constitucional, tendo sido formado paulatinamente a
partir de 1215 (Magna Carta);
1.2 – A Inglaterra não teve uma monarquia absoluta, tendo passado do Estado
estamental para o Estado constitucional representativo;
1.3 – O modelo originário inspirou a doutrina da separação de poderes de
Montesquieu, sobretudo a partir da obra de John Locke;
1.4 – O Parlamento teve a sua origem no sistema inglês;
1.5 – Não comporta uma Constituição escrita, mas sim uma Constituição mista
composta por leis escritas e normas consuetudinárias;
1.6 – A sua influência estendeu-se aos países que pertenceram ao Império Britânico
(atual Commonwealth);
1.7 – A forma de governo é monárquica e o sistema de governo é parlamentar. O
poder repousa no Parlamento e o Rei tem poderes simbólicos, preside honorariamente
à Commonwealth e abstém-se de intervir na vida política.

2 – As três fases de desenvolvimento


2.1 – Primórdios, iniciada com a outorga da Magna Carta por João sem Terra, em
1215;
2.1 – Transição, iniciada no início do século XVII e marcada pelas lutas entre o Rei e o
Parlamento, teve como momentos mais relevantes a aprovação da Petition of
Rights de 1628, as Revoluções de 1648 e 1688 (Revolução Gloriosa) e a
aprovação do Bill of Rights de 1689;
2.2 – Fase contemporânea, iniciada em 1832 e marcada pelas reformas eleitorais que
alargaram o direito de voto (nomeadamente às mulheres, através do movimento
das sufragistas);

3 – Caraterização dos estádios


3.1 – Na 1ª fase, registou-se uma centralização do poder real precoce, antecipada pela
conquista normanda (Guilherme);
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3.2 – A 2ª fase é caraterizada por lutas políticas e religiosas; houve duas revoluções
(1648 e 1688), uma República (a ditadura de Cromwell, que foi percursora do
regime bonapartista), foi aprovado, em 1653, o único ensaio de Constituição
escrita que a Inglaterra conheceu (Instrument of Government); a revolução de
1689 é essencialmente diferente da Revolução francesa de 1789, assim como o
Bill of Rights de 1689 é muito diferente da Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão de 1789;
3.3 – A 3ª fase é marcada pela democratização; até 1832 (Reform Act) o sistema
britânico era liberal mas muito pouco democrático; entre 1832 e 1929, foi
consagrado progressivamente o sufrágio universal para adultos de ambos os
sexos; assistiu-se ainda ao apagamento da Câmara dos Lordes, com membros
hereditários e vitalícios, pela Câmara dos Comuns, com membros eleitos e
mandatos renováveis, assim como ao surgimento dos partidos políticos
(Conservador e Trabalhista).

4 – Instituições
4.1 – Rei, Câmara dos Lordes (760 membros) e Câmara dos Comuns (650 membros).
As duas formam o Parlamento;
4.2 – Até ao século XVII prevalece o poder real (período monárquico); entre o século
XVII e meados do século XIX prevaleceu a Câmara dos Lordes (período
aristocrático); desde então, o poder assenta na Câmara dos Comuns (período
democrático).

5 – Constituição
5.1 – Consuetudinária e flexível;
5.2 – Não é escrita mas comporta leis escritas (para além das referidas, por exemplo,
a lei do habeas corpus, de 1679);
5.3 – Prevalência da common law sobre a statute law

6 – Direito
6.1 – Há um conjunto de princípios, instituições e processos que garantem os direitos
dos indivíduos perante o Estado
6.2 – Os principais marcos da consagração da Rule of Law foram a Magna Carta, a
Petition of Rights e o Bill of Rights.
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7 – Sistema de Governo
7.1 – O sistema é parlamentar e o Governo é emanação da Câmara dos Comuns e
responde perante ela; os membros do governo são obrigatoriamente deputados e
deixam o executivo quando perdem eleições.
7.2 – O sistema eleitoral é maioritário e não proporcional, como o português;
7.3 – O PM dirige o Gabinete e os ministros dependem dele;
7.4 – A oposição está institucionalizada e há um “Gabinete sombra”;
7.5 – A legislatura dura 5 anos no máximo;
7.6 – Os membros do Governo têm de provir do Parlamento;
7.7 – A Câmara dos Comuns pode ser dissolvida por iniciativa do PM;
7.8 – O Governo tem a iniciativa legislativa relativamente ao Parlamento;
7.9 – Há alternância partidária, normalmente de uma em uma ou de duas em duas
legislaturas;
7.10 – Os principais partidos são o conservador (tories) e trabalhistas (labour)

8 – Commonwealth
8.1 – É composta por 52 Estados
8.2 – Chefe – Rei (Reino Unido, Canadá, Austrália, Nova Zelândia, África do Sul,
Paquistão e Ceilão).

5ª AULA

O constitucionalismo norte-americano

1 – Antecedentes – a Declaração de Independência (1776), a Declaração de Virgínia e


restantes Declarações de Direitos dos primeiros Estados.

2 – A influência do sistema jurídico inglês, do pensamento de John Locke e dos


precursores da Revolução Francesa (1789) e as Constituições outorgadas pela Coroa
às treze colónias.

3 – Os EUA foram o primeiro grande Estado Europeu formado fora da Europa,


tiveram a primeira revolução anticolonial (contra os ditames da Coroa inglesa que
impediam as relações comerciais autónomas das treze colónias e as
sobrecarregavam de impostos, a primeira Constituição escrita, o primeiro Tribunal
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Constitucional, o primeiro Estado federal, o primeiro Estado laico, a primeira


república democrática e o primeiro sistema de governo presidencial fundado na
separação de poderes).

4 – Na sua versão originária, de 1787 (entrou em vigor em 1789), a Constituição dos


EUA compreendia apenas sete artigos. Esses artigos limitam-se a prever, no
essencial, os órgãos de poder e as suas competências: Presidente, de quem
depende o executivo (não há Primeiro Ministro nem Conselho de Ministros),
Congresso (bicameral, com Senado e Assembleia de Representantes) e tribunais.
A Constituição norte-americana é semirrígida porque esses sete artigos, base do
tratado de união das ex-colónias, não são revisíveis.

5 – Para além dos artigos, a Constituição compreende 27 “amendments” (emendas,


ou, mais rigorosamente, acrescentamentos). Só 25 têm conteúdo efetivo, porque
uma (a que institui a lei seca) já foi revogada por outra). As dez primeiras
constituem o Bill of Rights dos EUA, influenciado pelo seu homónimo inglês
(aprovado em 1689, na sequência da “Revolução Gloriosa” de 1688). Entre elas
encontram-se a que prevê a liberdade de expressão e religião, o controverso
direito de uso e porte de arma ou o direito à não autoincriminação. A emenda que
reconheceu o direito de voto aos afrodescendentes é de 1870 e só 50 anos depois
foi aprovada a que reconheceu o direito de voto às mulheres, na sequência do
movimento reivindicativo das sufragistas (1920).

6 – O federalismo dos EUA carateriza-se pelos vastos poderes concedidos aos


Estados, hoje em número de 50, com o crescimento verificado nos séculos XIX e
XX. Cada Estado federado tem a sua própria Constituição (subordinada à
Constituição federal) e órgãos de governo e autonomia para legislar em muitas
matérias. Ressalvam-se o comércio externo, as relações externas e a defesa. É
isto que explica, por exemplo, que a pena de morte só seja aplicada em alguns
Estados.

7 – Expressão clara deste federalismo é o Congresso, que detém o poder legislativo


e é formado por duas câmaras: a Câmara de Representantes, composta opor 435
membros eleitos por método maioritário para um mandato de 6 anos, e Senado,
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composto por 100 membros, à razão de 2 por cada Estado federado, eleitos para
um mandato de 2 anos em eleições parcelares que elegem um terço dos
senadores de dois em dois anos.

8 – O sistema político é bipartidário, assentando em dois grandes partidos que se


revezam na Presidência dos EUA: Democrático, simbolizado por um burro
(persistência…) e Republicano, simbolizado por um elefante (força…). Presidentes
“emblemáticos” foram, por exemplo, Abraham Lincoln (Republicano) e Franklin
Delano Roosevelt (Democrata) ou, mais modernamente, John Fitzgerald Kennedy
(Democrata) e Ronald Reagan (Republicano).

9 – O Presidente dos EUA não é eleito diretamente. É escolhido por um colégio,


esse sim, eleito diretamente pelos cidadãos dos Estados federados, cujo número
de membros coincide com o Congresso, após um processo de escolha dos
próprios candidatos (que está agora a decorrer…). É isso que explica que nem
sempre o voto popular coincida com o voto do colégio que elege o Presidente
(Donald Trump, por exemplo, teve menos cerca de três milhões de votos do que
Hillary Clinton). A eleição abrange também um Vice-Presidente, que é formalmente
o Presidente do Senado e substitui o Presidente no caso de impedimento (Lyndon
Johnson substituiu Kennedy, quando este foi assassinado, e Gerald Ford substituiu
Richard Nixon, quando ele foi obrigado a resignar, na sequência do processo de
destituição ou “impeachment” motivado pelo escândalo Watergate – escutas
ilegais na sede do Partido Democrático). O Presidente tem um mandato de quatro
anos e pode ser reeleito apenas para um segundo mandato, seguido ou
interpolado (em Portugal, só se admitem dois mandatos seguidos, mas não há
limite aos mandatos interpolados, o que explica que Mário Soares tenha concorrido
a um terceiro mandato presidencial interpolado – e perdido contra Cavaco Silva).
No caso de delitos graves, o Presidente pode ser destituído (impeachment). Para
aprovar a acusação, é necessária a maioria da Câmara de Representantes, mas
para a destituição é necessária uma maioria de dois terços no Senado, que
funciona como tribunal de júri (com 100 membros…), presidido pelo Presidente do
Supremo Tribunal dos EUA. No caso mais recente (Trump), a Câmara de
Representantes aprovou duas acusações (a maioria é do Partido Democrata) mas
o Senado votou contra (a maioria é do Partido Republicano).
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10 - Não havendo Primeiro-Ministro nem “Conselho de Ministros”, como em Portugal,


há um Gabinete, que apoia na ação executiva o Presidente, formado por 15
departamentos, chefiados por Secretários, que são escolhidos pelo Presidente e
confirmados pelo Senado.

11 – Os tribunais têm competência para fiscalizar a constitucionalidade das leis (ao


contrário do que sucede na França, onde só a partir da segunda metade do século
passado o Conselho Constitucional se converteu em verdadeiro tribunal
constitucional, o que se explica pela influência doo pensamento de Montesquieu
que considerava os juízes apenas “a boca que diz as palavras da lei”.). No topo do
sistema, nos EUA, está a Supreme Court, formada por nove juízes, nomeados
vitaliciamente pelo Presidente e confirmados pelo Senado. A importância da
jurisprudência é enorme nos EUA, em que o precedente serve de importante trunfo
nos tribunais (no nosso País e na família “romano-germânica”, é a lei escrita que
tem um peso decisivo). O Supremo dos EUA faz lei em muitas matérias. Por
exemplo, a legislação liberal em matéria de aborto resulta do acórdão “Roe contra
Wade” (1973), que é motivo de controvérsia em cada eleição presidencial. à escala
portuguesa, a Supreme Court é uma mistura de Supremo Tribunal de Justiça e de
Tribunal Constitucional, o que só é possível porque seleciona, segundo a sua
importância, os casos que decide julgar.

12 – Por fim, a revisão constitucional, que só pode abranger as emendas (suprimindo


as existentes ou aprovando novas), obedece a um processo difícil. É necessária,
para a aprovar, uma maioria de dois terços em cada uma das Câmaras (Câmara
de Representantes e Senado) e depois uma aprovação por pelo menos três
quartos dos Estados federados. Dificilmente se conseguirá, por exemplo, uma
alteração à segunda emenda, no sentido de tornar mais restrito o direito de uso e
porte de arma.
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6ª AULA

O constitucionalismo francês

1 – Antecedentes.
1. 1 – O pensamento filosófico de Montesquieu (separação de poderes), Rousseau
(contrato social)e Voltaire. O iluminismo, a separação de poderes, o contrato social e
os enciclopedistas (Diderot e D’ Alembert).
1.2 – A origem revolucionária. A Revolução de 1789 (Tomada da Bastilha).
1.3 – A vocação universalista. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão
(1789). O Código Napoleão – 1804.

2 – Fases de desenvolvimento do movimento constitucional


2.1 – Revolução de 1789.
2.2 – Consulado e I Império (Napoleão Bonaparte).
2.3 – 2ª República e II Império.
2.4 – 3ª, 4ª e 5ª Repúblicas.

3 – Constituições Revolucionárias
3.1 – Constituição de 1791 – Monarquia constitucional – Poder legislativo (Assembleia)
e Poder executivo (Rei).
3.2 - Constituição de 1793 ou do Ano 1 – abandono da divisão de poderes – órgão
político único, o corpo legislativo, que elegia o Conselho Executivo dele
dependente.
3.3 – Constituição de 1795 ou do Ano 3 – Duas câmaras e um órgão colegial, o
Diretório, encarregado do poder executivo.

4 – Constituições Napoleónicas
4.1 – Constituição de 1797 ou do Ano 8 – Consulado (três cônsules), quatro
assembleias (Senado, Conselho de Estado, Tribunado e Corpo Legislativo).
Sistema Eleitoral das “Listas de Confiança”.
4.2 - Constituição de 1802 ou do Ano 10 – Napoleão passa a Cônsul vitalício.
4.3 - Constituição de 1804 ou do Ano 12 – instaura o Império.
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5 – Constituições da Restauração (monárquica)


5.1 – Carta Constitucional de 1814 (Luís XVIII) – Monarquia limitada por duas
câmaras.
5.2 - Carta Constitucional de 1830 (resultou de um pacto entre Filipe de Orleães e a
Câmara dos Deputados) – Revisão da Carta de 1814, num sentido mais liberal.

6 – Constituições da República e do II Império


6.1 - Constituição de 1844 – Regime presidencialista (Presidente e uma Assembleia).
6.2 - Constituição de 1852 – Consolida o poder pessoal do chefe do Estado e coincide
com a restauração do Império (Napoleão III).
6.3 - Constituição de 1870 – evolução do Império no sentido do parlamentarismo.

7 – Constituições das III, IV e V Repúblicas


7.1 - Constituição de 1875 – III República – Sistema parlamentar.
7.2 - Constituição de 1946 – IV República – Manutenção do sistema parlamentar.
7.3 - Constituição de 1958 - V República – Limita o parlamentarismo e reforça os
poderes do PR. A Revisão de 1962 e o “Presidencialismo Gaullista”.

8 – Os grandes períodos constitucionais


8.1 – 1789 a 1871 – 11 Constituições.
8.2 – 1871 até hoje – 3 Constituições (a II Guerra e a Guerra da Argélia).

9 – Regimes Políticos
9.1 – 1789 a 1871 – Monarquia constitucional, regime jacobino, regime cesarista e
regime ditatorial.
9.2 – 1871 até hoje – Sistema parlamentar, substituído em 1958 por um sistema
semipresidencial de governo.

10 – Caraterização geral
10.1 – A evolução faz-se por oposição entre o princípio liberal (Montesquieu) e o
Princípio democrático (Rousseau).
10.2 – A Constituição é escrita e rígida com exclusão do costume
10.3 – Os tribunais judiciais não fiscalizam a constitucionalidade das leis (a Revisão
de 1958 criou o Conselho Constitucional, que se transformou num tribunal
constitucional).
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11 – V República
11.1 – O “presidencialismo” e o General Charles de Gaulle (o seu papel na II Guerra
Mundial)
11.2 A Constituição de 1958 e o Presidente árbitro e a Revisão de 1962 (eleição
presidencial). Presidente eleito por 7 anos e pode ser reeleito.
11.3 – Bicameralismo – Assembleia Nacional (4 anos) e Senado, a Câmara Alta (6
anos).
11.4 – Sistema eleitoral – maioritário, em duas voltas.
11.5 – Sistema de governo semipresidencial, mas com um Presidente que tem mais
poderes que o português e pode demitir o governo por falta de confiança política.

7ª AULA

O constitucionalismo soviético e russo

1. – Antecedentes.
1. 1 – Karl Marx e Friedrich Engels (século XIX) – influências – Filosofia alemã
(dialética de Hegel e materialismo de Feuerbach; Economia clássica inglesa – Adam
Smith e David Ricardo; Socialismo utópico – Proudhon. O Manifesto Comunista e o
Capital.
1.2 – A Revolução Industrial (Inglaterra – 1760 – 1830); A Comuna de Paris (Governo
Operário – 1871 – 72 dias).
1.3 – Situação na Rússia czarista – Guerra com o Japão – 1904-5; Revolta no
Couraçado Potemkine (o filme de Eisenstein…); Revolução de 1905; Criação da Duma
e instituição de partidos políticos (Czar Nicolau II); I Guerra Mundial (derrota contra a
Alemanha – 1914 – 1917, Paz de Brest Litovsk – 1918 – cedência da Finlândia, Países
Bálticos, Polónia, Bielorrússia e Ucrânia)
1.4 – Revolução de fevereiro de 1917 – Abdicação de Nicolau II, instauração de um
regime republicano e democrático; subida ao poder de Kerensky.
1.5 - Revolução de Outubro; O POSDR – mencheviques e bolcheviques; Vladimir
Ilitch Ulianov (Lenine) e Leon Trotzky; Sovietes (John Reed – Dez dias que abalaram o
Mundo).
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2. – Fases de desenvolvimento do processo político


2.1 – 1917 – 1921 – Fase revolucionária e guerra civil entre vermelhos e brancos;
1922 – Instituição da URSS.
2.2 – 1921 – 1928 – Reconstrução e NEP (Nova Política Económica).
2.3 – 1928 – Coletivização e industrialização; Kolkhozes (como as cooperativas na
revolução portuguesa de 1974) e Sovkhozes (como as unidades coletivas de
produção na revolução portuguesa de 1974).
2.4 – 1936 – 1953 – Consolidação do estalinismo; assassinato de Trotzky (1940 –
México); II Guerra (Pacto germano-alemão – Ribentrop/Molotov - e invasão da
URSS); Guerra fria, equilíbrio pelo terror e modelo bipolar internacional.
2.5 – 1953 – 1964 – desestalinização e abertura do regime; a troika Krushchev – XX
Congresso - 1956; guerra da Coreia (1950 – 53); crise de Cuba (1962); Cisma
sino-soviético e maoismo.
2.6 – 1964 – 1985 – estabilização interna e intervenção externa; guerras anticoloniais;
guerra do Vietname (1961 – 1975).
2.7 – 1985 – 1989 – Perestroika e Glasnost; Gorbachev e Ieltsin.
2.8 – 1989 – 1991 – Desagregação; a guerra das estrelas; Reagan e Thatcher; O
Solidariedade e Lech Walesa; o Papa Polaco (João Paulo II); Queda do Muro de
Berlim (1989) e colapso da URSS (1991) e do Pacto de Varsóvia.

3. – Constituições
3.1 – Declaração de Direitos do Povo Trabalhador e Explorado – 1918.
3.2 – Constituição de 1918 - Limitação do sufrágio (ditadura do proletariado);
Organização piramidal do poder – soviete local, Congresso pan-russo dos
Sovietes, Junta Central Executiva dos Sovietes e Conselho do Comissários do
Povo.
3.3 – Constituição de 1924 (1922 – instituição da URSS) – Sistema bicameral –
Conselho da União e Conselho das Nacionalidades.
3.4 - Constituição de 1933 – Fim da exploração do homem pelo homem e sufrágio
“universal”.
3.5 – 1977 – Estado de todo o povo; aprofundamento da democracia socialista.

4. – Caraterísticas gerais
4.1 – Partido único; centralismo democrático; controlo das organizações sociais.
4.2 – Papel da classe operária e ditadura do proletariado;
4.3 – Legalidade socialista e direitos fundamentais;
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4.4 - Papel da procuradoria e da polícia política (KGB).

5. – Organização política
5.1 – Soviete Supremo – órgão superior com duas câmaras - Conselho da União e
Conselho das Nacionalidades e um Praesidium.
5.2 – Conselho de Ministros – órgão executivo.
5.3 – O Secretário-Geral, o Comité central e o Congresso do PCUS.

6. – A Federação Russa e a Constituição Russa de 1993


6.1 – A queda do Muro de Berlim, a implosão da URSS e a extinção do Pacto de
Varsóvia originaram uma nova realidade, com a Federação Russa e a
independência de antigos Estados federados da URSS, como a Ucrânia.
6.2 - A Constitruição russa de 1993 prevê Direitos fundamentais, Democracia e
pluripartidarismo
6.3 Consagra a propriedade e a iniciativa privadas.
6.4 Contempla um sistema bicameral – Conselho da Federação (2 representantes por
cada República) e Câmara dos Deputados (Duma) – Câmara Baixa -459
deputados.
6.5 – Configura como órgão executivo o Governo.
6.6 Estabelece como sistema de Governo um presidencialismo imperfeito, com
Primeiro-Ministro (a “dança das cadeiras” de Putin).
6.7 A revisão constitucional depende de dois terços – artigos 3º a 8º da Constituição;
ou de três quintos do Parlamento - artigos 1º, 2º e 9º.

8ª AULA

Evolução do constitucionalismo português

1 - Generalidades
1. 1 – Seis Constituições portuguesas – 1822, 1826, 1838, 1911, 1933, 1976.
1.2 – À exceção da Carta Constitucional de 1826 (escrita no Brasil por D. Pedro IV),
todas tiveram origem em revoluções ou golpes de Estado, o que contraria um pouco a
ideia de “país de brandos costumes”.
16

1.3 – À semelhança do que sucedeu em França, o movimento constitucional


representou uma rutura com o absolutismo real, embora destituído da dimensão
anticlerical e de mudança de forma monárquica de governo.
1.4 – As quatro primeiras constituições foram liberais; a quinta foi ditatorial ou
autoritária; a sexta foi a primeira Constituição democrática portuguesa.

2 – Épocas
2. 1 – Liberal – 1820 – 1926 (quatro Constituições – 1822, 1826, 1838 e 1911).
Instauração do liberalismo – 1820 a 1851; Regeneração e pacificação do poder – 1851
a 1891; Crise da monarquia – 1891 a 1910; I República – 1910 a 1926).
2.2 – Corporativa e autoritária ou ditatorial – 1921 a 1974 (Constituição de 1933).
Ditadura nacional; Regime corporativista; “Primavera Marcelista”.
2.3 – Democrática – 1974 até hoje (Constituição de 1976). PREC; Pacto
MFA/Partidos; I Revisão Constitucional.

3 – Origem das Constituições


3.1 – Assembleias Constituintes – 1822, 1911 e 1976.
3.2 – Exercício do poder real – 1826.
3.3 – Assembleia Constituinte e sanção real – 1838.
3.3 – Governo e plebiscito – 1933.

4 – Dimensão das Constituições


4.1 – 1822 – 240 artigos.
4.2 – 1826 – 145 artigos.
4.3 – 1838 – 140 artigos.
4.4 – 1911 – 87 artigos.
4.5 – 1933 – 142 artigos.
4.6 – 1976 – 312 artigos (presentemente 296). Segundo Jorge Miranda, para além de
ser a mais longa, é também a mais perfeita que já tivemos.

5 – Constituição de 1822
5.2 – As invasões napoleónicas (1807). A fuga da Corte para o Brasil – D. João VI e
Príncipe D. Pedro (1808).
5.3 – Portugal como protetorado britânico e a conspiração de Lisboa de 1817. O
enforcamento dos doze conjurados (Campo dos Mártires da Pátria) e a execução
17

do General Gomes Freire de Andrade (1817) – Referência à peça de teatro


“Felizmente há Luar”, de Luís Sttau Monteiro.
5.4 – Formação do Sinédrio - Porto - Desembargador Manuel Fernandes Tomás (24
de agosto de 1820); Lisboa (15 de setembro de 1820); Unificação do movimento
revolucionário (28 de setembro de 1820). Influência da Revolução liberal
espanhola de 1820 e da Constituição de Cádis.
5.5 – Reunião das Cortes e regresso da família real do Brasil (1821). Aprovação da
Constituição e proclamação da Independência do Brasil – D. Pedro é proclamado
Imperador (1822).
5.6 – A Constituição de 1822 assentava numa união real com o Brasil. Reconhecia
direitos fundamentais (o tríptico liberdade, segurança, propriedade, inspirado na
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, que lhe acrescentava
já o direito de resistência contra a opressão). O direito de sufrágio era restrito e
dependente da condição social. O Governo era formado por Secretários de Estado
nomeados e destituídos pelo Rei. Havia uma só Câmara (Cortes). A Religião
Católica continuou a ser religião oficial (só o deixou de ser com a implantação da
República).

6 – Carta Constitucional de 1826


6.2 – Morte de D. João VI – Rei de Portugal e do Brasil de 1816 a 1822 e depois Rei
de Portugal (1826).
6.3 – D. Pedro, proclamado Imperador do Brasil em 1822, abdica em benefício da filha
mais velha, D. Maria II, então com 7 anos, e outorga a Carta Constitucional de
1826.
6.4 – A Carta Constitucional de 1826 foi influenciada pela Constituição brasileira de
1824 (primeira Constituição brasileira). Transferiu os direitos fundamentais para o
último capítulo. Instituiu um parlamento bicameral, com Câmara dos Deputados
(eleitos) e Câmara dos Pares (nomeados pelo Rei). Atribuía ao Rei um poder
“moderador”, de que ainda hoje se fala a propósito do Presidente da República.

7 – Constituição de 1838
7.2 – A proclamação de D. Miguel como Rei pelas Cortes (1828). Eclode a guerra
entre liberais e absolutistas (1828-1838).
7.3 – Derrota de D. Miguel. Tratado “quadripartido” de Londres, entre Reino Unido,
França, Espanha e D. Pedro IV, que leva à expulsão de D. Miguel de Portugal e de
D. Carlos de Bourbón de Espanha (1834).
18

8 – Constituição de 1911
8. 1 – Antecedentes. A expedição africana de Serpa Pinto, o “mapa cor-de-rosa”, o
ultimato britânico de 1890 e a cedência de D. Carlos (referência a Finis Patriae Guerra
Junqueiro e a “A Portuguesa” como hino antibretão: “contra os bretões, marchar,
marchar”, dizia o original…). A revolta republicana sufocada, de 31 de janeiro de 1891,
no Porto. O sistema vicioso de alternância entre o Partido Progressista e o Partido
Regenerador. A ditadura de João Franco. O regicídio de 1908 do Rei D. Carlos I e do
Príncipe Luís Filipe (Alfredo Costa e Manuel Buíça; o papel de Aquilino Ribeiro e a
Carbonária). O Partido Republicano e a revolução republicana. A proclamação da
República a 5 de outubro de 1919 nos Paços do Concelho, atual Câmara Municipal,
em Lisboa (José Relvas). Formação do Governo Provisório chefiado por Teófilo Braga.
O Primeiro Presidente da República e teve como fontes as Constiuições suíça e
brasileira (de 1891).foi Manuel de Arriaga (1911).

8.2 – A Constituição de 1911 foi elaborada num curto período (menos de três meses).
O sistema de governo era parlamentar, com um Congresso que tinha duas secções: o
Conselho Nacional, eleito por sufrágio direto (mas não universal, porque as mulheres,
designadamente, não tinham direito de voto por não serem chefes de família; o papel
de Leonor Cabete na luta pelo direito de voto das mulheres), o Conselho dos
Municípios, eleito pelos vereadores das Câmaras Municipais. O poder executivo ra
exercido pelo Presidente da República e pelos Ministros. O Presidente não tinha uma
legitimidade própria porque era eleito para um mandato de quatro anos (e não podia
ser reeleito nos quatro anos seguintes) pelo Congresso - e não diretamente pelos
cidadãos. O Presidente podia se destituído por decisão fundamentada do Congresso,
aprovada por maioria de dois terços. Não podia dissolver o congresso nem tinha
direito de veto.
8.3 – A Constituição de 1911 foi revista várias vezes. A alteração mais marcante foi a
de 1918, durante a ditadura de Sidónio, que transformava o sistema de governo em
presidencial. Porém, a alteração não sobreviveu ao assassínio de Sidónio, ainda em
1918.
8.4 – Não prevendo a existência de um tribunal constitucional, a Constituição de 1911
reconhecia aos tribunais em geral competência para apreciar a constitucionalidade das
leis (fiscalização difusa da constitucionalidade), de acordo com o modelo dos EUA.
19

9 - Constituição -1933.
9.1 – Antecedentes do golpe. A turbulência económica, social e política da I República:
a instabilidade política (23 os governos entre 1920 e 1926), a insegurança, com
atentados bombistas, a crise financeira e a oposição da Igreja devido à
natureza anticlerical do regime (separação entre Estado e Religião). A
intervenção desastrosa na I Guerra Mundial (Flandres). A sublevação militar
fracassada de 19 de outubro de 1921. A revolta militar dominada de 18 de abril
de 1925. O golpe militar de 28 de maio de 1926 (Gomes da Costa marchou
triunfalmente de Braga até Lisboa e Mendes Cabeçadas viria a ser designado o
primeiro Presidente). A Implantação da ditadura militar, depois convertida em
ditadura nacional.
9.2 - Entre o golpe de 28 de maio de 1926 e a entrada em vigor da Constituição de
1933, houve um vazio legislativo preenchido pela continuação em vigor apenas
parcial da Constituição de 1911 (por exemplo, os partidos políticos foram
proibidos).
9.3 – A Constituição de 1933 foi influenciada pela Constituição de Weimar; o Estado é
classificado como corporativo, ou seja, pretensamente fundamentado nas
corporações, que representavam o povo, mas não nos partidos, que o dividiam o
corporativismo; havia uma Assembleia Nacional, com um número reduzido de
deputados (de 100 em certa altura, mas com flutuações de número pouco
significativas), e Câmara Corporativa, mas um sistema unicameral, porque a
Câmara Corporativa não era órgão de poder.
9.4 – Havia partido único (União Nacional, transformada em Ação Nacional Popular no
tempo de Marcelo Caetano); não havia voto universal (tal como na I República, em
que o direito de voto só era reconhecido a chefes de família letrados, excluindo as
mulheres) nem partidos políticos.

9.5 – O sistema de governo era “presidencial de primeiro-ministro”, ou seja, a figura


dominante era o Presidente do Conselho de Ministros e não o Chefe de Estado.
Durante mais de trinta anos, a personagem central do regime foi António Oliveira
Salazar, Professor de Direito na Faculdade de Direito de Coimbra, autor de uma
tese de doutoramento sobre “O ágio do ouro” e especialista em finanças públicas.
Começou por ser Ministro das Finanças e depois concentrou um poder quase
ilimitado nas suas mãos, como primeiro-ministro, num regime em que havia polícia
política (PIDE, convertida em DGS no tempo de Marcelo Caetano) e censura
(Transformada em “exame prévio” por Marcelo Caetano). Depois do período inicial,
20

com Mendes Cabeçadas e Gomes da Costa, foram Chefes de Estado Carmona,


Craveiro Lopes e, durante um longo período, por fim, Américo Thomaz. Todos
eram oficiais generais. O Almirante Américo Thomaz chegou à presidência após
ter vencido em eleições o General da Força Aérea Humberto Delgado, sob fortes
acusações de fraude eleitoral. Essa eleição foi a última eleição direta que se
realizou para a Presidência da República na vigência da Constituição de 1933.

9.6 – Em 1968 Salazar sofreu um AVC na sequência de um acidente (queda) e foi


substituído por Marcelo Caetano (também Professor, de Direito Administrativo, na
Faculdade de Direito de Lisboa). O período que se seguiu, a que se chama com
frequência “Primavera marcelista” foi marcado por uma revisão constitucional (a
quinta em relação à Constituição de 1933), com o objetivo de promover uma
moderada liberalização do regime. Instituições como a União Nacional, a PIDE e a
censura mudaram de nome (Acção Nacional Popular, Direção-Geral de Segurança
e Exame Prévio) e entraram na Assembleia Nacional deputados da chamada ala
liberal (em que pontificava Francisco Sá Carneiro, mais tarde fundador do PPD).
As críticas que estes deputados fizeram à guerra, à polícia política e à censura
foram mal recebidas e eles foram rapidamente segregados pelo regime.

9ª AULA

A Constituição de 1976- Enquadramento político-constitucional

1 – Antecedentes.
A Guerra de África (1961-1974) em três frentes (Angola, Moçambique e Guiné) e o
isolamento internacional do Estado português (ONU, CEE). O atraso do país
(predominantemente rural, com elevada taxa de analfabetismo e sem “classe média”).
Os níveis de consumo baixos, com 80 Km de autoestradas (hoje mais de 3 000) e
cerca de 500 000 automóveis (atualmente mais de cinco milhões). O atraso económico
e a emigração massiva. A ausência de instituições democráticas e de direitos políticos.
A oposição interna ao regime. A eclosão de atentados em território nacional - ARA,
Acção Revolucionária Armada (Jaime Serra, Raimundo Narciso) ; a LUAR, Liga de
Unidade e Ação Revolucionária (Palma Inácio, Camilo Mortágua); as PRP, Partido
Revolucionário do Proletariado (Isabel do Carmo, Carlos Antunes). O
descontentamento nas Forças Armadas. A formação e as reivindicações do
Movimento das Forças Armadas (“Movimento dos Capitães”). O livro “Portugal e o
21

Futuro e o papel dos Generais António de Spínola e de Francisco da Costa Gomes. A


tentativa de golpe militar das Caldas da Rainha de 16 de março de 1974 (Vasco
Lourenço) e a incapacidade de reação do regime.

2 – Origens.
No dia 25 de abril eclodiu um golpe de Estado dirigido pelo MFA, cujo comandante
operacional foi Otelo Saraiva de Carvalho (escreveu o livro de relato “Alvorada em
Abril”). Os revoltosos dominaram rapidamente a situação. Sitiado no Carmo por uma
força comandada por Salgueiro Maia, Marcelo Caetano rendeu-se ao Genaral Spínola,
sendo levado para a Madeira, juntamente com o Chefe de Estado (Almirante Thomaz),
para a Madeira, de onde partiu para o exílio no Brasil. A adesão da população ao
golpe foi generalizada, desencadeando um movimento revolucionário que teve como
ponto alto o 1º de maio, com uma grande manifestação popular em Lisboa. Foi
constituída uma Junta de Salvação Nacional presidida pelo General Spínola.
Regressaram os políticos no exílio (Mário Soares, Álvaro Cunhal) e saíram da prisão
os presos políticos. Foi abolida a censura e extinta a PIDE-DGS, cujos elementos
mataram seis pessoas a tiro no dia 25 de abril, junto à sua sede, em Lisboa (Rua
António Maria Cardoso). O MFA apontou como objetivo descolonizar, democratizar e
desenvolver. Portugal entrou em negociações com os movimentos de libertação das
colónias, transferindo para eles a respetiva soberania num processo conturbado que
levaria à repatriação para o continente de centenas-de-milhar de portugueses. No
continente desenvolveu-se um processo revolucionário (“em curso” – PREC) que teve
como momentos de confronto, entre forças mais moderadas e mais revolucionárias, o
28 de setembro (Spínola demite-se e cede a presidência a Costa Gomes e o Primeiro-
Ministro Palma Carlos é substituído pelo então Coronel Vasco Gonçalves), o 11 de
Março (em que o país esteve à beira da guerra civil e que culminou com uma
assembleia do MFA que instituiu um Conselho da Revolução e decretou um vasto
conjunto de nacionalizações e o 25 de novembro (em que as força revolucionárias
mais radicais foram dominadas, por militares dirigidos por Ramalho Eanes e
comandados no terreno por Jaime Neves). Antes do 25 de novembro, chegara a haver
atentados bombistas contra os partidos mais à esquerda, levados a cabo por
organizações como o ELP-MDLP – Exército de Libertação de Portugal – Movimento
Democrático de Libertação de Portugal, onde teve papel preponderante Alpoim Calvão
e que chegou a ser apoiado por Spínola - e os CODECO – Comandos Operacionais
de Defesa da Civilização Ocidental. Nas ilhas, organizações a FLA (Frente de
Libertação dos Açores) e a FLAMA (Frente de Libertação do Arquipélago da Madeira)
22

reclamavam entretanto a independência. As forças que prevaleceram foram as forças


moderadas, com expressão militar no chamado grupo dos nove (Melo Antunes, Vítor
Alves, Vasco Lourenço, Pezarat Correia, Sousa e Castro…) e apoio nos partidos
políticos à direita do PCP (PS, PPD, CDS), que entretanto tinham criado já uma central
sindical alternativa `CGTP (a UGT). O 25 de novembro de 1975 está na origem do
surgimento de uma organização terrorista de extrema esquerda, as Foças Populares
25 de Abril, em que terá estado envolvido Otelo Saraiva de Carvalho. esta organização
foi desmantelada no final dos anos 70, graças ao esforço da PJ (Direção Central de
Combate ao Banditismo) e das Forças Armadas (DINFO – Divisão de Informações). A
paz social foi consolidada por uma amnistia muito controversa, que não foi
considerada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional e pela eleição do General
Ramalho Eanes (um dos vencedores do 25 de novembro) como primeiro Presidente
da República eleito (precedido de Spínola e Costa Gomes, como Presidentes não
eleitos, estes Generais receberam o bastão de marechal, que Ramalho Eanes viria a
recusar).

3 – A Assembleia Constituinte.
Cumprindo a promessa feita pelos militares, foi eleita uma Assembleia Constituinte em
25 de abril de 1975. Foi a primeira eleição em que participaram, sem restrições, todos
os eleitores com mais de dezoito anos (a maioridade, antes fixada nos vinte e um anos
tinha baixado para os dezoito). A eleição seguiu o sistema proporcional e o método de
Hondt, que viriam a ser consagrados no texto constitucional. Registou-se um afluxo
massivo de mais de 90 % dos eleitores e os resultados favoreceram as forças mais
moderadas (PS 38 %, PPD 26%, PCP 12 % e CDS 7 %9, levando à substituição de
Vasco Gonçalves por Pinheiro de Azevedo na chefia do (Sexto) Governo Provisório.
Antes da designação do primeiro primeiro-ministro constitucional, tiveram essa
responsabilidade Adelino da Palma Carlos (professor da Faculdade de Direito de
Lisboa, Vasco Gonçalves e Pinheiro de Azevedo (General e Almirante, no termo das
respetivas carreiras militares). Os deputados deram por concluído o seu trabalho em 2
de abril de 1976, tendo votado contra o texto constitucional apenas os representantes
do CDS. A Constituição entrou em vigor no dia 25 de abril de 1976.
23

4 – Caraterização geral.
A Constituição de 1976 foi influenciada pelo processo revolucionário e até certo ponto
condicionada pelo Pacto MFA-Partidos. Consagrou um órgão de soberania político-
militar, o Conselho da Revolução, e a irreversibilidade das nacionalizações. Todavia,
no essencial, a Constituição de 1976 instituiu um Estado de Direito democrático, liberal
e social, como resulta, desde logo, do seu artigo 2º. Assim, consagrou uma
democracia representativa (com aprofundamento da democracia participativa), a
separação e interdependência de poderes, a forma de governo republicana e o
sistema de governo semipresidencial, o sistema eleitoral proporcional e o método de
Hondt, um Estado unitário (com regiões autónomas político-administrativas nos Açores
e na Madeira e um programa de criação de regiões administrativas no continente), um
amplo conjunto de direitos fundamentais (incluindo direitos, liberdades e garantias,
mas também direitos económicos, sociais e culturais), a coexistência de três setores
de propriedade (pública, privada e social, incluindo a cooperativa), a fiscalização da
constitucionalidade (designadamente através do Tribunal Constitucional, mas, de
forma difusa, por todos os tribunais) e a revisão constitucional, num quadro de
Constituição semirrígida.
5 - Sistemática. Preâmbulo. Direitos e deveres fundamentais. Organização política.
Organização económica. Revisão e garantia da Constituição.

10ª AULA

Sistemática. Preâmbulo, Princípios e Direitos Fundamentais

1 – A sistemática constitucional
1.1 – Iluminismo, liberalismo, jusracionalismo, movimento codificador e sistemática
das constituições. O caráter casuístico, discriminatório e assistemático do
Direito antigo – Ordenações do Reino – Afonsinas, Manuelinas e Filipinas –
cinco Livros de cada – disponíveis em edição da Gulbenkian).
1.2 - A Constituição como carta de direitos e deveres e instrumento de regulação
dos poderes do Estado.
1.3 – A sistemática da Constituição de 1976: Preâmbulo; Princípios fundamentais;
Parte I - Direitos e deveres fundamentais; Parte I” – Organização económica;
Parte III – Organização do poder político; Parte IV – Garantia e revisão da
Constituição; Disposições finais e transitórias.
24

2 – Preâmbulo
2.1 – A linguagem e carga ideológica – as referências ao fascismo e ao socialismo.
2.2 – A ausência de força normativa do preâmbulo e a desnecessidade e ausência
de sentido da sua eventual revisão.

3 – Princípios fundamentais
3.1 – A dignidade da pessoa humana. Fundamento “ontoantropológico”. Os
humanismos. O pensamento kantiano – artigo 1º.
3.2 – O Estado de direito democrático. O programa político da Constituição -
democracia representativa e pluralista com aprofundamento da democracia
participativa, separação e interdependência de poderes com consagração do
princípio da legalidade e da independência dos tribunais, forma de governo
republicana, sistema de governo semipresidencial, parlamento unicameral
sistema eleitoral proporcional e o método de Hondt, Estado unitário – artigo 2º.
3.3 – Soberania, cidadania, Estado unitário com Regiões Autónomas e Regiões
Administrativas, relações internacionais, missões do Estado, direito de sufrágio
e símbolos da República – artigos 3º a 11º.

4 – Direitos e deveres fundamentais


4.1 – A tendência liberal e garantista da Constituição de 1976, por contraposição à
Constituição autoritária de 1933.
4.2 – Princípios da universalidade e da igualdade. A extensão a estrangeiros e os
regimes especiais para cidadãos da CPLP, da EU e estrangeiros residentes. As
pessoas coletivas – artigos 12º, 13º e 15º.
4.3 – Força jurídica – artigos 17º e 18º. Regime dos direitos, liberdades e garantias e
equiparação de direitos económicos, sociais e culturais com natureza análoga (a
definição pelo Tribunal Constitucional). A vinculação imediata, o efeito para
terceiros e a máxima restrição das restrições. Os princípios da necessidade, da
adequação e da proporcionalidade das restrições. Distinção entre restrições e
limites imanentes (referência a Robert Alexy e Vieira de Andrade) A congruência
ou concordância prática dos direitos fundamentais. A proibição de retroatividade
das restrições.
4.4 – Formas de tutela – acesso ao direito e aos tribunais, direito de resistência,
responsabilidade extracontratual do Estado e Provedor de Justiça (origem: o
Ombudsman sueco) – artigos 20º a 23º.
25

4.5 – Valor interpretativo da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1949 (II
Guerra Mundial e origem da Declaração; referência ao papel de Eleonor
Roosevelt) – artigo 16º.
4.6 – Estado de sítio e estado de emergência. Competência e processo de declaração.
Direitos insuscetíveis de suspensão. A subordinação ao princípio da
proporcionalidade. O prazo de quinze dias e a renovação. A questão dos estados
de exceção não constitucionais (referência a Bacelar Gouveia – tese de
doutoramento) – artigo 19º.

5 – Sedimentação histórica dos direitos fundamentais


5.1 – As quatro gerações de direitos fundamentais e o seu desenvolvimento a partir do
último quartel do século XXVII.
5.2 – Direitos de liberdade (revoluções liberais).
5.3 – Direitos de participação política (consagração da democracia).
5.4 – Direitos sociais (consagração do Estado social).
5.5 – Direitos de 4ª geração (exemplos: direito ao ambiente, direitos dos animais e
direito à utilização da informática).

6 – Classificação constitucional dos direitos fundamentais


6.2 – Os direitos liberdades e garantias – de natureza pessoal (exemplo: direito à vida
– os problemas do aborto e da eutanásia, à integridade – a proibição de tortura, à
liberdade – a prisão como ultima ratio, à segurança…); de participação política
(direito de sufrágio, direito de associação e criação de partidos políticos); dos
trabalhadores (segurança no emprego, liberdade sindical, direito à greve).
6.3 – Os direitos económicos (direito ao trabalho, direito de propriedade…), sociais
(direito à segurança social, direito à saúde…) e culturais (direito à educação,
direito à cultura…).
6.4 – Direitos fundamentais fora do catálogo (exemplos: artigos 124º, 264º, 2, 215º,
271º, 3, 113º, 276º, 7, da Constituição). O carater não taxativo da enunciação na
Parte I da Constituição.
6.5 – Direitos fundamentais não previstos na Constituição (mas reconhecidos pelo
artigo artigo 16º, 1) – Direito ao nome (artigo 72º do Código Civil); direito à
reparação de danos causados ilicitamente (artigo 483º do Código Civil).
26

7 – Deveres fundamentais
7.1 – A aparente menor expressão dos deveres fundamentais em confronto com os
direitos fundamentais
7.2 – A existência de um dever universal de respeito (omissivo) dos direitos
fundamentais alheios.
7.3 - A previsão expressa de deveres. Exemplos: o dever de respeitar o domicílio
alheio (artigo 34º, nº 3); o dever de defender a Pátria (artigo 276º, nº 1, da Constituição
– fora da Parte I).
7.4 – A pressuposição implícita. Exemplos: o dever de respeitar o direito à vida,
decorrente da sua inviolabilidade e da proibição absoluta de pena de morte (artigo
24º); o dever de pagar impostos, decorrente, a contrario sensu, do direito de não pagar
impostos inconstitucionais, ilegais ou retroativos (artigo 103º, nº 3).

11ª AULA

Organização económica e do poder político

I - Organização económica

1 – O modelo liberal de mercado e o Estado social.


1.1 – A subordinação do poder económico ao poder político (artigo 80º).
1.2 - A coexistência de três setores de propriedade: privado público e social, incluindo
o cooperativo (artigo 80º).
1.3 – O domínio público e a propriedade pública de recursos naturais e de meios de
produção de interesse público (artigos 80º e 84º).
1.4 – A proteção do setor social (artigo 81º).
1.5 - A participação dos trabalhadores (artigo 80º).

2 – Incumbências do Estado
2.1 – A Promoção do bem-estar e da justiça social (artigo 81º).
2.2 – A otimização de recursos (artigo 81º).
2.3 – O planeamento democrático (artigo 80º).
2.4 – O Conselho Económico-social (artigo 92º).
2.5 - A promoção da coesão económica e social (artigo 81º).
2.6 - A defesa do ambiente (artigo 81º).
27

3 – Sistema financeiro e fiscal


3.1 – O Banco de Portugal. A moeda única e o papel do Banco Central Europeu. A
soberania mitigada (referência a Adriano Moreira) (artigo 102º).
3.2 – O Orçamento de Estado. Competências do Governo, da Assembleia da
República, do Presidente da República, do Tribunal Constitucional e do
Tribunal de Contas (artigo 105º).
3.3 – Impostos. Distinção entre taxas e impostos e entre impostos diretos e
indiretos. O IRS e o IVA. A exigência de progressividade do IRS. A reserva de
lei da Assembleia da República. A proibição de retroatividade. A distinção entre
retroatividade e “retrospetividade” e o exemplo histórico de retroatividade do
imposto complementar (artigos 105º e 106º).

II - Organização do poder político

1 – Titularidade e exercício do poder político


1.1 – O povo como titular do poder (artigo 108º).
1.2 – Os órgãos de soberania: Presidente da República, Assembleia da
República, Governo e Tribunais (artigo 110º).
1.3 -O princípio da separação e interdependência de poderes: Montesquieu e
De l’Esprit des Lois (artigo 111º).
1.4 – A tipicidade dos atos normativos (leis, decretos-leis e decretos
legislativos regionais). Lei em sentido formal e material. A exigência de
igual dignidade hierárquica das leis interpretativas (artigo 112º).
1.5 – O princípio democrático e o pluralismo político. O sistema proporcional e
o método de Hondt (artigos 113º e 114º).
1.6 Democracia participativa, direito de petição e referendo. A vinculatividade
do referendo. Casos de referendo admitido (exemplos: aborto, eutanásia),
obrigatório (regionalização) e proibido (exemplos: matérias constitucionais,
orçamentais e tratados) (artigo 115º).
1.7 – Estatuto dos titulares de cargos políticos. Responsabilidade civil, penal e
política. Imunidades. A renovação de mandatos e os seus limites (artigos
117º e 118º).
28

2 – Presidente da República
2.1 – Definição constitucional, capacidade eleitoral passiva (35 anos e
nacionalidade portuguesa de origem), candidatura ( 7 550 assinaturas),
reelegibilidade (por um só mandato consecutivo e por outros, sem limite,
interpolados), sistema eleitoral (eleição em uma ou duas voltas) (artigos
120º a 128º).
2.2 – Destituição. O Presidente pode ser demitido e impedido de se
recandidatar por crimes cometidos no exercício de funções (por outros
crimes é julgado quando cessar o mandato, como qualquer outro cidadão).
A competência para o destituir é da Assembleia da República (iniciativa de
um quinto dos deputados e aprovação por dois terços) e do Supremo
Tribunal de Justiça (julgamento perante o pleno das secções criminais –
tal como o Presidente da Assembleia da República e o Primeiro- Ministro)
(artigo130º).
2.3 – Substituição interina – o Presidente da Assembleia da República como
segundo alto dignitário do Estado (artigo 132º).
2.4 Competências presidenciais. Dissolução da Assembleia da República
(prazos) e demissão do Governo (por irregular funcionamento das
instituições). É Comandante Supremo das Forças Armadas e preside ao
Conselho superior de defesa Nacional. Declaração da paz e da guerra e
do estado de sítio e do estado de emergência (ouvido o Governo e
autorizado pela Assembleia da República). Preside ao Conselho de
Estado, órgão de aconselhamento que é formado por altos dignitários do
Estado, pelos Ex-Presidentes da República, por cinco membros
designados pela Assembleia da República e por outros cinco de
nomeação presidencial. Promulgação, veto (no caso das leis da a
Assembleia da República, esta pode voltar a aprová-las por maioria
absoluta) ou pedido de fiscalização da constitucionalidade de leis e
decretos-leis. Ratificação de tratados. Indulta e comuta penas, ouvido o
Governo. É grão-mestre das ordens honoríficas e confere condecorações.
Tem, em geral, o poder moderador que já era atribuído ao Chefe de
Estado (então ao Rei) pela Carta Constitucional de 1826 (artigos 133º a
140º).
29

3 – Assembleia da República
3.1 – É eleita por círculos eleitorais, segundo o sistema proporcional e de
acordo com o método de Hondt (artigo 149º).
3.2 – Representa todos os cidadãos portugueses, tem o primado do poder
legislativo e, em geral, fiscaliza o Governo (artigos 161º e 162º). O
primado do poder legislativo é ilustrado, desde logo, pelo poder de
apreciar os decretos-leis do Governo, alterando-os ou fazendo cessar a
sua vigência, no prazo de 30 dias após a publicação, mediante
requerimento de dez deputados (artigo 169º).
3.3 – Tem um mínimo de 180 e um máximo de 230 deputados (no início foram
250). O número, dentro destes limites é fixado pela lei, sendo,
presentemente, de 230. Os deputados estão sujeitos a um regime de
incompatibilidades e beneficiam de imunidades para melhor exercerem o
mandato: enquanto tais, não podem ser responsabilizados pelos votos e
opiniões e só podem ser detidos em flagrante delito por crimes dolosos
puníveis com pena de prisão superior a três anos (este último regime é
extensivo aos membros do Governo) (artigos 148º, 155º e 157º).
3.4 – Às eleições para a Assembleia da República apenas podem concorrer
partidos políticos, sozinhos ou coligados. Os independentes apenas
podem concorrer nas listas dos partidos políticos (ao contrário do que
sucede nas eleições para a Presidência da República ou para as
autarquias) (artigo 151º).
3.5 A Assembleia da República tem competência reservada absoluta para
legislar em várias matérias, incluindo Orçamento de Estado, Segredo de
Estado, Regime do Estado de Sitio e de Emergência, Regime do Sistema
de Informações e Forças de Segurança. Se o Governo aprovar decretos –
leis sobre essas matérias, eles serão formal e organicamente
inconstitucionais. A Assembleia da República tem também uma
competência reservada relativa noutras matérias, como, por exemplo,
direitos liberdades e garantias, direito penal e direito processual penal e
sistema fiscal. Nestes casos, para além de poder legislar por si mesma, a
Assembleia da República pode autorizar o Governo a fazê-lo. As leis de
autorização legislativas têm de ser precisas, sob pena de
inconstitucionalidade. Nesta situação, os decretos-leis autorizados têm de
se subordinar às leis da Assembleia da República (tal como sucede
quanto aos decretos-leis que desenvolvem leis de bases gerais). a regra
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geral, porém, é a contrária, leis e decretos-leis têm o mesmo valor, e é


essa regra que sucede nas matérias não constantes das reservas, em que
a Assembleia da República e o Governo têm uma competência
concorrencial (o Governo só tem competência exclusiva para aprovar a
sua própria orgânica. que define a sua composição e as competências de
cada ministério). Apesar de o primado do poder legislativo pertencer à
Assembleia, é o Governo que aprova mais diplomas legais (decretos-leis)
por o processo de aprovação pelo Governo ser muito mais simples. As leis
da Assembleia têm origem em projetos dos grupos parlamentares ou
propostas do Governo e obedecem a um processo complexo, que pode
envolver aprovação na generalidade, discussão na especialidade e
aprovação global final, com audições de entidades exteriores de permeio
(artigos 112º, 164º e 165º).
3.6 – Se não houver convocação antecipada de eleições (pelo Presidente, que
não o pode fazer nos primeiros seis meses do mandato da Assembleia ou
nos últimos seis meses do mandato presidencial), a legislatura dura quatro
anos e é composta por quatro sessões legislativas (mais ou menos
coincidentes com os anos letivo e judicial) (artigos 171º e 172º).
3.7 – A Assembleia da República é presidida por um deputado eleito pelos
pares que é a segunda figura do Estado. O Presidente da Assembleia é
coadjuvado por quatro Vice-Presidentes. A assembleia da República tem
uma Comissão Permanente e várias comissões especializadas (Direitos
Liberdades e Garantis, Defesa, Educação, Saúde…). Os deputados dos
vários partidos ou coligações formam grupos parlamentares, que são
apoiados pelos serviços da Assembleia e pelos seus próprios gabinetes
(artigos 175º e 178º a 181º).
4 – Governo
4.1 – O poder executivo: condução da política geral do país e direção da
Administração Pública (artigo 182º).
4.2 – Composição: Primeiro-Ministro, Vice-Primeiros-Ministros (pode haver e é
frequente em governos de coligação), Ministros, Secretários e
Subsecretários de Estado 8artigo 183º).
4.3 – Nomeação: compete ao Presidente da República nomear o Primeiro-
Ministro, tendo em conta os resultados eleitorais. Normalmente é
escolhido o líder do partido ou coligação mais votados. Não foi assim com
o anterior Governo de António Costa, porque o PS, embora tivesse menos
31

deputados do que a coligação PSD/PP, tinha o apoio maioritário na


Assembleia da República (artigo 187º).
4.4 - O Governo depende politicamente da Assembleia da República (que o
derruba se não aprovar o Programa, votar desfavoravelmente uma moção
de confiança apresentada pelo Governo ou aprovar uma moção de
censura) e institucionalmente do Presidente da República que só o demite
se for necessário para assegurar o regular funcionamento das instituições
democráticas (em França, o Presidente tem poderes mais amplos,
podendo demitir o Primeiro-Ministro por falta de confiança política) (artigos
190º e 193º a 195º).
4.5 - Para além das competências políticas e administrativas muito vastas, o
Governo tem uma ampla e prolixa atividade legislativa (concorrencial com
a Assembleia da República ou no exercício de autorizações legislativas)
(artigos 197º a 201º).
4.6 – O Conselho de Ministros reúne, em regra, uma vez por semana
(costuma ser à quinta-feira), sendo presidido pelo Primeiro-Ministro, que é
usualmente coadjuvado pelo Ministro da Presidência. Cada Governo tem
uma orgânica e uma hierarquia próprias. Esta última serve para definir o
substituto do Primeiro-Ministro no caso de ausência ou impedimento e
também para efeitos protocolares. Existe um órgão informal, não previsto
na Constituição, que é o “Conselho de Secretários de Estado”, que
costuma reunir às terças-feiras, é Presidido pelo Ministro da Presidência e
conta com a participação do Secretário de Estado mais graduado
hierarquicamente de cada Ministério. Este Conselho prepara o Conselho
de Ministros. No Governo, só os Ministros têm competências próprias.
Secretários e Subsecretários de Estado têm apenas competências
delegadas pelos Ministros (o que justificou uma conhecida afirmação de
Cavaco Silva, que chamou aos Secretários de Estado “ajudantes de
Ministros”) (artigos 184º e 185º).
5 – Tribunais
5.1 - Os tribunais administram a justiça em nome do povo, asseguram a
defesa dos direitos, reprimem as violações da legalidade e dirimem os
conflitos (artigo 202º).
5.2 - São independentes, interna e externamente (uns dos outros e de
quaisquer poderes externos), e estão só subordinados à lei, a começar
pela Constituição. As suas decisões são fundamentadas e obrigatórias
32

para todos. As audiências são, em regra, públicas. Para incentivar a


participação dos cidadãos no processo de justiça, prevê-se o tribunal de
júri – que é facultativo, só diz respeito aos crimes mais graves e, ao
contrário do que sucede nos EUA, em que obedece a regras muito
diferentes, quase nunca funciona (funcionou, por exemplo, no caso
Grilo…) (artigos 203º a 207º).
5.3 - Os juízes estão obrigados à exclusividade, apenas podendo exercer a
docência ou a investigação não remuneradas. São inamovíveis e não
podem ser responsabilizados pelas suas decisões (salvo se elas
consubstanciarem a prática de ilícitos). Os juízes dos tribunais supremos
têm o título de “conselheiros” e os dos tribunais de segunda instância
“desembargadores”.
5.4 Existem tribunais judiciais (julgam questões civis, criminais, de trabalho e
família) e administrativos (julgam conflitos que opõem a Administração
Pública e Fiscal aos particulares. No topo, estão, respetivamente, o
Supremo Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Administrativo. Entre o
topo e os tribunais de “base” ou de 1ª instância, há os Tribunais de
Relação (Lisboa, Porto, Coimbra. Évora e Guimarães (no caso da
jurisdição administrativa, chamam-se Tribunais Administrativos Centrais).
Para além disso, prevêem-se tribunais militares (mas presentemente só
podem ser constituídos em tempos de guerra; em tempo de paz, são os
tribunais comuns que julgam os crimes militares, mas integrando na sua
composição um juiz militar). Para além disso, existem o Tribunal
Constitucional (com competência específica para fiscalizar a
constitucionalidade das normas) e o Tribunal de Contas, que autoriza e
fiscaliza as despesas públicas. Ambos são tribunais supremos (artigos
210º a 216º).
5.5 – Os tribunais têm como órgãos de autogoverno o Conselho Superior da
Magistratura e o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e
Fiscais, presididos, respetivamente, pelo Presidente do Supremo Tribunal
de Justiça e pelo Presidente do Supremo Tribunal Administrativo (que são
eleitos pelos pares). Destes Conselhos fazem parte juízes eleitos pelos
pares e personalidades indicadas pelo residente da República e pela
Assembleia da República, Cabe a estes Conselhos avaliar, promover,
colocar e exercer o poder disciplinar em relação aos juízes (artigo 218º).
33

6 – Ministério Público
6.1 - Distinta dos tribunais é a magistratura do Ministério Público. É autónoma (do
poder político, que não pode dar ordens sobre os processos),
hierarquizada e dirigida pelo Procurador-Geral da República (nomeado
para um mandato de seis anos, que pode ser renovado mais do que uma
vez, pelo Presidente da República sob proposta do Governo, podendo ser
demitido a qualquer momento pelo mesmo processo) (artigos 219º a 220º).
6.2 – Esta magistratura é composta por Procuradores-Gerais-Adjuntos (topo da
carreira), que beneficiam de autonomia técnica e por Procuradores (base
da carreira), cuja carreira estão equiparadas à de juiz. Os magistrados do
Ministério Público podem recusar-se a cumprir ordens superiores,
apresentando a “objeção de consciência jurídica”, caso (raro) em que são
substituídos, no processo em causa, por um colega.
6.3 - O Ministério Público representa o Estado, defende certos interesses
(designadamente de trabalhadores e de crianças) e exerce a ação penal.
Neste último âmbito tem uma ação decisiva: instaura o processo-crime,
dirige o inquérito (coadjuvado pelos órgãos de polícia criminal e fiscalizado
pelo juiz de instrução e deduz as a acusação para levar a julgamento o
arguido (artigo 219º).
6.4 – O Ministério Público também tem um órgão de autogoverno, o Conselho
Superior do Ministério Público, presidido pelo Procurador- Geral da
República e composto pelos Procuradores-Gerais Distritais, por outros
magistrados eleitos pelos pares e por personalidades eleitas pela
Assembleia da República e designadas pelo Ministro da Justiça.
6.5 – Outro órgão importante é o Conselho Consultivo do Ministério Público,
presidido pelo Procurador-Geral da República e composto por
Procuradores-Gerais-Adjuntos, que elabora pareceres a pedido do próprio
Procurador-Geral da República ou de membros do Governo (exemplo
recente foi o da greve dos enfermeiros). Se esses pareceres forem
homologados por quem os solicitou, são publicados em Diário da
República e têm força vinculativa para os respetivos serviços (embora não
tenham força de lei, ou seja, não obriguem os tribunais) (artigo 220º).
34

7 – Restantes normas
7.1 – A Constituição agrupa ainda na Parte III normas sobre as Regiões
Autónomas dos Açores e da Madeira. Têm órgãos de governo próprios – a
Assembleia Legislativa Regional (que aprova decretos-legislativos
regionais em matérias de interesse específico das Regiões) e o Governo
Regional (executivo formado por Secretários e dirigido pelo Presidente do
Governo Regional- o mais longevo foi Alberto João Jardim, na Madeira).
Há um Representante da República (que se chamava originariamente
Ministro da República) que representa o Estado Central e pode pedir a
fiscalização da constitucionalidade dos decretos-legislativos regionais pelo
Tribunal Constitucional) (artigos 225º a 234º).
7.2 – Distintas das Regiões Autónomas (político-administrativas) são as Regiões
Administrativas (uma espécie de “superautarquias”), previstas para o
continente mas nunca criadas. É uma matéria “fraturante”, que já foi objeto
de um referendo (pouco participado), em que a maioria votou contra. Para
a criação destas regiões é necessário um referendo vinculativo em que
participe mais de metade do eleitorado. Por outro lado, tais regiões têm de
ser criadas em simultâneo em todo o território nacional, segundo um mapa
e com competências pré-definidos (artigos 255º a 262º).
7.3 – As autarquias existentes são os Municípios e as Freguesias, cujo mapa foi
recentemente alterado. São governadas por um executivo (Câmaras e
Juntas, respetivamente, dirigidas por um Presidente) e comportam um
órgão colegial (Assembleia Municipal e Assembleia de Freguesia). A
tendência para a descentralização tem implicado a transferência de
competências do Estado para as autarquias (por exemplo, em matéria de
educação) (artigos 244º a 254º).
7.4 – A Constituição comporta ainda, na Parte III, normas sobre organizações de
moradores, hoje de escassa importância, mas que assumiram um papel
ativo durante o processo revolucionário, sobre a Administração Pública
(estrutura, regime, responsabilidade, Polícia) e sobre a Defesa Nacional,
as Forças Armadas e o serviço militar, que a Constituição não prevê hoje
como obrigatório (artigos 163º a 276º).
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12ª AULA

Garantia e revisão da Constituição e disposições finais e transitórias.

I – Garantia da Constituição

1. – Fiscalização difusa e concentrada da constitucionalidade


1.2 – A Constituição de 1976 admite a fiscalização (difusa) da
constitucionalidade por quaisquer tribunais e instituiu (na I Revisão
Constitucional, de 1982) um Tribunal Constitucional com competência
específica para esse efeito, seguindo o modelo dos EUA. Na versão
originária da Constituição, apenas se previa uma Comissão Constitucional,
na tradição do Direito francês, que emitia pareceres (em alguns casos
vinculativos) e não acórdãos e que dependia do Conselho da Revolução
(em concreto, do Coronel Melo Antunes), órgão de soberania político-militar
que foi extinto, tal como a Comissão Constitucional, em 1982, na I Revisão
Constitucional.
1.3 – A chamada fiscalização difusa resulta do artigo 204º da Constituição que
atribui a todos os tribunais o dever de não aplicar (“desaplicar”) normas que
considerem inconstitucionais. Nesse caso, cabe recurso para o tribunal
Constitucional, que é obrigatório para o Ministério Público, para ter a última
palavra sobre a questão de constitucionalidade.
1.4 - O Tribunal Constitucional é formado por treze juízes. Seis, pelo menos,
são juízes oriundos de outros tribunais; os restantes sete podem ser
professores de Direito, advogados, juízes ou juristas, em geral. Dez dos
juízes conselheiros do Tribunal Constitucional são eleitos por uma maioria
de dois terços dos deputados e três são cooptados pelos eleitos. São todos
eles que elegem o Presidente e o Vice-Presidente. Ex aequo com o
Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o Presidente do Tribunal
Constitucional é a quarta figura do Estado (a seguir ao Presidente da
República, ao Presidente da Assembleia da República e ao Primeiro-
Ministro). Todavia, entre os dois, o Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça tem precedência. O mandato dos juízes é de nove anos e não é
renovável (para garantir a sua independência). O Tribunal divide-se
presentemente em três secções.
36

1.5 – O Tribunal Constitucional tem competência para as seguintes formas de


fiscalização da constitucionalidade: preventiva, abstrata-sucessiva,
concreta e por omissão.
1.6 - A fiscalização preventiva é suscitada pelo Presidente da República ou
pelos Representantes da República nas Regiões Autónomas e visa impedir
a entrada em vigor de leis, decretos-leis ou decretos-legislativos-regionais.
O órgão que aprovou o diploma legal deve expurgá-lo das
inconstitucionalidades, mas, paradoxalmente, no caso da Assembleia da
República, esta pode voltar a aprovar o diploma com uma maioria
qualificada de dois terços dos deputados (embora depois de a lei entrar em
vigor o tribunal Constitucional tenha a última palavra em sede de
fiscalização abstrata sucessiva).
1.7 – A fiscalização abstrata sucessiva pode ser suscitada por várias entidades,
já depois da entrada em vigor do diploma legal: designadamente, o
Presidente da República, o Presidente da assembleia da república, o
Primeiro-Ministro, o Procurador-Geral da república, o Provedor de Justiça e
um décimo dos deputados (ou seja, 23). Se o Tribunal Constitucional
declarar a norma inconstitucional, ela deixa der vigorar. e deixa até de
vigorar retroativamente, excetuando casos de lei penal mais favorável ou
de limitação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade por
interesse público ou razões de equidade. As declarações de
inconstitucionalidade do Tribunal Constitucional têm, pois, uma força
semelhante às leis. O mesmo sucedia com os assentos do Supremo
Tribunal de Justiça, prolatados perante acórdãos contraditórios de tribunais
superiores, nos termos do artigo 2º do Código Civil. Todavia, o artigo 2º do
Código Civil foi declarado inconstitucional e os assentos foram substituídos
por acórdãos de uniformização de jurisprudência, que têm mero valor
indicativo para os restantes tribunais.
1.8 – A fiscalização concreta ocorre quando num processo judicial uma das
partes invoca a inconstitucionalidade de uma norma ou um tribunal recusa
a aplicação de uma norma com fundamento na inconstitucionalidade.
Nestes casos, o Tribunal Constitucional profere um acórdão que vale só
para aquele caso concreto. Contudo, quando se repete o mesmo
julgamento de inconstitucionalidade por três vezes, o Ministério Público
pode pedir ao Tribunal Constitucional que profira uma declaração de
37

inconstitucionalidade com força obrigatória geral, para evitar repetições


inúteis.
1.9 - A fiscalização da constitucionalidade por omissão apenas pode ser pedida
pelo Presidente da República e pelo Provedor de Justiça e fundamenta-se
na inexistência de normas legais que deem cumprimento a obrigações
constitucionais do Estado (por exemplo, imagine-se que não há nenhum
apoio aos desempregados, apesar de a Constituição determinar, no artigo
59º, nº 1, alínea e), que o Estado os apoia na situação de desemprego
involuntário). Nestes casos, o acórdão do Tribunal Constitucional vale como
uma recomendação para o órgão competente legislar.
1.10 O nosso sistema não contempla, ao contrário do que sucede nos EUA,
na Alemanha ou em Espanha, o chamado recurso de amparo, em eu se
impugna diretamente uma decisão perante o Tribunal Constitucional. Em
Portugal, apenas se pode arguir a inconstitucionalidade de normas (ainda
que numa certa interpretação, o que dá margem apos advogados para se
aproximarem do chamado recurso de amparo. Um exemplo: um caso
mediático, em que um Desembargador da Relação do Porto (Dr. Neto
Moura) aparentou uma relativa compreensão pela violência doméstica, era
insuscetível de recurso para o Tribunal Constitucional, porque não estava
em causa a inconstitucionalidade de norma nenhuma, mas sim da própria
decisão (e da respetiva fundamentação).

Revisão constitucional
2 – Uma Constituição semirrígida

2.1 – A Constituição de 1976 pode ser revista, mas o modo de revisão não é o de uma
lei normal. Há limites temporais, circunstanciais e materiais à revisão constitucional.
2.2 – Os limites temporais resultam de só se admitir uma revisão ordinária depois
de decorridos cinco anos após a revisão anterior (a última revisão foi em 2005,
pelo que se admitiria hoje uma revisão constitucional ordinária). Porém, antes de
decorrido os cinco anos é possível levar a cabo uma revisão extraordinária, se
quatro quintos dos deputados em efetividade de funções, ou seja, dos 230 que
compõem presentemente a Assembleia concordarem em desencadear o processo.
No entanto, a aprovação da revisão depende sempre apenas de uma maioria de
dois terços dos deputados em efetividade de funções, quer a revisão seja ordinária
quer seja extraordinária.
38

2.3 – Os limites circunstanciais dizem respeito aos estados de exceção, ou seja


estado de sítio e estado de emergência. enquanto esses estados durarem, não
pode ser empreendida uma revisão constitucional. Atualmente, por exemplo, a
Assembleia da república não pode rever a Constituição, o que se explica porque
os deputados não teriam as condições para a necessária ponderação.
2.4 – Os limites materiais à revisão dizem respeito a um conjunto vaso de matérias
que são insuscetíveis de alteração: por exemplo, a independência nacional, a
unidade do Estado, a forma republicana de governo, a laicidade do Estado, os
direitos liberdades e garantias ou a independência dos tribunais, entre muitas
outras. Há um meio engenhoso de iludir estes limites através de duas revisões
sucessivas: a primeira altera os limites e a segunda a matéria que antes estava
contida nos limites. Foi deste modo que as revisões constitucionais de 1912 e
1989, puseram fim ao regime de irreversibilidade das nacionalizações. Porém uma
rutura que implicasse a abolição da democracia ou a modificação da forma de
governo, por exemplo, seria já um golpe de estado constitucional, que implicaria
uma mudança de regime.

3 – Sete revisões constitucionais


3.2 – Até hoje, a Constituição de 1976 já foi revista por sete vezes. A 1ª e a 2ª
revisões (1982 e 1989) foram as mais importantes. Em 1982, houve uma limitação
dos poderes presidenciais, foi extinto o Conselho da Revolução e a Comissão
Constitucional e foram criados o Tribunal Constitucional, o Conselho de Estado e o
Conselho Superior de Defesa Nacional. Em 1982 e 1989 foi retirada alguma carga
ideológica ao texto constitucional. Em 1989, foi concluído um processo de dupla
revisão constitucional que pôs termo à irreversibilidade das nacionalizações.
3.3 – As revisões subsequentes foram em parte determinadas pela adesão à CEE,
pela integração europeia, pela moeda comum, pelo Espaço Schengen e pela
adesão ao Tribunal Penal Internacional. No plano interno também houve
alterações relevantes, por exemplo em matéria de poderes das Regiões
Autónomas, direitos dos trabalhadores, segurança ou discriminação em função da
orientação sexual (que viria a permitir o casamento entre pessoas do mesmo
sexo).
3.4 – A 7ª e última revisão, de 2005, foi extraordinária (tinha havido outra revisão
em 2004). Numa altura em que se pensava que iria ser aprovada uma Constituição
Europeia, com uma carta de direitos, era necessário criar a possibilidade
constitucional de realizar um referendo (em geral, a Constituição não admite
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referendos sobre tratados). Todavia, acabou por não se aprovar uma Constituição
Europeia, tendo sido apenas celebrado o Tratado de Lisboa, e não se realizou
referendo algum.

III – Disposições finais e transitórias


Como habitualmente sucede, o texto constitucional é encerrado por um conjunto de
disposições finais e transitórias (estas últimas Têm uma vigência temporária). De entre
todas estas normas (artigos 290º a 296º), merecem especial destaque os artigos
292ºe 296º.
O primeiro prevê a incriminação dos ex-agentes da PIDE-DGS (a polícia política do
anterior regime). A questão que se coloca (e se colocou com muita amplitude nos
julgamentos de Nuremberga e Tóquio, após a II Guerra Mundial, é a retroatividade da
lei penal, que é genericamente proibida, mas foi aceite por se considerar que a lei que
permitia perseguições políticas não seria verdadeiramente Direito 8º que corresponde
a uma certa visão jusnaturalista dos direitos humanos).
O segundo, introduzido apenas em 2005, em sede de 7ª Revisão Constitucional, veio
permitir a realização de um referendo sobre “a construção e aprofundamento da união
europeia”.

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