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PALMAS/TO
JUNHO/202
RESUMO
O presente ensaio acadêmico tem por objetivo trazer reflexões acerca da obra “S.
Bernardo” de Graciliano Ramos, será abordado como essa obra é vista pela crítica literária
e quais os pontos que chama atenção na obra que remete ao regionalismo e a alguns
problemas sociais. No mais será levado em consideração as características psicológicas
do personagem Paulo Honório, um personagem narrador que conta sua própria história a
partir de uma auto analise da sua trajetória até conquistar as terras de S. Bernardo, mas
ultrapassando os limites da ética e da moral para conseguir alcançar seus objetivos.
ABSTRACT
This academic essay aims to bring reflections about the work “S. Bernardo” by
Graciliano Ramos, in the light of the thinking of literary critics such as Afrânio Coutinho
and Antônio Candido, it will be discussed how this work is seen by literary critics and
what are the points that draw attention in the work that refers to regionalism. In addition,
the psychological characteristics of the character Paulo Honório will be taken into
account, a narrator character who tells his own story from a self-analysis of his trajectory
until conquering the lands of S. Bernardo, but surpassing the limits of ethics and morals
to achieve your plans.
1. Introdução
O Brasil nesse período dos anos 30 passa a ser encarado como uma parcela do
Ocidente, o que de fato coincide com a nossa condição de povo formado sob o influxo
dominante da civilização europeia. As influencias da cultura negra não são esquecidas,
mas sente-se mais o peso do Capitalismo, do Machismo, do Existencialismo e da
Psicanalise, aspectos que podem ser facilmente percebidos na obra de Graciliano Ramos
por meio das atitudes tomadas pelo personagem narrador Paulo Honório.
Percebe-se, nesse trecho da obra um dos aspectos que será abordado neste ensaio,
a ganancia pelo dinheiro, os problemas sociais incorporados na sociedade pelo sistema
capitalista, fazendo com que pessoas simples como Paulo Honório tornassem pessoas sem
escrúpulos capazes de fazer qualquer coisa para alcançar status social e riquezas.
Dessarte, na obra o autor traz aspectos questionáveis por alguns críticos como
Augusto Frederico Schmidt, devido a narração do romance ter sido escrita pelo
personagem rude e ignorante, Paulo Honório. Desse modo, à comparação com o que
deveria ser a realidade e o que a realidade é, pode ser percebida sob a perspectiva de uma
sociologia implícita nas obras de Graciliano, em que o mesmo aborda temas nacionais e
cotidianas, no entanto distancia-se do que é percebido como natural no mundo social, do
que se espera do romance social.
De início, Paulo Honório narra em primeira pessoa que iria delegar a função de
escrever a sua história a seus amigos que eram mais cultos,
O autor Graciliano Ramos traz em sua obra uma perspectiva crítica sobre o
sistema capitalista, talvez não esteja tão explicito quanto pareça, mas analisando a obra e
a forma como o personagem Paulo Honório, protagonista, é colocado ao longo da
narrativa, percebe-se essa crítica.
Trata-se de uma idealização de que esse sistema tira a humanidade do ser humano,
pois tudo para aqueles que só pensam no dinheiro não passa de objetos de valor, até
mesmo quando trata-se de pessoas, como é o caso de Casimiro Lopes, amigo fiel de Paulo
Honório que na verdade o ver apenas como algo útil de uso.
Mais adiante, Paulo Honório personagem, retorna a Alagoas sua terra natal, onde
pretende da um jeito de ter as Terras de S. Bernardo que até então estavam sobre os
domínios de Padilha, filho do seu antigo patrão Saulistano Padilha que já havia morrido.
Nesse ponto de partida, o protagonista trama a queda de Padilha para que esse perca as
terras para ele, o próprio Honório.
Nessa perspectiva, o personagem narrador, que traz à tona a voz do autor narrador
em primeira pessoa, Graciliano Ramos, evidencia o sistema latifundiário do Nordeste
Brasileiro, em que a predominância do domínio está nas mãos daquele que possui terras,
por isso o interesse ganancioso de Honório em conseguir conquistar as terras de S.
Bernardo para não mais passar por humilhações. No entanto, ele é quem passa a humilhar
e menosprezar as pessoas ao seu redor, chegando a ser responsável pela morte de um dos
personagens, Mendonça, que era dono de terras que faziam divisa com S. Bernardo.
Paulo Honório reduz tudo ao seu interesse egoísta: os homens não são
senão instrumentos de sua ambição, meios que ele utiliza para a obtenção do fim,
da realização individual a que se propõe. A construção de um burguês: eis o
conteúdo da primeira parte de São Bernardo. Note que Graciliano, ao contrário
dos naturalistas, não nos apresenta um burguês acabado, estático e definido de
uma vez por todas: ele narra a evolução psicológica de Paulo Honório, o
desenvolvimento de sua violenta e apaixonada ambição em estreita ligação com
a totalidade dos objetos que torna possível a realização de seus desejos. Esta
desenfreada ambição capitalista é o conteúdo do ‘demonismo’ de Paulo Honório.
(COUTINHO, 1967, p. 86-87 apud SIRINO,2015)
Diante a fala do critico Coutinho, é possível perceber que ele evidencia o realismo
(uma das influencias na 2 fase do modernismo) presente na obra de Graciliano, o autor
procura trazer por meio de sua obra problemas de seu tempo a partir da construção do
personagem Paulo Honório ao longo da narrativa. Logo, mais uma vez percebe-se a crítica
aos problemas sociais trazidos pelo autor ao capitalismo no contexto em que o próprio
autor vivia. Ainda vale destacar, que o autor traz não só tempos reais ao contexto da
história mais também espaços geográficos, visto que, o mesmo é natural de Alagoas, onde
se passa a história do personagem Paulo Honório.
Logo, a partir destes conflitos sociais, a ignorância que leva as pessoas nos anos
30 a miséria são algumas das características do período literário desta obra. O
autoritarismo de quem possui mais terras, facilita a conquista de muitas outras coisas
devido o contato direto com figuras políticas importantes, por isso o personagem Paulo
Honório conseguia suas conquistas sem ao menos pagar o preço justo a elas,
aproveitando-se da fraqueza do outro seja pela ignorância, pela falta de condição de o
outro não poder lutar por seus direitos, à miséria.
“– A notícia que circulou ontem foi que ele estava no hospital, com uma
punhalada, informou padre Silvestre. Constou até que tinha morrido. Felizmente
hoje sossegamos. Ferimentos leves, não‽” (RAMOS,2005, p. 94)
“– Fiz aquilo porque achei que devia fazer aquilo. E não estou habituado a
justificar-me, está ouvindo‽ Era o que faltava. Grande acontecimento, três ou
quatro muxicões num cabra. Que diabo tem você com Marciano para estar tão
parida por ele‽” (RAMOS, 2005, p. 129)
Dai em diante, Honório passa então a reclamar de tudo em Madalena, seja porque
é uma pessoa boa demais com os outros e sempre quer ajudar, seja porque é simpática,
pois até do juiz Dr. Magalhães passa a ter ciúmes. Começa pensar em Madalena como
uma mulher sem religião, comunista, que defende materialismo histórico um termo
utilizado por ele sem ao menos saber ao certo o significado.
“Daí o horror com que Paulo Honório vai percebendo a sua fraternidade, o
sentimento incompreensível de participar da vida dos desvalidos, para ele
simples autômatos, peças de engrenagem rural.” (CÂNDIDO, 2006, p.36)
Uma outra perspectiva que vale ser ressaltada é a questão do que o autor quis
transmitir para o leitor com tal obra, e eis uma questão complexa, pois talvez apenas
quisesse escrever um romance ou talvez não. Entretanto, a que se averiguar segundo
visões de especialistas literários que Graciliano mostrou nessa obra o homem no seu
consciente em conflito com sigo mesmo e com o mundo a sua volta, que achando esta no
controle de tudo, em contato com o amor perde o controle de tudo, eis a característica do
romance.
Diante do exposto até aqui, percebe-se que Honório é um personagem que nos
últimos tempos da sua vida, decide refletir sobre o que fez, sobre o que valeu a pena ou
não, e nesse momento de reflexão percebe que nada do que fez foi válido, o que havia
conquistado materialmente foi se acabando aos poucos por falta de recursos, único amor
que teve ele mesmo levou-a a morte (Madalena) e no final ele percebeu que nada
acrescentou de bom na vida de ninguém, nem dos seus empregados, pelo contrário,
contribui para a desgraça de cada um deles, os humilhando, os deixando passar fome, etc.
“Penso em Madalena com insistência. Se fosse possível
recomeçarmos... Para que enganar-me‽ Se fosse possível recomeçarmos,
aconteceria exatamente o que aconteceu. Não consigo modificar-me, é o que
mais me aflige.” (RAMOS,2005, p. 220)
Assim, Honório passa a escrever seu livro depois de dois anos que Madalena
morreu, morte esta que ele com suas atitudes brutescas, seu ciúme excessivo causou,
como ele mesmo afirma, “Três anos de casado. Fazia exatamente um ano que tinha
começado o diabo do ciúme.” (RAMOS, 2005, p. 193). Daí, Madalena começa a ficar
triste, emagrece, tudo por causa dos ciúmes de Honório, até que ela decide que aquela
vida não mais vale apena, e suicida-se.
O personagem narrador afirma que não é doente, entretanto, se o ciúme excessivo não é
doença o que é então⁉ Sob esse ponto de partida, que afirmo Honório é doente sim, a sua
agressividade o seu jeito “explorador feroz em que...” (RAMOS, 2005, p. 218) se
transformou, tudo isso fez dele uma pessoa doente, o contrário do que ele afirma.
6. Conclusão
Somente trago essas falas para exemplificar que uma obra literária pode trazer
uma mensagem sobre vários aspectos sociais, inclusive a política, que, no entanto, não
foi debatido aqui.
“Creio que nem sempre fui egoísta e brutal. A profissão é que me deu qualidades tão
ruins.” (RAMOS, 2005, p. 221)
Ademais, o que se percebe é que o narrador personagem tenta se redimir ou achar
uma saída a partir da escrita, como afirmou Freud em 1895: “sofremos de reminiscências
que se curam lembrando”. Talvez escrever um livro fosse a saída para se curar de sua
doença.
“Não julga que lhe aconteceu uma mudança, mas estende sua autocrítica ao passado:
afirma que ele nunca foi melhor.” (FREUD, 1917)
CÂNDIDO, Antônio. Ficção e Confissão: Ensaios Sobre Graciliano Ramos. 3. Ed. Rio
de Janeiro: Ouro sobre azul, 2006