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APRESENTAÇÃO – AULA CONSCIENTIZAÇÃO

Tópicos de interesse:

- Retomar um pouco dos conceitos já trabalhados em aula;


- Diferenciações importantes;
- Breve caracterização sobre o autor e o contexto de sua obra;
- Relação entre Paulo Freire e o Martín-Baró;
- Tema da aula: conscientização.

- Retomar um pouco dos conceitos já trabalhados em aula

- Alienação => conscientização (decodificação); fatalismo (naturalização das


relações).
- Fatalismo não é ausência de consciência => pode ser ausência da conscientização.
- Reivindicar uma análise e compreensão dialética dos fenômenos;
- Sob o risco de numa leitura mais mecanicista, não fazer e cair numa compreensão
acrítica, adialética, absoluta do fatalismo ou conscientização. Ninguém é 100%, de
todo alienado fatalista ou com consciência crítica.
- Dialética => unidade de contrários; método da Psi Social Crítica;
- Momento predominante => há momentos em que um elemento predomina mais
sobre o outro; podem co-existir contraditoriamente num mesmo indivíduo; dialética
não é 50% a 50%. Então eu, um sujeito que digo que sou crítico, que observo as
relações de poder na sociedade, posso também naturalizar realidades, valores
impostos => daí a complexidade que existe nessa análise.
- Para entender o fatalismo [e a conscientização] é necessário entender o
funcionamento da sociedade, sua estrutura, os processos de socialização.
[Instituições socializadoras: família, igreja, escola => mediação das estruturas com o
indivíduo].
- Fatalismo pode envolver: aceitação; atividade/ação; adaptação [causa menos
desgaste emocional];
- Fatalismo tem dimensão psicológica, mas sua origem não é no indivíduo.
- Fatalismo causa danos psicossociais: depressão da autoimagem; ataca o passado
e o futuro.
- Fatalismo [e vamos ver que a conscientização também] é uma manifestação de
consciência política => conceito importante para nós, é o de práxis política – uma ação
consciente com vistas à transformação ou manutenção de um dado direcionamento
societário, papeis sociais, por exemplo.
- No fatalismo => tendo a naturalização da realidade; manutenção de certos papeis
sociais;
- Na conscientização => tendo a decodificar relações de poder; transformar, romper
papeis sociais.

- Diferenciações importantes

Consciência enquanto uma função psicológica:


- Vigotski estuda as funções psicológicas: elementares [origem biológica, presentes
nos animais, ações involuntárias – reflexos, etc => memória natural, reações
automáticas, reflexos] e superiores [funções psicológicas elementares + aprendizado
da cultura; origem social; somente no ser humano; caracterizadas por uma mediação
somiótica => consciência, pensamento, fala, memória, percepção];
- Neuropsicologia: o estado de estar desperto, vígil, acordado, lúcido;
- Psicologia: soma total das experiências conscientes de um indivíduo em
determinado momento;
- Consciência na acepção marxista => não é só ter mais ou menos conhecimento
sobre um aspecto da realidade, ou um objeto, e o poder de interferência sobre o real.
Isso implica níveis dependendo do grau de conhecimento sobre um objeto e a
totalidade me que está inserido;
Ex: o celular que o professor falou nas aulas. Consciência é práxis.
- Consciência de classe => quanto mais conhecimento teórico sobre a realidade de
classes, e a aplicação prática do conhecimento na realidade da classe trabalhadora,
para superar o capitalismo, tem graus mais elevados de consciência de classe.
- Consciência de classe possui um elemento central que é a práxis política [a unidade
dialética entre teoria e prática] => práxis política [transformação de um
direcionamento societário, romper papeis sociais por exemplo, ou como manutenção,
manter certos papeis sociais, status quo].
- Práxis se manifesta em três níveis de realidade: singular [indivíduo], particular
[grupos sociais] e universal [estrutura social].
- Luckács: distingue consciência psicológica da consciência de classe como classe.
Consciência psicológica: manifesta naquilo que o trabalhador pensa e sente
individualmente no plano singular ou particular. Todas as experiências do indivíduo.
Remete às experiências específicas e ao modo de vida, o que pode ou não coincidir,
em um dado momento histórico, com um projeto de emancipação da classe
Consciência de classe como classe: é produto de uma condição universal posta
pelo capital ao conjunto da classe trabalhadora – a exploração do trabalho material ou
abstrato. Ela ganha materialidade no campo da universalidade.
- Seria uma condição de classe em si que pode se manifestar como uma classe para
si, de acordo com as condições históricas, fator subjetivo [apesar deste não ser
fundante]. => Elemento da processualidade histórica.
- A realidade existe, independente de eu ter consciência dela ou não => mas eu posso
muda-la, posso transformá-la.
- O que vem antes da consciência é algo que existe independente dela [classe em si].
O para si é o resultado da ação consciente. Eu trabalhador de uma indústria em
péssimas condições etc, em dado momento, a partir das condições históricas, tomo
consciência da minha condição => produzo e não me aproprio dos bens produzidos;
- Em que nos ajuda essa diferença entre consciência psicológica e consciência de
classe:
(a) refuta a tese da homogeneidade psicológica da classe;
(b) subjetividade não se subordina a questão universal da condição de classe;
(c) diferencia a natureza dos dois processos e distingue a dimensão do singular,
particular e universal na política.
- Nesse ponto que a gente vai passar para o conceito de conscientização, nos moldes
como é usado na Psicologia Social. Seguimos na perspectiva de Paulo Freire, e esse
termo foi adotado por Martín-Baró.
- A diferença entre a consciência de classe como classe e a conscientização, é que os
processos de conscientização, a leitura crítica da realidade, podem se manifestar na
dimensão do singular e particular. É o psicossocial => encontro, por exemplo, da
consciência psicológica com a consciência política, de classe.

- Breve caracterização sobre o autor e o contexto de sua obra

- Paulo Freire, pernambucano, de Recife, viveu até 97;


- Ficou conhecido pelo método inovador de alfabetização; => experiência de Angicos
no RN é a mais famosa [ensinou 300 adultos a ler e escrever em 45 dias]
- Princípios para educação: dialogicidade, organicidade da educação [contexto
histórico-social], práxis-reflexiva [ação-reflexão-ação], a criticidade [consciência
crítica], papel ativo de educandos e educadores no processo de educação, críticas à
educação bancária e suas consequências, por estar descolada da realidade concreta
e histórica dos educandos.
- Foi perseguido durante a ditadura, ficou preso por 70 dias, exilado por 16 anos,
considerado um traidor;
- Possui uma extensa obra, muitas publicações, uma importância internacional =>
retornou ao Brasil na década de 1980; foi secretário de educação de São Paulo.
- Pensador e educador da libertação => educação centrada na relação entre a
conscientização e a libertação dos oprimidos [opressão das classes muito ricas sobre
as muito pobres];
- Educação como um processo político e pedagógico => formação da consciência dos
oprimidos sobre sua própria realidade;
- Por meio da educação e a consequente politização as pessoas conheceriam o
contexto histórico das questões que as afetam diretamente, ao mesmo tempo que
formulariam respostas políticas para suas próprias indagações.
- Faz análises da realidade brasileira, realidade marcada pelas desigualdades sociais
=> analfabetismo como resultado da privação do direito à educação e também da
distância socialmente construída entre a escola e as classes populares.
- Esse livro é uma coletânea que contém textos breves do Freire, produzidos entre
1968 e 1974; aborda aspectos diferentes da realidade brasileira, como educação,
reforma agrária. Inclusive, quem não teve a oportunidade de ler, é uma ótima sugestão
de leitura.

- Relação entre Paulo Freire e o Martín-Baró


- Martim-Baró foi um leitor de Paulo Freire, cita algumas de suas obras em vários
textos; Na aula do dia 17, vai ser possível perceber isso no texto O papel do psicólogo.
- Ambos propõem uma práxis transformadora [libertação de quê?]; partem de uma
leitura teórica, na academicista, do contexto latino-americano: capital dependente,
ditaduras, autoritarismos, opressões de classe.
- Tema da aula: conscientização

- O ponto de partida do Freire para compreender a conscientização, é o entendimento


que somos seres no mundo e com o mundo. Uma condição básica para a
conscientização é que o agente seja um sujeito, um ser consciente.
- Conscientização, como veremos, é exclusivamente humano. => Só nós podemos
fazer transformações no mundo, captar a realidade, expressar essa realidade por
meio da linguagem. Podemos objetivar o mundo, e nesse momento estamos com o
mundo => implica tomar distância do mundo.
- Isso é o que nos difere dos animais. Eles apenas estão no mundo, são incapazes de
qualquer tipo de objetivação; apenas vivem sem reflexão; são incapazes de se
perceberem vivendo no mundo; são acrtíticos; vivem no nível da imersão, são
atemporais.
- Temos, então, o domínio da existência => domínio do trabalho, da cultura, da história,
dos valores => domínio em que experimentamos a dialética entre determinação e
liberdade.
- Consciência de e ação sobre são inseparáveis constituintes do ato transformador
pelo qual nos fazemos seres de relação.
- Prática consciente envolve: [a] reflexão, [b] intencionalidade, [c] temporalidade; [d]
transcendência; [e] criticidade] => o pior mestre de obras é superior à melhor abelha,
e é o fato de que, antes de executar a construção, ele a projeta em seu cérebro.
(Marx).
- Somos seres da práxis => nas nossas relações com o mundo se dão em um espaço
físico, histórico e cultural => o aqui e o ali envolvem sempre um agora, um antes e um
depois.
- Na medida em que vamos atuando sobre a realidade, transformamos ela com o
nosso trabalho, Paulo Freire fala que nossa consciência é condicionada e expressa
essa condicionada em níveis.
- Ele faz uma ressalva que propor níveis de consciência não é absolutizar a
consciência, a superestrutura ou infraestrutura => mas é uma compreensão dos níveis
de consciência na relação dialética com as condições materiais da sociedade. É
relativizar.
- Tem autores, como Goís, que falam em tipos, porque dá uma noção menos linear e
mais transitiva do processo. Segui níveis como está na obra, mas vocês podem
encontrar tipos de consciência.
- Para ele existem, basicamente, três tipos de sociedades e em cada uma um tipo de
consciência:
[a] sociedades fechadas => consciência semi-intransitiva;
[b] sociedades em transição => consciência transitiva ingênua;
[c] sociedades abertas => consciência transitiva crítica.

- Sociedades fechadas => consciência semi-intransitiva: Nessas sociedades


fechadas, que são sociedades dependentes, em que existe a cultura do silêncio
[representações, comportamentos, formas de ser, pensar e expressar => aquele que
fala, que impõe, e aquele que escuta, que segue], em que se encontram as formas
especiais de consciência dominada.
- Essa sociedade carrega a marca de uma elite cada vez mais rica em detrimento de
uma grande maioria cada vez mais pobre; maioria popular e suas demandas estão
subjugadas aos interesses alheios.
- Há uma quase aderência à realidade objetiva, quase imersão na realidade;
- A consciência dominada não toma suficiente distante da realidade, a fim de objetivá-
la e compreendê-la criticamente;
- Não consegue captar muitos dos desafios do contexto, ou vai percebê-los
distorcidamente;
- Tem o destaque os problemas vitais de existência, e a razão de ser encontrada fora
da realidade concreta => nessa quase imersão pode não haver a percepção estrutural.
Ex: imagem dos trabalhadores, na capina de uma roça/plantação, dois ou três com
suas enxadas, patrão próximo montado a cavalo.
- Explicação para os problemas se acha sempre fora da realidade, ora por desígnios
divinos, ora no destino, na inferioridade natural.
- A semi-intransitividade está associada ao fatalismo => ainda que ele não seja algo
exclusivo deste nível.
- Sociedades em transição => consciência transitiva ingênua: aquelas sociedades
em que começam a ter rachaduras, como impacto das transformações
infraestruturais. No Brasil, começa com a abolição da escravatura [trás uma certa
inversão de capital em indústrias], Primeira Guerra Mundial, Crise de 1929, Segunda
Guerra e vai até 1964 com o golpe.
- Com essas rachaduras, aquelas massas submersas e silenciosas começam a se
manifestar. Não é uma superação da cultura do silêncio, mas um momento novo.
- Se na fase anterior, esse silencia coincidia com a percepção fatalista que as massas
populares tinham da realidade, e em que as classes dominantes eram poucas vezes
questionadas, agora esse silêncio passa a ser percebido como o resultado de uma
realidade material que pode ser transformada => e não como algo inalterável, uma
sina, um destino fatal.
- É essa transição histórica, que tem uma ampliação da capacidade de percepção, e
não apenas o que antes não era percebido passa a ser, e outros entendimentos
diferentes se fazem presentes => tem-se assim uma nova consciência popular – a
transitivo ingênua.
- Caracteriza por um acirramento não muito profundo entre o velho e o novo; entram
aqui as posturas assistencialistas, por exemplo.
- Uma observação, não existem fronteiras rígidas entre as modalidades de
consciência. Lembrar da dialética, posso ter, em certos aspectos, a consciência semi-
transitiva na transitivo-ingênua.

- Sociedades abertas => consciência transitiva crítica: sociedades em que


prevalece o otimismo crítico e a esperança. Seria característica de regimes
democráticos, de um processo revolucionário, onde há interpretação dos problemas
em profundidade, demonstra apreço pela argumentação e diálogo, marcada pela
permeabilidade.
- Possuem uma relação mais direta entre elite e população em geral; o contexto é
levado em conta na efetivação das ações; há maior autoconfiança do seu povo e
fomento de espaços para uma participação pautada no diálogo
- A realidade anunciada como um projeto histórico a ser concretizado pelas classes
dominadas => onde a ação consciente não lhes pode ser negada.
- Máximo de consciência possível;
- A consciência crítica não se constitui através de um trabalho intelectual, mas na
práxis – ação e reflexão.
- Teria uma outra direção possível que se oferece à consciência ingênua: a
consciência fanatizada. Então, da consciência transitiva ingênua => poderia culminar
na consciência transitiva crítica [máximo de consciência possível] ou chegar à
transitividade fanática [seria sua distorção irracional e fanática]. Essa seria marcada
pela massificação, irracionalidade sectária e desumanização, quando a pessoa não
consegue ir da ingenuidade à criticidade.
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- A consciência é condicionada pela realidade;
- A conscientização é um esforço de analisar a prática que realizamos, percebemos
em termos críticos o próprio condicionamento a que estamos submetidos.
- Conscientização => ação e leitura crítica da realidade. O que é diferente da
consciência de classe => leitura conjuntural, analisar o fenômeno do ponto de vista de
como ele surge como um fenômeno de massas
- Posso ter uma leitura crítica da minha realidade, saber quais são as relações de
poder que existem, agir no sentido de romper e superar com essas relações; mas isso
não significa que eu ou o grupo estamos conscientes de que vamos tomar o poder,
revolucionar.
- Conscientização é tomar posse da realidade, é o olhar mais crítico possível da
realidade, que a desvela para conhecê-la e para conhecer os mitos que enganam e
que ajudam a manter a realidade da estrutura dominante.
- Essa definição extrapola uma dimensão apenas cognoscitiva [conhecer melhor a
realidade] trás uma concepção política, de transformação.
- Sufixo AÇÃO => compreensão lógica da realidade; ações concretas frente a ela.
- Processo de conscientização não é privilégio do Terceiro Mundo, pois é um
fenômeno humano.
- A conscientização não resume à decodificação das relações de poder. Este pode ser,
por exemplo, o primeiro passo. Mas é necessário agir sobre as decodificações das
relações de poder.
- Ninguém conscientiza ninguém: é através da experiencia quotidiana, com toda a
dramaticidade que ela implica, que as pessoas tomam consciência de sua condição
de oprimidos.
- A conscientização que ocorre como processo num dado momento deve continuar no
que se segue, em que a realidade transformada assume novo perfil.

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