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Conforme descrito por autores como Maria do Rosário Mortatti (2000), Artur Gomes de
Morais (2006) e Magda Becker Soares (2003), durante muito tempo, no Brasil, houve
uma discussão acirrada sobre os métodos de alfabetização, sua eficácia no ensino da
leitura e da escrita. Métodos sintéticos e analíticos foram analisados, reformulados e até
mesmo unificados, como aconteceu no caso do método da palavração. Assim, aquelas
dificuldades que os métodos não conseguiam solucionar foram atribuídas à não
prontidão para a alfabetização, concepção que procurou atribuir à maturidade
psiconeurológica a responsabilidade pelo fracasso dos métodos tradicionais de
alfabetização.
Outra questão apontada pela autora é a falsa ideia de que a conquista da cidadania
está assegurada no acesso à leitura e à escrita. O que se espera, na verdade é sua
conquista através de práticas sociais e práticas políticas que evidenciam a participação,
o direito a ter voz e a luta pelos direitos. Nessa linha, é imprescindível se considerar a
concepção de educação, sujeito e aprendizagem do professor, em especial do
professor alfabetizador. Ele não pode acreditar que a alfabetização é uma técnica
neutra e naturalmente suficiente para erradicar o analfabetismo. A alfabetização é uma
prática ideológica, cujo valor e importância dependem diretamente dos usos e funções
atribuídas no contexto social (SOARES, 2008).
Como se vê, a autora defende a alfabetização como um processo que vai muito além
de uma ”técnica”, é um processo político que vai contribuir contra as exclusões e as
discriminações. Para Soares (2008) não basta ensinar a ler, é preciso que se garanta o
acesso à leitura, associá-la a uma escrita com sentido, significado e criticidade para que
o alfabetizando possa não só conquistar, mas também exercitá-la de fato.
Freire (2008) diz que a alfabetização só tem sentido quando ela é decorrente de uma
reflexão do homem sobre sua capacidade de refletir no mundo e sobre o mundo. Assim,
esse homem terá poder para transformar seu meio. Desta feita, estaremos formando
sujeitos capazes de sentirem pertencimento às suas comunidades e preparando
pessoas livres de bloqueios da discriminação linguística, o que os impediria de se
colocar e partilhar saberes.
Alfabetização e letramento
Esta diferença, conforme explicita Soares está na forma e na ênfase nas quais
diferenciam-se a aquisição do sistema de escrita e seu uso social, ou seja, entre o
conceito de letramento (illettrisme, literacy) e o conceito de alfabetização
(alphabétisation, reading instruction, beginning literacy)”. Enquanto em países como
Estados Unidos e França o letramento é tratado de forma mais independente dos
conceitos de alfabetização (aquisição e apropriação do sistema de escrita alfabética),
Quem acompanha o trabalho realizado nas salas de aulas da grande maioria das
escolas públicas brasileiras sabe que ainda continuamos a utilizar os velhos métodos,
ou quando os professores se propõem a novas práticas de leituras de texto, verifica-se
que há pouca atividade de produção de textos, sempre recaindo na apresentação das
“famílias silábicas” ou no treino das “relações fonema-grafema” (MORAIS, 2012). O
autor ainda afirma que práticas inspiradas na teoria da psicogênese de Emilia Ferreiro e
Ana Teberosky (1979), chamada por muitos de “construtivismo” acontecem muito
raramente.
Para saber mais sobre as pesquisas que abordam o tema, leia o trabalho de Inês
Mamede: Professoras alfabetizadoras e suas leituras teóricas. In: Anais da 26ª Reunião
da Anped em Caxambu, 2003 p 1-16 Disponível em:
http://www.anped.org.br/reunioes/26/trabalhos/inescristinademelomamede.rtf
Morais (2012) chama a atenção para o que os estudiosos sobre alfabetização estão
denominando de método fônico. De acordo com o autor, esse método tem sido tratado
por jornalistas e acadêmicos que o defendem como o ensino sistemático de letras e
sons, ou seja, aquilo que faltou nas concepções construtivistas de alfabetização. Ainda
mais, de acordo com Morais (IBID), tem ocorrido o que ele denominou como um
desserviço à população: a mídia trata o método silábico e o fônico como se fosse o
mesmo.
Como se vê, os velhos métodos exercem um controle do ensino, com uma visão
adultocêntrica, fazem uso de material de apoio limitado e os ensinamentos são em
pequenas doses e ainda selecionando os capazes ou os mais habilitados para
aprender.
Esta perda de especificidade pode ter sido causada por vários fatores, mas atentando
apenas às questões de natureza pedagógica, podem ser citadas:
a reorganização do tempo escolar com a implantação do sistema de
ciclos que, ao lado, de aspectos positivos que sem dúvida tem, pode
trazer e tem trazido uma diluição ou uma preterição de metas e
objetivos a serem atingidos gradativamente ao longo do processo de
escolarização; o princípio da progressão continuada, que, mal
concebido e mal aplicado, pode resultar em descompromisso com o
desenvolvimento gradual e sistemático de habilidades, competências,
conhecimentos. Não me detenho, porém, no aprofundamento das
relações entre esses aspectos do sistema de ciclos, princípio da
progressão continuada, e a perda da especificidade da alfabetização,
porque me parece que a causa maior dessa perda de especificidade
deve ser buscada num fenômeno mais complexo: a mudança
conceitual a respeito da aprendizagem da língua escrita que se
difundiu no Brasil a partir de meados dos anos 1980 (SOARES,
2004).
O autor faz uma observação importante no que se refere ao não uso do termo
construtivismo à teoria da psicogênese da escrita. Isto porque, no senso comum ou
jargão pedagógico, o construtivismo se tornou uma palavra onde cabe tudo. É preciso
cuidado, porque o construtivismo é uma concepção teórica muito ampla. Ainda, o autor
nos alerta que os estudiosos, pesquisadores e educadores que praticam alfabetização
com um viés construtivista dizem não existir um consenso de como alfabetizar melhor.
Desta feita, será evitado de propósito o uso da palavra construtivismo relacionada à
teoria da psicogênese.
1. Escreve-se com letras que não podem ser inventadas, que têm repertório finito e
que são diferentes de números e de outros símbolos.
3. A ordem das letras no interior das palavras não pode ser mudada.
5. Nem todas as letras podem ocupar certas posições no interior das palavras e nem
todas as letras podem vir juntas de quaisquer outras.
8. As letras têm valores sonoros fixos, apesar de muitas terem mais de um valor
sonoro e certos sons poderem ser notados com mais de uma letra.
10. As sílabas podem variar quanto às combinações entre consoantes e vogais (CV,
CCV, CVV, CVC, V, VCC, CCVCC...), mas a estrutura predominante no português é a
sílaba CV (consoante – vogal), e todas as sílabas do português contêm, ao menos, uma
vogal (MORAIS, 2012, p. 50).
Assim, de acordo com Morais (2012) esse conjunto de regras sobre o sistema
alfabético é automático para o adulto alfabetizado, uma vez que ele nem pensa sobre o
sistema, é um conhecimento apreendido de tal forma que se torna automático. Mas para
a criança, esse conjunto de regras somente será internalizado se ela tiver a
oportunidade de refletir sobre ele por meio de situações planejadas para isto.
Diante do exposto, não podemos desacreditar que é possível ter sucesso, é através de
pesquisa e estudo que saberemos contestar essas distorções, que aos poucos vêm
sendo superadas e construir um trabalho sob a perspectiva do alfabetizar letrando, no
sentido de tornar a aprendizagem prazerosa para o alfabetizando e desafiadora para o
professor ensinar.
Consciência fonológica
Os sons associados às letras são os mesmos sons da fala, para quem já sabe ler, isso
é bastante óbvio. A noção de que a linguagem falada é composta de sequências de
pequenos sons denomina-se de consciência fonêmica, ou seja, um fonema são as
pequenas unidades da fala que correspondem a um som. Os autores verificaram em
pesquisa que a 25% dos alfabetizandos escapa a percepção de pequenos sons sem o
apoio de uma instrução direta. Essa consciência sonora é muito difícil, pois, no geral, as
pessoas não prestam atenção aos sons da fala produzidos ou escutados. O desafio
para os educadores é encontrar formas de fazer com que o aprendiz note os fonemas,
descubra sua existência e tenha a possibilidade de separá-los. Nesse sentido, as
antigas brincadeiras infantis que abordam as rimas, os ritmos, o uso de escuta de sons,
são ótimas para este fim. Com esse objetivo, muitas atividades podem ser usadas a fim
de desenvolver a consciência fonológica. (ADAMS et al., 2012, p.19).
Ainda de acordo com o autor, quanto aos antigos métodos fônicos de alfabetização,
além da crítica a respeito da memorização dos fonemas, ainda há o adiamento do
contato com textos reais por parte dos aprendizes do sistema de escrita, ou seja,
desconsideram por completo o letramento que deve ocorrer dentro do processo de
alfabetização.
Algumas atividades em sala de aula podem promover a reflexão sobre as partes orais
e partes escritas das palavras. Morais (2012) nos apresenta duas possibilidades: os
textos da tradição oral e os jogos. Como já indicamos, a exploração de textos poéticos
da tradição oral (cantigas, parlendas, quadrinhas, etc.) são propostas que as crianças
aprendem com facilidade e fazem parte da cultura infantil do brincar, favorecem a
exploração dos efeitos sonoros acompanhada da escrita das palavras. Os jogos com
palavras e situações lúdicas permitem a ludicidade, a exploração com a sonoridade e o
texto escrito, provocando reflexões sem conduzir os alfabetizandos a treinos cansativos.
Na busca a seguir você pode observar alguns jogos elaborados e distribuídos pelo
MEC às escolas públicas que muito contribuem para tornar a alfabetização e letramento
um processo lúdico e prazeroso.
https://www.google.com.br/search?q=caixa+jogos+de+alfabetiza%C3%A7%C3%A3o+
mec&newwindow=1&tbm=isch&tbo=u&source=univ&sa=X&ei=GTzpUozcIcS_kQeQ9IH
YCw&ved=0CFYQsAQ&biw=1264&bih=601.
ADAMS, Marilyn Jager [et al.]. Consciência fonológica em crianças pequenas. Porto
Alegre: Artmed, 2006.
COLELLO, Silvia M. Gasparian. Alfabetização e letramento: o que será que será. In:
ARANTES, Valéria Amorim (org.). Alfabetização e letramento. São Paulo: Summus,
2010.
FARIA, Ana Lucia Goulart de; MELLO, Suely Amaral (orgs.). O mundo da escrita no
universo da pequena infância. Campinas, SP: Autores Associados, 2012. Coleção
polêmicas do nosso tempo, 93.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 20ª
ed., São Paulo: Cortez, 1987.
GOMES, Lenice; MORAES, Fabiano. Alfabetizar letrando com a tradição oral. São
Paulo: Cortez, 2013. Coleção Biblioteca básica de alfabetização e letramento.
MORAIS, Artur Gomes de. Sistema de escrita alfabética. São Paulo: Melhoramentos,
2012. Coleção Como eu ensino.
MORAIS, Artur Gomes; LEITE, Tânia Maria Rios. Como promover o desenvolvimento
das habilidades de reflexão fonológica dos alfabetizandos? In: MORAIS, Artur Gomes;
ALBUQUERQUE, Eliana Borges Correia; LEAL, Telma Ferraz (org). Alfabetização:
apropriação do sistema de escrita alfabética. Belo Horizonte, MG: Autentica, 2005, p.
71-88. Disponível em: http://www.ufpe.br/ceel/e-books/Alfabetizacao_Livro.pdf.