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BELÉM-PA
2022
BELÉM-PA
2022
Wes Anderson pode ser resumido em uma característica bem individual: direção
única. É o diretor mais direto do cinema popular hoje em dia, mas seus filmes são
simultaneamente idiossincráticos e implacavelmente detalhados. Entrelaçado em meio aos
seus filmes, o design de produção salta aos olhos, com nuances bem visuais e típicas do
diretor, e de maneira tão deliberada que um espectador e consegue identificar tudo o que
precisa saber para a construção da narrativa; logo, a relação com a audiência é de uma troca
justa: o diretor diz ao público o que eles precisam saber, sempre mostra o que eles precisam
observar e evidencia os sentimentos que precisam sentir.
O primeiro longa do cineasta, Bottle Rocket (1996) é o mais diferente e fora da curva
na sua filmografia, levando em conta que era seu primeiro trabalho com um orçamento acima
do que ele costumava lidar. No filme, vemos Anderson utilizando estéticas e métodos de
gravação comumente usados por outros cineastas: pouco se vê de autoral e característico, já
que o autor realmente estudou diretores renomados e famosos, como Roman Polanski,
François Truffaut e Mike Nichols, e utilizou das estéticas destes para fazer seu filme. Apesar
disso, o longa é bem aclamado pela crítica e considerado um início de ouro para um diretor
que se consagraria no cinema mundial.
Dito isso, além da linguagem visual, sonora e verbal, dadas pelo fenômeno da
comunicação, observa-se no cinema de Wes Anderson uma estratégia intertextual típica do
pós-moderno, que busca cruzar diferentes referências. Na composição de suas cenas, o diretor
utiliza uma rigidez formal que remonta dos princípios clássicos de composição. Anderson cria
uma composição através da idealização matemática da natureza, apresentando um ambiente
equilibrado, simétrico, proporcional e harmônico: o diretor abdica da naturalidade por uma
representação racional. Em A Vida Marinha com Steve Zissou (2004), Viagem à Darjeeling
(2007) O Grande Hotel Budapeste (2014) e A Crônica Francesa (2020), Wes Anderson
demonstra repetidamente essa tendência ao uso da intertextualidade, o que confirma a
influência da estética pós-moderna, pois seria uma característica marcante na estética pós-
moderna.
Uma peculiaridade a parte nas obras de Wes Anderson é o trabalho com a composição
das cores. Sempre que o diretor é lembrado pelos espectadores, um dos critérios mais
discutidos são as cores, que sempre saltam aos olhos e tornam a obra visualmente fascinante,
quase um quadro em movimento; um identidade sua facilmente reconhecível. Todas as cores
utilizadas se interligam com a narrativa e a expressão dos ambientes e, sobretudo, dos
personagens; a exemplo, o universo de Steve Zissou, que apresenta um núcleo paterno
fragilizado, os tons azuis são muito utilizados e o grande diferencial, o gorro vermelho, como
sinal de alerta e de atípico naqueles personagens. Outros exemplos podem ser a saturação de
amarelo em quase todas as suas obras, que trazem um sentimento de paz e esperança e, junto
disso, características saudosistas e nostálgicas são sentidas pelo público. Parte disso é porque
os personagens de Anderson tendem a ser adultos agindo como crianças, logo, agem como tal;
é como se ele recorresse a essa imatura e ingênua felicidade que sentimos quando somos
menores e vemos as coisas por outro ponto de vista.
Todas essas estéticas mais visuais são envelopadas em narrativas que seguem um
determinado padrão nas obras de Wes Anderson. No quesito história e personagens, vemos
uma narrativa guiada pela perspectiva de jovens adultos completamente desajustados e
imperfeitos. São caracterizados principalmente por suas contradições e seu egoísmo, são
emocionalmente frágeis e desapontados com algo, chegam a ser inadequados. Como exemplo,
Os Excêntricos Tenenbaums, O Fantástico Sr. Raposo (2009), e Moonrise Kingdom (2012)
filmes que abordam a temática familiar e como seus problemas pessoais afetam nas suas
relações em família; com narrativas bem simples, o cineasta consegue propor um choque com
as cores fortes, alegres e saturadas e performances bem detalhadas com personagens que são o
completo oposto da estética apresentada, sendo descompassados, aborrecidos e frágeis. A
partir das decepções dos personagens, o diretor cria histórias extravagantes; cada obra dele,
segundo o próprio autor, tem um pouco de sua biografia na narrativa.
As obras de Wes Anderson refletem uma busca por uma rigidez formal, uma certeza
nas composições e tentam resgatar a composição das obras clássicas renascentistas como
forma de trazer de volta o que pode se posicionar como o novo tradicional. Apesar da beleza
das composições e um trabalho nas encenações dos cenários e a riqueza nos detalhes, o
olhares vazios e a falta de expressão dos personagens está ali para o público uma pessoa
insensível com o mundo e suas surpresas, com aspecto de fadiga e cansaço diante da
modernidade cheia de informações e novas maneiras de se expressar. Seria uma crítica ao
sujeito que viveria nessa fase do cinema pós-moderno, que convive em meio às incertezas,
que busca tirar prazer de tudo e vive intensamente as experiências do presente.
Graça, André Rui, Eduardo Tulio Baggio e Manuela Penafria. "Teoria dos cineastas:
uma abordagem para a teoria do cinema." Revista Científica/FAP (2015).
MacDowell, James. "Wes Anderson, tone and the quirky sensibility." New Review of
Film and Television Studies 10.1 (2012): 6-27.
A Vida Marinha com Steve Zissou. Wes Anderson. EUA. Searchlight Pictures. 2004.