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RESUMO
A grande contribuição de Max Weber foi promover a integração do método da
causalidade das “ciências da natureza”, com o método da compreensão, en-
tendido como o mais adequado às “ciências da cultura”. O paradigma da ação
recobre toda sua obra e a tipologia da ação vai forjar uma estratégia para cap-
tar o sentido da ação. Ao usar a burocracia como tipo ideal e a institucionaliza-
ção da dominação e poder que advém da burocratização das estruturas orga-
nizacionais, a TO promoveu a criação de um padrão de organização conside-
rada mais eficiente e criou uma representação convencional de seus estudos e
pesquisas.
Palavras-chave: Weber; Paradigma da ação; Burocracia; Ciência social.
O
ponto central para a compreen- A ação sobre a qual Weber centra sua
são da obra de Weber é o para- análise é a ação racional com relação a
digma da ação, quando o autor fins, pois a característica central do mun-
distingue entre ação racional com rela- do contemporâneo é a racionalização.
ção a fins, ação racional com relação a Para falar do sentido da ação Weber cons-
valores, ação afetiva e ação tradicional. truiu uma démarche cognitiva específica,
De certo modo esta classificação elucida diferente da démarche das ciências da na-
todas as concepções de Max Weber, uma tureza, mas não isenta de normas de exa-
vez que a sociologia é uma ciência que tidão e de rigor metodológico. Esta dé-
procura compreender a ação social. marche é formada por dois aspectos in-
*
Doutora em Administração pela UFMG, professora da FUMEC e da Faculdade Promove.
**
Doutor em Administração pela UFMG, professor da PUC Minas, Membro do Grupo de Estudos
Avançados em Gestão Internacional (GGI/UFMG).
sões sobre Max Weber e sua relação com dem a superação desta opção, buscando
a Teoria Organizacional. elementos metodológicos nos dois tipos
de estudo que, mesmo considerados
completamente diferentes, ofereçam pos-
WEBER, O MÉTODO, O TIPO IDEAL E SUA sibilidades que permitam um alto nível
OBRA A ÉTICA PROTESTANTE E O de compreensão dos fenômenos sociais,
ESPÍRITO DO CAPITALISMO quando adequadamente utilizadas. Para
Weber, a validade da sociologia enquan-
Max Weber representa uma das mais to ciência está unicamente nos problemas
importantes expressões teóricas da cha- específicos que ela se propõe a resolver.
mada sociologia que desenvolveu-se nos Aquilo que caracteriza o acontecimen-
primeiros anos do séc. XX. to social (objeto de estudo da sociologia),
Para compreender melhor as preocu- é o que se refere a valores, ou seja, à pró-
pações teóricas e metodológica de Max pria ação humana. Esta é a uma questão
Weber, é preciso ainda evidenciar que o central na reflexão epistemológica de
que estava em questão era todo o edifí- Weber: a observação de que diferente-
cio das Ciências Sociais, tanto seus fun- mente das ciências naturais, nas ciênci-
damentos quanto seus instrumentos as sociais a realidade empírica está sem-
metodológicos. A grande preocupação pre referida a alguma ordem de valora-
de Weber é trazer para um plano técnico ção. Assim, será preciso libertar o pes-
o pressuposto da validade e da objetivi- quisador de seus valores para que as ci-
dade, que passarão a ser consideradas ências sociais se fundamentem, e este
como propriedades metodológicas. A representará o esforço para construir
validade do conhecimento científico de- uma metodologia adequada a especifi-
penderá, então, da confiabilidade dos cidade do fato social.
métodos empregados, no sentido de que Partindo da premissa de que aquilo
a estrutura lógica dos mesmos possa ga- que justifica a existência de uma ciência é
rantir a transmissão da verdade dos a proposição de um problema específico
enunciados observáveis às hipóteses e a solucionar, para Weber não cabe buscar
vice-versa, pois por essa via poder-se-á um método universal, ao contrário, a
cumprir o requisito fundamental da ob- oportunidade da utilização de um deter-
jetividade científica exigido por Weber: minado processo metodológico deve va-
a verificação empírica dos resultados riar de acordo com o problema a ser re-
obtidos. (Saint-Pierre, 1991) solvido. Desta forma, podem existir tan-
Weber cria, assim, um sistema socio- tas ciências quantos pontos de vista espe-
lógico de interpretação dos acontecimen- cíficos no exame de um dado problema.
tos sociais, profundamente marcado pelo Weber, assumindo o espírito da epis-
debate que dividia os intelectuais ale- temologia Kantiana, nega que o conhe-
mães do seu período, acerca do estatuto cimento possa ser uma reprodução ou
das ciências “humanas” em relação às uma cópia integral da realidade, tanto no
ciências naturais. Seus trabalhos preten- sentido da explicação como da compre-
tipo ideal das ações sociais propõe for- ensão subjetiva das ações sociais estuda-
mação de um juízo de atribuição. Não é das. Thimasheff (1960) caracteriza dois
nunca uma “hipótese”, mas pretende modos de elaboração da compreensão ao
apontar o caminho para a formação de nível do significado das ações. Primeiro
hipóteses. Embora não constitua uma ex- há a compreensão por observação direta
posição da realidade, pretende conferir do significado subjetivo do ato de ou-
a ciência meios expressivos unívocos. trem. Pode-se apreender estes significa-
Freund (1970) explica que o tipo ide- dos porque temos consciência das inten-
al é um outro momento da seleção, feita ções subjetivas que atribuímos a nossas
pelo historiador e o sociólogo, por abor- próprias ações iguais. Segundo, há uma
darem necessariamente o real a partir de compreensão de motivo. Caracteriza-se
certos pontos de vista, em função da re- pela reprodução, no observador do raci-
lação com os valores. É ele, o modo de ocínio do agente ou, se sua ação não for
construção de conceitos peculiar ao mé- racional, compreende-se o contexto emo-
todo histórico ou individualizante, cujo cional em que ocorre a ação através da
objeto é o estudo da realidade e dos fe- participação simpatética ou da empatia.
nômenos em sua singularidade. Por Não há necessidade de participar dos
exemplo, o capitalismo, sendo uma ma- pontos de vista teóricos ou dos fins últi-
nifestação singular da vida econômica, mos ou valores do agente, mas intelec-
não poderia ser determinado pela adi- tualmente compreende-se a situação e a
ção das características comuns a todas as conduta correspondente.
formas de capitalismo, ou mesmo pela Na obra de Weber, continuadamente
média dos traços peculiares às diversas utiliza-se a comparação como técnica pa-
formas de fenômeno. A solução estaria ra relacionar entre si eventos totalmente
no conceito de tipo entendido de certa diversos. Segundo Jaspers (1977), o au-
maneira. Esta noção pode tomar o senti- tor utiliza a comparação como um dos
do de um conjunto de traços comuns (o caminhos para encontrar o possível. Ao
tipo médio), mas também o de uma esti- comparar desenvolvimentos na China,
lização que põe em evidência os elemen- na Índia ou no Ocidente, ele não procu-
tos característicos, distintivos ou típicos. ra encontrar leis históricas ou tipos so-
A grande maioria dos tipos não se ciológicos como abstrações do idêntico
aplica diretamente a ações, mas a coleti- ou do semelhante, mas faz do semelhan-
vidades sociais. A ação existe somente te o meio para se chegar a captação tan-
como conduta de um ou mais seres hu- to mais decisiva do especificamente di-
manos individuais, as coletividades de- ferente. Nas situações históricas seme-
vem ser tratadas como resultantes de lhantes os possíveis também são seme-
modos de organização de atos pratica- lhantes. No entanto, ao longo do tempo,
dos por indivíduos. ocorre o oposto ou simplesmente o dis-
Ao pesquisador interessa construir crepante. A partir das semelhanças, em
seus trabalhos nos termos daquilo que contraste com elas mesmas, pode-se en-
Weber determina como sendo a compre- contrar aquilo que se particulariza em ca-
da caso. Este particular que se procura é pode ser obtida quando este processo de-
pensado enquanto o possível. monstra oferecer uma adequação de sen-
Há um princípio de método, que de- tido e também pode ser demonstrado
preende-se da utilização da comparação, tanto significativa como casualmente
hoje denominado de homologia estrutu- adequado. No caso de nenhum sentido
ral, conforme Boudon (1989), que no tex- se ligar a uma tal ação típica, então, inde-
to A ética protestante e o espírito do ca- pendentemente do grau de uniformida-
pitalismo destaca-se por explicar um fe- de ou de precisão estatística da probabi-
nômeno, no caso o capitalismo, não por lidade, ela ainda permanece uma proba-
se tornar patente um feixe de causas e bilidade estatística incompreensível, em-
circunstâncias históricas, mas sim um pa- bora lide com um processo manifesto ou
ralelismo entre duas estruturas: a do subjetivo. A garantia possível de ser ob-
comportamento do empresário capitalis- tida em termos da casualidade significa-
ta e a da mentalidade puritana. A inter- tiva da adequação de sentido das ações
pretação de Weber deste paralelismo se advém da determinação, com algum
dá de maneira causal. O protestantismo grau de freqüência de aproximação, de
é descrito como uma das causas do capi- um tipo médio ou ideal.
talismo moderno. Para Weber, um saber só se adequa ao
Deste modo temos que um dos con- rigor da análise científica quando procu-
ceitos mais expressivos de Weber é o de ra ser acessível a todas as pessoas, ou
casualidade. Parece que o objetivo fun- seja, se submete à transformação concei-
damental da análise weberiana está em tual, à verificação, aos processos de ve-
buscar compreender as relações de cau- rificação da prova, etc. Seja qual for o pa-
sa-efeito dos acontecimentos sociais. É pel da intuição, e Weber não o minimi-
preciso identificar que sua concepção de za, a experiência vivida nunca é como tal
causa leva em conta o princípio de que um conhecimento científico. (Freund,
aquilo que de um certo ponto de vista se 1970)
considera como efeito, pode por sua vez O objeto, a entidade de que Max We-
agir como causa, e aquilo que se chama ber se ocupou, é realmente uma entida-
causa, pode, sob outro ponto de vista, de histórica singular: em parte alguma,
agir como efeito. De outra maneira, po- em qualquer outra sociedade e em ne-
de-se dizer que tudo o que é produzido, nhuma outra época, se viu desenvolver
produz por sua vez uma ação. este processo que constitui o capitalismo
Weber (1987) condiciona uma inter- ocidental. A questão a que se propõe,
pretação causal correta de uma ação con- então, é tentar compreender melhor por-
creta ao fato desta ação manifesta e seus que os comportamentos historicamente
motivos serem corretamente estabeleci- inéditos que caracterizam o empresário
dos e se, ao mesmo tempo, o relaciona- capitalista puderam desenvolver-se.
mento entre eles tornar-se inteligível, de (Boudon, 1989)
acordo com seu sentido. Uma interpre-
tação causal correta de uma ação típica
cita do uso dos meios lícitos. Para o ho- duta no mundo, devendo, deste modo,
mem pré-capitalista, a moral não só con- provar-se a si mesmo. Não importa até
denava os meios ilícitos, como também que ponto o mundo, como tal, é religio-
limitava a utilização dos ilícitos. (Fanfa- samente desvalorizado, pois este será o
ni, 1958) espaço da atividade desejada por Deus
Weber observa que a questão das for- na “vocação” que se tem neste mundo.
ças motivadoras da expansão do capita- O ascetismo desejou racionalizar o
lismo moderno não é, a princípio, uma mundo eticamente de acordo com os
questão de origem das somas de capi- mandamentos do Senhor. No ascetismo
tais disponíveis para o uso capitalístico, do mundo, a graça e o estado escolhido
mas, fundamentalmente, do desenvolvi- do homem religiosamente qualificado,
mento do espírito do capitalismo. Onde submetem-se à prova na vida diária, nas
ele aparece e é capaz de se desenvolver, atividades metódicas e racionalizadas de
ele produz seu próprio capital e seu su- vida de trabalho diário a serviço do Se-
primento monetário como meios para nhor. Transformada racionalmente numa
seus próprios fins, e não o inverso. vocação, a conduta cotidiana torna-se
central para a comprovação do estado de
A ética protestante enquanto tipo ideal graça. Assim, as seitas ocidentais fermen-
Weber (1963) sustenta que quando os tam a racionalização metódica da con-
virtuosos religiosos, aqueles religiosa- duta, inclusive a econômica.
mente qualificados, combinam-se numa O protestantismo introduziu no mun-
seita ascética ativa, alcança-se dois obje- do a idéia de vocação, segundo a qual
tivos fundamentais: o desencantamento cada indivíduo se entregaria de corpo e
do mundo e o bloqueio do caminho da alma a cultivar a atividade a que era cha-
salvação através da fuga do mundo. mado a desenvolver, convencido de que
Ocorre um desvio bastante significativo era este o seu único dever para com Deus
no caminho da salvação, que deixa de ser (Fanfani, 1958). Está na raiz desta idéia,
encontrado na “fuga contemplativa do a crença de que o trabalho é executado
mundo” e passa a estar no “trabalho nes- em benefício de todos, da própria huma-
te mundo”. Um trabalho ativo e ascéti- nidade. A divisão do trabalho é essenci-
co. Estes objetivos foram alcançados ple- almente colaborativa, e eticamente repre-
namente pela grande Igreja e organiza- sentada como uma vontade direta de
ções sectárias do protestantismo ociden- Deus.
tal e ascético. Weber (1987) estuda diferentes seitas
Agora o virtuoso religioso pode ser e entre as que ele chama de representan-
colocado neste mundo como o instru- tes históricos do protestantismo ascéti-
mento de um Deus, e isolado de todos co, conclui que o calvinismo foi aquela
os meios mágicos de salvação. Não obs- que melhor elaborou os fundamentos
tante, ele deve se provar acima de Deus, que determinaram o sentido ético de
como tendo sido chamado exclusiva- uma conduta, de uma concepção de vida,
mente pela qualidade ética de sua con- que será apontada em sua obra como o
que se limita à relação exteriores. Mas, da ação de muitos agentes, e como essa
configuração singular pode dar origem a
para ser válida, a compreensão deve ven-
linhas de ação, a sentidos ou então a va-
cer os equívocos da pura subjetividade. lores novos, que por sua vez possam ser
Isto significa rejeitar a revivescência e a reincorporados na dinâmica das diferen-
tes esferas da existência histórico-social.
intropatia. Compreender é, então, cap-
(Colliot, 1995, p. 44)
tar a evidência ao sentido de uma ativi-
dade. O grau mais alto da evidência é o Fica claro que sujeito e dominação são
da compreensão intelectual de uma ati- categorias fundamentais nesse esquema.
vidade racional, como a de uma opera- No entanto, a noção de sujeito se com-
ção matemática, mas quando trata-se da plica no momento em que estabelece o
compreensão das experiências alheias vínculo com as noções de compreensão
(por exemplo erros cometidos) que po- e de sentido, dado o importante papel
dem ser revividos por intropatia, Weber ao processo de racionalização. Em outras
atribui a estas apenas o grau de evidên- palavras:
cia “suficiente”, apesar da captação de
um sentido subjetivamente visado se fa- para o caso puro de ação racional refe-
zer melhor pela compreensão via revi- rente a fins, é perfeitamente plausível o
argumento de que, conhecidos os fins, os
vescência por intropatia.
meios e as máximas de ação correspon-
No entendimento deste autor, reviver dentes, o sentido mais adequado da ação
o comportamento alheio é importante pode ser derivado inequivocamente sem
passar pelo sujeito, mesmo porque só há
para a evidência da compreensão, mas
um único curso de ação que maximiza os
não é uma condição absoluta de uma in- resultados da relação meios-fins. (Cohn,
terpretação significativa. A evidência que 1979, p. 139)
se obtém pela intropatia, quer seja a ex-
periência vivida pessoal, quer seja revi- Isso não tira a importância do recur-
vescência da experiência alheia, não tem so à compreensão, mas deixa claro que
a validade de uma observação científi- ela só é possível, ou necessária, quando
ca. Weber se opunha tanto a medidas a margem de autonomia do agente não
puramente intuitivas que renunciam a permite outra via mais direta de acesso
conceituação rigorosa, quando a medi- a hipóteses adequadas sobre os seus cur-
das naturalistas, e afirmava que só a cau- sos de ação.
salidade garante à pesquisa compreen-
siva a dignidade de uma proposição ci- Quanto ao sentido da ação
entífica. Para Weber o objeto da sociologia
Por causalidade Weber não entende compreensiva é o agir social e esse agir é
uma seqüência linear e unívoca com va- “um comportamento humano ao qual o
lidade universal, agente(s) associa(m) um sentido subjeti-
vo”. (Colliot, 1995, p. 113)
mas interessa a ele saber como, em situa- Segundo Colliot este sentido subjeti-
ções particulares, as legalidades próprias
das diversas esferas da ação se articulam vo, mencionado por Weber pela primei-
para resultar numa orientação específica ra vez em 1903, num ensaio dedicado a
Roscher, e depois em 1921 nos Funda- das práticas inspiradas pela ética religio-
mentos Metodológicos, no início de Eco- sa e suas conseqüências sobre a econo-
nomia e Sociedade, deixa uma série de mia, Weber dissocia o sentido das inten-
ambigüidades. A primeira está na afir- ções dos profetas ou reformadores, bem
mação: o agente “associa” à sua ação um como dos adeptos desse fim.
sentido subjetivo. Para Colliot (1995, p.
Os efeitos sociologicamente significantes
103) este sentido não é algo que se junte das religiões são, em regra geral, os efei-
à ação vindo do exterior, mas ele é cons- tos não pretendidos. O protestantismo é,
titutivo da ação, isto é, “essa ação não é a esse respeito, exemplar. O puritano não
buscava a riqueza, mas a prova de sua
inteligível como tal independentemente eleição. (Colliot, 1995, p. 105)
deste sentido, nem os seus efeitos são in-
teligíveis como efeitos dessa ação se sua Por fim resta questionar se existe di-
lógica simbólica é deixada de lado”. Em ferença entre o sentido imediato da ação
resumo, não é o entendimento do senti- vivida, no momento em que ela é vivi-
do o objetivo da sociologia compreensi- da, o sentido que possui a ação no proje-
va, mas aquele da ação, enquanto estru- to que a antecipa e o sentido obtido quan-
turada por um sentido. Esta nuança se- do se reflete sobre ela a posteriori e a ra-
ria importante, pois marcaria a diferen- cionaliza?
ça entre o projeto da filosofia hermenêu- A resposta à esta questão é mais com-
tica e o de uma ciência empírica da ação. plicada. Para Colliot, Weber parece não
Domingues (1998) 1 discorda desta reconhecer que uma ação é o que se ex-
afirmação, uma vez que Weber nunca plicita na reflexão que dá razão à ela,
pretendeu afirmar que o sentido vinha mesmo quando ele argumenta que boa
descolado da ação. Quando Weber afir- parte das ações se desenvolvem sem que
ma que o agente associa um sentido, isto o sujeito tenha consciência do sentido.
não quer dizer que ele venha depois da Essas considerações permitem por em
ação, ao contrário, estão imbricados. evidência, mais uma vez, o papel da
Outra questão que pode causar algum compreensão no esquema de Weber.
desconforto na leitura da obra de Weber
é se o sociólogo entende o sentido da Quanto à ação racional em relação a fins
ação como sendo o sentido subjetivo do e a noção de liberdade e autonomia
agente. Para Colliot esta dúvida é fácil Como os homens criam valores e são
de ser esclarecida e a resposta é negati- capazes de atribuir significados à condu-
va, ou seja, Weber tinha consciência de ta, está aberto o caminho para a compre-
que os agentes não tinham domínio so- ensão da racionalidade da ação pelas vias
bre as conexões significantes buscadas racionais do método científico no proces-
pela sociologia e pela história. Um exem- so de explicação causal.
plo disso é que ao interpretar o sentido Para Weber a ação racional com rela-
1
Notas de sala de aula.
organização da ciência objetiva. Esta dis- ria e a sociologia como ciências. (Colliot,
1995, p. 123)
tinção permite marcar a diferença entre
a atividade do cientista e a do político, con- Com esta afirmação Colliot aponta a
tudo, não responde as questões acima. ambigüidade de Weber em relação a in-
Como uma ciência é orientada por terpretação da formação do ocidente mo-
questões que se modificam (uma vez que derno. Ela afirma que mesmo tendo sido
cada reconstrução do sentido da ação é prudente quanto a distância que guar-
seletiva e comandada por um sistema de dava quanto à “racionalidade” ociden-
valores) haverá tantas perspectivas his- tal, seu “valor” e sua “significação”, ele
tóricas ou sociológicas quanto sistemas não conseguiu romper totalmente com a
de valores orientando a seleção. Na me- antropologia racionalista, onde reside a
dida em que a seleção e a construção do força da sua sociologia compreensiva.
objeto da ciência dependem das questões Ele se esforçou para mostrar o estilo te-
propostas pelo observador, os resultados leológico de seus argumentos e concei-
científicos estão relacionados com a cu- tos como resultante dos questionamen-
riosidade do cientista, e as respostas às tos (o historiador e sociólogo constróem
questões já estão condicionadas aos fe- o objeto em função dos interesses do seu
nômenos que ele seleciona. tempo), mas por outro lado,
A pretensão de uma demonstração
porque as formas de discursividade que
científica universal também é problemá-
utilizam os saberes sócio-históricos são um
tica, uma vez que objetiva-se o conheci- dos componentes da modernidade ociden-
mento pela “compreensão da ação”. Co- tal, e porque Weber não se resolveu a du-
vidar de sua universalidade, ele teve que
mo mostra Colliot, o próprio Weber reco-
pagar seu tributo ao eurocentrismo vulgar
nheceu algumas vezes que a compreen- do pensamento da história universal. Mais
são da ação remete aos “nossos hábitos de dez anos depois da morte de Weber, Ed-
medianos de pensar e de conhecer”. Po- mund Husserl colocará, sem desvio a
questão que persegue as análises weberi-
de-se então supor que esses hábitos ul- anas: a humanidade européia carrega em
trapassem as regras lógicas do pensa- si uma “idéia absoluta”, ou então, ela não
mento e cedam lugar aos elementos cul- é senão “um simples tipo antropológico,
como a China ou a Índia. O comparativis-
turalmente condicionados. Então, as re- mo em Weber estava sem dúvida inclina-
gras através das quais reconstruímos a do para a segunda parte da alternativa,
lógica que torna inteligível o comporta- mas o epistemológico jamais consentiu
uma proposição que implicava, a seus
mento dos agentes sociais na cultura oci- olhos, uma apostasia da racionalidade ci-
dental moderna pode permanecer incom- entífica. (Col-liot, 1995, p. 124)
preensível, por exemplo, ao “chinês”.
do final do séc. XIX, através de Dilthey, A preocupação de Weber está muito mais
Windelband e Rickert, contribuindo for- relacionada com o sentido da ação e me-
temente para que a preocupação de We- nos com a sua figuração. Neste aspecto
ber fosse dirigida à questão do método a categoria ação é mais ambiciosa que a
nas Ciências Sociais, ou Ciências da Cul- categoria comportamento, pois no pla-
tura como ele preferiu denominar. Pou- no do comportamento não há diferença
co a pouco ele foi construindo uma dér- entre o comportamento do homem e do
mache própria e se afastando de um e ou- primata. O homem lida com o problema
tro autor em aspectos diferenciados. Re- ao mesmo tempo diferencial e capital que
jeitou a divisão das ciências entre nomo- é o do “sentido”, ou seja: como conferir
téticas e ideográficas, como proposto por sentido aos nossos gestos e ações?
Windelband, afastou-se de Rickert ao Weber não acreditava na possibilida-
opor-se à divisão das ciências em “ciênci- de do pesquisador (sociólogo) apreender
as da natureza” e “ciências da cultura”, e a totalidade de uma realidade, os tipos
se distanciou de Dilthey ao recusar a in- ideais seriam uma forma de observar o
tropatia como método de conhecimento. que é dominante na ação social. A idéia
Weber tendo como referência a indi- é de explicar os fenômenos na sua sin-
vidualidade, ou seja, os papéis desem- gularidade, adquirindo a análise um ca-
penhados pelos atores sociais preocupa- ráter de parcialidade e não totalidade
se em trabalhar conceitos tais como ação O método proposto por Weber objeti-
social, agente individual, papéis repre- va o entendimento da ação social, ou seja,
sentados e, principalmente, como em si- o entendimento da ação estruturada por
tuações específicas à ação de indivíduos um sentido. O interesse está na compre-
se constitui enquanto uma ação estrutu- ensão da racionalidade particular de
rada por um sentido, enquanto orienta- uma ação social numa situação específi-
ção para a ação de outros. Sua grande ca. Neste sentido, o método permite a
contribuição foi promover a integração apreensão da diversidade dos fenôme-
do método da causalidade das “ciências nos existentes em uma realidade qual-
da natureza”, com o método da compre- quer. O método se dirige a explicação de
ensão, entendido como o mais adequa- situações específicas, propondo que para
do às “ciências da cultura”, mas com a apreender a ação social deve-se observar
diferença de que este último deveria es- as regularidades empíricas de uma ação
tar submetido aos rigores dos métodos ligada a uma determinada situação, e se
positivos. Deste modo ele vai aproximar construir tipos ideais. No confronto des-
a hermenêutica, proposta por Dilthey, tes tipos ideais com o empírico é possí-
aos métodos positivistas de explicação, vel compreender a natureza particular do
e ao assim fazer ele renova tanto a her- caso em estudo. Ou seja, busca-se conhe-
menêutica quanto o positivismo. cer certas regras dos fenômenos esta-be-
O paradigma da ação recobre toda sua lecendo uma hipótese (tipo ideal) sobre
obra e a tipologia da ação vai forjar uma a linha de ação dos agentes. Busca-se or-
estratégia para captar o sentido da ação. denar o real no plano analítico estabele-
2
Morgan (1980) e Burrel e Morgan (1979) desenvolvem a noção de paradigma enquanto uma visão
alternativa de realidade social. Através do cruzamento de duas dimensões: a) a dos pressupostos
sobre a natureza da ciência social dentro de um continuum subjetivismo-objetivismo; e b) a dos
pressupostos sobre a natureza da sociedade (em termos de ordem x conflito) dentro de um conti-
nuum regulação – mudança radical, estes autores constroem quatro paradigmas: funcionalista, in-
terpretativo, humanista radical e estruturalismo radical. O paradigma funcionalista está baseado no
pressuposto de que a sociedade tem uma existência real e concreta e uma orientação sistêmica para
produzir um estado de relação ordenado e regulado. Os pressupostos ontológicos garantem a pos-
sibilidade da objetividade na ciência social, o cientista mantêm-se distante e neutro do cenário que
analisa através de métodos e técnicas rigorosas. Também apóia-se na possibilidade de generaliza-
ção dos conhecimentos empíricos. Teorias incluídas neste paradigma se interessam pelo estudo do
status quo, ordem social, integração solidariedade, etc. São exemplo deste grupo a teoria de sis-
temas sociais, teoria integrativa e teoria da ação social.
ção de que apenas uma parte de sua obra pretadas e debatidas. Dessa forma pode-
é destacada, principalmente os modos de se compreender a dominação, e portan-
dominação e o tipo ideal burocrático. Por to o poder, distribuída entre os atores so-
conta disso muitas más interpretações se ciais, conforme suas estratégias frente às
fazem presentes, a começar pelo uso do organizações.
termo burocracia, associado à disfunção Clegg (1994) também argumenta que
do sistema administrativo. os estudos e as pesquisas organizacionais
Por conta dos estudos relacionados à sobre estrutura, têm predominantemen-
importância alcançada pelas organiza- te interpretação e influências weberianas.
ções pública e privadas, burocratizadas Ao usar a burocracia como tipo ideal e a
ou não, na sociedade moderna, Weber institucionalização da dominação e po-
possibilitou à Teoria Organizacional uma der que advém da burocratização das
fundamentação epistemológica e tam- estruturas organizacionais, a TO promo-
bém ideológica. O fenômeno burocráti- veu a criação de um padrão de organi-
co, no pensamento weberiano, se situa, zação considerada mais eficiente e criou
em termos históricos, no nascimento do uma representação convencional de seus
mundo moderno, e é exatamente ele que estudos e pesquisas. Além disso, Weber
distingue a época capitalista ou moder- quando propôs a concepção metodoló-
na e das pré-capitalistas. O grande méri- gica de construção de um tipo ideal, re-
to deste autor foi o de ter identificado ceava que esta fosse confundida com um
formas de organização socioeconômicas modelo da realidade. Sua proposta de
diferentes daquelas típicas da idade mo- Tipo Ideal é de que este fosse um modo
derna e de ter considerado-as como espe- de construção de conceitos, de abstração
cificidades históricas. Contudo, o rótulo da realidade Sua preocupação era meto-
Burocracia, tem sido freqüentemente mal dológica, ou seja, o tipo ideal co-mo meio
empregado e o erro fundamental tem para apreensão de fenômenos históricos
consistido em abstraí-lo do contexto do e seus elementos em conceitos genéticos.
discurso weberiano, apresentando-o co- Para a TO enquanto método, a cons-
mo autônomo, como um modelo uni- trução de tipos ideais pode configurar-
versalmente válido. Assim procedendo- se como instrumento importante para a
se, de um lado perde-se sua especifica- compreensão das organizações e das
ção histórica, e de outro não se conside- ações dos indivíduos. Para Weber cada
ra seu fundamento real, não como mode- objeto a ser estudado possibilita a cons-
lo, mas como um tipo, uma abstração da trução de tipos ideais. A metodologia
realidade. (Reed, 1996; Vianello, 1976) proposta por Weber possibilita a apreen-
As análises da dominação e também são da diversidade de organizações exis-
do poder tem aparecido nos estudos or- tentes na realidade, ou seja, a diversida-
ganizacionais, proporcionando uma de de racionalidades presentes no mun-
“gramática”, além de recursos simbóli- do organizacional. Também permite
cos e técnicos, através dos quais a natu- apreender o movimento geral, a orienta-
reza das organizações podem ser inter- ção da ação organizacional em situações
ABSTRACT
The most important contribution of Max Weber was the integration between
the method of “natural sciences” with the method of comprehension of “cul-
ture sciences” The paradigm of action has recovered all your works and the
typology of action has created a strategy to captive the directions of action.
When the OT used the bureaucracy as ideal type and the institutional domina-
tion and power of bureaucrational structures had cried a standard of organi-
zation, and this standard has influenced the studies and researches about or-
ganizations.
Key words: Weber; Paradigm of action; Bureaucracy; Social science.
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