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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA BAHIA – UESB

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA – DH

ALEXANDRINA MENDES SANTANA

RESIDÊNCIA, RESISTÊNCIA – QUATRO ANOS DE LUTA PELA IMPLANTAÇÃO DE


UMA POLÍTICA DE PERMANÊNCIA ESTUDANTIL UNIVERSITÁRIA NA UESB-
CAMPUS VITÓRIA DA CONQUISTA - 2004-2008.

Vitoria Da Conquista
2013
ALEXANDRINA MENDES SANTANA

RESIDÊNCIA, RESISTÊNCIA – QUATRO ANOS DE LUTA PELA IMPLANTAÇÃO


DE UMA POLITICA DE PERMANÊNCIA ESTUDANTIL UNIVERSITÁRIA NA
UESB - CAMPUS VITÓRIA DA CONQUISTA- 2004-2008.

Monografia apresentada como requisito para a


conclusão do curso de licenciatura em História
da Universidade Estadual do Sudoeste da
Bahia.

Orientador: Profº. Carlos Alberto Pereira Silva

Vitoria Da Conquista
2013
“Quem passou a vida em brancas nuvens
E em plácido repouso adormeceu,
Quem não sentiu o frio da desgraça,
Quem passou pela vida e não sofreu
Foi espectro de homem, não foi homem,
Só passou pela vida, não viveu.”

Francisco Octaviano
RESUMO

No ano de 2004, formando um coletivo autodenominado MRA - Movimento Rompendo


Amarras, discentes de diversos cursos tomaram um prédio inacabado (atual sede da TV E
Rádio Uesb) como ocupação que duraria por 4 anos, servindo também como moradia. A
ocupação/residência serviria como fonte de pressão frente à administração da Universidade
para a conclusão do restaurante universitário, a construção da residência universitária bem
como um mecanismo propulsor onde o movimento estudantil pôde pautar, a implantação de
uma política de permanência estudantil na UESB. Por meio de outras denominações de
coletivos como o MRL – Movimento Resistência e Luta e duas gestões do DCE - Diretório
Central dos Estudantes (Gestões: Declare Guerra e DCE em Movimento) foi dada
continuidade a essa ação que culminou na entrega de um R.U gerido pela iniciativa privada e
da residência universitária, atualmente ainda com 1/3 da obra que fora entregue em 2008.

Palavras-chave: UESB, Movimento estudantil, Residência Universitária

ABSTRACT

In the year of 2004, forming a collective auto-called MRA - Movimento Rompendo Amarras
(Movement Breaking Ropes) students of several courses took an unfinished building (current
headquarter of the TV and Radio UESB) as occupation that would last for 4 years, which
served also like dwelling. The occupation/residence would serve like source of pressure in
front of the administration of the University for the conclusion of the university restaurant, the
construction of the students residence/dorms as well as a driving force where the student
movement could rule, the introduction of a permanent student representation in the UESB.
Through other denominations of collective such as the MRL - Movimento Resistencia e Luta
(Resistance and Fight Movement) and two managements of the DCE - Diretorio Central dos
Estudantes (Central Directory of the Students) (managements: Declare War and DCE in
movement) there was still given continuity to this action that culminated in the delivery of the
R.U. managed by the private enterprise and the University residence, at present with 1/3 of
the work that had been handed in 2008.
Key-words: UESB, Student Movement, Student residence.
AGRADECIMENTOS

Agradeço em primeiro lugar a Aquele do qual eu extrai meu ser físico e espiritual, que
é Imenso, - não somente em tamanho, mas também em uma Imensidão de Força e de
Vontade. O Tudo espiritual/invisível/visível/imaginado. Esses termos para definir o que as
demais pessoas chamam de Deus. Eternamente grata. Nada a pedir, obtenho perfeição em
minha vida. Compadeço-me com o infortúnio alheio, mas não sofro. Tenho ao meu redor
muito amor. Tenho a minha adorada mãe, minha preta maravilhosa, minha mamãezinha, que
tanto me auxilia nessa caminhada, minha aliada em tudo. Nada do que eu faça será
suficientemente necessário pra expressar minha gratidão por ela. Agradecer a minha pequena,
que mesmo me tirando do sério, nas vezes que precisei de silencio, de ficar quieta nos meus
papeis, ela me tirava da tela, pedia colinho e queria dançar. Por ela e para ela eu vivo. A
minha irmã que me traz tanta alegria. Batizou seu primeiro filho com o nome do filho que eu
sempre quis ter, a meu pedido: Alecsander. Depois, em suas homenagens na capa do convite
de formatura me escreve: “a minha adorada irmã...”. Mãe Cida: tudo que sou tem uma parte
de você. Quando com Juju me banho lembro-me de nós duas nos banhando. Minha melhor
amiga. Minhas 3 melhores amigas. Fazemos parte uma da outra. À mãezinha dona Valqui,
pela convivência e conversas... Pelas canções que me trouxe. Aliás, eu, ela, e minha mãe,
somos como um coro quando cantamos. Alegra-me sempre quando fazemos isso.
Aos meus queridos irmãos José, Jairo, Jackson e Pedro. Sei que o amor de vocês chega
a mim e me guarda, ainda que a distância. Ao meu querido pai (in memorian), que se faz
presente em todos os momentos em meu coração, principalmente quando tenho contato com
um de vocês.
A todos os colegas que estiveram comigo nesses caminhos uesbianos. Nesses
corredores, no Teatro Glauber Rocha, nos filmes e eventos, na biblioteca, em cada sala de
aula que passei; nos campos da vasta área da Uesb, no bosque de pinheiros, na floresta
vermelha, nos urucuns...na laje do modulo I, na quadra, no Ca de história/comunicação, no Ca
de direito, geografia etc..no pontinho de seu Zé, em dona Dalva, em seu Luiz, no DCE, no
Banquinho da Paz...todos meus irmãos. Muito, muito grata. Os de desde o inicio Fabão,
Goma, João, Day, bem como Glauber, Naira, Aladim, Big Raidem, Babá, Uelber, Gildart,
Jacques, Jeferson, Rildão, Bruno (Busslighteyer), Tenório, Dayse Maria, Morgana, Alberto
Marlon, Mário, Taís, Isis, Diu,Tinho, Dani Preta, Felipão, Felipe Magú, Leo Aleixo, Bruno e
Milton Leituga. Dani (presidenta da AFB) Dedé (Adeildson). O povo das bandas que tocavam
nas festas...agradeço pelas vezes que pude estar com vocês, dos longos diálogos , de tudo
enfim. Depois de outras grandes mentes como Lilica e Driu, Edilene, Edilando Ferraz...
Clarinha, Gabrielzão, o índio Matheus, Vinicius, mestre Engels, Victor irmão de Glauber,
Aquiles e Marquinhos, Xandó, o ruivo Cris, Gabriel Preto, Jhon, Arthur. Toda a galera que
passou por coisas da Uesb, para além sala de aula. Os que viveram a Uesb. Monique Fiducha,
Nau, o mestre Toni, Rafael Trindade, Kito, Gui, Bia, Luiza a galera da greve de 2011, do
mobiliza uesb.
Aos que conviveram comigo de outros semestres que peguei matéria junto. Tia Karine, Raul,
Jura, Dani, Luan, Rosival, Gustavo, Vaninha, Alex, Binho, Amine, Clarinha, Jessica, Analis.
Aos colegas que contribuíram com os depoimentos contidos neste trabalho; Juliano, Luciana,
Isaac, Uelber, Glauber, Rogério, Leandro (Téo), Lino, Alan, Morgana e Tenório. A este
ultimo, principalmente. Explorei bastante desse cara. De suas memórias e vivencias da
residência. A todos que pararam um tempo de seus afazeres para contribuírem. Aos vários
colegas que participaram ativamente da ocupação e que apesar de não terem expressado em
escrita, me foram úteis em diálogos e partilhas. Ou simplesmente ao sinalizarem
positivamente quanto minha escolha de estudo. Muito obrigada.
Aos minhas grandes amigas Tatiane, Neidinha, Eliana, Deusa, Patrícia, Amanda,
Carol, Clarinha, Luzimare, Claudinha, Sandra, Suely, dona Marlene, Nardi, tia Rose, Rebeca,
Veu, Bete a shotyo Gilza, enfim toda irmandade da Mahikari. Aos meninos também Marton,
Ferd, Bruno, Tinho, Zenilson, seu Wilson (2), João Felipe, Paulo Roberto, seu Dário, Fabão,
Roney.
Aos caianinhos que vêm me guiando, me fazendo aos poucos um deles. Mestre Robson, todos
conselheiros e conselheiras, aos demais irmãos. LPA. Muita gratidão.
As minhas grandes e eternas amigas de sempre: Yara, Manu, Day, Juli, Lyu, Lívalivanea,
Danielesma. Mari Melo, Martinha. À minha comadre Cabeça, Érica Daniela. Aos meus
grandes irmãos Juninho Brow, Tadeu Cajado. Aos meus grandes amigos Eduardo Falcão,
Fábio Cairo e Matheus Augusto. Meu compadre Massumi sempre comigo, pra onde for. Pela
música que banhou minha vida em muito tempo de minha graduação me trazendo leveza e
alegria. Ao professor Gilsérgio Botelho, pelos ensinos teatrais que são bem importantes para a
vida em todos os sentidos. A toda compahia Operakata. Minha eterna gratidão.
Aos meus professores acadêmicos, todos, que de uma forma amorosa ou raivosa, me
ensinaram alguma coisa. Agradeço muito ao Prof. Alexandre por mais que já tenha sentido
algo diferente de admiração, num grande período de tempo me foi considerado. Agradeço-lhe
pelos auxílios do inicio do curso professor. Perdão pelos momentos de fúria e
extrapolamentos de emoções. A luta certas vezes nos inflama o juízo. Aos professores Roque
Felipe, Iracema, Márcio, Ruddy, Gal, Binho, Cida, Belão, Grayce, Cleidinha, Rita, Humberto,
Nivaldo, Adilson (Diu), Tadas (Tadeu Botelho), Chico. Aos professores dos outros cursos
que, pelo contato e aulas públicas que tínhamos permissão de ter nos atos, reuniões etc., me
trouxeram conhecimento e convivência: prof. Reginaldo, Itamar, Susane, Ruy Medeiros,
Ferdinand, João Diógenes, Jânio Santos. E para concluir a lista docente, meu orientador Cacá.
Que tanto discuti, enrolei e perturbei. Demorei a entender seu caminho, mas com muita peleja
o compreendi. Agradeço-lhe e peço desculpas por minha insuficiência. Alegro-me com o
resultado deste trabalho. Foi o que deveria ser.
Enfim, um dia achei engraçado ler isso numa dedicatória de convite de formatura, mas
acho que cabe também dizer. Agradeço a mim mesma, por ter conseguido mais uma etapa.
Vivo! Minha vida é só agradecimento.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO............................................................................................................................
O DESASSOSSEGO ANTE AS NECESSIDADES .........................................................................
OS PRIMÓRDIOS DA LUTA ESTUDANTIL NA UESB..........................................................
ESTUDANTE: O MODIFICADOR DO LUGAR QUE PERTENCE.........................................
RESISTÊNCIA - O PODER DO MAIS FRACO.........................................................................
Movimento Rompendo Amarras e a Gestão Declare Guerra -2004....................................
Movimento Resistência e Luta e a Gestão DCE em Movimento -2007..............................
CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................................
ANEXOS......................................................................................................................................
Questionario para a pesquisa........................................................................................................
Entrevistas escritas........................................................................................................................
Fotos e Notas.................................................................................................................................
REFERÊNCIAS............................................................................................................................
INTRODUÇÃO

É perceptível a característica estudantil para a reivindicação, talvez pelo característico


desassossego e destemor, até que o molde que possivelmente lhe será imposto no galgar dos
anos o torne um ser humano “normal”. O estudante crê que a mudança é possível pela
experiência vivenciada na militância no seio da universidade. As atuações do corpo discente
refletem no andamento da universidade em seus aspectos gerais, principalmente no que tange
as formas e reformas físicas e restritas ao universo acadêmico. Ainda que seja comum tais
ações serem tratadas como imediatistas, simplificadas em lutas reformistas, de maneira geral
o pensamento das aglomerações e discussões estudantis entende que todo este microcosmo é
afetado por algo muito além de seus muros.
Este trabalho tratará das aquisições/alcances das lutas estudantis no âmbito
acadêmico, as quais não se restringem às obtenções dos espaços de direito. Estes também
adquiridos por intermédio de outras lutas tantas. Lutas essas empreendidas desde as de
defesas nacionais às de cunho social, moral e ético. Para analisar a atuação das manifestações
realizadas na luta estudantil, será utilizado o conceito de desobediência civil, aplicado por
Henry David Thoreau, pensador estadunidense que por meio dele próprio, utilizou seu
argumento acerca da legitimidade de atos que poderiam até ser ilegais, mas que -
empreendidos de forma a levar a um bem comum - deveriam ser realizados apesar das
consequências.
A história oral vem a se tornar uma importante ferramenta para analisar as atuações
das aglomerações e sendo assim convertem-se em material “palpável”, desprovido da
distância e métodos defendidos pela historiografia positivista. Assim o fazer histórico surge
com novas abordagens e contribui para ampliar o entendimento de fatos que possuem na
oralidade uma ferramenta de complemento e até mesmo de comparação, ante os documentos
escritos. As fontes utilizadas no estudo foram depoimentos, por escrito ou
gravados/transcritos dos participantes do processo. Além desses relatos, fotos, vídeos,
panfletos, notas, jornais e publicações da internet.
Será apresentado no segundo capítulo o estudo de caso que refletirá sobre a ação de
ocupação de um prédio público, ocorrida no interior do estado da Bahia. O movimento
autodenominado MRA (Movimento Rompendo Amarras) - inicialmente em prol do
restaurante universitário - no decorrer do processo, gestou novas demandas que apontaram
para a necessidade de uma residência universitária, bem como da implantação de uma política
de permanência estudantil na Uesb - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, campus
Vitória da Conquista. Desde os primeiros atos em prol do R.U às reuniões e enfrentamentos
no decorrer dos quatro anos, até culminar na entrega de 1/3 da obra projetada para a
residência. Este período que está inserido no marco temporal de 2004-2008.
O DESASSOSSEGO ANTE AS NECESSIDADES

Por que estudante não é só para estudar? O que significa esse tão bradado grito vindo
de vozes roucas e ávidas por justiça pelos corredores? Num momento de crise se aglomeram
alguns jovens “sabedores” e reivindicadores por fazer-se cumprir as ânsias de um bem
comum. Porque em movimento, junto aos camaradas, companheiros, malungos, amiguinhos,
coleguinhas, irmãos, brothers, os cabeças, enfim, como se chamarem, os grupos; homens e
mulheres neste período de fervilhamento constante da vida sentem um algo diferente que foge
ao simples ideal de acumular.
Parece que este lugar o converte (o estudante) no ser humano ideal, que se pretende
capaz de enxergar o seu entorno para além do que lhe é apresentado. E no emaranhado de
utilidades e tarefas que este estudante começa a vivenciar na militância, ele passa a vislumbrar
uma realidade onde as pessoas acreditam que as leis devem ser cumpridas. Que é inadmissível
passar como que “em brancas nuvens" em um ambiente no qual o descaso é impetrado às
claras - seja por parte de quaisquer tipos de governos os quais estejam subordinados, desde o
do reitor ao dos líderes políticos municipais, estaduais, nacionais, internacionais. As pessoas
sabem e é como se nada acontecesse ou é encarado com normalidade. Afinal tornou-se lugar
comum pensar que “as pessoas roubam”, e que “se estivesse no lugar dele, desviaria dinheiro
pra seu uso também.” Esse sentimento de ganância inerente atribuído aos seres humanos daria
ao líder a permissão de ignorar as necessidades da instituição a qual gere? Por parte desses
líderes institucionais o ato de ocupar um espaço - de se despir em público, de escrever
mensagens num muro, de fazer casas de sucata em locais inapropriados – se configura crime.
Porém a quem ofende? Afinal de contas, é isso violência? Parede pode ser novamente pintada
e não são em vão os escritos sobrepostos nos muros de uma ocupação. Servem como uma
mensagem, ato realizado na perspectiva de se fazer ouvido, mesmo que depois seja visto
como pichação e seja apagado. Em algumas ocasiões são até transformados em arte
contemporânea ou patrimônio econômico/turístico/cultural (depois de classificados como
pichação pelas autoridades), como os escritos do profeta Gentileza no Rio de Janeiro:

“Apagaram tudo, pintaram tudo de cinza. A palavra no muro


ficou coberta de tinta [...] Nós que passamos apressados pelas
ruas da cidade, merecemos ver as letras e as palavras de
Gentileza [...] Só ficou no muro, tristeza e tinta fresca.”

(MONTE, 1990.)
As infrações nesse sentido partem do princípio que estão sendo investidas em defesa
de algo ou como forma de alerta. Em alguns casos, por pedidos que foram simplesmente
ignorados, cujas resoluções sempre são postergadas e cujos resultados implicam em atos mais
visíveis de forma que cheguem à opinião púbica, pressionando as autoridades às devidas
providências. Pois bem, para além de crime, a desobediência civil é um conceito que,

“[...] constitui uma forma legítima de participação direta do


cidadão no exercício do poder quando os processos
institucionais se mostram insuficientes. Desse modo, pode ser
reconhecida como direito fundamental, porquanto de acordo
com regime democrático fundamentado na cidadania (Art. 1º, II,
da Constituição Federal).”
(PAULIN, 2011.)
O ato de desobediência civil, ainda que não tenha uma “previsão expressa sobre o
direito de resistência no ordenamento jurídico brasileiro, a Constituição Federal permite o
reconhecimento de direitos e garantias decorrentes do regime por ela adotados, nos termos do
Art. 5º, § 2º.” (PAULIN, 2011.p: 5). Sendo assim, “apesar da Constituição Federal
promulgada em 1988 não reconhecer expressamente o direito de resistência à opressão, tal
direito, manifestado através da desobediência civil, constitui uma forma legítima de
participação direta do cidadão no exercício do poder .” (PAULIN, 2011.p: 6).

O conceito de Desobediência civil foi desenvolvido pelo pensador americano Henry


D. Thoreau e versa plenamente sobre as reações de um individuo ou de um grupo, que
apresente algum tipo de manifestação “ilegal” não violenta. Este tipo de ação é válida na luta
por uma melhoria, ainda que este/estes indivíduos tenham momentaneamente ou
permanentemente suas vidas fora do convívio que contribua para o status quo. Em alguns
casos são mortos e torturados, noutros presos, processados ou vítimas de intimidações morais,
seletivas e excludentes. O autor/autores de tais atos terríveis como os de escrever em paredes,
invade um espaço abandonado para chamar atenção das lideranças e da população em geral
acerca de uma demanda e por seu turno são taxados pejorativamente como pessoas que,

“Não têm o que fazer, é um bando de desocupados querendo


ibope. O movimento estudantil só tem playboy drogado,
pseudofilósofos e aspirantes à carreira política, hipnotizados por
Che Guevara e que devia era tomar conta da sua vida e concluir
seu curso logo. Isso tudo é perda de tempo”. (L.P.O, 2013.)
Esse é o pensamento comumente expressado por uma boa parte de estudantes que
limitam a visão do estudante/militante nesse sentido. Mas há que se ter em mente que tão só
com a mobilização é que podem ser mudadas as posturas das lideranças ante as solicitações.
As ações de desprezo com que essas solicitações são tratadas conseguem ser, em alguma
medida, modificadas quando o assunto em questão chega ao público massivamente. Essa é a
importância da difusão nos meios de comunicação, pois ainda que cheguem de maneira
deturpada, as imagens e as intenções podem ser mais abertamente avaliadas. Resta saber qual
é a altura do alpendre de quem as avista. Pois colocar-se voluntariamente no fazer cumprir ou
descumprir leis por direitos, traz consigo questões, como o autor do conceito de desobediência
civil coloca,

“Deve o cidadão desistir de sua consciência, mesmo por um


único instante ou em última instância, e se dobrar ao legislador?
Por que então estará cada pessoa dotada de uma consciência? Na
minha opinião, devemos ser em primeiro lugar homens, e só
então súditos. Não é desejável cultivar o respeito às leis no
mesmo nível do respeito aos direitos. A única obrigação que
tenho direito de assumir é fazer a qualquer momento aquilo que
julgo certo”. (THOREAU, 1949).

Para enxergá-las (as imagens e ações) devidamente, este individuo necessita possuir o
mínimo de empatia para com a realidade alheia ou sua própria. Alguns nos agrupamentos, ou
mesmo fora deles. Thoueau absteve-se de pagar seus impostos ao Governo dos EUA e por
esta razão foi preso. Passado um dia na prisão, após ter tido sua divida paga por um vizinho a
sua revelia, retornou ao convívio social indignado com a obrigatória contribuição, que no seu
entendimento, serviria de investimento na guerra contra o México, ocorrida entre os anos de
1846 e 1848. Dessa forma em seus escritos ele traz a defesa da legitimidade de tais atos de
desobediência, de forma que prevalecesse o que julgava sensato perante ele próprio e outrem.

Os movimentos sociais, sendo o movimento estudantil um deles, dentre diversos tipos


de atuações, tem se utilizado destes instrumentos de não violência, no decorrer da historia de
suas lutas, principalmente relacionados a fechamentos de vias públicas ou ocupações. São
estratégias que

“[...] atualmente, as legislações aprimoram as medidas de


repressão e criminalizam os movimentos insurrecionais,
endurecendo a legislação penal. Há uma tendência de ampliar o
conceito jurídico de violência para além dos atos violentos
concretos, a fim de englobar formas não convencionais de
formação da vontade política, como a resistência à opressão e a
desobediência civil.”

(PAULIN,2011)

Um indivíduo - que tem sua vida norteada pela realidade onde o que é possível ser
construído para seu sustento advém de seu ingresso no ensino superior - prossegue dando
continuidade a seu calvário nessa aquisição, onde perdura uma realidade em que sua condição
de classe o impulsiona numa busca muitas vezes frustrada, no decorrer da graduação. Se
assim não vive, tem notícia de algum colega que desistiu do curso, pois não tinha como se
manter na cidade. Potenciais profissionais que num dado momento, a situação aperta tanto
que ou luta ou desiste. Então ele - ou quem se compadeça da situação - entende que a vida
deveria ser plena e boa para todas as pessoas, mesmo que essas todas sejam reduzidas ao seu
entorno. Nesse caso, a luta para a obtenção do subsidio para a manutenção e permanência
deste cidadão, de forma que este possua o direito constitucional à educação garantido.

Ainda que em alguns casos a apropriação da atuação junto ao movimento estudantil


parte de impulsos provocados por fatores outros, “práticos”, digamos assim - como uma carga
horária a mais no currículo, como trampolim político e/ou por estar na moda - um interesse
outro qualquer difere o estudante/militante. Isso ocorre com mais força, quando ainda não
foram tomadas suas 24 horas de vida contínua. Quando jovens desprovidos de temor, tomados
de audácia e força, desprendidos das obrigações familiares e profissionais, fazem-se cordões
nos gritos por Justiça. Daí aos anos e aos compromissos se multa. Despe-se da veste
revolucionária por achá-la imprópria para seu uso empregatício. Em suas vozes pacificadoras
não cabem mais os gritos, aquele desejo que o “ideal”, o seu ideal ou o ideal do coletivo ao
qual esteja inserido seja entendido, compreendido e defendido com a mesma veemência pelos
que estão ao seu redor. Porém, ainda que refluxos ocorram, o movimento estudantil responde
ao movimentar social. E este individuo que se prestou ao oficio de alardear, mesmo que não
mais nos mesmos palcos, atuará de forma diferenciada frente as injustiças visíveis pois,

“Naturalmente, ocorrem modificações na gradação que o


universitário imprime, depois de formado, às suas atitudes
diante da vida. [...] (mas como) a Universidade é, no Brasil, a
maior escola de formação de líderes políticos, centro onde se
moldam as consciências e mentalidades com respeito aos
problemas que assoberbam o nosso País; e que a maior parte dos
homens nela formados carregam, vida afora, as posições,
idiossincrasias, estigmas e pontos de vista políticos nela
adquiridos.” (POERNER, 1968:33).
Não é possível ser ignorada a presença forte de estudantes que militaram e hoje se
configuram como persona política pública. Artur José Poerner, em o Poder Jovem, obra de
um estudante/militante lançada em 1968 e reeditada em 1979 é uma compilação que aborda;

“[...] uma história do movimento estudantil brasileiro, na qual é


explicitado o papel importante e muitas vezes decisivo que
desempenhou ao longo da historia do Brasil, fruto de pesquisa
ampla em arquivos de jornais, folhetos, revistas, desde o Brasil
Colônia ao Império, da abolição da escravatura à fundação da
UNE e seus mais recentes desdobramentos, e junto aos próprios
participantes.”

(Contra Capa da 2ª Edição, 1979).

Dessa forma, as abordagens acerca das atuações estudantis e suas formas de poder,
exercidas no decorrer da história, possuem esses instrumentos de registro. Deve ser dito que a
bibliografia sobre a atuação estudantil nacional é reduzida, visto que a realização de pesquisas
e publicações de trabalhos nesse sentido foram ignoradas, proibidas e/ou deturpadas,
principalmente durante os tempos de repressão.

Quanto à capacidade de um estudante/militante ser o propulsor de feitos tantos na


historia? É inexplicável, mas esse grito, o desejo e a emoção explodem sobremaneira na
composição dos saberes, nesse tempo onde os ideais são mais veementemente defendidos e
expostos. Abraçar-se, amar-se e odiar-se assim tão escancaradamente é só nesse tempo.
Parece que de fato ela – a idade - chega para todos. Mas não é do tempo cronológico
especificamente que se trata. Talvez pode se tratar do ser estudante. Mas também não se
restringe a isso. Alguns aquisidores de conhecimento alheio não saem de seus lugares ali,
engolindo o que lhes regurgitam. Entram e saem dos ambientes sem nada afetar ou por nada
ser afetado.

Viver a experiência de fazer parte de uma passeata, de um ato, de ficar horas


debatendo e buscando a melhor saída para a melhoria de um coletivo. Nisso se entende; ler,
partilhar, silenciar, amar e sentir raiva, gritar e ouvir. Gargalhar e chorar; aprender. Tudo o
que interessa e que não serve para nada (isso depende do campo de visão e percepção). Em
grupo, juntos por algo em prol do coletivo, não somente como nas salas de aula, onde o
estudante se torna cada vez mais o que o mercado manda: uma máquina produtora de
certificado, puro assimilador de conteúdo.
O movimento estudantil não se configuraria como movimento social classista, já que o
individuo dele pertencente pode transitar entre ricos e pobres (principalmente), homens e
mulheres, gays, héteros e bis, negros, brancos, índios e qualquer cor, das mais variadas
religiões ou de nenhuma, sendo impossível classificá-lo numa categoria, enquanto classe
social. Ademais, a sua atividade como jovem estudante deve ser transitória, fato que é
lembrado sempre ao que ultrapassa o “limite” de anos na graduação. Talvez isso justifique o
quanto a vanglorização da rapidez com que um indivíduo conclui sua formação, tem sido tão
ostentada. Ou pode também ser vista nos cursos cada vez mais rápidos que aparecem em cada
esquina. Mas ele - o movimento estudantil- é um órgão, não no sentido institucional, mas
como um organismo biológico, fundamental para as transformações e transmutações tanto da
parte física da instituição como do seu funcionamento orgânico. Sendo assim a análise das
movimentações estudantis se torna complexa visto que,
“Analisar o movimento estudantil é antes de tudo, analisar um
movimento plural, capaz de se expressar através de vários
grupos que se potencializam no cotidiano da condição
estudantil. Poderíamos afirmar que este não se limita a suas
organizações estudantis e formais, mas se manifesta na própria
dinâmica de criação de interesses e pautas que – transformadas
diariamente pela realidade estudantil, pelas relações
universitárias e pela sociedade civil – pode ser capaz de
mobilizar os estudantes.[...] Nesta pluralidade existente, o
movimento agrega um número infinito de tribos e grupos em seu
interior, desde aqueles que se manifestam através de tendências
orgânicas – geralmente ligados a um partido político –, até
aqueles que expressam interesses temáticos e mais localizados –
como o grupo de estudantes negros e as Executivas de Curso,
por exemplo. Existem ainda aqueles que apesar (sic) terem uma
organização de grupo, não possuem vínculos partidários. É o
caso dos independentes e dos anarquistas.”

(MESQUITA,2003).

Sendo célula deste órgão, o estudante entende que em conjunto o que deve
ser/acontecer precisa ser conseguido (ainda que os “donos” sempre estejam tentando restringir
as benesses para si) para o desfrute comum, grupal. Ele atua onde o seu raio de influência
possui condições de mutação, sempre buscando o melhor do/para o grupo. Esta característica
se dá até o momento em que esse indivíduo não se convirja a massa de iludidos “donos”, que
cresce a cada centésimo de segundo, a partir do momento em que ele deseja o poder. Isso o
capitalismo e suas ferramentas de continuidade são experts em fazer suscitar.
Mas àqueles que juntos para além das entorpecências confabulam, sonham e creem
nesse “alcançar algo” marcam-se historicamente, ainda que no anonimato. Este é o espírito
que configura os que tentam, os que trazem em si a visão que algo pode ser feito, que é
sufocante viver aceitando, que é deprimente o sofrer de tantos à custa do luxo e do descaso de
outros, que acreditam em um ideal que deveria ser a convivência humana. A plena satisfação
das necessidades humanas (que estão sendo possibilitadas pelo desenvolvimento tecnológico)
a todas as pessoas.
Atribuindo ao egoísmo e a fabricação, reprodução e perpetuação dele a razão pela qual
a configuração estrutural das sociedades encontra-se nessa “ordem” é que a humanidade cria,
desenvolve, distribuí e consome utensílios e suas “necessidades” vão sendo propagadas em
tudo o que pode ser visto/sentido por alguém que tem a permissão de enxergar/sentir. Ainda
que em algumas localidades o merchan não tenha lá tanto êxito; ou pelo desejo do uso das
coisas ser maior ou menor, ou se estas são úteis de fato para as pessoas daquele local e/ou
ainda, se estas pessoas possuem o poder aquisitivo para obtenção destas coisas. O impulsionar
da sociedade telecomandada pelas mídias, as tendências do mercado consumidor, padrões
esses difundidos e estimulados pela família, sociedade, escola enfim, trazem consigo essa
amarra de ter, de possuir um “bem” ou “bens”. Mesmo as “ciências” relacionadas à atualidade
reproduzem e reforçam a ideia de consumo e das “necessidades” humanas, onde essas são
infinitas.
“o objetivo da Economia é melhorar a qualidade de vida do ser
humano utilizando da melhor maneira possível os recursos, uma
vez que os recursos presentes no mundo são de características
escassa e as necessidades humanas ilimitadas ou infinitas.”
(grifo meu)
(FATEC, 2012)
Afinal, a quem serve as guerras, as corridas armamentistas, a luta por acúmulo se não
a tão importante economia de mercado? Não é possível negar que ideologias também; as
“verdades” que devem ser levadas aos que são desprovidos delas; as religiosas, as de
costumes e moral, as políticas. Estas também são motivações para a difusão de lutas, tanto em
defesa como em rechaço. E os atores estudantis se fazem presentes na história em ambos os
lados, como está expresso na revista comemorativa dos 60 anos da União Nacional dos
Estudantes do Brasil, 1997. Nesta revista obtêm-se as atuações estudantis a partir da
institucionalização unificada nacionalmente em 1937. Nessas ações estão descritas as
campanhas da entidade, “pela declaração de guerra às potências nazi-fascistas”, que fora
adotada em ocasião da 2ª Guerra pelo presidente Getúlio Vargas. A campanha O Petróleo é
Nosso, lançada posteriormente ao final da Segunda Grande Guerra, traz os diversos contextos
que a atuação estudantil transita.
“O nacionalismo e o interesse pelo país estavam em alta,
naquela época. Era logo depois da guerra e havia, também uma
preocupação com a redemocratização...tinha toda aquela euforia
da participação do Brasil na guerra e, também, a crença de que
este era um pais que iria para frente. Agora eu realmente nunca
vi, daquela época pra cá, uma campanha igual aquela.[...]muito
maior que o impeachment de Collor.”
(FREJAT, 1997.p.32)
Este exemplo sugere que a atuação institucional das movimentações estudantis,
unificando pautas de lutas nacionais ou locais, traz consigo o sublinhar que é visível nas
atuações como um todo. E o histórico de um órgão como a União Nacional dos Estudantes
faz-se necessário para perceber o quanto essas atuações coletivas funcionam, ora em conjunto
ao corpo de cidadãos (quando de interesse nacional/local) ora subjulgadas pela mesma
sociedade. As descrições existentes abordam os diversos cenários os quais as atuações
estudantis permearam. Uma vez seguindo o status quo, bem quisto. Fomentando inquietações
que influíssem no desagrado ao governo (poder), na ilegalidade. Exemplo disso foi o período
em que a entidade teve sua sede nacional incendiada e suas assembleias suspensas, nos duros
anos da dita Dura de 64 (Revista UNE, 1997).
Ainda que pulverizada em grupos ultimamente, esses conflitos vão se tornando uma
massa homogênea de reivindicações e reivindicações, em cada momento da historia, de
acordo as necessidades dos grupos. Os grupos reivindicatórios em geral possuem a
característica, ainda que romantizada, de melhoramento para um coletivo. Estes agrupamentos
conseguem vislumbrar para além de suas necessidades e desejos pessoais, onde dedicados
tempo para ver, ler, pensar, debater e saber dos direitos venha a defendê-los quando
necessário de forma que estes sejam atendidos. Há que se destacar o fato de todas as causas
referentes aos mais necessitados, (ou melhor; os que não possuem poder de decisão ou
aquisitivo para comandar e viver de forma aprazível) terem sido conquistadas e adquiridas por
meio de agitações e aglomerações; de ideias, em passeatas, em atos de ocupação, enfim:
“lutando”.
A luta se converte no movimentar desses grupos de pessoas frente aos líderes,
detentores dos poderes. Mas o que teria haver o entendimento do consumo com as
revindicações dos grupos, aqui mais especificamente do movimento estudantil? As
necessidades existem ou são criadas e para estas - as reais necessidades ou necessidades
básicas como as de moradia, alimentação - sempre são necessárias as atuações de pessoas que,
desprendendo esforços buscam a defesa de que esses direitos sejam contemplados.
É notória a condição comum para os aglomerados; a busca de algo. A aquisição de
algo, a construção de algo, a desconstrução de algo, a obtenção de algo, a reivindicação de
algo para a grupo/sociedade. Assim, o individuo inserido no mundo concreto, experimenta
uma atividade prático/utilitária que nem mesmo possui consciência do real, ou seja, ele muitas
vezes age por impulsos que são gestados no senso comum como afirma Karel Kosik, em A
dialética do Concreto (1963) onde, ao tratar do
“complexo de fenômenos que povoam o ambiente cotidiano e a
atmosfera comum da vida humana, que, com a sua regularidade,
imediatismo e evidência, penetram na consciência dos
indivíduos agentes, assumindo um aspecto independente e
natural constitui o mundo da pseudoconcreticidade”.
(KOSIK, 1963)

Para além das analises fenomênicas, a pessoa humana individual reunida ao


MOVIMENTO funciona como mecanismo de uma engrenagem que se configura na essência
da coisa em si, ou seja, analisando o fenômeno (que se manifesta imediatamente) é possível
compreender a estrutura da realidade que não se expressa de forma direta.
O conglomerado que detém o poder (do maior ao menor) é representado
principalmente pelos homens que controlam as finanças do Estado. Ou a algum órgão
proveniente e/ou ligado a este, como é o caso da universidade, que por sua administração
trafegam nas receitas, as ordens de execução para os fins.
A luta estudantil nunca deixa de ser impulsionada, pois a cada necessidade e novo
corpo discente que multa, a renovação ainda com mais vigor a acompanha. E como um órgão
biológico que tem suas células morrendo e renascendo, mantendo-o sempre vivo, operando, o
desejo por melhora não cessa. Já que o ser/ter ideal deve ser constituído/construído
individualmente de forma a não afetar negativamente seu redor (semelhantes; ser humano,
animais, ambiente). Isso por si só já é algo que deveria estar sempre no ideário buscado por
todas as aglomerações.
No final do século XX, o pesquisador da historia cultural Roger Chartier destacava a
especificidade da história do tempo presente “não como uma busca desesperada de almas
mortas, (...) mas um encontro com seres de carne e osso que são contemporâneos daquele que
lhes narra as vidas” (CHARTIER, 1992.). Este tipo de abordagem é o que talvez melhor
defina a escolha para o objeto em questão, já que,
“essa característica conferia ao historiador do tempo presente
uma especificidade digna de nota. [...] (onde) ele é
contemporâneo de seu objeto e, portanto, partilha com aqueles
cuja história ele narra as mesmas categorias essenciais, as
mesmas referências fundamentais. Ele é, pois, o único que pode
superar a descontinuidade fundamental que costuma existir entre
o aparato intelectual, afetivo e psíquico do historiador e o dos
homens e mulheres cuja história ele escreve”.
(CHARTIER, 1992.)
Dessa forma, o acesso às fontes e toda memória de um passado tão recente tornou este
estudo inevitavelmente, rodeado de lembranças dos dias em que a solução para a demanda
fora tomada em conjunto, porém com todas as particularidades intrínsecas às individualidades
do estudante/militante. Este trabalho, elaborado com o maior esforço de conter a paixão - haja
vista a participação efetiva nas manifestações de quem escreve - não deixa de possuir em suas
falas, o suor e o esforço do movimento estudantil e de seus agentes em prol de uma sociedade
mais justa e que relacionada à Universidade, ainda possui a velha pauta não realizada no seu
ideário: a construção de uma universidade realmente pública, de qualidade, gratuita e
emancipatória.
ESTUDANTE: O MODIFICADOR DO LUGAR QUE PERTENCE

Com o crescimento do número de instituições educacionais de ensino superior na


cidade de Vitoria da Conquista, esta se configura um polo educacional onde milhares de
pessoas, de forma sazonal, migram para o município provocando um aumento da demanda
habitacional. Dentre outros fatores gerou-se o fenômeno da especulação imobiliária por
intermédio da indústria dos alugueis e pensionatos. Isso acarretou no aumento artificial dos
valores dos imóveis tornando-se um empecilho para a permanência de um determinado
seguimento de estudantes - os de baixa renda. Por meio da impossibilidade de manterem-se na
cidade, de alugueis e custo de vida alto, fomentava a grande evasão do âmbito universitário.
Ou seja, nada de “Educação para uma vida plena” como expresso no lema da universidade .
“A moradia se tornou complexa. Os Estados assumiram a sua
tutela. Uma série de tratados internacionais a incluem no rol dos
Direitos Humanos. Ademais, a positivação da moradia enquanto
direito implicou em sua institucionalização. Com isto se quer
dizer que o direito à habitação se aduz não apenas do direito
subjetivo dos cidadãos em exercê-lo, mas também nas ações do
Estado para a sua promoção.”
(MARINHO1E OLIVEIRA2, 2013).
Apesar de ser um direito assegurado, não é o que acontece visto que,
“A luta pelo direito à moradia ocorre, entretanto, no cotidiano
dos atores sociais. Ela é vivida dentro e fora dos limites da
legalidade. Conforme se aduz do paradoxo havido na
Constituição Federal, o Estado ora atua na defesa do direito à
moradia, ora age em seu sentido contrário. [...] Como todos os
outros direitos sociais, a moradia sofre os impactos do
neoliberalismo no início da década de 90, passando a ser
valorizada de acordo às especulações e a ((não)) participação do
Estado nesse sentido é determinante para o acesso à cidade.”
(MARINHO E OLIVEIRA, 2013).

Desnecessário salientar a Educação no roll dos direitos humanos. Enquanto direito, a


Educação, por meio das políticas de inclusão cada vez maiores, nas diversas camadas sociais,
tem conduzido um número crescente de pessoas ao ensino superior. Embora sendo válidas,

1 MARINHO, Marcos Silva. 2013. Graduando do 8º período do curso de Direito da Universidade Estadual do
Sudoeste da Bahia. Bolsista UESB de Iniciação Científica. o_marcus@hotmail.com
2 OLIVEIRA, Maria Alice Costa Fernandes. 2013. Graduanda do 6º período do curso de Geografia da Universidade Estadual
do Sudoeste da Bahia. Bolsista PIBID – Programa de Iniciação à docência. lilikageo@yahoo.com.br
essas políticas trazem consigo a toga da exclusão, pois, não ter condições de manter-se em
uma cidade anula a facilidade de ingresso em uma universidade pública.
A atuação dos movimentos sociais relacionados à garantia do direito a moradia é
ampla e bastante combativa. Em contrapartida, o governo brasileiro tem empenhado esforços
no sentido da habitação popular, pelos programas sociais como o Minha Casa Minha Vida,
por exemplo, mas ainda incipiente em relação à quantidade de pessoas desprovidas de
habitação própria e digna. Numa cidade como Vitória da Conquista, terceira maior do estado
da Bahia em que;
“a questão da habitação [...] não se reduz a seu valor social, pois
representa um lucrativo negócio para a economia local: a
especulação imobiliária. Há alguns anos, Vitória da Conquista
alcançou o status de cidade média e apresenta-se como um polo
de comércio e de oferecimento de serviços. Em função das
diversas instituições educacionais situadas nesta cidade,
estudantes de outras localidades migram para Vitória da
Conquista, e isto tem servido como estímulo para o crescimento
do comércio imobiliário.”
(MARINHO E OLIVEIRA, 2013).

No ambiente acadêmico, relativo ao direito à moradia destinada a estudantes que não


tenham condições para permanência, ao menos juridicamente está resguardo visto que,
“As universidades públicas brasileiras – em razão das lutas do
movimento estudantil na década de 70 – incluem a moradia em
seus programas de assistência estudantil e estabelecem as
residências universitárias como abrigo aos estudantes que
dependem deste auxílio para prosseguir suas formações. [...]
Entre os movimentos sociais, o Movimento Estudantil realiza a
defesa do direito à moradia no espaço universitário. Esta pauta é
histórica para o movimento e se faz presente na Academia
através da insígnia “permanência estudantil”. Pelo direito de
permanecer estudando, esta reivindicação insere
problematizações fundadas na realidade dos discentes que, em
muitos casos, vivenciam a graduação como um desafio.”
(MARINHO E OLIVEIRA, 2013).

A demanda pela implantação de uma política de permanência estudantil na Uesb,


sempre trouxe como pauta no movimento estudantil o direito a um Restaurante Universitário
e ao da Residência Universitária, porém tendo a segunda pouca aderência.
“Entretanto, o advento das cotas raciais e sociais em muitas
universidades públicas do Brasil, implicou em transformações
no retrato dos estudantes universitários do país. Eles mudaram
de cor, de roupa e de endereço! As histórias dos indivíduos
atingidos pelas cotas são, muitas vezes, ressignificadas na
universidade. É nesse instante que o movimento estudantil
agrega, nesta interpretação, um sentido político inovador em
suas lutas.”
(MARINHO E OLIVEIRA, 2013).

Apesar desta realidade, a demanda na busca pelos serviços de auxilio, bolsa ou


qualquer subsidio governamental é tão colocado como um favor, que as pessoas acreditam
que estas são esmolas. Não são. E os governantes sejam das instituições que comandam o
país, o estado, a cidade e uma instituição como a Uesb, estão no lugar de servir, no sentido de
reger os orçamentos para o atendimento das demandas do corpo social. Dentro da
universidade, de maneira a atender às necessidades relacionadas com a aquisição de saberes
dos atores principais deste ambiente. Os estudantes.

OS PRIMÓRDIOS DA LUTA ESTUDANTIL NA UESB

A participação estudantil se institucionalizou no ano de 1994, dentro da Uesb. Os


clamores por educação de qualidade e a chamada para a avaliação dos serviços referentes à
pesquisa, ensino e extensão são ouvidos de longa data. Traziam também desde então, um alerta
para a gestão universitária. Neste momento, o coletivo propunha seminários que discutiam entre
outras coisas o papel da informação e do conhecimento na “atualidade” (1994), bem como os
impactos da 1ª revolução técnico-científica, a evolução do ensino superior no Brasil, causas e
consequências da reforma universitária. Essas eram as temáticas abordadas nos encontros
estudantis. A avaliação institucional deu vida à comissão pró-DCE que propôs em conjunto com
a AFUS (Sindicato dos Servidores Técnico-Administrativos) e a ADUSB (Associação dos
Docentes) o seminário cujas solenidades foram abertas com a presença do Secretário de
Educação do Estado da Bahia e o Reitor da época.
“O movimento estudantil organizado em torno de uma entidade que
representa todos os estudantes da UESB (DCE) tem como marco
inicial o ano de1994, quando aconteceu o congresso de fundação
do Diretório Central dos Estudantes, conforme cartaz de
convocação para o referido evento. Desde então, há registros da
atuação do Movimento Estudantil em torno das demandas da
categoria, o que o coloca como sujeito na constante construção da
Universidade. Em seu histórico de atuações destacamos o
envolvimento direto com as questões políticas da universidade
através de diversas ações: realização de eventos acadêmicos e
lúdico/festivos, participação ativa em boa parte das eleições para
Reitoria, apoio às greves docentes, luta pela melhoria do transporte
coletivo, pela Residência Universitária e por uma Política de
Permanência Estudantil.”
(CARDIM3 e PRATES4, 2013).

Enquanto um órgão institucionalizado, o Diretório Central dos Estudantes da Uesb se


constitui neste ano e passaria por várias direções, moldes de conduta e lutas, defesas e
perspectivas das mais variadas. Existe uma espécie de retorno ao fato, aos moldes. Vão alguns e
outros chegam. Novas demandas surgem e por elas se lutam. A necessidade de ter algo que se
faz fundamental para a continuidade dos estudos, uma necessidade de denunciar desmandos e
ações fraudulentas. Esta é a alma de um militante, ainda que banhada de ingenuidade, vaidade e
orgulho juvenil. Para esses momentos, alguns sentimentos desprezíveis como estes servem de
bom grado.
O DCE de 1994 estava envolto aos que se agrupavam aos moldes da União Nacional dos
Estudantes UNE, porém no caminhar das gestões estes laços foram desfeitos e reconciliados.

3
CARDIM, Adriano C.C- Estudante de Graduação em Geografia/Uesb, membro do Grupo de Pesquisa
Urbanização e Produção de Cidades na Bahia/Bolsista CNPq. E-mail: adriano_cardim@yahoo.com.br
4
PRATES, Agnes - Estudante de Graduação em Direito/Uesb, membro do Grupo de Pesquisa em Diversidade
Sexual da UESB. E-mail: agnesnps@yahoo.com.br
Existem também os momentos de hiato em que a atuação estudantil esmorece. Ou seja, num
cenário de luta, o movimento estudantil estará atuante.
O universo acadêmico e suas necessidades refletem diretamente o fazer social do
individuo em um todo coletivo. E aqui, serão destacadas as reviravoltas empreendidas pelos
principais atores da ópera universitária: estudantes. E em alguma medida, professores e
funcionários. Estes atores, por conta das necessidades (que vão surgindo e as relacionadas às
estruturas físicas) fomentam debates, vivências, laços e desavenças. Tudo nas estruturas da
Uesb fora conseguido na base do grito. As articulações existem, os processos pelas vias
burocráticas são investidos, mas o resultado aparece por meio das aglomerações e resoluções
coletivas, pela pressão coletiva.

RESISTÊNCIA - O PODER DO MAIS FRACO

Partindo do pressuposto que toda história deve ser iniciada a partir dos germes que
desencadearam um processo, deve-se ser destacado o ano de 2003, mais precisamente no mês
de agosto, segundo semestre letivo. A ocorrência do 46º Congresso Nacional de Agronomia
em que os estudantes do CA (centro acadêmico), preocupados com a logística para o evento,
recorrem à administração da Universidade para que fosse providenciado um restaurante, visto
que a disposição geográfica da universidade na cidade é isolada, ou era naquele momento.
Ocorre que na oportunidade a administração (na figura do reitor da época, o senhor Abel
Rebouças São José) compromete-se com a construção do restaurante em tempo hábil para o
evento, porém o congresso ocorre e esta promessa não é cumprida. Deve ser dito que as
bandeiras que pautavam a implantação de um DCE desde 1994, traziam consigo as
necessidades da instituição, nelas a implantação de um restaurante e de uma política de
assistência (permanência) estudantil, logo esta não fora uma reivindicação própria do curso de
agronomia especificamente, já que existia anteriormente e englobava toda a comunidade
acadêmica. Porém como já foi dito, existe uma necessidade de trazer a tona o desenrolar dos
fatos.
A conjuntura trazia a total opacidade de atuação do movimento estudantil
institucional, haja vista a atuação do DCE composto por estudantes aparatados pelo PCdoB e
UJS, que assumiram em 2004 e que - apesar de todas as promessas de campanha - a gestão
não funcionava, aliás, era como se não existisse. No ano anterior, havia sido realizado um
Congresso onde ocorreu a reforma do estatuto do diretório, a qual versava sobre a
possibilidade da convocação de uma assembleia no caso de omissão por parte dos membros
do DCE, o que estava ocorrendo. Assim um grupo de estudantes decide convocar uma
assembleia, realizada no dia 14 de setembro de 2004 (sem muita expectativa) que servisse
para as colocações sobre as demandas de cada curso e dos acontecimentos que rondavam a
universidade. Um destes acontecimentos: a presença de uma placa no terreno somente
terraplanado que, desde 2003 (ocasião relatada acima) permanecia com o seguinte slogan:
ESTAMOS CONCLUINDO O RESTAURANTE UNIVERSITÁRIO!
“A indignação era por conta do fato da obra estar praticamente
parada, apesar da placa. Fomos direto para a Reitoria, e lá
permanecemos por 10 horas. O prédio da Administração Central
ficou completamente tomado por estudantes dos três turnos. [...]
A assembleia deliberou pela ocupação de um prédio público
como medida fundamental para pressionar a Reitoria a construir
a Residência Universitária. Sobre o Restaurante Universitário
foi dado o prazo de um mês; vencido o prazo, o Movimento iria
realizar uma feijoada-protesto no prédio da Administração
Central. Talvez eles tivessem duvidado, mas de fato, 30 dias
depois, isto é, no dia 14 de outubro de 2004, o Movimento
realizou a atividade e mais de 300 estudantes compareceram. As
obras já haviam sido retomadas e, no final do ano de 2004, sob
forte protesto, o reitor inaugurou o Restaurante, mas terceirizou
o serviço para uma empresa privada, que, obviamente, iria
administrar visando o lucro – o que, obviamente, iria repercutir
no preço da refeição e, com isso, no próprio caráter de um
Restaurante Universitário, isto é, fornecer alimentação de
qualidade e a baixo custo, ou a preço de custo, ao estudante. O
Restaurante inaugurado não era, portanto, um Bandejão. Nós
defendíamos gestão pública, e foi essa a bandeira que o
Movimento em seguida iria incorporar.” (CASTRO,2013)

Aqui estamos concluindo o restaurante universitário. Placa da vergonha

Assembleia 14 de setembro de 2004.


Ocupação da reitoria por 10 horas, no mesmo dia da assembleia. (ao centro, o reitor Abel São José)

Diante do ultimato dos estudantes o movimento parte para a organização de ações


práticas visando pressionar a reitoria. Dessa forma foram deliberadas em reuniões que
contavam com um número expressivo de estudantes - de variados cursos, credos e gostos - as
divisões de comissões; estrutura, limpeza, segurança, comunicação, etc. Nos vídeos
disponibilizados para a pesquisa podem ser verificadas várias falas de apoio (de membros da
sociedade civil, professores, advogados, religiosos, representantes de movimentos sociais) à
ocupação de um prédio dentre os que se encontravam inativos na instituição, reuniões estas
que ocorreram dentro e fora do âmbito acadêmico. Reuniões que obtinham tamanho respaldo,
que eram realizadas em salões públicos. Tomadas às devidas providências o grupo que
denominou-se MRA- Movimento Rompendo Amarras partiu para a ação.

“ [...] no dia seguinte, cerca de 60 estudantes lotariam um ônibus


por volta das 6h da manhã que passaria com destino à Uesb na
Praça do Fórum João Mangabeiras.[...] Tomamos o prédio de
assalto por volta das 6:30h e dali em diante a luta pela
Residência efetivamente havia começado – exatamente no dia
20 de setembro de 2004.”
(CASTRO,2013)
MRA- Movimento Rompendo Amarras e a Gestão Declare Guerra
Assim começava da luta da residência universitária. Logo o prédio inacabado, que
funcionava uma sala de videoconferência e que seriam as futuras instalações da TV e Rádio
Uesb foi o local escolhido, pois,
“[...] Esses fatores confluíram para a escolha estratégica daquele
prédio, além do fato de ser dentro do campus, o que de certa
forma resguardava o Movimento de maiores ofensivas por parte
do Estado. O prédio não tinha condições de habitação, aos
poucos improvisamos portas, janelas, pias, chuveiro, etc,
produzidos pela arte da gambiarra, nos dividíamos em diversas
comissões, de infraestrutura, limpeza, cozinha, mobilização,
comunicação, segurança, negociação, entre outras,
experimentando um novo jeito de habitar, conviver e se
organizar coletivamente. [...] o Movimento era coletivo e as
pessoas se dispunham de forma espontânea, então nos
revesávamos (sic) entre as diversas necessidades da ocupação,
em reuniões que começavam depois da última aula do curso
noturno e que se estendiam pelas madrugadas.” (GOMES, 2013)

Desta forma, com a ocupação do prédio esta atuação se configura um movimento de


ação direta, partindo do principio de tomar as rédeas do poder para realizar os benefícios que
deveriam estar sendo resguardados e garantidos pelo estado, neste caso em particular, pela
instituição. O movimento de ação direta se caracteriza da seguinte forma, segundo Sparrow:
“A ação direta repudia a aceitação da ordem existente e sugere que temos tanto direito, quanto
o poder, de transformar o mundo. Isso é demonstrado quando a ação direta é realizada. Os
exemplos de ação direta incluem bloqueios, piquetes, sabotagens, ocupações...” (SPARROW,
2009). Corroborando esta analise Thoreau afirma que “Não é desejável cultivar o respeito às
leis no mesmo nível do respeito aos direitos. A única obrigação que tenho direito de assumir é
fazer a qualquer momento aquilo que julgo certo”, assim, foi discernido e realizado pelos
estudantes da Uesb. Ao ocupar o prédio abandonado com vistas a garantir o direito à
educação aos estudantes carentes - por intermédio de uma política assistencialista - obtendo
apoio crescente e repercussão que respaldava e legitimava a causa. “Quem não luta por
direitos não os conquista. Naquela época o reitor não queria nem discutir essa
questão.”(CARNEIRO,2013) Dessa forma, Betinho
Portanto, mesmo com o desafio a vista,
“O MRA estava bem articulado com diversos outros segmentos
da sociedade antes de partir para a ocupação efetiva do prédio,
recebemos apoio político e material de movimentos sociais,
grupos, entidades, instituições, o Movimento ganhou uma
visibilidade nacional e tornou-se referência no movimento
estudantil brasileiro, mobilizando, também, a Comissão de
Direitos Humanos da Assembleia Legislativa da Bahia.
Recebemos alimentos do MST, que ofereceu apoio na
segurança, o que era uma preocupação constante, por muito
tempo a ocupação [vivia] em um movimento contínuo 24h,
tínhamos o cuidado de manter a casa sempre ocupada, mesmo
em momentos de esvaziamento da universidade, como finais de
semana, feriados e férias.”
(GOMES, 2013)
1
2
3
4
A ocupação continuou. Cerca de seis a oito meses depois os ocupantes recebem um
susto. Uma liminar de reintegração de posse e uma ação nominal a sete estudantes. Cada dia
de permanência no local, multa de 1.000,00 (Hum mil reais) por estudante, ou seja, 7.000,00
(Sete mil reais) por dia. Aqui se caracteriza de fato a desobediência, apesar desta não se
restringir ao infligir de uma lei. Na verdade esta intimação nunca fora entregue. Nunca
receberam de fato o oficial de justiça. A estratégia da administração era a intimidação
psicológica. Capangas armados e carros pretos rondavam a casa a noite. A água e a luz foram
cortadas. Trancaram os banheiros da quadra. Panfletos bem produzidos traziam a palavras de
repudio a ação estudantil. A tentativa era desmobilizar, intimidar, desmoralizar, vencer pelo
cansaço.
“O prolongamento da ocupação, em minha opinião, serve mais
para demonstrar a capacidade do Estado de vencer o movimento
pelo cansaço, principalmente porque ocupações e paralisações
do movimento estudantil, assim como alguns movimentos
ligados aos setores de serviços, não causam muito impacto na
sociedade. Podem ser deixados aos prantos até que se esgotem.”
(LEAL,2013)

No lugar os estudantes permaneceram. Alguns saindo, outros chegando. Depois de


algum tempo um grupo que compunha o MRA- Movimento Rompendo Amarras, montou a
chapa Declare Guerra e assumiu o DCE, mas com o tempo esbarrara com a burocracia e os
memorandos sem fim que não é e nunca será comparado ao movimentar de um ato de
protesto. As obrigações cobram, o cansaço atola e a maioria das gestões não consegue atuar
de forma concreta até o fim. Algumas lideranças primordiais foram se desligando do
movimento pelo bem estar individual, formando-se e moldando-se ao que lhe era oferecido.
Outros estudantes que surgem dos fluxos e refluxos naturais do corpo discente “seguraram a
onda mais um bocado” e por um longo período;
“Passamos muitas privações, havia uma força coletiva que nos
estimulava a seguir adiante, havia a vivacidade daquela
experiência, os encontros, as aprendizagens, as questões que
correspondiam às necessidades de alguns ocupantes e ao senso
de muitos outros que reconheciam a legitimidade da causa e sua
qualidade comum, de modo que o MRA não foi feito
exclusivamente pelos estudantes pobres, embora tenham sido
esses os que moraram efetivamente na ocupação e que a
sustentaram nos períodos de refluxo sucessivo da sua
efervescência inicial.”
(GOMES, 2013)
No processo da ocupação na Uesb os membros pertenciam a todo tipo de grupo
social. Neste emaranhado de mentes, alguns da classe média – que são os sujeitos que tem a
possibilidade material de desenvolver algum tipo de luta. Afinal de contas os grandes homens
do pensar eram providos de algum tipo de renda a qual o possibilitava o estudo e o ócio
criativo para as artes, filosofias, etc. Dificilmente um trabalhador que executa o mesmo
procedimento o dia inteiro, o qual o impossibilite parar, poderia obter conhecimento de seus
direitos enquanto cidadão e questionar a inexistência deles para seu bem estar. O
desenvolvimento e execução das leis são dados por uma determinada camada, porém na
maioria das vezes esta lei fora conseguida pela luta reivindicatória de um coletivo, pela
pressão numa demanda.

Movimento Resistência e Luta e a Gestão DCE em Movimento

A luta da segunda fase fora também, por conta da mal adaptação do que existia e que
os colegas seriam obrigados a aceitar. Dessa forma a obra fora “concertada” e colocaram
dentro desta estrutura. Uma cozinha e uma sala de convivência. Dois banheiros com lavabos,
chuveiros. E tantos são os requisitos de pobreza que o estudante necessita comprovar. Depois
disso, necessita também de um atestado de saúde da rede pública e um de antecedentes
criminais.
“Afinal de contas, a pobreza, ainda mais na Universidade, é uma
coisa difícil de se admitir publicamente; ela se manifestava
silenciosamente.. no estudante que assistia aula morrendo de
fome, muitas vezes sem café da manhã, que muitas vezes se
alimentava mal no almoço, e, em alguns casos extremos,
passava-se até fome. Quando a situação tornava-se
insustentável, a desistência era a saída encontrada.”
(CASTRO, 2013)
No passar dos anos e com a ocupação tendo tomado um corpo quase que institucional,
pois funcionava como se fosse algo comum, incorporado ao cotidiano da universidade.
Estudantes, professores, funcionários, artistas em trânsito pela cidade como Denilson Santana,
artista plástico. Encontravam naquele espaço algo que segundo Foucault funciona como uma
espécie de heterotopia, que diferente de utopia, pois
“Se refere a lugares reais, mas que estão fora dos lugares
aceitos. [...] a sociedade produz heterotopias [...] (estes espaços
são denominados) heterotopia de desvio, ou seja, aqueles
comportamentos que estão fora do que a sociedade aceita e
impõe as condutas. São nestes espaços que [...] estão contidos os
conflitos e tensões que se exercem pelas relações de poder de
uma sociedade determinada.”
(VANDRESEN,2011)
O ambiente da residência/ocupação teve momentos em que a tentativa de aproximar
aquele local ao mais próximo de uma casa, foi mantida pelos colegas, respeitando os espaços
de cada pessoa, todos procurando auxiliar na manutenção da cozinha, das panelas, dos
banheiros.
“Fui com meu filho morar na casa dos meus avós em Vitória da
Conquista para cursar a faculdade.(...) Recebíamos uma mesada
de uma outra avó que mora aqui em Salvador e vivíamos por
tanto às custas de avós. Em 2005, começaram a tratar o meu
filho mal na casa da minha avó. Por isso, apesar de achar um
ambiente inóspito para uma criança de 4 anos, fomos morar na
residência. [Por 3 meses em meados de 2005]”
(PACHECO, 2013)

Noutros momentos tornava-se insustentável a permanência. Isso explica os fluxos e


refluxos de pessoas. Porém uma coisa era certa. Em todo momento que a administração tentou
despejar os estudantes, uma corrida gritando pelos corredores lotava o espaço e a ação
recuava. Variadas estratégias para que a desmotivação fosse cada vez mais forte, para que
aquele espaço fosse o quanto antes retomado pela instituição. Estas estratégias transitavam
desde as ações relatadas acima até a desqualificação das pessoas que ali estavam engajadas,
taxando o local como um antro de drogados e um local de prostituição em notas lançadas na
comunidade acadêmica, uma mais escabrosa do que a outra;
“[...] o consumo das drogas era enaltecido como forma de
denegrir a legitimidade do Movimento, que, aliás, nunca
amadureceu a discussão política a respeito disso [...] havia um
paradoxo entre a prática subversiva do MRA e a reprodução dos
valores por ele questionados, que impedia o acesso e
aprofundamento de determinadas questões, o que refletia a
heterogeneidade das pessoas que transitavam pela ocupação,
brancos, pretos, pobres, ricos, mulheres, homens, homossexuais,
evangélicos, ateus, anarquistas, partidários, enfim, não havia um
perfil homogêneo, mas todos confluíam para um objetivo
comum, a construção da Residência Universitária como parte de
uma pauta mais ampliada de reivindicações dos estudantes.”
(GOMES, 2013)
A luta estudantil mesmo recorrendo à ação direta, numa única e ousada
tentativa, onde buscou também alternativas e apoios em outras instancias sociais,
como a igreja, pastorais, os movimentos sociais, advogados, políticos, membros da
sociedade civil. Ainda assim a aquisição da residência se estendeu por quatro longos
anos, para a instituição entregar 1/3 da obra e deixar apodrecer os alicerces da
construção do modulo 2.
“o projeto original da reitoria para a residência era (sic)
contemplava três módulos: um dormitório masculino, um
dormitório feminino, e um módulo com as áreas de convivência,
como sala de TV, cozinha, lavatório etc. No fim das contas, a
reitoria só entregaria um dos módulos de dormitório, e nós
tentávamos pressionar para que a administração da universidade
ao menos adaptasse melhor o prédio para servir as outras
funções, pois foi originalmente projetado com apenas quartos e
banheiros. Já não tínhamos muito poder de barganha, logo,
quando surgiu um escândalo da FADTC ficamos indignados
com o tamanho do desvio em comparação as migalhas
empreendidas na residência, e ao mesmo tempo entusiasmados
diante das novas condições para fazermos uma mobilização na
universidade.”
(LEAL, 2013)

A instituição novamente processou os estudantes, também nominalmente. Desta vez,


com multa de 2.000,00 ( dois mil reais) por dia. Da mesma forma, os mandados não foram
entregues nas mãos dos estudantes, talvez por conta que, dessa vez, a parte que havia sobrado
da ocupação foi entregue antes que isso ocorresse.
“As duas fases foram semelhantes, apesar da segunda fase não
ter sido em nada original. Como diz Marx, em 18 de Brumário
de Luiz Bonaparte, a história só se repete como farsa. A reitoria
processou estudantes como havia feito na primeira fase, cortou
água, energia, ameaçou, mandou capangas para intimidar
estudantes e tudo o mais que já estavam acostumados. Como
resposta, os estudantes passavam em sala, mobilizavam outros
estudantes, professores e técnicos. Uniam-se nos momentos
mais críticos, o que também já havia acontecido na primeira
fase. E depois da mobilização aconteceu o inevitável, aceitamos
sair da ocupação e se transferia para a residência universitária.”
(SILVA, 2013)

A pressão por parte dos professores que apoiavam a luta começou a ser contrária à
vontade de alguns que tinham naquele ambiente numa espécie de santuário de recordações. Já
desesperançados e com toda a pressão por parte da reitoria, abalou sobremaneira o
movimento. Já não tinham pernas, ou poder de barganha.
“A notícia do processo, porém, nos deixou muito tensos.
Apostamos tudo em uma última mobilização, tentando
pressionar para uma reunião de negociação. Fechamos os
portões da UESB com pneus velhos e toras de bambu. Levamos
conosco alguns pertences, como um botijão de gás em uma
galinhota, barracas de camping, colchões, jarros de flores e
esteiras de palha. Nosso objetivo era apenas criar um clima de
acampamento, mas não tínhamos a pretensão de ficar
acampados no meio da pista. Logo se aglomeraram muitos
estudantes, provavelmente chocados com aquela cena incomum.
Quando o espaço começou a esvaziar decidimos nos deslocar até
a reitoria para pressionar uma reunião e renegociar os termos da
desocupação. Estávamos muito preocupados quanto a nossa
capacidade de pressioná-los, entretanto tivemos uma “ajuda”
inesperada. Fomos salvos por uma má avaliação do prefeito de
campus, Mauro. Quando ele nos viu aproximar da reitoria com
toda aquela parafernália, julgou mal nossas reais intenções.
Imaginando que estávamos mesmo dispostos a ocupar a reitoria,
ordenou que seus portões fossem trancados, com todos que
estavam dentro, inclusive membros da sociedade civil. Ordenou
também uma espécie de sítio, mantendo a universidade fechada
mesmo após termos abandonado nosso posto inicial no portão.
Isso tornou o acontecimento muito mais grandioso do que teria
sido sem essa catastrófica interferência.
O bloqueio da passagem para a reitoria causou uma grande
indignação daqueles que ficaram presos lá dentro, e nós
soubemos utilizar isso a nosso favor. Se no momento em que
partimos para a reitoria já estávamos no limite de nossas
energias, com o “estado de sítio” ganhamos folego e
conseguimos prolongar a mobilização até o final da tarde,
obrigando o reitor Abel a nos receber. Graças à tempestade que
eles fizeram com nosso copo d’água, toda a UESB parou para
acompanhar as negociações. Foi neste momento que garantimos
a fim da ocupação, desde que os processos fossem retirados,
além de outros pontos de nossa pauta de reivindicações ligados a
assistência estudantil.”
(LEAL, 2013)

Ato no portão. Escândalo da AVIMIL.


O movimento ainda decide chamar a atenção ainda para que ao menos o prédio que
estava sendo oferecido fosse mais bem adaptado. Foi essa a decisão em assembleia. Além
disso o fato do escândalo dava novo fôlego as reivindicações.

Mobilizações em praças públicas


1
2
3
4
Reitor Abel na Reunião do CONSEPE- Para esclarecimentos sobre o desvio de dinheiro. Algo esclarecido?

Caminhada de estudantes pela Uesb. Convocando para o CONSEPE


Exposição 3 anos de Luta
Cartazes relembrando o inicio da luta
1
2
3
4
Mais uma vez a história se repete e os mesmos mecanismos de repressão foram
utilizados, quando na entrega da primeira etapa da residência. Realmente deve-se admitir a
presença de um número de pessoas nas mobilizações que aparentemente não deveriam estar
reivindicando por uma causa popular. Cada um desses possuía até moradia na cidade.
“A motivação para participar do movimento estudantil (...)
mesmo não tendo necessidade da residência universitária, essa
era apenas uma das inúmeras questões levantadas dentro deste
processo de sucateamento da educação superior, do processo de
fazer das universidades verdadeiros colégios técnicos que
priorizam formar mão-de-obra para o mercado ao invés de
pessoas que possam refletir, a minha participação se deu dentro
do processo coletivo de organização do movimento e de
resistência após os processos abertos pela administração da
universidade contra cinco estudantes e estava entre eles.”
(BONFIM, 2013)

O que faz um indivíduo sujeitar-se a situação de descaso e opressão há uma classe da


qual ele não pertence? Como dito anteriormente, é aos que possuem condições para o pensar,
são delegadas as funções de protesto. Existem variadas maneiras para demonstrar indignação
e propagar – para além das ações diretas - os desmandos dos detentores dos poderes. Mas de
fato a opinião pública não é pressionada frente papéis em tramites burocráticos. Mas na
imprensa, ainda que deturpada a imagem, a questão fica no ar. Por que estes estudantes estão
fora das salas de aula gritando. O que eles dizem? Pois aguardando ações jurídicas, duram
anos, nada acontece.
“O Movimento Rompendo Amarras, responsável pelo ato
originário da ocupação e por suas lutas iniciais, foi combativo e
organizado, tem muito mérito e não deve ser esquecido, mas
sofreu o desgaste acumulado dos enfrentamentos sucessivos,
sentiu o peso das dificuldades materiais cotidianas, o ônus de
táticas equivocadas (como assumir o DCE), a inevitável
rotatividade que caracteriza a participação dos estudantes no
movimento estudantil. Contudo, a ocupação continuou por
muito mais tempo, evidenciando que a luta pela residência
efetivamente correspondia a uma necessidade urgente. Demanda
social tratada com indiferença pelo corpo docente e com
hostilidade pela reitoria.”
(AQUINO, 2013)

A sociedade desqualifica o movimento estudantil, taxando os participantes como


desocupados e enaltecendo alguma característica social do sujeito, como uso de drogas, a que
classe pertence, seu gênero e sexualidade. Isso é usado de forma proposital inclusive, por que
o corpo social que conduz sabe da força que tem um coletivo em luta por algo.
“A residência universitária para mim hoje representa um
símbolo de uma luta, e mais que isso. Mostra o quanto que a
organização de estudantes, de pessoas, de sujeitos;(por) que os
estudantes são sujeitos, são trabalhadores muitas vezes, que
inclusive não têm como sobreviver. Não têm as mínimas
condições de alugar uma casa aqui em Vitória da Conquista.
Então, assim, a organização desses sujeitos que possibilitou, sem
sombra de dúvidas, que hoje nós tenhamos uma residência
universitária, que na verdade não atende a nossa demanda atual.
Mas ela, na medida que é um símbolo de uma conquista, que
inclusive após essa (foi) que a universidade começou a pensar
numa política de permanência estudantil.”
(CARDIM, 2013 - entrevista 2 de maio .)

Esta fala é de um estudante/militante que, como membro do DCE sente a diferença


que faz a luta estudantil para a composição social.

“Por que eles sabem que a parada é séria. Eles sabem. Um


professor de direito tem receio quando percebe (por exemplo)
que você que é do movimento estudantil está em sala de aula -
posso dizer por minha experiência- ele fica desconfortável de
algum jeito, por que ele sabe a força que tem o movimento
estudantil. Eles sabem e desqualificam por que não querem
mesmo que outros estudantes participem. Por que é o único
espaço aqui na universidade que a gente pode usar. O povo acha
que movimento estudantil é um monte de gente dando bafão.
[fazendo estardalhaço] Não é só isso o movimento estudantil. O
movimento estudantil é o cotidiano da universidade, é o dia a
dia, é participar. É estar com os olhos abertos e atentos para uma
outra realidade. Que a galera passa e não vê.”
(CARDIM, 2013).

Não é a toa que em boa parte dos relatos contidos no livro de Artur Poerner, acerca da
atuação militante estudantil, tinham nos futuros bacharéis as tochas que tocavam fogo nos
moditis urbano. A sociedade comprava escravos, os estudantes de Direito, num agrupamento,
compravam-lhes a alforria. Os libertava. Eram taxados (os estudantes) de vândalos pelos
líderes dos poderes. È de entender por que a sociedade de um modo geral, traz consigo a
defesa que o estudante precisa buscar em seus estudos seus meios de sobrevivência e que lutas
como essas são despropósitos.
As pessoas querem mudar, querem uma vida melhor, mais próspera. Não há mal
nenhum nisso. Todos possuem seu ideal de vida, uma maneira de viver. Alguns precisam de
pouco pra viver, outros acham que precisam de vários carros, casas e bens. Mas “a parte que
te cabe nesse latifúndio... é uma cova grande pra teu defunto pouco” (João Cabral de Melo
Neto). O estudo com foco único e exclusivo para a aquisição de um certificado para formação
profissional forma apenas isso: “Um profissional”. A cada dia vem sendo retirada da
universidade sua característica primordial; seu papel formador de sujeitos sociais. Quando não
se percebe a realidade, as falas são reduzidas a lamentações sem propósito. Faz-se necessário
a reflexão sobre as lutas, os conflitos existentes nos âmbito sociais, sendo o da universidade
uma realidade onde esses conflitos são mais fortemente expostos. Principalmente os cursos
das ciências exatas. Os de ciências humanas são “obrigados” a estudar os melindres humanos
a todo custo. Não que isto o torne melhor, mais empáticos com as causas coletivas. Mas ele ao
menos lê para fazer prova. Ele necessita escrever, colocar registro em pensar. Mesmo que
cada dia mais recheados de carnes de segunda/terceira categoria, os textos precisam ser
escritos, entregues e apresentados dentro da didática nas ciências humanas.
Os que entendem melhor e possuem aptidão para o serviço da busca de melhores
condições, para estar atento as manobras e descasos acometidos a universidade, patrimônio da
humanidade. Estes são os que colocam em prática para além das leituras e discussões.
Conhecimento sem práxis não executa função alguma. Casos de racismo, preconceitos de
variados tipos, relações de poder e “panelas”, os jogos sociais. Essas características
intrínsecas do ser humano, seus sentimentos velados; sobrepostas por seus valores e cargos,
são postos por terra quando na aquisição de conhecimento em conjunto. A prática e estudo
dentro do movimento estudantil forma para vida, esta é uma formação indispensável a uma
educação para vida plena.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

A abordagem de Thoreau traz a analise da legitimidade de atos como os empreendidos


por estes estudantes da Uesb, entre os anos de 2004 e 2008. O fato pode ser reconhecido como
desobediência civil para designar a ação dos discentes pela construção de uma política de
assistência estudantil institucionalizada. Já na ação da tomada de um prédio publico, esta se
converte em equivalência ao direito de greve. Tal ato é nomeado no anarquismo de ação
direta.
O movimento estudantil da Uesb é de luta, e esta talvez seja a mais palpável que se
pode admitir. Afinal foi pioneira, não tanto quanto dos funcionários que tencionaram algum
tempo antes acerca da construção da creche. Os estudantes com as lutas conseguiram cotas
para este serviço, porém é muito difícil conseguir. Tive a sorte e a “cara de pau” de conseguir
uma vaga para minha pequena o que possibilitou a conclusão do meu curso. Porém a luta pelo
restaurante e pela residência ocorrida neste período foi além. Possibilitou a inclusão de um
programa exclusivo para as questões estudantis. Este órgão na instituição é a PRAE. Dessa
forma a universidade (ainda que incipiente) possui um programa de assistência estudantil que
deve ser ampliado e otimizado - pelos discentes -, mas que existe. Entretanto, apesar de esta
ter sido a ocupação de prédio público, dessa natureza, que mais durou na historia do Brasil,
este mecanismo propulsor fora utilizado pelas demais universidades país afora. A residência
da UFBA- Universidade Federal da Bahia foi adquirida com muita corrida (dos militantes)
dos cavalos da PM em Salvador. Mas hoje está lá. Estão, pois existem mais de uma: são três.
O papel do movimento estudantil é este mesmo. Realizar melhoria onde pode.
Aperfeiçoar seu ambiente. Mas principalmente, promover encontros, vivencias e estudos que
proporcionem a percepção de seu derredor e do mundo. Isso constrói um ser humano mais
consciente.
A história da ocupação, tudo que ela representou pode ter se tornado algo fantasioso,
como uma lenda cheia de gloria. Porém a continuidade da ocupação se deu por conta da
própria administração não estar disposta a se expor negativamente à sociedade, por conta de
uma candidatura futura do reitor Abel Rebouças São José. Em outros espaços, noutras cidades
que esta ação foi tentada- onde os colegas que estiveram visitando a residência/ocupação para
adquirir exemplo e para verificar a experiência in loco empreenderam – a atuação estudantil
fora recebida a bala, a chumbo grosso. Talvez o movimento deva ser grato pela “cautela” do
reitor Abel. A duração de quatro anos se deu por conta desta ser uma estratégia do estado de
minguar a força de um militante. Muitas vezes, principalmente na área de educação o governo
age dessa forma: ignora e deixa cansar. Por certo ficar sem salário - como no caso dos
professores quando resolvem fazer greve- é complicado suportar. E ao governo, pouco
importa se a educação parar. A propaganda diz que as vagas crescem a cada dia. Mas
escondem que cresce também o numero dos que desistem. Se essa é a lei, a lei da selva, de
que “que quem aguenta mais pau é o mais apto para viver”, então retiro o que disse.
O direito a alimentação e moradia é o mínimo que deve ser garantido ao cidadão. A
todos em todo lugar. Mais ainda ao que produz conhecimento, aliás, reproduz, mas que de
todo modo, contribui para a sociedade que o cerca com sua graduação. O conhecimento
adquirido é o maior tesouro e este deve ser garantido a todo o ser humano. Os lugares sociais
serão preenchidos pelos profissionais formados e isso não pode ser restrito aos que possuem
maior poder aquisitivo. Se é passível a todos como retrata a propaganda, os que não possuem
capacidade financeira devem ser assistidos pelos poderes para que a garantia de sua aquisição
de conhecimento seja mantida.
Num universo de 4.000,00 alunos nos três campi, a Uesb possui apenas 1(uma)
residência universitária, do campus de Vitória da Conquista. Acredito que nos outros campi,
não exista ainda por falta de mobilização nesse sentido e principalmente por falta de vontade
da administração. Atualmente são poucos os calouros que sabem da existência da residência e
das bolsas de auxilio que existem. Corriam histórias que a administração fez o primeiro
módulo (antes do reavivamento das mobilizações) com a real convicção que os estudantes não
permaneceriam lá, tamanha a falta de humanidade com a qual fora construído o prédio. Uma
casa, quartos de um lado e do outro. Um corredor no meio. Depois de todo o tempo dado a
melhoria desta ofensa que a administração pensava em entregar como casa estudantil, os
estudantes que estavam na lista de espera foram para a Residência oficial.
No tocante a capacidade da casa que funciona a residência universitária - como se
pode constatar numa visita - é caótica. É bastante abafada, os quartos são divididos por seis a
oito pessoas, em locais bem pequenos. A quantidade de pessoas que mora até a visita que fiz
em dezembro de 2013 era de 14 pessoas. Apesar da PRAE (Programa de Assistência
Estudantil) ter conhecimento da situação, o módulo inacabado e deteriorado atrás da casa não
tem nem ideia de quando ganhará vida com pessoas transitando. A solicitação agora deve ser
da conclusão/ampliação, no sentido de aumentar o número de vagas e que o estatuto que a
rege seja melhor avaliado.
Temo que esta contribuição não tenha tido um grande aprofundamento em todos os
pontos que fazem deste objeto ser digno de um estudo mais longo, pois este acontecimento é
história vívida do movimento estudantil e torna-se algo digno de nota. Acredito que neste
trabalho devam ser retratados ainda, vários aspectos desta experiência heterotropica, com
todos seus pormenores e implicações. O poderá ser feito numa outra oportunidade.
ANEXOS
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Departamento de História - DH
Disciplina: TMO II
Professora: Carlos Alberto Pereira
Discente: Alexandrina Mendes Santana

Questionamentos para Pesquisa

1- Por que razão você adentrou no movimento em prol da construção da


residência? Possuía necessidade própria? Em que momento do período dos 4
anos de ocupação você participou efetivamente? Qual foi sua participação no
processo?
2- Você é de Vitória da Conquista? No decorrer da vida acadêmica residia em
residência familiar, alugada, com os pais, pensionato, república, qual? Você
trabalhava ou dependia de outrem financeiramente?
3- Caso tinha um local de moradia, que importância enxerga em sua participação
no movimento para instauração da residência universitária na Uesb? O que o
motivou?
4- Sofreu algum tipo de represália por parte da instituição? Qual (is)?
5- De que forma enxerga a atual situação da residência universitária?
ENTREVISTAS
Rogério Santos de Castro, jornalista formado pela Universidade Estadual do Sudoeste
da Bahia (2006). Doutorando em Serviço Social pela UFRJ, professor da UNESA e
mestre em Serviço Social pela UFAL.
Então.. eu ingressei na Uesb, campus de Vitória da Conquista, no outono do ano de 2001,
mais precisamente no mês de maio. Ingressei para o curso de Comunicação Social.. e logo fui
tomado por aquele clima ao qual o curso estava envolto: estudantes politizados, engajados,
atuantes, militantes, etc. Para se ter uma ideia da dimensão da politização, a minha primeira
assembleia discente iria me marcar muito exatamente pelo alto grau de maturidade dos novos
colegas, etc. Tal fato fora atestado certa vez, inclusive, pela presidente do Sinjorba à época, a
professora Heloísa Sampaio (UFBA), numa visita que fez à instituição. Aquele era um
contexto diferente; Fernando Henrique Cardoso estava no penúltimo ano do seu segundo
mandato e o PT era o maior partido de esquerda da época, e possuía uma significativa
inserção/influência no/sobre o movimento estudantil, e não só nele. De 2003 em diante tal
cenário iria se modificar e muito. Eu chegava de Salvador para a UESB nesse clima. Com a
vivência universitária, os aprendizados em sala de aula, as leituras, etc., fui logo
compreendendo aquela dinâmica e fui, naturalmente, tomado violentamente por aquela vida
cultural universitária. Foi assim que eu ingressei no movimento político dos estudantes, o
chamado movimento estudantil. A pauta da Residência já existia nessa época. A Uesb havia
se expandido e havia recebido muitos estudantes de fora, de outras regiões. Eu me recordo
que uma das coisas mais marcantes durante aquela fase para mim eram as festas nas
repúblicas universitárias, em sua esmagadora maioria constituídas de estudantes de fora. Eram
festas muito divertidas, todos se encontravam.. aquela festa que todo estudante sabe fazer..
parece que nasceu para fazer aquilo (risos). Pois bem.. esse fluxo de estudantes de outras
regiões era o que motivara essa pauta pela Residência. Uma questão aqui que não pode deixar
de ser salientada é que esses estudantes que migravam de cidades para estudar provinham de
condições distintas.. ou seja, embora alguns viessem de famílias que pudessem prover sem
muito desequilíbrio financeiro aquela estada fora de casa, havia um número, difícil no entanto
para mim precisar, de estudantes oriundos de famílias pobres, sem muitas condições de
manter a longa jornada universitária de alguns anos. Afinal de contas, a pobreza, ainda mais
na Universidade, é uma coisa difícil de se admitir publicamente; ela se manifestava
silenciosamente.. no estudante que assistia aula morrendo de fome, muitas vezes sem café da
manhã, que muitas vezes se alimentava mal no almoço, e, em alguns casos extremos, passava-
se até fome. Quando a situação tornava-se insustentável, a desistência era a saída encontrada.
Então, foi nesse contexto, que vinha se desenhando, que surgiu uma proposta, cujo um dos
idealizadores fora o então estudante de Comunicação Ronaldo Eli, de se realizar uma ação em
prol da Residência. Era uma “Proposta de Ação”, de fato. Houve algumas reuniões, eu
cheguei a ir em algumas delas.. mas o fato é que essa ação não vingou; ou se vingou, não me
lembro. Talvez ela tenha contribuído, não saberia dizer em qual grau, para disseminar mais
vivamente na Universidade a necessidade da Residência Universitária. Pois bem.. em 2003,
houve eleição para o DCE, após um Congresso que reformou o Estatuto, e assumia o posto da
entidade uma geração mais nova de dirigentes estudantis; eu era um deles. Essa era uma das
características do movimento estudantil: a rotatividade. Nós entrávamos com a missão de pôr
em prática o novo Estatuto. Paralelo a isso, a Universidade continuava crescendo (me refiro
ao número de alunos, e ao contingente de estudantes de fora). Nós realizamos uma
Assembleia, ainda muito verdes, e tiramos uma Pauta de Reivindicações. Essa Pauta viria a
ser protocolada na Reitoria. A conjuntura, como se sabe, já havia mudado. Após um processo
tumultuado, no segundo semestre de 2002, o ex-governador Otton Alencar nomeou para o
cargo de Reitor, por meio da prerrogativa da Lista Tríplice, o seu candidato, o professor do
curso de Agronomia, Abel São José. Pois bem.. seria dessa geração que assumira a partir de
então o comando das entidades estudantis da Uesb que iria sair os principais personagens da
ocupação que iria ser realizada no ano seguinte. A gestão “Instinto Coletivo”, que assumira o
DCE em 2003, chegou ao final rachada; eu, que compunha a gestão, ficaria do lado dos que
defenderiam a total autonomia do movimento estudantil frente à nova Reitoria, até porque não
havia nenhum motivo para uma decisão diferente. Abel era um político fraco, pragmático.. e
fora indicado para o cargo de Reitor pelos setores mais conservadores do estado da Bahia
naquela época. Fomos à luta e, sem o apoio do outro setor, tentamos a reeleição a base do
sacrifício, enfrentando o fortíssimo aparato da UJS e do PCdoB, que tinha interesse, mais
tarde assumido pelos próprios, em eleger para vereador o então estudante Fabrício, hoje um
pouco influente deputado na Assembleia Legislativa da Bahia. Perdemos a eleição e fomos
para oposição. Passaram-se alguns meses e todo o espalhafato prometido na época da
campanha havia ido por água abaixo. O DCE vivia fechado, os diretores sempre ausentes e o
retrato mais condizente com a situação era o da total inatividade da entidade. Houve nesse
ínterim, o surgimento de novos personagens que logo iriam se engajar nas lutas estudantis que
viriam a ser travadas adiante. Um deles, que eu julgo ter sido peça chave para a assembleia
histórica do dia 14 de setembro de 2004, fora o então estudante Lino Carneiro, também do
curso de Comunicação. Lino era um cara despojado, sem nenhuma timidez, e, graças a isso,
junto com outros colegas, percorreu nos três turnos de aula todas as salas do campus de
Vitória da Conquista convocando os estudantes para uma assembleia no dia seguinte, às 10
horas da manhã. O Estatuto do DCE garantia a convocação da Assembleia em caso de
omissão do DCE com 2/3 dos CAs/DAs assinando a convocação; foi com base nisso que ela
foi convocada. Ele, embora não muito conhecedor à época daquilo que os manuais dos
partidos de esquerda chamam de agitação, meio que intuitivamente, fazia um belo papel de
agitador. Eu particularmente não acreditava que aquela assembleia pudesse tomar as
proporções que tomou; na verdade, acho que ninguém acreditava. Mas, para a nossa surpresa,
e uma boa surpresa essa, os estudantes estavam muito indignados e, inflamados, resolveram
radicalizar. Enquanto as lideranças começavam a discursar, um grupo de estudantes partiu
para a ação e derrubou uma placa que dizia o seguinte: “Estamos concluindo o Restaurante
Universitário”. A indignação era por conta do fato da obra estar praticamente parada, apesar
da placa. Fomos direto para a Reitoria, e lá permanecemos por 10 horas. O prédio da
Administração Central ficou completamente tomado por estudantes dos três turnos. Acho que
ali a Reitoria sentiu que administrar uma Universidade em crescimento como a Uesb era uma
tarefa mais difícil do que eles imaginavam ser. E, de fato, dali em diante, a Reitoria gerida
pelo Reitor Abel não teria mais sossego. Havia sido ali declarado guerra ao Reitorado do
senhor Abel.
A assembleia deliberou pela ocupação de um prédio público como medida fundamental para
pressionar a Reitoria a construir a Residência Universitária (Sobre o Restaurante Universitário
foi dado o prazo de um mês; vencido o prazo, o Movimento iria realizar uma feijoada-protesto
no prédio da Administração Central. Talvez eles tivessem duvidado, mas de fato, 30 dias
depois, isto é, no dia 14 de outubro de 2004, o Movimento realizou a atividade e mais de 300
estudantes compareceram. As obras já haviam sido retomadas e, no final do ano de 2004, sob
forte protesto, o reitor inaugurou o Restaurante, mas terceirizou o serviço para uma empresa
privada, que, obviamente, iria administrar visando o lucro – o que, obviamente, iria repercutir
no preço da refeição e, com isso, no próprio caráter de um Restaurante Universitário, isto é,
fornecer alimentação de qualidade e a baixo custo, ou a preço de custo, ao estudante. O
Restaurante inaugurado não era, portanto, um Bandejão. Nós defendíamos gestão pública, e
foi essa a bandeira que o Movimento em seguida iria incorporar). Pois bem.. as lideranças que
estavam um pouco afastadas passaram então a se articular permanentemente.. pensando
estratégias, traçando cenários e.. o principal.. definindo o local a ser ocupado. Por razões
lógicas, acho que esse processo de escolha deve ser preservado.. a democracia brasileira é
muito cruel contra os que ela as tem como subversivos. Foi feita uma reunião bastante
representativa no domingo à tarde e, no dia seguinte, cerca de 60 estudantes lotariam um
ônibus por volta das 6h da manhã que passaria com destino à Uesb na Praça do Fórum João
Mangabeiras. O estranho é que, para a nossa surpresa, ninguém viu nada de anormal no fato
daquela multidão de pessoas estar indo para a Universidade aquela hora da manhã. Tomamos
o prédio de assalto por volta das 6:30h e dali em diante a luta pela Residência efetivamente
havia começado – exatamente no dia 20 de setembro de 2004. Em poucos instantes aquela
multidão de pessoas dava outra cara ao atual prédio da TV UESB, que na época encontrava-se
com as obras paralisadas. Pouco a pouco o jeito feminino das mulheres foi dando àquele
espaço insosso uma cara de residência-ocupação, mas uma cara com a cara daqueles
estudantes destemidos: fotos de Che Guevara, cartazes do MST, e até um Mapa do Brasil, que
eu não sei o porquê foi parar ali (risos). Foram inúmeras as ações, atos, reuniões,
mobilizações, passagens em sala de aula, pedidos de apoio, divulgação nacional dos
acontecimentos, protestos com fechamento de portões, etc. Dali até o ano de 2008 a Uesb iria
conhecer a luta implacável dos estudantes por condições de permanência na Universidade.. a
luta pela Moradia Estudantil, talvez a mais prolongada entre todas já realizadas nas
universidades brasileiras. Isso, em si, seria um outro problema, não menos importante, para o
Movimento, que iria ser ulteriormente intitulado de Movimento Rompendo Amarras: o longo
tempo que a Ocupação teria que se manter para conseguir o seu pleito.
Como disse antes, sou natural de Salvador, e tive várias residências, como era uma coisa
comum aos estudantes que vinham de outras regiões, em Vitória da Conquista. Morei em casa
de parente, em pensionato e em república. A minha adesão ao movimento, e talvez da maior
parcela dos que iriam se envolver mais efetivamente, era mais pela causa; haviam estudantes
que necessitavam da residência, que naquele momento era ocupação; as dificuldades eram
inúmeras, desde as perseguições mais rasteiras, tipo corte no fornecimento de água do
banheiro onde tomávamos banho, os vestiários do Ginásio de Esportes, ao conservadorismo
que era muito disseminado e fazia, creio eu, em certa medida, o estudante recuar de ingressar
na ocupação, como ocupante, ou residente. Todos sabem que estudante é sempre rotulado de
diversas maneiras.. seja de rebelde, num sentido vulgar, a usuário de drogas, etc. Isso
contribuía em muito para o estudante médio se sentir repelido a participar da Ocupação. A
Reitoria iria perceber essa situação e trataria, sem sucesso, de tentar isolar o movimento dessa
forma, desqualificando-o, etc. Mas o inestimável apoio que tivemos dos professores da Uesb,
tornava essa missão difícil para eles. Aqui é bom chamar a atenção também para se ver onde
está a maioria daquelas lideranças que encabeçara aquele processo; onde elas estão hoje
profissionalmente, enquanto na época eram deliberadamente desqualificadas, desprestigiadas,
pela Administração Central da Uesb, de todas as formas.
Acho que em parte esta pergunta já fora respondida no item anterior. Mas, se me permite,
gostaria de prosseguir com o relato de alguns fatos que me vêm à memória, em ordem
cronológica. Para mim, o momento mais crítico da Ocupação – que ora se confundia como
Residência, ora como Ocupação; não tínhamos muito claro isso, apesar de hoje eu entender
que aquilo era uma Ocupação pela Residência, e não uma Residência de fato e de direito – foi
após a eleição do Declare Guerra. A Ocupação, a meu ver, no seu segundo ano, isto é, no ano
de 2006, andou meio que por si própria, se é que podemos falar assim. Como falamos acima,
a rotatividade no movimento estudantil é uma coisa da dinâmica interna da vida estudantil
universitária; o estudante, em média, conclui um curso de graduação em 4 anos. Se você tem
em conta que a grande maioria das lideranças ingressam de fato, madura, etc., a partir do
segundo ano de curso, você tem aí pelo menos um a dois anos de militância ativa, levando em
conta também o fato de na fase final do curso se exigir do discente uma maior reclusão e, por
conseguinte, um certo afastamento da vida pública no interior da Universidade. Pois bem..
tínhamos isso em mente e, com a força acumulada por meses durante o primeiro ano da
Ocupação, que para mim, sem dúvida, foi o de maior impacto, vencemos com certa facilidade
a eleição do DCE do ano de 2005, derrotando, desta vez, duas chapas, sendo pelo menos uma
delas com o apoio direto da Reitoria. O que provava isso foi o fato de no dia da eleição um
ex-estudante de Comunicação que havia se tornado funcionário de confiança do Reitor estar,
junto com outras pessoas, distribuindo uma nota com declaração explícita de apoio a uma
dessas chapas. Vencida a eleição, que à época teria sido a maior eleição em termos de
participação discente realizada no campus de Vitória da Conquista, acreditávamos que talvez
o passo mais significativo para a transição para a outra geração de estudantes que estaria
encabeçando a partir de então aquele processo, ou seja, a segunda geração, havia sido dado.
No entanto, por motivos dos mais variados, a gestão Declare Guerra não conseguiu emplacar;
não conseguira sequer decolar. E isso significou para a Residência um grave problema. Tinha
claro, na ocasião, que nenhum movimento, e muito menos uma Ocupação, um
empreendimento dessa envergadura, se sustentaria sem um comando político forte, ativo e
com consciência global da situação. A partir daí, então, a Ocupação pela Residência
ingressaria numa das fases mais dramáticas, na minha opinião. Eu havia ido morar em
Aracaju no final do ano de 2005 (fui trabalhar como jornalista no Sindipetro AL/SE), e já
estava recluso desde o término da eleição para a elaboração do meu TCC. As notícias que
recebíamos eram desanimadoras. Vi com muito receio aquela situação, pois era claro que o
movimento, o MRA, estava muito debilitado. Foi aí, então, que passamos a articular, mesmo à
distância, uma recomposição desse quadro. O então estudante do curso de Comunicação Ney,
que havia participado de eventos estudantis nacionais e se despontava como uma liderança
politizada no curso, hoje funcionário da Câmara Municipal de Salvador, era para mim uma
boa opção para tentar reverter essa situação. Haviam entrado na Uesb nesse período também
ex-estudantes secundaristas que tinham participado do amplo Movimento contra o reajuste do
transporte coletivo em Vitória da Conquista no ano de 2004. Alguns deles inclusive eram
militantes do recém-criado partido de esquerda, o PSOL. Parecia que as coisas iriam melhorar
já no final de 2006 e no ano de 2007. E, de fato, melhorou. Dayane, Glauber e outros
estudantes iriam despontar como lideranças e, de certa forma, iriam dar o suporte que o
movimento pela Residência iria exigir no seu desenlace final, no ano de 2008. Eles haviam
vencido a eleição e iriam gerir o DCE no ano de 2007. A campanha-denúncia dos 1.000 dias
de Ocupação pela Residência pode ser considerada uma importante ação desse período que
visava dar visibilidade ao Movimento, que muitos, nesse período, sequer sabiam que
continuava existindo. Mas, na minha opinião, essa geração, que seria a terceira e última
geração que participaria do movimento pela Residência Universitária, iria se ver envolvida em
dilemas que para mim se constituíam em falsos dilemas: a questão da participação ou não nas
entidades (Essa crise se abateu mais significativamente sobre eles após a realização do
Terceiro Congresso do DCE e após o final da gestão). Esse foi um debate que desde 2004
existiu no MRA, animado por estudantes que flertavam com o anarquismo, bem como com
outras correntes operárias que atuam em Vitória da Conquista, mas que, durante o período em
que a primeira geração esteve à frente do processo, sempre se manteve de forma minoritária.
Num dado momento nessa terceira fase, esse debate, em certa medida, tornou-se majoritário, e
isso, a meu ver, trouxe mais prejuízos do que saldo prático e político para aquele movimento.
O sectarismo também foi uma coisa, a meu ver, que iria prejudicar o movimento mais do que
lhe ajudar a reerguer-se. E, de fato, acho que esse soerguimento não iria alcançar mais os
patamares iniciais. Mas, apesar disso, o fato é que é mérito desse grupo a condução do
desenlace final, isto é, a difícil transição da Ocupação para a Residência Universitária, que
viria ser construída na parte externa do campus, diferente do que nós pensávamos e
defendíamos, mas foi unilateralmente assim conduzida pela Reitoria exatamente no ano de
maior debilidade do Movimento, que foi o ano de 2006.
A represália de maior significância sem sombras de dúvidas foi a ação judicial movida pela
Uesb através de sua Procuradoria Jurídica. Esta, que viria a ser um mandado de reintegração
de posse, fora movida, salvo o engano, duas vezes. Uma, no momento inicial; e outra, no
final, nas conturbadas e delicadas negociações para o seu desfecho, das quais eu não
participei. Nós buscamos apoio, além dos movimentos sociais, sindicatos, partidos políticos,
etc., a órgãos institucionais, como a Câmara Municipal de Vereadores de Vitória da
Conquista, que realizou uma sessão especial para discutir o tema da Moradia Estudantil, e a
Assembleia Legislativa, que por meio do Presidente da Comissão de Direitos Humanos e
alguns outros parlamentares se fez presente na Ocupação a partir da solicitação do
Movimento. Até mesmo ao Presidente da Assembleia Legislativa da Bahia, à época o então
deputado Clóvis Ferraz, nós nos dirigimos, numa das greves que havia de mobilizar as quatro
universidades estaduais da Bahia. É claro que nós não alimentávamos ilusões de que tais
fatos, por si mesmos, seriam suficientes para equacionar o problema. Apesar de hoje crer que
cada um desses e de outros fatos, como entrevistas a emissoras de rádio e televisão de grande
audiência, inclusive em nível estadual, ter, em certa medida, contribuído, no cômputo geral,
para vencer a guerra de forças com a Reitoria, que praticamente havia cortado os canais de
negociação, exigindo, como ponto de partida para tal a desocupação do prédio, nós tínhamos
clareza da dificuldade – e até mesmo da arrogância do Reitor em ceder – que seria pôr em
prática a Residência Universitária, que hoje, em 2013, além de ser uma realidade, já completa
5 anos de vida. Nosso propósito com tais atos era expor a situação publicamente, denunciar os
absurdos, a truculência, para tentar vencer, na arena pública, de fora para dentro, a Reitoria da
Uesb. E hoje, sem dúvida nenhuma, tenho claro de que vencemos essa luta, e a Reitoria foi
derrotada. Cada um desses atos, no cômputo geral, para mim, contribuiu para essa vitória dos
estudantes, talvez a maior, única e mais amarga que o ex-reitor Abel São José teve que
aceitar.
Hoje olho para trás e sinto-me aliviado. Não me arrependo de nenhuma ação que fiz. Aquilo
que dizia sobre a luta pela causa maior hoje para mim é uma realidade materializada, e isso
nos dá uma certa satisfação, de dever cumprido, de ter participado desse processo. Não
lutamos pela Residência para simplesmente nós morarmos nela. Tínhamos clareza de que essa
era uma luta, e hoje uma conquista, da classe trabalhadora, que hoje, mesmo com todos os
trâmites burocráticos e pela insuficiência de vagas para residentes (tarefa agora que compete a
atual geração lutar contra isso, pela ampliação de vagas, etc.; a luta hoje, como dizia o hoje
engenheiro agrônomo Allan Dennizzard, se encontra em outro patamar), pode encontrar
condições distintas de permanência para seus filhos – note também que tudo aquilo ligado ao
Programa de Assistência Estudantil advém desse processo, e muitas das conquistas e avanços
são méritos das gerações mais recentes do movimento estudantil. Acho que é um desafio
dessa geração e também dos residentes de hoje e de amanhã preservar essa memória, isto é, o
fato de a Residência Universitária da Uesb campus de Vitória da Conquista ter sido produto
da luta dos estudantes. Essa é uma coisa que não pode ser deixada de lado. Nesse sentido,
acho que nada mais justo do que batizar essa criança que saiu do ventre da luta dos estudantes
com um nome de alguém que faria jus a essa causa. Eu, se me fosse permitido indicar um
nome, que poderia ser escolhido até mesmo por uma eleição entre os estudantes, indicaria o
nome do professor Carlos Nelson Coutinho, recentemente falecido no Rio de Janeiro. Por ser
baiano, natural de Itabuna, ser uma pessoa ligada a Universidade, e de uma densa e inconteste
contribuição para o desenvolvimento do pensamento crítico brasileiro, mais particularmente
do marxismo, eu diria que o nome dele seria uma justa homenagem que se casaria
perfeitamente com os quatro anos de luta que centenas de estudantes da Uesb das mais
diversas gerações se dedicaram para ver a concretização daquilo que há dez anos atrás era um
sonho e hoje, dez anos depois, é pura realidade: a Residência Universitária.
SOBRE O MRA – MOVIMENTO ROMPENDO AMARRAS
Sobre o MRA, é preciso fazer a seguinte consideração. O que era o MRA? Pois bem..
nós havíamos ocupado o prédio e isso implicava uma constante tomada de decisões e
ações políticas. Nós não éramos DCE; nós estávamos na oposição. Como então nos
identificarmos publicamente? Foi aí, então, que Allan Dennizzard, inspirado na
unificação da esquerda da UNE, salvo o engano em 1998, na disputa contra o PCdoB
que presidia e ainda preside a entidade, teve a ideia de chamar aquele movimento,
diverso no seu interior de posições políticas, de Movimento Rompendo Amarras,
MRA. A proposta foi posta em assembleia interna e aprovada. Seria essa a origem do
MRA. Por que isso é importante? Porque muitos depois, que de certa forma pegaram
o bonde andando, trataram de criticar a disputa pelo DCE no ano seguinte – que nós
disputamos com a chapa Declare Guerra a quem finge te amar – por achar que
estávamos “institucionalizando o Movimento”. Veja.. a assembleia do dia 14 de
setembro de 2004 foi convocada com base na prerrogativa do Estatuto do DCE que
permitia uma convocação por fora da entidade em caso de omissão da diretoria desta,
o MRA surgiu como Movimento de Oposição ao DCE, já que precisávamos de um
nome para se pronunciar publicamente.. as pessoas depois que passaram a querer dar
um caráter “anti-institucional”, “alternativo”, ou seja lá o que for, ao MRA, queriam
criar uma outra coisa.. e isso, naquele contexto, geraria muita confusão entre todos.
Eu particularmente tinha claro na época que a Ocupação ou a luta pela Residência
era uma parte da luta dos estudantes, e não a Luta dos Estudantes. Nós, como
estudantes, como partes do movimento político dos estudantes, não deveríamos nos
furtar de participar das outras questões que diziam respeito aos estudantes. Foi
fundamentado nesse princípio, que ainda hoje julgo correto, que nós defendemos a
disputa do DCE e éramos contra aos que argumentavam, de maneira simplista, a não-
participação nas entidades. O Declare Guerra não deu certo por problemas internos
entre seus membros, e não porque o MRA foi para o DCE, digamos assim. O DCE não
é um ser supremo, apartado da realidade; o DCE é constituído de indivíduos, e são
eles que devem dar o rumo a entidade, e não o contrário, a entidade que dá o rumo a
eles. Isso é um belo exemplo do que Marx chamava de fetiche, que aqui podemos, por
analogia, chamar de “fetiche das entidades”.
Rogério Castro - Conversa pelo Rede Social

Tranquilo, Alexandrina. Como te disse antes, a proposta éramos escrever um livro, eu e


Ildimar, sobre o assunto. A gente, com o amadurecimento, vai tendo cada vez mais uma visão
mais rica e panorâmica das coisas. O Movimento de Luta pela Residência na Uesb, ou a
história da Residência da Uesb, é, para mim, um dos mais belos exemplos do que a luta dos
oprimidos pode alcançar, talvez por ter, orgulhosamente, participado dele. Para você que é
historiadora, e hoje vejo isso com mais clareza, é um prato cheio de trabalho - e me sinto
satisfeito por minha entrevista ter te estimulado nesse sentido. Talvez as pessoas, por diversas
razões, não tenham a devida clareza do que significou aquele processo, e de que as mesmas
fizeram história - que hoje é objeto de seu estudo - ao participarem daquele movimento - que
logrou êxito: teve início, meio e fim. Te desejo muita sorte, pois, como te disse, teu trabalho, a
depender do resultado, pode sim ser publicado, e você, como historiadora, contribuir e muito
no registro do importante movimento que originou a Residência da Uesb, e que, como disse,
já entrou para a História. Fico à disposição para maiores detalhes.. acho que vc, como
pesquisadora, pode falar isso das respostas curtas diretamente com as pessoas, estimularem a
responder mais, ou fazendo novas perguntas, etc.. (as pessoas, como te disse, pode não ter a
devida compreensão do movimento.. não darem a devida importância, digamos assim.. aquela
história de que a "história" é só o que acontece com os outros, e não com a gente.. olha eu
falando isso para uma futura historiadora.. risos).. posso postar seu comentário num grupo
aqui na internet chamado MRA. Posso incentivar as pessoas a darem seu relato na entrevista,
etc.. fora isso, vc tb tem um farto material (documentos, etc.), inclusive aí em Conquista com
Ildimar, que mora, salvo o engano, no Inocoop I. Muita coisa eu deixei para as outras pessoas
falarem.. a questão da alimentação, um difícil problema.. vivíamos de doações; vc pode falar
sobre isso com Alana Cátia e Keila, que eram estudantes de Matemática; a questão da
segurança, que era um problema permanente, principalmente no primeiro ano (Felipe pode
dar detalhes disso); a questão das atividades culturais, das reuniões diárias e madrugada a
dentro no primeiro ano; o apoio dos estudantes de outras universidades, dos movimentos
sociais, da polícia no campus, o que era proibido, mas permitido pelo reitor; a dificuldade que
foi o final de ano.. nós passamos o ano novo e o natal na residência, eu inclusive fui um dos;
temiamos que se saíssemos da Casa, a Reitoria nos desalojaria a força. Enfim, Alexandrina,
isso dá uma linda história.. que hoje, para mim, só me enche de orgulho.. ter participado
daquele movimento lindo e vitorioso.. termos derrotados todos os reacionários que queriam
nos desacreditar. Enfim.. fique muito à vontade no que precisar.. dando o aval, eu falo com o
pessoal do grupo que te falei. um grande beijo! e mais uma vez, muito boa sorte!
Tínhamos comissões de diversos assuntos.. de articulação política à limpeza. Sobre
Articulação, vc precisa falar com Jessé.. pois tem coisa que eu nem me lembro mais.. e hj será
novidade inclusive para mim.. risos
Lino Carneiro - Agrônomo

Participei para contribuir com conquistas de direitos estudantis. Eu não tinha


necessidade de uma residência, mas via muitos colegas não poderem permanecer na
universidade por não terem condições de pagar um aluguel ou pensionato. Eu fui um
dos coordenadores e participei da ocupação e dos primeiros quatro meses.
Não sou de Vitória da Conquista. Eu morei em pensionato e depois sozinho. Eu
estagiava na universidade, mas dependia da ajuda dos meus pais.
Quem não luta por direitos não os conquista. Naquela época o reitor não queria nem
discutir essa questão. A minha participação sozinha não representa muita coisa num
movimento coletivo. Não podemos olhar apenas um.
Recordo da presença da policia nas nossas manifestações. Fui um dos citados na ação
da reintegração de posse impetrado pela universidade.
Não tenho acompanhado a situação atual.

Allan Denizzard Limeira Coutinho - Agrônomo

Entrei no ME por causa da aproximação que eu tinha com os movimentos sociais


campesinos e com a aproximação com a Democracia Socialista, tendência interna do Partido
dos Trabalhadores, o qual não faço mais parte. Ao Entrar no ME AGRO conheci a FEAB
(Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil) que fiz parte em toda a minha trajetória
acadêmica. [o movimento estudantil serve para] Formação política para jovens que buscam
outra forma de organização da sociedade. Formação de quadro intelectual orgânica para ter
capacidade de direção de organizações políticas.
Eu fui formado por movimentos sociais campesino e não acredito que estudante fará
revolução. O Movimento Estudantil de Esquerda precisa ter a capa cidade de formar
quadros políticos com capacidade para dirigir coletivamente uma organização de Classe. Esta
é a maior importância do movimento. É nesse mundo acadêmico que formam para o
município, pais e para o mundo. A universidade é um reflexo da sociedade e o movimento
estudantil também. Não acredito nos pensamento pós moderno, acreditando que as classes
possam viver em harmonia.
A maior dificuldade foi à questão familiar, no meu caso pesou muito, fui dedicado ao ME, me
entreguei a ele e não tenho arrependimento.
A questão acadêmica foi outro problema, eu não conseguia ser assíduo às aulas, o curso de
agronomia possui uma carga horária pesada, tive que trancar diversas disciplinas, inclusive o
curso quando a Escola de Agronomia da UESB assumiu a Coordenação Nacional da FEAB.
Com isso levei 8 anos para terminar o curso.
As outras dificuldades foram políticas principalmente as relações com os militantes da direita
do PT (kkkkkkkkkkkk antigamente tinha isso) com o PC do B (nunca tive boas relações com
este partido, até hoje tenho problemas políticos) e com o PSTU (militantes muito radicais,
mas, sem base social). Anarquistas convivi mas eu não tinha muitos problemas. Os
Independentes estes sim dava trabalho, pois eram disputados e precisávamos convencer era
um trabalho difícil, muito difícil.
O maior dos desafios foi à residência Universitária, fiz parte da primeira geração, o grupo que
deu origem a ocupação. Momentos de boicotes , policia, pressão psicológica, despejos.....
Vivíamos uma tensão sem fim, alem disso tudo os problemas políticos interno da residência.
Alexandrina essa sua pergunta para mim é complicado, em 8 anos de UESB fui um ativista
político, se for para eu responder isso, seria umas quatro páginas ou até mesmo mais. Teve a
greve estudantil de 30 dias, fizemos piquetes e trancamos o portões da UESB diversas vezes
por calendário e melhoria da qualidade de ensino, a questão da Biblioteca foi uma luta
incansável até possuirmos uma para se chamar de Biblioteca; o restaurante universitário que
foi uma luta casada com a residência.
O Congresso Nacional dos Estudantes de Agronomia em 2003, conseguimos realizar um
evento com 1200 estudantes de agronomia do Brasil com uma pauta socialista e de luta. É
uma história a minha vida na UESB.
O DCE deve perceber qual a pauta que unifica os estudantes. Esse é o principal ponto.
Estudante não quer saber sobre PT, PC do B, PSTU, MST, Via Campesina, CUT ou outros
debates políticos. Ele quer resolver o problema dele que é imediato.
No meu caso quando fiz parte da coordenação do DCE de 1999/2000 Gestão Não Vou me
Adaptar o que unificava era a Biblioteca. Partimos então para a luta da Biblioteca e dentro
desta bandeira política colocávamos debates da conjuntura política daquela época. Funcionou
desta forma. A Luta pela Resid~encia, Restaurante, greve por calendário todas as lutas foram
construída desta forma.
O DCE precisa fazer calourada para identificar os estudantes que podemos através das ideias
convencer politicamente, essa é uma estratégia que dava certo, o ME de AGRO ficou uns 15
anos em intensa luta por causa das calouradas que eram realizado pelo Centro Acadêmico.
Nunca tive decepção com o ME, sempre entendi que ele funciona de acordo a conjuntura
política. Conjuntura política com refluxo reflete no ME; Conjuntura política com lutas? ME
de Lutas. O Movimento Estudantil é um reflexo da sociedade.
Outra questão: Sempre entendi o Movimento Estudantil como espaço de formação política de
quadros para atuarem nas organizações de classe de nossa sociedade.
O meu maior contentamento é que a Residência Universitária foi a maior conquista. Uma luta
que passou por diversas gerações, desde as primeiras discussões dos primeiros militantes do
DCE que tinha Alexandre Thiago, Eduardo Leite, Danilo Moreira, Lorena, Marcão e outros....
passando pela ocupação e culminado em uma Residência Universitária de fato. Acabou? Não,
ainda tem muita luta para se fazer, a Assistência Estudantil é uma luta contínua e a residência
não para na sua construção, pois, os problemas persistem.
Sou Engenheiro Agrônomo, Assessor Técnico da COOPERCAM (Cooperativa de
Industrialização e Comercialização Camponesa) cooperativa de Assentados da Reforma
Agrária da região oeste Paranaense, e faço parte do Coletivo do SPCMA (Setor de Produção,
Cooperação e Meio Ambiente) do MST Paraná.
Fez-me um cidadão político e consciente. Contribuiu através de leituras. Quem ler nunca se
entrega. Na vida temos dois caminhos: Lutar ou se entregar. Fiz opção de Lutar. Essa opção
foi o ME que me ensinou a fazer.
Fiz Graduação em Engenharia Agronômica na UESB (Vitória da Conquista); Pós Graduação
em Agroecologia na UFSC (Florianópolis) e Mestrado em Agroecologia também na UFSC
(Florianópolis).
Sou casado, ou melhor, oficialmente estarei casado no dia 20 de julho; não possuo filhos;
trabalho como Assessor Técnico de Cooperativas (mais especifico a COOPERCAM).
Dependente eu possuo a minha mãe que financeiramente eu contribuo mensalmente para que
esta tenha condições de viver a velhice em paz, pois a aposentadoria neste país é uma
vergonha.
Ildimar França – Graduado em História
(Ex. Centro Acadêmico de História e ex-militante do MRA)
Por acreditar na utopia de transformação da sociedade: local, regional, nacional,
mundial. Influências do marxismo e de convicções particulares. Possuía residência própria.
Participei do primeiro ano de ocupação. Fui um dos idealizadores do movimento, desde
as primeiras reuniões, coletivas (mais abertas) e particulares (entre lideranças). Dentre essas
lideranças, destaco os nomes de Fabio Lúcio Martins Neto (Agronomia), Rogério Castro
(Comunicação) Allan Denizzard (Agronomia), Jessé Moreira (Agronomia), Lino
(Comunicação), dentre outros que fizeram parte do chamado núcleo duro.
Não. Sou de Piatã. Naquele movimento quase ninguém era de Conquista. Salvo Leandro
Aquino, de história, que já fazia movimento estudantil, mas que entrou no MRA, alguns
meses depois, vindo a se destacar pelas suas ideias e posicionamentos. Residia em casa
alugada, Morava com Fabio Lúcio. Ambos do movimento estudantil. Ambos, num momento,
professores de cursinho, noutros, bolsistas da UESB.
Democratização dos muros da universidade. Vontade de transformar o mundo.
Convicções políticas e ideologia marxista. Líamos muito o marxismo. Antes da residência, já
atuávamos em movimentos sociais, como MST, movimento de igreja, Centros Acadêmicos.
Para a minha casa e de Fábio, recebíamos telefonemas de ameaças. Que ligariam para os
nossos pais. Que tomássemos cuidados como nossas atitudes.
Na universidade, nossos passos eram monitorados pelos vigias da instituição.
Fui da primeira geração. Mas, tive que sair por conta da conclusão do curso.
Acompanhei de Salvador, onde fazia metrado. Aos poucos, naturalmente, perdi os laços com
o movimento e só sei que o fato se consumou. Portanto, não saberia dizer a atual situação.
Entretanto, quando passo pela UESB e vejo a residência e o restaurante, não deixo de
lembrar que fiz parte de um grupo que lutou por aquilo. Dos meses duros que passamos ali
(no processo de ocupação do MRA). Frio, as vezes, fome. Formação política. Lidar com a
diversidade. No MRA havia de tudo: ateu, homossexual, religioso, maconheiro. Preguiçoso,
revolucionário, o “descolado”, o “tímido”. Enfim... Uma diversidade, expressa nos perfis de
quase todos os cursos da universidade, cujo objetivo era um só. Portanto, o respeito, foi
fundamental para esse projeto que considero vitorioso.
Minha experiência no MRA: considerações micropolíticas1
Morgana Gomes – Graduada em Comunicação

Cheguei em Vitória da Conquista-BA em meados de 2003, para a graduação em


Comunicação Social, na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Comecei a participar
do movimento estudantil no segundo semestre do curso, em um coletivo que não era o Centro
Acadêmico, concorremos às eleições no semestre seguinte e não fomos contemplados. Em
2004, comecei a participar, junto aos colegas de outros cursos, das discussões a respeito da
necessidade de uma Residência Universitária e de um Restaurante Universitário na Uesb, bem
como de uma política de assistência estudantil que atendesse ao perfil minoritário dos
estudantes universitários, desprovidos de um berço que lhe desse acesso e permanência ao
ensino superior. Eu possuía o perfil do estudante retirante que dispõe de poucos recursos para
morar em outra cidade e todas os encargos referentes a uma formação universitária humana e
digna. Havia uma necessidade própria porque minhas condições não eram satisfatórias,
naquele momento eu vivia uma subordinação econômica do meu então companheiro, me
sentia oprimida como mulher e preferi enfrentar o Estado ao machismo, embora o machismo
não tenha desaparecido, ele estava presente o tempo inteiro, à imagem e semelhança do pai,
mesmo no movimento estudantil e na ocupação que o questionava.
A necessidade de um Restaurante Universitário, de uma Residência Universitária e de uma
política de assistência aos estudantes já vinha sendo pautada pelo movimento estudantil de
uma Universidade que crescia em números, a ocupação de um prédio público fazia parte de
um plano de ações esboçado por gerações anteriores, mas ainda não havia sido efetivada. Em
uma assembleia realizada durante uma ocupação da reitoria, que reivindicava atendimento de
demandas antigas relativas à construção do Restaurante Universitário e, após a derrubada
calorosa de uma placa que contradizia o estado da obra, centenas de estudantes deliberaram
pela ocupação de um prédio público, o que aconteceu na manhã do dia 14 de setembro de
2004, dando início ao que batizamos como Movimento Rompendo Amarras. Às seis horas da
manhã daquele dia, cerca de 80 estudantes se encontraram no ponto de ônibus em frente ao
fórum da cidade e partiram para o local escolhido para a ocupação, um prédio cujas obras
estavam paradas e que era bastante visado, possuia uma sala de videoconferência e uma
antena de TV que anunciavam um caro projeto do Estado para a Comunicação da
Universidade. Esses fatores confluíram para a escolha estratégica daquele prédio, além do fato
de ser dentro do campus, o que de certa forma resguardava o Movimento de maiores
ofensivas por parte do Estado.
O prédio não tinha condições de habitação, aos poucos improvisamos portas, janelas, pias,
chuveiro, etc, produzidos pela arte da gambiarra, nos dividíamos em diversas comissões, de
infraestrutura, limpeza, cozinha, mobilização, comunicação, segurança, negociação, entre
outras, experimentando um novo jeito de habitar, conviver e se organizar coletivamente.
Participei ativamente na mobilização dos estudantes, na escrita dos textos necessários ao
esclarecimento público dos fatos, na articulação junto à sociedade civil organizada e
movimentos sociais, na produção de atividades culturais e artísticas, não havia funções fixas
porque o Movimento era coletivo e as pessoas se dispunham de forma espontânea, então nos
revesávamos entre as diversas necessidades da ocupação, em reuniões que começavam depois
da última aula do curso noturno e que se estendiam pelas madrugadas.
Participei desde as articulações iniciais, a ocupação e sua resistência, não havia
distanciamento entre meu discurso e prática política, morei efetivamente na ocupação em seu
primeiro ano e tive outras referências de convivência e organização social, de coletividade,
diferente do modo de vida individualista com que somos educados e dos valores morais da
família e da sociedade burguesas, bem como das relações de trabalho e consumo. Minha
graduação atravessou diversas fases, no primeiro ano do curso era uma estudante
desempregada, no segundo morei na ocupação e vivia com o que conseguíamos obter
coletivamente, em um terceiro momento tranquei o curso e voltei para o machismo e, por fim,
retornei à Uesb como estudante e funcionária efetiva da Instituição, via concurso público.
O MRA estava bem articulado com diversos outros segmentos da sociedade antes de partir
para a ocupação efetiva do prédio, recebemos apoio político e material de movimentos
sociais, grupos, entidades, instituições, o Movimento ganhou uma visibilidade nacional e
tornou-se referência no movimento estudantil brasileiro, mobilizando, também, a Comissão de
Direitos Humanos da Assembleia Legislativa da Bahia. Recebemos alimentos do MST, que
ofereceu apoio na segurança, o que era uma preocupação constante, por muito tempo a
ocupação viva em um movimento contínuo 24h, tínhamos o cuidado de manter a casa sempre
ocupada, mesmo em momentos de esvaziamento da universidade, como finais de semana,
feriados e férias. A resistência na ocupação era difícil, ela não oferecia as condições
necessárias para um bem viver, havia algo que renunciávamos para estar ali, sobretudo o
comodismo de aceitar as condições da educação no Brasil e, mais precisamente, na
Universidade da qual fazíamos parte, em nome de uma experiência extraordinária que nos
amadurecia como cidadãos e como seres humanos. Passamos muitas privações, havia uma
força coletiva que nos estimulava a seguir adiante, havia a vivacidade daquela experiência, os
encontros, as aprendizagens, as questões que correspondiam às necessidades de alguns
ocupantes e ao senso de muitos outros que reconheciam a legitimidade da causa e sua
qualidade comum, de modo que o MRA não foi feito exclusivamente pelos estudantes pobres,
embora tenham sido esses os que moraram efetivamente na ocupação e que a sustentaram nos
períodos de refluxo sucessivo da sua efervescência inicial.
Sofremos diversos tipos de opressão, no início a Administração Central da Universidade
trancou os banheiros próximos ao prédio para dificultar a nossa permanência no local,
interrompiam os serviços de luz e de água, panfletos anônimos diziam que éramos terroristas
e assassinos em potencial, durante muitos dias uma viatura rondava o prédio, dia e noite,
tínhamos que conviver com a presença hostil dos policiais, não dos trabalhadores, que se
aproximavam do nosso cotidiano e se identificavam com a nossa luta, mas do que eles
representavam, a repressão do Estado, bem como a segurança patrimonial da Universidade,
que eram pessoalmente simpáticos à ocupação, apesar do ofício. Também houve tentativa
forçada por parte da Administração de adentrar o prédio, intimidando os moradores, existem
registros dispersos de imagens desses e de outros momentos mais tensos. Por duas vezes a
Universidade entrou com pedido de reintegração de posse do prédio, na primeira processava
nominalmente 7 estudantes, cobrando uma multa abusiva por cada dia de ocupação, mas
tínhamos uma boa assessoria jurídica, apoio de professores e advogados que tiveram também
uma participação política ativa na história da região, na resistência à ditadura. Ampliamos a
discussão em toda sociedade, cada passo contra o MRA aumentava a sua visibilidade,
colocando o Estado em uma situação delicada, a imprensa pautou a ocupação diversas vezes,
embora sua condição burguesa nos oferecesse, ainda, um recorte omisso e uma perspectiva
duvidosa. Havia uma pressão psicológica que perseguia todos nós, além da opressão
igualmente moral e burguesa dos próprios colegas universitários que reproduziam a
marginalização dos movimentos sociais promovida pela mídia e pelos valores capitalistas. As
mulheres da ocupação sofriam e reproduziam opressões de gênero, o consumo das drogas era
enaltecido como forma de denegrir a legitimidade do Movimento, que, aliás, nunca
amadureceu a discussão política a respeito disso, algumas fronteiras nunca foram superadas,
mas, ora, não haverá uma revolução sem a subversão da moral e dos bons costumes, como nos
mostra a história da contracultura e dos movimentos libertários. Então, havia um paradoxo
entre a prática subversiva do MRA e a reprodução dos valores por ele questionados, que
impedia o acesso e aprofundamento de determinadas questões, o que reflelia a
heterogeneidade das pessoas que transitavam pela ocupação, brancos, pretos, pobres, ricos,
mulheres, homens, homosexuais, evangélicos, ateus, anarquistas, partidários, enfim, não havia
um perfil homogêneo, mas todos confluiam para um objetivo comum, a construção da
Residência Universitária como parte de uma pauta mais ampliada de reivindições dos
estudantes. Havia um comum produzido no encontro das diferenças. Sofremos também
opressão por parte das nossas famílias, parceiros e amigos, que não aceitavam nossa opção de
incorporar uma causa coletiva, assumir uma condição de vida precária, e disso ter uma
visibilidade pública, então houve um círculo de relacionamentos interpessoais que se fechou e
outro que se abriu durante um tempo, a questão social esboçava essa fronteira, determinada,
sobretudo, pelas nossas escolhas políticas. Apesar disso, o MRA conquistou o respeito e apoio
da sociedade, independente das classes, pois não se tratava mais disso, a ocupação tornou-se
um tipo de heterotopia, como diz Michel Foucault, um espaço de liberdade, uma linha de fuga
a qual tantos recorriam para respirar além dos modelos instituídos, seja a família, a sala de
aula, o trabalho, enfim, as diversas forças cotidianas que nos aprisionam quando permitimos,
e para as quais parece não haver opção.
O MRA não foi um movimento feito por entidades representativas, era absolutamente livre,
autônomo, anárquico, ilegal, embora os estudantes envolvidos tivessem diversas
procedências, sejam sociais ou políticas, que revelaram, por fim, uma tendência à
institucionalização do Movimento e à reprodução das estruturas, o que ameaçava a sua
singularidade. Então, no decorrer do processo, o MRA começou a ganhar representatividade
estudantil através dos CA's e DCE, isso refletia sua aceitação por parte da comunidade
acadêmica e foi providencial para o amadurecimento burocrático da ocupação, pois esse era o
argumento da Administração para não reconhecê-lo como ente passível de diálogo e
negociação. A gestão Declare Guerra, da qual fiz parte no DCE, foi a primeira depois da
ocupação e certamente não correspondeu às expectativas da comunidade acadêmica porque
nunca teve a mesma força política do MRA, nem poderia ter, ela jamais poderia representar o
Movimento, surgia uma nova fronteira que parecia dividir o Movimento Estudantil entre os
ocupantes e as entidades que, teoricamente, os representavam, mas havia, entre as ambos, um
diálogo contínuo. Nunca fui favorável à institucionalização do MRA, sendo a única voz
contra em uma reunião que decidiu por isso, fiz parte de uma chapa composta
majoritariamente por mulheres, em uma eleição que mobilizou toda a Universidade e que
antecedeu uma longa greve de professores e estudantes. Mas minha permanência na ocupação
estava insustentável, tranquei o curso e saí da cidade, alimentando as estatísticas da evasão
universitária. Então fui a primeira a renunciar à gestão Declare Guerra, minhas impressões se
confirmavam a cada dia, começava a entender a falência da democracia representativa, do
modelo que estávamos reproduzindo, vivíamos um momento de desilusão generalizada, era o
final do primeiro mandato do governo Lula, havia um refluxo dos movimentos sociais no
Brasil, revelava-se a crise da esquerda nacional. Somos uma geração sem ideologia, o que nos
resta é um tipo de utopia pragmática, como aquela produzida pelo MRA antes de se diluir em
DCE e CA's, de incorporar as estruturas do Estado, como um vício do poder.
Depois de muito desgaste por parte, tanto da Administração, quanto do próprio MRA, a cena
seguiu apática, a ocupação existia como se fosse algo comum incorporado ao cotidiano da
Universidade, tudo parecia adormecido, até que novas gerações de estudantes ativaram novas
fases, que mantiveram o Movimento vivo em graus variáveis de intensidade e discernimento
político. Acompanhei e apoiei as outras fases da ocupação que durou 4 anos, até a entrega da
Residência Universitária, em 2008, que não foi pacífica, novos protestos traziam à tona a anti-
história do MRA, cujo resultado é de uma Universidade que dispõe, atualmente, de uma
Residência Universitária, um Restaurante Universitário e uma Política de Assistência
Estudantil, que, se não são as ideais, revelam estados referentes à evolução de um processo.
Novos movimentos serão necessárias para o aprimoramento das atuais condições.
Luciana Pacheco de Melo - Aluna de Jornalismo - turma 2003.1

Eu participei desde o começo de reuniões para organização do movimento, fazia parte


de um coletivo de comunicação que se reunia com freqüência para debater os problemas do
curso, da faculdade, da comunicação e da sociedade, gerando ações para ampliar esse debate.
Participei de uma reunião com outros CA´s e coletivos que decidiu pela convocação da
assembléia que originou o MRA. O movimento me empolgava muito. Eu via que muita gente
passava por dificuldades pra se manter na faculdade e também via o movimento como uma
forma de ampliação do debate e politização. A faculdade pública tem a estrutura mais
democrática que eu já vi, nos permite interferir em todos os níveis, via que esse potencial era
pouco explorado, fazendo com que a faculdade em si não rendesse tanto aprendizado,
interação e alteração da sociedade como poderia. Era muito nova na faculdade e não tinha
experiência alguma no movimento estudantil. Sempre participei chamando as pessoas,
entregando folhetos, lavando pratos... No começo participava das reuniões da residência, da
organização das festas para arrecadar recursos e do que mais fosse necessário em sentido
objetivo. De vez em quando ia passar o fim de semana na residência com o meu filho. Quando
tive problemas na casa da minha avó, precisei ir morar na residência, onde passei
aproximadamente 3 meses em meados de 2005.
Eu sou de Salvador. Fui com meu filho morar na casa dos meus avós em Vitória da
Conquista para cursar a faculdade. Recebíamos uma mesada de uma outra avó que mora aqui
em Salvador e vivíamos por tanto às custas de avós. Em 2005, começaram a tratar o meu filho
mal na casa da minha avó. Por isso, apesar de achar um ambiente inóspito para uma criança
de 4 anos, fomos morar na residência. Continuei recebendo a mesada da minha avó de
Salvador.
Bom, eu creio que a participação de todos foi importante. Uma das coisas, no meu caso,
que considero importante foram os períodos que estive por lá durante férias, feriados... Como
o pessoal de lá era de fora, a tendência era que a ocupação se esvaziasse nesses períodos e
uma ocupação não pode ficar vazia. Além disso, fui uma das que mais lavou pratos. Tinha era
gente pra comer naquele lugar!Não, eu não senti nenhum tipo de represália por parte da
instituição. Acho que ouvi uma ou outra crítica dos professores. Mas nada representativo, no
geral eles apoiavam a causa.
Infelizmente eu fui embora de Conquista para assumir um emprego na Caixa
Econômica Federal e não voltei para ver o resultado. Comemorei de longe quando soube que
finalmente a residência estava pronta. Voltei algumas vezes pra visitar a ocupação enquanto
ela ainda existia, depois não mais. De vez em quando tenho notícias de manifestações por aí, e
vejo que o movimento rendeu bons frutos. Tenho muito orgulho de ter participado do MRA.
Conheci pessoas incríveis que admiro demais, sei que muitas dessas pessoas seguem tentando
mudar o mundo de outras formas, mas ainda com muita vontade e ousadia.
Juliano - Licenciado em Geografia na Uesb - Universidade Estadual do Sudoeste da
Bahia - Professor do Estado

Participei do ME desde 2002, tinha acabado de entrar na facul e na ocasião o


atual reitor (Waldenor) tinha se afastado para concorrer ao senado federal e seu vice
(Aderbal) se afastou para concorrer a prefeitos em Itapetinga. Na ocasião, quem
deveria assumir a vaga de Reitor seria a procuradora Geral da UESB, e o Governador
(Não me lembro que era na época) mandou outra pessoa assumir tal cargo (um
interventor). Foi um momento turbulento na história da UESB. O ex-reitor Waldenor,
chamou pra briga (no braço mesmo) um estudante durante uma assembléia. Neste
momento entrei em contato com um grupo que se autodenominavam Grupo Coletivo
(de professores e de estudantes). Depois de muito embate nos corredores, houve
eleições pra Reitor (minha primeira eleição na uesb) onde fui cabo eleitoral de tal
chapa, que tinha a profa. Lívia como candidata. Lembro-me de ficarmos reunidos
noites a fio debatendo estratégias, campanha e possíveis golpes. Defendíamos o voto
universal. Por fim Abel “ganhou” tal pleito e as coisas mudaram.
Articulamos nos 3 campi, a necessidade de um congresso do DCE, montamos todo a
estrutura pra tal evento e o realizamos. Debatemos a mudança e conseguimos “criar”
praticamente outro estatuto, pois o atual estava defasado.
Puxaram-se eleições para o Diretório Central, lançamos a chapa Instinto Coletivo,
onde assumi a Coordenação de Movimentos Sociais, pois era envolvido com o MSDT
na época. Ganhamos tal eleição e fomos assumir em Jequié, numa posse tumultuada
(acredito que sumiram com as atas, pois ninguém consegue achá-las – mas é pura
burocracia). Durante nosso mandato no DCE, percebi um certo ar de traição perante
alguns grupos que o compunham ( O combinado seria fazermos um mandato
cooperativo com a chapa e o grupo coletivo). Percebi que a Coordenadora Geral, Rosa
Cândida, estava de certa forma se articulando por fora, contra tal decisão e sempre
defendia o reitor nas reuniões. Ela conseguiu por o grupo contra a minha posição e
fiquei sendo o cara malvado. Afastei-me do movimento, onde me dediquei apenas ao
movimento dos Trabalhadores Desempregados, que estava começando a surgir aqui no
nordeste. O grupo coletivo se desfez, depois de muitas brigas com esta menina (ela e
outros grupos do DCE assumiram “cargos” na reitoria). Ai que parei de acreditar em
vias institucionais e em eleições. Houve novas eleições o grupo do PDdoB assumiram
o DCE. Com um pequeno grupo de estudantes, remanescentes do grupo coletivo, que
sempre se reuniam no bar Paraki. Resolvemos nos movimentar novamente e puxamos
assembléia de estudantes, deixando claro que o DCE não tinha nada com aquilo.
Conseguimos por mais de 600 estudantes no teatro Glauber Rocha (isso contabilizado
apenas os que assinaram as listas), aumentamos tal grupo e surgiu a idéia de
ocuparmos o prédio. E o fizemos. Denominamos-nos Grupo rompendo amarras.
Comecei a distanciar deste grupo já no finalzinho quando este grupo decidiu lançar
uma chapa pra concorre ao DCE (que foi um fiasco). Sem nos institucionalizarmos,
conseguimos aglutinar tanto estudante e tava bonito o movimento, ai vem estes bestas,
e querem institucionalizar a coisa. Rompeu-se novamente e cada um foi pro seu canto.
Como estava já formando em 2007, fui cuidar de minha monografia e depois de minha
pós.
Sou de Vitória da Conquista sim. Morei um tempo com minha mãe e depois fui
morar com minha namorada e trabalhava.
Quando estamos na UESB, achamos que o mundo é só ela. Acreditava que com a
residência iríamos conseguir formar mais pessoas comprometidas com o social.
Teríamos um QG. E ajudaríamos muito estudante que não tinha condições de pagar
aluguel. Durante minha vida no ME visitei diversas universidades pelo Brasil e percebi
que muitas tinham residências. E porque a UESB não poderia ter uma? A idéia
principal era ajudar quem não tinha onde ficar.
Durante a ocupação, a reitoria entrou com um processo de despejo em nove de alguns
estudantes lembro o nome de alguns: Alan Denizard,Lino,Thais,Rogério e o meu
Juliano Oliveira.
Por incrível que pareça, não conheço a atual residência universitária. Ouço falar
que falta higiene e respeito uns pelos outros lá. O que faz que muita gente não queira
ficar hospedado lá.

Tenório – Transcrição entrevista gravada em 02/05/2013

Alexandrina - O que te levou, em que momento foi que você adentrou ao movimento?
Tenório - Acho que a pergunta fundamental não é o momento em que as pessoas
passaram a participar, e sim por que foi que fizeram a ocupação, por que foi que em
determinado momento isso virou uma bandeira de criar uma assistência estudantil na
Uesb. Desde o inicio foi para criar uma assistência estudantil na Uesb? Se não, o que
foi então que levou isso acontecer? Por que na verdade a luta pela residência surgiu da
ideia de duas pessoas, no entanto, não com intuito de se criar uma política
assistencialista aqui para estudante. A gênese da ocupação do prédio aqui atrás, do
prédio da Tv (Uesb) foi exatamente por que o curso de Agronomia tinha feito um
acordo com Abel. Abel para se eleger no primeiro mandato dele, ele fez um acordo
com o curso de agronomia, com os estudantes de agronomia de receber aqui um
evento de agronomia, não sei se estadual ou nacional, acho que era nacional de
agronomia aqui na Uesb. (46º Congresso Nacional dos Estudantes de Agronomia. A Agricultura: A via para garantir uma soberania
alimentar duradoura e sustentável para todos os povos.Agosto, 2003. UESB – Vitória da Conquista - Ba
Fonte: Currículo de Engenheiro Agrônomo )
Isso aconteceu no ano em que eu entrei aqui, no primeiro semestre de 2003. Eu entrei
no segundo semestre do ano de 2003. Esse evento ocorreu no primeiro semestre de
2003. Então o acordo de campanha era esse: o C.A (Centro Acadêmico) de Agronomia
iria trazer esse evento nacional dos estudantes de agronomia, eles apoiariam a
campanha de Abel e ele se comprometia a construir um R.U (restaurante universitário)
pra o evento e dar toda logística do evento, coisa que não aconteceu. O R.U não saiu, a
logística saiu por que os meninos ficaram em cima: “banheiro de maderite” aqui no
fundo da quadra de esporte. O pessoal do sudeste e do nordeste tomando banho gelado
por que só tinha um chuveiro quente. (...) Antes disso também, o DCE da Uesb tinha
feito a maior greve dos estudantes aqui em Vitoria da Conquista, foi num semestre
anterior. Teve a greve dos professores e depois os alunos continuaram a greve por que
o acordo feito com os professores não foi cumprido, né? Os professores chegaram e,
quando a caba a greve: bora, bora, atividade, avaliação.
Alexandrina- Quanto tempo durou?
Tenório – durou muito tempo. Parece que um mês a mais depois. Uma coisa assim.
Deve ser até visto isso pois foi um movimento interessante, que deve ser pesquisado
também. Isso aconteceu, eu ainda não tinha chegado à cidade definitivamente.
Alexandrina- Pergunto por que a derradeira greve de 2011 os estudantes também
deram continuidade a greve com a saída dos professores, mas não durou tanto apesar
da mobilização. Engraçado que é sempre o mesmo que acontece.
Tenório- Mas hoje não existe mais mobilização, hoje isso aqui virou um “coléjão”. O
movimento da residência foi o ultimo suspiro do cadáver, do defunto. Por que o
movimento estudantil morre ali com a residência. Então assim: Esses meninos de
agronomia dentro agora já num embate com a reitoria desde o evento que Abel não
tinha cumprido o que prometeu começa recrudescer as ações contra a reitoria. Nisso o
CA de Comunicação também é muito importante por que vinha batendo pesado desde
sempre, nessa época tinha Rogério batendo pesado em Abel. Foi quando eu entrei e
comecei participar das reuniões. Em cima dessas mobilizações por essas coisas
prometidas; primeiro pelo restaurante. Então os meninos de agronomia fazendo essa
campanha do restaurante. Daí, Allan Denizzard que era do CA de Agronomia mais
Lino que era do CA de Comunicação resolveram criar/fazer uma ação política para
forçar a entrega do R.U.
O R.U (restaurante universitário) pra você ter uma ideia nesse momento, só tinha
aplainado o local e a placa. Que tem o dia da placa, que a galera sai carregando a
placa, leva e coloca lá na sala, dentro do modulo do reitor. Em função disso, Lino e
Allan não falam para ninguém; só eles sabiam o quê que ia ser feito:
- Em determinado dia a gente vai convocar todos vocês, em determinado horário, pra
a gente fazer determinada coisa. Vocês não podem saber. Pra não dar merda.
Por que a gente sabia que tinham os “orelhas secas” da reitoria no meio do movimento.
Por que Abel era uma pessoa covarde, então ele tinha essa prática de espionagem, essa
coisa feia de espionar. Até durante a época da ocupação mesmo, o pessoal do curso de
comunicação, os câmeras, eram funcionários da Uesb, eles eram prestadores de serviço
da Uesb. Eram obrigados a filmar. Se você cavoucar dentro dessa Uesb
institucionalmente, tem vários vídeos feitos a mando de Abel da gente, do pessoal que
fazia parte do movimento.
Alexandrina – Dedé (Adeildison Ferreira) tem um vídeo também, tá tudo em VHS.
Tenório – Fui até eu quem deu uma dessas fitas. No dia da entrega do Ru. Foi até um
dia que a policia tentou prender uns meninos aqui e etc. e tal. Mas a gente vai chegar
lá.
(...) Ai o que aconteceu?
A ação era exatamente isso: ocupar um prédio público pra forçar a entrega do R.U. Foi
assim que se ocupa o que hoje é o prédio da TV Uesb. No dia da ocupação eu não
estava aqui. Nessa semana que aconteceu a ocupação eu fui pra São Paulo, na USP,
num seminário internacional. Mas eu estava de São Paulo ligando pra os caras daqui
pra saber o que estava acontecendo. Eu fique sabendo que iria acontecer a ocupação.
Eles me disseram que iriam ocupar. Eu também não sabia o que era. Ai o pessoal me
disse qual era ação. A ação era ocupar. Ocuparam de noite, 9/10 horas da noite.
Trouxeram esse pessoal todo pra cá de mochila, de barraca e tudo. O prédio estava
inacabado, sem porta, sem nada.
Leandro Aquino – Historiador e professor.

A razão imediata que me fez participar do movimento foi o reconhecimento da


necessidade de uma residência estudantil na UESB. Além disso, é como diz Chico
Science naquela canção conhecida: “O homem coletivo senti a necessidade de lutar.”
Sou socialista, me interesso pelas lutas sociais. Pessoalmente não precisava da
residência. Meu envolvimento ocorreu logo nos primeiros dias da ocupação; das
reuniões de planejamento do ato de ocupação eu não participei. Estive na luta como
ocupante por cerca de um ano, mais ou menos o período de duração do Movimento
Rompendo Amarras. É necessário distinguir o período de organização política da
ocupação, da ocupação sem organização política regular. O Movimento Rompendo
Amarras, responsável pelo ato originário da ocupação e por suas lutas iniciais, foi
combativo e organizado, tem muito mérito e não deve ser esquecido, mas sofreu o
desgaste acumulado dos enfrentamentos sucessivos, sentiu o peso das dificuldades
materiais cotidianas, o ônus de táticas equivocadas (como assumir o DCE), a
inevitável rotatividade que caracteriza a participação dos estudantes no movimento
estudantil. Contudo, a ocupação continuou por muito mais tempo, evidenciando que a
luta pela residência efetivamente correspondia a uma necessidade urgente. Demanda
social tratada com indiferença pelo corpo docente e com hostilidade pela reitoria. Sou
natural de Vitória da Conquista, na época morava na casa dos meus pais. Eu já
trabalhava.
Nas lutas sociais a participação individual tem importância secundária.
Pessoalmente a minha intervenção, como a de qualquer outro companheiro e
companheira, não representou mais que uma contribuição limitada e delimitada por um
quadro de relações políticas e sociais maior. Seja como for, acredito ter sido
importante minha participação, tanto nas reuniões de natureza tático-estratégica quanto
na cozinha, na hora de lavar os terríveis panelões.
(As minhas motivações apresentei na resposta da primeira pergunta deste
questionário).
Não sofri represália da instituição. Apesar de isso ter acontecido com alguns
companheiros, apesar da ocupação ter sofrido por algumas vezes a invasão de agentes
da reitoria, a administração da universidade procurou neutralizar o movimento
preferencialmente por outros meios: pela negação da sua existência, por reuniões e
pronunciamentos teatrais, pela propaganda caluniosa, pela infiltração.
Atualmente não moro em Vitória da Conquista e não acompanho a situação da
residência universitária. Sei que suas instalações distantes se encontram de satisfazer
as necessidades de uma cidade que atraí tantos estudantes, dentre os quais muitos
filhos da classe trabalhadora.
Uelber Barbosa Silva – Graduado em História

Quando eu cheguei à Universidade, em 2005, o movimento já estava instaurado e em


seu momento mais produtivo, com unidade e com um grupo oriundo de lá disputando as
eleições para o DCE, a chapa Declare Guerra. No momento eu não entendia o que era
movimento estudantil e não pensava na possibilidade de ir morar em uma ocupação dentro da
universidade, para mim naquele momento não fazia sentido, apesar de ser oriundo de uma
família pobre da periferia de Salvador. Já no segundo semestre de 2005 eu me aproximei do
movimento estudantil de História, o curso que eu fazia. Comecei a participar de reuniões e
atividades políticas na ocupação, na sala do Centro Acadêmico e em outros espaços da
universidade. Em 2006 o grupo que integrava o Declare Guerra, que havia ganhado as
eleições para o DCE, abandonou a gestão, por uma série de fatores dos quais o mais
importante foi o momento crítico por qual passava o movimento que se encontrava na
ocupação do prédio universitário. Eram momentos tensos, a universidade entrou com processo
de reintegração de posse contra alguns dos ocupantes e, além de ter cortado água e energia do
prédio, ligava para a família daqueles que lá se encontravam para dizer que era um local
exclusivo para o uso de drogas, para a prostituição etc. Claro que sexo, drogas e rock in roll é
comum em um ambiente universitário, não podemos ser hipócritas, mas o espaço da ocupação
não se reduzia a isso. Apesar dessa crise e de muitos estudantes terem abandonado o prédio
ocupado, alguns resistentes permaneceram e fizeram um acordo com a universidade para
protelar sua saída do prédio. A universidade tinha necessidade de fazer as instalações para o
Canal de Tv e Rádio universitários e o prédio deveria ser aquele. Desta forma, os estudantes
acordaram em dividir o prédio, a Tv e Rádio Uesb se instalaria em parte e na outra parte os
poucos que restaram continuariam sem ser incomodados, por determinado tempo. Em troca
disso, a universidade se comprometia em construir uma residência universitária com três
prédios para instalar definitivamente os estudantes. Já estávamos nos idos de 2007 quando eu
decidir definitivamente morar na ocupação. Neste período tínhamos conseguido fazer uma
eleição para o DCE e a chapa da qual eu fazia parte ganhou o pleito, era o DCE EM
MOVIMENTO. Logo no início do mandato uma greve docente que apoiamos integralmente e
conseguimos incluir algumas de nossas reivindicações e sentar à mesa de negociação com o
governo estadual. O ambiente externo era tenso, mas o interno era ainda mais. A reitoria nos
perseguia, mas com a ajuda de um grupo muito extenso que apoiava a nossa causa
conseguimos mobilizar, de certa forma, os estudantes e depois de fechar os portões da
universidade diversas vezes a reitoria recuou e passou a dialogar conosco. Começamos, então,
a construir o programa de Assistência Estudantil da universidade e por aí passava a residência
universitária. A gente conseguiu interferir no projeto de construção dos três prédios. De início
fizeram acordo de fazer apenas o primeiro prédio e transferir os ocupantes para ele. O projeto
era ridículo, um quarto de empregadas no apartamento de um casal classe média. Era o que
parecia! Eu era morador da ocupação e comecei a levar as reuniões do DCE para dentro da
ocupação, no intuito de fazer com que os ocupantes participassem das reuniões políticas do
movimento estudantil. Mas essa participação se tornou efetiva quando a reitoria terminou a
construção do novo prédio e o próprio movimento informou que não iria sair do prédio
ocupado. Estava começando aquilo que passamos a chamar de SEGUNDA FASE do
movimento de ocupação da Uesb da qual eu fui um dos integrantes. As duas fases foram
semelhantes, apesar da segunda fase não ter sido em nada original. Como diz Marx, em 18 de
Brumário de Luiz Bonaparte, a história só se repete como farsa. A reitoria processou
estudantes como havia feito na primeira fase, cortou água, energia, ameaçou, mandou
capangas para intimidar estudantes e tudo o mais que já estavam acostumados. Como
resposta, os estudantes passavam em sala, mobilizavam outros estudantes, professores e
técnicos. Uniam-se nos momentos mais críticos, o que também já havia acontecido na
primeira fase. E depois da mobilização aconteceu o inevitável, aceitamos sair da ocupação e
se transferia para a residência universitária.
Sou de Salvador e morei boa parte do tempo em repúblicas universitárias até passar a
morar na ocupação e depois na residência universitária da Uesb. Sempre dependi de minha
mãe, mesmo quando estagiei na universidade.
Acho que a luta individual por moradia universitária, ainda que o indivíduo seja da
cidade onde a instituição está instaurada, parte da concepção de mundo que a pessoa
construiu. Se ela é insatisfeita com a desigualdade social, com as injustiças etc. já é
fundamental para se envolver numa causa estudantil como esta.
Não sofri nenhum tipo de represália por parte da instituição.A atual residência
universitária é o reflexo da sociedade. Somos filhos da geração que bateu de frente com a
ditadura militar. Sou nascido em 1983. E agora a gente se contenta em lutar contra Marcos
Feliciano. A geração que entra na universidade é aquela que acha que o Prouni e as Cotas são
as melhores políticas que a universidade poderia vivenciar. Sofremos de um déficit de
consciência crítica.
Glauber Leal – Graduado em História
Não integrei o movimento pela residência universitária da UESB por necessidades
materiais próprias, sou natural de Vitória da Conquista e vivi na casa dos meus pais durante
toda a graduação. Nunca cheguei a morar afetivamente na ocupação, apesar de ter passado
alguns períodos dormindo lá quase todas as noites, sobretudo nos últimos momentos, pouco
antes da entrega do prédio. Minhas motivações eram ideológicas (políticas e morais), ainda
que naquele momento estes princípios fossem muito mais intuitivos que produto de uma
convicção minimamente refletida. Participei porque de alguma forma acreditava que era a
coisa certa a fazer, o que politicamente me aproximava de uma linha de pensamento mais a
esquerda - com toda a amplitude do termo, afinal eu pouco conhecia sobre a complexidade
dessa dita esquerda. Fazia pouco tempo que eu participava do PSOL, partido do qual me
aproximei após o movimento contra o aumento da tarifa dos ônibus coletivos de Vitória da
Conquista em 2005 (1,20 não!). Eu não possuía um histórico de lutas no movimento
secundarista, somente quando entrei na UESB, em 2006, tive contato orgânico com o
movimento estudantil, e minha militância partidária acabou me direcionando neste caminho.
Ingressei na universidade com mais quatro membros do PSOL (Dayane, Francisco,
Frederico e Edmilson), e possuíamos intenções claras de participar do movimento e disputar
as eleições pelas entidades representativas. A velha estratégia de se ocupar os canais de
participação política na sociedade como meio de propagandear as ideias do partido,
ampliando sua influência nos movimentos sociais. Desta forma eu, Dayane e Francisco
compusemos junto com Ney (PSTU) e outros estudantes independentes a chapa “DCE em
Movimento”, eleita em 2007. Frederico participou do Centro Acadêmico de Pedagogia neste
mesmo ano, enquanto Edmilson acabou se afastando do movimento e do partido. Debilidades
internas do nosso diretório impossibilitaram o acompanhamento do PSOL em nossa militância
na universidade, o que acabou tornando nossa militância muito mais estudantil que partidária.
A esta altura (2007), a ocupação pela residência universitária já havia completado dois
anos, e as obras da atual residência estavam paralisadas há quase um ano. Metade do prédio
ocupado já havia sido entregue para a TV UESB, em troca do início das obras da residência
universitária. Um dos objetivos do “DCE em Movimento” era retomar as negociações junto à
reitoria para impulsionar a conclusão do prédio. Neste primeiro momento não participei
efetivamente da ocupação, apesar do convívio quase diário no prédio ocupado (atual TV
UESB), graças às amizades que criei com alguns dos moradores. No período em que me
aproximei do movimento grande parte da velha guarda já havia deixado a ocupação, muito
embora novos moradores tenha chegado. Dos moradores fixos, haviam restado apenas Dayse
(geografia), Mario (história) e Fabiano “Pinicão” (história). Porém, muitos daqueles que
participaram de alguma forma do Movimento Rompendo Amarras (MRA) ainda estavam na
universidade, sendo que uma parte deles visitava o prédio com frequência. Neste momento, a
ocupação era muito mais um espaço de convivência que político. Muitas pessoas, além dos
moradores, transitavam pelo prédio todos os dias com objetivos recreativos (“jogar uma
conversa fora”, tocar violão, almoçar, assistir filmes etc.). Foi através deste convívio que pude
conhecer mais sobre a história da ocupação e do MRA, de onde partiu a iniciativa de ocupar o
prédio, e da gestão do DCE formada por integrantes deste movimento, o “Declare Guerra”.
Em outras palavras, grande parte do que sei sobre o assunto deve-se muito mais a história oral
do que a qualquer outro meio, além de panfletos antigos que estavam espalhados pela sala do
DCE.
Além deste convívio, minha participação política neste primeiro momento foi através da
mediação institucional do Diretório Central dos Estudantes (DCE). Chegamos a nos reunir
com os moradores da ocupação algumas vezes para discutir os andamentos das negociações
com a reitoria, bem como formas de pressioná-la a concluir as obras da atual residência, que
deveria estar integrada a uma política de assistência estudantil. Dessa forma, decidimos
organizar uma calourada unificada em 2007, com os Centros e Diretórios Acadêmicos (CAs e
DAs), cujo tema era a ocupação: “Viver na luta construindo a história: 1095 de ocupação”.
Promovemos oficinas, palestras, saraus, visitas ao prédio, distribuição de milhares de
cartilhas, além de algumas paralizações com o objetivo de alimentar uma comoção pública na
comunidade universitária que nos ajudasse a pressionar a reitoria com as negociações.
Tentamos, inclusive, por duas ou três vezes convocar uma assembleia geral dos estudantes
para tirar um posicionamento da base, mas a ínfima participação do corpo discente não
alcançou sequer o quórum mínimo previsto no estatuto, que, se não me falha a memória, era
3% ou 5% de um total de mais ou menos quatro mil estudantes na época.
Iniciamos um processo de articulação com outras universidades (UESC, UEFS e
UNEB), rearticulando o Fórum dos DCEs. Graças a esta articulação pudemos negociar
diretamente com a secretária de educação em Salvador pela criação de um programa estadual
de assistência estudantil, o que acabou repercutindo internamente na UESB. Promovemos
seminários para discutir essas questões paralelamente aos seminários sobre políticas
afirmativas, que envolveu a participação de estudantes, professores e membros da
comunidade conquistense. Não me lembro dos termos técnicos, mas o fato foi que
incorporamos ao regimento da UESB cláusulas que definiam categoricamente o que era
assistência estudantil e qual era o papel da universidade na permanência dos estudantes que
não podiam se manter sozinhos na cidade. Também foram sugeridas mudanças na estrutura do
prédio da atual residência, além da elaboração de seu regimento interno.
Já havíamos entregado a gestão do DCE quando se aproximou o período em que se
concluiriam parte das obras da residência, entretanto nos mantivemos organizados enquanto
grupo, junto aos ocupantes do prédio. No processo de negociação com a reitoria, tentamos
garantir que os moradores da ocupação tivessem prioridade na seleção de ingresso à nova
residência. A reitoria aceitou a proposta desde que o perfil social destes moradores
condissesse com aqueles estabelecidos pelo regimento da residência, o que os obrigaria a
passar pela avaliação de um assistente social. Aceitamos esta condição, apesar de saber que
alguns ocupantes certamente não passariam na peneira.
Foi neste momento que surgiu a figura de Tenório, um estudante do curso de história da
velha guarda que exerceu um papel chave na sequencia de acontecimentos que resultaram na
“segunda fase” da residência, o último folego da ocupação. Eu conheci Tenório nos
corredores do Módulo II e nas assembleias do curso de história. O pouco que sei dele é que já
possuía uma longa trajetória no movimento secundarista de Salvador, teve uma experiência
partidária (salve engano o PDT), além de ter acompanhado a primeira geração da ocupação
sob a liderança do MRA. Naquele período Tenório era funcionário do Departamento de
História (DH), durante a gestão do professor Alexandre Galvão, conhecido por sua atividade
sindical vinculada ao projeto petista.
No momento em que estávamos prestes a entregar o prédio da ocupação, começaram a
ser distribuídos alguns panfletos anunciando a continuidade da ocupação. Quando procurei
saber, Tenório havia incentivado Fábio e Filipe, dois dos ocupantes que não passariam na
peneira, a iniciar uma nova mobilização. Sinceramente, eu não sei quais eram as motivações
de Tenório, mas o fato é que ele é um agitador de qualidade, e sem sombra de dúvidas
incentivou muito o retorno das mobilizações. Quando percebi que a coisa estava acontecendo
decidi apoiar ativamente. Outros estudantes fizeram o mesmo, inclusive aqueles que não
faziam parte do DCE Em Movimento. A ocupação estava sendo retomada, ainda que
brevemente.
Logicamente, este fato isolado talvez não fosse o bastante dar impulso a um novo
movimento de dentro da ocupação, mas simultaneamente outros três fatores colocaram mais
lenha nesta fogueira. O primeiro deles foi a revelação do escândalo de um desvio de 13
milhões de reais pela Fundação para o Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico e Cientifico –
FATDC, onde estavam envolvidos pessoas de dentro da própria reitoria, inclusive o próprio
Abel Rebouças, até então reitor, que evidentemente se tornou o bode expiatório de nossas
críticas. Essa notícia caiu para nós como um terremoto bem conveniente.
O segundo fator foi que a reitoria já estava se sentindo bem a vontade para nos
pressionar a abandonar o prédio de qualquer jeito. Alguns membros da prefeitura de campus
entravam no local vistoriando enquanto ainda haviam estudantes morando lá, até que um dia
chegaram acompanhados com alguns guardas e pedreiros, que carregavam enorme grades
para serem colocadas nas portas e janelas, sem nenhum aviso prévio. Fomos pegos de
surpresa e reagimos de maneira bastante enérgica. O próprio Tenório estava no momento, e
começou a recolher pedras e paus, amontoando-as ao lado da entrada. Lembro-me de ajudar a
carregar as próprias grades trazidas pela prefeitura de campus para construir uma barricada
em frente. Estava montado um campo de batalha. Algumas pessoas correram para as salas de
aula e começaram a dizer que a reitoria estava nos expulsando da residência. Logo o local
estava repleto de estudantes, o que fez com que o prefeito de campus, Mauro, recuasse. Este
evento foi o estopim para o retorno das mobilizações de dentro da casa, que tinham se
encerrado a mais de dois anos.
O terceiro fator foi a nossa própria insatisfação em estar entregando aquele prédio.
Existia um forte romantismo - no mal sentido da palavra - por parte da militância com aquele
espaço, pelo que ele significava para nós, por tudo que passamos lá. Havia quase quatro anos
de mensagens deixadas naquelas paredes, era como um grande diário coletivo. Só em pensar
que aqueles desenhos e frases seriam apagados nos dava certa tristeza. Este romantismo junta-
se ao fato de que nós não estávamos satisfeitos com os resultados de nossa luta. Tudo que
havia acontecido, desde o MRA até nós, que fizemos parte do DCE Em Movimento, não
estava resultando em uma conquista satisfatória. A residência que estava prestes a ser
entregue era um verdadeiro insulto, pois suas instalações eram extremamente precárias.
Tempos depois, eu fiquei sabendo de vários moradores que deixaram a casa por não
suportarem mais viver lá. Porém, o movimento estava completamente isolado e enfraquecido,
em condições extremamente desfavoráveis para negociação. Eu particularmente, me sentia
desmoralizado com aquela situação. Estávamos fazendo de tudo por um pouco mais de
migalhas. Por exemplo, o projeto original da reitoria para a residência era contemplava três
módulos: um dormitório masculino, um dormitório feminino, e um módulo com as áreas de
convivência, como sala de TV, cozinha, lavatório etc. No fim das contas, a reitoria só
entregaria um dos módulos de dormitório, e nós tentávamos pressionar para que a
administração da universidade ao menos adaptasse melhor o prédio para servir as outras
funções, pois foi originalmente projetado com apenas quartos e banheiros. Já não tínhamos
muito poder de barganha, logo, quando surgiu um escândalo da FADTC ficamos indignados
com o tamanho do desvio em comparação as migalhas empreendidas na residência, e ao
mesmo tempo entusiasmados diante das novas condições para fazermos uma mobilização na
universidade.
Desconfio porém, que alguns grupos políticos dentro da universidade tentaram nos usar
como massa de manobra neste processo. A corrupção na FADTC e nova onda de
mobilizações da ocupação podem ter sido incentivadas naquele momento para sabotar a
imagem pública de Abel, pois na época havia um boato de que ele pretendia se lançar
candidato a deputado. Por sorte, de certa forma havia um temor de nossa parte de que a
revelação do escândalo da FADTC estava vindo à tona naquele momento por motivos
convenientes, então decidimos atacar também a oposição de Abel feita pelo PT, relembrando
que as suspeitas de corrupção vinham desde o mandato de Waldenor. Porém, é lógico que
Abel levou a pior nessa história, pois o seu nome estava em evidência, o que nos fim das
contas acabou sendo muito útil para o grupo do PT.
As acusações de corrupção de fato geraram uma grande comoção pública, além de criar
um clima para mobilizações. Além de fazer a denuncia, queríamos utilizar as circunstâncias
para fortalecer o movimento estudantil dentro da UESB. Nossa decisão em permanecer na
ocupação forçou a reitoria a tomar medidas mais drásticas. Começaram cortando a água e a
energia do prédio ocupado, e acabaram por recorrer à justiça, dando entrada em um processo
contra alguns estudantes, lista da qual fiz parte. Ameaçaram-nos com uma multa de dois mil
reais para cada dia que permanecêssemos no prédio. Felizmente eles não levaram este
processo à diante, pois no fim das contas desocupamos antes que os mandatos fossem
entregues.
A noticia do processo, porém, nos deixou muito tensos. Apostamos tudo em uma última
mobilização, tentando pressionar para uma reunião de negociação. Fechamos os portões da
UESB com pneus velhos e toras de bambu. Levamos conosco alguns pertences, como um
botijão de gás em uma galinhota, barracas de camping, colchões, jarros de flores e esteiras de
palha. Nosso objetivo era apenas criar um clima de acampamento, mas não tínhamos a
pretensão de ficar acampados no meio da pista. Logo se aglomeraram muitos estudantes,
provavelmente chocados com aquela cena incomum. Quando o espaço começou a esvaziar
decidimos nos deslocar até a reitoria para pressionar uma reunião e renegociar os termos da
desocupação. Estávamos muito preocupados quanto a nossa capacidade de pressioná-los,
entretanto tivemos uma “ajuda” inesperada. Fomos salvos por uma má avaliação do prefeito
de campus, Mauro. Quando ele nos viu aproximar da reitoria com toda aquela parafernália,
julgou mal nossas reais intenções. Imaginando que estávamos mesmo dispostos a ocupar a
reitoria, ordenou que seus portões fossem trancados, com todos que estavam dentro, inclusive
membros da sociedade civil. Ordenou também uma espécie de sítio, mantendo a universidade
fechada mesmo após termos abandonado nosso posto inicial no portão. Isso tornou o
acontecimento muito mais grandioso do que teria sido sem essa catastrófica interferência.
O bloqueio da passagem para a reitoria causou uma grande indignação daqueles que
ficaram presos lá dentro, e nós soubemos utilizar isso a nosso favor. Se no momento em que
partimos para a reitoria já estávamos no limite de nossas energias, com o “estado de sítio”
ganhamos folego e conseguimos prolongar a mobilização até o final da tarde, obrigando o
reitor Abel a nos receber. Graças à tempestade que eles fizeram com nosso copo d’água, toda
a UESB parou para acompanhar as negociações. Foi neste momento que garantimos a fim da
ocupação, desde que os processos fossem retirados, além de outros pontos de nossa pauta de
reivindicações ligados a assistência estudantil.
Desta vez entregamos o prédio de vez. A maneira como conseguimos fazer isso acabou
tornando nossa saída um pouco mais “gloriosa”, pois saímos com a moral mais elevada, com
um gostinho de vitória. Foi o nosso “gol de honra”. Minha avaliação, entretanto, é que nossas
conquistas foram muito pequenas, muito embora esta não seja uma avaliação unânime, pelos
menos dentre aqueles com quem conversei após o fim da ocupação. Acredito, porém, que a
atual residência universitária e o atual programa de assistência estudantil da UESB não são
grande coisa, e está até mesmo aquém das outras universidades da Bahia. Evidentemente, para
aqueles que moram na residência a diferença é significativa, tanto quanto qualquer
assistencialismo barato como o bolsa família. Infelizmente, migalhas as vezes fazem uma
diferença no bolso de quem precisa.
Acredito que o movimento em torno da ocupação, em suas diversas fases, tenha tido
também algumas conquistas do ponto de vista histórico. A experiência construída gerou
muitos frutos, e já faz parte para sempre da história do movimento estudantil da UESB e do
Brasil, pois não conheço registro de uma ocupação desta natureza que tenha durando tanto
tempo. O DCE Em Movimento, por exemplo, foi construído na ressaca do MRA, e eu me
considero certamente herdeiro deste legado em minha militância universitária. Da mesma
forma, a geração que nos sucedeu colheu alguns de nossos aprendizados. Alguns de nós ainda
estavam presentes na greve estudantil de 2010 que culminou na Assembleia Universitária, o
que em minha opinião foi uma experiência mais radical do que a ocupação, apesar de não ter
sido tão emblemática.
Quatro anos de ocupação foi um fato épico, mas assim como a queda da bastilha, talvez
tenha tido uma importância muito mais simbólica que substancial. A ocupação acabou se
tornando um grande mito, principalmente porque sua memória está em grande parte
circunscrita ao domínio da oralidade. Cada um conta a história como quer, e geralmente esta é
uma história contada em sua maioria por aqueles que estão engajados no movimento. O
problema é que poucos estão interessados em fazer uma crítica severa a seu próprio legado, o
que torna grande parte destes relatos um tanto ufanistas. Eu mesmo construí uma imagem
fantástica do MRA, e eram comuns os comentários saudosistas entre nós, sempre imaginando
que os nossos veteranos tiveram muito mais glórias que nós. Eu cheguei a esta conclusão mais
de um ano após o fim da ocupação, quando por acaso passei pela sala do Centro Acadêmico
de História e Comunicação, e acabei conversando com uma das pessoas que se encontrava lá.
Ela me perguntou, com certo tom de contemplação, se era verdade que alguns dos objetos
daquela sala tinham sido da antiga ocupação, o que provavelmente não era verdade.
Ao mesmo tempo em que achei incrível que estas memórias ainda sobrevivessem entre
os estudantes, mesmo depois que a ocupação deixou de existir, também me incomodei com o
ar místico destas memórias, pois acredito que este seja um terreno fértil para muitas ilusões
perigosas ao movimento. Muitas destas histórias fabulosas são construídas e reproduzidas
com a melhor das intensões por aqueles que tentam valorizar os movimentos sociais,
sobretudo porque estes são constantemente difamados pela mídia e pelos membros
“respeitáveis” da sociedade. Entretanto, não acredito que devamos alimentar ufanismos pela
sua suposta utilidade ao movimento, pois é possível que muitos dos pontos negativos
levantados contra ele sejam de fatos reais, inclusive aqueles mais graves. Negá-los pode
significar permanecer sempre no erro.
Hoje tenho críticas muito severas ao movimento estudantil, o que talvez não caiba expor
detalhadamente aqui. Considero, contudo, que minha experiência neste espaço foi
extremamente significativa para minha vida política, e com certeza minha passagem pela
ocupação cumpriu um papel importante neste sentido. Não obstante, como disse
anteriormente, em um sentido mais amplo acredito que este processo teve sua contribuição
para o movimento estudantil da UESB e para o avanço das políticas de assistência estudantil
na universidade, mas também sou pessimista quando considero que estes avanços foram
muito tímidos. Não acredito sequer que a duração da ocupação seja motivo de tanta glória.
Seus melhores momentos foram sem dúvida os primeiros meses, pouco tempo antes da
eleição do “Declare Guerra”. Foi o período onde se construiu as ações mais combativas. O
prolongamento da ocupação, em minha opinião, serve mais para demonstrar a capacidade do
Estado de vencer o movimento pelo cansaço, principalmente porque ocupações e paralizações
do movimento estudantil, assim como alguns movimentos ligados aos setores de serviços, não
causam muito impacto na sociedade. Podem ser deixados aos prantos até que se esgotem.
Hoje considero um erro ter retomado a ocupação em sua “segunda fase”, apesar de ter
demorado muito tempo para admitir isso. Foi um movimento praticamente isolado, sem forças
suficientes para enfrentar a reitoria de igual para igual. Meu romantismo cego, em particular,
me impedia de enxergar isso. Até possuíamos um plano de ocupar a outra metade do prédio,
onde estava a TV UESB, para aumentar nosso poder de barganha.
Alguns dos professores mais combativos da universidade chegaram a nos procurar,
marcando uma reunião na ocupação, onde nos chamaram a atenção para a gravidade da
situação, e nos aconselharam a entregar o prédio assim que possível, pois o momento já havia
chegado. Somente neste momento passamos a levar essa possibilidade a sério. Em meu
íntimo, eu desejava profundamente que aquela ocupação fosse eterna, que pudesse ser
transformada em um espaço de convivência dos estudantes, para que todos pudessem ter
contato com as histórias escritas e pintadas naquelas paredes. Durante muito tempo foi difícil
para mim passar em frente daquele prédio, aquilo era nosso patrimônio. Hoje sei que jamais
permitiriam que os estudantes ficassem com o espaço, e assim como em Canudos, fizeram
questão de apagar sua memória física. Aliás, minha participação no movimento estudantil
serviu, dentre outras coisas, para me fazer desapegar de muitas ilusões.
Talvez um dos grandes papeis cumprido pela ocupação tenha sido proporcionar um
intenso espaço de formação política que, sem sombra de dúvidas, a academia não oferece e
até desencoraja. Muitos estudantes passaram por aquele espaço e fizeram dele sua escola, um
aprendizado que certamente carregam para toda a vida. Da mesma forma deixaram sua marca
na história da UESB, como parte da síntese do movimento histórico. Neste sentido, a
experiência desta ocupação deve ser tomada criticamente como uma lição a todos os
estudantes que desejam, de alguma forma, dar continuidade ao seu legado.
Glauber Leal
13 de junho de 2013

Isaac Bonfim –Graduado História


A motivação para participar do movimento estudantil, não apenas do movimento
em prol da residência, se deu a partir do momento que constatei os rumos que a
educação superior tomava dentro do contexto do ano de 2007 ( Projetos de lei do
Governo Federal que tramitavam no congresso e eram discutidos dentro da
universidade desde o ano de 2005 e que tratavam da reforma universitária que entre
outras coisas aumentava a oferta de cursos a distância, o número de alunos sem o
aumento de recursos, a inviabilidade da autonomia das universidades, etc. Além dos
inúmeros problemas pelos quais a UESB atravessava, como: Falta de recursos para
assistência estudantil, falta de democracia interna nas decisões da universidade,
escândalos de suspeita de corrupção como o da FADCT), mesmo não tendo
necessidade da residência universitária, essa era apenas uma das inúmeras questões
levantadas dentro deste processo de sucateamento da educação superior, do processo
de fazer das universidades verdadeiros colégios técnicos que priorizam formar mão-
de-obra para o mercado ao invés de pessoas que possam refletir, a minha participação
se deu dentro do processo coletivo de organização do movimento e de resistência após
os processos abertos pela administração da universidade contra cinco estudantes e
estava entre eles. Sim, de Vitória da conquista, morava com os meus pais e trabalhava
ganhando um salário mínimo.
Como coloquei na primeira resposta, a luta pela residência universitária com toda
a sua importância trazia consigo uma luta muito maior, que não era apenas da Uesb e
dos seus estudantes, não era apenas um plano para assistência estudantil, tudo isso era
dentro de um processo de desmontagem pelo qual passavam e ainda passam as
Universidades Públicas no Brasil, creio que como sujeito histórico é necessário a
participação e inserção nestes processos, o mais importante foi ajudar nessa luta
coletiva, todos os estudantes que participaram da ocupação – a mais longa ocupação de
um prédio público no país na época – são os verdadeiros responsáveis por hoje, bem
ou mau, os alunos que não moram em Conquista e não tem condições de pagar os
valores absurdos de aluguel cobrados na cidade, tenham um lugar para concluir os seus
estudos, acho que essa foi a maior motivação de ter participado do movimento de
ocupação daquele prédio.
Fui processado criminalmente pela instituição – com mais quatro colegas – além,
claro, da perseguição velada por parte da Administração e também de alguns
professores.
Não tenho mais informações atualizadas sobre a situação da residência
universitária ou mesmo de como se encontra a questão da assistência estudantil dentro
da instituição, mas mesmo na época em que considerávamos a residência uma vitória
do Movimento Estudantil, tínhamos a consciência de que a reitoria não havia
cumprido a promessa que havia feito na época das negociações e que era preciso
continuar a luta mesmo sem a ocupação e foi isso que realizamos enquanto DCE
aprovando as minutas de Assistência Estudantil e de Cotas na UESB.
FOTOS E NOTAS
Derrubada da placa – 14 de setembro de 2004.

Movimento levando a placa para a reitoria.


Feijoada protesto – 14 de outubro de 2004.

Reunião no salão da Igreja antes da ocupação


Manifestações na Uesb

Campanha do CA de comunicação
Fundos da residência/ocupação

Churrasco coletivo
Lavando pratos no banheiro. Fabiano Borges “Pinicão”.

Reuniões
Reuniões

Eleições do DCE Declare Guerra


Dayse Maria e Luciano Pinicão abraçados (dois dos moradores efetivos)

Confecção dos cartazes


Apreciação antes da exposição

Exposição 3 anos de Luta


Quarto de Mário

Porta da Esperança
O diário coletivo

Arte na parede
1

2
3

4
1
2
3
4
1
2
Estudantes da Uesb ocupam prédio público e exigem Residência Universitária

COMISSÃO DE MOBILIZAÇÃO ESTUDANTIL


Nesta segunda-feira, 20/9, os estudantes da Uesb deram um BASTA a incompetência da
Administração Central da Universidade. Por volta das 6 da manhã, cerca de 60 estudantes
ocuparam um prédio em construção atrás do Ginásio de Esportes. O movimento exige que o
local seja transformado imediatamente em Residência Universitária.Trata-se de uma bandeira
histórica do movimento estudantil da Uesb e que após inúmeras promessas de várias
administrações, os discentes resolveram radicalizar e partiram para a ocupação desse prédio
público que não estava exercendo função social.
As razões para tal, deve-se ao fato de a Uesb ter tido um crescimento abrupto nos últimos
anos na oferta de cursos e, conseqüentemente, ter aumentado significativamente o número de
estudantes, principalmente, os que vêm de outras cidades do Estado e até mesmo do país. A
Universidade inchou e o orçamento não acompanhou o crescimento. Tal discussão perpassa
pela questão da permanência do estudante na universidade. Grande parte dos nossos colegas é
de famílias de baixa renda, o que impossibilita que o estudante tenha um tempo maior para se
dedicar aos estudos, já que quando não tem que trabalhar para sobreviver, passam
dificuldades financeiras e, em alguns casos, vão embora da cidade, abandonando a
Universidade por não ter onde morar. Essa é uma realidade que a Administração da Uesb não
mostra em suas propagandas enganosas.
A ocupação estudantil ocorrida na Uesb não é um fato isolado. Aqui e em quase todas as
universidades do Brasil, as Casas Estudantis sempre foram conquistadas através de muita luta
e resistência do movimento estudantil. Na Bahia, a única universidade pública estadual que
possui Residência Estudantil é a Uefs, conquistada com muita luta dos estudantes, também
por meio de ocupação. Vale ressaltar que no campus da UNEB, em Santo Antônio de Jesus, os
estudantes ocuparam recentemente um prédio público exigindo que a Reitoria da Instituição
tomasse as providências com relação a Residência Universitária. A Uesb dá um salto
importante nesse sentido, com os alunos realizando a primeira ocupação da história da
Universidade em prol da Moradia Estudantil.
A atual Reitoria está há dois anos e sequer se preocupou em discutir Residência com a
estudantada; em contrapartida, demonstra subserviência ao Governo do Estado e total falta de
autonomia ao aceitar um curso de Medicina goela abaixo sem se preocupar com a dotação
orçamentária, que, segundo dados do Fórum da Associação dos Docentes, todas as
universidades estaduais têm o orçamento reduzido desde 1998, muito diferente do discurso da
Secretária de Educação que diz que o repasse tem aumentado. Isso sem falar no Restaurante
Universitário que se encontra atrasado há mais de 400 dias e mesmo após a mobilização da
última terça (14), as obras continuam paralisadas.
O movimento tem ganhado o apoio de diversos setores combativos. Na ultima quarta, os
estudantes receberam a visita de Edmundo Dias (Andes-SN), Jose Maria (Conlutas/PSTU) e
do desembargador Rui Portanova (Associação de Juizes pela Democracia).
O movimento tem resistido aos atos de truculência da Reitoria, que mandou trancar os
vestiários para impossibilitar que os residentes tomassem banho. Para completar, foram
afixadas faixas anônimas pelo campus caracterizando o movimento como baderna.
Vale lembrar, que na última assembleia, convocada pelo DCE (UJS/PCdoB), os estudantes
repudiaram as ações da entidade, que foi para o Coneg sem consultar a base. O movimento,
também tem se posicionado contra a Reforma Universitária de Lula que, caso seja aprovada,
destruirá a universidade pública brasileira.
Comissão de Mobilização Estudantil

Apóiam essa Mobilização Estudantil:

CA de Pedagogia,CA de Agronomia,DA de Biologia,CA de Geografia,CA de Física,Conlute


(Coordenação Nacional de Lutas dos Estudantes),Conlutas (Coordenação Nacional de Lutas),
Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social – ENECOS,Movimento Negro
Unificado – MNU,Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil – FEAB,Intervozes –
Coletivo Brasil de Comunicação Social,Adusb – Associação dos Docentes da Universidade
Estadual do Sudoeste da Bahia,SIMPRO,Centro Acadêmico Filosófico Cultural do
Amazonas-CAFCA/Universidade Federal do Amazonas –UFAM,DCE da Universidade
Federal do Mato Grosso do Sul,Sindicato Municipal do Magistério Público de Vitória da
Conquista (SIMMP),Comissão Pastoral da Terra,Pastoral Cristão Universitária,Pastoral da
Crisma,Via Campesina (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, Movimento
dos Trabalhadores Desempregados – MTD, Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA,
Movimento dos Trabalhadores Atingidos por Barragens – MAB, Movimento de Mulheres
Camponesas – MUC, FEAB e CPT),DCE Carlos Marighela UESC,CA de Historia Caboclo
Marcelino UESC.
Nota lançada a comunidade acadêmica.
Lista de moradores entregue a reitoria.
1
2
Encontros festivos
Nota de Apoio ao movimento da Gestão de 2004 do PCdoB e UJS (Gestão Inovação)
Fim da primeira fase
OCUPAÇÃO 2007
Texto de comunidade do Orkut
http://www.orkut.com/Main#CommMsgs?tid=2556206325171654207&cmm=261027&hl
=pt-BR
21/09/2007
Feliz Aniversário! 3 anos de LUTA...
Cheguei em casa nesse instante, e um sono pesado me arrastava para cama. Não...Eu precisava
escrever...Passei minha noite a beira de uma fogueira, apreciando uma boa viola carregada com um
gosto de vinho. Estávamos reunidos numa tentativa simbólica de se preservar uma memória: 3 ANOS
de OCUPAÇÃO da Residência Universitária da UESB. Me emociono sempre ao entrar naquele
prédio, e facilmente me perco em suas paredes...Os anos de descaso por parte da administração ainda
perece se perpetua!Feliz aniversário Para a OCUPAÇÂO!!

Um regate histórico - Residência Universitária


Vitórias se conquistam. Há dois anos a Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia viveu um dos
momentos mais intensos de sua trajetória. Neste período, manifestações e ocupações dividiram
corações e mentes na instituição.Vitória da Conquista, ano: 2004. Em uma manhã fria do dia 20 de
setembro estudantes iniciaram a ocupação do módulo, em construção, destinado ao Centro de Estudos
Interdisciplinares e à TV Universitária. Havia seis dias que a ação fora programada, e tinha
como objetivo chamar a atenção da reitoria e da comunidade acadêmica para a questão da necessidade
de uma Residência Universitária. De acordo com o estudante de Comunicação Lino Carneiro, "seis
horas da manhã, mais de 60 pessoas estavam em frente ao Fórum Municipal esperando um caminhão
vermelho. Na verdade não era um caminhão e sim um ônibus do transporte coletivo. Entramos no
ônibus com destino à Uesb e ocupamos o prédio". Após as primeiras horas de ocupação, começaram
as negociações para resolver o impasse. A coordenação do movimento, que mais tarde viria a se
chamar MRA (Movimento Rompendo Amarras) e surgira da coesão de estudantes de diversos cursos,
reivindicava, entre outras coisas, uma solução para a questão do Restaurante Universitário e da
Moradia Estudantil. A Reitoria entendia que, dentro do arcabouço burocrático que tal questão
envolvia, a solução não se daria simplesmente atendendo às exigências do movimento. Havia ainda o
fato de que no prédio se encontravam duas salas equipadas para videoconferência. Segundo o assessor
especial da Reitoria, Carlos Alberto Andrade Freitas, "houve a necessidade de uma atitude mais
adequada por parte da gestão, no sentido de que pudesse ser resguardada a própria integridade da
universidade. O gestor público tem por obrigação responder pelo espaço físico da instituição e, como
houve uma ocupação, ou invasão, a administração tomou providência junto à justiça para garantir que
a gestão estivesse juridicamente resguardada" . Dentro do módulo o clima era de tensão. De acordo a
estudante de Geografia Dayse Maria Souza, "formamos várias comissões, de limpeza, cozinha e
segurança. À noite fazíamos turnos de guarda, pois se temia uma ação por parte da administração" .
Do lado de fora uma fogueira ardia constantemente. Nela se assava milho – recolhido nas plantações
dos projetos do curso de Agronomia - e carne. A feijoada era presença constante. Havia sempre
alguém disposto a não deixar o violão silenciar.Os dias passavam entre um misto de medo e sonhos.
Noite após noite tinha-se a impressão de um eterno luau. Muitos não mais freqüentavam aulas. "Faltar
aula sozinho é apenas uma aula perdida, matar aula em conjunto é movimento", filosofava o estudante
de História, Átila Moy. Entre manifestações contrárias e a favor, troca de acusações e questões desta
ordem, os meses foram passando. Em 10 de fevereiro de 2005 uma decisão judicial, oriunda da 2ª
Vara Cível, determinava a desocupação imediata do módulo, sob pena de uma multa diária de R$
7.000,00 (R$ 1.000,00 por aluno). No processo foram citados os estudantes Alan Denizzard Limeira
Coutinho, Lino Carneiro Júnior, Rogério Santos de Castro, Thaís Brito Silva, Juliano
Oliveira,Jonathan Santos Pereira e Alexandre Soares Andrade. O estudante de Geografia Adeildson
Ribeiro relembra que "as perseguições foram desde cortar a água até trancar o banheiro para os
estudantes não tomarem banho".
Susto
O temor de uma ação policial era constante. Uma noite, como tantas outras ao redor da fogueira, todas
as luzes do campus se apagaram. O pânico foi total, uma correria. Logo cresceu o medo de uma
invasão policial com conseqüentes prisões e violências. Apressaram-se em disparar fogos de artifício -
era o sinal combinado em casos extremos - e procuraram entrar em contato com a assessoria jurídica,
prestada pelo advogado Osvaldo Camargo Júnior. Após alguns instantes de terror vieram informações,
através de seguranças e funcionários da Uesb, que era uma queda de energia em toda a cidade.
Alarme falso, precipitação. Tudo não passara de um grande susto.Vieram as risadas, rir de si é a mais
construtiva forma de zombaria.O violão, a fogueira, o vinho, o amor... Naquela noite todas as coisas
tiveram um sabor diferente.

Embate
Na ocupação havia duas entradas, ambas permaneciam constantemente fechadas, uma com corrente e
cadeado e outra com uma enorme placa metálica.
Em 19 de abril de 2005 realizou-se na Uesb o 1º Encontro de Estudos/Formaçã o Continuada do PEI
(Programa de Enriquecimento Instrumental) . Parte da programação seria nas salas de
videoconferência, no então prédio ocupado. Houve tentativas de
negociações, mas o movimento decidiu, em assembléia, que não facultariam o acesso ao prédio.
Assim, na manhã do dia 19, funcionários da segurança tentaram serrar a corrente que lacrava a entrada
principal. Só havia cinco pessoas no Módulo, Adeildson operava uma filmadora portátil, enquanto
Morgana Gomes, estudante de Comunicação, e Kelly Prado, estudante de História, tentavam dissuadir,
com palavras de ordem, os seguranças. As duas colocaram os braços sobre a corrente, desafiando os
agentes. Fabiano Borges,estudante de História, após saltar a janela, saiu em disparada gritando que
estavam tentando retomar o Módulo ocupado. A reação foi imediata, e a cena desenvolvida é digna de
ser mencionada nos anais do Movimento Estudantil: alunos deixando as salas de aula, correndo e
formando uma multidão em frente à entrada do prédio ocupado. Os
seguranças desistiram e se retiraram. As imagens captadas dos funcionários indo embora, sob vaias,
ilustram o poder que as pessoas têm quando unidas em torno de uma causa comum.
Hoje
Em uma reunião realizada no dia 7 de outubro de 2005, um acordo foi firmado entre a Reitoria e a
direção do movimento. Toda a tensão inicial foi extinta. A Uesb retirou a ação judicial, abrindo
mão da decisão favorável, e se comprometeu em iniciar as obras da Residência Universitária.A
construção foi iniciada em janeiro de 2006, com prazo para término de 90 dias. Atualmente as obras
estão paralisadas. Carlos, assessor da Reitoria, diz "ter uma intuição que, talvez ainda este ano, a obra
possa ser concluída, senão no ano que vem". Dentre os envolvidos nesses dias agitados alguns se
formaram e muitos ainda se encontram na Uesb, acalmados pelos tempos de paz ou suprimidos pela
vida cada vez mais atarefada. Destes, apenas três ainda moram no prédio ocupado: Dayse Maria
Souza, Fabiano Borges e Josemário Cavalcante. Atualmente vivem, em média, 10 moradores. O fluxo
de alunos é grande, uns ficam alguns dias e outros, ex-moradores e amigos, freqüentam diariamente a
casa. O movimento estudantil é dinâmico. Fez ou faz parte da vida de muitos que tiveram a
oportunidade de respirar os ares da academia.No entanto, os quadros precisam sempre ser renovados.
Eis uma, senão a principal, causa das cíclicas hibernações pelas quais passa a política nas
universidades. Como afirma Morgana Gomes "o resgate histórico é uma coisa a ser pensada no
movimento estudantil, o DCE (Diretório Central dos Estudantes) deveria ter um arquivo com fotos e
imagens. Tudo isso poderia compor um acervo que valeria a pena porque, daqui a pouco tempo,
muitos que hoje aqui se encontram nãoestarão mais".
Por Alberto Marlon, Péricles Pereira e Fábio Botelho

ps.: Repassem a todos seus contatos de email, é preciso anunciar que


o movimento estudantil ainda resiste e necessita constantemente
renovar seus quadros.
"Por amor as causas perdidas"
Apoio nas lutas docentes

Quando a administração tentou tomar o prédio de surpresa. Mobilização ressurge.


Carta aberta dos ocupantes da “residência universitária” da UESB sábado, às 22h22
http://www.nucleodenoticias.com.br/2008/08/30/carta-aberta-dos-ocupantes-da-residencia-
universitaria-da-uesb/
30 de agosto de 2008
Ontém, dia 29/08/08, alguns estudantes resolveram – mesmo com parte do prédio destinado à
Residência Universitária entregue – continuar com a Ocupação do prédio que tinha como finalidade o
Centro de Estudos Interdisciplinar e hoje transformou-se na TV UESB. Alguns podem se perguntar os
motivos da continuidade, tendo em vista que a residência, mesmo não sendo o que queremos, pois
antende apenas 36 estudantes, em quartos pequenos com 08 estudantes dividindo cada um dos 04
quartos e mais 04 estudantes com necessidades especiais dividindo 02 quartos. Acontece que se é que
foi mesmo acordado algo com o movimento isso não foi cumprido. A administração da universidade
tinha prometido construir uma residência com 03 módulos – 02 para quartos e 01 para cozinha e área
de convivência -, o primeiro módulo seria construido no prazo de 90 dias e, posteriormente, seriam
construidos os outros. 02 anos se passaram para que a primeira parte da obra fosse entregue e não se
tem perspectiva de que o restante seja viabilizada. Mas para além da Residência, o movimento tem
outro caráter: trazer para pauta cotidiana dos estudantes o debate a respeito da educação que queremos
e denunciar as práticas nefastas das administrações que usam dos seus cargos públicos para benefício
próprio [o doutorado de três administradores - WALDENOR (Deputado pelo PT na Bahia),
ADERBAL (PT) e LUCAS (Acessor de Waldenor PT) - e o desvio de milhões do programa de
avicultura familiar na gestão de ABEL (PMDB com falações que se filiou ao PCdoB)]. Ontem
aconteceu aquilo que esperávamos: TENTARAM NOS COLOCAR A FORÇA PRA FORA (não
conseguiram), CORTARAM O FORNECIMENTO DE ÁGUA E ENERGIA.
O movimento vive sobre pressão. Será que eles tentarão nos tirar agora final de semana quando a
universidade estará vazia? Precisamos de AJUDA, inclusive alimentar e, sobretudo, jurídica.
Ontém foi feito uma assembléia e os estudantes estão articulados e mobilizados, resistiremos até o fim.
Aqueles que se identificam com a luta, participem, opoiem, contamos com vocês para pautarmos uma
universidade pública, verdadeiramente gratuita e com qualidade referendada nos anseios da classe
explorada e oprimida.
OBS.: Em setembro de 2008 a ocupação completa 04 anos de vida.
Uelber B. Silva
Movimento Resistência e Luta

Passando em salas. Reavivando a movimentação estudantil.


Nota do Movimento resistência e luta
At o em f r ent e
Banquinho da Paz (Arrancado pela prefeitura de campus)

Depois que a prefeitura de campos ordena o cortar da escada de acesso ao telhado de modulo I
Resistindo até o ultimo suspiro

Buscando inspiração em grandes mentes


Apoio dos veteranos no debate nas eleições para DCE – 2007/2008
RESIDÊNCIA ATUAL - Ainda 1/3 da obra que foi projetada em 2004.

Area externa

Cozinha
Sala de estudos

Sala de estudos
Quarto feminino
Quarto feminino

Quarto masculino
Guarita

Sala de convivência
Área externa lavanderia. (Finalmente a casa é entregue)

Comemoração entre estudantes, professores, artistas, membros da luta.


O velho rango coletivo

A luta é continua. E a viola não pode calar...


REFERÊNCIAS:

Apostila FATEC – Faculdade de Teologia e Ciências. Economia e Mercado: A ECONOMIA


COMO UMA CIÊNCIA SOCIAL - Acesso em 17 de outubro de 2013, disponível em:
http://www.fatecc.com.br/ead-moodle/gestaoproducaologistica/economiaemercado.pdf

CARDIM, Adriano C.C e PRATES, Agnes - A inserção da pauta LGBT através do


movimento estudantil na UESB. Disponível em :
http://www.uesb.br/eventos/semana_economia/2012/anais/f01.pdf

Edital de seleção para a residência da UESB - http://www.uesb.br/editais/2013/04/Edital-


079-13-PRAE.pdf

MARINHO, Marcos Silva e OLIVEIRA, Maria Alice Costa Fernandes - Residência


Universitária: a moradia enquanto direito x especulação imobiliária na cidade de
Vitória da Conquista/BA. Disponível em:
http://www.uesb.br/eventos/semana_economia/2012/anais/f03.pdf

PAULIN, Pedro Iris. "A Desobediência Civil e os Movimentos Sociais." REVISTA DE


DIREITO CONSTITUCIONAL E INTERNACIONAL - VOL.74. Ano 19 - janeiro-março 2011.
Disponívelem:
http://www.pucsp.br/iniciacaocientifica/20encontro/downloads/artigos/PEDRO_IRIS_PAULI
N.pdf

THOREAU, Henri David – Desobediência Civil, 1849. Versão Digital eBooksBrasil,2001.


Disponível em: http://www.ip.pt/~ip234535/

VANDRESEN, Daniel Salésio - O conceito de heteropia em Foucault. Publicado em


17/06/2011. Acesso em 21/12/2013. Disponível em:
http://aufklarungsofia.wordpress.com/2011/06/17/o-conceito-de-heterotopia-em-foucault/

Entrevistas:

AQUINO, Leandro. Entrevista, 29 de abril. 2013.


BONFIM, Isaac. Entrevista, 26 de maio. 2013.
CARNEIRO, Lino. Entrevista, 31 de julho. 2013.
CASTRO, Rogério Santos de. Entrevista, 26 de abril. 2013.
COUTINHO, Allan Denizzard. Entrevista, 15 de maio. 2013.
FRANÇA, Ildimar. Entrevista, 26 de maio. 2013.
GOMES, Morgana. Entrevista, 22 de maio.2013. Disponível em:
http://morganapoiesis.wikispaces.com/MrA
L.P.O. Entrevista, Vitória da Conquista, 13 agosto. 2013.
LEAL, Glauber. Entrevista, 13 de junho. 2013
LIMA SOBRINHO, Tenório Batista. Entrevista, 02 de maio. 2013.
OLIVEIRA, Juliano Ribeiro. Entrevista, 19 de abril. 2013.
PACHECO, Luciana. Entrevista, 22 de julho. 2013.
SILVA, Uelber Barbosa. Entrevista, 01 de maio. 2013.

Sites:

http://www.residencia.ufba.br/r1/

http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1275

http://www.ebah.com.br/content/ABAAAAmdcAE/apostila-economia

http://ujcrj.blogspot.com.br/2013/05/nota-da-uniao-da-juventude-comunista.html

http://www.nucleodenoticias.com.br/2008/08/30/carta-aberta-dos-ocupantes-da-residencia-
universitaria-da-uesb/

http://www.pstu.org.br/node/10261

http://www.pstu.org.br/juventude_materia.asp?id=2538&ida=0

http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_26/rbcs26_03.htm

http://www.nucleodenoticias.com.br/2008/09/05/estudantes-tentam-ocupar-reitoria-da-uesb/

http://nacildadecampos.blogspot.com.br/2008/04/interpretao-da-msica-de-chico-buarque.html

VÍDEOS:

http://www.youtube.com/watch?v=ZaAvPswXlRs
MRA – Movimento Rompendo Amarras - 2004/2005 (Parte 1/3)
http://www.youtube.com/watch?v=IF1YRv1ODNU
MRA – Movimento Rompendo Amarras - 2004/2005 (Parte 2/3)
http://www.youtube.com/watch?v=hS80BvEQL3U
MRA – Movimento Rompendo Amarras - 2004/2005 (Parte 3/3)
http://www.youtube.com/watch?v=M58k0HyUTLQ
Ocupa e Vem pra LUTA! - UESB - Residência Universitária - 2008

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