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2, 2018 132
Prolegômenos metodológicos
3 ALTHUSSER, Louis. Por Marx. Trad. Maria Leonor F. R. Loureiro. Rev. Márcio
Bilharinho Naves, Celso Naoto Kashiura Jr. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2015,
p. 189.
4 Ibidem, p. 190.
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Mas como o objeto está inserido numa totalidade concreta, uma realidade
complexa que determina a maneira pelo qual o objeto é pensado, ele sofre as
determinações da estrutura que lhe sustém e do momento onde existe. Uma
existência concreta, mas que apenas é percebida pelo sujeito por meio do
pensamento: um concreto pensado. Mas esse concreto pensado apenas pode
surgir no pensamento por meio da abstração do concreto; ele é o resultado dessa
operação dialética. Essa abstração parte inicialmente da captura da aparência
(Scheinen) do objeto, já que ele não emerge, como destacamos com Kashiura Jr.,
como conceito (Begriff) efetivo, mas apenas como um “brilho” do que é, por uma
certeza sensível daquilo que pensamos ser.
10 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos
direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11. ed. rev. atual. Porto Alegre:
Livraria do Advogado Editora: 2012, p. 59.
11 Ibidem, p. 61.
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13 Ibidem , p. 84.
14 MOTTA, Luiz Eduardo. A favor de Althusser: revolução e ruptura na teoria marxista.
1. ed. Rio de Janeiro: GRAMA; FAPERJ, 2014, p. 52, 53.
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Nesse sentido, o Direito como aquilo que é existe apenas como resultado
de contradições de um dado complexo de determinações onde há uma
sobredeterminação do econômico. E a modernidade é esse todo complexo que
marca suas notas distintivas; um bloco histórico que é inaugurado a partir da
acumulação primitiva do capital – a subsunção do trabalho ao capital.
Ora, no vol. I d’O Capital, Marx já havia mostrado como esse processo de
acumulação primitiva do capital insere a liberdade na sociabilidade humana,
entendida sob uma perspectiva dúplice: por um lado, há uma espoliação do
trabalho e das condições de vida do homem campestre e, por outro, a inserção do
homem enquanto mercadoria implicada na possibilidade de disposição de si
mesmo enquanto força de trabalho.16
A compreensão do fenômeno jurídico, assim entendemos, depende de sua
análise através do materialismo histórico e dialético. Portanto, como já
destacado, o Direito somente pode ser apreendido se também engendrarmos seu
entorno, capturando a totalidade através da dialética e compreendendo o limite
negativo que delimita as determinações e contradições colidentes dentro de um
intervalo espacial finito, isto é, captando a “realidade como um todo estruturado,
dialético, no qual ou do qual um fato qualquer (classe de fatos, conjuntos de fatos)
pode vir a ser racionalmente compreendido”17.Nesse sentido, a totalidade
moderna se mostra uma totalidade eminentemente capitalista,
sobredeterminada pela lógica do Capital, que define, configura e reproduz suas
Mas isso quer dizer que a liberdade e igualdade dos sujeitos de direito –
que aparecem na sociedade capitalista enquanto trocadores de mercadorias –
“garantidas” pelo Direito são apenas imaginárias? São apenas atribuições
institucionais resultantes da forma social? Liberdade e igualdade não existem
realmente, e na verdade nossa existência é tão oca quanto o Vazio de Boötes 19?
Sim, e não. O fato de a liberdade e a igualdade, na sociabilidade capitalista, não
existirem de modo efetivo (Wirklich), mas enquanto atribuição imaginária, não
retira a sua possibilidade de reverberar efeitos sobre o real. Na verdade, o
imaginário pode ser tanto ou até mais real que o concreto. Ora, a modernidade
não é um mundo colonizado por relações imaginárias? Uma caótica inversão
entre real e imaginário que cria uma zona de indeterminação entre o que é um e
o que é outro, o que é imanente e o que é ilusório; não é isso o fetichismo do
fenômeno econômico e jurídico?
20MIALLE, Michel. Introdução crítica ao Direito. Trad. Ana Prata. 3. ed. Lisboa:
Editorial Estampa, 2005, p. 94, 95.
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efetivação da relação jurídica, assim como a mercadoria não cria valor, mas
apenas o realiza no momento da troca.21
do capital. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013, p. 250, 251.
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A forma jurídica e a forma social do Capital são duas faces de uma mesma
moeda que existe em razão de uma lógica simbólica específica e que engendra
uma forma de organização social. Uma sociabilidade que depende do Direito para
que possa ser reproduzida e que então encontra sua realização nuclear em duas
categorias fundamentais: a mercadoria e o sujeito de direito; elementos
Nas relações de troca, cada um dos sujeitos envolvidos cede a sua própria
mercadoria e adquire a mercadoria do outro por meio de um consentimento
recíproco. Cada um dos sujeitos de direito que se contrapõem nesse circuito de
relações mercantis manifesta sua vontade de forma livre – conditio sine qua non
da troca – de adquirir ou alienar as mercadorias que estão circulando no circuito
de trocas. Não há e nem pode haver entre eles qualquer tipo de domínio,
dependência ou hierarquia. Eles se apresentam iguais na forma e, portanto,
devem também apresentar-se como igualmente livres na relação que estabelecem
entre si26.
25 KASHIURA JR., Celso Naoto. Sujeito de direito e capitalismo. 1. ed. São Paulo: Outras
Expressões; Dobra Universitário, 2014, p. 166-168, 169.
26Ibidem, p. 169.
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27 Ibidem, p. 170.
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Há, portanto, uma relação inexorável entre essas três formas. Uma forma
social – a própria sociabilidade capitalista fundada por e fundante da troca de
mercadorias – a forma jurídica – que tem por objeto o sujeito de direito enquanto
livre e igual (equivalente) – e a forma política – o Estado moderno. Essas três
formas básicas são responsáveis por manter a dinâmica do Capital em
movimento, permitindo sua manutenção, reprodução e desenvolvimento, mesmo
diante de certas fissuras ou descontinuidades. As formas podem sofrer fraturas,
dobraduras, distorções, serem realocadas, transformadas, adaptadas. Podem
sofrer qualquer tipo de alteração. Elas continuarão reproduzindo a lógica da
estrutura simbólica do Capital. É essa lógica que dá a configuração das formas no
devir de seus deslocamentos; é apenas por meio da ruptura com essa lógica que
30 Ibidem, p. 43.
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Isso quer dizer que ambas as formas possuem uma configuração direcionada à
manutenção, em maior ou menor grau, dessa sociabilidade, pela qual estão
sobredeterminadas.
Ora, se ambos estão sobredeterminados pelo regime corrente de
sociabilidade, isto é, por um modo de produção capitalista que se sedimenta como
determinação oposta ao Direito e ao Estado, engendrando-os numa única
totalidade, então é forçoso dizer que a própria democracia, enquanto fundamento
e princípio político legitimador do Estado, está submetida à lógica do valor
imprimida pela estrutura simbólica reproduzida pelo capitalismo. Dessarte,
como podemos entender a democracia então?
A DEMOCRACIA E OS SEM-PARCELA
hoje o termo, assim como a legitimidade do poder, diluída entre os cidadãos, era
de difícil apreensão, já que o próprio exercício do poder ocorria de maneira
difusa, muitas vezes escapando de um controle preciso de seus desdobramentos.
Não à toa a democracia ateniense guarda em si o germe de sua própria
degradação em razão de suas limitações práticas.
A disposição da repartição dos poderes dos cidadãos, aos poucos, vai se
revelando problemática, na medida em que a liberdade e a igualdade distribuídas
aos cidadãos revela as dimensões de homens dominados pelas paixões e pelos
interesses individuais onde a realização da vontade do corpo coletivo torna-se
cada vez mais difícil. Platão, antecipando – como veremos mais a frente – as
críticas modernas à democracia, revela-nos o cerne do problema do ideal
democrático:
32 Ibidem, p. 30.
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34 Ibidem, p. 27-29.
35 Ibidem, p. 28.
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37 Ibidem, p. 42.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALTHUSSER, Louis. Por Marx. Trad. Maria Leonor F. R. Loureiro. Rev. Márcio
Bilharinho Naves, Celso Naoto Kashiura Jr. Campinas, SP: Editora da Unicamp,
2015.
MIALLE, Michel. Introdução crítica ao Direito. Trad. Ana Prata.3. ed. Lisboa:
Editorial Estampa, 2005.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral
dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11. ed. rev. atual. Porto
Alegre: Livraria do Advogado Editora: 2012.