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CUIDADOS

PALIATIVOS
Coordenação
Profa. Ana Lúcia Giaponesi
100% DE ESFORÇO
ONDE HOUVER 1% DE CHANCE

Realização Colaboraram nesta apostila


Abrale Autores 
Dalva Y. Matsumoto
Supervisão Ana Lúcia Giaponesi
Merula Steagall Rita Tiziana
Débora G. Costa
Direção
Fabio Fedozzi  Texto e revisão 
Denise Barbosa
Coordenação
Leandro Mião Revisão técnica
Ana Lúcia Giaponesi
Revisão técnica 
Sandra Loggetto Ilustração 
Marta Leão
Design educacional
Fernanda Prando Projeto gráfico e diagramação
Estúdio Oliver Quinto
Apoio educacional
IIEP Albert Eistein
CUIDADOS
PALIATIVOS
PROJETO
Esta apostila é parte do conjunto de recursos instrucionais do
curso Cuidados Paliativos, na modalidade ensino à distância do
projeto Onco Ensino.
Este material foi elaborado para que os participantes dos cur-
sos possam revisitar a síntese dos conteúdos, a qualquer tempo e
após terem concluído os programas, como instrumento de con-
sulta e memorização.
A obra foi produzida a partir da prática clínica e vivência acadê-
mica de seus autores e baseada nas recentes publicações literá-
rias até o momento de sua edição.
Em razão da constante evolução da medicina e suas áreas cor-
relatas, sugerimos ao aluno certificar-se de que as informações
obtidas nesta apostila permaneçam vigentes como melhores prá-
ticas e recomendações à época de sua leitura.

SOBRE O ONCO ENSINO


O Onco Ensino é uma plataforma educacional de apoio às uni-
dades de saúde que realizam diagnóstico e tratamento oncológi-
co no Brasil, promovida pela Associação Brasileira de Linfoma e
Leucemia, a ABRALE.

4
Por meio do Onco Ensino, unidades e centros de assistência
podem complementar sua estratégia de educação permanente,
disponibilizando cursos de aperfeiçoamento profissional aos seus
colaboradores.
São cursos de curta duração para profissionais de saúde sobre
temas relacionados às modalidades de atendimento, como pro-
moção de saúde, prevenção, diagnóstico, tratamento, reabilitação
e cuidados paliativos.
Através da capacitação e atualização de médicos e profissionais
envolvidos no atendimento oncológico no país, a ABRALE preten-
de estimular a prevenção, o diagnóstico precoce e o atendimento
multidisciplinar aos pacientes, além de difundir práticas de suces-
so no tratamento, na reabilitação e nos cuidados paliativos.
Ao promover o projeto Onco Ensino, a ABRALE avança em sua
missão de oferecer ajuda e mobilizar parceiros, para que todas as
pessoas com câncer do sangue no Brasil tenham acesso ao me-
lhor tratamento.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 5


Curso Cuidados Paliativos em Oncologia
Coordenação Profa. Ana Lúcia Giaponesi

OBJETIVOS
DO CURSO
• Dar ferramentas para o profissional identificar pacientes elegíveis
para os cuidados paliativos;
• Entender o conceito e a filosofia dessa área de atuação, assim
como compreender o seu papel na assistência à saúde;
• Mostrar os sintomas mais frequentes em oncologia na termina-
lidade; e
• Compreender cuidados paliativos em Pediatria.
ÍNDICE
Aula 1 CONCEITOS DE CUIDADOS PALIATIVOS
SEGUNDO A ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SÁUDE (OMS)

Cuidados Paliativos e a realidade brasileira ............................................................................... 15


Origem dos Cuidados Paliativos: Hospice e Cicely Saunders ........................................ 17
Cuidado Paliativo Moderno: Klüber Ross ..................................................................................... 21
Conceito e definições de Cuidados Paliativos .......................................................................... 23
Equipe multiprofissional ........................................................................................................................ 26

Aula 2 PRINCÍPIOS DE CUIDADOS PALIATIVOS

Promover o alívio da dor total ............................................................................................................. 31


Afirmar a vida e considerar a morte .............................................................................................. 32
Não adiar nem acelerar a morte ...................................................................................................... 33
Integrar aspectos psicológicos e espirituais ............................................................................. 34
Sistemas de suporte .................................................................................................................................. 36
Abordagem multiprofissional e qualidade de vida do paciente ............................... 38

Aula 3 BIOÉTICA E LEGISLAÇÃO EM CUIDADOS PALIATIVOS

Leis e Resoluções ......................................................................................................................................... 44


Bioética Principialista - Beauchamp e Childress .................................................................. 48
Bioética do Cotidiano - Diego Garcia ............................................................................................ 49
Aula 4 AVALIAÇÃO INTEGRAL DOS PACIENTES

Comunicação: um dos pilares dos Cuidados Paliativos ................................................... 57


Avaliação Integral ........................................................................................................................................ 58
Dados Biográficos ....................................................................................................................................... 59
Cronologia da doença atual ............................................................................................................... 60
PPS – Paliative Performance Scale ................................................................................................... 61
ESAS – Escala de Avaliação de Sintomas de Edmonton ................................................. 62
Plano de Cuidados ...................................................................................................................................... 63
Decisões Terapêuticas ............................................................................................................................. 64

Aula 5 CONCEITOS E PECULIARIDADES


DE CUIDADOS PALIATIVOS PEDIÁTRICOS

Definição e Princípios de Cuidados Paliativos Pediátricos ............................................ 70


Habilidades necessárias para o trabalho .................................................................................... 72
Especificidade do CPP ............................................................................................................................ 73
Uma história de Cuidados Paliativos ............................................................................................. 75
A família ............................................................................................................................................................ 76
Tríade: criança, família e equipe ...................................................................................................... 78

Aula 6 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO E EXCLUSÃO

Elegibilidade ................................................................................................................................................... 83
Conceitos gerais de elegibilidade .................................................................................................... 84
Quando indicar CP ..................................................................................................................................... 85
Implicações ..................................................................................................................................................... 87
Aula 7 MODALIDADES INTEGRAIS

Modelos de assistência ........................................................................................................................... 93


Ambientes – Hospitais .............................................................................................................................. 94
Ambientes – Domicílio ............................................................................................................................. 95
Ambientes – Ambulatório ..................................................................................................................... 97
Hóspice .............................................................................................................................................................. 98
Hospedaria ...................................................................................................................................................... 99

Aula 8 INTRODUÇÃO À COMUNICAÇÃO

Como comunicar notícias difíceis ................................................................................................ 105


Habilidades para o processo de comunicação ................................................................... 106
Comunicação não verbal ..................................................................................................................... 107
Comunicação individualizada ......................................................................................................... 108
Conspiração do silêncio .......................................................................................................................... 111

Aula 9 COMUNICAÇÃO COM O PACIENTE

Preparar-se para comunicar ............................................................................................................... 118


O quanto o paciente sabe e o quanto aguenta saber ...................................................... 119
Compartilhar a informação ................................................................................................................ 120
Acolher os sentimentos e planejar o seguimento .............................................................. 121
Traçar metas .................................................................................................................................................. 123
Trabalhar a autonomia do paciente ............................................................................................. 124
Aula 10 COMUNICAÇÃO COM A FAMÍLIA

Diretiva antecipada de vontade ...................................................................................................... 130


Técnica roleplay para treinar o profissional ............................................................................ 130
A comunicação adaptada para a população assistida .................................................. 132
O luto .................................................................................................................................................................. 133

Aula 11 FASE FINAL DE VIDA: SINTOMAS MAIS FREQUENTES

Controle de sintomas e escala PPS .............................................................................................. 139


Sintomas físicos mais comuns .......................................................................................................... 141
Sofrimentos psicossociais desta fase .......................................................................................... 142
Sofrimentos espirituais desta fase ................................................................................................ 143
Depoimento: o cuidado da dor ....................................................................................................... 143

Aula 12 FASE FINAL DE VIDA: SOFRIMENTO TOTAL

Como lidar com a dor total ................................................................................................................ 149


Definição de dor total ............................................................................................................................ 150
Futilidade terapêutica ............................................................................................................................. 151
Fase final da vida ........................................................................................................................................ 152
Espiritualidade ............................................................................................................................................ 153
Como encarar o paciente que se despede da vida ........................................................... 154
Luto: o que falar e como falar ........................................................................................................... 155
Aula 1

CONCEITOS DE
CUIDADOS
PALIATIVOS SEGUNDO A ORGANIZAÇÃO
MUNDIAL DA SAÚDE (OMS)
Profa. Dalva Y. Matsumoto
• Médica oncologista
• Coordenadora da Hospedaria
do HSPM (São Paulo)
• Diretora do Instituto Paliar
OBJETIVOS
DA AULA
Na aula de hoje, a professora traz o conceito e explica o
surgimento dos cuidados paliativos, desde as primeiras ini-
ciativas que deram origem aos Hospices, o embrião desse
atendimento, até a adoção das Normas estabelecidas pela
Organização Mundial da Saúde para realizar o trabalho. Tam-
bém aborda a importância da equipe multiprofissional.

14
CONTEÚDO
Para dimensionar a importância do atendimento paliativo te-
mos que olhar para o contexto em que vivemos: a população do
país envelhece progressivamente e, com isso, surgem as doenças
crônico degenerativas, entre elas o câncer. Essas doenças trazem
a diminuição da funcionalidade e uma maior dependência das
pessoas. Quando adquirimos uma doença ameaçadora em nos-
sas vidas o nosso sofrimento não é só físico, mas também mental,
espiritual, social e familiar, ou seja, sofremos em todas as nossas
dimensões. O cuidado paliativo vem para trazer alívio a todo esse
sofrimento e esse cuidado é extensivo à família do paciente.

CUIDADOS PALIATIVOS E A NOSSA REALIDADE


Os cuidados paliativos em nosso país ainda são uma área pouco
conhecida. Como muitos profissionais desconhecem as técnicas
de paliação, a maioria dos pacientes quando se descobrem porta-
dores de uma doença potencialmente mortal não tem seu sofri-
mento totalmente paliado. .
Isso faz com que os pacientes com doença avançada acabem se
acumulando nos hospitais, principalmente nos prontos-socorros,
sendo abordados de forma inadequada, invasiva, com muita tec-
nologia, mas sem qualidade. Esse tipo de comportamento ignora
o sofrimento do paciente e das famílias e muitos sintomas não são
corretamente abordados. O sintoma mais dramático talvez seja a
dor. Muitos de nós não sabemos tratá-la.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 15


Não cultivamos uma atitude contrária à tecnologia médica,
mas é importante discutirmos e repensarmos nosso comporta-
mento, nossa conduta diante da mortalidade humana, tentando
o equilíbrio entre o conhecimento técnico e o humanismo, o sen-
tido de resgatar a dignidade de vida e a possibilidade de se morrer
em paz. Muitos vivem em situação de abandono. É fundamental
mudarmos o panorama atual dos cuidados, adotarmos medidas
para melhorar o que já existe, formar grupos de profissionais com
conhecimento específico e educação da sociedade em geral. Os
cuidados paliativos vêm para preencher essa lacuna da necessida-
de de cuidados ativos e integrais desses pacientes.

16
HISTÓRICO: OS HOSPICES

Historicamente, cuidado
paliativo se confunde com
o termo Hospice.
Nos primórdios da era
cristã, essas instituições fize-
ram parte da disseminação
do cristianismo pela Europa.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 17


No século V, Fabíola, discípula de São Jerônimo, abrigava peregri-
nos e viajantes vindos da Ásia, África e dos países do leste no Hos-
pício do Porto de Roma. Outras instituições de caridade surgiram
na Europa no século XVII e abrigavam pobres, órfãos e doentes.

Our Lady’s Hospice of Dying


Dublin, 1879

e of Dying
’s Hospic
Our Lady ublin, 1879
D

Mary Aik
St. Jose enheads
phs’ Ho
Londre
spice
s, 1905

Essa prática se espalhou com organizações religiosas católicas


e protestantes e, no século XIX, passaram a ter características de
hospitais. As Irmãs de Caridade Irlandesas fundaram o “Our Lady’s
Hospice of Dying” em Dublin, em 1879, e a Ordem de Irmã Mary
Aikenheads abriu o “St Joseph’s Hospice” em Londres, em 1905.

18
“Eu serei uma janela na sua casa”
O Movimento Hospice Moderno foi introduzido por uma ingle-
sa de formação humanística que se tornou médica: Dame Cicely
Saunders. Em 1947, ela conheceu David Tasma, um judeu pro-
veniente do Gueto de Varsóvia. O pa-
ciente recebeu uma colostomia pa-
liativa devido a um carcinoma retal
inoperável. Cicely o acompanhou até
a sua morte, tendo com ele longas
conversas. David deixou-lhe uma pe-
quena quantia como herança, dizen-
do: “Eu serei uma janela na sua casa”.
Segundo Cicely Saunders, esse
foi o ponto de partida para o com-
promisso com uma nova forma de
cuidar. Em 1967, ela fundou o “St.
Christopher’s Hospice” que não só
permitiu a assistência aos doentes
mas o desenvolvimento de ensino e pesquisa, recebendo bolsis-
tas de vários países.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 19


CUIDADO PALIATIVO MODERNO
A motivação para que Cicely criasse o cuidado paliativo moder-
no foi baseada em um estudo com mais de 1.000 pacientes por-
tadores de câncer avançado que tinham muita dor. Nesse estudo,
os pacientes foram tratados com opioide, caindo por terra o tabu
de que esses medicamentos traziam dependência. Pelo contrário,
esses pacientes tiveram grande alívio de seus sofrimentos.

Os cuidados paliativos saem do Reino Unido para outros países


através de profissionais, principalmente dos Estados Unidos e do
Canadá, que fazem estágios no St. Christopher’s Hospice e levam
esse conhecimento para seus países de origem.

20
Na década de 70, Elisabeth Klüber Ross se encontra com Cicely
Saunders e leva para o seu país, os EUA, o conhecimento dos
cuidados paliativos.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 21


CUIDADOS PALIATIVOS
NA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE
Em 1982, o comitê de câncer da Organização Mundial de Saúde
cria um grupo de trabalho para definir política de tratamento de
dor e de cuidados no modelo hospice para pacientes com câncer
avançado, que deveriam ser estabelecidos em todos os países. O
termo cuidados paliativos foi utilizado pelo Canadá e acolhido
pela OMS devido ao fato de que o termo Hospice era de difícil
tradução para outras línguas.

Primeira definição da OMS, de 1990


“Cuidado ativo e total para pacientes cuja doença
não é responsiva a tratamento de cura.
O controle da dor, de outros sintomas e de problemas
psicossociais e espirituais é primordial.
O objetivo do cuidado paliativo é proporcionar a melhor
qualidade de vida possível para pacientes e familiares.”

A OMS publicou sua primeira definição de cuidados paliativos


em 1990.

22
DEFINIÇÃO
Cuidado paliativo: cuidado ativo e total para pacientes cuja do-
ença não é responsiva a tratamento de cura. O controle da dor, de
outros sintomas e de problemas psicossociais e espirituais é pri-
mordial. O objetivo do cuidado paliativo é proporcionar a melhor
qualidade de vida possível para pacientes e familiares.

Essa definição ainda era muito voltada para pacientes com cân-
cer avançado. Em 2002 a OMS reedita esta versão com algumas
modificações.

Cuidado paliativo: é uma abordagem que promove a qualidade


de vida de pacientes e familiares que enfrentam doenças que ame-
acem a continuidade da vida, através da prevenção e alívio do sofri-
mento. Requer a identificação precoce, avaliação e tratamento da
dor e outros problemas de natureza física, psicossocial e espiritual.

Conceito revisto em 2002 pela OMS


“Cuidado paliativo é uma abordagem que promove a
qualidade de vida de pacientes e seus familiares, que
enfrentam doenças que ameaçam a continuidade da
vida, através da prevenção e alívio do sofrimento.
Requer a identificação precoce, avaliação e tratamento
da dor e outros problemas de natureza física
psicossocial e espiritual.”

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 23


Esta é a versão mais recente:

Nova definição da OMS (2017)


“Cuidado Paliativo é uma abordagem que melhora a
qualidade de vida de seus pacientes (adultos e crianças)
e famílias que enfrentam problemas associados
a doenças que ameaçam a vida. Previne e alivia o
sofrimento através da identificação precoce, avaliação
correta e tratamento da dor e outros problemas físicos,
psicossociais ou espirituais.” – WHO, 2017

CUIDADOS PALIATIVOS NO BRASIL


No Brasil, o início dos cuidados paliativos se deu na década de
1980, mas somente a partir do ano 2000 é que várias iniciativas
começaram a aparecer, principalmente na cidade de São Paulo
e no Rio de Janeiro. Em 2005, foi fundada a Academia Nacional
de Cuidados Paliativos (ANCP), que congrega profissionais que
atuam na área. A Academia Nacional de Cuidados Paliativos, jun-
tamente com outras associações, compõe a Câmara Técnica de
Terminalidade da Vida, do Conselho Federal de Medicina. Esse
grupo discute propostas para políticas públicas na área de cui-
dados paliativos e terminalidade da vida. Umas das conquistas
desse grupo foi a aprovação de cuidados paliativos como área
de atuação médica.

24
A morte é parte integrante da vida e a Medicina lida com os ex-
tremos: vida e morte. A área de cuidados paliativos abre uma ampla
discussão envolvendo toda a sociedade sobre conceito de morte e
os cuidados que a Medicina deve oferecer aos pacientes terminais.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) anunciou, no dia 1o de
agosto de 2011, a regulamentação da medicina paliativa como
área de atuação. Essa área é ligada a oito especialidades médicas,
incluindo a onco-hematologia.
Em 2011, foi firmado um convênio entre o Conselho Federal de
Medicina, a Associação Médica Brasileira (AMB) e a Comissão
Nacional de Residência Médica (CNRM) de reconhecimento de
especialidades médicas para o cuidado paliativo.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 25


EQUIPE MULTIPROFISSIONAL
É importante ressaltar que, de acordo com a própria definição
da OMS, cuidado paliativo não se faz sozinho, e sim com uma
equipe multiprofissional. A atuação da equipe multiprofissional
deve ser coesa e focada em uma comunicação interpessoal bem
estabelecida. Dessa forma, conseguirá oferecer um cuidado que
traga dignidade não somente ao paciente e ao familiar, mas tam-
bém à própria equipe.

Com o aumento dos serviços, observamos a procura de profis-


sionais em busca de conhecimento específico na área. Também é
importante enfatizarmos a necessidade da abordagem do tema
para os alunos de formação na área de Medicina e na área de saú-
de de maneira geral. É importante que o médico aprenda desde
cedo a focar não na doença, mas na pessoa doente.

26
PALAVRAS FINAIS DA PROFA. DALVA Y. MATSUMOTO

Os profissionais formados poderiam estar mais atentos


na comunicação e principalmente na escuta do paciente
e família, vivenciar a empatia e o elo terapêutico, funda-
mental para a melhora dos sintomas.

Para saber mais


ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).

Manual de Cuidados Paliativos. São Paulo, 2a ed. Ed Sulina, 2012.

TWYCROSS R, Wilcock A. Thorp S. Palliative Care Formulary PCF4.

Radcliffe Medical Press, Oxford, 2011.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 27


Aula 2

PRINCÍPIOS
DE CUIDADOS PALIATIVOS

Profa. Ana Lúcia Giaponesi


• Enfermeira
• Formada em Cuidados Paliativos
pelo Instituto Paliar
• Coordenadora do Comitê de CP da ABRALE
OBJETIVOS
DA AULA
Nesta aula, a professora descreve os princípios que regem o tra-
balho da equipe multiprofissional. Fala sobre a “dor total” que aco-
mete os pacientes e da abordagem holística.

30
CONTEÚDO
Os cuidados paliativos baseiam-se em conhecimentos inerentes
às diversas especialidades, possibilidade de intervenção clínica e
terapêutica nas áreas da Ciência Médica e de estudo específico. Em
1986, a OMS publicou os princípios que regem a atuação da equipe
multiprofissional de cuidados paliativos. Esses princípios foram re-
afirmados na revisão de 2002 e de 2017.

PRINCÍPIO: PROMOVER O ALÍVIO DA DOR


E OUTROS SINTOMAS DESAGRADÁVEIS
É necessário conhecimento específico para a prescrição de me-
dicamentos e também para a adoção de tratamento não farmaco-
lógico da dor. Cicely Saunders, precursora de cuidados paliativos,
definiu o conceito de dor total. Ou seja, o paciente, além da dor físi-
ca, também pode ter dor social, emocional e espiritual, e todos es-
ses fatores podem contribuir para a exacerbação ou atenuação dos
sintomas, devendo ser levados em consideração na abordagem.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 31


PRINCÍPIO: AFIRMAR A VIDA E CONSIDERAR A MORTE
COMO UM PROCESSO NATURAL DA VIDA
Dr. Bernard Lown, em seu livro “A Arte Perdida de Curar”, afirma:

Muito pouco se ensina sobre a arte de ser médico. Os médi-


cos aprendem pouquíssimo a lidar com moribundos. A realida-
de mais fundamental é que houve uma revolução biotecnológica
que possibilita o prolongamento interminável do morrer. O cuida-
do paliativo resgata a possibilidade da morte como um evento es-
perado e natural aos pacientes que têm uma doença que ameaça
a vida, colocando ênfase na vida que ainda pode ser vivida.

32
PRINCÍPIO: NÃO ADIAR ACELERAR A MORTE
É dessa maneira que enfatizamos que cuidado paliativo não
pode ser entendido ou confundido como eutanásia, como muitos
ainda querem entender. Essa relação causa decisões equivocadas
e até mesmo intervenções desnecessárias em pacientes que têm
uma doença progressiva e incurável.

Como prognosticar esses pacientes e definir uma linha tênue


entre o fazer e o não fazer?

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 33


PRINCÍPIO: INTEGRAR OS ASPECTOS PSICOLÓGICOS
E ESPIRITUAIS NO CUIDADO AO PACIENTE
A doença, principalmente aquela que ameaça a continuidade
da vida, traz perdas com as quais o paciente e a família são obri-
gados a conviver, e que nem sempre estão preparados para isso:
as perdas da autoimagem, da autonomia, da capacidade física.
Sem falar das perdas concretas como emprego, poder aquisitivo e
status social. Tudo isso pode levar à depressão, angústia, causando
e interferindo, objetivamente, na evolução da doença. E também
na intensidade e frequência dos sintomas que podem apresentar
maior dificuldade de controle. É fundamental a abordagem des-
ses aspectos sob a ótica da psicologia. A novidade é a possibilida-
de de abordagem também do ponto de vista da espiritualidade,
que se sobrepõe sobre à questão religiosa.

34
Noventa e cinco por cento (95%) dos americanos creem numa
força superior e 93% gostariam que seus médicos abordassem as
questões religiosas se ficassem gravemente enfermos.

A dimensão imaterial do corpo

u Segundo o Dr. Luis Saporetti, médico geriatra e estudioso


da espiritualidade: “Espírito, do latim spiritus, significa
sopro, e se refere a algo que dá ao corpo sua dimensão
imaterial, oculta, divina ou sobrenatural, que anima
a matéria. O espírito conecta o ser humano à sua
dimensão divina ou transcendente.”

É mais esse significado da transcendência, esse significado da


vida, aliado ou não à religião, que você deve estar preparado para
abordar com o paciente. Sempre lembrando que o sujeito é o pa-
ciente, com suas crenças e seus princípios.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 35


PRINCÍPIO: OFERECER UM SISTEMA DE SUPORTE QUE
POSSIBILITE AO PACIENTE VIVER TÃO ATIVAMENTE
QUANTO POSSÍVEL, ATÉ O MOMENTO DA SUA MORTE
Este princípio de oferecer um sistema de suporte mostra que
não podemos esquecer que qualidade de vida está ligada aos vá-
rios aspectos pessoais do paciente. Problemas sociais e de aces-
so a medicamentos e a serviços podem causar um sofrimento
para o paciente e para a família que tem que ser abordado pela
equipe multiprofissional. Viver ativamente não significa viver a
qualquer custo.

Mais vida aos dias

u Cicely Saunders dizia: “Podemos acrescentar mais vida


aos dias do que dias na vida do nosso paciente.”

É nosso dever e responsabilidade sermos facilitadores para a


resolução dos problemas do nosso paciente.

36
PRINCÍPIO: OFERECER SISTEMA DE SUPORTE
PARA AUXILIAR OS FAMILIARES DURANTE A DOENÇA
DO PACIENTE E A ENFRENTAR O LUTO
Nunca estamos completamente sós, seja uma família biológi-
ca, uma família escolhida, nós sempre temos alguém do nosso
lado durante o processo da doença. E por muitas vezes a família
pode adoecer junto com o paciente. A família também é uma
unidade de cuidado.

A importância da família

u A dra. Marília Pereira Franco descreve: “A unidade


de cuidados paciente-família se coloca como una
e específica ao mesmo tempo. A célula de identidade
do ser humano é a família, respeitadas todas
as condições que fazem dela um universo cultural próprio,
muitas vezes distante ou até mesmo alheio
ao universo cultural dos profissionais da saúde”.

Ninguém conhece o paciente melhor do que a própria família


e com isso pode se tornar grande parceira para a equipe. Da mes-
ma forma, essas pessoas também sofrem, e esse sofrimento deve
ser acolhido e paliado. O cuidado paliativo não se encerra com a
morte do paciente, é preciso realizar o acolhimento e o tratamen-
to do luto da família. Geralmente esse tratamento é realizado pelo
psicólogo, mas todos da equipe podem colaborar.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 37


PRINCÍPIO: ABORDAGEM MULTIPROFISSIONAL PARA
FOCAR AS NECESSIDADES DOS PACIENTES E SEUS
FAMILIARES, INCLUINDO ACOMPANHAMENTO AO LUTO
Na prática, você irá se deparar com várias mudanças na resposta
terapêutica. Elas podem estar na própria evolução da doença ou
na relação paciente-família. Ignorar uma dessas dimensões pode
acarretar em uma avaliação incompleta e consequentemente um
difícil controle de sintomas. O sujeito da ação é sempre o paciente,
respeitando a sua autonomia. Incluir a família no processo do cuidar
compreende estender esse cuidado até o luto, mas isso não precisa
ser realizado apenas pelo psicólogo, e sim por toda equipe multi-
profissional. Essa equipe, com diferentes olhares e uma percepção
individual, pode realizar esse trabalho de uma forma abrangente.

PRINCÍPIO: MELHORAR A QUALIDADE DE VIDA E


INFLUENCIAR POSITIVAMENTE O CURSO DA DOENÇA
Como abordagem holística, é observar o paciente como um ser
biográfico e não biológico, respeitando seus desejos e necessida-
des. Fazendo um controle impecável de seus sintomas no curso
da doença, o paciente pode aumentar a sobrevida.
Cuidados paliativos devem ser iniciados o mais precocemen-
te possível, juntamente com outras medidas de prolongamento
de vida, como a quimioterapia e a radioterapia, e incluir todas as
investigações necessárias para melhor compreender e controlar
situações clínicas estressantes.

38
Pela própria definição da OMS, o cuidado paliativo deve ser in-
dicado no início do diagnóstico. O que acontece erroneamente,
por muitas vezes, quando o cuidado paliativo é ativado na termi-
nalidade da vida. Mas, se a equipe for chamada logo no início, po-
derá realizar ações paliativas e criar um vínculo com a família,
tratando o paciente durante o percurso e em todas as etapas da
doença. Uma abordagem precoce também permite uma pre-
venção de sintomas e complicações inerentes à doença de base.
Todos esses princípios que você acabou de aprender norteiam
a prática diária com nosso paciente e sua família.

Para saber mais

ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).

Manual de Cuidados Paliativos. São Paulo, 2a ed. Ed Sulina, 2012.

TWYCROSS R, Wilcock A. Thorp S. Palliative Care Formulary PCF4.

Radcliffe Medical Press, Oxford, 2011.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 39


Aula 3

BIOÉTICA
E LEGISLAÇÃO EM
CUIDADOS PALIATIVOS
Profa. Dalva Y. Matsumoto
• Médica oncologista
• Coordenadora da Hospedaria
do HSPM (São Paulo)
• Diretora do Instituto Paliar
OBJETIVOS
DA AULA
Nesta aula, a professora aborda a grande discussão sobre os li-
mites do pensamento tecnicista na assistência em saúde e sobre
a validação da voz dos pacientes a familiares. Você vai conhecer
as leis e resoluções que norteiam a conduta médica. Aprender
sobre Bioética Principialista, Bioética do Cotidiano e a Bioética
da Responsabilidade. Entender melhor distanásia e o processo
de deliberação moral.

42
CONTEÚDO
Entre as transformações que a humanidade sofreu no decor-
rer de sua história, duas concepções permanecem estanques: o
ser humano nasce e morre.
Simples à primeira vista, e ainda objetivo e aceitável, reflete
complexidade, subjetividade e negação. A certeza da morte ain-
da é soberana à tecnologia.
E é justamente o desconforto das pessoas diante da morte
que levou a assistência em saúde a um caminho tão pouco hu-
mano e artificial.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 43


LEIS E RESOLUÇÕES
Documentos descrevem leis e resoluções que defendem o di-
reito do paciente, a boa prática em saúde e que colocam o cuida-
do paliativo em destaque nas boas práticas em saúde. O primeiro
documento importante é a Lei estadual 10.241, de 1999, conhecida
como Lei Mário Covas, que “permite que os médicos, perante au-
torização da família, suspendam tratamentos que prolonguem a
vida de pacientes terminais ou sem chances de cura. Essa lei asse-
gura aos usuários dos serviços de saúde no Estado de São Paulo,
em seu artigo segundo, o direito de “recusar tratamentos doloro-
sos ou extraordinários para tentar prolongar a vida”.

44
O segundo documento é a resolução número 1.805 de 2006,
do Conselho Federal de Medicina, que atesta que, na fase termi-
nal de enfermidades graves e incuráveis, é permitido ao médico
limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolon-
guem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários
para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva
de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou
de seu representante legal.

É importante salientar que essa resolução gerou polêmica em


função da má interpretação do texto. Porém, ela foi um passo deci-
sivo para novos textos do Novo Código de Ética Médica.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 45


O terceiro documento é o novo Código de Ética Médica, capítu-
lo V, artigo 41, citado anteriormente, que determina ao médico que,
nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer
todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações
diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sem-
pre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua
impossibilidade, a de seu representante legal.

É importante lembrar que o médico fica com medo da punição


por omissão de socorro quando, na realidade, nos casos de doen-
ças terminais, empreender procedimentos invasivos, inúteis, que
causem sofrimento, é distanásia. E distanásia é um delito ético gra-
ve. Esta é uma questão importante para que paciente e familiares
não sejam vítimas do abuso do tecnicismo.

46
O quarto documento são as resolutivas antecipadas de von-
tade, cuja resolução 1.995 de 2012 foi publicada pelo Conselho
Federal de Medicina. A resolutiva de vontade determina que o
paciente tem o direito de estabelecer o seu desejo diante de
uma doença terminal.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 47


E esse desejo precisa ser respeitado. Não precisa necessariamente
ser documentado em cartório. Basta que ele seja descrito em pron-
tuário médico, uma vez que o prontuário é um documento formal.

BIOÉTICA ATUAL EM CUIDADOS PALIATIVOS


Nos anos 1970, dois autores, Beauchamp e Childress, criaram a
Bioética Principialista, baseada em 4 princípios: o da Beneficên-
cia, o da Não Maleficência, o da Autonomia e o da Justiça.

48
Atualmente, a Bioética Principialista evoluiu para a Bioética do
Cotidiano e a Bioética da Responsabilidade.
Diego Gracia, importante psiquiatra espanhol, defende a ideia
de que leis e teorias não são absolutas e sim adequáveis às dife-
rentes realidades.

Considerando os aspectos éticos no cuidados paliativos, é pre-


ciso levar em consideração a tomada de decisão ou deliberação
moral, ou seja, método deliberativo que consiste na análise de fatos
e valores, no sentido de uma tomada de decisão mais prudente.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 49


As decisões em cuidados paliativos têm como foco a manuten-
ção da qualidade de vida, e não a manutenção da vida a qualquer
custo. Fazem parte do processo decisório a opção pelo início e
suspensão de determinados tratamentos ou condutas, e isso é
sempre difícil. Além do saber técnico dos profissionais médicos, é
fundamental levar em conta os valores dos pacientes: seus dese-
jos, suas vontades e sua forma de viver.
O cuidado paliativo nasce com o conceito de tratar os sintomas,
controlar o sofrimento. Mas, para isso, é primordial que o trabalho
seja feito com uma comunicação impecável, tirando do paciente
aquilo que ele entende como sofrimento, e o sintoma que realmen-
te necessita ser paliado.

A FUNÇÃO ÉTICA
“Na deliberação, a função ética é evitar que as deci-
sões sejam imprudentes e não buscar uma unanimida-
de. Segundo Diego Gracia isso implica conhecimentos,
habilidade e atitudes, como respeito mútuo, humilda-
de intelectual, desejo de enriquecer a própria compre-
ensão dos fatos pela ótica do outro.”

50
Nesse processo de deliberação, devemos observar:
• Deliberação sobre os fatos: ou seja, expor o caso, descrever a
situação, descrever o caso clínico do paciente.
• Deliberação sobre os valores: os valores que estão envolvidos
na tomada de decisão. Não somente aqueles do conhecimen-
to técnico, mas inclusive os valores do paciente.
• Deliberação sobre os deveres: são os deveres do profissional.
É o momento do profissional observar as seguintes questões:
_ Se eu tivesse mais tempo, tomaria a mesma decisão?
_ Essa decisão é legal?
_ Tomada essa decisão, posso tornar público o que decidi?
• Provas de Consistência: com prudência e responsabilidade
para a tomada de decisão definitiva.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 51


PALAVRAS FINAIS DA PROFA. DALVA Y. MATSUMOTO

Os cuidados paliativos desenvolvem o cuidado ao pa-


ciente baseados no princípio bioético de sua autono-
mia, através do consentimento informado, possibili-
tando que ele tome suas próprias decisões, visando à
qualidade de vida e à manutenção da dignidade hu-
mana no decorrer da doença, na terminalidade da
vida, na morte e no período de luto.”

Para saber mais

ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).

Manual de Cuidados Paliativos. São Paulo, 2a ed. Ed Sulina, 2012.

TWYCROSS R, Wilcock A. Thorp S. Palliative Care Formulary PCF4.

Radcliffe Medical Press, Oxford, 2011.

52
ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 53
Aula 4

AVALIAÇÃO
INTEGRAL
DOS PACIENTES
Profa. Ana Lúcia Giaponesi
• Enfermeira
• Formada em Cuidados Paliativos
pelo Instituto Paliar
• Coordenadora do Comitê de CP da ABRALE
OBJETIVOS
DA AULA
Nesta aula, a professora aborda a necessidade da avaliação inte-
gral do paciente para poder controlar os sintomas. Você vai conhe-
cer os instrumentos de avaliação, como a PPS e a ESAS. Vai entender
como a participação de toda a equipe multiprofissional no plano
de cuidados para o paciente e a família é essencial. A professora
explica ainda o que é o sintoma total e as decisões terapêuticas.

56
CONTEÚDO
Um adequado controle de sintomas é fundamental em cuidados
paliativos. No próprio conceito da Organização Mundial da Saúde
(OMS), justifica essa importância quando profere:
• Promover o alívio da dor e de outros sintomas desagradáveis;
• Integrar aspectos psicológicos e espirituais no cuidado ao doente.

Mais do que um sintoma físico, falamos do “sintoma total”, ou


seja, a conjunção de fatores físicos, psicológicos, sociais e espirituais
na gênese do sintoma. O desafio é a boa avaliação do doente e a
identificação de parâmetros que apoiem, de forma científica e clí-
nica, o diagnóstico desse processo. Porém, requer conhecimento
técnico aliado à percepção do ser humano, ou seja, devemos co-
nhecer não só o doente, mas a doença, a história de vida e o percur-
so do adoecer e do morrer.

COMUNICAÇÃO É UM DOS PILARES


DOS CUIDADOS PALIATIVOS
Tudo é valorizado: a história natural da doença, a história de vida
do paciente, suas alterações emocionais, físicas e culturais. É im-
portante que os familiares participem e compreendam a evolução
da doença e as possibilidades até o evento final.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 57


A avaliação permite uma comparação em diversos momentos.
Você avalia aquele sintoma, prescreve, avalia novamente, para ver
como ele está sendo controlado. Uma boa assistência e um bom
controle de sintomas são possíveis quando se tem atenção aos de-
talhes. Ouvir a família e o paciente requer uma boa comunicação.
Por todas essas razões, cuidados paliativos é realizado de forma
individualizada, lembrando sempre que se faz por princípios e não
por protocolos.

AVALIAÇÃO INTEGRAL
A avaliação integral só pode ser realizada por uma equipe mul-
tiprofissional: médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais,
fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, farma-
cêuticos e qualquer outro profissional da área da saúde.

58
DADOS BIOGRÁFICOS
A avaliação integral começa nas informações dos dados biográfi-
cos. Qual o objetivo de ter os dados biográficos? É conhecer quem
está em sofrimento. Nós só podemos cuidar e realizar um plano de
cuidados quando conhecemos a pessoa.
Veja como é a ficha de Dados Biográficos:

Uma dica: todos esses dados podem ser coletados em uma con-
versa informal, desde que haja um estímulo para que o paciente
fale sobre si mesmo. Nem sempre conseguimos todos esses dados
na primeira entrevista ou no primeiro encontro com o paciente.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 59


CRONOLOGIA DA DOENÇA ATUAL
Outro aspecto importante da avaliação integral são as informa-
ções atuais da avaliação clínica: o registro da doença com o mês e
o ano do diagnóstico, os tratamentos realizados e outras doenças
secundárias. Vale lembrar que outras complicações também
são importantes no registro do prontuário: complicações liga-
das à própria doença atual ou outros diagnósticos não relaciona-
dos à doença em questão.
Um prontuário em cuidados paliativos deve conter todas as deci-
sões terapêuticas tomadas a partir de uma avaliação clínica.
Veja como é a ficha de prontuário em cuidados paliativos:

60
Dois instrumentos são essenciais na avaliação clínica e diária do
paciente em cuidados paliativos:

PALLIATIVE PERFORMANCE SCALE (PPS)

Palliative Performance Scale (PPS) é uma tabela que informa


a funcionalidade do paciente. Ela vai de zero a 100% e mostra o
declínio da funcionalidade a partir da progressão da doença. As
características são: autocuidado, deambulação, ingesta (alimentar),
atividade e evidência da doença, e nível de consciência. O PPS deve
ser aplicado diariamente nas unidades em que o paciente esteja in-
ternado, em todas as consultas ambulatoriais e visitas domiciliares.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 61


ESCALA DE AVALIAÇÃO DE SINTOMAS
DE EDMONTON (ESAS)

Outro instrumento utilizado é a Escala de Avaliação de Sinto-


mas de Edmonton (ESAS). Nessa escala, constam 09 sintomas,
que variam em um escore de 0 a 10, além de um sintoma ou pro-
blema que o paciente possa relatar e que não conste nessa lista-
gem. Por exemplo: uma obstipação, um problema social ou emo-
cional. Zero mostra a menor intensidade do sintoma e 10 a maior.

62
PLANO DE CUIDADOS
Após essa avaliação integrada, nós realizamos o plano de cuida-
dos. Ele deve ser feito por toda a equipe multiprofissional de ma-
neira clara e objetiva. O ideal é que contemple não só o paciente
mas também a família. Salientamos que, no plano de cuidados do
sintoma total, avaliado pela equipe multiprofissional, deve conter
o tratamento não farmacológico também, mas é importante que
o sintoma físico esteja controlado. Nós não conseguimos acessar
as outras dimensões do paciente se ele estiver apresentando al-
gum sintoma físico, principalmente a dor. Mas o plano de cuida-
dos em tratamento não farmacológico também ajuda e comple-
menta o tratamento da dor física e de outros sintomas físicos.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 63


LEMBRETE
Lembrar sempre que cada paciente e cada família
enfrenta a doença de uma maneira. Cada um traz um
recurso de enfrentamento diferenciado e este recurso
serve para a equipe como um parâmetro na condução
da assistência.

DECISÕES TERAPÊUTICAS
A avaliação da família é essencial no plano de cuidados. Ela deve
participar e compartilhar das tomadas de decisão. Uma família
bem cuidada e bem orientada participa e auxilia muito nos cuida-
dos com o paciente.

64
Vivência da equipe
Profa. Débora G. Costa, psicóloga hospitalar

Na nossa prática diária ao atendimento à família,


vivenciamos várias histórias. Tem um caso muito rico
em que todas as dimensões da família e do paciente
foram abordadas pela equipe de cuidados paliativos. Diferen-
temente do que é comum, foi indicado cuidados paliativos no
momento do diagnóstico de câncer de uma criança, acometi-
da por tumor sólido. A família possuía diversas necessidades: a
mãe tinha sobrecarga de trabalho e precisava dar conta de um
financiamento da casa própria; o pai estava afastado do traba-
lho por questão de saúde; e o irmão da criança portava um mal
compulsivo. A família apresentava múltiplas carências físicas,
emocionais e sociais. E o cuidado paliativo fez toda a diferença.
Conseguimos abordar todas as dimensões. O assistente social
ajudou nos benefícios, o psicólogo ajudou no sofrimento, os mé-
dicos e enfermeiros, na questão física, e a família conseguiu en-
frentar todas as dificuldades do curso da doença graças à assis-
tência de uma equipe multidisciplinar que cumpriu seu papel”.

Para saber mais

ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).

Manual de Cuidados Paliativos. São Paulo, 2a ed. Ed Sulina, 2012.

TWYCROSS R, Wilcock A. Thorp S. Palliative Care Formulary PCF4.

Radcliffe Medical Press, Oxford, 2011.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 65


Aula 5

CONCEITOS
E PECULIARIDADES DE CUIDADOS
PALIATIVOS PEDIÁTRICOS

Profa. Rita Tiziana


• Enfermeira
• Especialista em Administração
Hospitalar e Serviços de Saúde pela
Faculdade de Saúde Pública da USP
OBJETIVOS
DA AULA
Embora recente, a especialidade de Pediatria também pode ser
inserida em cuidado paliativo. Nessa aula, a professora descreve pa-
ciente e família como uma unidade de cuidados. Conta qual é a ori-
gem da unidade de Cuidados Paliativos Pediátricos (CPP) e como
esse trabalho é de escuta, de criação de vínculo e de cuidar da dor
em todas as suas dimensões.

68
CONTEÚDO
Uma boa notícia: o índice de sobrevivência do câncer infanto-ju-
venil chega a 70% dos pacientes. Além de curar, o tratamento visa
manter a qualidade de vida do paciente e integrá-lo à sociedade.
Apesar de todo arsenal terapêutico oferecido, há casos em que
a doença progride, sendo considerada fora das possibilidades te-
rapêuticas de cura. Ocorre, então, a mudança no enfoque de tra-
tamento: passa de curativo para paliativo. Nessa fase, o objetivo
principal é o controle de sintomas físicos e psicológicos para levar
qualidade de vida para as crianças com câncer avançado. Os Cui-
dados Paliativos Pediátricos (CPP) dão suporte à criança e seus
familiares visando aliviar expectativas e necessidades físicas, psi-
cológicas, sociais e espirituais. Qualquer que seja a fase da doença
a ser enfrentada, é sempre possível oferecer medidas de suporte
à criança, cuidador principal e família. Os CPP consideram o pa-
ciente e a família como uma unidade de cuidados, e eles devem
ser apoiados antes e após a morte da criança. Esse trabalho re-
quer uma abordagem multidisciplinar efetiva e ampla que inclua
a unidade de cuidados (criança e família) e o uso de recursos dis-
poníveis na comunidade.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 69


DEFINIÇÃO
Cuidados Paliativos Pediátricos (CPP): na pediatria, a expansão
dos cuidados paliativos é recente. O primeiro serviço de atendi-
mento para crianças surgiu na Inglaterra, no ano de 1982. Nos Es-
tados Unidos, o primeiro serviço de cuidados paliativos dentro de
uma unidade pediátrica foi o do St. Mary’s Hospital, em Nova York.

70
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os CPP des-
tinam-se à crianças com doenças ameaçadoras da vida, repre-
sentando um campo especial, embora próximo dos cuidados
paliativos de adultos.

PRINCÍPIOS DO CUIDADO PALIATIVO PEDIÁTRICO


São os cuidados ativos totais para o corpo, mente e espírito da
criança, e envolvem também o suporte à família. Começam quan-
do a doença é diagnosticada e continuam independentemente de
a criança receber ou não tratamento curativo. Os profissionais de
saúde devem avaliar e aliviar os sintomas físico, psicológico e social
da criança. Para serem eficazes é necessária uma equipe interdis-
ciplinar e multiprofissional capacitada e bem treinada. Podem ser
implementados mesmo quando os recursos são limitados e pode-
mos atender esses pacientes em Hospitais terciários, nas Unida-
des Básicas de Saúde ou no domicílio.

As necessidades do paciente

A abordagem do paciente e seus familiares em cuidados


paliativos envolve “estar com” o paciente, ou seja,
disponível para atender suas necessidades, compreender
suas angústias e respeitar seus direitos. Jean Lugton e
Margareth Kindlen publicaram um dos primeiros livros de
enfermagem em cuidados paliativos e nele citam que é
preciso desenvolver habilidades para o trabalho nesta área.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 71


HABILIDADES NECESSÁRIAS
PARA OS CUIDADOS PALIATIVOS
• Respeitar a identidade e integridade do ser humano;
• Ser sensível e não julgar;
• Saber quando falar e quando ouvir;
• Ter conhecimento e habilidades para intervir de modo a pro-
mover a melhor qualidade de vida possível, sempre respeitan-
do a vontade do paciente.

72
ESPECIFICIDADE DO CUIDADO PALIATIVO PEDIÁTRICO
A Academia Americana de Pediatria descreve que a criança tem
inúmeras diferenças em relação ao adulto. Ela apresenta doenças
diferentes, peculiares de cada faixa etária e, consequentemente,
com necessidades específicas. A criança tem grande dependên-
cia afetiva aliada a uma personalidade ainda imatura para enfren-
tar as consequências de uma doença grave, limitante e fatal. Os
mecanismos fisiológicos de compensação da criança ainda estão
em fase de desenvolvimento. E ela reage à dor e à ansiedade de
forma diversa do adulto. Outra diferença a ser considerada são as
necessidades metabólicas e a farmacocinética específica de cada
estágio de desenvolvimento da criança. Sendo assim, as crianças
têm necessidades complexas de cuidados paliativos, que são de-
terminadas pela idade, a fase da doença, a unidade familiar, o
meio cultural e requerem respostas coordenadas dos serviços de
saúde, além dos apoios comunitários.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 73


O menino que queria ser médico
Raquel Vaz da Cunha, mãe de paciente
atendido por cuidados paliativos

Eu sou Raquel, mãe do Vitor, que faleceu com 14


anos em decorrência de um Linfoma de Hodgkin, em
2015. Cuidados Paliativos foi essencial tanto no final
da vida dele quanto na continuação da minha. Vitor era uma
menino de 12 anos muito sonhador, inteligente, ativo... tanto que,
quando recebeu o diagnóstico, ficou encantado pela Oncologia,
e sempre falava que queria ser médico. Ele nunca associou a
doença à morte, sempre tinha vida. Um momento em que isso
ficou claro foi quando o médico pediu para que Vitor visitasse
um outro paciente da mesma idade, tão curioso quanto ele, que
pediu ao Vitor que respondesse a uma pergunta que o menino
tinha feito para ele. O médico disse: ele me fez uma pergunta
que o Vitor nunca fez. Eu, mãe, muito curiosa, perguntei: Qual foi
a pergunta? O médico
respondeu: ‘O menino
me perguntou se essa
doença iria matá-lo’.

74
Fiquei calada. Aí o Vitor ouviu e explicou: “Eu nunca fiz essa
pergunta porque eu não acho que o câncer vai me matar.” Ele
nunca associou o câncer à morte.
O atendimento contou com toda a equipe de Onco-hema-
tologia e toda a equipe de enfermagem, que realizou todo o
acolhimento. Vitor escolhia a enfermeira e a hemato que o
atenderiam em tal dia, além dos médicos que o visitavam. Era
liberada a visita dos familiares a qualquer hora, era tudo muito
acolhedor. Esse atendimento fez toda a diferença, e acho que é
por isso que eu consigo caminhar hoje”.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 75


A FAMÍLIA
A família é doadora e receptora de cuidados. Quando aborda-
mos um paciente gravemente enfermo e em cuidados paliativos,
é importante a proximidade, criar um vínculo com a família. Para
isso, temos que estabelecer uma boa comunicação: começar con-
versando com a família, perguntar sobre as suas necessidades, ver
os desejos da criança, atender tudo aquilo que for necessário para
que a família seja confortada. Esse período em que a criança está
em cuidados paliativos pode estar muito próximo à sua terminali-
dade ou não. E é importante dar todo o apoio à família, para que
possam entender que a equipe estará do lado deles para atender
as necessidades de todos. Todo esse processo deve acontecer du-
rante o atendimento. Depois disso, é desejável que a equipe de cui-
dados paliativos possa acompanhar essa família no sentido de per-
ceber como ela está se comportando depois que a criança morre e
ajudar essa família a se reestruturar.

76
É importante reconhecer a criança
e sua família como parceiros
dos cuidados e criar entre eles uma
verdadeira aliança terapêutica.

Ao trabalhar em equipe junto com a família podemos saber de-


talhadamente a história dessa criança, conhecer eventualmente
os seus medos e preocupações acerca da doença, dor, sintomas e
ainda sobre a morte. E é importante estabelecer um vínculo com
essa família, uma aliança. O plano terapêutico deve ser muito bem
traçado, atendendo à todas essas necessidades.

E mais:

NÃO PODEMOS ESQUECER DA DOR.

Porque esse é o sintoma mais temido por todos os pais e pelas


crianças e adolescentes nessa fase paliativa.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 77


TRÍADE CRIANÇA, FAMÍLIA E EQUIPE
Trabalhar neste prisma da tríade criança, família e equipe é uma
excelente alternativa usada no CPP. Ouvir a criança, suas necessida-
des, suas angústias, seus desejos e seus medos faz com que a equi-
pe possa executar um plano para atender às suas necessidades. A
família deve participar ativamente desse cuidado:
• Deve ser ouvida em suas necessidades;
• Deve participar de suas decisões;
• Não esquecer de levar em conta a herança cultural, religião e
espiritualidade do paciente e familiares.

Tudo isso vai fazer com que se estabeleça um caminho para o


atendimento desse paciente. A criança pode se beneficiar desse
desfecho e a duração desse cuidado pode se tornar variável ou di-
fícil de prever.

78
PALAVRAS FINAIS DA PROFA. RITA TIZIANA

Cuidados Paliativos Pediátricos são de fundamental


importância para atender as necessidades da crianças
com doenças limitantes da vida ou sem possibilidade
terapêutica de cura. Estabelecer planos e estratégias e
um atendimento humanizado e individualizado pode
ser a grande saída para a finitude dessas crianças.

Para saber mais

ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).

Manual de Cuidados Paliativos. São Paulo, 2a ed. Ed Sulina, 2012.

TWYCROSS R, Wilcock A. Thorp S. Palliative Care Formulary PCF4.

Radcliffe Medical Press, Oxford, 2011.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 79


Aula 6

CRITÉRIOS DE
INCLUSÃO
E EXCLUSÃO
Profa. Ana Lúcia Giaponesi
• Enfermeira
• Formada em Cuidados Paliativos
pelo Instituto Paliar
• Coordenadora do Comitê de CP da ABRALE
OBJETIVOS
DA AULA
Esta aula é sobre elegibilidade. A professora mostra quem são
os pacientes elegíveis aos cuidados paliativos, quais são as doenças
que podem ser indicadas aos cuidados paliativos e quais as dúvidas
mais frequentes dos profissionais da área da saúde quando pen-
sam em indicar um paciente aos CP.

82
CONTEÚDO
ELEGIBILIDADE
Os pacientes elegíveis a cuidados paliativos são aqueles que têm
uma doença grave, incurável e que ameaça a continuidade da vida.
Dentro dessas doenças nós temos:
• Câncer
• Doenças cardiovasculares
• Doenças pulmonares
• Doenças hepáticas
• Doenças renais
• Demências
• Síndromes neurovegetativas

Segundo o DATASUS, ocorre 1 milhão de mortes por ano no


Brasil. E mais de 50% dessas mortes são passíveis de paliação.
Infelizmente, o país não conta com serviços nem com profissio-
nais para atender essa demanda.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 83


CONCEITOS GERAIS DE ELEGIBILIDADE
Os conceitos gerais de elegibilidade têm as seguintes caracte-
rísticas:
• Diagnóstico bem definido;
• Doença que ameace a continuidade da vida ou que esteja em
franca progressão;
• Necessidade de adequação terapêutica dinâmica;
• Grande impacto social e emocional ao paciente e a família.

Essas características nos levam a algumas dificuldades, como


reconhecer as doenças que ameaçam a vida e identificar a morte
e a proximidade dela, ou seja, ter um prognóstico para o paciente.

84
RECONHECER O MOMENTO DE INDICAR
CUIDADOS PALIATIVOS
Essa é uma grande dúvida entre os profissionais dentro da área
da saúde, porque muitos acreditam que indicar cuidados paliati-
vos deve ocorrer na doença terminal. A gente sabe que a Organi-
zação Mundial da Saúde (OMS) preconiza que cuidados paliativos
têm que ser indicados precocemente, a partir do diagnóstico da
doença. Desse jeito, o cuidado paliativo permite que você crie um
vínculo com a família, com o paciente, e você pode atuar apenas
com ações pontuais até os cuidados paliativos em sua totalidade.
A Organização Mundial da Saúde definiu as diversas etapas de
atuação dos cuidados paliativos de acordo com a progressão da
doença. Veja:

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 85


Observe que as ações paliativas ocorrem no início do diagnós-
tico da doença. E, a partir do momento em que essa doença vai
progredindo, a ação do trabalho avança para a totalidade dos cui-
dados paliativos. Ele anda junto com o tratamento curador da do-
ença. Então, o paciente tem um diagnóstico, começa o tratamento
curador, como quimioterapia, radioterapia, e os cuidados paliativos
vão ter algumas ações psicossociais, algum controle de sintomas
que esse tratamento curador, por exemplo, vai trazer ao paciente.
É importante adotar essas ações desde o início porque cria-
mos vínculo com a família e com o paciente. E, a partir do mo-
mento que a doença progride e o cuidado paliativo se faz mais
presente e o curador menos presente, nós podemos obter um
controle maior dos sintomas e dar uma melhor qualidade de
vida ao paciente. Quando o paciente chega na fase terminal da
doença e os cuidados paliativos são adotados na sua totalidade,
dificilmente haverá algum tratamento curador. E é necessário
lembrar sempre que, após a sua morte, os cuidados paliativos
vão acolher a família em seu luto.

86
IMPLICAÇÕES
Algumas implicações são importantes nesse contexto.
• Avaliação e controle dos sintomas: precisamos manter nosso
paciente com sintomas bem controlados;
• Discussão e expectativa de vida: quando possível, o paciente
deve participar com sua família dessas discussões;
• Discussão de objetivos de tratamento: onde vamos chegar,
como podemos chegar para dar uma qualidade melhor de
vida a esse paciente e sua família;

• Compartilhamento na tomada de decisão: não podemos es-


quecer que o paciente é um ser biográfico, que tem uma his-
tória antes da doença. E, quando possível e indicado, ele deve
participar dessas decisões;

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 87


• Planejamento do cuidado: qual o objetivo desse cuidado,
onde podemos chegar para que o paciente e a família tenham
uma qualidade de vida;
• Alocação de recursos: apropriados para cada momento do
tratamento. Ou seja, do que o paciente e a família precisam
para aquele momento do plano de cuidados.

88
PALAVRAS FINAIS DA PROFA. ANA LÚCIA GIAPONESI

As populações elegíveis têm suas características diver-


sas e as equipes terão que construir uma formação es-
pecífica para avaliação, plano terapêutico e interven-
ções necessárias ao cuidado paliativo. E a questão da
elegibilidade é um assunto muito delicado que requer
uma formação do profissional.”

Para saber mais

ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).

Manual de Cuidados Paliativos. São Paulo, 2a ed. Ed Sulina, 2012.

TWYCROSS R, Wilcock A. Thorp S. Palliative Care Formulary PCF4.

Radcliffe Medical Press, Oxford, 2011.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 89


Aula 7

MODALIDADES
INTEGRAIS
Profa. Ana Lúcia Giaponesi
• Enfermeira
• Formada em Cuidados Paliativos
pelo Instituto Paliar
• Coordenadora do Comitê de CP da ABRALE
OBJETIVOS
DA AULA
Nesta aula, a professora fala mais um pouco sobre elegibilida-
de. Ensina que cuidados paliativos podem ser realizados dentro do
âmbito hospitalar com uma equipe de interconsulta ou em uma
unidade específica de cuidados paliativos. Também pode ser am-
bulatorial, no domicílio, em Hospice ou em uma hospedaria.

92
CONTEÚDO
QUANDO SURGIU
Em 1993, a Revista Brasileira de Cancerologia publicou uma ma-
téria em que citava, pela primeira vez, a implantação de um serviço
de cuidados paliativos no Brasil. A oncologista Magda Rezende, do
Instituto Nacional de Câncer (INCA) e alguns colegas falaram sobre
o centro de suporte terapêutico oncológico. A partir daí, ocorreu
um maior interesse e houve um crescimento de profissionais na
área da saúde em torno de cuidados paliativos no Brasil.

MODELOS DE ASSISTÊNCIA
EM CUIDADOS PALIATIVOS NO BRASIL
As pesquisas nos mostram que, culturalmente, quando o pacien-
te chega na fase final da vida, a sua preferência é morrer dentro
de um hospital. Constata-se que, nesse momento, começam os
cuidados paliativos dentro do ambiente hospitalar. Por conta dessa
demanda, as equipes hospitalares vão se formando para realizar
cuidados paliativos, mas ocorre que nem sempre é tão vantajoso
que sejam realizados dentro do hospital. É bom lembrar que, às
vezes, os pacientes ficam sujeitos a procedimentos invasivos como
drenos, sondas, e são levados para as unidades de terapias intensi-
vas sem ter realmente uma indicação para isso. O que os pacientes
com doenças graves, incuráveis, necessitam, é de controle de sinto-
mas especializados, de comunicação e ações coordenadas.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 93


AMBIENTES ONDE OS CUIDADOS PALIATIVOS
PODEM SER REALIZADOS

Hospitais:
No ambiente hospitalar, os cuidados paliativos são realizados de
três maneiras:
• Unidade de Cuidados Paliativos: que tem uma equipe treina-
da e capacitada. O paciente é transferido para os leitos dessa
unidade.
• Equipe de interconsulta: é uma equipe mínima formada por
um médico, uma enfermeira, um psicólogo e uma assistente
social. Quando acionados, vão até o leito do paciente, avaliam,
traçam um plano de cuidados e, periodicamente, passam para
avaliar e prescrever esse paciente. Geralmente, o médico as-
sistente acompanha essa equipe no tratamento e no controle
dos sintomas.

94
• Equipe itinerante: é acionada conforme a necessidade do
médico e passa a assumir esse paciente em sua totalidade.
Nem sempre o médico assistente continua nos seus cuidados.

Domicílio:
Outra opção para se realizar cuidados paliativos é no domicílio.
Com uma equipe especializada e capacitada, podemos periodica-
mente avaliar o paciente em casa, controlando seus sintomas. A
vantagem é que as necessidades vão ser atendidas conveniente-
mente, o paciente está em seu ambiente, o acesso será mais fácil
aos cuidadores e o controle dos sintomas é mais adequado.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 95


As desvantagens de não estar em um hospital podem ser um
problema se não houver acesso à certidão de óbito, à restrição de
drogas e pela própria estrutura da casa. Não podemos esquecer
que deve haver uma adequação estrutural para que o atendimen-
to ocorra no domicílio. Mas o fato marcante é que o paciente pode
estabelecer suas necessidades sem o rigor das normas e horários
que existem em hospital, e isso é um grande ganho para a família
e para o paciente.

Resumindo: para realizar os cuidados paliativos a domicílio, é ne-


cessário uma série de condições que garantem um resultado efi-
caz. Acompanhe:
• Diagnóstico bem definido;
• Plano terapêutico feito pela equipe multiprofissional;
• Condições mínimas da residência;
• Cuidadora responsável e capaz de seguir as orientações dadas
pela equipe;
• A própria vontade do paciente e da família de permanecer no
domicílio.

96
Ambulatório:
No atendimento ambulatorial, a equipe interdisciplinar cuida do
paciente e da família. É nesse atendimento que o paciente vai trazer
sua emoções, sua dúvidas e vai discutir com toda a equipe sobre ter-
minalidade, morte, escolhas e, principalmente, sobre a progressão
da doença. Quando uma equipe de cuidados paliativos planeja o
atendimento ambulatorial, é muito importante que eles consigam
fazer a dispensação do medicamento, principalmente analgésicos,
resultando em um controle melhor dos sintomas. Como exemplo,
os opióides, que são muito usados em cuidados paliativos. Porém,
esse é um grande desafio no Brasil, desde a prescrição ou o arma-
zenamento até a dispensação, devido à legislação fortemente con-
trolada, de acordo com a portaria no 344 da ANVISA, que normatiza
e regula o tema. O paciente precisa receber esses medicamentos
mesmo estando em seu domicílio, através da consulta ambulatorial.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 97


Hospice:
É um termo em inglês utilizado para uma unidade de cuidados
paliativos diferente de um hospital geral, pois nesse atendimento
o paciente vem com a família. Estando ele na doença terminal ou
em um quadro mais mediano de complexidade, terá também o
cuidado da equipe multiprofissional. É importante salientar que o
paciente pode ficar dias, semanas e até meses, ou mesmo receber
alta e seguir o acompanhamento laboratorial.

98
Hospedaria:
Assim como Hospice, a Hospedaria é uma unidade de cuidados
paliativos diferente de um hospital geral que recebe os pacientes e
familiares para o controle de sintomas. A diferença é que muitas ve-
zes o paciente poderia receber esse atendimento em seu domicílio,
mas algum empecilho faz com que isso não ocorra. Em relação ao
tempo de internação, pode variar entre média e longa permanên-
cia. A visita médica é realizada duas ou três vezes por semana ou
quando o paciente tem alguma intercorrência.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 99


PALAVRAS FINAIS DA PROFA. ANA LÚCIA GIAPONESI

Seja qual for a necessidade do serviço de cuidados pa-


liativos, alguns parâmetros devem ser respeitados na
implantação do modelo. No Brasil, não existem parâ-
metros oficiais para o cálculo das necessidades dos cui-
dados paliativos, mas, de acordo com a Organização
Mundial de Saúde, a necessidade pode ser tomada com
base no perfil de mortalidade de uma nação. O mais im-
portante é que, segundo a OMS, não é possível realizar
cuidados paliativos sem uma equipe multiprofissional.
Portanto, nenhum serviço funciona sem uma equipe mí-
nima para esses modelos descritos.

Para saber mais

ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).

Manual de Cuidados Paliativos. São Paulo, 2a ed. Ed Sulina, 2012.

TWYCROSS R, Wilcock A. Thorp S. Palliative Care Formulary PCF4.

Radcliffe Medical Press, Oxford, 2011.

100
ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 101
Aula 8

INTRODUÇÃO À
COMUNICAÇÃO
Débora G. Costa
• Psicóloga Hospitalar
• Mestre em Gerontologia
• Membro do Instituto Paliar
OBJETIVOS
DA AULA
Nesta aula, a professora aborda a comunicação de notícias
difíceis. Define o que é comunicação não verbal, comunicação
individualizada e a Conspiração do Silêncio. Explica a prática
de uma técnica do psicodrama chamada Role Play, com cenas
do cotidiano assistencial de pacientes e familiares onde as no-
tícias difíceis estão envolvidas.

104
CONTEÚDO
Desde o momento do diagnóstico de uma doença, seguido por
sua evolução, agravo e mudança de perspectiva de tratamento
para Cuidados Paliativos Exclusivos, a comunicação de notícias di-
fíceis faz-se presente. Cabe ao profissional entender a comunica-
ção como aliada para o sucesso da condução dos cuidados.
• O objetivo é conhecer a importância e o papel da comunica-
ção interpessoal aplicada aos cuidados.
• Reconhecer as nuances da comunicação verbal e não verbal
na relação com o paciente, família e equipe na prática assis-
tencial.

COMO SE COMUNICAR SEM CAUSAR


TANTO IMPACTO E INSTABILIDADE EMOCIONAL?
Exemplos de má comunicação podem se configurar em:
• Falta de acolhimento;
• Falta de clareza no diagnóstico e tratamento;
• Inadequação da própria comunicação.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 105


DEFINIÇÃO
Comunicação: é o ato ou efeito de emitir, transmitir e receber
mensagens. Ato criativo que envolve: conteúdo (fato ou informa-
ção) e o sentimento (o que você quer comunicar e como se sen-
te a respeito). Não se trata só de transmissão de informação. As
mensagens podem ser interpretadas de acordo com a postura, o
conteúdo, a circunstância e o sentimento.

É um ato de extrema responsabilidade


por parte de quem transmite.

QUE HABILIDADES O PROFISSIONAL PRECISAR TER PARA


CONDUZIR UM BOM PROCESSO DE COMUNICAÇÃO?
Além da teoria, a técnica de psicodrama Role Play é uma apren-
dizagem prática que orienta qual a postura do profissional no mo-
mento da comunicação de notícias difíceis. Cenas do cotidiano as-
sistencial de pacientes e familiares onde as notícias difíceis estão
envolvidas são reproduzidas.

106
COMUNICAÇÃO NÃO VERBAL
As pessoas não se comunicam apenas por palavras:

• Movimentos corporais
• Expressões faciais
• Olhares
• Gestos
• Entonação

Os movimentos corporais, expressões faciais, os gestos, os olha-


res e as entonações estão presentes no processo de comunica-
ção: são os elementos da comunicação não verbal. Quando ela é
utilizada como estratégia de relação interpessoal com o paciente
favorece a expressão de sentimentos, angústias, medos e ansieda-
des. Desta forma estabelece-se uma relação de confiança entre
equipe e paciente. O paciente se sente acolhido e isso representa
a essência do cuidado.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 107


COMUNICAÇÃO INDIVIDUALIZADA
Assim como o cuidado, a comunicação deve ser individualiza-
da. Conhecer exatamente o paciente e a família garantem maior
assertividade no processo de comunicação. Conhecer sua cultura,
suas experiências, seus interesses, suas expectativas, suas ansie-
dades e suas crenças é fundamental para esse processo.

• Cultura
• Crenças
• Experiências
• Interesses
• Ansiedades
• Expectativas

108
O paciente em cuidados paliativos com doença avançada viven-
cia inúmeros sentimentos e sofrimentos. É comum apresentar des-
conforto físico, conflitos existenciais, necessidades que fármacos
ou tecnologia não suprem. Sente ameaça da morte e dificuldade
de deixar o que ama. A equipe deve procurar sempre aprimorar
sua comunicação pois quem trabalha com o núcleo paciente e
família em sofrimento, necessita saber não apenas o que, mas
quando e como falar. Em Cuidados Paliativos existe uma máxima
de que a verdade deve ser lenta e progressivamente suportável
para quem dá e para quem recebe a má notícia. Uma comuni-
cação de qualidade não envolve só a fala: é preciso saber ouvir e
silenciar. Este é um grande desafio para o profissional. Em meio ao
sofrimento muitas vezes palavras não chegam.

O silêncio e a presença acolhedora


fazem parte da comunicação tanto
quanto qualquer fala.
Uma das principais habilidades a serem desenvolvidas pelo pro-
fissional de saúde é a escuta. Uma escuta reflexiva e empática.
Quem dirá o que de fato necessita é o próprio doente. E cabe ao
profissional saber ouvir. O que o paciente espera desse profissio-
nal é uma postura empática e uma escuta legítima. Gente cui-
dando de gente: o profissional precisa se colocar em um patamar
igual ao do paciente. Não para sofrer como o paciente, mas para
tentar entender todas as suas dimensões e necessidades e dessa
forma acessar suas reais necessidades.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 109


O PACIENTE PRECISA SER OUVIDO

Por uma visão histórica e cultural somada ao avanço tecnológi-


co, questões relacionadas à doença, velhice e morte não são abor-
dadas: viram tabu para a maior parte das pessoas. A formação
do profissional na área da saúde, nesse sentido, é falha. Não são
treinados para falar sobre fracasso, quem dirá sobre terminalidade
da vida. Isso faz com que, no cotidiano assistencial, assuntos sobre
terminalidade da vida sejam evitados por parte do profissional, da
família e da equipe. Instaura-se o que chamamos de conspiração
ou cerco do silêncio.

110
CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO
É um processo que, com o intuito de proteger um ao outro, deixa
de compartilhar as más notícias, e se manifesta como um discurso
vago, otimista e superficial. É contraditório com a comunicação
não verbal que expressa claramente a gravidade da situação. To-
dos evitam falar sobre terminalidade e morte, para poupar o pa-
ciente, acreditando que vão evitar seu sofrimento ou depressão.

Para proteger um ao outro, as más


notícias não são compartilhadas.

O paciente sabe que é portador de uma doença. A família sabe


da gravidade da doença, mas não conversa a respeito. Finge, atra-
vés de um teatro de má qualidade, que está tudo bem. Isso im-
plica em um custo emocional muito grande. Por amor, tentam se
proteger. Mas, quando a dificuldade é partilhada, fica mais fácil de
enfrentar. Além disso, quando se sabe do desfecho da terminali-
dade da vida, o paciente pode planejar suas diretivas antecipadas,
suas despedidas e tentar deixar o seu legado.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 111


Estudos sugerem que a maior parte dos pacientes deseja:
• Ser informada sobre o diagnóstico;
• Saber sobre a possibilidade de agravo da doença;
• Conhecer a evolução da doença para a terminalidade da vida.

112
PALAVRAS FINAIS DA PROFA. ANA LÚCIA GIAPONESI

Culturalmente, a Medicina salva vidas e busca saúde. O


profissional não é formado para lidar com o insucesso
das doenças e com a proximidade da morte. Assuntos
como: informar ou não um diagnóstico e preservar ou
não a autonomia de um doente ainda representam um
grande desafio no processo de assistência em saúde. A
comunicação é um dos pilares dos cuidados paliativos.

Para saber mais

ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).

Manual de Cuidados Paliativos. São Paulo, 2a ed. Ed Sulina, 2012.

TWYCROSS R, Wilcock A. Thorp S. Palliative Care Formulary PCF4.

Radcliffe Medical Press, Oxford, 2011.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 113


Aula 9

COMUNICAÇÃO COM
O PACIENTE
Débora G. Costa
• Psicóloga Hospitalar
• Mestre em Gerontologia
• Membro do Instituto Paliar
OBJETIVOS
DA AULA
A professora apresenta dicas e técnicas para a comunicação de
notícias difíceis. Fala dos laços importantes para a condução de um
bom trabalho. E ensina a utilizar a comunicação como aliada para
o sucesso da condução dos cuidados: aprender a identificar sinais
de ansiedade extrema ou sofrimento exacerbado, saber ouvir e dar
autonomia ao paciente.

116
CONTEÚDO
IDENTIFICAR E ACOLHER
Aprendemos que comunicação é um dos pilares de CP. E que
toda equipe deve estar preparada e disposta a realizar as ações
junto ao paciente e à família. No contexto da doença, há um so-
frimento imenso do paciente e familiares devido à doença ame-
açar sua vida. E a equipe deve estar preparada para identificar e
acolher qualquer tipo de sofrimento, seja ele físico, social, espiri-
tual ou emocional.
É importante pontuar que as dicas e técnicas na comunica-
ção de notícias difíceis não tratam de protocolos. Tratam de dar
um norte, um passo a passo para auxiliar na comunicação des-
sas notícias. Tudo começa com uma preparação. Acompanhe as
etapas nas próximas páginas.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 117


ETAPA: PREPARE-SE PARA COMUNICAR
Estratégia:
• Escolha o local de preferência onde haja acomodações para
sentar;
• Cuide da privacidade;
• Reserve tempo para a conversa.

Por exemplo: psicóloga se apresenta como uma das profissionais


da equipe de cuidados paliativos e fala: “A proposta é que, a partir
de agora, a gente foque nos seus sintomas que tragam desconfor-
to. Seria bom saber qualquer sintoma físico, espiritual e emocional
que traga desconforto para você. Nossa equipe vai ter condições de
cuidar disso.”

118
ETAPA: DESCUBRA O QUANTO O PACIENTE SABE,
O QUANTO QUER OU AGUENTA SABER
Estratégia:
• Utilize perguntas abertas:
_ O que você sabe sobre sua doença?
_ O que você teme sobre sua condição?

Atente aos sinais não verbais do paciente durante suas respostas.


Identifique:
• Sinais de ansiedade extrema ou sofrimento exacerbado, ava-
liando as condições emocionais do paciente.

Já sabendo o que o paciente conhece ou não sobre sua doença,


cabe à equipe compartilhar a informação.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 119


ETAPA: COMPARTILHE A INFORMAÇÃO
Estratégia:
• Informe com tom de voz suave, porém firme, utilizando voca-
bulário adequado à compreensão do outro;
• Seja claro e faça pausas para que o paciente tenha oportuni-
dade de falar.

Valide a compreensão, fazendo perguntas curtas. Utilize o toque


afetivo e a proximidade física. Verbalize compaixão e solidariedade
ao sofrimento do outro.

Uma vez transmitida a notícia difícil, recomenda-se acolher os


sentimentos.

120
ETAPA: ACOLHA OS SENTIMENTOS
Estratégia:
• Permaneça junto ao paciente;
• Permita e estimule a expressão de sentimentos (de modo ver-
bal ou não verbal);
• Verbalize disponibilidade para ouvir.

É importante que, ao longo da consulta, haja um planejamento


do seguimento.

ETAPA: PLANEJE O SEGUIMENTO


Estratégia:
• Fale concisamente sobre os sintomas, possibilidades de trata-
mento e prognósticos;
• Estabeleça, junto com o paciente, metas a curto e médio pra-
zo e ações para atingí-las;
• Nunca é demais verbalizar a disponibilidade para o cuidado e
o não abandono;
• Deixe claro como e onde encontrá-lo, se necessário.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 121


Exemplo:

Psicóloga fala com paciente e familiares:


– Daqui a dois dias eu encontro vocês aqui neste mesmo
ambulatório. Se nesse meio tempo algum desconforto
predominar, entrem em contato. Vou entregar um folder
da equipe com as normas e com todos os contatos. Vocês
podem telefonar, na medida do possível, a gente orienta.
Eu quero que vocês saibam de verdade que não vai ser um
caminho fácil, nunca é, mas vamos trilhar juntos.”

122
TRAÇAR METAS
Justamente por ser um momento difícil é essencial que sejam
traçadas metas para a comunicação ao final da vida. É preciso
conhecer os problemas, anseios e temores e expectativas do pa-
ciente. Temos que facilitar o alívio de sintomas de modo a refor-
çar a autoestima e a melhorar a qualidade de vida do paciente. É
importante que o profissional ofereça informações verdadeiras,
de forma lenta, suportável e delicada. Desse modo, todas as ne-
cessidades do doente podem ser contempladas em um plano
assistencial de qualidade.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 123


RESPEITAR E REFORÇAR A AUTONOMIA
MESMO NESSA HORA
Em uma primeira consulta de comunicação de notícias difíceis,
há muitos assuntos a serem abordados. Nem sempre nessa primei-
ra abordagem o profissional conseguirá acessar questões culturais,
espirituais e necessidades mais amplas do doente. Existe um as-
pecto que é fundamental: a autonomia do doente. Mas, para que
o profissional consiga saber o que ele realmente deseja, é preciso
ter tempo de conhecê-lo.
No final da vida, as necessidades de comunicação da família são
mais específicas. Ela precisa de apoio e de tempo para poder se
reconciliar, agradecer, se despedir e fechar um ciclo ao lado da pes-
soa que ama e que se despede da vida.

124
PALAVRAS FINAIS DA PROFA. DÉBORA G. COSTA

É importante diminuir incertezas e auxiliar o paciente


no enfrentamento do processo de morrer. Para finalizar,
é importante lembrar sempre que o paciente é um ser
biográfico, com uma história de vida, história cultural,
crenças, valores, expectativas e sentimentos. Tem direi-
to a informação e autonomia na medida do possível,
e pode participar ativamente do processo de tomada
de decisões sobre o seu tratamento. AFINAL, ELE É O
SUJEITO DA PRÓPRIA VIDA.”

Para saber mais

ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).

Manual de Cuidados Paliativos. São Paulo, 2a ed. Ed Sulina, 2012.

TWYCROSS R, Wilcock A. Thorp S. Palliative Care Formulary PCF4.

Radcliffe Medical Press, Oxford, 2011.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 125


Aula 10

COMUNICAÇÃO COM
A FAMÍLIA
Débora G. Costa
• Psicóloga Hospitalar
• Mestre em Gerontologia
• Membro do Instituto Paliar
OBJETIVOS
DA AULA
Nesta aula, a professora aborda a importância da inclusão da fa-
mília no processo de comunicação. Explica algumas particularida-
des da família e da equipe em relação à comunicação no processo
de final de vida. Também descreve quais são as características fun-
damentais para uma equipe de cuidados paliativos.

128
CONTEÚDO
Não é novidade que a família é parte da unidade de cuidados. A
família está envolvida no processo desde o momento do diagnós-
tico até o seu luto. A equipe deve considerar essa assistência, pois
a família passa por um processo penoso de reorganização de vida.
Um idoso, por exemplo, com a cognição afetada, pode ser incapaz
de responder por si, de tomar decisões, de fazer valer sua autono-
mia. Cabe à família, através do seu conhecimento sobre o paciente,
fazer valer esses desejos de autonomia.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 129


Existe um documento chamado Diretiva Antecipada de Von-
tade que é um gênero de documentos de manifestação de vonta-
de para cuidados e tratamentos médicos, criado na década de 60,
nos Estados Unidos. No caso de o paciente estar impossibilitado
de responder por si, esse documento faz valer a sua vontade e a
sua autonomia. O familiar pode ser responsável por isso, mas o
profissional, registrando em prontuário, também pode. Costuma
ser muito penoso para o familiar assumir a responsabilidade de
decidir pela vida do outro, por isso, a equipe deve estar pronta
para amparar, apoiar e orientar, evitando, assim, os sentimentos
de culpa ou aumento do sofrimento.
A técnica de psicodrama Role Play é uma aprendizagem prá-
tica para orientar o profissional sobre a postura a ser adotada no
momento da comunicação de notícias difíceis. A reprodução de
algumas cenas do cotidiano assistencial de pacientes e familiares
treina para o trabalho.
Veja este exemplo:

Em uma consulta de familiares de um paciente com o


médico e equipe de CP o diálogo poderia ser este:
Cuidador Paliativo 1:
– Tudo bem, Julia? Acho que não me conhece, mas já
venho acompanhando faz algum tempo o seu pai. Ele é
avaliado todo dia pela equipe multiprofissional e ele tem
evoluído, tem tido uma melhora, uma resposta...

130
Familiar Júlia pergunta:
–Mas por que não põe
na UTI para ele melhorar?
Cuidador Paliativo 1:
– Tem algumas questões.
Primeiro, ele conversou
com a sua irmã, não é Maitê?, pedindo a participação dela.
Familiar Maitê, chorando:
– Ele não queria ir para a UTI, falou para mim enquanto
você estava viajando.
Familiar Júlia:
– Mas ele está pior...
Familiar Maitê:
– Ele viu o sofrimento da mamãe e
não quer que isso aconteça com ele. Ele não aguenta mais.
Cuidador Paliativo 1:
– Isso é um ponto, a vontade dele, que deve ser
respeitada, mas não é só isso. Somos profissionais e
temos competências técnicas para avaliar essa indicação.
Cuidador Paliativo 2:
– É um cuidado adequado para o que ele precisa neste
momento, é o cuidado proporcional a doença e à condição
clínica dele. Nada está sendo deixado de lado, estamos
fazendo tudo que traz benefício ao seu pai.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 131


NEM TODAS AS FAMÍLIAS SÃO IGUAIS
Um profissional deve levar em conta essa particularidade. Quan-
do uma criança adoece, a abordagem deve ser muito específica
com os pais e com a própria criança. No caso do idoso ou de um
jovem adulto, da mesma forma. Cada um tem uma necessidade,
uma característica, e a equipe precisa levar isso em conta. A co-
municação deve ser adaptada de acordo com a necessidade e a
população assistida, sem subestimar e nem superestimar a capa-
cidade de compreensão.
Veja a continuidade do diálogo que poderia ocorrer:

Cuidador Paliativo 2 pondera para a filha considerar a


vontade do pai:
– Pensa um pouquinho: se você estivesse no lugar dele,
se desejasse um determinado cuidado e se a equipe
apontasse também para essa indicação, como seria?

132
Cuidador Paliativo 1 dá um tempo para os familiares
entenderem a questão.
– Tudo bem, Julia? Ficou alguma dúvida?
Familiar Júlia:
– Tudo... Não ficou, tudo bem.
Cuidador Paliativo 1 confirma a disposição para a
conversa, sempre, mas reforça o plano de cuidados:
– Fique à vontade, se a gente precisar conversar de novo
não tem problema. Mas quero que confie na equipe, que
saiba que o que estamos fazendo é o que é para ser feito
realmente, o que é indicado para ele neste momento.

A assistência em Cuidado Paliativo termina com o luto da fa-


mília. No final da vida o luto antecipatório já se instala e a as-
sistência deve se estender até o processo de luto propriamente
dito. A tarefa do luto não é fazer com que a família se esqueça
do seu ente querido, mas achar um novo lugar e significado para
quem partiu em sua vida.

O luto é o preço que se paga por amar.


A EQUIPE QUE COMPARTILHA O CUIDADO PRECISA TER
TRANSPARÊNCIA, PARTILHAR INFORMAÇÕES E TER MUITA
MATURIDADE.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 133


Lidar com essa população que sofre afeta diretamente todos
os envolvidos da equipe. É bom lembrar que, assim como o pa-
ciente e família, a equipe também sofre com as perdas. O que se
deve evitar é que o conhecimento profissional de cada membro
da equipe fique fragmentado em sua atuação. Em cuidados pa-
liativos a equipe compartilha ações dentro de um plano de cuida-
do de forma interdisciplinar e, mais ainda, transdisciplinar. Para
as coisas boas e ruins da assistência a equipe racha a conta. É
responsabilidade de todos tudo que acontece com o paciente e
com a família no processo de cuidados. As habilidades interpes-
soais são fundamentais para o bom funcionamento da equipe de
cuidados paliativos. Quando se tem um problema de comunica-
ção, a equipe sofre um impacto negativo.

134
PALAVRAS FINAIS DA PROFA. DÉBORA G. COSTA

Uma comunicação harmônica e coesa favorece a qua-


lidade da assistência ao paciente e à família no final
da vida.

Para saber mais

ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).

Manual de Cuidados Paliativos. São Paulo, 2a ed. Ed Sulina, 2012.

TWYCROSS R, Wilcock A. Thorp S. Palliative Care Formulary PCF4.

Radcliffe Medical Press, Oxford, 2011.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 135


Aula 11

FASE FINAL DE VIDA:


SINTOMAS
MAIS FREQUENTES
Débora G. Costa
• Psicóloga Hospitalar
• Mestre em Gerontologia
• Membro do Instituto Paliar
OBJETIVOS
DA AULA
Nesta aula, a professora trata da fase final da vida, que pode
levar dias ou semanas, onde o controle de sintomas deve ser im-
pecável. Explica como identificar e quais são os sintomas e sofri-
mentos que a equipe deve observar. Também explica como lidar
com recursos internos do paciente e perceber se a prescrição
médica deve ser reavaliada.

138
CONTEÚDO
FASE FINAL DE VIDA
O paciente nessa etapa poderá ter horas, dias ou semanas de
vida. Seu PPS, que é uma escala de performance de avaliação, já
apresentada em outra aula, estará em torno de 30% e cursando
em declínio.

Vivência da equipe
Profa. Ana Lúcia Giaponesi

Eu me lembro de um paciente de 40 e poucos anos


que tinha um câncer muito avançado e grave. O de-
sejo dele era ir para a festa de 4 anos de seu filho. Ele
tinha muitos sintomas, a gente conseguiu controlar, mas a do-
ença estava muito avançada e ele veio a falecer antes da festa.
Então, foi um acolhimento muito difícil para a esposa e para a
mãe desse paciente, porque envolvia uma série de sentimentos
e responsabilidades que elas não estavam esperando, mas a
gente conseguiu, com toda a equipe, amenizar um pouco esse
sofrimento. O acolhimento é sempre necessário.”

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 139


O paciente estará provavelmente acamado e com muita dificul-
dade de se alimentar. Seu nível de consciência estará claudicante.
A atenção deve estar voltada para:
• Controle impecável dos sintomas;
• Uma boa comunicação;
• Atenção aos aspectos psicossociais e espirituais tanto do pa-
ciente quanto da sua família.

Vale ressaltar que, tanto o paciente quanto a família, para che-


garem nessa etapa da fase final de vida, cursaram um caminho
árduo na tentativa de modificar o curso da doença e, por essa ra-
zão, podem estar muito desgastados. Reações de raiva, desespero
e tristeza podem surgir e cabe à equipe acolher o paciente e a
família e nunca julgar o comportamento ou a reação, pois por trás
disso sempre existe um sofrimento e um pedido de ajuda.

140
SINTOMAS FÍSICOS MAIS COMUNS NESSA FASE
• Dor;
• Dispneia (dificuldade intensa ao respirar);
• Anorexia/caquexia (quando o paciente não ganha mais peso
pelo contrário, fica extremamente emagrecido);
• Fadiga (cansaço intenso, falta de energia para realizar qualquer
atividade, mesmo a que exija o mínimo esforço);
• Disfagia (dificuldade de deglutir qualquer consistência de ali-
mento, líquido, pastoso ou sólido);
• Rebaixamento de nível de consciência (o paciente já não conse-
gue ficar muito tempo acordado com a cognição funcionante);
• Alteração no padrão do sono e apetite, ou a pessoa dorme de-
mais ou tem insônia severa. A insônia, nessa fase, tem muita re-
lação com o medo do que possa vir ou medo da morte. E a bai-
xa de apetite está relacionada com os sintomas no final da vida.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 141


SOFRIMENTOS PSICOSSOCIAIS NESSA FASE
• Depressão
• Ansiedade
• Medo de morrer
• Medo de ser esquecido após a sua partida
• Tristeza
• Raiva
• Isolamento social
• Abandono social
• Perda de recursos financeiros
• Perda de função e papéis exercidos na época em que tinha
saúde

142
SOFRIMENTOS ESPIRITUAIS MAIS COMUNS DESSA FASE
• Vivência ou ausência da religiosidade;
• Questionamentos sobre o sentido da vida;
• Preocupações com o legado, ou seja, o que eu vou deixar para
as pessoas que eu amo após a minha partida;
• Reflexões sobre a existência ou não de algo após a morte.

O cuidado da dor
Raquel Vaz da Cunha, mãe de paciente
atendido por cuidados paliativos

Eu sou a Raquel, mãe do Vitor, que faleceu com 14


anos de Linfoma de Hodgkin, em janeiro de 2015. Eu
acho que o sofrimento é dolorido sim, mas esse cui-
dado que eu tive, essa atenção, foi muito importante para mim,
e eu vejo tantas famílias que não têm isso. E eu posso tentar
diminuir um pouco esse sofrimento, mostrar para as famílias
que há vida após a morte, essa vida após a morte sou eu aqui.
Não é só porque meu fi-
lho não foi curado que
eu não posso diminuir
o sofrimento de uma
família, acolher uma
família hoje, cuidar
dela. Ou até mesmo
de cuidados paliati-
vos, chegar em um
paciente que está

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 143


em estado terminal dentro de uma sala, ligado a equipamentos,
e mostrar para aqueles pais, para aquela família, que mesmo
depois da partida do paciente, independente de religião, é pos-
sível levar esse cuidado, essa atenção, esse carinho para outras
famílias. Mostrar que você sabe a dor que eles estão sentindo,
você entende, não precisa nem ser com palavras, apenas o fato
de você estar ali se colocando à disposição ou falando “Eu pas-
sei por isso e estou aqui”, consigo multiplicar esse amor, essa
atenção. Consigo dividir, acolher e entender esse sentimento.
A equipe que cuidou do meu filho, em cuidados paliativos,
teve cuidado comigo depois do óbito. Muitas famílias não sa-
bem, existe um cuidado depois, o cuidado paliativo, não só
para o paciente, mas para a família. Eu achava que receber
um diagnóstico de câncer era difícil, mas depois que você rece-
be um prognóstico que te encaminha para os cuidados palia-
tivos pensa que isso te remete à morte. Não! Na verdade é um
cuidado da dor. Eu achava que a morte era uma coisa muito
mais dolorida, mais difícil e, como veio crescendo essa questão
dos cuidados paliativos, com a equipe me acolhendo, e com a
minha fé também, foi mais fácil viver esse momento da separa-
ção, da morte do meu filho, e conseguir sobreviver hoje, continu-
ar a viver levando a fé e
esperança para essas
famílias que também
passam por esse pro-
cesso. Isso fez a dife-
rença, e é por isso que
eu consigo continuar.

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Para saber mais

ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).

Manual de Cuidados Paliativos. São Paulo, 2a ed. Ed Sulina, 2012.

TWYCROSS R, Wilcock A. Thorp S. Palliative Care Formulary PCF4.

Radcliffe Medical Press, Oxford, 2011.

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Aula 12

FASE FINAL DE VIDA:


SOFRIMENTO
TOTAL
Débora G. Costa
• Psicóloga Hospitalar
• Mestre em Gerontologia
• Membro do Instituto Paliar
OBJETIVOS
DA AULA
Nesta aula, a professora continua a desenvolver o tema sobre a
fase final da vida e o sofrimento total e descreve como a equipe
de cuidados paliativos pode escolher abordagens de atendimento.
Fala sobre a dor total e o princípio da proporcionalidade. Como lidar
com paciente e família em meio a tanta dor e sofrimento. O que
falar para o familiar nesse momento em que está prestes a perder
alguém que ama. Como encarar o paciente que se despede da vida.

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CONTEÚDO
COMO LIDAR COM O SOFRIMENTO TOTAL
Vamos falar de uma etapa da assistência a pacientes e familiares,
quando a Medicina chega ao seu limite e a realidade da morte tem
que ser encarada.
O princípio do controle de sintomas e da boa assistência na fase
final de vida é conhecer o doente, conhecer a sua história e a partir
daí avaliar o impacto do sintoma na vida do paciente. O paciente,
na fase final de vida, tem muitos sintomas, por isso precisamos es-
tabelecer prioridades: é importante conhecer a causa do sintoma e
a partir daí avaliar e conhecer a causa do sofrimento.
Sempre iniciar pelo controle de sintomas físicos, pois, com dor,
por exemplo, fica inviável acessar as esferas psicossocial e espiritual.
No entanto, muitas vezes, a queixa física, no caso a dor, perdurará
mesmo após a medicação; aí sim é importante avaliar se a poten-
cialização da dor não tem uma causa psicossocial ou espiritual.

DOR TOTAL
Vemos DOR como algo TOTAL, ou seja, DOR TOTAL.
Mais do que isso, hoje se fala em sofrimento total. Como
exemplo, o sintoma de dispneia pode ter uma relação
grande com o medo, ansiedade e não necessariamen-
te com uma questão física respiratória do paciente.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 149


DEFINIÇÃO
Dispneia: também chamada de falta de ar, é um sintoma no
qual a pessoa tem desconforto para respirar, normalmente com
a sensação de respiração incompleta.

Conheça agora alguns indicadores deste estágio:


• Dor e câncer: 70% dos pacientes sofrem de dor;
• Doença avançada: 75% sentem dor e 25% morrem com dor
severa;
• Dor e câncer terminal: a dor é apenas um dos sintomas; habi-
tualmente, esses pacientes apresentam três sintomas preva-
lentes, que aumentam com a evolução da doença.

CHEGOU A HORA DE FALAR


SOBRE FUTILIDADE TERAPÊUTICA

150
Nessa etapa, as condutas indicadas devem ser bem pondera-
das, evitando assim a Futilidade Terapêutica. É a hora de enxugar
a prescrição de medicamentos, deixando os que de fato tiverem
relevância para o controle dos sintomas. E é nessa etapa que a
equipe precisa estar bem alinhada, pois a família pode questio-
nar a suspensão de alguns medicamentos que o paciente toma-
va em todo o curso do tratamento. A equipe deve explicar que o
tratamento no final de vida deve ser proporcional à necessidade
do doente. No Brasil, apesar do crescimento notável dos cuida-
dos paliativos, ainda existe muita resistência, e os pacientes são
encaminhados muito tardiamente para as equipes de cuidados
paliativos. E, no momento inicial, é importante assegurar para to-
dos da família que nenhum procedimento que traga benefícios
ao doente será suspenso. É o momento em que o princípio da
proporcionalidade deve ser aplicado.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 151


Nessa fase, não pode existir
pressa, mas também não
há tempo para banalidades.

A fase final de vida é um momento muito intenso para todos os


envolvidos. Nessa fase, não pode existir pressa, mas também não
há tempo para banalidades. O foco deve estar direcionado para
os sintomas físicos, psicossociais e espirituais. Os sintomas físicos,
através de uma prescrição proporcional e muito bem apurada. Já
os sofrimentos psicossociais e espirituais precisam ser identifica-
dos e cuidados por toda a equipe multidisciplinar. A família e o
paciente vivenciam provavelmente um dos momentos mais difí-
ceis de toda a vida. Uma pessoa muito amada se despede, a vida
está prestes a se findar. A família vive essa despedida e esse luto
antecipatório com muito sofrimento. E o paciente vive um pesar
pela despedida da sua própria vida e de tudo que faz parte dela.

152
É imprescindível a atenção:
• na espiritualidade;
• no sofrimento existencial;
• no luto da família.

O que se espera é uma morte digna, com o mínimo de sofrimen-


to possível, mas essa não é uma tarefa simples.

ESPIRITUALIDADE

As crenças espirituais, independentemente da religiosidade, re-


presentam uma importante fonte de apoio para o paciente e sua
família na fase final da vida. É importante dar espaço para expres-
sarem sua espiritualidade. Crer em algo que leve à reflexão sobre o
sentido da vida e o sentido da morte pode ajudar. E, na medida do
possível e do cabível, buscar uma assistência para essa esfera.

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 153


Como encarar o paciente
que se despede da vida?
Profa. Ana Lúcia Lopes Giaponesi

Quando o paciente está no final da vida, temos que fi-


car muito atentos, porque existem inúmeros casos em
que o paciente entra em um sofrimento espiritual. Ele
sabe que está chegando o fim da sua vida e deixar sua existência
acarreta em um desespero de alma muito intenso. Às vezes, não
existe remédio que faça ele melhorar. Tem o caso de uma senhora
que estava bem no final da vida. Horas antes de falecer, a pacien-
te gritava dizendo que tinha muita culpa, que sentia dor e nós
não conseguíamos identificar a causa. Quando a gente realmen-
te conseguiu identificar
que se tratava da esfe-
ra espiritual, resolvemos
trazer um padre para
ela, que a abençoou,
deu a extrema-unção
e ela realmente par-
tiu em paz.”

154
LUTO

O luto começa com o anúncio do diagnóstico de uma doença


ameaçadora da vida, com todas as suas perdas sequências e sofri-
mentos. Uma boa assistência em todas as etapas da doença favo-
rece o processo de luto sem complicações.
Mas perder alguém é sempre muito sofrido e a assistência ao
luto ajuda a pessoa a ressignificar sua vida sem o ente querido. Vale
ressaltar que a família não fracassou, que ela não tem culpa e na
medida do possível encorajá-la a participar ativamente no proces-
so de cuidados na fase final de seu ente querido.

O que falar para o familiar nesse momento em que está pres-


tes a perder alguém que ama?

ONCO ENSINO CUIDADOS PALIATIVOS 155


Mais do que ter receitas, fórmulas e frase prontas, o profissional
precisa saber ouvir. Foi tema da aula de comunicação. O que é
inadmissível é o profissional não legitimar o sofrimento e respon-
der às demandas com determinadas frases:
• “Não chora, esse sofrimento uma hora acaba”; ou
• “Todos nós vamos morrer um dia”.

Essas frases parecem ter um tom mais distante, artificial. O que


o paciente e a família precisam é de alguém que, de fato, mesmo
sem saber o que dizer, assegure os cuidados e a sua presença, este-
ja junto do paciente e da família até o final dessa trajetória.

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PALAVRAS FINAIS DA PROFA. DÉBORA G. COSTA

O final de vida é uma fase muito delicada. Uma fala ina-


propriada, uma atitude inadequada podem gerar uma
complicação do luto. Isso fica registrado na memória
da família. É um momento da presença acolhedora
e silenciosa e da assertividade nas condutas. Ima-
ginem: alguém que você ama está se despedindo da
vida, ficará forte na memória. Cabe à equipe fazer com
que essa memória seja a mais amena e serena possível.

Para saber mais

ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).

Manual de Cuidados Paliativos. São Paulo, 2a ed. Ed Sulina, 2012.

TWYCROSS R, Wilcock A. Thorp S. Palliative Care Formulary PCF4.

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Realização Apoio Educacional

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