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UFC - Universidade Federal do Ceará

Cinema e Audiovisual - Bacharelado


Teorias e Estéticas Clássicas do Cinema e Audiovisual

ÚLTIMOS DIAS, Gus van Sant, e RAPSÓDIA BOÊMIA, Bryan Singer.

Luíza Sales de Azevedo

Fortaleza,
2022
Em Rapsódia Boêmia, desde o primeiro momento da obra, acompanhamos Freddie
sendo um indivíduo definido, aquele que encontra-se na busca de atingir certos
objetivos, objetivos esses que estão sempre relacionados a se tornar alguém
memorável, que não será esquecido por meio da música, através de algo que ele
tem paixão em fazer. A busca do indivíduo definido no mundo cinematográfico
caracteriza-se pelas circunstâncias externas que ocorrem com o personagem e a
consecução dos objetivos deste, e o momento em que a banda se separa e briga
com Fred é um exemplo de conflito e as circunstâncias dele.

A fotografia da obra também merece destaque, pois, além de ser marcante em


momentos específicos, para dar ênfase na situação ocorrente, a iluminação também
é usada em abundância para destacar a figura presente em cena, e a cor é capaz
de definir os planos espaciais. Os planos de cena geralmente centralizam a figura
principal em relação às laterais do espaço, tornando os corpos e os rostos pontos
focais de atenção que transmitem fortes emoções. Em diversos momentos, a cena
finaliza com a reação facial de algum personagem, fornecendo a transição para a
próxima cena, muitas vezes um momento musical. A ferramenta visual do cinema
clássico narrativo, o campo contra campo, é utilizado em forma de montagem
invisível no filme, construindo imagens descontínuas, como, por exemplo, em cenas
que a banda está no palco e, em seguida, a câmera volta-se para o público
presente. Essa ferramenta também é usada propositalmente para dirigir o olhar do
espectador exatamente para onde ele deve olhar.

A transparência é um termo capaz de definir a sequência de planos e a narrativa do


filme, já que é totalmente possível fazer com que a história se desenvolva sem
tropeço, onde os planos e as sequências são encadeados com toda a lógica, e a
história não precisa de um entendimento específico para ser assistida, podendo ser
contada de maneira independente.

No meu ponto de vista, a jornada do herói, um dos maiores recursos utilizados em


obras para o melhor desenvolvimento das histórias, não ocorre de imediato no filme.
Por mais que mostre um pouco antes da vida de Freddie antes da banda, o
protagonista sempre teve sua confiança e talento envolvido em suas atitudes, como
no primeiro encontro com a banda, em que ele mesmo fala que eles precisam dele.
Eu diria que o problema que fez Freddie enfrentar uma complexa batalha e seu
próprio medo, foi no momento em que ele descobre que está doente. Diante disso,
ele se sentiu inseguro e preocupado com o seu futuro, porém, por mais que essa
situação tenha se tornado um grande desafio em sua vida, ele decide tomar
decisões que seriam a “solução” para isso, já que ele sentia que podia estar vivendo
os últimos dias de sua vida. Dessa forma, Freddie reconcilia-se com aqueles que ele
havia se afastado, sabendo que eles realmente eram sua verdadeira família, e que
nada, como as festas e drogas que estavam sobrecarregando sua vida, seria capaz
de substituí-los. Isso faz com que ele volte a ser como antes, retornando ao seu
melhor estado e se tornando alguém melhor.

Já o filme Últimos Dias, de Gus Van Sant, trata-se de uma história fictícia que
baseia-se na vida do cantor Kurt Cobain. Trata-se de uma obra profunda, que busca
tocar os sentimentos do espectador que assiste alguém que não se vai de repente,
mas que vai deixando a sua vida aos poucos, dia após dia. Percebe-se que a sua
saúde mental estava muito afetada e que isso foi se agravando com as situações
que ele tinha que passar tanto na sua vida pessoal, quanto dentro da sua carreira.
Os únicos momentos musicais presentes no filme são extremamente relevantes,
visto que são os únicos momentos em que Blake consegue expressar seus
verdadeiros sentimentos e pensamentos.

Inicialmente, o filme já é capaz de transmitir a solitude vivida pelo cantor. A câmera


capta fragmentos de um amplo espaço, nesse caso, a paisagem em que o cantor se
encontra, indicando ao que o espectador deve focar, nesse caso, nas
movimentações e reações do personagem, principalmente em seu comportamento.
Além disso, desempenha uma função muito importante na compreensão da cena
em si, pois, mesmo sem a presença de diálogo por um longo tempo, os sons dos
movimentos e do espaço preenche bem a cena e junta o que está fora e dentro
desse espaço, com o objetivo de dar ao espectador a comunicação e completar o
percurso de mensagem enviada por um meio.

Os saltos e sequências descontínuas revelam a falta de linearidade presente no


filme Últimos Dias. Pequenas fusões de uma ação que não cria necessariamente
uma sequência, induzindo o espectador a, em muitos momentos, fazer uma
construção própria com lacunas que suprimem informações e fazem com que
surjam questionamentos que as respostas ficam suspensas de forma proposital.

Rapsódia Boêmia e Últimos Dias são dois filmes distintos, mas, ao mesmo tempo,
estão intimamente relacionados em suas tramas, na relação com a música e a vida
de quem a canta. Rapsódia Boêmia é um filme de 2018, no entanto, possui em
abundância elementos do cinema clássico, enquanto Últimos Dias (2005) tem
diversas ligações com o cinema contemporâneo.

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