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Direito Penal

Teoria do crime
EXTENSIVO DPE
CURSO RDP
Direito Penal

SUMÁRIO

DIREITO PENAL ................................................................................................................................................................................. 5


1. BEM JURÍDICO PENAL .......................................................................................................................................................................... 5
2. FUNCIONALISMO TELEOLÓGICO (ROXIN) E SISTÊMICO (JAKOBS) ...................................................................................................... 5
3. DIREITO PENAL DO AMIGO .................................................................................................................................................................. 9
4. ESPIRITUALIZAÇÃO DO DIREITO PENAL ............................................................................................................................................... 9
5. O DIREITO PENAL EM VELOCIDADES ................................................................................................................................................. 10
5.1 1ª VELOCIDADE - JESÚS – MARÍA SÁNCHEZ .................................................................................................................................... 10
5.2 2ª VELOCIDADE - JESÚS – MARÍA SÁNCHEZ .................................................................................................................................... 10
5.3 3ª VELOCIDADE - GÜNTHER JAKOBS ............................................................................................................................................... 10
5.4 4ª VELOCIDADE – DANIEL PASTOR .................................................................................................................................................. 10
6. DIREITO PENAL DO FATO E DIREITO PENAL DO AUTOR .................................................................................................................... 11
7. TEORIA DO CRIME .............................................................................................................................................................................. 12
7.1 CONCEITO CLÁSSICO DE DELITO ...................................................................................................................................................... 12
7.2 CONCEITO NEOCLÁSSICO – TEORIA NEOKANTISTA ........................................................................................................................ 13
7.3 CONCEITO FINALISTA - (HANS WELZEL) .......................................................................................................................................... 13
8. O FATO TÍPICO.................................................................................................................................................................................... 14
8.1 A EVOLUÇÃO DO TIPO ..................................................................................................................................................................... 14
8.2 TEORIA DOS ELEMENTOS NEGATIVOS DO TIPO .............................................................................................................................. 14
8.3 ELEMENTOS DO FATO TÍPICO .......................................................................................................................................................... 15
8.3.1 TEORIA CAUSALISTA OU CLÁSSICA ............................................................................................................................................... 15
8.3.2 TEORIA NEOCLÁSSICA OU NEOKANTISTA..................................................................................................................................... 15
8.3.3 TEORIA FINALISTA ......................................................................................................................................................................... 15
8.3.4 TEORIA SOCIAL DA AÇÃO .............................................................................................................................................................. 15
8.3.5 TEORIA CIBERNÉTICA DA AÇÃO .................................................................................................................................................... 15
8.4 CAUSAS QUE EXCLUEM A CONDUTA............................................................................................................................................... 16
8.5 ESPÉCIES DE DOLO ........................................................................................................................................................................... 16
8.6 OUTRAS CLASSIFICAÇÕES ................................................................................................................................................................ 17
8.7 TEORIAS DO DOLO ........................................................................................................................................................................... 18
8.7.1 TEORIA DA VONTADE (ADOTADA NO DOLO DIRETO) .................................................................................................................. 18
8.7.2 TEORIA DA REPRESENTAÇÃO (ADOTADA NA CULPA CONSCIENTE) ............................................................................................ 18
8.7.3 TEORIA DO ASSENTIMENTO/CONSENTIMENTO (ADOTADA NO DOLO EVENTUAL) ................................................................... 18
8.8 DETALHES SOBRE A TENTATIVA....................................................................................................................................................... 18
9. CRIME IMPOSSÍVEL ............................................................................................................................................................................ 21
9.1.1 TEORIA SINTOMÁTICA .................................................................................................................................................................. 21
9.1.2 TEORIA SUBJETIVA ........................................................................................................................................................................ 21
9.1.3 TEORIA OBJETIVA .......................................................................................................................................................................... 21
10. CRIMES CULPOSOS........................................................................................................................................................................... 22

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10.1 CONCEITO DE CULPA ..................................................................................................................................................................... 22


10.2 ESPÉCIES DE CULPA........................................................................................................................................................................ 22
10.3 COAUTORIA EM CRIME CULPOSO ................................................................................................................................................. 23
10.4 PARTICIPAÇÃO EM CRIME CULPOSO ............................................................................................................................................. 23
10.5 CULPA CONSCIENTE ....................................................................................................................................................................... 23
10.6 CULPA INCONSCIENTE ................................................................................................................................................................... 24
10.7 ELEMENTOS DO CRIME CULPOSO ................................................................................................................................................. 24
11. NEXO DE CAUSALIDADE ................................................................................................................................................................... 24
11.1 TEORIAS SOBRE O NEXO DE CAUSALIDADE................................................................................................................................... 24
11.1.1 EQUIVALÊNCIA DOS ANTECEDENTES CAUSAIS .......................................................................................................................... 24
11.1.2 CAUSALIDADE ADEQUADA/SIMPLES .......................................................................................................................................... 24
11.1.3 TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA ............................................................................................................................................. 24
11.2 CONTRIBUIÇÃO DE CLAUS ROXIN .................................................................................................................................................. 25
11.3 MÉTODO HIPOTÉTICO DE THYRÉN ................................................................................................................................................ 26
11.4 CONTRIBUIÇÃO DE GÜNTHER JAKOBS PARA A IMPUTAÇÃO OBJETIVA ....................................................................................... 26
11.5 O QUE É UMA CONCAUSA? ........................................................................................................................................................... 27
11.5.1 TIPOS DE CONCAUSAS ................................................................................................................................................................ 27
12. RESULTADO JURÍDICO E NATURALÍSTICO........................................................................................................................................ 28
13. TIPICIDADE ....................................................................................................................................................................................... 29
13.1 TIPICIDADE FORMAL ...................................................................................................................................................................... 30
13.2 TIPICIDADE MATERIAL ................................................................................................................................................................... 30
13.3 TIPICIDADE LEGAL .......................................................................................................................................................................... 31
13.4 TIPICIDADE CONGLOBANTE ........................................................................................................................................................... 31
13.5 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA .................................................................................................................................................... 32
13.6 BAGATELA PRÓPRIA ....................................................................................................................................................................... 32
13.7 BAGATELA IMPRÓPRIA................................................................................................................................................................... 32
13.8 TEORIA DA REITERAÇÃO NÃO CUMULATIVA DE CONDUTAS DE GÊNEROS DISTINTOS ............................................................... 33
13.9 SITUAÇÕES JURISPRUDENCIAIS ENVOLVENDO O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA ..................................................................... 33
14. ERRO DE TIPO ................................................................................................................................................................................... 40
14.1 CONCEITO ...................................................................................................................................................................................... 40
14.1 ERRO DE TIPO X ERRO DE PROIBIÇÃO ........................................................................................................................................... 41
14.2 ESPÉCIES DE ERRO DE TIPO ........................................................................................................................................................... 41
A) ERRO DE TIPO ESSENCIAL .................................................................................................................................................................. 43
B) ERRO DE TIPO E CRIME PUTATIVO POR ERRO DE TIPO .................................................................................................................... 44
C) DISCRIMINANTES PUTATIVAS ............................................................................................................................................................ 44
D) ERRO DE TIPO ACIDENTAL ................................................................................................................................................................. 46
D.1 ERRO DE TIPO ACIDENTAL SOBRE O OBJETO (ERROR IN OBJECTO) ............................................................................................... 47
D.2 ERRO DE TIPO ACIDENTAL QUANTO À PESSOA (ERROR IN PERSONA)........................................................................................... 47
D.3 ERRO DE TIPO ACIDENTAL NA EXECUÇÃO ...................................................................................................................................... 47

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D.4 RESULTADO DIVERSO DO PRETENDIDO .......................................................................................................................................... 48


D.5. ERRO SOBRE O NEXO CAUSAL ........................................................................................................................................................ 49
QUESTÕES PARA FIXAR .......................................................................................................................................................................... 51
QUESTÕES PARA FIXAR - COMENTÁRIOS .............................................................................................................................................. 54

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DIREITO PENAL

1. BEM JURÍDICO PENAL

Olá, pessoal. Tudo certinho? Iniciamos essa semana com Direito Penal. Nada melhor que aprendermos
o conceito de bem jurídico penal, já que esse tema vem sendo cobrado em diversas provas orais.

Podemos definir bem jurídico penal como todo aquele bem que possui relevância, a fim de que seja
acobertado pelo direito penal, considerando os princípios da ultima ratio (intervenção mínima, fragmentarie-
dade e subsidiariedade).

Atenção à diferença entre o princípio da fragmentariedade e o da subsidiariedade!

Enquanto aquele determina que somente os bens jurídicos mais relevantes devem ser tutelados pelo Direito
Penal (como a vida e a integridade física), o princípio da subsidiariedade dispõe que, mesmo diante de um
ato violador de bem jurídico relevante ao direito penal, este ramo somente atuará no caso concreto se os
outros ramos do direito (como civil e administrativo) não forem capazes de tutelá-lo.

Um exemplo é a extinção da punibilidade em crime tributário caso haja o pagamento do débito apurado; o
bem jurídico (a higidez do sistema tributário) foi tutelado com o pagamento, resolvendo-se a situação e
afastando a necessidade de atuação do direito penal no caso.

O funcionalismo, lembra Rogério Sanches1, é um movimento da atualidade, uma corrente doutrinária


que visa analisar a real função do Direito Penal. Muito embora não haja pleno consenso acerca da sua teori-
zação, sobressaem-se dois segmentos importantes: o funcionalismo teleológico e o funcionalismo sistêmico.

2. FUNCIONALISMO TELEOLÓGICO (ROXIN) E SISTÊMICO (JAKOBS)

TEORIAS SOBRE O FUNCIONALISMO


FUNCIONALISMO TELEOLÓGICO/MODERADO FUNCIONALISMO SISTÊMICO/RADICAL
Principal autor é o Claus Roxin Principal autor é o Günther Jakobs

Para o funcionalismo teleológico, o direito penal O Direito Penal é um sistema autopoiético. Assim,
surge para proteger bens juridicamente relevantes. para os adeptos do funcionalismo sistêmico, o di-
Assim, a norma incide não para mostrar que o direito reito penal atua para manter a ordem, mostrando
penal deve “apenas” manter a ordem, mas porque que quem cometeu o crime violou a disfunção social
este é necessário para proteger aqueles bens jurídi- e quebrou a confiança.
cos mais relevantes na sociedade. Em outras palavras, a função do Direito Penal é man-
ter a integridade do próprio sistema.

1Cunha, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral (arts. 1º ao 120)/Rogério Sanches Cunha - 4. ed. rev., ampl. e atual.-
Salvador: JusPODIVM, 2016, p. 34.

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Lembra ainda Rogério Sanches2 que para o funcionalismo teleológico (ou moderado), que tem como
maior expoente Claus Roxin, a função do Direito Penal é assegurar bens jurídicos, assim considerados aqueles
valores indispensáveis à convivência harmônica em sociedade, valendo-se de medidas de política criminal. Já
de acordo com o funcionalismo sistêmico (ou radical), defendido por Günther Jakobs, a função do Direito Penal
é a de assegurar o império da norma, ou seja, resguardar o sistema, mostrando que o direito posto existe e
não pode ser violado. Quando o Direito Penal é chamado a atuar, o bem jurídico protegido já foi violado, de
modo que sua função primordial não pode ser a segurança de bens jurídicos, mas sim a garantia de validade
do sistema.

Claus Roxin3, em sua obra “A proteção de bens jurídicos como função do Direito Penal”, sustenta que
as fronteiras da autorização de intervenção jurídico-penal devem resultar de uma função social do direito
penal. O que está além desta função não deve ser logicamente objeto do direito penal. Assim, pontua o autor:

(...) A função do direito penal consiste em garantira seus cidadãos uma existência
pacífica, livre e socialmente segura, sempre e quando estas metas não possam ser
alcançadas com outras medidas político-sociais que afetem, em menor medida, a
liberdade dos cidadãos. Esta descrição de funções corresponde, segundo minha
opinião, com o entendimento mesmo de todos as democracias parlamentares atu-
ais, por isso não necessita, então, de uma fundamentação teórica mais ampla.
(GRIFOS NOSSOS).

Entretanto, para Günther Jakobs, a função do Direito Penal não é a proteção de bens jurídicos, mas a
de evitar uma diminuição da vigência da norma. Claus Roxin lembra que Jakobs pensa que o conceito de bem
jurídico não tem um conteúdo genuinamente liberal. Assim, por exemplo, a punibilidade da homossexualidade
em uma sociedade configurada pela hierarquia de homens, como o exército prussiano, buscava proteger bens
jurídicos, já que as relações sexuais que em princípio tem caráter de quebrar as hierarquias havia surtido efei-
tos sociais danosos.4

Além disso, é preciso lembrar que o funcionalismo sistêmico (segundo as ideias de Jakobs) está asso-
ciado ao que se chama de “direito penal do inimigo”.

Sobre o Direito Penal do Inimigo, sustenta Masson5:

(...) A teoria do Direito Penal do inimigo foi desenvolvida por Günther Jakobs, pro-
fessor catedrático de Direito Penal e Filosofia do Direito na Universidade de Bonn,
Alemanha, reconhecido mundialmente como um dos maiores criminalistas da atua-
lidade. A ele é também atribuída a criação de uma nova teoria da ação jurídico-penal,
o funcionalismo radical, monista ou sistêmico, ou seja, o pensamento que reserva

2 Idem, p. 34.
3 Roxin, Claus. A proteção de bens jurídicos como função do Direito Penal”. Org. e Traduzido por André Luís Callegari Nereu José
Giagomolli. 2 ª Edição. Porto Alegre. Livraria do Advogado Editora, 2018, p.
4 Idem, p. 35.
5 Masson, Cleber. Direito penal esquematizado – Parte geral – vol. 1/Cleber Masson. – 8.ª ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro:

Forense; São Paulo: MÉTODO, 2014, p. 162.

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elevado valor à norma jurídica como fator de proteção social. Para ele, apenas a
aplicação constante da norma penal é que imprime à sociedade as condutas aceitas
e os comportamentos indesejados. Na década de 1980, Jakobs traçou os primeiros
lineamentos da teoria em análise, voltando ao seu estudo no final dos anos 1990,
mas, em 2003, de maneira corajosa, assumiu postura inequívoca na defesa da ado-
ção do Direito Penal do inimigo, justificando com toda uma obra doutrinária a ne-
cessidade de revolucionar conceitos clássicos arraigados na mente dos doutrinado-
res. Seu pensamento coloca em discussão a real efetividade do Direito Penal exis-
tente, pugnando pela flexibilização ou mesmo supressão de diversas garantias ma-
teriais e processuais até então reputadas em uníssono como absolutas e intocáveis.
(GRIFOS NOSSOS).

Lembra Masson6 que para o “inimigo”:

“É possível, assim, a eliminação de direitos e garantias individuais, uma vez que não
paira necessidade de obediência ao devido processo legal, mas a um procedimento
de guerra, de intolerância e repúdio ao inimigo. A propósito, é cabível inclusive a
utilização da tortura como meio de prova, e também para desbaratar as atividades
ilícitas do criminoso e dos seus comparsas. O inimigo arrependido, disposto a auxiliar
o Estado no combate de seus antigos companheiros, contudo, deve receber benefí-
cios, desde que os delate, permitindo o desmantelamento de quadrilhas, prisões em
massa e recuperação dos produtos e proveitos dos crimes. Nitidamente, enxerga-se
na concepção de Jakobs a convivência de dois direitos em um mesmo ordenamento
jurídico. Em primeiro lugar, um direito penal do cidadão, amplo e dotado de todas
as garantias constitucionais, processuais e penais, típico de um Estado Democrático
de Direito. Sem prejuízo, em parcela menor e restrita a grupos determinados, com
ele coexiste o Direito Penal do inimigo, no qual o seu sujeito deve ser enfrentado
como fonte de perigo e, portanto, a sua eliminação da sociedade é o fim último do
Estado”. (GRIFOS NOSSOS).

CAIU NA DPE-MS-VUNESP-2014: Idealizado por Günter Jakobs, o direito penal do inimigo é considerado um
direito penal de terceira velocidade, por utilizar a pena privativa de liberdade, mas, também, permitir a flexi-
bilização de garantias materiais e processuais de todos integrantes da sociedade, podendo, inclusive, ser ob-
servado no direito brasileiro alguns institutos da lei que trata dos crimes hediondos.7

Assim, temos, em resumo, a seguinte previsão segundo Jakobs:

6 Idem, p. 164.
7 ERRADO. A questão está basicamente toda certa, exceto quando afirma: “mas, também, permitir a flexibilização de garantias mate-
riais e processuais de todos integrantes da sociedade”. Isso porque apenas ao “inimigo” é “possível, assim, a eliminação de direitos e
garantias individuais, uma vez que não paira necessidade de obediência ao devido processo legal, mas a um procedimento de guerra,
de intolerância e repúdio ao inimigo. Isso porque, segundo Jakobs, “quem em princípio se conduz de modo desviado, não oferece
garantia de um comportamento pessoal. Por isso, não pode ser tratado como cidadão, mas deve ser combatido como inimigo”.

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DESDOBRAMENTOS DO DIREITO PENAL DO INIMIGO (Günther Jakobs)


DIREITO PENAL DO CIDADÃO DIREITO PENAL DO INIMIGO
(Bürgerstrafrecht) (Feindstrafrecht)
Caracterizado pela manutenção da vigência da Orientado para o combate aos perigos e que permite
norma. que qualquer meio disponível seja utilizado para punir
esses inimigos, ainda viole direitos previstos.

Nas palavras dos professores Estefam e Rios (2020, p. 243), o direito penal do inimigo (isto é, indiví-
duos que reincidem constantemente na prática de delitos ou praticam fatos de extrema gravidade, como
ações terroristas) teria como finalidade combater perigos. Neste, o infrator não é tratado como sujeito de
direitos, mas como inimigo a ser eliminado e privado do convívio social. Abaixo, o autor traz as principais
características do direito penal do inimigo:

■ Tem como finalidade a eliminação de perigos;


■ Baseia-se na periculosidade do agente, considerado inimigo e, portanto, como al-
guém que não pode ser tratado como sujeito de direitos (“não pessoa”);
■ Efetua uma ampla antecipação da punibilidade, visando coibir ações perigosas an-
tes que estas se concretizem (punição de atos preparatórios);
■ As penas são severas, ainda quando aplicadas em casos de antecipação da tutela
penal;
■ Aplica-se uma legislação diferenciada, com enfoque combativo (“combate ao ini-
migo”);
■ Utiliza-se principalmente de medidas de segurança;
■ Garantias processuais penais são suprimidas.

Em relação à teoria de Jakobs, fica muito clara a necessidade de uma visão crítica da Defensoria Pública
em relação a quem seria esse “inimigo” que pode ter suas garantias processual-penais violadas. Isso porque
basta lembrarmos das teorias da Criminologia do Conflito (como a Criminologia Crítica), vistas na meta pas-
sada, para verificarmos que os valores mais relevantes e a figura do “inimigo” não são pautados por decisões
consensuais da sociedade, mas sim pelas classes detentoras do poder político para tanto.

Essa ideia é reforçada com o fato de que nosso sistema penal é composto basicamente por pessoas
pobres, negras e moradoras de regiões carentes das cidades (fora aquelas em situação de rua), além do rígido
tratamento dado pelo nosso CP aos crimes contra o patrimônio (basta lembrar que a pena do furto qualificado
pela subtração de semovente domesticável de produção é muito mais alta do que a pena do homicídio cul-
poso, p. ex.).

Nesse contexto, pergunto a vocês, querid@s alun@s: quem é o inimigo da nossa sociedade, que é tido
como aquele que deve ser reprimido com todas as forças estatais? Com o uso desmensurado de violência
policial? Com a “flexibilização” das garantias processual-penais? Imagino que vocês saibam a resposta. Assim,
em provas e também no dia a dia forense, mantenham a postura crítica diante das situações que ensejam a
personificação da teoria de Jakobs.

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3. DIREITO PENAL DO AMIGO

Há ainda uma teoria nova chamada de “direito penal do amigo”, bem trabalhada por Diego Castor de
Matos, Procurador da República. Em uma obra com o título “Direito Penal do Amigo”, este autor ensina que o
objetivo do livro “é analisar a impunidade dos crimes do colarinho branco na atuação prática da persecução
penal, abordando as dificuldades do processo penal no país que superprotege ricos e poderosos, tratando dos
entraves operacionais vivenciados no cotidiano forense pelos que enfrentam a criminalidade econômica no
Brasil. Utiliza-se de uma crítica ao atual modelo de sistema processual penal brasileiro, complexo e moroso,
com inesgotáveis fontes de recursos para aqueles que podem custear caros advogados, o que acaba sendo
decisivo para facilitar a impunidade dos crimes cometidos pelas pessoas do último andar da pirâmide social."

Sobre o direito penal do amigo, propõe o Christiano Gonzaga8:

[...] Atualmente, a sociedade está sentindo mais sensivelmente os efeitos desse fa-
migerado Direito Penal do Amigo, pois várias leis estão sendo feitas para beneficiar
esse tipo de criminalidade. Para citarmos duas, já vistas anteriormente, tem-se a Lei
nº 10.684/2003, que em seu art. 9º permite a extinção da punibilidade dos crimes
de sonegação fiscal quando a agente pagar o tributo devido. Tal ocorrência não é
aceita para um simples crime de furto, em que o agente pode ser beneficiado,
quando muito, pelo arrependimento posterior previsto no art. 16 do CP, como sim-
ples causa de diminuição de pena. Na mesma linha de pensamento, surge a Lei nº
13.254/2016, que em seu art. 5º prevê a extinção da punibilidade de vários crimes,
na maioria espécies de crimes de colarinho-branco, para quem pagar o imposto de-
vido e repatriar o valor depositado no estrangeiro de forma ilícita. São simples de-
monstrações de que o Direito Penal para as pessoas da elite é mais benevolente. [...]
Não é somente na seara legislativa que há benefício penal para os mais abastados.
Nos julgamentos feitos pelo Poder Judiciário pode ser constatado claramente que
há uma tendência a beneficiar criminosos de colarinho-branco em detrimento de
pessoas mais humildes. Em recente julgamento, o Supremo Tribunal Federal deter-
minou a soltura de empresário acusado de ter cometido inúmeros crimes de colari-
nho, uma vez que ele não era considerado uma ameaça social. Todavia, deve ser
lembrado que um dos crimes imputados a ele era o de corrupção ativa, de gravidade
enorme, apesar de imediatamente não ser tão lesiva a sua prática. Daí ter sido solto
porque não havia necessidade de garantir a ordem pública. (GRIFOS NOSSOS).

4. ESPIRITUALIZAÇÃO DO DIREITO PENAL

Tem surgido algumas críticas no sentido de que o Direito Penal está protegendo bens jurídicos cada
vez mais difusos, como meio ambiente, saúde pública, segurança pública, etc.

8 (GONZAGA, Christiano Manual de criminologia. Christiano Gonzaga. – São Paulo: Saraiva Educação, 2018. P. 109 e seguintes.)

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Para parte da doutrina, o bem jurídico protegido deve ser certo e materializado (vida, patrimônio,
liberdade, etc.).

Assim, com a proteção a bem jurídicos desmaterializados, a doutrina aponta que está ocorrendo uma
“espiritualização do direito penal”, também chamada de liquefação ou desmaterialização.

5. O DIREITO PENAL EM VELOCIDADES

O DIREITO PENAL EM VELOCIDADES


Aplicação de penas privativas de liberdades.

5.1 1ª VELOCIDADE - JESÚS – MARÍA


Procedimento mais lento, havendo o respeito às garantias consti-
SÁNCHEZ
tucionais.
Penas alternativas à prisão.

Flexibilização de algumas garantias, assim, o processo acaba


5.2 2ª VELOCIDADE - JESÚS – MARÍA sendo mais rápido do que o normal.
SÁNCHEZ
Ex.: Lei do Juizado Especial Criminal (transação penal, suspensão
condicional do processo, etc.).
É a soma da primeira e a segunda velocidade, isto é, aplicação de
penas privativas de liberdade e garantias constitucionais flexibili-
5.3 3ª VELOCIDADE - GÜNTHER JA-
zadas. Ex.: Lei de Crimes Hediondos.
KOBS

Está associada ao Direito penal do inimigo de Jakobs.


Associada ao neopunitivismo. Está ligada à proteção penal inter-
nacional, associada aos chefes de Estado no cometimento de cri-
mes contra a humanidades, a serem julgados pelo TPI.

O Estatuto de Roma define os crimes de competência do TPI: ge-


nocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e crimes
de agressão (mnemônico: GHUGA – vocês nunca mais vão esque-
cer esse rol de crimes com esse mnemônico).
5.4 4ª VELOCIDADE – DANIEL PASTOR

Importante lembrar que a quarta velocidade do Direito Penal foi


batizado por Daniel Pastor como “neopunitivismo” em La deriva
neopunitivista de organismos y activistas como causa del despres-
tigio actual de los derechos humanos, in Nueva Doctrina Penal.
Buenos Aires: 2005/A, pp. 73-114).

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Sobre o tema, lembra Cleber Masson9 que “Nessa linha de racio-


cínio, o neopunitivismo se destaca como um movimento do pan-
penalismo, que busca a todo custo o aumento do arsenal punitivo
do Estado, inclusive de forma mais arbitrária e abusiva do que o
Direito Penal do Inimigo. Cria-se, em outras palavras, um direito
penal absoluto. De fato, o panpenalismo promove a diminuição
(ou eliminação) de garantias penais e processuais, o aumento de-
sordenado das forças policiais e a inflação legislativa mediante o
aumento das penas, com finalidades altamente retributivas e in-
timidatórias. Para quem se filia a esta concepção doutrinária, a
defesa social legitima o Direito Penal, visualizando o delito como
uma problemática vinculada exclusivamente ao Direito Penal”.

Para ilustrar melhor, colaciono uma imagem da obra de Cleber Masson:

Cleber Masson, Direito penal esquematizado – Parte geral – vol. 1 p. 166.

Por fim, é preciso ressaltar que o direito penal deve punir o criminoso pelo FATO praticado, e não por
quem ele é.

Nesse sentido surgem duas teorias.

6. DIREITO PENAL DO FATO E DIREITO PENAL DO AUTOR

DIREITO PENAL DO FATO DIREITO PENAL DO AUTOR


O direito penal deve punir alguém em razão do Por outro lado, o direito penal do autor pune pessoas
fato praticado (e não pelo que o autor é). pelo que elas são. O maior exemplo que podemos dar é
o da Alemanha nazista, em que milhares de pessoas fo-
O nosso direito penal Brasileiro pode ser enten- ram mortas, perseguidas e torturadas por serem
dido como do fato.

9 Idem, p. 166.

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judeus, homoafetivas, ou contrários às ideias pregadas


pelo Nazismo.
IMPORTANTE: na prova oral para o cargo de Defensor Público do Estado do Amapá, o examinador indagou
sobre as circunstâncias judiciais do art.59 do Código Penal. A resposta esperada, em minha opinião, era
justamente críticas a estas circunstâncias, já que o Juiz, em vez de considerar apenas o FATO praticado,
estaria utilizando circunstâncias PESSOAIS do indivíduo, tais como personalidade, maus antecedentes, mo-
tivos, consequências do crime, personalidade, conduta social, etc. Portanto, fiquem atentos às críticas à
primeira fase da aplicação da pena.

ATENÇÃO!

Amig@s, a reincidência (agravante) é constitucional?

A questão já foi decidida pelo STF quando do julgamento do RE 453000 e a resposta da Corte à época
foi afirmativa. No entanto, observemos sempre a postura crítica necessária para um(a) Defensor(a).

A reincidência é tratada pelo CP em seu art. 61, I, como sendo uma agravante; ocorre que o sujeito
considerado reincidente já foi punido anteriormente em decorrência do crime praticado. Agora, em um pro-
cesso totalmente distinto, ele vê sua pena agravada justamente por causa dessa conduta pretérita. Veja que
é uma verdadeira caracterização do Direito Penal do Autor, por sancionar o agente, dada a sua condição pes-
soal, o que é inadmissível. Por isso, não obstante a reincidência hoje ser considerada constitucional, mante-
nhamos a visão crítica e, quem sabe no futuro, o STF tenha que se posicionar novamente sobre esse ponto.

Pessoal, feita essas observações, vamos entrar na teoria do crime.

7. TEORIA DO CRIME

Vamos começar com o conceito de crime em cada uma das teorias adotadas.

7.1 CONCEITO CLÁSSICO DE DELITO

CONCEITO CLÁSSICO DO DELITO


FATO TÍPICO ILÍCITO CULPÁVEL
CONDUTA
IMPUTABILIDADE
(apenas movimentos voluntários)
Resultado
Nexo causal Contrariedade entre a conduta e
DOLO/CULPA NORMATIVO (per-
o direito.
cebam que o dolo não está na
Tipicidade conduta, mas na culpabilidade)

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Teoria Psicológica da Culpabilidade: A culpabilidade é o nexo psíquico entre o agente e o fato crimi-
noso (Franz von Liszt e Ernst von Beling).

Teoria do dolo normativo: O dolo carregava em si a REAL CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE.

7.2 CONCEITO NEOCLÁSSICO – TEORIA NEOKANTISTA

CONCEITO NEOCLÁSSICO (TEORIA NEOKANTISTA)


FATO TÍPICO ILÍCITO CULPÁVEL
Conduta Imputabilidade
DOLO E CULPA (ainda estão na
Resultado Contrariedade entre a conduta e
culpabilidade)
o direito
Nexo causal Exigibilidade de conduta diversa
Tipicidade (novidade)

Teoria Psicológica-Normativa da Culpabilidade: Reinhard Frank e James Goldschmidt introduziram um


elemento normativo, a exigibilidade de conduta diversa.

7.3 CONCEITO FINALISTA - (HANS WELZEL)

CONCEITO FINALISTA (HANS WELZEL)


FATO TÍPICO ILÍCITO CULPÁVEL
Conduta (dolo e culpa)

Obs.: dolo e culpa passam a inte- Imputabilidade


grar o fato típico (saem da culpa-
Contrariedade entre a conduta e
bilidade).
o direito
Potencial consciência da ilicitude
Resultado
do fato
Nexo causal Exigibilidade de conduta diversa
Tipicidade

Teoria Normativa Pura da Culpabilidade: O elemento subjetivo (dolo/culpa) migra para o fato típico,
permanecendo na culpabilidade apenas elementos normativos.

Teoria do Dolo Natural: Elemento puramente psicológico, sem qualquer juízo de valor. Apenas von-
tade e consciência, sem a (potencial) consciência da ilicitude, analisada na culpabilidade.

Agora precisamos saber sobre o primeiro substrato do crime, o fato típico.

Prova oral da DPE-BA: tipo é a mesma coisa de tipicidade? A resposta é negativa. Não se deve confundir o tipo
com a tipicidade. O tipo é a fórmula que pertence à lei, enquanto a tipicidade pertence à conduta. Um fato
típico é uma conduta humana, por isso prevista na norma penal. Tipicidade é a qualidade que se dá a esse

13
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fato. Assim, tipo penal é o próprio artigo da lei. Fato típico é inerente a norma penal. Típica é a conduta que
apresenta característica específica de tipicidade (atípica a que não apresenta); tipicidade é a adequação da
conduta a um tipo; tipo é a fórmula legal que permite averiguar a tipicidade da conduta. O juiz comprova a
tipicidade comparando a conduta particular e concreta com a individualização típica, para ver se adéqua ou
não a ela. Este processo mental é o juízo de tipicidade que o juiz deve realizar10.

8. O FATO TÍPICO

ELEMENTOS QUE INTEGRAM O FATO TÍPICO


1. Conduta (dolosa ou culposa)
2. Nexo de causalidade
3. Resultado
4. Tipicidade

8.1 A EVOLUÇÃO DO TIPO

Antes de falarmos sobre cada elemento integrante do fato típico, vamos entender a evolução do tipo.

DESENVOLVIDA POR BELING (AB- DESENVOLVIDA POR MAYER (RA- DESENVOLVIDA POR MEZGER
SOLUTA INDEPENDÊNCIA) TIO COGNOSCENDI) (RATIO ESSENDI)
O tipo penal existe, mas sem con- A tipicidade presume que o fato Para Mezger, todo fato típico será
teúdo valorativo. também é ilícito. ilícito.

Ele NÃO depende dos outros ele- Assim, até que não se comprove Assim, se o fato é típico, ele tam-
mentos, como ilicitude e culpabi- que o agente atuou, por exemplo, bém será ilícito. O que às vezes é
lidade. acobertado por legítima defesa, o falho, já que é possível que o fato
fato será presumidamente ilícito. seja típico, mas o autor haja em le-
Teoria da absoluta independên- gítima defesa (o fato será típico,
cia. Teoria da ratio cognoscendi. Ado- mas não será ilícito, não preen-
tada no Brasil. chendo os requisitos do crime).
Teoria da ratio essendi.

8.2 TEORIA DOS ELEMENTOS NEGATIVOS DO TIPO

Em provas da Defensoria Pública e em outros certames de carreiras jurídicas, têm-se questionado


sobre a “teoria dos elementos negativos do tipo”, então vamos entender.

TEORIA DOS ELEMENTOS NEGATIVOS DO TIPO


Segundo Cleber Masson (2014, p. 328), a teoria dos elementos negativos do tipo foi preconizada pelo ale-
mão Hellmuth Von Weber, e propõe o tipo total de injusto, por meio do qual os pressupostos das causas de
exclusão da ilicitude compõem o tipo penal como seus elementos negativos. Tipicidade e ilicitude integram

10 Disponível em: http://conteudojuridico.com.br/artigo,tipicidade-conceito-e-classificacao,22427.html. Acesso em: 06/06/2021.

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o tipo penal (tipo total). Consequentemente, se presente a tipicidade, automaticamente também estará
delineada a ilicitude. Ao reverso, ausente a ilicitude, o fato será atípico. Não há distinção entre os juízos da
tipicidade e da ilicitude. Crime, assim, não é o fato típico e ilícito, mas sim um tipo total de injusto, em uma
única análise.

Opera-se um sistema bipartido, com duas fases para aferição do crime: tipo total (tipicidade + ilicitude) e
culpabilidade. Portanto, identificada a tipicidade, resultará identificada a ilicitude. Por outro lado, afastada
a tipicidade, restará também afastada a ilicitude. Se fosse adotada a referida teoria, o art. 121, caput, do
Código Penal ficaria assim redigido: “Matar alguém, salvo em legítima defesa, estado de necessidade, exer-
cício regular do direito ou estrito cumprimento de dever legal”. Não foi acolhida pelo nosso sistema penal,
que distinguiu explicitamente os tipos incriminadores (Parte Especial do Código Penal e legislação especial)
dos tipos permissivos ou causas de exclusão da ilicitude (em regra na Parte Geral do Código Penal, mais
precisamente em seu art. 23).

Falaremos agora sobre os elementos integrantes do fato típico.

8.3 ELEMENTOS DO FATO TÍPICO

O primeiro é a conduta.

TEORIAS DA CONDUTA
8.3.1 TEORIA CAUSALISTA OU CLÁSSICA Conduta é mero movimento humano.
Conduta pode ser ação ou omissão voluntária capaz de gerar
modificação no mundo exterior.
8.3.2 TEORIA NEOCLÁSSICA OU NEO-
KANTISTA Cuidado: dolo e culpa ainda estão na culpabilidade.

Welzel inova, entendendo que conduta é comportamento hu-


mano voluntário com uma finalidade específica.

8.3.3 TEORIA FINALISTA


Assim, conduta (dolosa ou culposa) está no fato típico e não na
culpabilidade (subvertendo a teoria clássica e neokantista).
Conduta é comportamento humano dirigido a um fim SOCIAL-
MENTE reprovável. Hans-Heinrich Jescheck, partidário dessa te-
8.3.4 TEORIA SOCIAL DA AÇÃO oria, define a conduta como o comportamento humano com
transcendência social. 11
Também conhecida como “ação biociberneticamente anteci-
pada”, leva em conta o controle da vontade, presente tanto nos
crimes dolosos como nos crimes culposos. Para explicar a con-
8.3.5 TEORIA CIBERNÉTICA DA AÇÃO
duta em crimes culposos, Welzel afirma que a vontade reside
no resultado e não na conduta. Pelo fato de ter sido consagrada

11Direito Penal: parte geral (arts. 1º a 120) – vol. 1/Cleber Masson. – 13. ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019, p.
374.

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no âmbito jurídico, e mostrar-se mais pertinente ao estudo do


Direito Penal, manteve-se a denominação “finalismo penal”.12

8.4 CAUSAS QUE EXCLUEM A CONDUTA

Pessoal, vocês saberiam responder quais são as causas que excluem a conduta? Essa foi pergunta de
prova oral, então não podemos dormir no ponto.

CAUSAS QUE EXCLUEM A CONDUTA


Caso fortuito ou força maior
Coação física (se for moral exclui a culpabilidade)
Atos ou movimentos reflexos
Ato praticados por pessoas em estado de sonambulismo

CUIDADO: Segundo Cleber Masson (2014, p. 303), também não há conduta, por falta de vontade nos compor-
tamentos praticados em completo estado de inconsciência, como é o caso da hipnose. No entanto, o tema
não é pacífico. Segundo Juarez Cirino (2012, p. 123)13, “a teoria dominante admite ação porque o hipnotizado
não pode realizar ações reprovadas pela censura pessoal, mas um segmento respeitável fala em ausência de
ação. A questão da hipnose pode ser esclarecida por FREUD, iniciado na arte da sugestão hipnótica por JEAN-
MARIE CHARCOT, que descobriu as causas psicológicas de muitos distúrbios psíquicos, e influenciado por HIP-
POLYTE BERNHEIM, cujas experiências sobre sugestão pós-hipnótica lhe inspiraram a ideia de um inconsciente,
responsável pela maioria das ações humanas. Na situação de hipnose, o hipnotizado não tem consciência do
mundo exterior, apenas ouve e vê o hipnotizador, acredita em suas palavras e obedece a seus comandos, de
modo alucinado. Uma pessoa saudável pode ser induzida a ver o que não existe (uma cobra), ou a não ver o
que existe (uma pessoa), a sentir o cheiro de uma rosa imaginária ou a morder uma batata indicada como
pera, mas existem limites: (...) um cidadão educado não realiza a sugestão de furtar coisas. A explicação é
simples: o ego do hipnotizado pode estar sob o poder alheio, mas o superego continua ativo no papel de
censura sobre as ações do ego, sob a forma de resistências psíquicas contra ações censuráveis. (GRIFOS NOS-
SOS).

A conduta pode ser dolosa ou culposa. Sobre dolo, veja o quadro abaixo.

8.5 ESPÉCIES DE DOLO

Em resumo:

1. DOLO O agente prevê um resultado, dirigindo a sua conduta na busca de realizar esse
DIRETO mesmo resultado.

12 Masson, Cleber Direito penal esquematizado – Parte geral – vol. 1/Cleber Masson. – 8.ª ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro:
Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019, p.273.
13 Direito Penal – Parte Geral/Juarez Cirino dos Santos - 5.ed. - Florianópolis: Conceito Editorial, 2012.

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1.1 DOLO DIRETO


É o dolo direto, hipótese em que o agente, com consciência e vontade, persegue de-
DE PRIMEIRO
terminado resultado (fim desejado) (SANCHES, 2016).
GRAU
Chamado também de dolo de consequências necessárias. Ex.: para matar uma pessoa
1.2 DOLO DIRETO que está no avião, o agente instala uma bomba. Sabe-se que para matar uma pessoa
DE SEGUNDO necessariamente matará outras pessoas, por isso o nome dolo de “consequências ne-
GRAU cessárias”, isso porque há uma certeza na obtenção quanto a morte dos demais do
avião.
2.DOLO O agente, com a sua conduta, não busca resultado certo e determinado. Possui duas
INDIRETO formas: dolo alternativo e dolo eventual (SANCHES, 2016).
Ocorre quando o agente prevê uma pluralidade de resultados, dirigindo sua conduta
2.1 DOLO
para perfazer qualquer deles com a mesma intensidade de vontade (Ex.: quero ferir
ALTERNATIVO
ou matar, tanto faz). (SANCHES, 2016).
2.2 DOLO No dolo eventual o agente não está nem aí para o resultado, pois assume o risco. Ex.:
EVENTUAL ultrapassar o sinal vermelho em alta velocidade para sentir uma “adrenalina”.
Ainda, há quem traga o dolo de terceiro grau, que seria uma inevitável violação de
bem jurídico em decorrência do resultado colateral produzido a título de dolo de se-
DOLO DE gundo grau. Ex.: a bomba no exemplo acima atinge uma mulher grávida, que vem a
TERCEIRO GRAU abortar em consequência daquela. O problema dessa teoria é que traz uma respon-
sabilidade penal objetiva, pois, abstratamente, não se pode esperar que o agente pre-
suma que haverá mulheres que estão gestantes no voo.

8.6 OUTRAS CLASSIFICAÇÕES

Outras classificações para o dolo segundo Rogério Sanches (2016, p. 197/198)14:

O agente pretende alcançar dois resultados, em sequência (caso de progressão crimi-


DOLO
nosa). Trata-se da hipótese em que o agente quer, por exemplo, lesionar e, após a
CUMULATIVO
lesão, resolve causar a morte da vítima.
DOLO DE DANO A vontade do agente é causar efetiva lesão ao bem jurídico tutelado.
O agente atua com a intenção de expor a risco o bem jurídico tutelado. É interessante
notar que o dolo de perigo pode se manifestar em situações que, na prática, con-
DOLO DE PERIGO funde-se com a inobservância do dever de cuidado, elemento elos crimes culposos.
Imaginemos a situação em que o agente expõe a perigo direto e iminente a vida ou a
saúde de outrem.
O agente tem vontade de realizar a conduta descrita no tipo penal, sem um fim espe-
DOLO GENÉRICO
cífico (Ex.: art. 121, CP, “matar alguém”).
O agente tem vontade de realizar a conduta, visando um fim específico que é elemen-
DOLO
tar do tipo penal (Ex.: art. 159, CP, “Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou
ESPECÍFICO
para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate)”

14Manual de direito penal: parte geral (arts. 1º ao 120). Rogério Sanches Cunha - 4. ed. rev., ampl. e atual.- Salvador: JusPODIVM,
2016.

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DOLO DE
A vontade e consciência refletida, pensada, premeditada.
PROPÓSITO

Ainda temos o seguinte:

DOLO NORMATIVO15 DOLO NATURAL


• Adotada pela teoria clássica/causal e pela • Adotado pela teoria finalista
neokantista • Integra o fato típico
• Tem dois elementos:
• Integra a culpabilidade.
a) Consciência (sabe o que faz)
• Tem três elementos: b) Vontade (querer ou aceitar)

a) Consciência OBS.: a consciência da ilicitude esta afeta à culpabi-


b) Vontade lidade.
c) Consciência atual da ilicitude (sabe da ilici-
tude do seu comportamento)

8.7 TEORIAS DO DOLO

Agora veremos as teorias do dolo.

TEORIAS DO DOLO

8.7.1 TEORIA DA VONTADE (ADOTADA Vontade livre e consciente de praticar o crime.


NO DOLO DIRETO)
Só é possível o resultado se o agente consegue prevê-lo antes.
8.7.2 TEORIA DA REPRESENTAÇÃO
(ADOTADA NA CULPA CONSCIENTE) É, na verdade, culpa consciente (veremos abaixo).
Também chamada de teoria do consentimento ou da anuência,
8.7.3 TEORIA DO ASSENTIMENTO/CON- complementa a teoria da vontade, recepcionando sua premissa.
SENTIMENTO (ADOTADA NO DOLO Para essa teoria, há dolo não somente quando o agente quer o
EVENTUAL) resultado, mas também quando realiza a conduta assumindo o
risco de produzi-lo.16

8.8 DETALHES SOBRE A TENTATIVA

Sobre a tentativa, precisamos saber alguns pontos importantes.

15 Manual de direito penal: parte geral (arts. 1º ao 120). Rogério Sanches Cunha - 4. ed. rev., ampl. e atual.- Salvador: JusPODIVM,
2016, p. 195.
16 Masson, Cleber Direito Penal: parte geral (arts. 1º a 120) – vol. 1/Cleber Masson. – 13. ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo:

MÉTODO, 2019, p. 440.

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Segundo o art. 14, II, do CP, a tentativa é quando o agente inicia a execução, mas o crime não se
consuma por circunstâncias alheias à sua vontade.

O parágrafo único aponta que “salvo dispositivo em contrário, pune-se a tentativa com a pena corres-
pondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços.” Em síntese, a tentativa é uma causa de dimi-
nuição de pena, a ser incidida na terceira fase da dosimetria da pena.

Além disso, bom relembrarmos que a adequação típica pode ser imediata ou mediata.

ADEQUAÇÃO TÍPICA IMEDIATA ADEQUAÇÃO TÍPICA MEDIATA


É imediata quando o fato se amolda ao tipo legal Ocorre a adequação típica mediata quando, para ade-
sem a necessidade de qualquer outra norma. O quar o fato ao tipo, utiliza-se de uma norma de exten-
ajuste do fato à lei incriminadora se dá de forma di- são, sem a qual é absolutamente impossível enqua-
reta. Exemplo: o artigo 121 do Código Penal pune a drar a conduta. O ajuste do fato à lei incriminadora se
conduta matar alguém. O fato de X matar Y se ajusta dá de forma indireta.
diretamente à lei incriminadora do referido disposi-
tivo Os artigos 13, §2º (agente garantidor) (causal), 29
(partícipe) (pessoal), assim como o artigo 14, II (tenta-
tiva) (temporal), do Código Penal são normas de ex-
tensão.

Vamos estudar as teorias sobre a tentativa.

TEORIAS DA TENTATIVA
Nesse caso, inicia-se a possibilidade de punir a partir do momento em que o
agente ingressa na fase da preparação. Sabemos que se pune a partir da exe-
SUBJETIVA (VULUNTARÍS-
cução, exceto quando os atos de preparação constituam crimes autônomos,
TICA OU MONISTA)
como possuir petrechos destinados especialmente à falsificação de moeda
(art. 291, CP).
Para esta teoria o objetivo da punição da tentativa volta-se ao perigo efetivo
que o bem jurídico corre. É a adotada pelo Código Penal. Na teoria subjetiva
OBJETIVA
(acima), a mera preparação já seria uma tentativa. Por outro lado, na teoria
(REALÍSTICA OU DUALISTA)
objetiva é necessário que o agente tenha iniciado a execução e que a consu-
mação não se dê por motivos alheios à sua vontade.
Ideias herdadas da Escola Positiva (estudada em criminologia).
Para os adeptos da teoria sintomática, o fundamento de punição da tentativa
concentra-se na análise da periculosidade do agente.
SINTOMÁTICA
Seria possível punir inclusive os atos preparatórios, e pior, sem reduzir a pena.

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Também chamada de teoria da impressão. Para os adeptos da teoria subjetiva-


SUBJETIVA-OBJETIVA objetiva, o juiz PODERIA, no caso concreto, diminuir ou não a pena. Portanto
a tentativa não seria uma causa de diminuição de pena obrigatória.

CAIU NA DPE-PE-2015-CESPE: “Em relação à tentativa, adota-se, no Código Penal, a teoria subjetiva, salvo na
hipótese de crime de evasão mediante violência contra a pessoa”.17

CLASSIFICAÇÕES DA TENTATIVA
O agente é impedido de prosseguir, deixando de praticar os atos executórios
que assim o desejava.
TENTATIVA IMPERFEITA
OU INACABADA
Ex.: agente que está atirando em A, mas é preso em flagrante e não consegue
consumar o crime.
O agente faz tudo que está ao seu alcance, praticando todos os atos executó-
TENTATIVA PERFEITA rios à sua disposição, mas mesmo assim não consegue consumar o crime.
(ACABADA OU CRIME FA-
LHO) Ex.: agente que dispara 20 tiros em outro, mas as munições acabam. Ele não
acerta nenhum tiro e a vítima sai correndo. Há tentativa perfeita.
O agente não atinge a vítima. Em outras palavras, o bem juridicamente tute-
TENTATIVA BRANCA OU lado não chega a ser lesionado.
INCRUENTA
Ex.: tiro que não acerta a vítima.
O agente atinge a vítima. Em outras palavras, o bem juridicamente tutelado
TENTATIVA VERMELHA chega a ser lesionado, em que pese o crime não tenha consumado.
OU CRUENTA
A vítima é atingida.
O resultado, embora seja possível, não é atingido por circunstâncias alheias à
TENTATIVA IDÔNEA
vontade do agente. É a tentativa por excelência.
É o crime impossível (absoluta impropriedade do objeto ou absoluta ineficácia
TENTATIVA INIDÔNEA
do meio).

Pessoal, há alguns crimes que não admitem tentativa.

Vamos lembrar?

CRIMES QUE NÃO ADMITEM TENTATIVA


CRIMES Os crimes culposos não admitem tentativa, exceto a culpa imprópria, que na ver-
CULPOSOS dade é um dolo punido a título de culpa, por questão de política criminal.
Os crimes preterdolosos são aqueles em que se pratica uma conduta dolosa, me-
CRIMES
nos grave, porém obtém um resultado danoso mais grave do que o pretendido, na
PRETERDOLOSOS
forma culposa. Eles não admitem tentativa.

17 ERRADO. Como vimos, o Código Penal adota a teoria objetiva.

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CRIMES OMISSIVOS O crime se consuma com a própria omissão, independente de resultado. Ex.: omis-
PRÓPRIOS são de socorro.
CONTRAVENÇÕES PE- O art. 4º da Lei de Contravenções penais aduz que não é punida a tentativa de
NAIS contravenção. Então, embora seja possível a tentativa, esta é impunível.
CRIMES Se consuma com a reiteração dos atos. Não acontecendo a reiteração, o fato é
HABITUAIS atípico. Por isso é impossível a tentativa.
CRIMES
Consuma-se com um único ato, por isso é incabível a tentativa.
UNISSUBSISTENTES

9. CRIME IMPOSSÍVEL

Também precisamos saber sobre crime impossível, estampado no art.17 do Código Penal.

O que é o crime impossível?

É também chamado de quase crime, crime oco ou tentativa inidônea. Configura-se crime impossível
quando o agente não consegue realizar o seu intento por ineficácia absoluta do meio, ou impropriedade (ab-
soluta) do objeto.

Algumas teorias surgem para explicar o crime impossível; vamos ver?

9.1 TEORIAS SOBRE O CRIME IMPOSSÍVEL


9.1.1 TEORIA SINTOMÁ- Ainda que o crime seja impossível, o agente merece ser punido por mostrar pe-
TICA riculosidade. Tem viés totalmente positivista!
Ainda que o crime seja impossível, deve o agente ser punido com a pena equi-
9.1.2 TEORIA SUBJETIVA valente à tentativa (portanto, com causa de diminuição de pena).
A teoria objetiva se desdobra em duas: objetiva pura e objetiva temperada.
OBJETIVA PURA: não há crime mesmo que a ineficácia do meio ou a improprie-
dade do objeto sejam relativas. Não é adotada pelo Código Penal.
OBJETIVA TEMPERADA: não há tentativa apenas se a ineficácia do meio ou a
9.1.3 TEORIA OBJETIVA
impropriedade do objeto sejam absolutas.

Se for relativa e o crime não se consumar por circunstâncias alheias à vontade


do agente, o agente responderá por tentativa. É a adotada pelo Código Penal.

Para fechar, reforço que o crime impossível ou quase-crime apresenta-se em três espécies em nosso
ordenamento:

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INEFICÁCIA ABSOLUTA DO IMPROPRIEDADE ABSOLUTA DO OBRA DE AGENTE


MEIO OBJETO MATERIAL PROVOCADOR
Ex.: tentar matar com arma de Ex.: mulher que toma remédio para Ex.: flagrante provocado, con-
brinquedo. abortar, sem estar grávida. forme enunciado 145 da Súmula
do STF.

CAIU NA DPE/GO – 2021 – FCC: O crime impossível


A) é reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça quando o agente já possuidor da droga a oferece ao policial,
que efetua a prisão em flagrante.
B) pela impossibilidade absoluta do meio ocorre quando o objeto não pode sofrer a ação típica, como no caso
de alguém que atira da janela uma pessoa que já estava morta.
C) demanda o potencial lesivo da conduta e a ausência de elementos subjetivos do tipo para sua configuração.
D) ocorre quando o agente em situação de extrema vulnerabilidade pratica um fato típico em razão da falta
de apoio do Estado.
E) pode ocorrer em caso de furto em estabelecimento comercial se a vigilância concretamente tornar impos-
sível a consumação do delito.18

10. CRIMES CULPOSOS

Agora sobrevoaremos os crimes culposos.

Segundo o Código Penal, o crime culposo pode ser cometido por três hipóteses: imprudência, negli-
gência e imperícia, que se consubstanciam na inobservância do dever OBJETIVO de cuidado.

10.1 CONCEITO DE CULPA


Inobservância de um dever objetivo de cuidado.

Veremos agora as espécies de culpa.

10.2 ESPÉCIES DE CULPA


IMPRUDÊNCIA Ação que extrapola os limites esperados, agindo sem cautela e zelo.
(ação) Ex.: motorista que anda a 200 km/h e atropela alguém.
NEGLIGÊNCIA Deixar de fazer algo que deveria ter feito.
(omissão) Ex.: acidente de carro ocasionado por falta de cuidado com os freios.
Praticar um ato em que não se tem conhecimento.
IMPERÍCIA
Ex.: médico clínico geral que decide realizar cirurgia plástica e deforma rosto de paci-
(ação)
ente. Cuidado, pois se assumiu o risco, poderá ficar caracterizado o dolo eventual.

SE LIGA, ALUN@ RDP: existe tese defensorial no sentido de que o §4º do art. 121, CP é inconstitucional no que
se refere à inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício. Isso porque se o agente não observa a
regra técnica necessária no caso concreto, naturalmente ele agiu com culpa (pois se tivesse atuado com dolo

18 GAB: E.

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responderia por homicídio doloso). Dessa forma, não há falar em aumento de 1/3 da pena como previsto no
parágrafo, pois haveria bis in idem na punição (já que justamente por ter deixado de observar a regra técnica,
ocorreu o homicídio culposo e, conforme a redação do §4º, o agente ainda por cima veria sua pena aumen-
tada). Confira a redação do dispositivo19:

10.3 COAUTORIA EM CRIME CULPOSO 10.4 PARTICIPAÇÃO EM CRIME CULPOSO


É possível, quando duas ou mais pessoas, conjunta- Não é possível.
mente, agindo por imprudência, negligência ou im- A unidade de elemento subjetivo exigida para a ca-
perícia, violam o dever objetivo de cuidado a todos racterização do concurso de pessoas impede a parti-
imposto, produzindo um resultado naturalístico. cipação dolosa em crime culposo.
Um exemplo segundo Masson (2014, p. 63520 ) é o Um exemplo segundo Masson (2014, p. 63621 ) é o
seguinte: “Imagine-se o exemplo em que dois indiví- seguinte: “Na hipótese em que alguém, dolosa-
duos, em treinamento, efetuam disparos de arma de mente, concorre para que outrem produza um resul-
fogo em uma propriedade rural situada próxima a tado naturalístico culposo, há dois crimes: um doloso
uma estrada de terra pouco movimentada. Atiram si- e outro culposo. Exemplo: “A”, com a intenção de
multaneamente, atingindo um pedestre que passava matar “B”, convence “C” a acelerar seu carro em
pela via pública, o qual vem a morrer pelos ferimen- uma curva, pois sabe que naquele instante “B” por
tos provocados pelas diversas munições. Há coauto- ali passará de bicicleta. O motorista atinge veloci-
ria em um homicídio culposo.” dade excessiva e atropela o ciclista, matando-o. “A”
responde por homicídio doloso (CP, art. 121), e “C”
por homicídio culposo na direção de veículo automo-
tor (Lei 9.503/1997 – CTB, art. 302).”

Precisamos saber ainda a diferença entre CULPA CONSCIENTE E CULPA INCONSCIENTE.

O agente prevê o resultado, mas acredita que ele não acontecerá.

Cuidado 01: se ele prevê o resultado e também o aceita, temos o dolo even-
tual.

10.5 CULPA CONSCIENTE


Cuidado 02: previsão é diferente de previsibilidade. Todos os crimes culposos
necessitam da previsibilidade, que é a possibilidade do resultado ser previsí-
vel (já que se não há previsibilidade, não há punição, pois, caso contrário,
haveria responsabilidade penal objetiva). A previsão, por outro lado, é a

19 Homicídio culposo
§ 3º Se o homicídio é culposo: (Vide Lei nº 4.611, de 1965)
Pena - detenção, de um a três anos.
Aumento de pena
§ 4º No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão,
arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge
para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa
menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003).
20 Direito penal esquematizado – Parte geral – vol. 1/Cleber Masson. – 8.ª ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo:

MÉTODO, 2014.
21 Idem.

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visualização prévia, pelo agente, do acontecimento de determinado crime,


isto é, o agente conhece o perigo.
Neste caso, o resultado também é previsível, mas o agente, no caso concreto,
10.6 CULPA INCONSCIENTE
não prevê.

Agora vamos aos elementos do crime culposo (anotem em seus cadernos).

10.7 ELEMENTOS DO CRIME CULPOSO


CONDUTA HUMANA
A voluntariedade está relacionada à ação, e não ao resultado.
VOLUTÁRIA
VIOLACÃO A UM DEVER O agente atua em desacordo com o que é esperado pela lei e pela soci-
OBJETIVO DE CUIDADO edade.
RESULTADO NATURALÍSTICO Necessidade de um resultado no mundo dos fatos.
NEXO CAUSAL Elo entre a conduta e o resultado naturalístico.
PREVISIBILIDADE É a possibilidade de prever o resultado, conhecer o perigo.
Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato pre-
TIPICIDADE
visto como crime, senão quando o pratica dolosamente.

Agora entraremos no outro elemento do fato típico, qual seja, o nexo de causalidade.

11. NEXO DE CAUSALIDADE

Muitas pessoas acham difícil, e realmente é. Mas vamos tentar fazer com que você entenda as teorias,
pois o assunto é cobrado em todas as fases para Defensoria Pública.

De início, saibam que nexo de causalidade é a ligação entre a conduta praticada e o resultado obtido.
Para explicar o nexo causal, surgem algumas teorias, que veremos agora.

11.1 TEORIAS SOBRE O NEXO DE CAUSALIDADE

11.1.1 EQUIVALÊNCIA DOS ANTE- 11.1.2 CAUSALIDADE ADE- 11.1.3 TEORIA DA IMPUTAÇÃO
CEDENTES CAUSAIS QUADA/SIMPLES OBJETIVA
É a adotada como regra no Código Aqui, causa é todo comporta- Talvez, a mais importante para
Penal. É chamada também de mento capaz de produzir o resul- nossa prova.
CONDITIO SINE QUA NON. tado. A razoabilidade do antece-
dente como causa do resultado A imputação objetiva busca limi-
Para ela, causa é todo e qualquer advém das regras de experiência. tar o nexo físico.
acontecimento provocado pelo
agente, sem o qual o resultado É adotada com relação às concau- Só responde aquele que criou ou
não teria ocorrido. sas relativamente independente incrementou um risco juridica-
que, por si só, causariam o resul- mente proibido.
Regra no Código Penal. tado.

24
@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 24
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Duas vertentes são as mais conhe-


Art. 13 § 1º do CP. cidas, a saber:

a) Claus Roxin e
b) Günther Jakobs.

CAIU NA DP-DF-2019-CESPE: “A superveniência de causa relativamente independente da conduta do agente


excluirá a imputação do resultado nos casos em que, por si só, ela tiver produzido o resultado”.22

CAIU NA DPE-PA-2009-FCC: “Para formação do nexo de causalidade, no sistema legal brasileiro, a superveni-
ência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado, impu-
tando-se os fatos anteriores a quem os praticou”.23

11.2 CONTRIBUIÇÃO DE CLAUS ROXIN

Segundo a doutrina24, “Claus Roxin visa, com o desenvolvimento da teoria da imputação objetiva, de-
terminar um critério de imputação capaz de concretizar a finalidade da norma penal. Para ele, um resultado
só deve ser imputado como sua obra e preenche o tipo objetivo unicamente quando:

(1) o comportamento do autor cria um risco não permitido para o objeto da ação;
(2) o risco se realiza no resultado concreto; e
(3) este resultado se encontra dentro do alcance do tipo”

No tocante à visão de Roxin sobre a imputação objetiva, Luiz Regis Prado, em seu Curso de Direito
Penal (2019), arremata:

Imputação objetiva: Procura fixar os critérios normativos que permitem atribuir um


resultado a determina do comportamento (ação ou omissão). Com vistas a elaborar
uma teoria geral da imputação para os delitos de resultado (dolosos ou culposos)
desvinculada do dogma causal, Claus Roxin elaborou uma série de critérios norma-
tivos, a saber:

• a diminuição do risco;
• a criação ou não criação de um risco juridicamente relevante;
• o incremento ou falta de aumento do risco permitido e o âmbito de proteção
da norma.

O denominador comum desses critérios encontra-se no princípio do risco, pelo qual


o decisivo é saber se a conduta do autor criou ou não um risco juridicamente

22 CERTO.
23 CERTO.
24 Direito Penal: parte geral (arts. 1º a 120) – vol. 1/Cleber Masson. – 13. ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019, p.

411

25
@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 25
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relevante de lesão típica de um bem jurídico em relação com determinado resul-


tado. Para que um resultado seja objetivamente imputável a um comportamento é
preciso que este incorpore um risco juridicamente desaprovado consubstancia do
em um resultado.”25

Entraremos agora no método hipotético de Thyrén.

11.3 MÉTODO HIPOTÉTICO DE THYRÉN


Aplicando a teoria dos antecedentes causais, surge um método para saber se determinado fato é ou não
causa. Esse método foi cunhado por Thyrén, daí porque o método leva o seu nome.

Para saber se determinado fato é ou não causa, de acordo com a teoria dos antecedentes causais, su-
prime-se mentalmente um determinado fato que está no desenvolvimento linear do crime. Se não ocor-
rer resultado naturalístico em razão dessa supressão, é porque esse fato era causa; de outro lado, se
persistir, causa não será.

Ex.: “A” efetuou 4 disparos de arma de fogo contra “B”, que veio a óbito. Para saber se este fato é causa,
suprime-se hipoteticamente a ação e verifica-se se o resultado aconteceria.

Além de Claus Roxin, Günther Jakobs também traz importante contribuição acerca da teoria da im-
putação objetiva, que veremos a seguir.

11.4 CONTRIBUIÇÃO DE GÜNTHER JAKOBS PARA A IMPUTAÇÃO OBJETIVA


Há riscos que nem sempre são proibidos. Para Jakobs, o risco permitido é
RISCO PERMITIDO
aquele que a sociedade aceita como válido.
Se o indivíduo agiu dentro da legalidade, sem qualquer relação com ato cri-
minoso, ele confiará que o próximo também o fará.

Exemplo dado por Jakobs: um freguês de um mercado ao pagar o seu pão,


PRINCÍPIO DA CONFIANÇA
por exemplo, não deve desconfiar se o dono do mercado irá usar o dinheiro
de forma lícita ou ilícita. Não faz parte do papel do freguês controlar o que
o proprietário irá ou não fazer com o dinheiro, seu papel é somente pagar
o que deve.
Este é o desdobramento lógico do princípio da confiança. No caso do fre-
guês dado acima, se ele compra pão, e o dono da padaria utiliza o dinheiro
PROIBIÇÃO DO REGRESSO para comprar uma arma de fogo a fim de assaltar o banco, o indivíduo que
comprou o pão nada tem relação com o possível crime. Há, neste caso, uma
proibição do regresso.

Feitas essas considerações, veremos agora as possibilidades de concausas.

25 Prado, Luiz Regis Curso de Direito Penal Brasileiro. – 17. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 339

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@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 26
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11.5 O QUE É UMA CONCAUSA?

CONCEITO DE CONCAUSA
“Nada mais é do que o concurso de fatores (preexistentes, concomitantes ou supervenientes) que, parale-
lamente ao comportamento do agente, são capazes de modificar o curso natural do resultado.”

11.5.1 TIPOS DE CONCAUSAS


CONCAUSA O resultado obtido depende da conduta do indivíduo. O agente responde pelo
DEPENDENTE crime, pois o resultado está dentro da cadeia normal do nexo de causalidade.
Capaz de produzir, por si só, o resultado.
Podem ser:
CONCAUSA
a) absolutamente independentes e
INDEPENDENTE
b) relativamente independentes.
Vamos explicar cada uma em uma tabela distinta, para facilitar a compreensão.

CONCAUSAS ABSOLUTAMENTE INDEPENDENTES


(RESPONDE PELO CRIME TENTADO)
Acontecem antes da conduta do agente.

PREEXISTENTES Ex.: “A” dispara um tiro em “B”, que morre. Na perícia, constata-se que “B” havia
tomado veneno antes, sendo esta a causa da morte. Assim, temos uma concausa
absolutamente independente, respondendo o autor apenas por tentativa.
Acontece ao mesmo tempo, por isso o nome “concomitante”.

Ex.: “A” atira para matar “B”. No entanto, na hora do disparo, este é alvejado por
CONCOMITANTE
um carro, que o atropela e mata.

Neste caso, “A” responderá por homicídio tentado.


Acontecem após à conduta do agente, daí porque o nome “concausa superveni-
ente”.

“A” administra dose letal de veneno para “B”. Enquanto este último ainda está vivo,
SUPERVENIENTE
desprende-se um lustre da casa, que acaba por acertar sua cabeça, sendo esta sua
causa mortis.

Este responderá por homicídio tentado.

27
@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 27
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CONCAUSAS RELATIVAMENTE INDEPENDENTES


(RESPONDE PELO CRIME CONSUMADO)
Acontecem ANTES da conduta.

Ex.: “A” atira nas pernas de “B”, apenas para “dar um corretivo”. Acontece que
PREEXISTENTE “B” era hemofílico e vem a óbito em razão da perda de muito sangue.

Sem entrar na discussão da responsabilidade subjetiva/objetiva, isto é, se “A” sa-


bia ou não da hemofilia, o resultado morte poderá ser imputado a “A”.
Acontecem ao mesmo tempo da conduta do agente.

Ex.: “A”, com intenção de matar, atira em “B”, mas não atinge o alvo. A vítima,
CONCOMITANTE
assustada, tem um infarto fulminante e morre.

“A” responderá por homicídio consumado.


Está prevista no artigo 13, §1º, do Código Penal: “A superveniência de causa rela-
tivamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resul-
tado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou”.

Ex.: “A”, com intenção de matar, atira em “B”; este é socorrido, mas no trajeto
para o hospital a ambulância sofre um acidente totalmente inesperado e capota,
vindo “B” a falecer exclusivamente em decorrência do acidente. “A” responderá
SUPERVENIENTE
por homicídio tentado.

Situação diversa ocorreria caso “B” falecesse em decorrência da imperícia do mé-


dico que fez sua cirurgia de emergência; isso porque, nesta segunda hipótese, a
cirurgia não foi causa absolutamente independente, eis que se “A” não tivesse
feito o disparo, “B” não precisaria ter se submetido ao procedimento cirúrgico.
Assim, “A” responderá por homicídio consumado.

12. RESULTADO JURÍDICO E NATURALÍSTICO

Dentro ainda do fato típico, agora sobre o elemento “resultado”, precisamos entender que há dois
principais tipos: resultados jurídicos e naturalísticos.

RESULTADO
JURÍDICO NATURALÍSTICO
Todo crime tem resultado jurídico. É, em suma, a vi- Nem todos os crimes têm resultado naturalístico,
olação ou o perigo/ameaça de lesão ao bem jurídico. pois o resultado naturalístico é a modificação no
mundo dos fatos.

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@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 28
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Ex.: todo crime material terá modificação no mundo


dos fatos. Se “A” mata “B”, há uma modificação no
mundo dos fatos, pois “B” deixará de existir.

Já os crimes de mera conduta, por exemplo, não têm


resultado naturalístico.

Ex.: ameaça.

O simples fato de “A” falar que vai matar “B” já con-


suma o crime, sem qualquer necessidade de resul-
tado no mundo exterior.

Rogério Sanches (201626) traz três classificações curiosas que podem ser cobradas em provas:

CRIME DE TENDÊNCIA INTERNA TRANSCENDENTE (OU CRIME DE INTENÇÃO): “O sujeito ativo quer um resul-
tado dispensável para a consumação do delito. O tipo subjetivo é composto pelo dolo e por elemento subjetivo
especial (finalidade transcendente). Ex.: na extorsão mediante sequestro - art. 159 do Código Penal- a obten-
ção da vantagem (resgate) é dispensável para a consumação (que se contenta com a privação da liberdade da
vítima).

CRIME DE RESULTADO CORTADO: espécie de crime de intenção, o resultado (dispensável para a consumação),
não depende do agente, não está na sua esfera de decisão. Ex.: na extorsão mediante sequestro, a obtenção
da vantagem-pagamento do resgate, dispensável para a consumação do crime, não depende do agente, mas
de terceiros ligados à vítima.

CRIME MUTILADO DE DOIS ATOS: também espécie de crime de intenção, o crime mutilado de dois atos se
verifica quando o resultado dispensável depende de novo comportamento do agente, está em sua esfera de
decisão. Ex.: no crime de petrechos para falsificação de moeda, a efetiva falsificação das moedas e sua colo-
cação em circulação, ambos resultados dispensáveis para a consumação, dependem de nova decisão do
agente.”

13. TIPICIDADE

Por fim, chegamos ao último elemento do fato típico, que é a “tipicidade em sentido estrito”, ou ape-
nas “tipicidade”.

Relembro que o fato típico é composto pelos seguintes elementos: conduta (já vimos), nexo de cau-
salidade (já vimos), resultado (acabamos de ver) e tipicidade (veremos agora).27

26 Manual de direito penal: parte geral (arts. 1º ao 120) /Rogério Sanches Cunha - 4. ed. rev., ampl. e atual.- Salvador: JusPODIVM,
2016, p. 172/173.
27 Lembre-se que o crime é composto, segundo a teoria tripartida, por fato típico, ilícito e culpável. Essa meta estamos estudando

apenas o fato típico. Em outras estudaremos a ilicitude e em outra a culpabilidade.

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@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 29
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A tipicidade pode ser meramente formal ou material (conceito dentro de tipicidade conglobante,
como veremos).

Em resumo, a tipicidade formal é a mera subsunção do fato à norma. Ex.: matar alguém é crime; se
você realizou essa conduta, você cometeu um fato típico (e presumidamente ilícito, de acordo com a teoria
da indiciariedade ou ratio cognoscendi).

No entanto, a mera tipicidade formal pode levar a inúmeras injustiças. Para isso, a doutrina criou um
outro conceito de tipicidade, chamada de tipicidade material.

A tipicidade material é a EFETIVA lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico. Isto é, além da subsunção
dos fatos à norma, agora deve haver uma tipicidade MATERIAL, ou seja, relevante para o direito.

13.1 TIPICIDADE FORMAL 13.2 TIPICIDADE MATERIAL


Necessidade de efetiva lesão ou perigo de lesão a
Mera subsunção do fato à norma.
um bem jurídico relevante.
Furtar R$ 2,00 é formalmente típico, mas não é ma-
Furtar R$ 2,00 (dois reais) é formalmente típico.
terialmente típico, como regra.

Acontece que para parte da doutrina (Zaffaroni, por exemplo), a tipicidade material está dentro da
tipicidade conglobante. Para que fique claro, a tipicidade conglobante seria a soma de atos antinormativos +
a tipicidade material (vista acima). E assim teríamos:

FORMAL
MATERIAL
TIPICIDADE
(RELEVÂNCIA)
CONGLOBANTE

ANTINORMATIVIDADE

Para Rogério Greco (2017, p. 68)28, “para que ocorra a chamada tipicidade conglobante, devemos ve-
rificar se o comportamento formalmente típico praticado pelo agente é:

a) antinormativo;
b) materialmente típico.

A tipicidade conglobante (bem trabalhada pro Zaffaroni e Pierangeli) surge quando comprovado, no
caso concreto, que a conduta praticada pelo agente é considerada antinormativa, isto é, contrária à norma

28 Código Penal: comentado/Rogério Greco. – 11. ed. – Niterói, RJ: Impetus, 2017.

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@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 30
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penal, e não imposta ou fomentada por ela, bem como ofensiva a bens de relevo para o Direito Penal (tipici-
dade material).”

CAIU NA DPE-RS-2014-FCC: “Para a teoria da tipicidade conglobante, a tipicidade penal pressupõe a existência
de normas proibitivas e a inexistência de preceitos permissivos da conduta em uma mesma ordem jurídica”.29

Cleber Masson (2014, p. 328)30, com uma didática incrível, estabelece a tipicidade conglobante da
seguinte forma:

“O nome “conglobante” deriva da necessidade de que a conduta seja contrária ao


ordenamento jurídico em geral, conglobado, e não apenas ao Direito Penal. Não
basta a violação da lei penal. Exige-se a ofensa a todo o ordenamento jurídico. Em
suma, para a aferição da tipicidade reclama-se a presença da antinormatividade.

(...) A tipicidade conglobante (antinormatividade) é a comprovação de que a conduta


legalmente típica está também proibida pela norma, o que se afere separando o
alcance da norma proibitiva conglobada com as demais normas do sistema jurídico.

Finalmente, a tipicidade penal (adequação penal + antinormatividade) é a fusão da


tipicidade legal com a tipicidade conglobante. Não basta, pois, a mera tipicidade le-
gal, isto é, a contrariedade do fato à lei penal. É necessário mais. A conduta do
agente, contrária à lei penal, deve violar todo o sistema normativo. Em suma, deve
ser antinormativa”.

Para essa teoria, a tipicidade penal resulta da junção da tipicidade legal com a tipicidade conglobante:
tipicidade penal = tipicidade legal + tipicidade conglobante. Assim, para Cleber Masson, podemos resumir no
seguinte quando:

13.3 TIPICIDADE LEGAL 13.4 TIPICIDADE CONGLOBANTE


Adequação à fórmula legal do tipo Antinormatividade
É a individualização que a lei faz da conduta, medi- Já a tipicidade conglobante (antinormatividade) é a
ante o conjunto dos elementos objetivos e normati- comprovação de que a conduta legalmente típica
vos de que se vale o tipo penal. está também proibida pela norma, o que se afere se-
parando o alcance da norma proibitiva conglobada
com as demais normas do sistema jurídico.

Aprofundando sobre o tema, e para melhor entender o conceito de antinormatividade, explica Rogério
Greco (2017, p. 67/68)31:

29 CERTO.
30 Direito penal esquematizado – Parte geral – vol. 1/Cleber Masson. – 8.ª ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo:
MÉTODO, 2014.
31 Código Penal: comentado/Rogério Greco. – 11. ed. – Niterói, RJ: Impetus, 2017.

31
@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 31
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“Explicando o conceito de antinormatividade, Zaffaroni e Pierangeli, exemplificando


com o caso de um oficial de justiça que, cumprindo uma ordem de penhora e se-
questro de um quadro, de propriedade de um devedor a quem se executa em pro-
cesso regular, por seu legítimo credor, para a cobrança de um crédito vencido, adu-
zem: “A lógica mais elementar nos diz que o tipo não pode proibir o que o direito
ordena e nem o que ele fomenta. Pode ocorrer que o tipo legal pareça incluir estes
casos na tipicidade, como sucede com o do oficial de justiça, e, no entanto, quando
penetramos um pouco mais no alcance da norma que está anteposta ao tipo, nos
apercebemos que, interpretada como parte da ordem normativa, a conduta que se
ajusta ao tipo legal não pode estar proibida, porque a própria ordem normativa a
ordena e a incentiva”.

A tipicidade material, a seu turno, que integra o conceito de tipicidade conglobante,


seria o critério por meio do qual se afere a importância do bem no caso concreto,
sendo o lugar apropriado para a análise do chamado princípio da insignificância”.

RESUMO: tipicidade penal = tipicidade formal + tipicidade conglobante (soma da tipicidade material + atos
antinormativos).

13.5 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Feitas essas observações, eu te pergunto: o princípio da insignificância (bagatela própria) exclui a tipi-
cidade formal ou material?

Isso mesmo, a tipicidade material, que, como vimos, está dentro do conceito de tipicidade conglo-
bante (ao lado de antinormatividade). A aplicação do princípio da insignificância é para EXCLUIR a tipicidade
material, naqueles casos em que o STF e o STJ entendem estar preenchidos os requisitos.

Aproveitando o gancho, você saberia diferenciar bagatela própria de bagatela imprópria?

13.6 BAGATELA PRÓPRIA 13.7 BAGATELA IMPRÓPRIA


Sinônimo de princípio a insignificância. Causa supra- É a constatação da desnecessidade da pena, mesmo
legal de exclusão da tipicidade material. que o fato seja típico, ilícito e culpável.

Requisitos para aplicação (decorar o nome MARI) fi- O juiz, na aplicação da pena, entende que aplicar
xados pelo STF: uma pena naquela situação iria de encontro ao di-
reito, considerando que o art. 59 do Código Penal diz
o Mínima ofensividade da conduta. que o Juiz “estabelecerá, conforme seja necessário e
o Ausência de periculosidade. suficiente para reprovação e prevenção do crime”.
o Reduzido grau de reprovabilidade.
o Inexpressividade da lesão provocada. Ligada à ideia de responsabilidade trazida pelo fun-
cionalismo, em que se analisa não apenas a

32
@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 32
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culpabilidade, mas também a necessidade de aplica-


ção da pena.

Assim, resumindo: na bagatela imprópria, a conduta


é penalmente relevante, mas na hora de haver a
aplicação da pena, o juiz verifica que esta é desne-
cessária.

13.8 TEORIA DA REITERAÇÃO NÃO CUMULATIVA DE CONDUTAS DE GÊNEROS DISTINTOS

Essa teoria foi utilizada pelo STF em alguns julgamentos e tem cabimento no estudo do princípio da
insignificância. Pergunta: é cabível o princípio da insignificância, como excludente da tipicidade material, em
situações de agente reincidente?

Pois bem.

Devemos entender que se um acusado já tem, por exemplo, uma condenação por delito anterior que
NÃO tutele o patrimônio (ex.: calúnia) e, em seguida, pratique um delito contra o patrimônio (ex.: furto) que
seja insignificante, é possível SIM aplicar a insignificância a este segundo delito, considerando a teoria da rei-
teração não cumulativa de condutas de gêneros distintos. O nome é complicado, mas é fácil de entender, não
é? Haha. Lembrem-se que essa teoria já foi citada expressamente em acórdãos do STF. 32

13.9 SITUAÇÕES JURISPRUDENCIAIS ENVOLVENDO O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

A despeito da presença de qualificadora no crime de furto possa, à primeira


vista, impedir o reconhecimento da atipicidade material da conduta, a aná-
lise conjunta das circunstâncias pode demonstrar a ausência de lesividade
FURTO QUALIFICADO do fato imputado, recomendando a aplicação do princípio da insignificân-
cia. STJ. 5ª Turma. HC 553.872-SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca,
julgado em 11/02/2020 (Info 665)

É possível aplicar o princípio da insignificância para furto de bem avaliado


em R$ 20,00 mesmo que o agente tenha antecedentes criminais por crimes
patrimoniais Ementa: HABEAS CORPUS. FURTO DE CARRINHO DE MÃO.
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂN- PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INCIDÊNCIA. ABSOLVIÇÃO. ORDEM CON-
CIA PARA FURTO DE BEM CEDIDA. (RHC 174784, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/
AVALIADO EM R$ 20,00 Acórdão: Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em
11/02/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-110 DIVULG 05-05-2020 PUBLIC
06-05-2020)

FURTO MAJORADO E REINCI- É possível aplicar o princípio da insignificância para o furto de mercadorias
DÊNCIA avaliadas em R$ 29,15, mesmo que o a subtração tenha ocorrido durante

32 Disponível em: https://rumoadefensoria.com/artigo/principio-da-insignificancia-penal. Acesso em: 06/06/2021.

33
@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 33
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o período de repouso noturno e mesmo que o agente seja reincidente. STF.


2ª Turma. HC 181389 AgR/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em
14/4/2020 (Info 973).

Não se admite a incidência do princípio da insignificância na prática de es-


ESTELIONATO POR telionato qualificado por médico que, no desempenho de cargo público,
MÉDICO QUE BATE O PONTO registra o ponto e se retira do hospital. AgRg no HC 548.869-RS, Rel. Min.
E SE RETIRA DO HOSPITAL Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em
12/05/2020, DJe 25/05/2020.

Em regra, a habitualidade delitiva específica (ou seja, o fato de o réu já res-


ponder a outra ação penal pelo mesmo delito) é um parâmetro (critério)
que afasta o princípio da insignificância mesmo em se tratando de bem de
reduzido valor. Excepcionalmente, no entanto, as peculiaridades do caso
concreto podem justificar o afastamento dessa regra e a aplicação do prin-
cípio, com base na ideia da proporcionalidade. É o caso, por exemplo, do
furto de um galo, quatro galinhas caipiras, uma galinha garnizé e três quilos
de feijão, bens avaliados em pouco mais de cem reais. O valor dos bens é
FURTO DE GALO, GALINHA E inexpressivo e não houve emprego de violência. Enfim, é caso de mínima
FEIJÃO ofensividade, ausência de periculosidade social, reduzido grau de reprova-
bilidade e inexpressividade da lesão jurídica. Mesmo que conste em desfa-
vor do réu outra ação penal instaurada por igual conduta, ainda em trâmite,
a hipótese é de típico crime famélico. A excepcionalidade também se justi-
fica por se tratar de hipossuficiente. Não é razoável que o Direito Penal e
todo o aparelho do Estado-polícia e do Estado-juiz movimente-se no sen-
tido de atribuir relevância a estas situações. STF. 2ª Turma. HC 141440
AgR/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 14/8/2018 (Info 911).33

Em regra, o reconhecimento do princípio da insignificância gera a absolvi-


ção do réu pela atipicidade material. Em outras palavras, o agente não res-
ponde por nada. Em um caso concreto, contudo, o STF reconheceu a insig-
nificância do bem subtraído, mas, como o réu era reincidente em crime pa-
INSIGNIFICÂNCIA E trimonial, em vez de absolvê-lo, o Tribunal utilizou esse reconhecimento
APLICAÇÃO DE PENA para conceder a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva
RESTRITIVA DE DIREITO de direitos. Em razão da reincidência, o STF entendeu que não era o caso
de absolver o condenado, mas, em compensação, determinou que a pena
privativa de liberdade fosse substituída por restritiva de direitos. STF. 1ª
Turma. HC 137217/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Alexandre
de Moraes, julgado em 28/8/2018 (Info 913).34

33 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. É possível a aplicação do princípio da insignificância para o furto de um galo, quatro galinhas
caipiras, uma galinha garnizé e três quilos de feijão. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: https://www.buscadordizerodi-
reito.com.br/jurisprudencia/detalhes/3b199f42a9909061516b6ce6d334af6d. Acesso em: 09/06/2021.
34 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. STF reconheceu que o valor econômico do bem furtado era muito pequeno, mas, como o réu

era reincidente, em vez de absolvê-lo aplicando o princípio da insignificância, o Tribunal utilizou esse reconhecimento para conceder

34
@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 34
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Em um caso envolvendo a realização de pesca de 7kg de camarão em perí-


odo de defeso com o uso de método não permitido, o STF entendeu não
ser possível aplicar o princípio da insignificância.
PESCA ILEGAL

Mas há decisões do STF e STJ do princípio da insignificância em situações


excepcionais.
STJ E STF: até R$ 20 mil incide o princípio da insignificância aos crimes tri-
butários federais.

DETALHE: Não pode ser aplicado para fins de incidência do princípio da in-
significância nos crimes tributários estaduais o parâmetro de R$ 20.000,00
CRIMES TRIBUTÁRIOS
(vinte mil reais), estabelecido no art. 20 da Lei 10.522/2002, devendo ser
observada a lei estadual vigente em razão da autonomia do ente federativo.
STJ. 5ª Turma. AgRg-HC 549.428-PA. Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em
19/05/2020.

A jurisprudência é pacífica em admitir a aplicação do princípio da insignifi-


cância ao crime de descaminho (art. 334 do CP), que, topograficamente,
está inserido no Título XI do Código Penal, que trata sobre os crimes contra
a Administração Pública. De acordo com o STJ, “a insignificância nos crimes
DESCAMINHO de descaminho tem colorido próprio, diante das disposições trazidas na Lei
n. 10.522/2002”, o que não ocorre com outros delitos, como o peculato
etc. (AgRg no REsp 1346879/SC, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado
em 26/11/2013).

Súmula 606-STJ: Não se aplica o princípio da insignificância a casos de trans-


missão clandestina de sinal de internet via radiofrequência, que caracteriza
o fato típico previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/1997. STJ. 3ª Seção. Apro-
vada em 11/04/2018, DJe 17/04/2018.
TRANSMISSÃO
CLANDESTINA DE SINAL DE
ATENÇÃO: o STF entende que é possível, em situações excepcionais, o re-
INTERNET VIA
conhecimento do princípio da insignificância, desde que a rádio clandestina
RADIOFREQUÊNCIA
opere em baixa frequência, em localidades afastadas dos grandes centros
e em situações nas quais ficou demonstrada a inexistência de lesividade.
STF. 2ª Turma. HC 138134/BA, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em
7/2/2017 (Info 853).35

CRIMES CONTRA A O STJ não aplica. Editou inclusive o enunciado 599 da sua súmula.
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

a pena restritiva de direitos. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurispru-
dencia/detalhes/631e9c01c190fc1515b9fe3865abbb15. Acesso em: 09/06/2021.
35 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Manter rádio comunitária clandestina. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em:

https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/d6723e7cd6735df68d1ce4c704c29a04. Acesso em: 09/06/2021.

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Enunciado 599 da Súmula do STJ: O princípio da insignificância é inaplicável


aos crimes contra a administração pública. STJ. Corte Especial. Aprovada
em 20/11/2017, DJe 27/11/2017.

CUIDADO: O STF não concorda com essa súmula do STJ. Segundo o enten-
dimento que prevalece no STF, a prática de crime contra a Administração
Pública, por si só, não inviabiliza a aplicação do princípio da insignificância,
devendo haver uma análise do caso concreto para se examinar se incide ou
não o referido postulado. Há julgados admitindo a aplicação do princípio da
insignificância mesmo em outras hipóteses além do descaminho, como foi
o caso do HC 107370, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 26/04/2011 e
do HC 112388, Rel. p/ Acórdão Min. Cezar Peluso, julgado em
21/08/2012.36
STF: é inaplicável.
APROPRIAÇÃO INDÉBITA STJ: é possível, desde que o total dos valores retidos não ultrapasse o valor
PREVIDENCIÁRIA utilizado pela Fazenda Público como limite mínimo para que sejam ajuiza-
das as execuções fiscais (20 mil reais).
DELITOS PRATICADOS EM SI-
TUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DO- É inaplicável (STJ e STF).
MÉSTICA.
O STJ possui posição consolidada no sentido de que o princípio da insignifi-
cância não é aplicável aos crimes de posse e de porte de arma de fogo, por
se tratar de crimes de perigo abstrato, sendo irrelevante inquirir a quanti-
dade de munição apreendida. STJ. 5ª Turma. HC 338153/RS, Rel. Min. Ri-
beiro Dantas, julgado em 03/05/2016.37

Porém, o atual entendimento do STJ é no sentido de que a apreensão de


pequena quantidade de munição, desacompanhada da arma de fogo, per-
POSSE OU PORTE DE ARMA mite a aplicação do princípio da insignificância ou bagatela. STJ. 5ª Turma.
DE FOGO AgRg no HC 517.099/MS, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em
06/08/2019.).

Importante: A Quinta Turma e a Sexta Turma, em algumas oportunidades,


têm entendido que o simples fato de os cartuchos apreendidos estarem
desacompanhados da respectiva arma de fogo não implica, por si só, a ati-
picidade da conduta, de maneira que as peculiaridades do caso concreto
devem ser analisadas a fim de se aferir: a) a mínima ofensividade da con-
duta do agente; b) a ausência de periculosidade social da ação; c) o

36 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Aplicação do princípio da insignificância em crime praticado em prejuízo da Administração Pú-
blica. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/deta-
lhes/d04e5fdcd17f0616f965099351d2f2a1>. Acesso em: 27/06/2022
37 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Posse ou porte de arma ou munição: não se aplica o princípio da insignificância. Buscador Dizer

o Direito, Manaus. Disponível em: https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/deta-


lhes/d91d1b4d82419de8a614abce9cc0e6d4. Acesso em: 09/06/2021.

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reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) a inexpressivi-


dade da lesão jurídica provocada. Na hipótese dos autos, embora com o
embargado tenha sido apreendida apenas uma munição de uso restrito,
desacompanhada de arma de fogo, ele foi também condenado pela prática
dos crimes descritos nos arts. 33, caput, e 35, da Lei n. 11.343/06 (tráfico
de drogas e associação para o tráfico), o que afasta o reconhecimento da
atipicidade da conduta, por não estarem demonstradas a mínima ofensivi-
dade da ação e a ausência de periculosidade social exigidas para tal finali-
dade. STJ. 3ª Seção. EREsp 1.856.980, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado
em 22/09/2021.38

CRIMES AMBIENTAIS STJ e STF: é possível, devendo ser analisado caso a caso.

A reiteração criminosa inviabiliza a aplicação do princípio da insignificância


nos crimes de descaminho, ressalvada a possibilidade de, no caso concreto,
as instâncias ordinárias verificarem que a medida é socialmente recomen-
dável. Assim, pode-se afirmar que:

• Em regra, não se aplica o princípio da insignificância para o agente que


DESCAMINHO E praticou descaminho se ficar demonstrada a sua reiteração criminosa (cri-
REITERAÇÃO minoso habitual).

• Exceção: o julgador poderá aplicar o referido princípio se, analisando as


peculiaridades do caso concreto, entender que a medida é socialmente re-
comendável. STJ. 3ª Seção. EREsp 1217514-RS, Rel. Min. Reynaldo Soares
da Fonseca, julgado em 9/12/2015 (Info 575).39

Se o valor do bem é acima de 10% do salário-mínimo vigente na época, o


STJ entende ser inaplicável o princípio da insignificância (porém, se o valor
FURTO SIMPLES do bem for acima de 10% até o valor do salário-mínimo, incide o “privilégio”
do art. 155, §2º, CP).

ESTELIONATO CONTRA O STF e STJ não aplicam o princípio da insignificância.


INSS
Inaplicável. Contudo, no HC 127.573, o STF reconheceu a atipicidade mate-
rial em um caso que uma mulher foi presa com 1g de maconha. No caso,
uma mulher foi condenada à pena de 6 anos, 9 meses e 20 dias de reclusão,
TRÁFICO DE DROGAS
em regime inicialmente fechado, pela posse de 1 grama de maconha, sem
indícios de que ela teria anteriormente comercializado maior quantidade
de droga. Prevaleceu entendimento do relator, ministro Gilmar Mendes.

38 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Posse ou porte de munição (desacompanhada) de arma de fogo e atipicidade da conduta. Bus-
cador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/deta-
lhes/d91d1b4d82419de8a614abce9cc0e6d4>. Acesso em: 27/06/2022
39 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Reiteração criminosa no crime de descaminho e princípio da insignificância. Buscador Dizer o

Direito, Manaus. Disponível em: https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/deta-


lhes/1b0114c51cc532ed34e1954b5b9e4b58. Acesso em: 09/06/2021.

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Para ele, a jurisprudência deve avançar no sentido de criar critérios dogmá-


ticos objetivos para separar o traficante de grande porte do traficante de
pequenas quantidades, que vende drogas apenas para retroalimentar o seu
vício. 40
Inaplicável. Porém, recentemente, no caso em que o Réu que portava 1,8g
de maconha para consumo próprio, houve possibilidade de aplicação do
princípio da insignificância em porte de drogas para consumo pessoal com
a concessão do habeas corpus: STF. 2ª Turma. HC 202883 AgR, Relator(a)
p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 15/09/2021. Entretanto, vale
registrar que o caso foi empatado com 2 votos favoráveis dos Ministros Gil-
mar Mendes e Edson Fachin e com 2 votos contrários dos Ministros Ricardo
Lewandowski e Nunes Marques. A discussão é muito mais complexa, porém
registrarei os motivos principais das teses (o tema aguarda posicionamento
do STF - tema 506 do STF).41

Argumentos contrários: 42
1) A posse de entorpecente para uso próprio, pela vontade do povo, é pu-
nida porque representa mal à coletividade, à saúde pública, o que autoriza
a punição ainda que em detrimento da intimidade e vida privada daquele
que possui drogas para consumo próprio e efetivamente consome entor-
POSSE PARA CONSUMO PES- pecentes.
SOAL DE DROGAS
2) O objeto jurídico tutelado pela norma em comento é a saúde pública, e
não apenas a do usuário, visto que sua conduta atinge não somente a sua
esfera pessoal, mas toda a coletividade, diante da potencialidade ofensiva
do delito de porte de entorpecentes. Ademais, o porte ilegal de drogas é
crime de perigo abstrato ou presumido, uma vez que prescinde da compro-
vação da existência de situação que tenha colocado em risco o bem jurídico
tutelado.
3) O principal argumento levantado por aqueles que sustentam tal inapli-
cabilidade é o de que o ilícito se revela um crime de perigo abstrato, que
tutela bens jurídicos difusos (segurança publica e paz social), e que, por-
tanto, repele o emprego do princípio da insignificância.
4) Logo, para a caracterização do delito descrito no art. 28 da Lei n.
11.343/2006, não se faz necessária a ocorrência de efetiva lesão ao bem
jurídico protegido, bastando a realização da conduta proibida para que se
presuma o perigo ao bem tutelado. Isso porque, ao adquirir droga para seu
consumo, o usuário realimenta o comércio nefasto, o que põe em risco a
saúde pública e é fator decisivo na difusão dos tóxicos.

40 Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-nov-11/stf-nao-reconhece-crime-mulher-maconha. Acesso em: 09/06/2021.


41 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Porte de droga para consumo pessoal. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em:
<https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/68b1fbe7f16e4ae3024973f12f3cb313>. Acesso em:
27/06/2022
42 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Porte de droga para consumo pessoal. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em:
<https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/68b1fbe7f16e4ae3024973f12f3cb313>. Acesso em:
27/06/2022

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Argumentos favoráveis:
1)Entende que a razão para a recusa da aplicação do princípio da insignifi-
cância em crimes relacionados a entorpecentes está muito mais ligada a
uma decisão político-criminal do que propriamente a uma impossibilidade
dogmática.
2)Se os crimes de perigo concreto exigem uma demonstração concreta do
perigo, em uma certeza de risco de dano, os crimes de perigo abstrato exi-
gem uma demonstração concreta da possibilidade de risco de dano, já que
não são crimes de mera conduta. Isso significa que se não houver, no caso
concreto, uma clara comprovação da possibilidade de risco de dano da con-
duta do agente ao bem jurídico tutelado, estaremos diante de um compor-
tamento atípico do ponto de vista material, ainda que haja uma subsunção
formal da conduta ao tipo penal de perigo abstrato
3)O comportamento do paciente pode não ser capaz de lesionar ou colocar
em perigo o bem jurídico protegido ou colocar em perigo a paz social, a
segurança ou a saúde pública, sendo afastada a tipicidade material do tipo
penal imputado. Trata-se de um caso exemplar em que não há qualquer
demonstração da lesividade material da conduta, apesar da subsunção
desta ao tipo formal.
4) Logo, o direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam re-
sultado cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurí-
dicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante,
seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem
social.
MOEDA FALSA Inaplicável.
CONTRABANDO Inaplicável43.
CRIMES MILITARES Polêmico. Mas entende-se majoritariamente que não se aplica.
ROUBO Não se aplica.
FALSIFICAÇÃO DE
Não se aplica.
DOCUMENTO PÚBLICO
VIOLAÇÃO DE DIREITOS AU-
Não se aplica.
TORAIS
ESTELIONATO
ENVOLVENDO SEGURO DE- Não se aplica.
SEMPREGO
ESTELIONATO
Não se aplica.
ENVOLEVNDO FGTS
O princípio da insignificância pode ser reconhecido mesmo após o trânsito
TRÂNSITO EM JULGADO
em julgado da sentença condenatória.
CRIMES COMETIDOS POR STF: possui julgados aplicando.
PREFEITOS

43 Em relação ao crime de CONTRABANDO, não cabe, em regra, o princípio da insignificância. Isso porque a criminalização da conduta
visa proteger o país contra a entrada de produtos proibidos em seu território. EXCEPCIONALMENTE, porém, é cabível a insignificância
no caso de contrabando de pequena quantidade de medicamento destinado a uso próprio do agente (AgRg no REsp 1572314/RS).

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STJ: possui julgados pela inaplicabilidade.

14. ERRO DE TIPO

14.1 Conceito

O erro de tipo encontra previsão no art. 20, caput do CP. Vejamos:

"O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas
permite a punição por crime culposo, se previsto em lei ".

Cleber Masson traz uma distinção importante sobre erro e ignorância, tendo em vista que são institu-
tos diferentes. Para o autor temos o seguinte (2020, p.272).

Erro Ignorância
O erro é a falsa percepção da realidade ou o falso A ignorância é o completo desconhecimento da rea-
conhecimento de determinado objeto. Exemplo: O lidade ou de algum objeto. Exemplo: O sujeito, nas-
sujeito erra ao confundir um cavalo com um ju- cido em uma casa Urbana e trancado no interior de
mento. um quarto até os 18 anos de idade, não tem a mí-
nima ideia do que seja um cavalo.

A questão é que o Código Penal trata de forma idêntica o erro e a ignorância, tendo em vista ambos
poderem ensejar a aplicação do instituto do erro de tipo, de forma que quando o CP escreve “erro”, devemos
compreender o erro propriamente dito e a ignorância. Fechado? Vamos prosseguir.

Segundo Rogério Sanches (2020, p. 275, Penal Parte Geral), o erro de tipo recai sobre as elementares,
circunstâncias ou quaisquer dados que se agregam a determinada figura típica. Para melhor ilustrar, o autor
traz os seguintes exemplos de erro de tipo:

(A) a mulher que sai às pressas da sala de aula e, por engano, leva a bolsa de sua
colega, muito parecida com a sua;

(B) ou o caçador que atira e mata o seu colega de caça, depois que este, sem avisar,
se disfarçara de urso para pregar-lhe uma peça.44

44 Esses exemplos, tão conhecidos apenas nos livros, não é que aconteceu aqui no Brasil? Saiba mais em:
https://g1.globo.com/mg/sul-
de-minas/noticia/2020/08/03/cacador-e-morto-por-tiro-amigo-ao-ser-confundido-com-javali-na-zona-rural-de-itanhandu-mg.ghtml.
Acesso em: 09/06/2021.

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14.1 Erro de tipo X erro de proibição

É muito comum que a gente confunda, na hora da prova, o erro de tipo com o erro de proibição.
Contudo, vamos aprender essa diferença para nunca mais errar. #TAMOJUNTO

No erro de proibição, o erro (equívoco) NÃO recai sobre os elementos ou dados agregados ao tipo
penal, mas sobre a ILICITUDE da conduta. De forma resumida, a doutrina costuma dizer que no ERRO DE TIPO
o agente não sabe o que faz, enquanto no ERRO DE PROIBIÇÃO o agente sabe o que faz, porém ignora o caráter
ilícito do ato.

Para ilustrar, trago uma tabela feita pelo professor Rogério Sanches em sua obra (2020, p. 275):

Erro de tipo Erro de proibição


Há falsa percepção da realidade que circunda o O agente percebe a realidade, equivocando-se sobre
agente. regra de conduta.
O agente não sabe o que faz. O agente sabe o que faz, mas ignora ser proibido
Ex.: “A” sai de festa com guarda-chuva pensando ser Ex.: “A” encontra um guarda-chuva na rua e acredita
seu, mas logo percebe que errou, pois o objeto é de que não tem obrigação de devolver, porque “achado
terceiro. não é roubado”.

Se você está entendendo tudo até agora, meus parabéns. É um grande passo para entendermos os
demais temas sobre erro tipo. Essa é a base que precisamos para compreender bem o que veremos agora,
que são as espécies de erro de tipo, tendo em vista que o erro de tipo pode ser dividido em duas espécies: o
erro de tipo essencial e o erro de tipo acidental.

Tomem água, respirem, e vamos nessa! Avante!

14.2 Espécies de erro de tipo

Bem, como dissemos acima, o erro de tipo pode ser dividido em duas espécies: o erro de tipo essencial
e o erro de tipo acidental. Desta forma, temos o seguinte:

Erro de tipo essencial Erro de tipo acidental


O erro recai sobre os dados principais do tipo penal. O erro recai sobre dados secundários.
Se avisado do erro, o agente corrige os caminhos ou
Se avisado do erro, o agente para de agir criminosa-
sentido da conduta e continua agindo de forma ilí-
mente.
cita.
O erro de tipo acidental possui cinco subespécies:
erro sobre o objeto, erro sobre a pessoa, erro na
O erro de tipo essencial pode ser inevitável ou evitá-
execução, resultado diverso do pretendido e erro so-
vel
bre o nexo causal (veremos todos ainda neste mate-
rial).

41
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Resumindo:

a) inevitável
Erro de tipo essencial
b) evitável
a) sobre o objeto
b) sobre a pessoa
Erro de tipo acidental c) na execução
d) resultado diverso do pretendido
e) sobre o nexo causal

O que precisa ficar claro é que o erro de tipo, seja evitável ou inevitável, sempre exclui o dolo.

Como lembra Cleber Masson (2020, p. 273), “erro de tipo escusável exclui o dolo e a culpa, acarretando
na impunidade total do fato, enquanto o inescusável exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo,
se previsto em lei (excepcionalidade do crime culposo). Nesse último o agente age de forma imprudente, negli-
gente ou imperita, ao contrário do que faz no primeiro. Excepcionalmente, todavia, pode acontecer de o erro
de tipo, ainda que escusável, não excluir a criminalidade do fato. Esse fenômeno ocorre quando se opera a
desclassificação para outro crime. O exemplo típico é o do particular que ofende um indivíduo desconhecendo
a sua condição de funcionário público. Em face da ausência de dolo quanto a essa elementar, afasta-se o crime
de desacato (CP, art. 331), mas subsiste o de injúria (CP, art. 140), pois a honra do particular também é tutelada
pela lei penal”.

Escusável Exclui o dolo e a culpa

Erro de tipo
Exclui o dolo, mas não a
Inescusável culpa (se houver previsão
de crime culposo)

CAIU NA DPE-SP-2012-FCC: “Em Direito Penal, o erro de tipo, se for invencível, exclui a tipicidade dolosa e a
culposa”.45

CAIU NA DPE-MA-FCC-2015: “Se o agente oferece propina a um empregado de uma sociedade de economia
mista, supondo ser funcionário de empresa privada com interesse exclusivamente particular, incide em erro
de tipo”.46

Para o nosso estudo ficar ainda mais completo, vamos analisar cada espécie de erro.

45 CERTO.
46 CERTO.

42
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a) Erro de tipo essencial

Como vimos acima, o erro de tipo essencial encontra-se no artigo 20, caput, do Código Penal, que
assim dispõe: "O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição
por crime culposo, se previsto em lei”:

Um caso clássico é o do caçador que atira contra um arbusto, pensando que lá estaria um animal,
quando na verdade atinge um humano, vindo este a óbito. Rogério Sanches e outros autores trazem esse
exemplo. Perceba, neste caso, que o atirador não sabia da elementar “alguém”, que consta no crime de ho-
micídio (art. 121, caput, “matar alguém”). Por isso que se diz que o erro de tipo recai sobre as elementares,
circunstâncias ou quaisquer dados que se agregam a determinada figura típica.

Para saber as consequências dessa espécie de erro, precisamos saber se ele foi INEVITÁVEL ou EVITÁ-
VEL. Isso porque o art. 20 do CP, como vimos, estabelece que o erro sobre elemento constitutivo do tipo legal
de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.

Conforme Rogério Sanches (2020, p. 276), temos a seguinte distinção:

Também conhecido como justificável, escusável ou invencível, configura o erro imprevisível,


Inevitável
excluindo o dolo (por não haver consciência) e a culpa (pois ausente a previsibilidade).
Também conhecido como injustificável, inescusável ou vencível, cuida- -se do erro previsí-
Evitável vel, só excluindo o dolo (por não existir consciência), mas punindo a culpa (se prevista como
crime), pois havia possibilidade de o agente conhecer do perigo.

Contudo, uma questão muito tormentosa surge: como fazemos para aferir a evitabilidade (ou inevita-
bilidade) do erro? O Código Penal, eu seu art. 21, parágrafo único, apenas estabelece que “considera-se evi-
tável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas
circunstâncias, ter ou atingir essa consciência”. Perceba, contudo, que ainda assim não há muita clareza sobre
o que de fá fato seria evitável ou inevitável.

Por isso surgem algumas teorias, como sempre, rs. Uma tradicional e outra moderna.

Teorias para se chegar à evitabilidade/inevitabilidade do erro de tipo essencial


Tradicional Moderna
Invoca a figura do "homem médio" por entender Trabalha com as circunstâncias do caso concreto, pois
que a previsibilidade deve ser avaliada tão-so- percebe que o grau de instrução, idade do agente,
mente sob o enfoque objetivo, levando em consi- momento e local do crime podem interferir na previ-
deração estritamente o fato e não o autor. (San- sibilidade do agente (circunstâncias desconsideradas
ches, 2020, p. 276) na primeira orientação). (Sanches, 2020, p. 276)

Vistos os detalhes sobre erro de tipo essencial, agora precisamos entender sobre o chamado erro de
tipo e crime putativo por erro de tipo e as descriminantes putativas, para depois vermos todas as hipóteses
de erro de tipo acidental.

43
@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 43
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b) Erro de tipo e crime putativo por erro de tipo

Primeiro, preciso que você não ache que esses institutos são iguais. Apesar do nome querer passar
isso, são institutos diferentes.

Para Cleber Masson (2020, p. 273), a diferença primordial entre eles é a seguinte:

Erro de tipo Crime putativo por erro de tipo


No erro de tipo o indivíduo, desconhecendo um ou Já o crime putativo por erro de tipo, ou delito puta-
vários elementos constitutivos, não sabe que pratica tivo por erro de tipo, é o imaginário ou erronea-
um fato descrito em lei como infração penal, quando mente suposto, que existe exclusivamente na mente
na verdade o faz. do agente. Ele quer praticar um crime, mas, por erro,
acaba por cometer um fato penalmente irrelevante.
Exemplo: “A” deseja praticar o crime de tráfico de
drogas (Lei 11.343/2006, art. 33, caput), mas por
desconhecimento comercializa talco.

Nessa mesma pegada, também precisamos revisar com calma o tema “descriminantes putativas”. Se
você não lembra, fique tranquilo(a), estamos aqui para aprender.

c) Discriminantes putativas

Mas antes de iniciarmos sobre as descriminantes propriamente, vamos entender a junção desses no-
mes dois nomes (descriminantes putativas), para que tudo faça sentido. Vejamos o significado individualmente
de cada expressão.

Descriminante Putativa
Causa que exclui o crime, retirando o caráter ilícito Putativa provém de parecer, aparentar. É algo ima-
do fato típico praticado por alguém. Sinônimo de ginário, erroneamente suposto. É tudo aquilo que
causa de exclusão da ilicitude. (Masson, 2020, p. parece, mas não é o que aparenta ser. (Masson,
274). 2020, p. 274).

Desta forma, de maneira, geral, podemos dizer que a descriminante putativa é uma causa de exclusão
de ilicitude que NÃO EXISTE no caso concreto, mas tão somente na cabeça do agente que pratica o fato. Por
isso que parte da doutrina chamada a descriminante putativa também de “descriminante erroneamente su-
posta ou descriminante imaginária”.

Portanto, é possível que haja legítima defesa putativa, estrito cumprimento do dever legal putativo e
exercício regular do direito putativo. Para isso, será necessário que o agente, incidindo em erro, suponha situ-
ação que, se realmente existisse, tornaria ação legítima.

As descriminantes putativas guardam relação com a figura do erro, sendo dividida em três espécies
vistas a seguir (Cleber Masson, 2020, p. 274):

44
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a) erro relativo aos pressupostos de fato de uma causa de exclusão da ilicitude: É o


caso daquele que, ao encontrar seu desafeto, e notando que tal pessoa coloca a mão
no bolso, saca seu revólver e o mata. Descobre, depois, que a vítima fora acometida
por cegueira, por ele desconhecida, e não poderia sequer ter visto o seu agressor.
Ausente, portanto, um dos requisitos da legítima defesa, qual seja a “agressão in-
justa”;

b) erro relativo à existência de uma causa de exclusão da ilicitude: Imagine-se o su-


jeito que, depois de encontrar sua mulher com o amante, em flagrante adultério,
mata a ambos, por crer que assim possa agir acobertado pela legítima defesa da
honra. Nessa situação, o agente errou quanto à existência desta descriminante, não
acolhida pelo ordenamento jurídico em vigor;

c) erro relativo aos limites de uma causa de exclusão da ilicitude: Temos como exem-
plo o fazendeiro que reputa adequado matar todo e qualquer posseiro que invada a
sua propriedade. Cuida-se da figura do excesso, pois a defesa da propriedade não
permite esse tipo de reação desproporcional.

Galera, ainda preciso que vocês saibam que a grande discussão sobre esse tema diz respeito à natu-
reza jurídica dessas três modalidades de descriminantes putativas. Na verdade, quanto às duas últimas - erro
relativo à existência de uma causa de exclusão da ilicitude e erro relativo aos limites de uma causa de exclusão
da ilicitude – não há grandes discussões, sendo pacífico o entendimento de que se trata, de fato, de uma
modalidade de erro de proibição (erro de proibição indireto, chamado também de descriminante putativa por
erro de proibição).

Neste caso, subsiste o dolo e também a culpa, excluindo-se a culpabilidade, se o erro for inevitável ou
escusável.

CAIU NA DPE/BA – 2021 – FCC: No Direito Penal, o erro:


A) de proibição incide sobre os elementos imputabilidade e exigibilidade de conduta diversa da culpabilidade,
levando à isenção de pena.
B) de tipo, quando evitável, conduz à redução da pena de um sexto a um terço.
C) sobre a pessoa consideram-se as condições e qualidades da vítima, em razão da proibição de responsabili-
dade penal objetiva.
D) inevitável sobre a ilicitude do fato exclui a culpabilidade, de modo a impedir a responsabilidade penal do
agente.
E) sobre a existência ou limites de uma causa de justificação configura o erro de tipo permissivo, com exclusão
da tipicidade objetiva.47

47 GAB: D.

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@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 45
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Por outro lado, caso o erro seja EVITÁVEL, não há afastamento da culpabilidade, respondendo o
agente por crime doloso, diminuindo-se a pena de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), na forma definida pelo art.
21, caput, do Código Penal.

Erro sobre a ilicitude do fato

Art. 21 - O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se


inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço.

Já com relação à hipótese primeira - erro relativo aos pressupostos de fato de uma causa de exclusão
da ilicitude a natureza jurídica da descriminante putativa vai depender da teoria da culpabilidade adotada. Isso
porque, para a teoria normativa pura, em sua vertente limitada, constitui-se em erro de tipo permissivo. É aí,
portanto, que surgem as descriminantes putativas por erro de tipo.

Por outro lado, como bem lembra Cleber Masson, “para a teoria normativa pura, em sua variante
extremada, extrema ou estrita, trata-se também de hipótese de erro de proibição. Logo, constitui descrimi-
nante putativa por erro de proibição, com todos os seus efeitos: subsiste o dolo, e também a culpa, excluindo-
se a culpabilidade se o erro for inevitável ou escusável. Se evitável ou inescusável o erro, não se afasta a culpa-
bilidade, e o agente responde por crime doloso, diminuindo-se a pena de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), nos
moldes do art. 21, caput, do Código Penal. Partilham desse entendimento, que consagra em sede de descrimi-
nantes putativas a teoria unitária do erro, Cezar Roberto Bitencourt e Guilherme de Souza Nucci, entre outros.
Enfim, a natureza jurídica das descriminantes putativas varia conforme a teoria da culpabilidade adotada con-
forme o quadro abaixo” (2020, p. 275/276):

Teoria limitada da Teoria normativa pura


Descriminante putativa
culpabilidade da culpabilidade
Erro relativo aos pressupostos de
Erro de proibição (teoria unitária
fato de uma causa de exclusão da Erro de tipo
do erro)
ilicitude
Erro relativo à existência de uma
Erro de proibição Erro de proibição
causa de exclusão da ilicitude
Erro relativo aos limites de uma
Erro de proibição Erro de proibição
causa de exclusão da ilicitude

d) Erro de tipo acidental

Agora trataremos dos erros acidentais. Inicialmente, saibam que o erro de tipo acidental é aquele que
recai sobre dados diversos (secundários) dos elementos constitutivos do tipo penal. A doutrina costuma apre-
sentar 5 (cinco) espécies de erro acidental, os quais veremos agora.

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@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 46
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d.1 Erro de tipo acidental sobre o objeto (error in objecto)

O erro acidental sobre o objeto não tem previsão legal, apesar da doutrina tratar sobre o tema. Nesta
espécie de erro o agente confunde o objeto material visado e atinge outro que não o desejado.

Exemplo dado por Sanches: a pessoa ingressa numa loja para subtrair um relógio de ouro, mas acaba
furtando um relógio dourado (sem ser de ouro), confundindo, portanto, o objeto visado.

Neste caso, por exemplo, embora tenha existido um erro, a consequência será a punição do agente
pela conduta praticada, respondendo pelo delito e considerando-se o objeto material (coisa) efetivamente
atingido.

d.2 Erro de tipo acidental quanto à pessoa (error in persona)

O erro quanto à pessoa tem previsão legal no art. 20, § 3º do Código Penal:

Art. 20, § 3º O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de
pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão
as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime.

Nesta espécie de erro, o agente se equivoca quanto à pessoa visada e atinge pessoa diversa. Desta
forma, perceba que há a vítima real (pessoa que de fato é atingida) e a vítima virtual (pessoa que se pretendia
atingir caso o agente não tivesse errado).

Exemplo dado por Rogério Sanches: “A” quer matar seu próprio pai, porém, representando equivoca-
damente a pessoa que entra na casa, acaba matando o seu tio. "A" será punido por parricídio, embora seu pai
permaneça vivo.

CAIU NA DPE-AM-2018-FCC: “No Direito Penal brasileiro, o erro sobre a pessoa leva em consideração as con-
dições e qualidades da vítima para fins de aplicação da pena”.48

Perceba que o erro sobre a pessoa não exclui o dolo e muito menos a culpa. Também não isenta o
agente de pena. Porém, nos termos do art. 20, § 3º do CP, o magistrado deverá considerar as qualidades ou
condições pessoais da vítima virtual (a que de fato o autor queria atingir).

d.3 Erro de tipo acidental na execução

Esse erro é o conhecido como aberratio ictus, ou também chamado de erro na execução. Encontra-se
previsto no artigo 73 do Código Penal:

48 ERRADO. O erro sobre a pessoa leva em consideração as condições e qualidades da vítima virtual (pretendida), e não da vítima
atingida.

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@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 47
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Erro na execução

Art. 73 - Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao
invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde
como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º
do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente
pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.

Trata-se de erro ou acidente no uso dos meios de execução e, por consequência desse erro (ou aci-
dente), o agente acaba atingindo pessoa diversa da pretendida.

Exemplo dado por Rogério Sanches: "A" mira seu pai, entretanto, por falta de habilidade no uso da
arma, acaba atingindo um vizinho que passava do outro lado da rua.

Abro um parêntese para lembrá-los que não podemos confundir erro sobre a pessoa com o erro na
execução (aberratio ictus).

Erro sobre a pessoa49 Erro na execução (aberratio ictus)


Há equívoco na representação da vítima pretendida. Representa-se bem a vítima pretendida.
A execução do crime é correta (não há falha opera- A execução do crime é errada (ocorre falha operaci-
cional) onal).
A pessoa visada não corre perigo, pois confundida A pessoa visada corre perigo, não sendo confundida.
com outra.

Nos dois casos o agente responde pelo crime cometido considerando as qualidades da vítima virtual, pre-
tendida.

Ademais, o erro na execução pode ter duas consequências:

Consequência 01: caso o agente atinja apenas a pessoa diversa da pretendida (aberratio ictus de re-
sultado único), será punido pelo crime. Porém, neste caso serão consideradas as condições e qualidades da
vítima desejada (virtual) e não da vítima que de fato foi atingida (real).

Consequência 02: na hipótese de o agente atingir também a pessoa diversa da pretendida (chamado
pela doutrina de aberratio ictus com unidade complexa ou resultado duplo), a consequência será a punição
pelos dois crimes, aplicando-se, neste caso, as regras do concurso formal.

d.4 Resultado diverso do pretendido

Também chamado de aberratio criminis ou aberratio delicti, encontra previsão no art. 74 do Código
Penal, vejamos:

49 Tabela feita por Rogério Sanches Cunha em sua obra “Manual de Direito Penal: parte geral, 2020, p. 279).

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@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 48
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Resultado diverso do pretendido

Art. 74 - Fora dos casos do artigo anterior, quando, por acidente ou erro na execução
do crime, sobrevém resultado diverso do pretendido, o agente responde por culpa,
se o fato é previsto como crime culposo; se ocorre também o resultado pretendido,
aplica-se a regra do art. 70 deste Código

Trata-se de situação em que o agente, seja por acidente ou erro no uso dos meios de execução, tam-
bém atinge bem jurídico distinto daquele que pretendia atingir.

Desta forma, podemos concluir que tanto a aberratio ictus quanto a aberratio criminis são espécies
de erro na execução. A diferença é que na aberratio ictus o erro praticado pelo agente atinge pessoa diversa
da pretendida (pessoa x pessoa). Enquanto no aberratio criminis o agente provoca lesão em bem jurídico di-
verso do pretendido (coisa X pessoa).

Rogério Sanches traduz bem essa distinção em uma tabela que trago abaixo:

Erro na execução
Tipo de erro Aberratio Ictus Aberratio Criminis
Previsão Le-
Art. 73 do CP Art. 74 do CP
gal
0 agente, apesar do erro, atinge o O agente, em razão do erro, atinge bem jurídico
mesmo bem jurídico de pessoa diversa. diverso. Resultado produzido diverso (vida) do
Conceito
O resultado produzido (vida) coincide resultado pretendido (patrimônio).
com o resultado pretendido (vida).
Relação Há uma relação pessoa X pessoa Há uma relação coisa X pessoa.

d.5. Erro sobre o nexo causal

Chegamos no último erro acidental: erro sobre o nexo causal. Trata-se de erro que também não possui
previsão legal, embora presente na maioria dos manuais.

Segundo Rogério Sanches,

“É o caso em que o resultado desejado se produz, mas com nexo diverso, de maneira
diferente da planejada pelo agente. Divide-se em duas espécies. A primeira é erro
sobre o nexo causal em sentido estrito. Ocorre quando o agente, mediante um só
ato, provoca o resultado visado, porém com outro nexo de causalidade. Exemplo:
"A" empurra "B" de um penhasco para que ele morra afogado, porém, durante a
queda, "B" bate a cabeça contra uma rocha e morre em razão de um traumatismo
craniano. A segunda é o dolo geral ou aberratio causae, espécie em que o agente,
mediante conduta desenvolvida em pluralidade de atos, provoca o resultado pre-
tendido, porém com outro nexo. Exemplo: "A" atira em "B" (primeiro ato) e,

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@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 49
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imaginando que "B" está morto, joga seu corpo no mar, vindo "B" a morrer por afo-
gamento. A consequência que prevalece, é a punição do agente por um só crime
(princípio unitário), desejado desde o início, a título de dolo (nos exemplos acima,
homicídio consumado), considerando-se, aliás, o nexo ocorrido (e não o preten-
dido). É o que ensina Cleber Masson, citando Paulo José da Costa Júnior e exempli-
ficando com a hipótese de um pretendido homicídio qualificado pelo emprego de
veneno”.50

Porém, Rogério Sanches discorda dos ensinamentos de Cleber Masson na citação acima:

(...) Ousamos discordar. Como já alertamos no erro sobre o objeto, não havendo
previsão legal, parece mais acertado (e justo) o juiz, na dúvida, considerar o nexo
mais favorável ao réu, aquilatando o caso concreto. O agente vai ser punido pelo
crime praticado, mas considerando o nexo desejado ou realizado, sempre o mais
benéfico (imaginemos que um nexo gera qualificados, enquanto o outro permite a
forma simples do delito). (Ibidem, p. 283).

50Cunha, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral (arts. 1º ao 120) /Rogério Sanches Cunha. - 8. ed. rev., ampl. e atual. -
Salvador: JusPODIVM, 2020, p. 283.

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QUESTÕES PARA FIXAR


Questão 01
O princípio da subsidiariedade determina que somente os bens jurídicos mais relevantes devem ser tutelados
pelo Direito Penal.

CERTO ERRADO

Questão 02
Para o funcionalismo sistêmico, defendido por Günther Jakobs, o direito penal surge para proteger bens juri-
dicamente relevantes. Desta forma, a norma penal incide devido a necessidade de proteger os bens jurídicos
e não para reafirmar a manutenção da ordem.

CERTO ERRADO

Questão 03
O direito penal do inimigo é orientado para o combate aos perigos e desta forma, autoriza que seja utilizado
qualquer meio disponível para punir os considerados “inimigos”, ainda que haja violação de direitos previstos.

CERTO ERRADO

Questão 04
A liquefação do direito penal consiste na tendência do direito penal de proteger bem jurídicos desmaterializa-
dos, cada vez mais difusos, tais como o meio ambiente, a saúde pública, a segurança pública, etc.

CERTO ERRADO

Questão 05
Conforme a doutrina, o direito penal pode ser dividido em velocidades. Desta forma, a terceira velocidade do
direito penal é caracterizada pela aplicação de penas privativas de liberdade, com procedimento mais lento,
havendo respeito às garantias constitucionais.

CERTO ERRADO

Questão 06
No conceito de crime defendido pela teoria finalista (Hans Welzel) há a migração do dolo e da culpa para o
fato típico. Desta forma, o dolo passa a ser um elemento puramente psicológico, sem qualquer juízo de valor,
ou seja, um dolo natural.

CERTO ERRADO

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Questão 07
A teoria da ratio essendi afirma que a tipicidade presume a ilicitude, ou seja, até que não se comprove que o
agente atuou amparado por uma excludente de ilicitude, o fato será presumidamente ilícito.

CERTO ERRADO

Questão 08
São causas que excluem a conduta: a) caso fortuito ou força maior; b) coação física ou moral; c) atos ou movi-
mentos reflexos e; d) atos praticados por pessoas em estado de sonambulismo.

CERTO ERRADO

Questão 09
No dolo eventual o agente prevê uma pluralidade de resultados, dirigindo sua conduta para perfazer qualquer
deles com a mesma intensidade de vontade.

CERTO ERRADO

Questão 10
Acerca das teorias da tentativa, para a teoria sintomática, o fundamento de punição da tentativa concentra-
se na análise da periculosidade do agente.

CERTO ERRADO

Questão 11
Uma das teorias sobre o crime impossível é a teoria objetiva pura, na qual não há tentativa se a ineficácia do
meio ou a impropriedade do objeto forem exclusivamente absolutas. Caso sejam relativas e o crime não se
consumar por circunstâncias alheias à vontade do agente, o agente responderá por tentativa.

CERTO ERRADO

Questão 12
Em relação ao nexo de causalidade, o Código Penal adotou, em regra, a teoria da equivalência dos anteceden-
tes causais, também chamada de conditio sine qua non. Para esta teoria, causa é todo e qualquer aconteci-
mento provocado pelo agente, sem o qual o resultado não teria ocorrido.

CERTO ERRADO

Questão 13
A tipicidade conglobante é a comprovação de que a conduta legalmente típica está também proibida pela
norma, o que se afere separando o alcance da norma proibitiva conglobada com as demais normas do sistema
jurídico.

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CERTO ERRADO

Questão 14
O princípio da insignificância, também conhecido como princípio da bagatela imprópria, assinala a desneces-
sidade da pena, mesmo que o fato seja típico, ilícito e culpável.

CERTO ERRADO

GABARITO
1.E 2.E 3.C 4.C 5.E 6.C 7.E
8.E 9.E 10.C 11.E 12.C 13.C 14.E

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QUESTÕES PARA FIXAR - COMENTÁRIOS


Questão 01
O princípio da subsidiariedade determina que somente os bens jurídicos mais relevantes devem ser tutelados
pelo Direito Penal.
GAB: E. O enunciado aborda a determinação do princípio da fragmentariedade. O princípio da subsidiariedade
dispõe que, mesmo diante de um ato violador de bem jurídico relevante ao direito penal, este ramo somente
atuará no caso concreto se os outros ramos do direito (como civil e administrativo) não forem capazes de
tutelá-lo.

Questão 02
Para o funcionalismo sistêmico, defendido por Günther Jakobs, o direito penal surge para proteger bens juri-
dicamente relevantes. Desta forma, a norma penal incide devido a necessidade de proteger os bens jurídicos
e não para reafirmar a manutenção da ordem.
GAB: E. O enunciado trata do funcionalismo teleológico, defendido por Claus Roxin.

Questão 03
O direito penal do inimigo é orientado para o combate aos perigos e desta forma, autoriza que seja utilizado
qualquer meio disponível para punir os considerados “inimigos”, ainda que haja violação de direitos previstos.
GAB: C. É o que dispõe o direito penal do inimigo abordado por Günther Jakobs.

Questão 04
A liquefação do direito penal consiste na tendência do direito penal de proteger bem jurídicos desmaterializa-
dos, cada vez mais difusos, tais como o meio ambiente, a saúde pública, a segurança pública, etc.
GAB: C. A referida tendência é também chamada de espiritualização do direito penal ou desmaterialização do
direito penal.

Questão 05
Conforme a doutrina, o direito penal pode ser dividido em velocidades. Desta forma, a terceira velocidade do
direito penal é caracterizada pela aplicação de penas privativas de liberdade, com procedimento mais lento,
havendo respeito às garantias constitucionais.
GAB: E. O enunciado aborda as características do direito penal de primeira velocidade. A terceira velocidade
é a soma da primeira e a segunda velocidade, isto é, aplicação de penas privativas de liberdade, contudo, com
garantias constitucionais flexibilizadas. Ex.: Lei de Crimes Hediondos. Está associada ao Direito penal do ini-
migo de Jakobs.

Questão 06
No conceito de crime defendido pela teoria finalista (Hans Welzel) há a migração do dolo e da culpa para o
fato típico. Desta forma, o dolo passa a ser um elemento puramente psicológico, sem qualquer juízo de valor,
ou seja, um dolo natural.

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@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 54
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GAB: C. O conceito finalista de Hans Welzel está diretamente ligado a teoria normativa pura da culpabilidade,
onde o elemento subjetivo (dolo/culpa) migra para o fato típico, permanecendo na culpabilidade apenas ele-
mentos normativos.

Questão 07
A teoria da ratio essendi afirma que a tipicidade presume a ilicitude, ou seja, até que não se comprove que o
agente atuou amparado por uma excludente de ilicitude, o fato será presumidamente ilícito.
GAB: E. O enunciado aborda a teoria da ratio cognoscendi, que é a teoria adotada no Brasil.

Questão 08
São causas que excluem a conduta: a) caso fortuito ou força maior; b) coação física ou moral; c) atos ou movi-
mentos reflexos e; d) atos praticados por pessoas em estado de sonambulismo.
GAB: E. O erro da questão está em considerar que a coação moral exclui a conduta, quando na verdade exclui
a culpabilidade. A coação física, no entanto, exclui a conduta (afastando o elemento tipicidade, já que é nele
que se encontra a conduta).

Questão 09
No dolo eventual o agente prevê uma pluralidade de resultados, dirigindo sua conduta para perfazer qualquer
deles com a mesma intensidade de vontade.
GAB: E. Trata-se do conceito de dolo alternativo.

Questão 10
Acerca das teorias da tentativa, para a teoria sintomática, o fundamento de punição da tentativa concentra-
se na análise da periculosidade do agente.
GAB:C. É exatamente o que preconiza a referida teoria sintomática.

Questão 11
Uma das teorias sobre o crime impossível é a teoria objetiva pura, na qual não há tentativa se a ineficácia do
meio ou a impropriedade do objeto forem exclusivamente absolutas. Caso sejam relativas e o crime não se
consumar por circunstâncias alheias à vontade do agente, o agente responderá por tentativa.
GAB: E. A questão aborda o conceito defendido pela teoria objetiva temperada, que é a adotada pelo Código
Penal. Na teoria objetiva pura não há crime mesmo que a ineficácia do meio ou a impropriedade do objeto
sejam relativas. Não é adotada pelo Código Penal.

Questão 12
Em relação ao nexo de causalidade, o Código Penal adotou, em regra, a teoria da equivalência dos anteceden-
tes causais, também chamada de conditio sine qua non. Para esta teoria, causa é todo e qualquer aconteci-
mento provocado pelo agente, sem o qual o resultado não teria ocorrido.
GAB: C. É exatamente a teoria adotada pelo Código Penal, como regra.

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@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 55
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Questão 13
A tipicidade conglobante é a comprovação de que a conduta legalmente típica está também proibida pela
norma, o que se afere separando o alcance da norma proibitiva conglobada com as demais normas do sistema
jurídico.
GAB:C. É a tese defendida pela teoria da tipicidade conglobante.

Questão 14
O princípio da insignificância, também conhecido como princípio da bagatela imprópria, assinala a desneces-
sidade da pena, mesmo que o fato seja típico, ilícito e culpável.
GAB:E. Trata-se da bagatela imprópria. O princípio da insignificância relaciona-se com a bagatela própria,
sendo uma causa supralegal de exclusão de tipicidade.

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@CURSOEBLOGRDP #TÔCOMORDP 56

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