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A INDIGESTÃO MENTAL:

UM COMPARATIVO DO PROCESSO DIGESTIVO.

O próprio título do texto já sugere o seu conteúdo, o prefixo IN no sentido de


negação/ausência, junto de DIGESTÃO, já demarcando um pouco do que se trata o texto.
Certo momento se compara a indigestão mental com o processo de digestão humano, o
alimento entra no corpo, no estômago, nesse momento ele está dentro, mas ainda não está na
corrente sanguínea, não foi digerido, depois de alguns processos – e por decorrência de
enzimas produzidas pelo pâncreas – nosso corpo vai digerir e trabalhar sobre esse alimento,
até que possamos fazer com que ele – seus nutrientes, no caso – entre na corrente sanguínea.
Com isso, do que se trata a indigestão? Os bebês pequenininhos possuem a
incapacidade de digerir carne de porco, por decorrência de ainda não terem algumas enzimas
responsáveis por essa digestão da carne suína, se tendo então, uma indigestão. A indigestão
entraria no mesmo esquema do comentado, onde o conteúdo – na alimentação, o alimento –
entra no corpo, já está dentro dele, mas não se consegue o digerir, o absorver; Por isso geraria
uma sintomática, no caso da criancinha – com menos de um ano de vida –, diarreia e/ou
vômito.
O texto até compara esse processo de digestão com um filme – e em outro momento,
compara até com uma peça teatral –, sendo um exemplo diferente do alimentício. Imagine que
você e mais uma amigo tenham ido assistir ao mesmo filme – imagine também o exemplo do
teatro –, no final você pergunta ao colega “o que achou do filme?”, sendo assim, o conteúdo
já “entrou” no corpo de seu amigo, já que já assistiu, seu amigo pode já ter digerido esse filme
e ter uma opinião a respeito dele, ou pode ainda o ter em seu duodeno, ainda não digerido e,
por isso não teria uma opinião a respeito. Com isso, questiona-se a respeito do que faz com
que esses conteúdos sejam absorvidos? Que enzimas que fazem isso? Na alimentação se sabe
qual enzima é responsável por digerir tal coisa, na psicanalise não se sabe sobre.
Quando se fala a respeito de terapia, ao que se remete à psicanálise – pelo menos, pelo
contexto do texto –, o paciente procura ajuda quando não está conseguindo digerir alguma
coisa, quando está com a indigestão, mas diferente do exemplo alimentício, uma indigestão
mental.
Bion acabou por usar de duas conceitualizações para de falar a respeito desse processo
de digestão e indigestão, no caso, mental. Todo o conteúdo pelo qual entramos em contato e
entram no nosso corpo – assimilar ao duodeno – foi chamado de elemento beta, na medida em
que se tem a digestão desse conteúdo, se diz que operou-se a função alfa – transformando esse
conteúdo, elemento beta, o digerindo, em elemento alfa.
Interessante a forma que no texto se compara o papel do terapeuta junto de seu
paciente, com o papel da mãe junto de seu filho; a mãe acaba por nomear o que o filho sente,
se o bebê chora a mãe pressupõe ser fome, se o bebê continua a chorar, pressupõe que pode
ser a fralda suja, que pode ser medo, a mãe vai servindo como uma função, a função alfa,
auxiliando – emprestando sua função alfa – o bebê a digerir o que sente – conforme o bebê for
se desenvolvendo, poderá saber e explicitar o que está sentindo, “ah, isso é fome... estou com
fome...”. Sendo assim, o elemento alfa é o conteúdo com representação mental, o elemento
beta seria o inominado, o ingerido. O terapeuta emprestaria, assim como no exemplo da mãe,
sua função alfa, ajudando o sujeito a nomear o que sente, o conteúdo indigerido, tornando-o
digerido e mentalmente representado.
Como no exemplo do bebê que somatiza vômito e/ou diarreia ao comer carne de
porco, se tratando de um conteúdo, uma experiência que não consegue digerir, nos outros
exemplos correspondentes isso também ocorre, como se sobrassem resquícios, fantasmas do
conteúdo indigerido – comenta-se sobre alucinações, quando o paciente relata estar sentindo
um cheiro estranho, sem relacionar esse cheiro a algo, sem o representar, o cheiro se trata de
uma alucinação –, toda a somatização, nesses casos, correspondem a uma falha da função
alfa, uma falha em digerir o conteúdo, em representá-lo.
Conforme o parágrafo anterior, os conteúdos que não foram digeridos permanecem,
como fantasmas, surgindo somaticamente, já os conteúdos que foram digeridos não
esquecidos; Se compara aqui novamente aos alimentos, o sujeito não se lembra do que
almoçou no domingo da semana anterior, mas certamente se lembra de quando comeu X
alimento e teve uma indigestão.
Diante desse processo de digestão e indigestão, alimentícia e mental, compara-se ao
contexto de terapia, no discurso livre o paciente pode apresentar distintos atos falhos – sendo
elemento beta –, o terapeuta precisa se atentar e dar continuidade ao ato falho, usando do
mesmo para ver se o paciente percebe seu ato falho e o representa – corrigindo-se,
transformando o elemento beta em alfa –, ou se simplesmente não o percebe – ou o nega –,
não se da conta de seu “equívoco”/ato falho, mantendo este conteúdo como elemento beta.
EXPERIENCIAS E APRENDIZADOS COM BION:
FICHAMENTO TEXTUAL E BIBLIOGRÁFICO

Partindo das inseguranças do psicoterapeuta – o autor do capitulo, Luiz Alberto Py –


diante de seus atendimentos, mesmo apoiando-se e sustentando-se na evolução do
pensamento freudiano acerca das neuroses e das psicoses, ainda com isso, sentia que esse
embasamento teórico se mostrava insuficiente diante da prática clinica. Mesmo diante da
proposta freudiana de tornar consciente o inconsciente, sentia-se perdido – comparando com
m jogo de tênis ou pingue-pongue –, já que não sabia ao certo o como perceber os conteúdos
inconscientes presentes na fala dos clientes.
Percebendo que o eixo do trabalho do psicoterapeuta psicanalítico corresponde a uma
analise da transferência, o conteúdo inconsciente que o terapeuta não saberia ao certo o como
o perceber, este acabaria sendo expresso por meio da transferência do paciente/cliente para
com o próprio terapeuta; De maneira mais lúdica, às impressões do cliente perante as pessoas
ao seu redor, por exemplo, a fala de o cliente se sentir incompreendido pela namorada, o
terapeuta interpretaria que o cliente estaria se sentindo incompreendido pelo próprio terapeuta
– o que era chamado de “transferência negativa”.
Um ponto crucial da psicoterapia, de acordo com o pensamento de Bion, seria o de o
terapeuta perceber os elementos que surgiam diante da própria relação terapeuta-cliente e,
exteriorizar ao cliente essas percepções. Importante salientar que o conteúdo observado diante
da transferência ocorrida na relação terapeuta-cliente não poderia ser “lido” na íntegra, fazia-
se preciso tentar compreender as motivações por trás da fala do cliente – o que os levou a
dizer/fazer aquilo?
Diante dos questionamentos descritos acima, o psicoterapeuta começou a questionar a
respeito da sua própria prática enquanto psicoterapeuta e, acabou por perceber que tanto si
próprio como seus clientes estavam simplesmente desempenhando papéis. Bion questionava a
respeito do autoritarismo que os analistas acabavam exercendo diante do seu papel de analise
de seus clientes, na medida em que eram vistos única e exclusivamente como os responsáveis
pelo trabalho da analise, de acessar os conteúdos inconscientes como se fossem “donos da
verdade”, com isso, Alberto Py mudou de postura de analise e, atribuiu esse papel também ao
próprio cliente, que estaria responsável por ouvir e averiguar se o trabalho do terapeuta estava
sendo considerado valido e, se teria sentido para si próprio.
“[...] Quando comecei a questionar a situação e a indagar a mim e a meus clientes o que
realmente ocorria na analise, ocorreu uma interessante transformação: eles passaram a
assumir a responsabilidade de separar o joio do trigo nas minhas palavras.”
(PY, p.57, 2009, grifo meu).

Antes disso, o que gerou os questionamentos de Bion a respeito do autoritarismo do


analista e da passividade do analisando, seria o fato de que o trabalho se atribuía ao papel do
analista, já que o analisando simplesmente ouvia passivamente as interpretações que o analista
fizera de sua fala e, esperava que com essas interpretações vocalizadas pelo analista,
servissem de remédio, fonte provedora de cura.
O terapeuta passara a fazer mudanças significativas dentro da dinâmica da terapia,
indo contra o autoritarismo do analista e a passividade do analisando, na medida em que,
mudando a formulação de suas frases, por exemplo, fazia com que o cliente pudesse participar
ativamente do seu próprio processo de analise, onde o cliente assumiria, também, o papel de
psicanalista, onde ao narrar um sonho, por exemplo, falaria também sobre suas próprias
interpretações a respeito deste – estimulado pelo psicoterapeuta a assumir seu papel de
analista –, sendo então, pessoas que estariam trocando ideias a respeito dos conteúdos que
passavam nas suas cabeças – no caso, do próprio cliente – com o papel de analisando e
analista.

“[...] Tomei para mim a ideia de que meu compromisso devia ser tentar me preparar
para ser uma pessoa mais bem capacitada para funcionar como analista, investindo no
“ser”, e não no “saber”.”
(PY, p.57, 2009).

Um ponto aprendido e relatado pelo autor Luiz Alberto Py, diante dos artigos escritos
por Bion na década de 50, seria o de dar atenção para os processos mentais do analista e não o
de estudo dos processos mentais do analisando. Com isso, o analista precisaria estar sempre
atento para não se deixar levar – conforme a tradição psicanalítica – ao desejo de cura e
compreensão do analisando.
Com isso, em concordância ao parágrafo e à citação acima, fazia-se importante
perceber que não era o acumulo intelectual – conceitual – do analista que se mostrava
importante para o trabalho de análise, mas o de ser uma pessoa sadia – física e mentalmente –,
na medida em que um ser humano – com sabedoria – teria maior chance de ser um bom
analista, quando comparado a um erudito – simplesmente dotado de saber.
O autor adentra comentando a respeito de tudo que aprendeu com Bion – quer em suas
leituras, quer nas conferências que Bion fez no Brasil –, onde dizia que só se tornaria possível
fazer psicanalise, no sentido de prática, quando se busca aprender o que ainda não se sabe e,
diante disso, de lidar com a tormenta enquanto essa durar, ser capaz de enfrentá-la até a
bonança – representaria a calmaria provinda ao se aprender e/ou descobrir algo que estava
desconhecido. Com isso, o fazer psicanalise não representaria simplesmente a encontrar
respostas ou interpretações, mas sim de dar a oportunidade para se descobrir tudo que pode
chegar a acontecer diante do encontro genuíno entre duas mentes humanas, salientando que
isso sim merece ser chamado de psicanálise. Após isso, o autor discorre páginas a fio a
respeito de sua experiência de ser analisando de Bion.
https://www.youtube.com/watch?v=j-DM6oa3wgY&feature=youtu.be
20/04
Clínica Psicanalítica I: Introdução de Bion

Preocupa-se mais com o uso das coisas, não propriamente a um conceito. É um autor
mais clínico do que teórico; Percebe-se isso pelo número de textos publicados, sendo
pouquíssimos (no máximo de 40 textos). Bion preocupa-se em não saturar demais uma
experiência, um conceito, afins, não tenta “fechar” nada, não tenta “diluir” demais as coisas.
(Saturação na química é quando um solvente dissolveu o máximo possível do soluto, o que
for acrescentado a mais de soluto não se dissolve).
Bion irá escrever e fazer “teorias” sobre elementos que acontecem dentro da clínica
(poucas vezes fala sobre algo fora da clínica, como infância, idade, afins, já que é algo
saturado, não permite uma abertura para a experiência do sujeito, seu modo singular, as
possíveis transformações, da forma que utiliza os elementos à sua disposição, afins). Então
busca abstrair os elementos que se encontra na clínica (não necessariamente padronizada,
individual, afins, pode ser grupal, por exemplo, se trata de uma situação de análise).
Bion busca diante da sessão de cada paciente, separar e categorizar os elementos beta,
elemento alfa, o que o paciente disse, a forma que usa dos elementos ao seu redor, afins. Feito
isso, observando vários casos, relatos e falas dos pacientes, faz um estudo metaclínico (que
vai além do que se pode observar na clínica), onde explica o como é uma sessão (com base no
seu entendimento diante das inúmeras sessões que teve com os pacientes), explica o
funcionamento de uma pessoa (de forma generalizada, mas também considera que cada um
dos sujeitos vai dar o seu toque, sua tonalidade pessoal para o elemento beta, função alfa,
continente, conteúdo, afins).
Acaba por criticar a forma que os psicanalistas categorizavam o paciente, o que
ocorria em sessão, onde rapidamente classificavam o que se estavam vivenciando, “isso é
transferência”, “isso é resistência”, afins... Bion questiona, “E o novo? Não existe mais nada
para se descobrir? Tudo que se tem para saber sobre o ser humano já foi descoberto?”. Com
isso, com essa preocupação da saturação da psicanálise, foi gradativamente adotando uma
linguagem mais aberta, acessível (tanto que suas obras finais são romances, onde se tinha a
teoria psicanalítica inserida entre os personagens, cada um com suas próprias
particularidades).
Chama-se de grade/grelha a forma que se esquematiza a sessão (após ela), os
elementos principais daquela sessão, o como esses elementos foram usados, a forma que o
paciente usou dos elementos da sessão, afins.
“Sonhei com minha mãe fugindo de casa” – é um elemento onírico (do sonho, não é
nem um elemento alfa e nem beta) –, a forma que o paciente usa desse relato em sessão é
importante, já que esse relato pode ser usado para buscar comoção/preocupação do terapeuta,
para “dar material” para o terapeuta trabalhar, realmente buscar entender o que se passa
consigo/com a mãe. Sendo assim, o terapeuta se atenta aos elementos e aos seus usos pelo
paciente.
A grade tenta esquematizar e “reproduzir” a sessão, mas apenas em partes, mutilada,
não corresponde a própria sessão de fato, já que o essencial de uma sessão é irreproduzível (o
que se percebe é o que se pode ser anotado, por exemplo, os demais conteúdos se perdem
nessa grade, que ao mesmo tempo que prende a sessão, deixa muito conteúdo vazar entre os
vãos).
Esquematizar a sessão é puramente romance, onde o terapeuta mostra o que foi feito
diante do que lhe vinha. Um psicanalista freudiano poderia ver Édipo em tudo, os
mecanismos de defesa, também; Uma psicanalista kleiniana poderia ver a agressividade,
inveja e voracidade; assim por diante com diversos teóricos e abordagens “fechadas”.
Novamente, conforme já foi dito, Bion questiona, “Mas é só isso? Tudo é isso? E o novo?”.
Os textos de Bion fomentam reflexões abstratas. Compara-se aos aforismas de
Nietzsche, onde diante das frases, parábolas, por mais que curtas, cada sujeito acabará
“tirando” um sentido daquilo. Reflexões ricas, inúmeras, mas nunca fechadas/finais.
Bion acaba sendo um teórico da curiosidade, no sentido de se opor à certeza e à
arrogância daquele que acha – acredita – que sabe. A arrogância “mata” o novo, já que está
restrita ao velho. Não permite “talvez...”, restringe-se a “tenho certeza de que...” (essa
perspectiva de “tenho certeza de que...” é muito comum com psicóticos).
Capacidade para o negativo se refere ao recuo filosófico, ao “não atropelamento”, a
“dar um passo atrás” para conseguir entender do que se trata. Positivo e negativo no sentido
de estudável, o negativo envolve o “não sei”, posição de insaturação, envolve se abrir a
possibilidade de adotar a posição daquele que não sabe, diferentemente do que outros
psicanalistas fazem, onde se colocam como dotador do conhecimento e automaticamente vão
“encaixando” conceitos; o positivo seria essa ideia de achar que sabe do que se trata, algo
saturado, já estudado, já dado. A capacidade para o negativo acaba sendo uma condição do
pensamento, já que é a incerteza que permite o pensar, já que quem aceita uma verdade como
já dita, não lidando com a incerteza, não pensa, apena reproduz o que já foi pensado.
Com isso, Bion acaba por defender a capacidade para o negativo, que seria a
capacidade de se manter na dúvida, na incerteza, na posição do que não sabe – posição
daquele que sabe é positivista –, na capacidade de destruir o significado de um signo e abri-lo
novamente para suas infinitas significações – pausar o que já é considerado como verdade
dada e se abrir para as demais possibilidades, uma redução fenomenológica. A ciência acaba
tendo o significado de verdade e, ao “abrir” isso, percebe-se que ciência é um método, o
método científico que é usado para explicar as coisas (lembrando que é muito útil para N
questões, mas não é universal, não se pode ser usada para explicar a tudo, como já dito
algumas vezes, a fé, o saber indígena, por exemplo).
Positivo seria então, aquilo que é estabelecido ou reconhecido como um fato, opõe-se
ao natural. Direito natural envolve o direito a liberdade, a propriedade, livre expressão, afins,
direitos que se têm simplesmente por existir, nasce-se com. Direito positivo seria o conjunto
de leis que criamos em um Estado, como o direito do consumidor, não é todos que possuem
esse direito – só o consumidor, no caso –, os sujeitos em situação de rua não possuem acesso
a esse direito, direito construído, antinatural. Assim pode-se dizer do direito tributário, direito
monetário.
Religião natural envolve o amor ao próximo, um aspecto e religiosidade, questões
comuns do que se espera e do que deveria ser religião. Religião positiva envolve, assim como
foi dito no direito, especificidades, onde se tem uma configuração do conceito religião, feito
pelo homem, interpretado e alterado pelo homem, como as Cruzadas que matavam – indo
contra a ideia da religião natural –, o acúmulo de capital e a compra de indulgências, afins,
questões envolvendo a religião que foram estruturadas pelo homem.
A primeira definição de positivo seria a dessa oposição ao natural. Já a outra definição
seria o que se é tido como fato – que foi obtido com um método positivo –, opondo-se à
fantasia, às crenças, afins, um fato positivo seria algo medido, comprovado cientificamente,
“é isso sim, pois eu medi e deu 12 cm, 150 g”.
*Não sei se entendi direito essa questão de positivo e negativo, no final o professor
resume o positivo em algo presente e observável, o negativo no contrário, na ausência.
Comenta o behaviorismo, onde o termo positivo influi em adicionar algo,
recompensa/aversivo, o negativo influi na retirada.
No positivismo, a ciência era romantizada e idealizada, onde somente a ciência
poderia estudar tudo que se existe. Questiona-se a respeito, a fé pode ser estudada pela
ciência? Todo o conhecimento provindo de outras fontes de conhecimento são descartáveis?
Bion diz que não, que não se deve descartar esses conteúdos, já que existem outros
mecanismos apropriados para o estudo do mundo, do que existe, não somente a ciência pode
explicar a tudo (volta na fé). Embora a ciência possa ser útil para estudar e explicar N coisas,
não pode ser usada para explicar e “olhar” tudo. Os sonhos e intuições, por exemplo,
transmitem um conhecimento, mas que não tem validade científica.
Bion diz que o pensar não se restringe a deduções lógicas, seguir raciocínios, o pensar
para Bion acaba envolvendo as possíveis interpretações que o sujeito possa vir a ter, de um
conteúdo aberto – sua escrita é aberta, não é fechada, não coloca pontos finais, mas vírgulas, o
leitor interpreta, conforme comparado com os aforismas de Nietzsche. O pensar é visto como
uma “arma” contra a megalomania – envolve fantasia de poder, daquele ser dotador do poder
e conhecimento, relevante e onipotente –, contra a arrogância e contra a identificação com
Deus; Essa convicção de certeza é uma característica de distintas neuroses – aquele que tem
certeza de que não vale nada, por exemplo – e psicoses – aquele que tem certeza de que está
sendo perseguido, por exemplo –, com isso, o pensar e mostra como “arma” contra o
patológico; Já que a certeza é típica do pensamento doentio.
https://youtu.be/uDetNoeWLs4
27/04
Clínica Psicanalítica I: Os elementos alfa e beta, assim como suas funções

Bion se interessa em estudar a formação do pensamento, pensamento enquanto


reflexão e interpretação e, para isso, divide a experiência em elementos, o elemento alfa e o
elemento beta.
Elemento beta é o conteúdo bruto, cru, da experiência, sendo assim, são os elementos
sensíveis da experiência e que não possuem representação mental. Conforme o texto
indigestão mental comentava, seria então o conteúdo ainda indigesto, que está dentro do corpo
mas não chegou a ser digerido pelo mesmo.
Já o elemento alfa, corresponde ao conteúdo, ao pensamento que já foi mentalmente
representado e, que por isso, pode ser usado para interpretações, formulação de ideias, afins.
Bion chama de alfabetização mental – no texto conhecido como função alfa – o
processo de transformação dos elementos beta em alfa (esse processo é o que o professor
chama de processo de simbolização? Acredito que não, mas que é um processo que utiliza da
simbolização para tal, não sendo a simbolização propriamente dita)
A psicose é um tipo de patologia onde o sofrimento ocorre por decorrência da falta de
simbolização. Simbolização é a transformação de algo em símbolo. Símbolo é uma alusão ao
objeto original, mas ao mesmo tempo não o é o original – exemplo, desenhar ou escrever
“cadeira” é um símbolo, mas não é a cadeira propriamente dita. Os psicóticos “falham” na
capacidade de simbolização e de comunicação dos símbolos – percebe-se isso pela fala
desconectada e dificuldade em usar uma linguagem comum. Os elementos, esses símbolos
invadem a mente do psicótico, de modo que o psicótico não tenha autonomia frente a isso e
nem capacidade de articular um símbolo com os outros.
Com psicóticos, não se da para fazer uma sessão de análise convencional, já que estão
desconectados com a realidade e, com isso, não se teria relações de transferência, perdendo-se
o principal da psicanálise, restringindo-se apenas a elementos mais sugestivos, intelectivos,
que não é propriamente psicanálise – já que o principal da psicanálise é o tratamento via
transferência, onde o terapeuta ocupa um lugar importante e significativo, se estabeleça uma
relação onde o paciente possa reestruturar e ressignificar essa relação e possa então parar de
projetar e se defender, dos conteúdos que tenta esconder e si próprio.
Se o psicótico não consegue ter a noção de símbolo, não simbolizando, ele não irá
entender a relação transferencial com o terapeuta, “parece que é meu pai”, “quando fala,
lembra minha mãe”. No caso, o psicótico diria “é meu pai”. Sendo assim, resumindo, todo o
universo do simbólico desse psicótico, se encontra muito prejudicado.
Esse conteúdo comentado sobre a psicose é importante para a compreensão de Bion, já
que é justamente no processo de transformação dos processos concretos, o não dito, do
conteúdo chamado de elemento beta, em conteúdo simbolizado, comunicado, maleável, que
pode ser ressignificado e retrabalhado, chamado de elemento alfa.
Quanto mais regredido o sujeito, mais próximo da psicose, nasce como se fosse
psicótico – esse universo é normal para o bebê, por isso não é considerado psicótico – e aos
poucos, vai se estruturando, formando mente, ego, superego, adquirindo mais recursos para
lidar com o mundo. Já o psicótico, é como se tivesse parado antes mesmo disso, como se
fosse “meio bebê”, já que a organização do mundo, de sua mente se encontra próxima de
como é a do bebê. Lidando com objetos parciais, pouca capacidade de memória, sem fala/com
fala desencontrada, sem os símbolos propriamente ditos – criança chama cachorro de au au,
por exemplo. O bebê vivencia o mundo caótico, o foco de sua visão não está bem
desenvolvido, coordenação motora não desenvolvida, afins.
Bion tenta compreender e estudar o que ocorreu com a mente do psicótico, que
aparenta ser próximo da mente de um bebê, conforme já dito, mas em graus diferentes.
Estudar o que é que falhou na mente do psicótico para que a mente deles fique parecida com a
do bebê.
Sabe-se que o conteúdo não verbalizado, não dito, se encontra no inconsciente, seria
elemento beta, um “negócio” que o sujeito não sabe o que é e, por isso, não pode falar sobre;
Já o conteúdo verbalizado, já dito, simbolizado, seria um conteúdo consciente, um elemento
alfa, já que pode ser usado, conforme já dito anteriormente, para interpretações, formulações
de ideias e crenças, por exemplo. O bebê chora, a criança esperneia e faz birra, mesmo
quando a mãe pergunta o motivo, a criança não sabe e, por isso não pode comunicar isso para
a mãe, ainda não existe palavra para tal. Nisso, um adulto, a mãe nesse caso citado,
“emprestaria” a cabeça dela, a própria mente, a própria função alfa, para transformar o
elemento beta do filho em elemento alfa, verbalizando o que pode estar sentindo, “isso é
fome, você está faminto”, “isso é sono, você está cansado” (retomar o fichamento que fez do
texto Indigestão Mental”, onde o terapeuta, o adulto, empresta sua própria função alfa para
que o sujeito consiga aos poucos, desenvolver a própria função alfa). Retomando, o universo
do bebê é caótico, sem palavras, é puramente sensorial, assim como o universo do psicótico,
que grita, fica com medo, corre... onde ele próprio não consegue entender o que está
ocorrendo consigo próprio, sendo uma mente caótica, invadida por pensamentos – sem o
aparelho de pensar, coisas que surgem e não conseguem serem (ser?) digeridas em alfa.
O universo inconsciente do Freud é como se fosse cheio de conteúdos existentes e que
o sujeito não quer ver, que sabe, mas que nega; o universo inconsciente do Bion é diferente,
refere-se aos conteúdos que podem ser esquecidos, que não precisam estar sempre na
consciência, “martelando” na mente, onde se digere esse conteúdo e o esquece.
Os elementos beta são elementos que se encontram na fronteira psíquica/corporal,
assim como são as pulsões. Onde esse conteúdo é sensível para o sujeito, não sendo sensório,
já que possui uma qualidade afetiva ligada ao próprio sujeito, envolvendo prazer ou desprazer,
não simplesmente fruto da percepção – sensório. Exemplo, não seria apenas um cheiro, seria
um cheiro gostoso/prazeroso ou um cheiro ruim/desprazeroso; Quando se anda pelo
supermercado, alguém passa do seu lado e simplesmente você se sente mais alegre, por mais
que você possa não perceber, a pessoa que passou ao seu lado estava usando um perfume que
você gosta muito, o perfume que seu namorado usa, afins. Isso é um elemento sensível – pois
envolve o sensório e o afetivo – e beta, já que o sujeito não digeriu o conteúdo, não sabe o
motivo de ter se sentido mais alegre, sendo um conteúdo não dito, não consciente.
Vale lembrar que, conforme já dito aqui e no fichamento comentado, quando o
elemento beta não consegue ser digerido, metabolizado pelo próprio sujeito, pela própria
função alfa, pela própria mente, pode contar com uma mente auxiliar, onde este outro irá
emprestar a própria função alfa, a alfabetização mental, para que o sujeito consiga digerir
aquele conteúdo, tornando o beta em alfa, simbolizando-o. Assim faz a mãe para a criança, o
terapeuta para o cliente.
A mãe faz esse processo de digestão para o bebê por meio do mecanismo da
identificação projetiva – não somente visto como mecanismo de defesa, mas também como
uma tentativa de comunicação –, percebe o desconforto do bebê, digere o conteúdo para ele e,
retorna para o próprio filho, “ai meu anjo, você está com sono, dorme...”. O bebê sente algo e,
encaixa a palavra “sono” da mãe junto ao sentimento. Quando a palavra e o sentimento não se
“encaixam”, se torna um elemento meio beta e meio alfa, quando uma mãe que para tudo,
todo tipo de choro do bebê, tenta dar comida, fará com que seu filho perca a habilidade de
distinguir o que está sentindo, caracterizando tudo como “é fome”, poderá desenvolver uma
compulsão alimentar, já que acredita que todo o fruto do seu desconforto, tudo que estiver
sentindo, na verdade é fome, até quando já está cheio, ainda não saciou o sentimento que
tinha, então ainda está com “fome”. Sendo assim, o elemento alfa simbolizado diz que aquele
sentimento é fome, mesmo quando não o é, por isso a patologia alimentar.
A comunicação pela identificação projetiva ocorre pela projeção do que estou sentindo
no outro, que vai se identificar – não para desempenhar a função projetada – e me dizer o que
é que estou sentindo. Professor cita um exemplo de Bion, que percebeu que o paciente o
olhava com raiva e simultaneamente medo e, interpreta que o paciente estava com medo do
que poderia acontecer se deixasse a raiva agir, se perdesse o controle, verbaliza isso para o
paciente e então ele se acalma. Nisso, conforme explicado abaixo, o paciente não precisará
dar a vasão ao elemento beta pela via de ação, ele já pode verbalizar e falar sobre, já que o
terapeuta digeriu esse conteúdo para ele. Começando a construir a capacidade de usar da fala
para a vasão do elemento beta. No caso, o olhar do paciente de medo e raiva permitia que o
terapeuta pudesse sentir aquilo para ele, se identificar com o conteúdo e digeri-lo, depois
devolvendo ao paciente, já como elemento alfa.
O elemento beta que não consegue se transformar em alfa possui três saídas, uma seria
para o corpo, com as somatizações de diversos tipos, diarreia, dor de cabeça, dificuldade de
enxergar, feridas pelo corpo, descamações, afins (comprovadas como sendo de origem
psicossomática); Outra saída seria por meio de alucinações, projeções intensas, fantasias que
vão refletir o elemento beta mal digerido, indigesto; Por fim, a última saída seria por meio de
ações, acting out, o sujeito não consegue pensar e simplesmente age – como quem pratica o
cutting, pode se cortar por agir sem conseguir pensar, estava sentindo algo e simplesmente
agiu –, onde o elemento beta não foi digerido pelo pensamento e, simplesmente evadiu pela
ação.
Neste terceiro caso, o terapeuta precisa auxiliar, por meio da própria função alfa, o
cliente, para que no lugar da ação do cutting, o paciente consiga verbalizar e falar sobre. No
caso do psicótico a mesma coisa, no lugar de projetar, que ele consiga falar sobre o que está
sentindo. No caso da psicossomatização a mesma coisa, que o paciente consiga verbalizar e
falar sobre. Basicamente, almeja que o elemento beta consiga evadir pela única via
privilegiada, pela fala – simbolizar e torná-lo alfa – e não pelas três vias problemáticas e
ruins.
Se o terapeuta, usando da identificação projetiva enquanto comunicação/mente
auxiliar/emprestando função alfa, não conseguir digerir e “ter espaço” dentro de si para
suportar o conteúdo, irá devolver para o paciente de maneira problemática, agressiva,
desalinhada e amedrontada, o que só é maléfico/tóxico para o paciente, não trás benefício
algum.
TBeta, conhecido também como função beta é um processo de transformação do
elemento beta em algo comunicável – primitivo –, o sujeito tenta comunicar o seu desconforto
mas não sabe ao certo o que o é, se cerca pela possibilidades “será que isso é fome? devo estar
com fome...”. É uma tentativa falha de transformar o conteúdo em alfa, mas que não se torna
alfa, se torna algo mal feito, primitivo, incompleto, TBeta.
TAlfa, conhecido propriamente como função alfa seria o devido processo de
transformação do elemento beta em alfa, se tendo a simbolização (sentimento e palavra que o
corresponde, sonolência com sono, afins), é algo mais complexo, acabado, que produz insight
(se permite pensar sobre, falar sobre, revelando algo sobre o próprio sujeito, sua história, sua
relação com o trabalho/pais/namorado/afins).
Voltando no bebê, possui questões afetivas, sensações, elementos beta que, através da
identificação projetiva – despertar seu desconforto no outro –, passam para a mãe – que usa de
sua função alfa, de sua mente – e essa transforma o elemento beta do filho em elemento alfa
(pela TAlfa/função alfa), então devolve esse conteúdo digerido para o filho – através da
verbalização –, “meu anjinho, isso é fome”, de modo que gradativamente, o bebê vá
desenvolvendo o próprio aparelho de pensar e de transformar os elementos beta em alfa. Se a
mãe não tiver uma mente devidamente desenvolvida, não terá função alfa para lidar com o
desconforto do bebê e, agirá como o que foi dito do terapeuta, intoxicando. O psicótico e o
bebê acabam tendo pensamentos soltos, sem o aparelho desenvolvido para pensar, que pode
se manifestar de diversas maneiras (três formas, conforme já dito anteriormente), podendo
manifestar-se por alucinações, por exemplo.
Bebê que se contorce e chora, mãe percebe o desconforto do bebê, se sente
desconfortável também (identificação projetiva), usa da sua mente, sua função alfa e conclui
que o bebê está com calor, então tira uma das blusinhas do filho enquanto fala “você está com
calor né?” (ela não apenas tira, ela comunica também, o que é essencial para o
desenvolvimento da mente da criança, onde começa a simbolizar, falar, pensar). A mãe fala
sobre o desconforto do bebê e, também fala como se fosse o próprio bebê “poxa, a mamãe me
deixou passando calor aqui... poxa mãe, tira essa blusinha de mim”.
https://web.microsoftstream.com/video/9c7e30e5-6a94-4d43-987d-20969defa98c
04/05
Clínica Psicanalítica I: O conceito de rêverie

Os elementos beta são os elementos que não possuem acesso ao verbal, tudo que ainda
não foi entendido, por exemplo; tudo que é do campo inconsciente.
Para Freud, algo ocorre, entra na consciência e em seguida é afastado da consciência.
Já em Bion, há elementos que nunca entraram na consciência – com isso, sendo algo muito
mais primitivo. O elemento beta se trata disso, é um conteúdo, um elemento que nunca
chegou a ser consciente.
O inconsciente de Bion é o conteúdo inominado, sem nome ainda, sem simbolização.
Se os animais não têm palavras, não possuem consciência, por não possuírem palavras, não
possuem símbolos – que não é a coisa propriamente dita, apenas a representação dessa coisa.
O paradoxo de Bion é ao explicar elemento beta, já que ao conseguir falar, digerir, se
torna um elemento alfa.
Sofrimento para Freud era visto como o aumento da tensão – o ângulo econômico –,
para Bion, diante do desconforto do sujeito – bebê que chora –, outra mente pode nominar
esse desconforto e em seguida o eliminar e servir de função alfa para esse sujeito em
desconforto – mãe que da a mamadeira e diz que o bebê estava com fome.
Rêve = sonho. Rêverie se trata de um estado de percepção no qual a mãe percebe a
situação do filho, seu desconforto. Assimilar também ao terapeuta com o papel similar ao da
mãe e, o cliente com o do filho. É só isso? Só percebe esse desconforto ou também faz algo
sobre? Por exemplo, emprestar a própria função alfa para o filho/paciente.
Professor, alfabetização mental é a mesma coisa que função alfa? Esse processo é a
simbolização ou ocorre por meio da simbolização?
Função alfa é uma função, no sentido da matemática, pegar alguma coisa e
transformar em outra coisa. É um mecanismo de pegar uma coisa e transformar em outra
coisa. Já alfabetização é o processo todo, o como o elemento beta vai ser transformado em
alfa. Ocorre por meio da simbolização, não é a simbolização propriamente dita, ocasiona a
simbolização e usa da simbolização (retroalimentação, cada vez sofistica mais, você começa
aprendendo o que é estar bravo, depois diferencia em irritado, raiva, ódio, afins... Ódio é uma
raiva estruturada que se sustenta pelo tempo, é uma simbolização com mais enriquecimento,
p. ex.)

Outra coisa, rêverie é o tomar consciência do que está sentindo e também agir sobre
isso ou, rêverie seria “só” o estado de percepção do desconforto, sem agir sobre (quer
desconforto próprio, quer o do outro)?
Rêverie é um estado mental, uma capacidade, uma receptividade para digerir beta em
alfa. É um modo da mente funcionar que permite a consciência do que estou sentindo. “estou
com fome”. Ou seja, a segunda parte da pergunta, o perceber o que se sente, digerir o
conteúdo e identificar.

E continência, seria “ter recurso” para lidar com o conteúdo desconfortável de


si/outro? Onde indivíduo com continência usará do rêverie para identificar e “solucionar” o
desconforto? Como a mãe que identifica a fome do bebê e depois oferece mamadeira, “isso é
fome meu anjo, toma tetê”. É esse o caminho?

Tu comentou sobre a rêverie e função alfa, qual a conexão de um com o outro? A


função alfa emprestada da mãe com o bebê, ela ocorreria através da rêverie?
*Só estou com saída de áudio, sem entrada, por isso não perguntei por voz.

Rêverie se trata de um estado de percepção (receptividade) no qual a mãe percebe a


situação do filho, seu desconforto (sim?). É só isso? Só percebe esse desconforto ou também
faz algo sobre? Por exemplo, a mãe (/terapeuta) que empresta a própria função alfa para o
filho (/paciente); onde a mãe nomeia o desconforto do filho e o satisfaz, “isso é fome meu
anjo, toma tetê”.
A mãe precisa estar no estado de rêverie para poder usar/emprestar a função alfa dela
para o bebê. Rêverie é um estado, um jeito de estar. É aquele psicanalista que está com
receptividade bem alta e, que só fala quando percebe algo pertinente, que não fica falando de
forma afobada ou desorganizada.

Tomar consciência do que está sentindo e também agir sobre isso. A mãe percebe e
toma consciência do desconforto do filho – como fome – e, age sobre isso – “isso é fome meu
anjo, toma tetê”. Eu percebo que estou ranzinza e com desconforto na barriga, por estar
faminto, vou agir sobre, comendo e saciando a fome, assim como, parando de reclamar.

Continência no sentido de se controlar diante do desconforto do outro/próprio, de ter


paciência e usar de seu estado de percepção/rêverie. Continência seria ter recurso para lidar
com o desconforto?

*Pesquisar continente (em torno, de segurar no mesmo lugar, parado – exemplo da


incontinência urinária, “consigo ou não segurar a urina?” – “consigo ou não me
segurar/controlar?”) e conteúdo Bioniana

**Retomar a aula pelo Teams, assistir novamente


https://web.microsoftstream.com/video/f0c42131-f40a-48d2-8063-91f1af146553
11/05
Clínica Psicanalítica I: O conceito de rêverie

Sonhar no sentido de fantasiar o que poderia estar se passando com a outra pessoa.
O conceito se direciona a relação mãe-bebê, onde a mãe pressupõe o que o bebê está
passando, o que o bebê está sentindo e, nisso a mãe consegue trazer o que o bebê sente para a
linguagem, o terror sem nome do bebê ganha um nome, “você está com frio, vou te enrolar na
mantinha”, “isso é fome, toma tetê”. Sendo assim, aqueles que não possuem a noção de outro
sujeito, que não consegue entender e verbalizar o que sente, conta com outra pessoa para fazê-
lo, para nomear para si, quer a mãe (relação mãe-filho), quer o terapeuta (relação terapeuta-
cliente, principalmente os psicóticos).
Pode-se assemelhar o ego com a pele, temos consciência de nós/pele. Para os autistas,
parece-se que sua pele é mais fina, onde seu ego o protege pouco do contato com o mundo.
Nisso pode-se falar da hipersensibilidade que o autista tem, tátil.
Rêverie seria um desdobramento do que Freud chamava de atenção flutuante, onde
não se tem uma atenção pré-selecionada, não se tem elementos pré-determinados para se
atentar, mas o terapeuta e a mãe mantêm a sua atenção pra captar aquilo que se mostrar
relevante, conforme o momento. O terapeuta fica calmamente esperando, falando no
momento que achar certo e relevante, não ficar se forçando a falar algo, um algo já pronto,
frases feitas.
Terapeuta nessa perspectiva Bioniana seria de que “O analista deve ser sem desejo –
nem o de curar o paciente, nem de prover felicidade, nem nada disso, apenas de acompanhar o
paciente nas decisões desse próprio paciente, já que um terapeuta com desejo poderia
manipular e agir pragmaticamente, guiando o cliente para seu próprio fim desejado, ou o
contrário, que diante do desejo do terapeuta, o cliente controle a situação –, sem memória – o
terapeuta não fica retomando o que foi conversado na semana anterior, não fica pedindo
continuidade do assunto, afins, já que o sujeito muda constantemente e, não faz sentido querer
relembrar de algo que já não possui relevância para o paciente atualmente, se mostrar aberto
para o que o paciente quiser falar hoje, sem forçar nenhuma memória – e sem ânsia de
compreensão” – calma receptividade, a capacidade de suportar o negativo.
https://web.microsoftstream.com/video/5cbe8f91-2a4c-4484-8915-ea2428950fa6
11/05
Clínica Psicanalítica I: Parte psicótica e não psicótica da personalidade

Freud e o posteriormente Lacan dividiu as formas de organização mental em três


estruturas básicas: Neurose, Psicose e Perversão. Não se tem um ideal de conduta estruturado
para a normalidade, contudo, existe uma tendência a assimilar a neurose como o mais
próximo da normalidade, onde não se tem graves conflitos com a realidade, contudo, isso não
significa que não existe sofrimento psíquico atrelado. Não se existe cura para a psicose –
esquizofrênico, paranoico, por exemplo.
Após passar o complexo de Édipo, se tem a definição do que o sujeito será, neurótico,
psicótico ou perverso.
Lembrando que existem subcategorias (1h:13m de aula)
Na neurose o ego suprime parte de seu id, por decorrência da realidade. Já na psicose,
por decorrência do próprio id que o sujeito acaba retirando-se, ego, em parte da realidade.
Neurose = suprime o próprio desejo, id, por decorrência do conflito com a realidade; o sujeito
diante da realidade, acaba suprimindo seu desejo, já que não pode o desejar, não é algo
tangível, “possível”/socialmente aceito. Psicose = se devota ao desejo, id, mesmo que precise
distanciar-se da realidade; o psicótico não abre mão do desejo, nem que tenha que delirar para
isso, nem que tenha que se distanciar da realidade, não abandona o desejo; o psicótico não
sabe que não pode fazer X, Y e Z, o perverso já sabe que não pode e mesmo assim o faz.
Já a perversão, por outro lado, seria de certa maneira o meio termo, envolve a
aceitação da Lei (primeiro a castração), onde aceita e simultaneamente não aceita a castração,
aceita e não aceita a diferença dos sexos. Perverso é aquele que acha que não existe distinção
entre os gêneros, que homem pode virar mulher, mulher virar homem, onde não aceita a “lei
natural” do mundo, dos sexos, afins. Perverso no sentido de negar as “leis” do mundo. Onde
aceita e rejeita tanto a realidade como seu próprio desejo.
Perverso aceita a realidade, mas ao mesmo tempo não o aceita, pois nega suas leis.
“Eu sei que não pode fazer, mas...”. O sujeito reconhece a realidade e não aceita essa
realidade. “estacionar em uma vaga de deficiente”, percebe que não pode, mas o faz mesmo
assim, uma lei própria, reconhece que é uma vaga de deficiente, mas não aceita isso, não nega
seu desejo de parar próximo, o fazendo mesmo assim, mesmo sabendo que não deveria. Sabe
que não é algo totalmente certo, mas mesmo assim, o faz, mesmo que escondido do mundo,
não nega seu desejo, os concretizam as margens da sociedade. O perverso não abre mão do
seu desejo, não existe motivo para que seu desejo não seja satisfeito, mesmo que precise “dar
jeitinhos” para conseguir saciar seu desejo. Reconhece a realidade mas não a respeita.
18/05
Clínica Psicanalítica I: Parte psicótica e não psicótica da personalidade

Klein e Bion passam a falar de formas de funcionamento. Klein com as posições


esquizo-paranoides e depressiva; Bion fala sobre parte de psicótica e uma parte não-psicótica.
O psicótico nunca perde completamente o contato com a realidade e, o neurótico nem
sempre estará em contato com essa.
O que para Freud não ocorreria assim, formas de funcionamento com parte psicóticas
e não-psicóticas, pois achava que o psicótico não teria contato com a realidade e por isso não
poderia se analisar questões como transferência.
Para Bion, mesmo com sujeitos catatônicos, esse possui um contato com a realidade,
os psicóticos teriam uma parte psicótica e uma não-psicótica, onde o contato do neurótico
com a realidade pode não ser percebido. Um exemplo de estar em contato e não estar em
contato com a realidade ao mesmo tempo seria a realidade de exploração por trás dos
produtos de 2 reais da China, por exemplo.
O psicótico ataca seu próprio contato com a realidade, de modo que ela não seja
percebida da maneira frustrante que ela na verdade é. Atacar os meios de se entrar em contato
com a realidade, pois a realidade da medo, assusta, mostra impotência do usuário em questões
problemáticas do mundo. Já o neurótico atacaria a informação, não o aparelho que permite
entrar em contato com a informação, conforme o psicótico o faz. A forma do psicótico atacar
esse aparelho que intermedia o contato com a realidade, permite um afastamento “maior”
dessa realidade, do medo e de tudo que ela pode representar.
Enquanto o neurótico buscaria estudar, se aperfeiçoar, sacrificar o ID (desejo) em
nome da realidade, desemprego, por exemplo (o sujeito se adapta a realidade, sacrificando o
ID); O psicótico iria torturar um juiz, de modo que crie uma lei que obrigue as empresas a lhe
contratar (a realidade precisa se adaptar a esse sujeito), ignorando questões como ser preso, a
polícia, afins, mostrando uma onipotência ao “driblar” o mundo inteiro e, ao mesmo tempo
não é suficientemente inteligente para conseguir um emprego (não entra em contato com
isso), por exemplo. O psicótico ataca e destrói o aparelho que o faz entrar em contato com a
realidade. O contato com a realidade em pacientes mais psicóticos é mascarado por uma
fantasia de onipotência e um ataque, não só da realidade, mas de toda percepção da realidade.
A mente psicótica é uma mente não desenvolvida, podendo ser uma mente assim
desde sempre (como autistas), ou através de uma regressão (voltar a ter a mente infantilizada,
desenvolvimento de esquizofrenia, por exemplo, que tem a possibilidade de voltar a ter uma
mente desenvolvida e “normal”).
A própria realidade implica em um limite do ataque do psicótico a realidade. Por
exemplo, pode deixar de acreditar na gravidade, contudo, ao pular de uma árvore segurando
um guarda-chuva aberto, não irá voar, irá entrar em contato com a realidade.
Existem dois modelos mentais, princípio do prazer (busca prazer sem muita relação
com a realidade, como os limites e os passos percorridos para se atingir a felicidade) e
princípio da realidade. O princípio da realidade acaba por entrar em conflito com o princípio
do prazer (onde as coisas existem para lhe satisfazer, mas não é assim que acontece,
conflitando com a complexa realidade). Na tentativa de negar a frustração, o princípio do
prazer vai entrando em ação como substituto do princípio da realidade. Na realidade tu tem
que atuar e fazer algo, pelo prazer tu apenas deseja e espera que aconteça.
O psicótico quer por que quer, o psicótico deseja o outro; o neurótico quer o que o
outro quer, que esse outro i deseje. O psicótico poderia estuprar, pois ele quem deseja o outro
e se satisfazendo com isso; o neurótico quer que o outro o queira, então não se satisfaz em um
sexo forçado, por exemplo. O psicótico (p. ex. esquizofrênico e o autista) não se preocupa
com o que o outro pensa dele, por exemplo.
O terapeuta apresenta a realidade para o cliente de forma fragmentada, “em
pedacinhos”, pois o cliente pode digerir esse pouco de conteúdo, não adiantaria uma grande
confrontação (mostrar o quão longe o psicótico se encontra da realidade), pois ele não teria
função alfa para digerir todo o conteúdo.
O sujeito se afasta da realidade ao fragmentar o aparelho de percepção e pensamento,
como estudar para uma prova, ele estuda e passa na prova, depois esquece disso, não conserva
esse conhecimento e dedica-se para outra questão, não consegue manter tudo
simultaneamente, trabalhar, estudar, afins. Não consegue começar a fazer o almoço e deixar a
comida no fogo enquanto lava a louça, por exemplo, precisa começar uma coisa e terminar
antes de começar uma outra. Assim é o seu contato com a realidade, entra em contato com
uma coisa de cada vez, o seu aparelho de pensar foi danificado e permitia que todas as coisas
pudessem conviver junto.
Sujeito religioso, vai na balada gay, deseja a morte do padre, tipo de filme predileto é
terror com tortura, afins. Ele pode ser religioso, “pausar” a religião e ir para a balada gay,
aproveitar e depois “pausar” isso e desejar que o padre morra (a religiosidade fica pausada),
afins.
Bion destaca que existem quatro traços da personalidade psicótica:
Preponderância dos impulsos destrutivos, onde mesmo os impulsos de amor acabam
inundando-se e se transformando em sadismo. Controle, dominação, até mesmo em questões
referentes ao amor, a mente do psicótico não consegue lidar com a realidade do mundo,
apenas o controlando que ele lidaria com a realidade.
Ódio pela realidade, quer interna, quer externa, assim como toda a percepção dessa
realidade. Como uma pessoa que acha que os buracos na rua são para furar o pneu da sua
moto, começa a chover só para ele se molhar quando sai de moto, o Sol existe para deteriorar
a lataria de sua moto e o irritar, afins. A realidade como querendo destruir o sujeito, o atacar,
por isso que o sujeito tem ódio pela realidade.
Um terror de aniquilação iminente, como surtos.
Uma formação prematura e precipitada de relações de objeto, onde o sujeito pode na
primeira sessão de terapia contar coisas completamente bizarras, expressando-se livremente
mesmo sem desenvolver uma relação terapêutica adequada. Por exemplo, chegar para um
desconhecido e falar “meu maior ídolo é Hitler, ele conseguiu dominar a Alemanha e deixar
tudo ao seu controle”. Questões prematuras e intensas.
Perversão é a face erótica do ódio, uma forma de demonstrar o ódio usando o
erotismo, constranger o outro, essa violência, desconforto e medo do outro.
O sujeito convive simultaneamente com uma parte psicótica e uma parte neurótica,
percebe-se isso na clínica. O psicótico poderia evitar externalizar às emoções, mas ainda
expressa a raiva, se tendo um ódio à vida, raiva de suar e não gostar de transpirar, por
exemplo. A dúvida é fundamental na personalidade sadia, já a categorização da posição
daquele que acha que sabe de tudo acaba sendo visto como psicótico, onisciente e onipotente,
ficando com ataques de raiva quando a realidade não condiz com esse seu domínio. Psicóticos
perversos gostam de tirar o outro do sério, transformando o outro a ser como si, que o outro o
ataque da mesma forma que é atacado.
“olha só como você está preso a manter as coisas dentro dessa sua realidade, olha o
como você ignora parte dessa realidade por não conseguir lidar com ela”. Na psicanálise não
se tenta moldar a forma de se pensar, não confrontando o sujeito conforme a TCC; o analista
iria gradativamente fazendo o paciente entrar em contato com a realidade.
O analista deve falar de acordo com o nível egóico (contato do sujeito com o mundo,
de forma abstrata? De forma concreta?) do paciente (quem não consegue simbolizar não
entenderia algo como “isso me foi como um tapa na cara”, não entende piadas e metáforas,
pois não se tem a simbolização, leva o conteúdo para o concreto). O analista não pode
desprezar a forma que o paciente pensa e enxerga o mundo, suas verdades infantis e bizarras.
O analista não serve como pai/mãe, deve lidar com a contratransferência, mantendo
aspectos de maternagem apenas suficientemente bons. Tomar cuidado para que as atitudes do
paciente psicótico não acabe resultando em alterações do setting por decorrência da
contratransferência; Se busca sempre manter o setting da mesma forma para não afetar sobre a
análise.
A parte psicótica da personalidade do sujeito acaba ganhando espaço conforme a falta
de rêverie da mãe e é fundamentalmente isto que devemos fornecer ao paciente, capacidade
de metabolizar aquilo que lhe ocorre. Lembrar que não somos o ego ideal do paciente, não
pode-se ter uma arrogância de querer que o paciente entre em contato com a realidade que tu
mesmo tem; não somos guardiões da moral para conflitar com os valores do paciente, mas
sim de mostrar para esse paciente a forma que ele funciona.

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