Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Curitiba – 2013
TRABALHO DOCENTE E AÇÃO PEDAGÓGICA: REFLEXÕES A PARTIR DE
MAX WEBER
1
Um conceito ideal é normalmente uma simplificação e generalização da realidade.
Partindo desse modelo, é possível analisar diversos fatos reais como desvios do ideal:
Tais construções (...) permitem-nos ver se, em traços particulares ou em seu caráter
total, os fenômenos se aproximam de uma de nossas construções, determinar o grau
de aproximação do fenômeno histórico e o tipo construído teoricamente. Sob esse
aspecto, a construção é simplesmente um recurso técnico que facilita uma disposição
e terminologia mais lúcidas (WEBER, apud, QUINTANEIRO, 2002: 113).
de objetivos e resultados. A ação racional orientada por valores, como o próprio
nome indica, diz respeito às ações que se guiam por valores, ideológicos,
morais, políticos ou religiosos. Tal ação prescinde de um cálculo
predeterminado, pois quem age guiado por valores e convicções de ordem
ontológica, muitas vezes não esta muito preocupado com os fins alcançados.
As ações oriundas dos afetos ou sentimentos tem como motivação primeira os
aspectos sentimentais de quem age. Ação tradicional é aquela que nasce dos
costumes e tradições. Muitas vezes guiadas pelo senso comum. Podemos
pensar nas festas folclóricas, cultura religiosa e acontecimentos coletivos como
exemplos típicos dessa forma de ação. (WEBER, 1994)
Paralelamente as formas de ação, podemos trazer as formas de
dominação propostas por Weber, veremos que é possível depreender destes
conceitos alguma compreensão sobre o universo escolar que se estendem
para o trabalho do professor
Embora Weber discorde de Marx em relação a forma de compreender
a sociedade como fruto da luta de classes, o mesmo entende que a sociedade
tão pouco é fruto de relações simétricas e equilibradas. Na verdade para este
autor a desigualdade social estaria muito mais ligada à desigualdade natural
entre as pessoas (RIUTORT, 2008).
Os processos que envolvem a existência de conflitos não tem como
causa principal a determinação econômica conforme defende o materialismo
histórico de Marx, estão muito mais associados a seleção social entre os
indivíduos e instituições. Por seleção social, Weber entende os processos de
competição envolvendo a sobreposição de status e reconhecimento dentro de
um grupo social quando os indivíduos buscam afirmar sua existência. Outra
forma de seleção proposta por Weber diz respeito a seleção biológica onde as
chances de sobrevivência dos indivíduos decorrem do legado genético que os
mesmos recebem. Parece-nos que, concordando com Darwin, este autor
admite que a seleção acontece permanentemente na sociedade. A educação e
o acesso a cultura, somando-se hás habilidades e qualidades individuais irão
representar um conjunto de fatores importantes a contribuir para a realização
social dos indivíduos.
Para Weber a educação além de representar a racionalização da
cultura, a mesma se afigura sua relação social direcionada a fins, tratando-se
de uma “relação associativa segue-se, em regra, uma relação comunitária mais
complexa que a abrange. É claro que isso ocorre apenas numa parte das
relações associativas, a saber, naquelas em que a ação social pressupõe
algum contato ‘pessoal’, e não puramente de negócio ”(WEBER, 1994, p.280).
A educação representa uma possibilidade de mobilidade social, um fator
que contribui para os processos de seleção social, aquisição ou manutenção
de um status. Ao relacionar os tipos de educação com os tipos de dominação
propostos por Weber assim se pronuncia:
2
Em oposição às classes, os estamentos são normalmente comunidades, ainda que, com
freqüência, de caráter amorfo. Em oposição à situação de classe condicionada por motivos
puramente econômicos, chamaremos situação estamental a todo componente típico do destino
vital humano condicionado por uma estima específica - positiva ou negativa - da honra adscrita
a alguma qualidade comum a muitas pessoas. (...) Quanto ao seu conteúdo, a honra
correspondente ao estamento é normalmente expressa, antes de tudo, na exigência de um
modo de vida determinado para todos os que queiram pertencer ao seu círculo. (WEBER,
1994, p. 288)
3
Falamos de uma classe quando: 1) é comum a um certo número de pessoas um componente
causal específico de suas probabilidades de existência na medida em que 2) tal componente
esteja representado exclusivamente por interesses lucrativos e de posse de bens 3) em
condições determinadas pelo mercado (de bens ou de trabalho). ( WEBER, 1994, p. 286)
Outro exemplo de educação carismática é aquela exercida pelo aparato
estatal, corporação de ofício e ainda da educação eclesiástica e sacerdotal 4.
Entre os gregos é bem visível essas diferenças no campo da educação. Em
Atenas havia um claro direcionamento a formação do bom cidadão, homem da
polis, virtuoso e participativo, arauto da democracia. Por outro lado os
espartanos desenvolviam uma educação militar, tendo como seu objetivo
principal a formação do cidadão guerreiro.
Mesmo na antiguidade a dominação é exercida tanto pela tradição, que
se propaga pela hereditariedade, títulos e posses quanto pela dominação
carismática. O escopo dessa modelo de educação carismática, deriva de uma
concepção essencialista de educação, voltada a despertar os dons dos
indivíduos, fazer aflorar suas habilidades. Conforme nos indica este autor:
4
“Também em uma parte considerável dos demais povos do Oriente, e devido somente ao
desenvolvimento de um sistema educativo racional que satisfizesse às necessidades oficiais de
escribas e burocratas exercitados no pensamento racional, o sacerdócio continuou sendo o
encarregado da educação dos funcionários, o que equivale dizer o chefe da educação geral.
No Ocidente e durante a Idade Média, a educação por meio da Igreja e dos monastérios, como
sede de educação racional, teve uma grande importância” (WEBER, 1994, p. 281 v. I).
estamento com suas razões, métodos e objetivos. A dominação tecnocrata
exercida pela racionalidade administrativa exige que “toda a burocracia busca
aumentar a superioridade dos que são profissionalmente informados,
mantendo secretos os seus conhecimentos e intenções” (WEBER, 1994,
p.269).
Essa competição entre os indivíduos para manter suas posições na
sociedade confere um valor diferenciado aos títulos acadêmicos e escolares. A
educação vista sob essa ótica favorece a vantagem econômica e a seleção
social dentro dos estamentos. Se pensarmos em nossa sociedade atual,
veremos que existe um certo escalonamento entre as instituições
certificadoras. Algumas gozam de enorme prestigio e reconhecimento o que é
repassado para os certificados que confere, enquanto que outras são pouco
conhecidas e de pouco prestigio social, refletindo isso no modo como as
empresas e a sociedade de modo geral julga seus egressos. ou avaliadas
como medianas, refletindo nos seus egressos. Na atualidade, o diploma teria o
mesmo valor que a ascendência familiar, no passado. No entanto de modo
geral é inegável que uma titulação superior uma maior qualificação continua
funcionado como foi descrito por Weber, como sendo uma recurso utilizado
para adquirir ou melhorarem o status dos indivíduos
A existência de três sistemas de educação: a educação para o cultivo do
saber, a educação racional para a burocracia e a educação carismática
contribuíram para que os indivíduos desempenhassem papéis sociais
diferenciados. Resumindo, Para Weber é possível identificar pelo menos três
sistemas de educação. Aquele no qual o saber é adquirido como parte da
aquisição de uma cultura clássica e erudita, uma educação direcionada a
atender a formação de funcionários para a burocracia estatal racionalizada e
o que ele definiu como educação carismática voltada a formação diferenciada
dos indivíduos e seus estamentos. (WEBER, 1995)
Embora não se possa falar de uma sociologia da educação weberiana,
não se pode negar sua contribuição nesse campo, ao propor uma conceituação
ampliada de educação abrangendo a educação religiosa, a educação dada na
família, a educação carismática, política e especializada.
Seria acertado dizer então, que Weber se esforçou para inserir a
problemática da relação entre educação e sociedade em sua obra. Sua
perspectiva metodológica busca romper com aquelas teorias que ele julgava
forçosamente totalizadoras da realidade, ao desconsiderar os aspectos
individualizantes da ação social. Embora o individualismo metodológico tenha
seus méritos no modo como compreende e explica as relações sociais, dando
um peso importante ao aspecto subjetivo, entendemos que a subjetividade
como elemento que se constrói mediada pelas tensões entre individuo e
sociedade.
Em se tratando da escola, ou do trabalho docente, cabem algumas
considerações sobre os limites da abordagem weberiana. O tipo ideal visto
como recurso heurístico contribui por aproximação os processos mentais de
evidenciar os aspectos próprios e singulares do objeto de estudo e desta forma
compreender pela ótica do sujeito o significado de suas ações. O tipo ideal
como pressuposto lógico nos ajudaria a entender, por exemplo, o que leva um
professor a escolher trabalhar em mais de um turno, aceitar uma jornada
extenuante, levar sobrecarga de trabalho para casa. Segundo Weber estas
seriam ações sociais, e sua compreensão se encontra no próprio indivíduo e no
modo como este significa para si e suas escolhas.
Tal visão apresenta alguns problemas e limites não permitindo ir além
do mero subjetivismo epistemológico, perdendo de vista o vínculo total que
existe entre o individuo e as determinações sociais. Essas determinações
sociais5 constituem a realidade concreta do professor e refletem dialeticamente
em suas ações. Desconsiderar essas determinações seria falsear a realidade e
reduzir a ação a somente o aspecto motivacional, psicológico. Estes aspectos
são muito importantes, contudo, não podem ser pensados de modo isolado,
abstraído dos tensionamentos que são engendrados pelas circunstâncias dos
indivíduos.
O tipo ideal tende a hipostatizar as características construídas do objeto,
sua formulação contribui sem duvida nenhuma, para a organização da
5
Quando falamos de vínculo total, queremos dizer que numa analise dialética a sociedade é
vista como uma totalidade. Nessa linha os fenômenos sociais precisam ser compreendidos a
partir dos tensionamentos que provocam as ações e as reações. A ação do individuo é
fortemente influenciada pelo meio, pelas forças concretas da sociedade, pelas suas
circunstancias. Em relação às determinações sociais, nos referimos à objetividade das
ideologias que se materializam em políticas e relações de poder. Em se tratando da realidade
de nossa pesquisa, o trabalho docente precário e a subjetividade do professor, entendemos
que a perspectiva weberiana é limitada em desconsiderar as contradições que demarcam o
campo educacional, como a luta de classes e políticas neoliberais que geram na outra ponta o
trabalho precário.
realidade, sempre caótica conforme argumenta Weber, contudo entendemos
que o objeto como parte da realidade social é movimento, fluxo em
transformação. A própria realidade possui uma estrutura contraditória, na
medida em que se afirma e se nega ao mesmo tempo. De modo que modelo
de Weber segue numa direção oposta a visão dialética oferecendo uma
compreensão limitada da realidade social em relação ao trabalho dos
professores.
BIBLIOGRAFIA
WEBER, Max. Ciência e política: duas vocações. São Paulo: Martin Claret,
2002.