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PODER 

JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 9ª REGIÃO

5ª TURMA
CNJ: 0101800-82.2008.5.09.0562
TRT: 01018-2008-562-09-00-2 (RO)

V  I  S  T  O  S, relatados e discutidos estes autos de


RECURSO ORDINÁRIO, provenientes da VARA DO TRABALHO DE PORECATU,
sendo recorrentes UNIÃO  e  MINISTÉRIO  PÚBLICO  DO  TRABALHO  -
PROCURADORIA  REGIONAL  DO  TRABALHO  DA  9ª  REGIÃO  -  OFICIO  DE
LONDRINA e recorridos OS  MESMOS,  USINA  CENTRAL  DO  PARANÁ  S.A.
AGRICULTURA  INDÚSTRIA  E  COMÉRCIO,  JORGE  RUDNEY  ATALLA,
(ESPOLIO DE)JORGE WOLNEY ATALLA, JORGE EDNEY ATALLA e JORGE
SIDNEY ATALLA.

I - RELATÓRIO

Tratam-se de recursos ordinários interpostos pelo Ministério


Público do Trabalho e pela União, manifestando inconformismo com a r. sentença de fls.
1266-1280, proferida pelo Exmo. Juiz Mauro Vasni Paroski, que acolheu parcialmente os
pedidos iniciais da Ação Declaratória de Nulidade de Atos movida pela Usina Central do
Paraná S.A. e seus proprietários em face da União e da Ação Civil Coletiva, movida pelo
Ministério Público do Trabalho em face da Usina Central do Paraná S.A. e seus
proprietários.

A pretensão recursal da União é de reforma do julgado no


tocante a: a) A política nacional para erradicação do trabalho escravo / As bases

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5ª TURMA
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TRT: 01018-2008-562-09-00-2 (RO)

constitucionais e infraconstitucionais de proteção ao trabalhador e de repúdio ao trabalho


escravo e ao trabalho em condições análogas à de escravo / A existência de trabalho em
condição análoga à de escravo; e b) O poder-dever do Estado Brasileiro de punir e
erradicar o trabalho escravo e o trabalho em condições análogas à de escravo e a
presunção de legitimidade dos atos do GEFM do Ministério do Trabalho.

O recolhimento do depósito recursal e das custas processuais


não foi efetuado, conforme a previsão constante no art. 1º, IV e VI, do Decreto-lei nº
779/69

Os réus Jorge Edney Atalla, Jorge Sidney Atalla, Jorge


Rudney Atalla, Usina Central do Paraná S.A. Agricultura Indústria e Comércio e (Espolio
De)Jorge Wolney Atalla deixaram de apresentar contrarrazões, não obstante regularmente
intimado.

A pretensão recursal do autor Ministério Público do


Trabalho - Procuradoria Regional do Trabalho da 9ª Região - Oficio de Londrina é de
reforma do julgado no tocante a: a) A prevalência da eficácia dos direitos fundamentais
frente à autonomia da vontade do trabalhador / A limitação da vontade no campo das
relações entre particulares / A limitação da autonomia da vontade no âmbito das relações
de trabalho / A atuação do MPT em favor da cogência da Lei; e b) Os trabalhadores
atingidos que propuseram reclamatórias individuais.

O recolhimento do depósito recursal e das custas processuais


não foi efetuado, conforme a previsão constante no art. 1º, IV e VI, do Decreto-lei nº
779/69

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Os réus Jorge Edney Atalla, Jorge Sidney Atalla, Jorge


Rudney Atalla, Usina Central do Paraná S.A. Agricultura Indústria e Comércio e (Espolio
De)Jorge Wolney Atalla deixaram de apresentar contrarrazões, não obstante regularmente
intimado.

Os autos não foram enviados ao Ministério Público do


Trabalho, ante a desnecessidade de seu pronunciamento.

É o relatório.

II - FUNDAMENTAÇÃO

1. ADMISSIBILIDADE

Conheço dos recursos ordinários interpostos, por atendidos


os pressupostos legais de admissibilidade.

2. MÉRITO

RECURSO ORDINÁRIO DE UNIÃO

1. A política nacional para erradicação do trabalho


escravo / As bases constitucionais e infraconstitucionais
de proteção ao trabalhador e de repúdio ao trabalho
escravo e ao trabalho em condições análogas à de escravo
/ A existência de trabalho em condição análoga à de
escravo / O poder-dever do Estado Brasileiro de punir e
erradicar o trabalho escravo e o trabalho em condições
análogas à de escravo e a presunção de legitimidade dos
atos do GEFM do Ministério do Trabalho

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O Ministério Público do Trabalho adentrou com a presente


ação civil coletiva com pedido de antecipação de tutela em face de Usina Central do
Paraná S/A Agricultura, Indústria e Comércio e seus proprietários, sob a alegação de que
foram encontrados, nas instalações da ré, 155 trabalhadores em situação de trabalho
degradante, desprovidos de condições básicas de adequações às normas ambientais, de
modo que se enquadravam enquanto vítimas de falta grave praticada pelo empregador.
Tal fato ocorreu em uma ação fiscal do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, composta
por membros da Procuradoria Regional do Trabalho da 9ª Região, Auditores Fiscais do
Trabalho, Delegado e agentes da Polícia Federal, no dia 06 de agosto de 2008.

Aduziu que se tratava de trabalho degradante em decorrência


das seguintes situações verificadas no referido ambiente: i) ônibus de transporte de
trabalhadores em condições inadequadas e sem autorização de transporte de trabalhadores
rurais; ii) transporte de ferramentas junto dos trabalhadores; iii) transporte juntamente
com produtos agroquímicos e refeição; iv) exames que avaliam a exposição a
agroquímicos pelos trabalhadores sem nenhum critério de acompanhamento; v) ausência
de máscara respiratória para aplicação de agroquímicos; vi) utilização do mesmo
vestuário para aplicação do agroquímico durante toda a semana; vii) prática inadequada
de transporte, manuseio, preparo e aplicação dos agroquímicos, bem como ausência dos
EPI's; viii) não observância do procedimento adequado à descontaminação e higiene
pessoal dos trabalhadores que manuseiam agroquímicos; ix) ausência de vestiários; x)
ausência de plano de resgate de trabalhadores que porventura sofram contaminação
aguda; xi) caudas dos agrotóxicos preparadas com risco de contaminação ao meio
ambiente e aplicadores em plena atividade sem o cumprimento das condições mínimas de
segurança; xii) não disponibilização de água potável para os trabalhadores; xiii) ausência

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de hidratação adequada aos trabalhadores; xiv) ausência de banheiros; xv) ausência de


refeitórios; xvi) trabalhadores sem EPI's; xvii) trabalhadores adquirindo seus próprios
EPI's; xviii) asuência de kit de primeiros socorros; xix) conduta omissa da equipe da
Segurança e Saúde do Trabalho; xx) moradias incompatíveis com o nível mínimo de
adequabilidade, com falta de luz elétrica e instalações sanitárias; xxi) irregularidades nos
exames médicos realizados; xxii) trabalhadors sem registro na CTPS; xxiii) ausência de
depósitos do FGTS; xxiv) não recolhimento das contribuições previdenciárias; xxv) não
pagamento do salário de julho de 2008; xxvi) atraso contumaz do pagamento dos salários;
xxvii) ausência de regular controle de ponto dos trabalhadores rurais; xxviii) excesso de
jornada; xxix) não concessão de repouso semanal; xxx) não concessão de intervalos para
repouso intra e interjornada.

Diante de tal situação, foram lavrados centenas de Autos de


Infração e interdições nas frentes de trabalho. Pleiteia a declaração de rescisão indireta
dos contratos de trabalho, por falta grave do empregador, em decorrência da existência de
trabalho degradante e condição análoga à escravidão. O pedido liminar foi no sentido de
bloquear as contas bancárias do réu, na quantia de um milhão de reais, para fins de
garantir o pagamento dos créditos dos trabalhadores. E ainda, sustentou pedido de
antecipação de tutela da rescisão indireta.

Em decisão sobre a antecipação de tutela, expôs o MM. Juiz


Mauro Vasni Paroski:

"...

Diante desse quadro, o que se tem constatado é que na falta de


alternativas no mercado de trabalho, os trabalhadores de Porecatu e
região submetem-se às condições de trabalho oferecidas pelo GRUPO
ATALLA, por mais indignas que sejam.

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Não se resolve o problema de forma definitiva apenas declarando


indiretamente rescindidos os contratos de trabalho, pois, em curto prazo,
os trabalhadores estarão novamente sendo empregados do GRUPO
ATALLA na mesma atividade, apesar de todas as irregularidades
encontradas pelo GEFM. Em resumo, termina-se o CONTRATO
VELHO e depois de algum tempo forma-se um NOVO CONTRATO,
com as mesmas características no que se refere à precarização da
prestação de serviços e aos inadimplementos de obrigações legais pelos
demandados.

(...)

Há trabalho em condição degradante? Há precarização do trabalho


humano? Pela experiêncai do Juízo (não extra-autos, mas em processos
sob sua responsabilidade), a resposta é afirmativa. Mas, não é de hoje, e
sim, há décadas.

Desse modo, não se mostra presente o requisito consistente no receio de


dano de difícil reparação ou irreparável, que possa justificar o
provimento antecipatório, menos ainda em sede de decisão inaudita
altera pars. A fumaça do bom direito é manifesta, mas não o perigo da
demora.

(...)

Visto o problema de outro ângulo, há que ser considerado, ainda, os


próprios interesses dos trabalhadores encontrados em condições
degradantes, pois, é perfeitamente possível que os mesmos, a despeito
de todas as irregularidades e violações constatadas, podem não desejar
as rescisões indiretas dos contratos de trabalho, pelas mais variadas
razões, entre elas a falta de alternativa no mercado de trabalho local.

(...)

Por todo exposto, INDEFIRO a antecipação de tutela postulada." (fls.


942/948)

Em contestação, a ré alega ilegitimidade do MPT, eis que


estariam defendendo direitos individuais dos trabalhadores, fugindo da sua esfera
constitucional de competência de atuação. No mérito, aduziu que os trabalhadores não se
encontravam em condições análogas à de escravos e que não procedeu à rescisão indireta
dos referidos contratos de trabalho porque os empregados eram necessários ao
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empreendimento, eles não querem despedi-los, eis que os empregados necessitam do


emprego e dos salários e ainda, que a maioria dos empregados não deseja a rescisão.

Alegou ainda que os atos praticados pelo GEFM são nulos,


sob a alegação de que declararam a rescisão indireta dos contratos de trabalho dos
empregados informalmente, sem qualquer documentação, sendo que nem poder para tanto
detinham.

Apensou-se aos presentes autos a MC


00959-2008-562-09-00-9 e da Ação Declaratória de Nulidade de Atos (principal) (fl.
1117), diante dos objetos e pedidos das ações.

Na referida Ação Declaratória movida em face da União


Federal, a Usina Central do Paraná S/A. e seus proprietários pedem nulidade dos atos
praticados pelo GEFM, afastando-se a declaração que 120 empregados teriam sido
"libertados", eis que se encontravam em condições análogas a de escravidão, suplicam
ainda a declaração de nulidade dos Autos de Infração expedidos, mantendo-se em curso
os contratos de trabalho dos empregados.

Em contestação, a União inicialmente alega inépcia do


pedido inicial e insurge-se alegando que a atividade de Inspeção do Trabalho insere-se no
poder de polícia estatal, de modo que as sanções aplicáveis são aquelas legalmente
estabelecidas. Assevera o poder-dever do Estado Brasileiro em punir e erradicar o
trabalho escravo e o trabalho em condições análogas à de escravo e a presunção de
legalidade dos atos do GEFM.

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Narra a atual política nacional para erradicação do trabalho


escravo e as cita as bases constitucionais e infraconstitucionais de proteção ao trabalhador
e de repúdio ao trabalho escravo e ao trabalho em condições análogas à de escravo e por
fim, estabelece as razões que os empregados da Usina são enquadrados em trabalho
análogo à de escravo.

Em sentença, o MM. Juízo de origem inicialmente narrou


alguns esclarecimentos iniciais, bastante pertinentes:

"Público e notório em Porecatu e região, o que dispensa provas, ex vi do


art. 334, inc. I, do CPC, que a USINA CENTRAL DO PARANÁ,
conhecida e antiga usina de açúcar e álcool, juntamente com as pessoas
físicas que lhe administram (JORGE RUDNEY ATALLA, JORGE
WOLNEY ATALLA, JORGE EDNEY ATALLA e JORGE SIDNEY
ATALLA), são proprietários de extensas áreas rurais, que somam
milhares de alqueires (estados do Paraná e São Paulo), destinadas ao
cultivo da cana-de-açúcar, empregando anualmente, em épocas de
estabilização dos negócios, de três mil a cinco mil pessoas, seja no corte
e no plantio da planta, na adubação, na capina, no preparo do solo e em
outras atividades agrárias, seja na usina propriamente dita, no
processamento/moagem da cana colhida, para a produção de açúcar
(parte visando atender ao mercado interno e parte para exportação) e
álcool.

Também é fato por demais conhecido na região, portanto, notório, que


em virtude de problemas de grande monta em três geradores de energia
elétrica, cujo reparo, em regra, exige mão-de-obra especializada, é de
alto custo e pode demandar várias semanas ou meses, a cana-de-açúcar
que ocupa as referidas áreas rurais deixou de ser colhida e a atividade
industrial de moagem para a fabricação de açúcar e álcool foi paralisada,
em final de outubro/início de novembro de 2007. Somente agora, no
início de junho de 2009, mais de ano e meio depois da paralisação, a
atividade econômica da Usina Central do Paraná S.A. (UCP) foi
retomada.

Mesmo assim, a UCP manteve um quadro expressivo de empregados,


parte deles sem trabalhar e parte trabalhando em ritmo mais lento que o
habitual, conservando-se os contratos de trabalho e pagando-lhes as
respectivas remunerações, ainda que com algum atraso.
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Em razão deste longo período de crise, houve mora salarial em alguns


meses no início e no meio do ano de 2008, que exigiu atuação enérgica
desta Vara, em demandas propostas pelo Ministério Público do
Trabalho, objetivando solução para o pagamento dos salários em atraso.
Houve ainda, manifestações públicas de protestos por trabalhadores da
UCP, em parte comandados pelos sindicatos representativos de suas
categorias profissionais, em parte pela interferência do pároco local.

Em agosto de 2008, atendendo a denúncias que não são conhecidas


desta Vara quanto à sua origem, mas comenta-se na cidade que teriam
partido de algumas pessoas e entidades de Porecatu, incluindo o pároco
local (embora este juízo não tenha condição alguma de afirmar que os
comentários nesta direção têm ou não procedência), esteve na região,
EXCLUSIVAMENTE para fiscalizar o cumprimento da legislação
trabalhista pelo GRUPO ATALLA, bem como as condições de trabalho
dos seus empregados, o chamado GRUPO ESPECIAL DE
FISCALIZAÇÃO MÓVEL (GEFM), criado pelo Governo Federal com
a finalidade primordial de erradicação de todas as formas de trabalho
forçado (entre eles o trabalho realizado por trabalhador reduzido à
condição análoga à de escravo e o trabalho em condições degradantes).

No caso em exame, o GEFM era formado por auditores fiscais do


Ministério do Trabalho e Emprego, acompanhados por um Delegado
Federal e vários Policiais Federais, todos portando armas de fogo, além
do acompanhamento por membros do Ministério Público do Trabalho.
As operações, em alguns momentos, pelo que se viu na imprensa e pelo
que se comenta na cidade, chegaram a ser cinematográficas. O trabalho
perdurou por duas ou três semanas. Resultou na lavratura de centenas de
autos de infração, colheitas de depoimentos, interdição e embargo de
alguns setores de trabalho da UCP, interdição ônibus utilizados no
transporte de trabalhadores rurais (alguns de propriedade de pessoas
físicas ou jurídicas terceirizadas) e, ainda, num suposto resgate de
trabalhadores reduzidos à condição análoga à de escravo, com
fornecimento de guias do seguro-desemprego (para alguns deles) pelos
integrantes do GEFM, tudo documentado em DVD e em 44 volumes
que compõem os autos do processo ora em apreciação (mais sete
volumes encadernados, não numerados).

Rendeu ainda, aos integrantes do GEFM exposição na mídia, entrevistas


a jornais e televisões locais, além de notas oficiais publicadas em vários
outros veículos de comunicação da imprensa nacional e internacional,
incluindo sites na internet. Claro que tudo isso em benefício do interesse
coletivo, do bem público.

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Pois muito bem, quase um ano depois, é triste constatar que tudo
continua como dantes no quartel de abrantes, relembrando surrada frase
popular.

Fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego não resolve, ações


civis públicas não surtem plenamente os efeitos esperados, multas
milionárias aplicadas por esta Vara não inibem, decisões judiciais não
assustam.

Os sindicatos de trabalhadores da região continuam fazendo o que


sempre fizeram: nada, ou, numa visão mais generosa, quase nada. A
comunidade local está em permanente estado de letargia, como há
décadas.

Os advogados de trabalhadores, os que militam nesta Vara, dezenas


deles, querem mercado de trabalho e não demonstram a menor
preocupação em contribuir para transformar esta realidade para melhor.
Não estudaram e não são pagos para isso. São profissionais e precisam
ganhar dinheiro. Responsabilidade social igual a zero. Querem a
litigiosidade; querem a eternização destes problemas, enfim, querem
clientes.

Assim, remanescem, com alguma possibilidade de atuar para


transformar tudo isso para algo mais humano, melhor, o Judiciário
Trabalhista e o Ministério Público do Trabalho, e claro, também o
Ministério do Trabalho e Emprego. Empenho não tem faltado, dentro do
que é permitido pelo ordenamento jurídico-constitucional.

Diante da determinação do GEFM, que a UCP e as pessoas físicas suas


proprietárias entenderam ilegal e abusiva-, de que fossem rescindidos os
contratos de trabalho dos empregados encontrados em suposta condição
análoga à de escravo, aqueles ajuizaram ação cautelar inominada, com
pedido de liminar inaudita altera pars, além de terem efetivado o
depósito judicial das quantias relativas às verbas rescisórias calculadas
até então (Autos MC-00959-2008-562-09-00-9, anexos), de 120
empregados, no montante de R$ 294.964,64, o que se deu em
15.08.2008, através de Guia de Depósito Judicial Trabalhista, perante o
Banco do Brasil S.A, agência de Porecatu (f. 67 e 90 dos autos da ação
cautelar).

Este magistrado, na mesma data (15 de agosto de 2008), analisou e


deferiu parcialmente a liminar requerida, para que "... sem prejuízo de
revisão posterior, caso os elementos probatórios dos autos venham a
indicar quadro fático e legal que possa embasar outro entendimento,
determinando ao Grupo Especial de Fiscalização Móvel que se
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ABSTENHA de exigir dos requerentes rescisão contratual compulsória


dos empregados supostamente encontrados em situação análoga à de
escravo ou em condições degradantes" (f. 70-76 daqueles autos,
anexos).

Em 15 de setembro de 2008, os requerentes da cautelar inominada


ajuizaram a ação principal em face da União Federal (demanda
declaratória de nulidade de atos). Alguns dias antes, em 05 de setembro
de 2008, o Ministério Público do Trabalho havia ajuizada a ação civil
coletiva.

Embora explorando perspectivas distintas, a causa de pedir em ambas as


ações é a mesma, ainda que em parte, sendo os autores de uma, réus na
outra. Em outros termos, os pedidos fundam-se nos mesmos fatos. A
exigência legal de identidade de partes (no plural) não impede a reunião
dos processos, apenas porque na ação declaratória ré é a União Federal.
Trata-se apenas de uma questão processual que precisa ser adaptada ao
caso concreto. Não há dúvida que o objeto da ação civil coletiva é mais
amplo que o da ação declaratória, abrangendo o desta.

Penso, e posso estar equivocado, cuidar-se de caso especial de


continência (CPC, arts. 104 e 105). Em razão da continência, os autos
foram reunidos em um só processo (despachos de f. 1.117 e 1.211 e
certidões de f. 1.119 e 1.213), para instrução e julgamento numa mesma
oportunidade.

Nas três demandas (declaratória, civil coletiva e cautelar inominada)


houve apresentação de resposta escrita (f. 103/147 dos autos da MC,
apensos; f. 1.154/1.204 - 6o volume; e 969-1.007 - 5o volume), juntada
de documentos e oportunidade a todos os sujeitos parciais da relação
processual para a produção dos demais meios de provas que entenderam
adequados e pertinentes.

Feitos estes esclarecimentos, necessários, até mesmo porque muito


provavelmente esta sentença não será a última manifestação do
Judiciário sobre o que constitui o objeto da prestação jurisdicional
pretendida pelos demandantes nestas duas ações, e assim, faz-se mister
pôr a par do que se sucede em Porecatu outros julgadores que
desconhecem a realidade relatada, deve-se, sem perda de tempo, julgar
as pretensões da UCP e outros e as do Ministério Público do Trabalho.

Há que se verificar, antes, porém, se existem, de uma das partes ou de


ambas, as famosas - e quase sempre infundadas - preliminares de
mérito." (fls. 1266/1268)

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Afastou as preliminares de inépcia da inicial e impugnação


ao valor da causa, alegadas pela União na Ação Declaratória e afastou a preliminar de
ilegitimidade do MPT alegada pela Usina na ação coletiva.

No mérito da Ação Declaratória, o MM. Juízo esclareceu que


intimou os 120 trabalhadores alegadamente em condição análoga à de escravos, sendo
que destes, compareceram 104 na Secretaria da Vara e, diante de declarações levadas a
termo, 50 manifestaram vontade em continuar a prestar serviços à Usina e seus
proprietários, sendo 45 manifestaram vontade de rescisão do contrato de trabalho.

Decidiu o MM. juízo que o caso fático não era de condição


análoga de escravo, eis que:

"Não há no ordenamento jurídico norma ou princípio que confira aos


auditores fiscais do MTE a atribuição de exigir do empregador o
transporte de trabalhadores para local por eles determinados, visando
pagamento de verbas rescisórias, sob justificativa de que se encontram
em condição análoga a de escravos, mesmo contra sua vontade, e
mesmo sendo passível de questionamento judicial esta conclusão inicial,
ou seja, baseado exclusivamente numa valoração a priori, extrajudicial,
sem observância das garantias processuais constitucionais do devido
processo legal

O chamado resgate, salvamento ou libertação de trabalhadores


reduzidos à condição análoga à de escravos, por membros do MTE,
integrantes do Grupo Especial de Fiscalização Móvel é de fundamental
importância no combate e na erradicação de toda e qualquer forma de
trabalho forçado, mas há uma razão muito clara para isso, implícita nas
normas legais reguladoras da matéria: o resgate é necessário porque, por
si mesmos, esses trabalhadores não têm condição alguma de se
rebelarem contra o empregador, eis que sua liberdade individual é
restringida ou, nos caos mais graves, completamente eliminada, por
coação em suas mais variadas formas (física, psicológica, econômica,
moral etc.).

Os trabalhadores, em condição análoga à de escravo, ficam,


literalmente, "presos" aos estabelecimentos em que prestam serviços sob

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condições desumanas e degradantes, tornando necessária a ação


enérgica dos auditores fiscais do trabalho para libertá-los, com o reforço
da Polícia Federal e acompanhamento por membros do Ministério
Público do Trabalho.

Por esta razão mesma, justifica-se a previsão legal de preenchimento e


entrega de formulário especial para viabilizar o acesso ao
seguro-desemprego, dando-lhes, assim, a oportunidade de manutenção
do sustento de si próprios e suas famílias, enquanto procuram nova
colocação no mercado de trabalho.

Todavia, no caso em exame, pelas provas coligidas ao caderno


processual e pela experiência de mais de sete anos deste magistrado na
região (março de 1999 a novembro de 2002 na MM. VT de Rolândia,
desde janeiro de 2006 nesta Vara), atuando em processos jurisdicionais,
em demandas voltadas contra a UCP e outros, não existe esta
necessidade, simplesmente porque não há restrição de liberdade, nem
coação ou outros óbices que os impeçam de deixarem as unidades
agrárias da parte passiva, considerando rescindidos os respectivos
contratos de trabalho, constituindo advogados e ingressando em juízo,
individual ou coletivamente, como, aliás, há nesta Vara exemplos de
dezenas de trabalhadores que ajuizaram demandas individuais e
continuam prestando serviços à parte passiva.

Ainda que fosse adotado outro entendimento, não há razão jurídica


razoável capaz de tornar subsistente a ordem dada pelos integrantes do
GEFM aos demandados, para que providenciassem transporte dos
trabalhadores em questão para determinado local, bem como, o
pagamento de verbas rescisórias.

Pelo exposto, limitando-se ao quanto postulado (CPC, art. 128),


ACOLHO o pedido de letra "b" (f. 1.133 - 6o volume dos autos), para
declarar a ilegalidade de ordem desta natureza, por sua absoluta
impropriedade, desprovida de embasamento jurídico. "

Entretanto, afastou o pedido de declaração de nulidade dos


atos praticados pelo GEFM, eis que foram exaustivamente documentados nos mais de 40
volumes deste processo, de modo que incumbia à Usina demonstrar um por um, vício de
legalidade.

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Já na Ação Civil Coletiva, com relação ao pedido de rescisão


indireta dos contratos de trabalho, decidiu-se na origem que o MPT não pode atuar em
juízo contra a vontade dos trabalhadores, de modo que levou em consideração as
declarações colhidas na Secretaria da Vara, determinando que: i) para os 59 empregados
que declararam desejar continuar trabalhando para a Usina e seus proprietários, rejeita-se
o pedido de rescisão indireta e pagamento dos haveres rescisórios; ii) para os 51
empregados que não se manifestaram até o momento da decisão, tem até o momento da
liquidação para manifestar interesse em rescindir o contrato, caso contrário, não haverá
rescisão indireta do contrato de trabalho e consequentemente, o pagamento das verbas
rescisórias; e por fim; iii) excluiu-se dos efeitos desse processo, 16 empregados que
ajuizaram demanda individual e outros que por ventura também o façam até o momento
da liquidação da sentença; iv) condenou-se a Usina e seus proprietários, solidariamente,
ao pagamento das verbas devidas da rescisão indireta quanto aos demais trabalhadores
que manifestaram interesse na rescisão do contrato.

Recorre a União, quanto a sentença proferida na Ação


Declaratória, entretanto, não obstante a União traga, em suas razões recursais, importantes
traçados sobre a política nacional de combate ao trabalho escravo, da importância das
ações do GEFM, as bases legais e constitucionais de vedação ao trabalho em condições
análogas à de escravidão e a legitimidade dos seus atos, bem como a narrativa da situação
fática vivenciada na referida ação, vê-se que sequer rebateu os fundamentos da sentença,
se limitando a repetir exatamente os termos apresentados em contestação.

Nada alegou a respeito dos fundamentos do MM. Juízo a quo


para deferir a declaração de nulidade das declarações de rescisão indireta e da obrigação

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de fornecer transporte coletivo. Cumpre ressaltar que incumbia à parte recorrente


manifestar-se de forma precisa contra todos os fundamentos que embasaram o julgado,
em atendimento ao princípio da dialeticidade. Verificando-se ofensa ao referido princípio,
deve prevalecer a decisão de fundo, vez que não foram apresentados argumentos aptos a
desconstituir os fundamentos da sentença.

A propósito, já se manifestou essa C. 5ª Turma:

"RECURSO QUE ATACA APENAS UM DOS FUNDAMENTOS DA


SENTENÇA. INAPTIDÃO PARA REFORMA. Revela-se inapto para a
reforma da decisão de primeiro grau o recurso que ataca apenas um de
seus fundamentos, quando o outro é suficiente para mantê-la. Recurso
ordinário não provido.
(TRT-PR-02710-2008-678-09-00-1-ACO-40637-2009 - 5ª TURMA.
Relator: RUBENS EDGARD TIEMANN. Publicado no DJPR em
24/11/2009)" (Destaquei)

Nada a alterar, portanto.

RECURSO ORDINÁRIO DE MINISTÉRIO PÚBLICO


DO TRABALHO - PROCURADORIA REGIONAL DO
TRABALHO DA 9ª REGIÃO - OFICIO DE
LONDRINA

1. A prevalência da eficácia dos direitos fundamentais


frente à autonomia da vontade do trabalhador / A
limitação da vontade no campo das relações entre
particulares / A limitação da autonomia da vontade no
âmbito das relações de trabalho / A atuação do MPT em
favor da cogência da Lei / Os trabalhadores atingidos
que propuseram reclamatórias individuais

Com relação à decisão primeira quanto a declaração de


rescisão indireta dos contratos de trabalho de parte dos empregados apenas, insurge-se o

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Ministério Público do Trabalho, alegando que os réus praticaram 30 faltas graves -


violações à legislação trabalhista - em face de 155 empregados. Aduz que se tratam de
irregularidades capazes de expor a risco a saúde, a integridade física, a vida dos
empregados propriamente.

Assevera que os direitos fundamentais devem ser defendidos


frente às relações privadas, principalmente no caso em tela, no qual a desigualdade
apontada entre as partes é ainda mais acentuada. Nesse sentido, o MPT afirma que os
direitos à saúde, à integridade física e direitos trabalhistas decorre da limitação da
autonomia da vontade e assim, deixar de declarar a rescisão indireta de todos os
trabalhadores seria reconhecer válida a renúncia de direitos que são conferidos aos
trabalhadores.

Insiste no fato de que os trabalhadores encontravam-se em


condições análogas à de escravo, eis que atualmente, pela redação do art. 149, do Código
Penal, a caracterização do trabalho em condições análogas à de escravo não mais
centra-se no tolhimento da liberdade de ir e vir. Aduz ainda que "não se trata da vontade
do MPT atuar contra a vontade do trabalhador, mas, muito ao contrário, cuida-se de o
MPT atuar em favor da vontade da Lei, que é a sua atribuição institucional indeclinável "
(fl. 1489).

E por fim, afirma que os 16 trabalhadores que foram


excluídos dos efeitos da sentença porque propuseram demandas individuais devem
também ter seus contratos rescindidos indiretamente, sendo que os valores recebidos
nesta ação devem ser compensados na lide individual.

Vejamos.
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Não se olvida que restaram demonstradas inúmeras violações


aos direitos trabalhistas dos empregados das rés, dentre eles, em especial, a ausência de
condições básicas de higiene, como ausência de sabão para lavar as mãos antes das
refeições, bem como ausência de lugar apropriado para as refeições e por fim, falta de
banheiros em consonância com a NR 31. Ainda, restou incontroverso que a ré atrasou,
por diversas ocasiões, os salários dos empregados, bem como não depositou as
contribnuições previdenciárias e FGTS, entretanto, tal situação, ao menos pelos fatos
narrados nos autos, já foi sanada em ação própria.

Restou amplamente demonstrado, pelos documentos


juntados pelo Ministério Público do Trabalho, relativos à ação realizada pelo GEFM, que
não havia o correto fornecimento e substituição dos EPI's, bem como não foram
respeitadas as normas no que diz respeito aos agroquímicos, que eram transportados
prontos juntamente com os trabalhadores e sua aplicação era arriscada no que diz respeito
à saúde dos empregados.

Entretanto, não houve demonstração, nos autos, do excesso


de jornada, ausência do respouso semanal e intervalos intra e interjornadas.

Já no que diz respeito ao transporte dos trabalhadores rurais,


verifica-se que as rés fornecem, através de ônibus próprios e terceirizados, transporte
precário aos seus empregados, uma vez que os veículos (ônibus) não possuem autorização
específica e alguns deles possuem adaptação para transportar mais pessoas do que sua
capacidade.

Em que pese tais fatos restarem amplamente demonstrados


nos inúmeros volumes do processo, resta controvertido o enquadramento de tais situações
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enquanto condição análoga à de escravo, que requeira a "libertação" da totalidade dos


empregados, tal como pretende o MPT, através da declaração de rescisão indireta dos
contratos de trabalho.

Vejamos a atual redação do art. 149, do Código Penal:


"Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos
forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho,
quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o
empregador ou preposto."

Ou seja, caracteriza-se como condição análoga à de escravos,


a verificação de i) trabalhos forçados; ii) jornadas exaustivas; iii) condições degradantes
de trabalho; e iv) restrição da locomoção do trabalhador.

Não há dúvidas que não se constata no caso ventilado


nestes autos a realização de trabalhos forçados, jornadas exaustivas e restrição na
locomoção dos trabalhadores, restando somente analisar se a situação que se encontravam
os empregados era, de fato, caracterizada como condição degradante de trabalho.

De acordo com Luiz Guilherme BELISARIO, "trabalho


degradante é aquele realizado sem respetio às regras de segurança e medicina do trabalho,
que violam o direito a uma vida digna e a integridade física dos obreiros", porém, não
seria qualquer violação às regras de segurança e medicina do trabalho, tratam-se de
situações de incredulidade. (BELISARIO, Luiz Guilherme. A redução de trabalhadores
rurais à condição análoga à de escravos. São Paulo: LTr, 2005. p. 117)

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Em precedente citado pelo referido autor, numa Ação Civil


Pública no Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (01049-2003-411-01-00-1),
utilizou-se como elementos de convicção do trabalho degradante "pelas condições do
alojamento ou moradia, pela água e pela alimentação colocada à disposição dos
trabalhadores, bem como pelo grau de descumprimento das normas de segurança e saúde
do trabalho." (p. 121)

A Ilustre Desembargadora Marlene T. Fuverki Suguimatsu,


deste E. Tribunal, teve oportunidade de enfrentar a questão em um artigo jurídico,
analisando o Relatório Global da OIT a respeito do trabalho forçado, no qual concluiu
que:

"Não obstante a proximidade dos conceitos e as comuns imprecisões


terminológicas, o Relatório Global permite algumas conclusões: a)
'trabalho forçado' é uma expressão genérica, que abrange algumas
práticas abusivas de apropriação de trabalho alheio; b) seus elementos
definidores são a imposição, sob ameaça de punição (que vai além da
punição penal) e a natureza involuntária do trabalho; c) são formas de
'trabalho forçado', a 'escravidão' (estado ou condição de duma pessoa
sobre a qual se exerce poder decorrente do direito de propriedade, em
caráter permanente) e a 'condição análoga a de escravo' (que abrange a
servidão por dívida e da gleba, tráfico de pessoas, entre outras); d)
'condições extremamente precárias de trabalho' podem ou não
caracterizar 'trabalho forçado', dependendo da natureza e gravidade dos
mecanismos coercitivos empregados." (SUGUIMATSU, Marlene T.
Fuverki. Condições de existência digna, direitos mínimos do trabalhador
e o paradoxo do trabalho escravo ou em situação análoga a de
escravidão)

Ou seja, como se observa somente as condições


extremamente precárias podem ser consideradas como análogas à de escravo e ainda,
deve-se sempre considerar o uso de mecanismos coercitivos, de acordo com o Relatório
Global da OIT.
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Conclui ainda a Desembargadora que entre as principais


características das formas modernas de trabalho forçado, estão as restrições à liberdade de
locomoção, retenção de documentos de identidade e ameaças de denúncias às autoridades
no caso de migração ilegal¿. Ainda, o tráfico interno e entre fronteiras e a coerção ao
vulnerável grupo de trabalhadores domésticos.

A jurisprudência também tenta criar parâmetros de quais as


situações degradantes de trabalho podem ser enquadradas como condições análogas a de
escravo:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - TRABALHO ANÁLOGO AO DE


ESCRAVO - O conjunto probatório revela que os  trabalhadores  que
prestavam serviços ao Réu não apenas não tinham CTPS assinada,
mas também estavam sujeitos a condições absolutamente indignas a
qualquer  laborista,  seja  pela  inexistência  de  equipamentos  de
proteção,  primeiros  socorros  a  despeito  da  atividade  desenvolvida
estar  impressa  de  possibilidade  de  lesões,  seja  pela  moradia
absolutamente  sem  estrutura,  ausência  de  água  potável,  direito  à
intimidade, seja, ainda, pela formação de truck system configurado
na indução do trabalhador a se utilizar de armazéns mantidos pelos
empregadores em preço, em regra, superfaturado, inviabilizando a
desoneração  da  dívida. Nesse passo, devem ser julgados procedentes
os pedidos afetos a obrigações de fazer e não-fazer, sob pena de multa
diária. A indigitada situação deve ser veementemente combatida;
considerar o trabalho em condições aviltantes como normal em face das
circunstâncias de determinada região do País é transgredir a finalidade
ontológica do Judiciário e fazer letra morta a legislação tutelar do
trabalho. A dignidade da pessoa humana é um dos mais importantes
pilares do Estado Democrático de Direito. (TRT 10ª R. - RO
00011-2004-811-10-00-6 - 2 ª T. - Relª Juíza Flávia Simões Falcão -
DJU 06.05.2005 - p. 21) (grifo nosso)

Na situação ventilada no julgado acima, observa-se que


alguns traços delineadores, como: i) dependência econômica (sistema truck system); ii)
total inexistência de EPI's; iii) moradia sem qualquer estrutura; iv) ausência de primeiros
socorros; v) ausência de água potável; vi) ausência de direito à intimidade. Na situação
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abaixo, as condições dos empregados eram ainda mais degradantes, uma vez que
moravam em barracas de zinho, de chão batido e sem camas!

RELAÇÃO DE EMPREGO - CONDIÇÕES DE TRABALHO


DESUMANAS E DEGRADANTES CONFIGURANDO O CRIME DE
REDUÇÃO À CONDIÇÃO ANÁLOGA À DE ESCRAVO - AUTO
DE INFRAÇÃO DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO -
SUBSISTÊNCIA - É inadmissível que, em pleno século XXI, empresa
agrícola localizada em uma das regiões mais ricas do Estado da Bahia,
onde ocorre o plantio e o cultivo de soja, contrate empregados,
sujeitando-os a condições de trabalho desumanas e degradantes,
alojando-os em barracas de zinco, de chão batido, sem camas, muito
menos instalações sanitárias ou refeitórios. Tal conduta, além de violar
preceitos internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos
Humanos, que estabelece, no art. 23, que 'toda a pessoa tem direito ao
trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições eqüitativas e
satisfatórias de trabalho', ofende princípios fundamentais da Carta
Magna consistentes na dignidade da pessoa humana, no valor social do
trabalho e na proibição de trabalho desumano ou degradante (incisos III
e IV do art. 1º e inciso III do art. 5º). (TRT 05ª R. - RO
00715-2006-661-05-00-8 - (Ac. 19282/07) - 2ª T. - Relª Desª Dalila
Andrade - DJBA 07.08.2007)RJ02-2008-C2

O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região também se


manifestou sobre condição análoga a de escravidão, quando caracterizada pelo trabalho
extremamente degradante, como "modernamente concebida como "trabalho em
condições análogas à de escravo", em violação à organização do trabalho, e
configura-se infração penal descrita nos tipos legais dos arts. 149, 131, parágrafo único,
203 e 207 do Código Penal. Para a sua caracterização não é necessário o cerceio da
liberdade de locomoção do trabalhador, mediante o aprisionamento deste no local de
trabalho. Basta a configuração da falta de condução, da dependência econômica, da
carência de alimentação e de instalações hidro-sanitárias adequadas, do aliciamento de
mão-de-obra, dentre outros." (0227-2005-129-03-00-1)

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E, por fim, o Tribunal Regional do Trabalho se manifestou


no sentido de que não há configuração de trabalho degradante quando há o registro
funcional dos empregados e esses possuem total liberdade de ir e vir:

ESCRAVATURA - ABOLIÇÃO - CONCEITO MODERNO DE


TRABALHO ESCRAVO OU ANÁLOGO - FUNDAMENTO
CONSTITUCIONAL E LEGAL - ATUAÇÃO INIBITÓRIA DO
PODER PÚBLICO - NOTÍCIA DE SITUAÇÕES IRREGULARES - R
E G U L A M E N T A Ç Ã O - A escravatura foi abolida em 1888 pela
Lei Áurea e proibida pelas Constituições republicanas em respeito à
dignidade da pessoa e do trabalho humano, que recepcionaram a norma
imperial. O Estado brasileiro, em decorrência do comando
constitucional, modernamente tem inscrito os conceitos que permitem
vislumbrar situações de escravidão dissimulada ou de situação análoga à
de escravo pelos trabalhadores, podendo adotar medidas no sentido de
inibir práticas que deturpem o histórico de repulsa à exploração
degradante do ser humano. O conceito de trabalho escravo emerge
inequívoco, tanto assim que a Lei Áurea, ao declarar libertos os
escravos, não precisou conceituar quem eram os beneficiários da
abolição da escravatura. As normas internacionais subscritas pelo
Estado brasileiro, assim como aquelas do próprio ordenamento interno,
permitem inibir práticas espúrias de exploração humana e dão campo à
atuação do Governo na instituição de regulamentos específicos de
conduta interna, como a inscrição do nome dos sujeitos e empresas que
hajam explorado trabalhadores como escravos ou em situações
análogas. Constitucionalidade e legalidade das Portarias
MTE-1.234/2003 e MTE-540/2004, que instituíram o Cadastro
conhecido por "lista negra do trabalho escravo", desde que observado
que o ato concreto de inscrição do nome de qualquer sujeito ou empresa
como escravocrata não pode fugir dos preceitos que a própria
Administração Pública tenha elegido como razoáveis, como a atualidade
da prática nefasta, a regularização das condições de trabalho, o
cumprimento das obrigações fiscais com o pagamento das multas
aplicadas e das obrigações trabalhistas e previdenciárias (Portaria
MTE-540/2004, art. 4º e parágrafos). ATO CONCRETO DE
INSCRIÇÃO NO CADASTRO CONHECIDO POR "LISTA NEGRA
DO TRABALHO ESCRAVO E ANÁLOGO": EXIGÊNCIAS:
VÍCIOS: VERIFICAÇÃO DE CASO CONCRETO: DISTINÇÃO DE
PRECEDENTES: SITUAÇÃO DE DEGRADAÇÃO DO
TRABALHADOR COMO SER HUMANO: INEXISTÊNCIA:
CAMPO DE ADEQUAÇÃO DA INSCRIÇÃO: IMPROPRIDADE DA
AUTUAÇÃO OPERADA PELA FISCALIZAÇÃO DO TRABALHO:
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EFEITO: CASSAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO:


PROCEDÊNCIA DO PEDIDO ANULATÓRIO. Situação concreta:
vício do ato de inscrição do nome do Autor no Cadastro previsto nas
Portarias MTE-1.234/2003 e MTE-540/2004, porque a autuação pela
Delegacia Regional do Trabalho não revelou que o empregador atuasse
como escravocrata, nem descreveu irregularidades quanto ao contrato e
registro funcional, tendo os obreiros dito como em condições
degradantes localizados em área urbana, em hospedarias enquanto
aguardavam transporte para a área rural onde deveriam empreender
atividades, sequer tendo ainda começado a prestação de serviços em
favor da empresa contratante, estando a muitos quilômetros de distância
do local de trabalho e sem qualquer impedimento ao livre ir e vir ou ao
dispor de seu próprio tempo na espera empreendida na cidade.
Impossibilidade de haver trabalho escravo quando não há efetivo
trabalho prestado, nem tendo sido os obreiros submetidos a condição
degradante pelo empregador, ao contrário tendo sido efetivados os
registros funcionais conquanto ainda aguardassem a chamada para
iniciar o labor, enquanto isso tendo liberdade de ir e vir na cidade onde
se hospedaram. Situação da hospedaria alheia à atuação patronal.
Inscrição imprópria efetivada pela Secretaria de Inspeção do Trabalho:
fuga dos limites contidos na própria regulamentação interna relativa ao
trabalho em condições análogas à de escravo. Remessa oficial e recurso
da União conhecidos, preliminar de nulidade rejeitada e, no mérito,
desprovidos. (TRT 10ª R. - RO 30500-97.2009.5.10.0012 - Rel. Des.
Brasilino Santos Ramos - DJe 21.05.2010 - p. 69)

Observa-se que tanto a jurisprudência e a doutrina se


esforçam em fixar critérios para a definição de trabalho degradante enquanto condição
análoga a de escravo, considerando a gravidade de tal enquadramento. Diante de tal
contexto, conclui-se que somente o trabalho extremamente degradante pode ser
considerado, quando não há qualquer condição de moradia, alimentação e higiene e
ainda, quando ocorram atos de coercitividade ou alguma forma de dependência
econômica, ainda que haja liberdade de ir e vir.

No caso em tela, sequer foi ventilada a hipótese de


dependência econômica, até porque os empregados recebiam salários efetivamente, ainda
que houvesse algum atraso. Ademais, também não foi constatada situação absolutamente

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PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 9ª REGIÃO

5ª TURMA
CNJ: 0101800-82.2008.5.09.0562
TRT: 01018-2008-562-09-00-2 (RO)

precária de moradia, tanto que, com relação aos empregados que moram na sede da
Usina, o Ministério Público do Trabalho se absteve de pleitear a rescisão do contrato de
trabalho, eis que era essencial à sua sobrevivência. Nesse sentido, observe que os casos
em que se constatou situação degradante, os trabalhadores dormiam em barracas.

Por mais que se constate irregularidades e desrepeito à


dignidade dos trabalhadores no que se refere à condições de higiene, transporte e
alimentação, são condições que não se enquadram como extremamente degradantes, a
ponto de se equiparar à moderna escravidão. Ainda, há que se enfatizar que o GEFM
constatou precariedade no fornecimento do EPI's, que eram inadequados, havia falta de
reposição de equipamentos danificados, mas não a total ausência de fornecimento, como
se observa do seu relatório à fl. 33 dos autos.

Deste modo, considero que não há, na situação em foco,


condição análoga a de escravidão por trabalho degradante, eis que este requer a presença
de situações extremas de ausência do mínimo à prestação laboral, tanto que a maioria dos
trabalhadores escolhem, livremente, continuar trabalhando para a ré, ainda que em
mesmas condições.

Em decorrência, ausente o trabalho escravo, não há que se


falar em inclusão dos 16 trabalhadores que possuem reclamatória individual já
distribuida, eis que, ao adentrarem com seu pedido idêntico (rescisão indireta do contrato
de trabalho), renunciaram a sua representação nesse processo coletivo.

Mantenho a sentença, portanto.

III - CONCLUSÃO

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5ª TURMA
CNJ: 0101800-82.2008.5.09.0562
TRT: 01018-2008-562-09-00-2 (RO)

Pelo que,

ACORDAM os Desembargadores da 5ª Turma do Tribunal


Regional do Trabalho da 9ª Região, por unanimidade de votos, CONHECER dos
recursos ordinários das partes. No mérito, por igual votação, NEGAR-LHES
PROVIMENTO, nos termos da fundamentação.

Custas inalteradas.

Intimem-se.

Curitiba, 09 de fevereiro de 2012.

FRANCISCO ROBERTO ERMEL
Relator

#12

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