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ADOÇÃO POR CASAIS HOMOSSEXUAIS NO


AMBITO JURIDICO
Karolina Fernanda Nunes Nemer1

Resumo
O presente artigo enfoca a possibilidade de adoção de casais homossexuais no
âmbito jurídico, visto que a entidade familiar é o alicerce da sociedade, é um direito
fundamental de todo cidadão, porém, os casais homossexuais enfrentam muitos
obstáculos para a adoção, à falta de previsão legal torna a situação ainda mais
complexa. Os progressos na jurisprudência em relação à adoção homoafetiva faz
com que haja uma esperança de reconhecimento para esses casais terem os seus
direitos respeitados, sem que o preconceito prevaleça sob o melhor interesse da
criança, que os valores morais impostos historicamente não infrinjam a dignidade e
os direitos humanos.
Palavras – Chave: adoção – homoafetividade – jurídico – direitos.

Abstract
This article focuses on the possibility of adopting homosexual couples in the legal
framework, the family entity is the foundation of society, it is a fundamental right of
every citizen, however, homosexual couples face many obstacles to adoption, lack of
legal foresight the complex situation. Progress in jurisprudence in relation to
homoaffective adoption gives hope of recognition for these couples to have their
rights respected, without bias prevailing in the best interests of the child, that
historically imposed moral values do not infringe on dignity and human rights.
Keywords: adoption – homoafetividade – juridical – rights.

Sumário: Introdução; 1. Conceitos e Evolução Histórica; 1.1. Família; 1.2.


Adoção; 1.3. Homossexualidade; 2. Requisitos para adoção; 2.1. Lei 12.010/09; 2.2.
Constituição Federal e Código Civil; 2.3. Estatuto da Criança e do Adolescente; 3.

1
Graduanda do Curso de Direito, pela Universidade Braz Cubas. Trabalho orientado pelo Professor Ivan de
Oliveira.
2

Possibilidade jurídica de adoção por casais homossexuais; 3.1. Contexto de


homoparentalidade; 3.2. Família homoafetiva; 3.3. Adoção homoparental individual;
3.4. Adoção homoparental conjunta; 4. Ordenamento jurídico brasileiro; 4.1.
Jurisprudências dos tribunais brasileiros; 4.2. Omissão legislativa e as decisões
judiciais; 5. Considerações Finais; 6. Referências Bibliográficas.

Introdução
A falta de legislação especifica para adoção de casais homossexuais dificulta
a formação de famílias, privando crianças de um ambiente familiar com o
compromisso de amor, educação e cuidado.
Hodiernamente, a filiação adotiva é basicamente jurídica havendo uma
ligação afetiva entre as partes, não sendo exclusivamente biológica, formando
assim diversos tipos de família.
A omissão de leis reguladoras demonstra que os princípios fundamentais não
estão sendo aplicados, pois a adoção é um direito personalíssimo, gerando mais
preconceito. Ante a ausência de regulamentação, impede que crianças de um lar,
uma família para prover suas necessidades intelectuais e emocionais.
Por falta de leis especificas, os juízes da infância e juventude foram
autorizados a aplicação da legislação de união estável para as uniões
homossexuais, garantindo-lhes o direito a família e a adoção.
O Estatuto da Criança e do Adolescente não impõe qualquer impedimento
para adoção de casais homoafetivos e ainda define que a adoção será deferida
quando houver vantagens para a criança.
O ordenamento jurídico adapta-se conforme os costumes da sociedade, as
famílias de hoje não estão mais restritas ao conceito de homem e mulher, e sim ao
conceito de afeto, cuidado, amor e carinho.
Os princípios da dignidade da pessoa humana, de liberdade e igualdade por
casais homossexuais na adoção são respeitados no ordenamento jurídico
brasileiro?
A adoção por casais homossexuais no Brasil é abundantemente complexa,
embora a Constituição Federal vise os direitos fundamentais de todo ser humano,
não há legislação vigente para adoção desses casais, devendo assim, os direitos
3

serem garantidos com base no princípio da dignidade da pessoa humana e no


melhor interesse da criança e do adolescente.
Demonstrar a possibilidade de adoção por casais homossexuais no âmbito
jurídico, apresentando a evolução de família e adoção, asseguradas pelo Código
Civil e Estatuto da Criança e do Adolescente.
O tema se justifica em retratar um assunto atual e de suma importância no
ordenamento jurídico, com a constante evolução social do conceito de família, há
falta de previsão legal de adoção por homossexuais mesmo com o reconhecimento
do STF da união homoafetiva, gera debates sobre direitos fundamentais garantidos
pela Constituição Federal, sendo assim, o presente artigo busca enquadramento à
aplicação dos direitos aos casais homossexuais.
A metodologia de pesquisa utilizada foi baseada na pesquisa de materiais
bibliográficos e temas essenciais ao tema abordado, bem como autores que
defenderam os direitos dos casais homossexuais, usando livros, artigos científicos,
revistas, periódicos e enfoques sobre o tema no meio eletrônico.

1. Conceitos e Evolução Histórica


1.1 Família
Não há como discorrer sobre a adoção homoafetiva sem uma abordagem a
respeito de sua definição, portanto, precisamos entender este conceito. Família
deriva do termo latino familia, que é descrito pelo dicionário como um grupo de
pessoas vivendo sob o mesmo teto ou grupo de pessoas com ancestralidade
comum2.
Silvio Rodrigues3 ensina que “a família se constitui a base de toda sociedade.
Nela se assentam não só as colunas econômicas, como se esteiam as raízes
morais da organização social”.
Segundo Venosa4, a época primitiva foi denominada como “endogamia”, uma
família matriarcal, as relações sexuais ocorriam entre todas as tribos, onde as
mulheres tinham elevada importância e domínio no âmbito familiar, elas não
mantinham relações sexuais somente com um parceiro, sem possibilidade de dizer

2
Michaelis - Dicionário Escolar - Língua Portuguesa, 4ª Ed, 2016.
3
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família: volume 6. 28. Ed. Ver. E atual. Por Francisco José Cahali; de
acordo com o Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 04.
4
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família, v. 6. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2012, pg. 257.
4

quem era o devido pai da criança advinda dessas relações, sendo responsabilidade
da tribo.
Em seguida nasceu a família patriarcal, onde as mulheres e os filhos se
submetiam as vontades do marido, o qual era responsável por todos os assuntos
referentes aos membros familiares, surgindo assim, o termo “pátrio poder”.
Uma época influenciada pela religiosidade, a única forma legítima de família
era pelo casamento, visando à procriação e a economia². Por este motivo, as
famílias de outrora eram numerosas, se não seguissem as regras, estariam vivendo
em pecado e desobedecendo as vontades de Deus5.
Com o início da Revolução Francesa, começou a busca pela igualdade entre
homens e mulheres, adiante, com a Revolução Industrial, houve a necessidade do
aumento de trabalhadores, começando assim, o primeiro ingresso da mulher no
mercado de trabalho.
Conforme Venosa6:
A industrialização transforma drasticamente a composição da família,
restringindo o número de nascimentos nos países mais desenvolvidos. A
família deixa de ser uma unidade de produção na qual todos trabalhavam
sob a autoridade de um chefe. O homem vai para a fábrica e a mulher
lança-se para o mercado de trabalho. No século XX, o papel da mulher
transforma-se profundamente, com sensíveis efeitos no meio familiar. Na
maioria das legislações, a mulher, não sem superar enormes resistências,
alcança os mesmos direitos do marido. Com isso, transfigura-se a
convivência entre pais e filhos.
Apesar disso, não houve igualdade entre os gêneros, as mulheres recebiam
um salário menor e seus direitos ainda não eram reconhecidos.
Com a Constituição de 25 de março de 1824, em seu artigo 5º, foi legislado
que a formação da família somente ocorria pelo casamento religioso, já com a
terceira Constituição Federal de 24 de fevereiro de 1891, no Título IV, Seção II,
artigo 72, § 4º, admite que não ocorra somente o casamente religioso, mas também,
o casamento civil.
Com o Código Civil de 1916, a base da família era o casamento civil ou
religioso entre homem e mulher, onde o homem comandava, sendo responsável
pelo sustento da família e a mulher responsável pelos afazeres domésticos, a

5
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família, v. 6. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2012.
6
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família, v. 6. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2012, pg. 6.
5

mulher continuava submissa ao homem, sendo considerada incapaz para os atos


da vida civil.
Se as regras da época não fossem seguidas, as relações eram chamadas de
“extraconjugais”, e os filhos advindos dessas relações eram considerados ilegítimos.
Para Maria Berenice Dias7:
Negar a existência da prole ilegítima simplesmente beneficiava o genitor e
prejudicava o filho. Ainda que tivesse sido o pai quem cometera o delito de
adultério – que à época era crime-, infringindo o dever de fidelidade, o filho
era o grande perdedor. Singelamente, a lei fazia de conta que ele não
existia. Era punido pela postura do pai, que se safava dos ônus do poder
familiar.
A Constituição Federal de 16 de julho de 1934, em seu Capítulo I, Título V,
artigos 144 e 146, possibilitou que o casamento religioso abrangesse os efeitos
civis. Na Constituição de 10 de novembro de 1937 e a Constituição de 18 de
setembro de 1946, não houve alterações, somente reafirmou que o casamento era
indissolúvel.
Por fim, em 1977, com a Emenda nº 9 de 28 de junho de 1977, em seus
artigos 1º e 2º, levou ao fim a indissolubilidade do casamento, surgindo a Lei 6.515
de 26 de dezembro de 1977, regulando a dissolução da sociedade conjugal e o
casamento.
Com a Constituição Federal de 05 de outubro de 1988 o conceito de família
foi se transformando, novos tipos de famílias foram sendo aceitas, como por
exemplo, os homossexuais, houve igualdade nos direitos entre homem e mulher
(artigo 226, § 5º), o fim da família ilegítima com a união estável (artigo 226, § 3º).
Segundo Kátia Maciel8:
Nota-se que somente com a publicação da Constituição de 1988 é que
todos os membros da família foram reconhecidos e tratados como “sujeitos
de direito”, havendo um maior respeito a sua “individualidade” e aos seus
“direitos fundamentais”, o que tornou irreversível o pluralismo das entidades
familiares.

7
DIAS, MAria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 9. ed. São Paulo, SP: Revista Tribunais, 2013, pg. 361.
8
MACIEL, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade. Direito fundamental à convivência familiar. Curso de direito da
criança e do adolescente: aspectos teóricos e práticos. 4ª ed – revista e atual. Rio de Janeiro: Editora Lumem
Juris, 2010. p 68.
6

Após o discorrido, não há como manter uma conceituação de família sem


mutações, visto que, as leis se modificam conforme a evolução do homem em
sociedade.
Para Maria Berenice Dias9, a evolução social:
Ocorreu um alargamento conceitual da família, que passou a ser vivenciada
como um espaço de afetividade, destinado a realizar os anseios de
felicidade de cada um. Os elos de convivência, que levam ao enlaçamento
de vidas e ao embaralhamento de patrimônios, fazem surgir
comprometimentos mútuos e responsabilidades recíprocas. Esse é o
verdadeiro sentido que deve prevalecer na identificação das relações
familiares: transformar cada um do par em “responsável por quem cativa”
como já afirmava Saint-Exupéry, o que leva ao reconhecimento de um maior
número de direitos e a imposição de mais deveres de um para com o outro.
Com entendimento da autora, a partir do momento que duas pessoas
possuem uma relação duradoura, pública e continua, formam um núcleo familiar,
sendo reconhecido como união estável.
As uniões homoafetivas são uma realidade que se impõe e não podem ser
negadas, estando a reclamar tutela jurídica, cabendo ao Judiciário solver os
conflitos trazidos. Incabível que as convicções subjetivas impeçam seu
enfrentamento e vedem a atribuição de efeitos, relegando à marginalidade
determinadas relações sociais, pois a mais cruel consequência do agir
omissivo é a perpetração de grandes injustiças.
Deste modo, temos os seguintes exemplos de famílias: a) família
matrimonial é aquela formada pelo casamento, b) família informal é formada por
uma união estável, c) família monoparental é formada por qualquer um dos pais e
seus descendentes, d) família anaparental uma família sem pais, formada apenas
por irmãos, e) família anipessoal uma família de uma pessoa, f) família mosaico
ou reconstituída são de pais que têm filhos e se separam, e eventualmente
começam a viver com outra pessoa que também tem filhos de outros
relacionamentos, g) família simultânea/paralela são em situações que uma pessoa
mantém duas relações ao mesmo tempo, h) família eudemonista família afetiva,
formada por uma parentalidade socioafetiva10.

9
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias – 8ª ed. São Paulo: RT, 2011, pg. 18.
10
SOUZA, Daniel Barbosa Lima Faria Corrêa de. Famílias plurais ou espécies de famílias. Conteudo Juridico,
Brasilia-DF: 14 dez. 2009. Disponivel em:
<http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.25712&seo=1>. Acesso em: 20 set. 2018.
7

1.2 Adoção
Para sabermos o conceito de adoção, primeiro precisamos saber sua
etimologia. A palavra adoção tem origem do latim "adoptio", que em nossa língua
significa "tomar alguém como filho". Ação de adotar, tomar para si com cuidados11.
Para Maria Helena Diniz12:
[...] adoção vem a ser o ato jurídico solene pelo qual, observados os
requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer
relação de parentesco consangüíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação,
trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe
é estranha.
As primeiras adoções ocorrem na Bíblia entre hebreus e egípcios, como
Ester por Mardoqueu e a de Efraim Emanes por Jacó, após isso entre os gregos e
os atenienses13.
Nesse sentido, Rui Ribeiro de Magalhães cita uma passagem de Gêneses
16:1-2 em que Sarai diz a Abraão: “Eis que o Senhor me tem impedido de dar à luz,
toma, pois a minha serva, porventura tereis filhos dela”14. O princípio da adoção
começa quando se é dito: “tereis filhos dela15”.
No direito romano, regido pela Lei das XII Tábuas, havia a adoção ad-rogatio
e a adoptio, ambas com a mesma finalidade, porém a primeira de forma mais
complexa, tendo como requisitos adotantes homens, com mais de 18 anos em
relação ao adotado e não possuir filhos.
Segundo Maria Alice Zaratin Lotufo16 nessa época não envolvia uma relação
de afeto, não visava à proteção ou bem-estar do adotando, o seu objetivo era servir
aos interesses do adotante.
A primeira lei que tratou sobre a adoção foi na época da Monarquia, sendo a
Lei de 22 de setembro de 1828, regente até o Código Civil de 1916. Na idade
contemporânea, a legislação de adoção foi inserida no código de Napoleão de

11
Dicionário Informal SP. Disponivel em:
<https://www.dicionarioinformal.com.br/significado/ado%C3%A7%C3%A3o/9659/>. Acesso em 20 set. 2018.
12
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito de família. Vol. 5, 23ª ed. rev., atual. e ampl. de
acordo com a Reforma do CPC e com o Projeto de Lei nº 276/2007. São Paulo: Saraiva, 2008.
13
SILVA JUNIOR, E.D. A possibilidade jurídica de adoção por casais homossexuais. Curitiba: Juruá, 2010, pg. 53.
14
Bíblia de estudo da mulher. Traduzido por João Ferreira de Almeida. Belo Horizonte: Atos, 2002, pg. 17.
15
MAGALHÃES, Rui Ribeiro. Instituição do Direito de Família. São Paulo. Editora do Direto, 2000.
16
LOTUFO, Maria Alice Zaratin. Curso avançado de Direito Civil: Direito de Família. V.5 São Paulo: Ed Revista
dos Tribunais, 2002.
8

1804. A lei Francesa de 1923 ampliou a adoção, com a Lei de 1939 que fixou a
legitimação adotiva17.
Com o Código Civil foi colocado os requisitos para adoção, que no fim,
seguiu as mesmas exigências do direito romano, a adoção era feita por escritura
pública e a manifestação de vontade das partes, havendo um documento para
assinar em cartório.
Porém o direito de família se transforma conforme a evolução do homem em
sociedade, nesse sentido, Rabindranath18 menciona que “a adoção vem se
adaptando a finalidades distintas, trazendo como consequência tipos de adoções
totalmente diversas, quer na sua forma de constituição, quer nos seus efeitos”.
Com a Lei 8.069 – Estatuto da Criança e do Adolescente, Gueiros19 explica
que “esse dispositivo incorpora a concepção presente no texto constitucional de
1988, no qual a criança e o adolescente são vistos como sujeitos de direitos”.
Com o Estatuto da Criança e do Adolescente, não houve mais entre filhos
biológicos e filhos adotivos, protegendo os direitos fundamentais dos filhos adotivos.
No Código Civil de 2002, o tema adoção está regulado no Capítulo V, entre os
artigos 1618 e 1619.

1.3 Homossexualidade
Para falarmos de adoção por homossexuais precisamos conceituar
homossexualidade, uma opção sexual que data desde a antiguidade até os dias
atuais.
Para Maria Berenice Dias e Roberta Vieira Larratea20 o conceito se define “[o]
vocábulo homossexual tem origem etimológica grega, significando ‘homo’ ou ‘homoe’, que
exprime a ideia de semelhança, igual, análogo, ou seja, homólogo ou semelhante ao sexo
que a pessoa almeja ter”.
Já Taísa Ribeiro Fernandes21 afirma que o:
Homossexual é o indivíduo cuja inclinação sexual é voltada para uma
pessoa do mesmo gênero, o homem que se sente atraído por outro homem

17
VENOSA, S.S. Direito Civil. Direito da família. São Paulo: Atlas, v.6, 2011.
18
RABINDRANATH, Valentino A. Capelo. de Souza.A adoção: Constituição e relação adotiva .Coimbra:Ed.
Coimbra, 1973.
19
GUEIROS, Dalva Azevedo. Adoção consentida: do desenraizamento social da família à prática de adoção
aberta. São Paulo: Cortez, 2007. p.278.
20
DIAS, Maria Berenice LARRATEA, Roberta Vieira. A constitucionalização das uniões homoafetivas. Revista
Magister de Direito Civil e Processual Civil, Porto Alegre, v. 6, n. 32, p. 47-61, set./out. 2009.
21
FERNANDES, Taísa Ribeiro. Uniões homossexuais efeitos jurídicos. Ed. Método, ano 2004, pgs. 190.
9

e a mulher que se sente atraída por outra mulher. É alguém que não nega
sua formação morfológica, entretanto seu interesse e sua atividade sexual
são voltados, direcionados exclusivamente para quem tem o mesmo sexo
que o seu”.
Os primeiros indícios de homossexualidade surgiram na Grécia Antiga, por
meio das olimpíadas, dos teatros e das longas guerras em que enfrentavam, porém,
com o idealismo da igreja católica, a homossexualidade virou motivo para
recriminação e preconceito22.
Para Trevisan e Silva Junior23:
As pesquisas em torno da prática homossexual revelam que a
homossexualidade é tão antiga quanto à própria humanidade e está
presente em todas as fases históricas, culturais, classes e ramos da
atividade humana, desde os mais masculinos como os exércitos até os mais
opressivos como a igreja católica.
E conclui Silva Júnior24 que “Em uma visão histórica a prática homossexual
se confirma como uma oscilação reiterada entre o fascínio e a repulsa, a prática e a
condenação”.
Na visão de Angeluci25 “a visão afetiva da sociedade grega fora destituída,
anos depois, com o pensamento ideológico da Igreja Católica, condenando as
pessoas que tinham relações com outras do mesmo sexo, tornando-as abomináveis
e tipificando a prática homossexual como um grande pecado [...]”.
Somente na década de 60 até a década de 70 que o assunto da opção
homossexual voltou a ter relevância, com os movimentos LGBT, repercutindo no
mundo inteiro, logo em seguida, com a Constituição de 1988 que seus direitos de
igualdade começaram a ganhar voz e com o Código Civil de 2002 sus direitos a
serem reconhecidos.

2 – Requisitos para Adoção


2.1 Lei nº 12.010/09

22
DIAS, Maria Berenice. UNIÃO HOMOAFETIVA: O PRECONCEITO & A JUSTIÇA. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 4.ed., 2009, p. 36-37.
23
TREVISAN, J.S. A epopeia universal do desejo. Rev. Sui Generis, vr.3, n. 23, 1997.
24
SILVA JUNIOR, E.D. A possibilidade jurídica de adoção por casais homossexuais. Curitiba: Juruá, 2010.
25
ANGELUCI, Cleber Affonso; JUSTINA, Daiane Dela; NASCIMENTO, Rogério Dorneles do. A relação homoafetiva
e os princípios constitucionais: uma leitura a partir do julgamento da ADI nº 4277. Conselho da Justiça Federal –
Acervo, abril. 2014.
10

A Lei nº 12.010/09 dispõe sobre adoção, altera as Leis nº 8.069, de 13 de


julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente, 8.560, de 29 de dezembro de
1992; revoga dispositivos da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil,
e da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decrto-Lei nº 5.452
de 1º de maio de 1943; e dá outras providências.
Esta Lei regula a situação jurídica entre os adotantes e as crianças adotadas,
facilitando o processo de adoção, fazendo com que seja menos desgastante.
Com isso, objetiva que seja preservado os melhores interesses das crianças,
mantendo separado dos familiares de sangue somente em ultimo recurso.
Com intuito de que o processo de adoção seja mais rápido e que o tempo
das crianças em abrigos seja reduzido, modificou artigos do Código Civil de 2002,
deixando para regulamentar o processo de adoção para o Estatuto da Criança e do
Adolescente, conforme exposto: “Art. 1.618. A adoção de crianças e adolescentes
será deferida na forma prevista pela Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto
da Criança e do Adolescente. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)”.
Há requisitos para que ocorra o processo de adoção, primeiramente é
necessário que haja um cadastro das pessoas interessadas nos foros ou comarcas
regionais.
Conforme explica o Conselho Nacional de Justiça26:
O curso de preparação psicossocial e jurídica para adoção é obrigatório. Na
1ª Vara de Infância do DF, o curso tem duração de 2 meses, com aulas
semanais. Após comprovada a participação no curso, o candidato é
submetido à avaliação psicossocial com entrevistas e visita domiciliar feitas
pela equipe técnica interprofissional. Algumas comarcas avaliam a situação
socioeconômica e psicoemocional dos futuros pais adotivos apenas com as
entrevistas e visitas. O resultado dessa avaliação será encaminhado ao
Ministério Público e ao juiz da Vara de Infância.
Durante a entrevista técnica, o pretendente descreverá o perfil da criança
desejada. É possível escolher o sexo, a faixa etária, o estado de saúde, os
irmãos etc. Quando a criança tem irmãos, a lei prevê que o grupo não seja
separado.
A partir do laudo da equipe técnica da Vara e do parecer emitido pelo
Ministério Público, o juiz dará sua sentença. Com seu pedido acolhido, seu

26
Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/cadastro-nacional-
de-adocao-cna/passo-a-passo-da-adocao>. Acesso em: 09 setembro de 2018.
11

nome será inserido nos cadastros, válidos por dois anos em território
nacional.
Após isso, começa a etapa de testes, onde acontecem avaliações com
psicólogos, que é uma das etapas mais demoradas e complexas.
Para os casais que desejam adotar devem apresentar a certidão de
casamento ou a de união estável, mesmo que durante o processo ocorra o divórcio,
isto não influencia na adoção.
Neste sentido, artigo 42, 4º, ECA que dispõe:
Os divorciados, os judicialmente separados e os ex-companheiros podem
adotar conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de
visitas e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na
constância do período de convivência e que seja comprovada a existência
de vínculos da afinidade e afetividade com aquele não detentor da guarda,
que justifiquem a excepcionalidade da concessão.
Conforme a Lei de Adoção, os avôs, homem solteiro e casal sem filhos
adotar o neto ou o irmão de um dos cônjuges, neste caso, seria deferida a guarda
do menor, e não a adoção.
Porém, ser não houver parentes para a modificação de guarda dessas
crianças, elas serão encaminhadas para uma família que seja cadastrada no
acolhimento familiar.
O período de convivência ser tornou obrigatório com a nova lei, sendo
justificado para que se verificar se os adotantes iram permanecer com a criança ou
o adolescente, para que haja o costume, o vínculo e familiaridade entre ambas as
partes.
Neste contexto, Granato27 esclarece:
O período experimental em que o adotando convive com os adotantes, para
se avaliar a adaptação daquele à família substituta, bem como a
compatibilidade desta com a adoção. É de grande importância, porque
constituindo um período de adaptação do adotando e dos adotantes à nova
forma de vida, afasta adoções precipitadas que geram situações de
sofrimento para todos os envolvidos.
E para que respeite o melhor interesse da criança ou do adolescente, foi
incluído pela Lei 12.010/09 que o Judiciário ouça o adotado antes que seja
aprovada sua adoção.

27
GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção doutrina e prática. Curitiba: Juruá, 2005, pg. 50.
12

Entretanto, mesmo com várias alterações significativos no sentido de adoção


e das famílias adotantes, não houve qualquer regulamentação para a adoção de
casais homoafetivos.
Com isso, Maria Berenice Dias28 diz que:
Nada, absolutamente nada, justifica a omissão. Para conceder a adoção
conjunta, de modo pouco técnico, fala a lei em "casados civilmente" (ECA
42, § 2º). Ora, quem não é legalmente casado, casado não é. Também é
confrontado o preceito constitucional ao ser exigida a comprovação
documental da união estável (ECA 197-A, III). É instituto que não requer
prova escrita. Trata-se de situação fática que se caracteriza pela
convivência entre pessoas que têm o desejo de, entre si, constituir família. É
o que basta. De qualquer modo, apesar da aparente limitação, tais
dispositivos não vão impedir que casais homoafetivos continuem
constituindo família com filhos por meio da adoção”.

2.2 Constituição Federal de 1988 e Código Civil de 2002


A Constituição Federal exemplifica o dever de família, da sociedade e do
Estado, in verbis:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança,
ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão. [...]§ 5º - A adoção será
assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e
condições de sua efetivação por parte de estrangeiros.
Porém, na legislação constitucional, a letra da lei é exclusiva em relações aos
tipos de famílias, sendo garantidos os direitos somente as uniões entre homens e
mulheres, conforme artigo: “Artigo 226, § 3º Para efeito da proteção do Estado, é
reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar,
devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.
Neste sentido, Dóris de Cassia Alessi29 menciona: “Se por um lado é certo
que não há previsão constitucional expressa nesse sentido, por outro, também é

28
DIAS, Maria Berenice. O lar que não chegou, IBDFAM, revista, atualizada e ampliada, editora RT, 2011.
29
ALESSI, Dóris de Cássia. Teoria Geral do Direito – Ensaios sobre dignidade humana e fraternidade. 1ª Ed.
Coleção UNIVEM, Ed. Boreal, 2011, pg. 02.
13

correto dizer que é por meio de uma interpretação sistemática e teleológica da


Constituição que se irá inferir tal conclusão”.
No tocante ao Código Civil de 2002, este também não inclui as uniões
homoafetivos, demonstrando isso, em seu artigo 1.723, conforme artigo: “Art. 1.723
- É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher,
configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o
objetivo de constituição de família”.
Seguindo o contexto, Alessi²³ continua “ao discorrer sobre o silêncio do
Código Civil de 2002, com relação às uniões homoafetivas e seu caráter excludente,
adverte que os fora dessa lei não estão fora da lei quando é de outra lei que se
trata, ensejando uma remissão à Constituição Federal”.
Ademais, no Código Civil a única regulamentação referente à adoção está
em seu artigo 1.619, onde altera a idade mínima para entrar com o pedido de
adoção.
Com isso, Cipriano30 discorre:
Modificação da idade mínima para se adotar instituída pelo ECA, onde para
ser adotante era necessária a idade de 21 anos, independente do seu
estado civil. Com o advento do atual Código Civil, segundo o artigo 1.618,
caput, a pessoa maior de 18 anos pode adotar. Esse fato se explica pela
mudança da maioridade civil ocorrida com a promulgação de tal legislação”.
E prossegue “[...] pelo código civil anterior, o adotante deveria ser pelo menos
18 anos mais velho que o adotado. Essa diferença foi reduzida pela Lei 3.133/57
para 16 anos e a partir de então mantida”.
E em seu artigo 1.757 que permite tutor e curador a adotar o pupilo ou
curatela, desde que siga a regra do artigo 1.762, onde devem ter prestado todas as
suas contas durante sua administração.

2.3 Estatuto da Criança e do Adolescente


O ECA é o estatuto que protege os direitos das crianças e dos adolescentes,
abrangendo todo o sistema de adoção, conforme disposto em seu artigo 39,
delineando seus requisitos e procedimentos.

30
CIPRIANO, Ana Paula. Adoção: as modificações trazidas pela Lei nº 12.010/2009. Disponível em:
<http://www.conteudojuridico.com.br/monografia-tcc-tese,adocao-as-modificacoes-trazidas-pela-lei-12010-
de-03-agosto-de-2009,39187.html>. Acesso em: 08 de setembro de 2018.
14

As comarcas e os foros regionais mantem um registro das crianças e dos


adolescentes em condições de adoção e um registro com as pessoas que
manifestam interesse em adotar (art. 50).
Em seu artigo 40 começam os requisitos para adoção, sendo que, regula que
o adotante precisa ser maior de 18 (dezoito) anos, independente do estado civil,
para adoção em conjunto, é necessária a apresentação de certidão de casamento
ou união estável (art. 42, §2º), ser 16 (dezesseis) anos mais velho que o adotado
(art. 42, §3º).
Para que ocorra a adoção, o fundamental é analisar as vantagens reais que a
criança ou o adolescente irá receber, seguindo este conceito, o adotado maior de 12
(doze) anos terá direito a se manifestar se deseja ou não continuar no acolhimento
familiar (art. 43, §2º).
Um dos requisitos para a adoção é o tempo de convívio com a criança ou o
adolescente para estabelecer um vínculo entre adotado e adotante, havendo um
acompanhamento com profissionais qualificados pelo tempo determinado em juízo,
conforme artigo 46, §4º, in verbis:
O estágio de convivência será acompanhado pela equipe interprofissional a
serviço da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com apoio
dos técnicos responsáveis pela execução da política de garantia do direito à
convivência familiar, que apresentarão relatório minucioso acerca da
conveniência do deferimento da medida.
Para que aconteça esse convívio, o ambiente familiar deve ser adequado
para acolher uma criança, no entendimento de Luiz Antônio Miguel Ferreira 31:
Esse ambiente familiar adequado não se restringe apenas à questão penal.
Esta análise é bem mais ampla e é uma tarefa a ser desempenhada,
principalmente pela equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude.
Esse requisito deve ser analisado quando da habilitação dos pretendentes
ao cadastro de adoção, bem como na avaliação do estágio de convivência,
ou seja, antes e durante o processo adotivo.
O transito em julgado da sentença determina o momento do vínculo (art. 47)
de adoção, sendo esta, inscrita no registro civil mediante mandado, consolidando a
filiação.
Para Paulo Luiz Netto Lôbo, há outro efeito da sentença “outro efeito da
adoção é que a sentença judicial deve consignar expressamente a atribuição ao

31
FERRERIA, Luiz Antônio Miguel. Adoção: guia prático doutrinário e processual. Sâo Paulo, Cortez, 2010, p. 54.
15

adotado do sobrenome do adotante, podendo este requerer que também o prenome


seja alterado, fundando-se no direito à identidade pessoal dos filhos, sem
discriminação”.
Dentro do contexto, é vedada a adoção por procuração, estando expresso na
legislação, no artigo 32, § 2º, para que durante o processo não ocorra que o
adotado não tenha qualquer contato com o adotante.

3 – Possibilidades Jurídicas de Adoção por Casais Homossexuais


Como relatado anteriormente, conforme regra, para ocorrer a adoção
conjunta um dos requisitos é a apresentação da certidão de casamento ou união
estável.
O STJ reconheceu aos casais homoafetivos o direito de adoção, pelo fato
desses casais serem inclusos em equiparação com a união estável.
Nesse entendimento, Marianna Chaves32 diz:
A adoção por casais do mesmo sexo também pode ser facilmente
equalizada dentro do atual contexto do ordenamento brasileiro. Antes de
tudo, é importante relembrar que a idoneidade dos requerentes à adoção,
assim como sua capacidade para o exercício efetivo e afetivo da
parentalidade são os fatores que deverão ser levados em conta, para a
materialização do melhor interesse da criança”.

3.1 Contexto da homoparentalidade


Homoparentalidade é a intenção de adoção por pessoas homossexuais ou
bixessuais, “homo” deriva do grego “homós” que significa uma ideia de igual,
semelhante, e “parental” deriva do latim, “parentalis”, que é a relação com os
parentes.
Em conjunto é uma entidade familiar composto por duas pessoas do mesmo
sexo que se unem por laços afetivos com intutito de constituir família e ação optar
pela adoção.
Para Silva Junior33:

32
CHAVES, Marianna. União homoafetiva: breves notas após o julgamento da ADPF 132 e da ADI 4277 pelo
STF. ARPEN.SP. Disponível em <http://www.arpensp.org.br/?pG=X19leGliZV9ub3RpY2lhcw==&in=MTM3NjE=>.
Acesso em 21 de outubro de 2014.
33
SILVA JÚNIOR, E de. A possibilidade jurídica de adoção por homossexuais. 2.ed. Curitiba: Juruá, 2006. p.34-
35.
16

Enfocando-se a família como realidade ou dado psíquico, percebe-se a


verdade socioafetiva mais relevante do que a biológica, porque é o amor e a
afeição recíproca que marcam a liame de respeito entre seus membros.
Assim, na edificação subjetivo-familiar, onde cada pessoa ocupa uma
função (a de pai, mãe ou filho, por exemplo), não é preponderante o vinculo
biológico ou a orientação sexual dos integrantes, mas o afeto que os
prepara para enfrentar os desafios da existência.

3.2 Família homoafetiva


“Os princípios constitucionais têm como função proteger e garantir os direitos
conquistados pela sociedade e aqueles que estão sendo conquistados que, no
caso, constitui a condição de tratamento equivalente ao dado à união estável para
pessoas do mesmo sexo34”.
O vínculo de uma família homoafetiva ainda não está regido pela
Constituição Federal, porém, o direito acompanha a evolução da sociedade, e com
isso, houve a necessidade de regulamentação para questões que envolvem direito
civis a todas as pessoas independentemente do sexo.
A união entre pessoas do mesmo sexo passou a ser julgado nos tribunais,
visto que as relações homoafetivas tem o direito de serem reconhecidas como
entidade familiar.
Com isso, o STF julgou de forma unânime a procedência da ADPF 132/2008
(Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) e ADI 4.277/2009 (Ação Direta
de Inconstitucionalidade) que reconhece a união homoafetiva como entidade
familiar, sendo seus direitos e deveres iguais ao regimento da união estável,
descrito no artigo 1.723 do Código Civil.
Conforme entendimento dos tribunais:
O reconhecimento da união homoafetiva no ordenamento jurídico brasileiro
foi matéria debatida e questionada durante largo prazo de tempo, gerando
grande instabilidade acerca do tema. A pacificação da matéria apenas se
deu com o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito
Fundamental nº 132 pelo STF, em 5 de maio de 2011. 2. Por se tratar de
verba de caráter alimentar, a pensão por morte somente será negada
quando houver elementos probatórios que indiquem a inexistência de
relação entre o de cujus e aquele que pleiteia o benefício decorrente de seu

34
ANGELUCI, Cleber Affonso; JUSTINA, Daiane Dela; NASCIMENTO, Rogério Dorneles do. A relação homoafetiva
e os princípios constitucionais: uma leitura a partir do julgamento da ADI nº 4277. Conselho da Justiça Federal –
Acervo, abril. 2014.
17

falecimento. Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os


Desembargadores da QUARTA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do
Espírito Santo, à unanimidade, REJEITAR a preliminar arguida, e, no
mérito, por igual votação, NEGAR PROVIMENTO ao recurso. Vitória (ES),
04 de novembro de 2013. Desembargador SAMUEL MEIRA BRASIL JR.
Presidente e Relator.35

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE


RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA. HARMONIA
ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ.
REEXAME DE FATOS E PROVAS. INADMISSIBILIDADE. 1- O acórdão
recorrido que adota a orientação firmada pela jurisprudência do STJ não
merece reforma. 2- O reexame de fatos e provas em recurso especial é
inadmissível. 3- Agravo não provido36.
Sendo assim, não há discussão do reconhecimento da união homoafetiva, e
com esse avanço, há projetos de lei como a Proposta de Emenda Constitucional e
do Anteprojeto do Estatuto da Diversidade Sexual, que buscam a admissibilidade do
casamento homossexual.
Entretanto, está em vigor a Resolução 175/2013 do Conselho Nacional da
Justiça (CNJ), que regulamenta o casamento civil entre homossexuais.
Antes da Resolução CNJ 175/2013 era necessário um pedido na justiça para
reconhecer o casamento, agora, pode ser realizado diretamente no Cartório. Caso
algum cartório não aplique as regras da Resolução do CNJ, os casais podem levar
o caso ao conhecimento do juiz corregedor competente para que ele determine o
cumprimento da medida. Também pode ser aberto processo administrativo contra a
autoridade que se negar a celebrar ou converter a união estável homoafetiva em
casamento37.
No primeiro ano em vigor, a norma viabilizou 3.700 casamentos em todo o
país. Os números foram aumentando: em 2015, foram realizados 5.614 casamentos

35
(TJ-ES - AI: 00222319620138080024, Relator: SAMUEL MEIRA BRASIL JUNIOR, Data de Julgamento:
04/11/2013, QUARTA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 13/11/2013).
36
(STJ - AgRg no REsp: 1349791 RS 2011/0275552-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento:
19/11/2013, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/11/2013).
37
BANDEIRA, Regina. Casamento homoafetivo: norma completa quatro anos. Disponível em: <
http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/84740-lei-sobre-casamento-entre-pessoas-do-mesmo-sexo-completa-4-
anos>. Acesso em: 16 de setembro de 2018.
18

- um acréscimo de 52%38. Em cinco anos, foram registrados 19.5 mil casamentos


homoafetivos39.

3.3 Adoção homoparental individual


Embora o ordenamento jurídico esteja avançando nos direitos fundamentais
dos casais homossexuais, o preconceito existente é genuinamente grande, 51% dos
paulistanos já foram ou viram outra pessoa sendo vítima de preconceito de gênero
ou orientação sexual em espaços públicos40.
Assim, faz com que somente uma pessoa da relação entre com o pedido de
adoção, sendo regulamentado pelo artigo 42 do ECA, a adoção unilateral, não
existindo mais a necessidade de omitir sua orientação sexual.
Porém, mesmo que seja um caminho mais fácil a seguir, não é o melhor pra
a criança, pois seu companheiro não terá qualquer vinculo jurídico com o menor,
conforme Maria Berenice Dias41:
Ocorre que a adoção ter se dado por um dos parceiros acarretara prejuízo
para a criança ou adolescente, pois com a morte do adotante ou separação
judicial do casal o infante só poderá pleitear seus direitos com relação
aquele que o adotou. O companheiro (a) do adotante não possui nenhum
tipo de responsabilidade nem tem resguardo o direito de visitas, porque não
existe vinculo jurídico entre ele e o adotado.

3.4 Adoção homoparental conjunta


Os requerimentos de adoção conjunta são assegurados pelos princípios do
ordenamento jurídico, conforme os artigos 42, § 2º do ECA e 1.622 do CC/02 é
necessário a comprovação da união estável e que sejam apresentadas as
vantagens para o adotando.
Não há qualquer impedimento expresso na lei que não seja possível essa
adoção, desde que ofereça um ambiente familiar equilibrado, tenha uma relação
estável e forem resguardados os interesses do menor.

38
Idem ³¹.
39
ConJur. Disponivel em: <http://www.diarioonline.com.br/noticias/brasil/noticia-508793-brasil-comemora-
195-mil-casamentos-homoafetivos-em-cinco-anos.html?v=56>. Acesso em 20 de setembro de 2018.
40
SANTIAGO, Tatiana. Público LGBT sofre mais preconceito em espaços públicos e no transporte em SP.
Disponível em: <https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/publico-lgbt-sofre-mais-preconceito-em-espacos-
publicos-e-no-transporte-em-sp-diz-rede-nossa-sp.ghtml>. Acesso em: 20 de setembro de 2018.
41
DIAS, Maria Berenice. União homossexual: o preconceito & a justiça. 9ª ed., Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2010, pg. 33/34.
19

Para que isso seja comprovado, se faz necessário uma equipe


multidisciplinar, que irá auxiliar o juiz na melhor opção para a criança ou
adolescente, nesse sentido, Silva Júnior42 diz:
Tais estudos da equipe multiprofissional, extremamente importantes
para a formação do convencimento do(a) magistrado(a), têm revelado
que a orientação sexual dos requerentes não é um elemento que, por si
mesmo inabilite uma pessoa ou um casal para o responsável
exercício das funções familiares ou para a educação de seres
humanos.
Sendo assim, o posicionamento do Judiciário se encontra a favor da adoção
por casais homoafetivos.
Conforme os tribunais, a questão diz respeito à possibilidade de adoção de
crianças por parte de requerente que vive em união homoafetiva com companheira
que antes já adotara os mesmos filhos, circunstância a particularizar o caso em
julgamento. Em um mundo pós-moderno de velocidade instantânea da informação,
sem fronteiras ou barreiras, sobretudo as culturais e as relativas aos costumes,
onde a sociedade transforma-se velozmente, a interpretação da lei deve levar em
conta, sempre que possível, os postulados maiores do direito universal. Mister
observar a imprescindibilidade da prevalência dos interesses dos menores sobre
quaisquer outros, até porque está em jogo o próprio direito de filiação, do qual
decorrem as mais diversas consequências que refletem por toda a vida de qualquer
indivíduo.
A matéria relativa à possibilidade de adoção de menores por casais
homossexuais vincula-se obrigatoriamente à necessidade de verificar qual é a
melhor solução a ser dada para a proteção dos direitos das crianças, pois são
questões indissociáveis entre si.
Os diversos e respeitados estudos especializados sobre o tema, fundada em
fortes bases científicas dizem que "não indicam qualquer inconveniente em que
crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do
vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga
a seus cuidadores". A adoção, antes de mais nada, representa um ato de amor,

42
SILVA JÚNIOR, Enézio de Deus. A possibilidade Jurídica de adoção por casais homossexuais. 5. ed. rev. e
atual. Curitiba: Juruá, 2011, pg. 122.
20

desprendimento. Quando efetivada com o objetivo de atender aos interesses do


menor, é um gesto de humanidade43.
A vara da infância e juventude entende que determinada situação é possível
ao extrato heterossexual da população brasileira, também o é à fração
homossexual, assexual ou transexual e todos os demais grupos representativos de
minorias de qualquer natureza que são abraçados, em igualdade de condições,
pelos mesmos direitos e se submetem, de igual forma, às restrições ou exigências
da mesma lei, que deve, em homenagem ao princípio da igualdade, resguardar-se
de quaisquer conteúdos discriminatórios44.
Na visão moderna, não há mais espaço para se conceberem argumentos
impeditivos de adoção de crianças e adolescentes por casais homoafetivos. Tanto
estes como os casais heterossexuais deverão comprovar, no mínimo, no interesse
maior de crianças e adolescentes, suas aptidões para o exercício responsável da
paternidade e maternidade. No âmbito do Direito da Infância e Juventude, há que se
ter muita cautela na Infância e Juventude, há que se ter muita cautela para não se
afrontar o princípio da dignidade humana, quer de crianças e adolescentes, quer de
pretendentes a guarda ou adoção. Ambos merecem absoluta e inarredável
proteção45.
Atualmente está em trâmite o PL 2.153/2011 que objetiva a alteração do art.
42, §2.º, da Lei 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente) para permitir a
adoção de crianças e adolescente por casais homoafetivos. A justificativa do PL
destaca que deve ser dada maior importância ao interesse do infante do que ao
preconceito da sociedade46.

4 – Ordenamento jurídico brasileiro


4.1 – Evolução histórica da adoção homoafetiva.

43
(STJ - REsp: 889852 RS 2006/0209137-4, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento:
27/04/2010, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/08/2010).
44
(STJ, REsp 1281093/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, j. 18/12/2012).
45
(TJ-SC - AC: 00025831120178240036 Jaraguá do Sul 0002583-11.2017.8.24.0036, Relator: Marcus Tulio
Sartorato, Data de Julgamento: 13/03/2018, Terceira Câmara de Direito Civil).
46
MAIA, Hérika Juliana Linhares; CAVALCANTI JÚNIOR ; Wellington Alves; MELO, Felipe Victor Carvalho César e;
CASTRO, Izamara Dayse Cavalcante de; COSTA, Jamilly Steffane Liberato da. Adoção homoparental conjunta:
familias socioafetivas e a concretização do melhor interesse da criança e do adolescente. Revista dos Tribunais,
RT, v. 957. Julho, 2015.
SILVA, Elaine Cristina de Aquino. União de homossexuais e a adoção. UNIPAC, P. 25, 2011.
21

A primeira adoção individual por homossexuais ocorreu por volta de 199047, à


lei permitia a adoção de pessoas solteiras e era comprovado que não traria
qualquer prejuízo para o menor.
Somente após 10 anos da Constituição Federal de 1988 que houve um
avanço no reconhecimento dos direitos homoafetivos em relação à adoção, sendo
que, atualmente, o fundamento jurídico utilizado pelos tribunais seja um dispositivo
da Constituição.
Em 1998, no Rio de Janeiro, o Desembargador da 2ª Câmara Civil do
Tribunal de Justiça48 julgou:
ADOÇÃO. PÁTRIO PODER. DESTITUIÇÃO. HOMOSSEXUALISMO.
PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. SENTENÇA CONFIRMADA. ADOÇÃO
CUMULADA COM DESTITUIÇÃO DO PÁTRIO PODER. ALEGAÇÃO DE
SER HOMOSSEXUAL O ADOTANTE. DEFERIMENTO DO PEDIDO.
Recurso do Ministério Público. 1. Havendo os pareceres de apoio
(psicológico e de estudos sociais) considerado que o adotado, agora com
dez anos sente agora orgulho de ter um pai e uma família, já que
abandonado pelos genitores com um ano de idade, atende a adoção aos
objetivos preconizados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e
desejados por toda a sociedade. 2. Sendo o adotante professor de ciências
de colégios religiosos, cujos padrões de conduta são rigidamente
observados, e inexistindo óbice outro, também é a adoção, a ele entregue,
fator de formação moral, cultural e espiritual do adotado. 3. A afirmação de
homossexualidade do adotante, preferência individual constitucionalmente
garantida, não pode servir de empecilho à adoção de menor, se não
demonstrada ou provada qualquer manifestação ofensiva ao decoro e
capaz de deformar o caráter do adotado, por mestre a cuja atuação é
entregue a formação moral e cultural de muitos outros jovens. Apelo
improvido.
Em 1999 houve a primeira decisão em São Paulo49:
ADOÇÃO. PEDIDO EFETUADO POR PESSOA SOLTEIRA COM A
CONCORDÂNCIA DA MÃE NATURAL. POSSIBILIDADE. Hipótese onde os
relatórios social e psicológico comprovam condições morais e materiais da
requerente para assumir o mister, a despeito de ser homossexual.
Circunstância que, por si só, não impede a adoção que, no caso presente,

47
ALDROVANDI, Andrea; BRAUNER, Maria Claudia Crespo. Adoção no Brasil: aspectos evolutivos do instituto no
direito de família. Juris – Revista da Faculdade de Direito. Vol. 15, 2010.
48
(TJRJ, AC 14332/1998, 9ª C. Cív., Rel. Des. Jorge Magalhães, j. 23/03/1999).
49
(TJSP, AC 51.111-0, Rel. Des. Oetterer Guedes, j. 11/11/1999).
22

constitui medida que atende aos superiores interesses da criança, que já se


encontra sob os cuidados da adotante. Recurso não provido.
Em 2006, no Rio Grande do Sul ocorreu a primeira decisão em 1º grau que
deferiu o pedido de adoção para um casal homossexual, formados por duas
mulheres50.
APELAÇÃO CÍVEL. ADOÇÃO. CASAL FORMADO POR DUAS PESSOAS
DE MESMO SEXO. POSSIBILIDADE. Reconhecida como entidade familiar,
merecedora da proteção estatal, a união formada por pessoas do mesmo
sexo, com características de duração, publicidade, continuidade e intenção
de constituir família, decorrência inafastável é a possibilidade de que seus
componentes possam adotar. Os estudos especializados não apontam
qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais
homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que
permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga aos seus
cuidadores. É hora de abandonar de vez preconceitos e atitudes hipócritas
desprovidas de base científica, adotando-se uma postura de firme defesa da
absoluta prioridade que constitucionalmente é assegurada aos direitos das
crianças e dos adolescentes (art. 227 da Constituição Federal). Caso em
que o laudo especializado comprova o saudável vínculo existente entre as
crianças e as adotantes. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME.
(SEGREDO DE JUSTIÇA)51.
Somente em 2015 o Supremo Tribunal Federal se mostrou favorável à
adoção por homossexuais, a ministra Carmem Lúcia negou provimento ao recurso
do Ministério Público do Paraná, autorizando a decisão em favor do casal.
A decisão foi fundamentada no entendimento do reconhecimento da união
estável em 2011, e ainda, justifica52:
O conceito contrário implicaria forçar o nosso Magno Texto a incorrer, ele
mesmo, em discurso indisfarçavelmente preconceituoso ou homofóbico. A
isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos somente ganha
plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de
uma autonomizada família”.
Porém, ainda a casos que são julgados improcedentes, mesmo nos dias
atuais, em 2013, no Rio Grande do Sul, foi negada a adoção homoafetiva.

50
ALDROVANDI, Andrea; BRAUNER, Maria Claudia Crespo. Adoção no Brasil: aspectos evolutivos do instituto no
direito de família. Juris – Revista da Faculdade de Direito. Vol. 15, 2010.
51
(Apelação Cível Nº 70013801592, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil
Santos, Julgado em 05/04/2006).
52
(STF, AC 000767462201240583000. Rel. Des. Carmem Lúcia, j. 05/03/2015).
23

APELAÇÃO CÍVEL. ECA. HABILITAÇÃO PARA ADOÇÃO. CONCLUSÃO


DO ESTUDO PSICOSSOCIAL, ELABORADO POR EQUIPE
INTERPROFISSIONAL, QUE CONTRAINDICA A HABILITAÇÃO DO
CASAL PARA A ADOÇÃO. INDEFERIMENTO DA HABILITAÇÃO.
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. Para que se defira a habilitação para a
adoção, é necessário perquirir a adequação e capacidade dos postulantes
para o exercício da função parental, através da realização de estudo
psicossocial, porquanto imperiosa a observância dos superiores interesses
da criança, segundo a doutrina da proteção integral preconizada pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente. . Tendo em vista que o parecer da
equipe interprofissional foi pela contraindicação da habilitação do casal para
a adoção, não restando atendidos os requisitos objetivos (sociais) e
subjetivos (psicológicos) para tanto, correta a sentença que indeferiu a
habilitação. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (SEGREDO DE
JUSTIÇA) (Apelação Cível Nº 70055454359, Oitava Câmara Cível, Tribunal
de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em
17/10/2013).53

4.4 - Omissão legislativa e as decisões judiciais.


Os pares homossexuais para terem seus direitos adquiridos precisam
recorrer ao Poder Judiciário, visto que as leis não os inclui expressamente. A lei é
omissa e discriminatória, sendo que uma mesma regra não se aplica a todos.
Neste sentido, Maria Berenice Dias54 discorre:
O legislador se acovarda na hora de assegurar direitos à minoria alvo de
tanta discriminação. Esconde-se em motivos de natureza religiosa, mas
certamente se omite por temor de ser rotulado de homossexual, ou, quem
sabe, por medo de comprometer sua reeleição. Mas ninguém pode ficar à
mercê de um Poder Legislativo inerte e preconceituoso que se nega a
cumprir o seu mister: editar leis que deem efetividade aos comandos
constitucionais”.
Hodiernamente, o Judiciário vem tentando preencher essas falhas na
legislação, porém, isto não substitui legislar sobre o tema, gerando com isso, uma
inclusão social.
Maria Berenice Dias55 explica:

53
(TJ-RS – AC 70055454359 RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Data de Julgamento: 17/10/2013, Oitava
Câmara Cível. Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 21/10/2013).
54
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 9. ed. São Paulo, SP: Revista Tribunais, 2013, p. 197.
55
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 9. ed. São Paulo, SP: Revista Tribunais, 2013, p. 197.
24

Claro que a omissão da lei dificulta o reconhecimento de direitos, sobretudo


frente a situações que se afastam de determinados estereótipos
convencionais, o que só faz crescer a responsabilidade do Poder Judiciário.
Igualmente, não cabe invocar o silêncio da lei para negar direitos àqueles
que vivem fora do modelo imposto por uma moral conservadora, mas que
não agridem a ordem social”.
A omissão legislativa não pode negar os direitos aos que não fazem parte do
molde tradicional imposto pela sociedade, Maria Berenice Dias56 diz:
[...] A simples ausência de dispositivo legal reconhecendo o direito
postulado não significa que o pedido seja impossível. A lacuna da lei não
permite tal conclusão, eis que é expresso o dever do juiz de julgar. Tanto a
Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, como o Código de
Processo Civil impõem ao juiz a obrigação de decidir mesmo inexistindo a
lei. A doutrina é pacifica neste sentido.
A falta de legislação faz com que ocorra um grande acumulo de processos,
fazendo com que sejam mais longos que o necessário. Porém, apesar da
superlotação, o Judiciário tem se mostrado favorável ao reconhecer os direitos dos
casais homossexuais, mesmo que não estejam expressos no texto constitucional.
Maria Berenice Dias57 alega que:
Foi a Constituição que elegeu o afeto como elemento constitutivo da união
estável. Com isso, passou-se a identificar a família pela presença de um
vínculo de afetividade”, deixando de lado as questões sociais de falso
moralismo para abrir espaço às famílias ligadas pelo sentimento mútuo, e
não pelo dever de cumprir a norma socia”.
Com a omissão legislativa, o julgamento está sendo realizado com
base no artigo 226 da Constituição Federal, que versa sobre família, estando ela
sobre proteção do Estado.
É com este argumento que os juízes e desembargadores estão
proferindo sentenças favoráveis aos casais homoafetivos, analisando o dispositivo
constitucional de forma mais ampla, para que seja garantido os direitos de todos,
sem exceção.
Sendo assim, se os pares homoafetivos preencherem os requisitos
para a adoção, é perfeitamente possível o deferimento de seu pedido.
Conforme falado:

56
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 9. ed. São Paulo, SP: Revista Tribunais, 2013, p. 141.
57
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 9. ed. São Paulo, SP: Revista Tribunais, 2013, p. 144.
25

APELAÇÃO CÍVEL. HABILITAÇÃO PARA ADOÇÃO. CASAL


HOMOAFETIVO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA AFASTADA.
POSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO DE UNIÕES HOMOAFETIVAS
COMO ENTIDADES FAMILIARES. AUSÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL.
ATRIBUIÇÃO POR ANALOGIA DE NORMATIVIDADE SEMELHANTE À
UNIÃO ESTÁVEL PREVISTA NA CF/88 E NO CC/02. HABILITAÇÃO EM
CONJUNTO DE CASAL HOMOAFETIVO. POSSIBILIDADE, DESDE QUE
ATENDIDOS AOS DEMAIS REQUISITOS PREVISTOS EM LEI.
IMPOSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO DE IDADE E SEXO DO ADOTANDO.
AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. NÃO-DEMONSTRAÇÃO DE
PREJUÍZO. MELHOR INTERESSE DO ADOTANDO QUE DEVE SER
ANALISADO DURANTE O ESTÁGIO DE CONVIVÊNCIA NO PROCESSO
DE ADOÇÃO, E NÃO NA HABILITAÇÃO DOS PRETENDENTES.
APELAÇÃO PROVIDA. RECURSO ADESIVO PREJUDICADO.58
Percebe-se que as jurisprudências estão tentando se adequar e
reconhecer os direitos dos casais homossexuais, entretanto, não justifica a omissão
legislativa com eles, visto que, perante a lei, somos todos iguais.

5 – Considerações Finais
Com este trabalho foram demonstradas as possibilidades jurídicas de adoção
por casais homoafetivos, evidenciando essas relações como entidade familiar
baseadas no afeto.
Ao passar do tempo o conceito de família foi se modificando conforme os
avanços da sociedade. O presente trabalho expôs o conceito histórico e princípios
constitucionais de família, adoção e homossexualidade, bem como, o necessário
para ser considerado uma entidade familiar, não sendo mais somente a ligação
sanguínea, e sim, a afetiva.
A adoção homoafetiva vem sendo notória nos tribunais, principalmente após
o Supremo Tribunal Federal se manifestar favoravelmente à adoção visando
somente o melhor interesse da criança ou adolescente, em vez da orientação
sexual do adotando. Justificando no embasamento ao princípio da dignidade da
pessoa humana, da afetividade, da liberdade de expressão e da igualdade.

58
(TJ-PR - AC: 5824999 PR 0582499-9, Relator: Mendonça de Anunciação, Data de Julgamento: 17/03/2010,
11ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 409).
26

Entretanto, mesmo com os avanças jurídicos, a falta de legislação especifica


gera uma grande insegurança, a lei não proíbe a adoção por pares homoafetivos,
mas também, não regulamenta.
A necessidade de lei que regulamente os direitos desses casais é
assombrosa, o reconhecimento do Supremo Tribuna Federal traz uma esperança de
que essa entidade familiar ganhe sua legislação especifica, sem qualquer descaso
ou discriminação.

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