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Criação e Redação

em Meios Impressos,
Audiovisuais e Digitais
A Definição dos Roteiros

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Esp. Andrea Barros

Revisão Textual:
Prof.ª Esp. Kelciane da Rocha Campos
A Definição dos Roteiros

• Como se Constrói um Roteiro para Criação/Redação;


• Storytelling.


OBJETIVOS

DE APRENDIZADO
• Preparar o aluno para construir uma linha de raciocínio clara para a redação de um
texto publicitário;
• Apresentar técnicas para auxiliar na montagem de conteúdos.
UNIDADE A Definição dos Roteiros

Como se Constrói
um Roteiro para Criação/ Redação
Já exploramos, em outras unidades, uma empresa de cosméticos orgânicos.
Para darmos mais dinamismo à aprendizagem, vamos considerar aqui um produ-
to diferente, para construirmos uma nova campanha para um produto hipotético:
uma lava-louças. Um produto como uma lava-louças é algo que todo mundo conhe-
ce. Não é uma nova invenção, todos sabemos para que serve, as pessoas têm uma
ideia, mesmo que aproximada, de quanto custa, mas, mesmo assim, o mercado de
eletrodomésticos precisa girar. E o que faz um mercado girar são os lançamentos...

Se as marcas não criam diferenciais, ninguém vê a necessidade de trocar algo


que está funcionando por um produto novo, a não ser que o item quebre e precise
ser substituído.

Então, cada lançamento traz algum tipo de diferencial e é nele que as marcas
apostam para construir uma campanha de sucesso.

Vamos supor que a máquina de lavar em questão traga dois diferenciais específi-
cos: uma gaveta que permite a acomodação dos talheres de forma horizontal, garan-
tindo uma limpeza mais eficiente dos mesmos, e dois ciclos de lavagem especiais: um
ciclo de apenas 10 minutos (com água 10 graus mais quente que o habitual, o que dá
agilidade para quem tem pressa) e outro ciclo voltado à limpeza da máquina em si.

Nada espetacular, mas dentro de um novo design. Apesar de 95% da máquina ser
exatamente igual a de um modelo anterior, esses dois itens passam a ser os diferenciais
de venda que serão explorados por todos os canais onde o produto é disponibilizado.

Agora, imagine que apenas por ter esses dois novos atributos a máquina custasse
20% a mais do que qualquer modelo de seus concorrentes. Isso é muito para ser
justificado considerando-se inovações que fazem pouca ou nenhuma diferença para
o consumidor.

Então, aí entra a habilidade de contar essa história de maneira interessante, agre-


gando ao produto um conceito que ajude a vendê-lo.

Vamos acompanhar esse pensamento.

Ninguém gosta de realizar trabalho doméstico.

Mas, não há como fugir dele e a única garantia que temos é que atividades como
lavar a louça são diárias e sem fim.

Outro ponto de consenso: infelizmente, a sociedade acabou assimilando que o


trabalho doméstico é uma atividade de responsabilidade feminina, pouco valorizado
e, se forçarmos um pouco, esse tipo de crença enaltece um comportamento de sub-
missão da mulher em relação ao homem.

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Esse é um quadro exagerado, é claro, pois sabemos que muitos homens ajudam
nos afazeres domésticos e há mulheres que delegam 100% esse serviço a terceiros
ou ao próprio marido. Mas, esse cenário desfavorável citado anteriormente pode nos
dar uma dica de como abordar um tema chato, valorizando a mulher.

Imagine dizer que a mulher que escolhe a lava-louças X é uma mulher moderna,
que dá conta de ter uma carreira de sucesso, que é independente financeiramente,
que pode comprar a máquina mais cara do mercado e que tem justificativas suficien-
tes para escolher um produto por suas características técnicas.

Isso transforma o ato de colocar a louça para lavar em uma ação de independên-
cia e poder.

Ao contar uma boa história, você pode inverter a percepção de conceitos tidos como fixos.

Verdade ou não, acabamos de criar uma história que coloca nosso produto na
categoria de “tecnológico, escolhido por mulheres fortes e independentes, que resol-
vem as tarefas domésticas de um jeito inteligente”.

Olhando dessa forma, parece até patético associarmos esse perfil a uma simples
lava-louças, mas essa é a mágica que o marketing faz para tratar de forma nada ba-
nal um produto que tem, na verdade, pouco a oferecer.

No final das contas, essa mulher que pode comprar a máquina e escolhe comprá-
-la pode ser que nunca chegue a usar os atributos do produto pelos quais justificou
a aquisição.

O que foi vendido não foi uma máquina de lavar-louças e sim o sentimento de se sentir
poderosa e independente.

Esse tipo de recurso é usado o tempo todo, com todos nós, sempre apelando para
algo que queremos agregar à nossa pessoa. Emprestamos o poder proporcionado
por um carro elegante ou uma joia à nossa própria personalidade, com a ilusão de
que ao portá-los, seremos vistos com outros olhos.

E, no final das contas, isso acaba acontecendo.

Um executivo, ao ser promovido, tende a investir em um novo relógio, em novos


ternos ou em uma caneta poderosa: ele quer mostrar para o mundo que está em um
patamar mais alto, para reafirmar a sua própria posição.

Quando uma família melhora sua condição financeira e planeja suas férias, mais
do que o destino em si, o que vale é poder mostrar que o destino escolhido é caro e
que, a partir daquele momento, eles têm condições de bancar.

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UNIDADE A Definição dos Roteiros

Trocando Ideias...
No marketing, imagem é tudo. Passa uma mensagem clara de quem nós somos através
daquilo que consumimos.

Então, vamos simular quais seriam as peças de divulgação no nosso produto em


uma campanha de lançamento, para depois enxergarmos o roteiro e os artifícios de
criação por trás de cada uma delas:
• anúncio em revista;
• comercial na TV;
• material de ponto de venda;
• filme no YouTube;
• campanha no Instagram;
• material para revendedor;
• área no site da marca;
• ação com público-alvo.

As peças acima listadas são suficientes para a realização de uma campanha ven-
cedora. Vamos aos detalhes de cada uma delas.
• Anúncio em revista: como queremos nos posicionar como o produto de es-
colha de uma mulher moderna, bem-sucedida e independente, contamos essa
história mostrando uma personagem em uma cozinha com móveis caros, am-
pla, tecnológica. Ela está bem maquiada, pronta para sair sozinha (o que mostra
ser dona do próprio nariz), apenas olhando para a máquina que ela deixa liga-
da, trabalhando, enquanto deduz-se que uma noite maravilhosa espera por ela.
Os indicadores de status são claros: joias, roupa elegante, cozinha de ponta.
Ela tem entre 30 e 35 anos, desmistificando que trabalho doméstico é para uma
mulher mais velha, sem grandes desafios na vida. O fato de ela deixar claro que
a máquina trabalha enquanto ela se diverte mostra que ela faz ótimo uso de seu
tempo. Pronto, o impacto conceitual foi construído. Então, apenas no rodapé da
página, com um texto curto e objetivo, comunica-se o que essa máquina tem de
tão especial. O que é importante aqui é que a decisão da compra da máquina já
é feita antes de ler os diferenciais... Pouco importa quais são. O que importa é
que a consumidora quer se sentir o máximo por escolher esse produto e, para
justificar o investimento, precisa apenas conhecer, brevemente, o que tem de
diferente, o que ela defenderá com afinco para poder responder por que pagou
20% a mais no produto;
• Comercial na TV: a imagem da revista aqui ganha vida e dá ainda mais riqueza
ao cenário. Para dar mais amplitude ao conceito, podemos trocar a persona-
gem usada na revista, colocando uma outra mulher ou um casal bem-sucedido,
reforçando a ideia de que quem escolhe o produto é “cool”. Sempre seguindo

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a mesma linha: gente bonita e interessante, que tem coisa muito melhor para
fazer do que lavar a louça;
• Material de ponto de venda: aqui a história que temos que contar é mais téc-
nica e objetiva. Imagine que, ao lado de nosso produto, há mais 15 modelos
disponíveis, todos mais baratos. Para que um vendedor tenha argumentos ou
para que os clientes construam as próprias justificativas para comprar tal má-
quina, o foco aqui tem que ser os reais diferenciais. O que muda na lavagem
ter os talheres dispostos de forma horizontal? Como quem vem comprar uma
máquina cara, geralmente, já teve uma anterior, a abordagem pode ser algo do
gênero: sua máquina atual lava bem pratos, mas deixa muito a desejar quanto
aos talheres? Isso acontece porque os talheres são lavados de pé, dificultando,
assim, a ação da água e detergente. Com esse modelo X, isso foi brilhantemente
resolvido. O diferencial do ciclo rápido é apoiado no “ninguém tem mais tempo
para ficar esperando 2 horas para a louça ficar pronta”, e o ciclo de autolavagem
da máquina segue a mesma linha: “se a sua máquina não for devidamente limpa
com frequência, lavará muito mal as suas louças. E ninguém tem tempo para fi-
car lavando máquina de lavar...”. Dessa forma, um vendedor está, devidamente,
treinado para orientar a venda para esse produto que é mais caro e trará mais
lucros para ele e para a loja. No material impresso, tudo isso é explicado de
forma objetiva, mas sempre ambientado com o ar de sofisticação disseminado
nos anúncios e comerciais;
• Filme no YouTube: um filme no YouTube pode ser muito interessante para
vender um produto dentro de um conceito. Podemos pensar apenas em uma
demonstração técnica dos diferencias da máquina ou no relato de um dia de uma
mulher poderosa que tem a máquina em casa, e como ela usa esse recurso para
poder realizar tantas coisas interessantes na vida dela. Além disso, em um canal
do YouTube da marca, podemos colocar diversos testemunhos de mulheres (e
por que não de homens) que compraram o produto, que são “descolados” e
assinam embaixo que é o melhor eletrodoméstico para pessoas que têm vidas
interessantes como as deles. Tudo reforçando o mesmo conceito;
• Campanha no Instagram: no Stories pode-se fazer uma enquete para verificar
se o público-alvo tem “perfil” para ter uma máquina dessas. Nos feeds, imagens de
pessoas inspiradoras ao lado da máquina, falando de suas rotinas cheias de ativida-
des associadas a pessoas poderosas. Entre os feeds, destaques para os diferenciais,
ajudando a disseminar as novas características entre os públicos de interesse;
• Material para revendedor: totalmente focado em diferenciais técnicos, com gran-
de ênfase no preço mais alto, que garante maior lucratividade ao lojista. Produtos
mais baratos e de grande giro são bem-vindos, é claro, mas o próprio fabricante
desse produto premium pode ter itens que também suprem essa necessidade;
• Área no site da marca: por se tratar de um lançamento, logo na página de
abertura uma foto do produto, ambientada em elementos que vendem o concei-
to. Ao clicar nela, vai-se direto à página exclusiva. Lá, todas as características
técnicas, com fotos de impacto e links para canais do YouTube e Instagram;

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UNIDADE A Definição dos Roteiros

• Ação com público-alvo: uma vez que a marca optou por se posicionar como a
escolha de uma mulher poderosa e independente, imagine se propusesse uma
discussão sobre o novo papel da mulher na sociedade. Para discutir o assunto,
poderiam convidar para um encontro, no modelo de debate, mulheres influentes
e mulheres comuns para discutir o tema trabalhos domésticos na vida de uma
mulher que desempenha, completamente, a sua vida profissional, com sucesso.
O encontro poderia contar com uma audiência de mulheres, convidadas atra-
vés das mídias sociais. No local, a linha de produtos da marca, com destaque,
mostrando que trabalho doméstico e realização profissional podem acontecer ao
mesmo tempo, desde que as ferramentas certas (os produtos da linha) sejam esco-
lhidas. Uma ação dessas coloca a marca em um patamar além do convencional:
deixa de ser um fabricante de máquinas de lavar-louça e passa a ser um parceiro
estratégico para contribuir com um espaço para evolução do poder feminino.

Como você pôde observar, para cada peça, um roteiro. Mas, tudo partindo do
mesmo conceito e tendo uma história contada de forma a envolver o público-alvo
dentro daquilo que se quer que ele observe.

Muito poderoso.

Mais poderoso do que qualquer dado técnico, uma vez que nossas escolhas de
consumo estão muito mais voltadas à reação emocional do que à racional.

Compramos com o coração, muito mais do que com a razão.


E isso nos leva ao conceito de storytelling, que vamos abordar a seguir.

Storytelling
Todos nós adoramos uma boa história.

É pelas histórias que vamos aprendendo sobre o mundo e qualquer assunto, se


abordado dentro de uma narrativa envolvente, fica em nossa memória.

Se trabalhamos em publicidade, esse é um recurso fantástico a ser usado. É pra-


zeroso de ser desenvolvido e muito eficaz no alcance dos resultados.

Trocando Ideias...
Toda boa história tem elementos clássicos a serem considerados:
• um começo intrigante;
• o desenrolar do enredo;
• a elucidação do mistério;
• uma mensagem final.

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Esses elementos não falham e são a estrutura de bons filmes, bons livros e cam-
panhas bem-sucedidas de marketing.

Vamos imaginar uma fábrica de lenços de seda.

Como ela, devem haver várias ao redor do mundo, que se apoiam nos atributos
imediatamente associados ao produto:
• design elegante;
• matéria-prima sofisticada.

Sozinhos, muitas vezes, apenas esses atributos são mais do que suficientes para
que uma marca decole e venda. Mas, e se contarmos a história por trás da marca?
E se esta história tiver grande apelo emocional?

Vamos pensar aqui em 2 roteiros, seguindo a estrutura sugerida anteriormente.


• Um começo intrigante: a marca X é hoje um dos maiores fabricantes de len-
ços luxuosos de seda do mundo, exportando para mais de 70 países, mas seu
começo foi muito distante do luxo;
• O desenrolar do enredo: a sua fundadora, Sr.ª Marie Louise Bourdain, nasceu
em uma família pobre e sua mãe trabalhava como empregada na casa de uma
família muito abastada. Ela cuidava da família com afinco e seu momento pre-
ferido era dobrar, meticulosamente, todos os lenços de seda de sua patroa, ima-
ginando que nunca na vida poderia possuir algo tão nobre, fato que ela sempre
confidenciava à filha. O que ela previa realmente aconteceu: ela veio a falecer,
sem nunca ter tido a chance de ganhar dinheiro suficiente para comprar um
lenço, mas conseguiu dedicar tudo o que ganhava para a educação de sua filha,
que alcançou sucesso e decidiu que teria a sua própria fábrica de lenços, a pre-
ços mais acessíveis, para que mais mulheres pudessem ter acesso a esse luxo;
• A elucidação do mistério: ela decide começar a desenvolver a criação de seus
próprios bichos da seda e, com essa produção, conseguiu criar um império;

• Uma mensagem final: ao comprar um lenço dessa marca, você não está ape-
nas comprando o produto, mas está apostando em uma marca que acredita que
todo mundo merece ter algo de valor.

Trocando Ideias...
A história pode ser piegas, divertida ou solene. Não importa, o que importa é dar ao
consumidor a oportunidade de entender os motivos de uma marca ou produto existir.

Um outro jeito de contar uma história, considerando uma empresa do mesmo setor.
• Um começo intrigante: Mariana nunca havia pensado em usar um lenço de
seda. Não fazia parte de seu guarda-roupa;

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UNIDADE A Definição dos Roteiros

• O desenrolar do enredo: mas um dia, começou a passar mal e descobriu que


estava seriamente doente. Tinha câncer e foi informada de que perderia seus
cabelos devido ao agressivo tratamento. Então, na tentativa de enfrentar o pro-
blema, passou a usar lenços coloridos, que tinham um efeito psicológico extre-
mamente positivo diante de sua condição. Mas, entre os que havia no mercado,
não encontrava nada que realmente a agradasse;
• A elucidação do mistério: então, ela resolve criar a sua própria linha, onde as
estampas trazem mensagens de otimismo para outras mulheres que, como ela,
passam ou passaram pelo mesmo problema;
• Uma mensagem final: ela alcança a cura e decide destinar 5% dos lucros de
cada lenço vendido a uma instituição de apoio ao câncer.

Esse enredo é mais uma forma de mostrar ao consumidor que o que está à venda
não é um simples produto e sim um item com uma história, que entrega algo mais
do que uma mercadoria comum. Esse tipo de argumento cai como uma luva para
que as pessoas tenham um discurso interessante para poderem justificar onde e por
que gastam seu dinheiro.

Qual é a história que você quer contar?

O que a marca tem que pode dar um bom enredo?

Muitas vezes, você não precisa usar o recurso de storytelling para contar a his-
tória por trás da marca, mas para explicar algum conceito complexo, substituindo
assim um manual de instruções, por exemplo.

Tudo pode ser explicado de uma forma chata ou divertida.


Você escolhe. Mas, pode ter certeza de que contar uma história de forma divertida é, infini-
tamente, mais eficiente.

Há marcas que escolhem eleger um mascote para contar uma história e contam
o que precisam através desse personagem. Lembra-se do exemplo citado, lá no co-
meço, da marca Red Bull?

Cada desenho animado contava uma história.

Um recurso muito importante quando falamos de storytelling é a metáfora.

Muitas vezes um assunto muito complexo fica fácil de explicar se pegamos uma
boa metáfora, quer ver?

Imagine que a empresa fornecedora de água na sua cidade tivesse o objetivo de


diminuir o consumo.

Ela pode lançar uma campanha dizendo que a água é um recurso escasso, que
não podemos viver sem água, que se não economizarmos não vai ter para todo
mundo e por aí vai. Mas, certamente, isso teria pouco impacto real.

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Agora imagine esta metáfora:

Se você escova os dentes com a torneira aberta, gasta, em média, 30 litros de


água cada vez que realiza esse ato.

Se junto com essa mensagem fosse colocada uma foto da sua escova de dentes ao
lado de 3 galões de água de 10 litros, daqueles que estamos acostumados a ver em
bebedouros? Bom, ao entendermos essa história nos sentimos ridículos em imaginar
que estamos jogando tanta água pelo ralo, para simplesmente escovar os dentes.

E se a história continuasse a ser contada e pudéssemos mostrar o quanto de água


uma pessoa sem consciência ambiental gasta em um dia? Um banho, lavando louça,
lavando roupa, etc. O efeito seria brutal e, certamente, muito mais eficiente do que
qualquer apelo para economizarmos o recurso.

Uma metáfora bem colocada conta uma história com clareza, ajudando muito a
convencer o nosso interlocutor.

Outro recurso interessante é contarmos a história que mostra o benefício que um


produto pode trazer. Quer ver?

Vamos pensar em um curso de graduação em Letras.

O curso em si propõe a entrega de conhecimento.

Mas, o que realmente interessa é o que esse conhecimento vai trazer. Mais do que
as matérias que compõem o curso ou as instalações de uma faculdade, a venda será
mais eficiente se soubermos mostrar os ganhos que a vida de uma pessoa pode ter
ao optar por esse curso: as oportunidades de trabalho ao redor do mundo, as via-
gens, poder trabalhar em empresas com salário diferenciado, ter o cargo de tradutor
e intérprete, atuar como porta-voz de uma empresa internacional, etc.

Se essa história é bem contada, o que vendemos é o sonho e não o curso em si.
E, na verdade, todo mundo estuda pelo que o estudo pode proporcionar e não pelo
conhecimento em si...

O que o produto que você tem em mãos vende?

Veja aqui alguns exemplos.


• Um programa de streaming como Netflix não vende apenas a comodidade do
cinema em sua casa. Vende a possibilidade de você viver aventuras através dos
diversos personagens de seus filmes e séries;
• Uma máquina de lavar roupas não vende apenas roupa limpa. Vende, por exem-
plo, tempo livre para ler aquele livro que você quer;
• Um personal trainer não vende boa forma, vende uma autoestima mais elevada
aos seus alunos;

E por aí vai...

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UNIDADE A Definição dos Roteiros

Se você descobrir o que o seu produto realmente entrega, vai ficar muito mais
fácil criar uma história convincente e vendedora.

Aí, vem da criatividade de cada um levar o conceito ao conhecimento de seus


consumidores.

Uma avícola com proposta “orgânica” passou a anexar nas embalagens de seus
ovos a seguinte frase: “botados por galinhas felizes, criadas em espaço aberto”.

Ok, não dá para julgarmos a felicidade de uma galinha, mas se o consumidor fica
contente com esse argumento, está valendo, não é?

Às vezes uma marca consegue ganhar a simpatia de seus consumidores quando


explora a vida de seus fundadores. O lançamento de uma biografia pode trazer a
uma marca um olhar bem diferente do qual estamos habituados.

Há um milionário inglês chamado Richard Brenson. Ele é considerado uma das


maiores fortunas da Inglaterra e tem, entre as suas marcas, a Virgen Records e a
Virgen Air, uma imensa gravadora e uma companhia aérea, respectivamente. Além
desses negócios, é difícil encontrar um mercado no qual ele não tenha algum produ-
to: de refrigerantes a preservativos. O império é descomunal.

Mas um ponto alto da carreira dele foi o lançamento de uma autobiografia. A his-
tória dele é tão impressionante, que conquistou fãs ao redor do mundo, facilitando a
entrada dele em mercados internacionais: todo mundo queria fazer parte da história
de um homem que começou sem nada, quebrou várias vezes, aprendeu e se trans-
formou em um ícone inglês.

Quem não gosta de uma história de sucesso de alguém que veio de baixo e venceu?

Essa é uma fórmula imbatível, explorada à exaustão na literatura, nos filmes e nas
novelas, sempre dando certo. Funciona que é uma maravilha.

Outro tipo de apelo que funciona muito bem é o da pessoa/empresa que teve uma
ideia genial. Pense no Steve Jobs. Com a Apple, ele mostrou que tinha um jeito di-
ferente e irresistível de fazer computadores pessoais. Ele contou uma história de que
computadores poderiam e deveriam ser diferentes. Junte isso a uma personalidade
emblemática, minuciosamente construída, explorada também em uma potente biogra-
fia? A Apple não tem consumidores. Tem fãs, que querem se sentir um pouco à frente
de seu tempo, promessa explorada por seu fundador.

A história de vida fascinante de alguém é combustível de sobra para vender um


produto. Por isso, um recurso poderoso é o licenciamento de marcas, onde se em-
presta uma história de sucesso a um produto. Como é na prática?

O que tem a ver uma figura como o jogador de futebol Neymar com lâminas de
barbear? Na verdade, nada, além do fato de ele ser homem e ter que fazer a barba.
É muito provável até que ele use apenas barbeador elétrico em vez de lâmina...
Mas, ele passa a imagem de campeão, daquele que ganha milhões. E se o consumidor

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não pode ter os carros que ele tem, a namorada que ele escolhe, os imóveis que
ele adquiriu devido ao seu sucesso, pode ao menos compartilhar o uso da mesma
lâmina de barbear.

Ou seja, empresta-se a história associada a uma pessoa vencedora, como um jo-


gador de futebol ou uma celebridade do cinema, para transferir essas características
para um produto que não tem uma história para chamar de sua.

Essa estratégia pode alavancar muito as vendas de um produto a ponto de justificar


investimentos em milionários contratos publicitários. Entretanto, também não deixa de
ser perigosa: um erro do personagem pode colocar toda uma marca em risco.

Imagine um país como o Brasil, com 54% da população formada por negros, com
poder de compra e escolha. E, se boa parte dos homens dessa população escolhe a
lâmina de barbear por admiração a um jogador de futebol e ele, em algum momen-
to, faz algum comentário racista? Isso pode gerar uma reprovação massiva a uma
marca, por associação àquele que deu um passo errado. Isso pode ser irreversível
e ter um impacto, de um dia para o outro, nas vendas do produto. Não apenas os
consumidores negros podem eliminar a marca de suas vidas, assim como todos os
demais, que também apoiam a extinção de comportamentos racistas na sociedade.

Esse tipo de problema pode ser o suficiente para quebrar uma empresa.

Nos dias de hoje, as pessoas estão cada vez mais inclinadas em se informar sobre a história
e o posicionamento das marcas em relação a temas importantes, como racismo, feminismo,
sustentabilidade, etc.

As marcas que entendem esse comportamento saem muito na frente, cuidando


para se pronunciarem de forma clara e justa, avaliando qualquer campanha publici-
tária como uma plataforma importante para disseminarem os valores éticos sobre os
quais constroem suas marcas. Essa é a forma de fazer publicidade hoje, consideran-
do conceitos verdadeiros.

A verdade é um valor muito importante nesse tipo de comunicação.

Há pouco tempo, uma empresa investiu pesado no lançamento de um sorvete


premium, alegando que a receita tinha sido criada pelo bisavô dos fundadores na
Itália, ficou perdida por décadas e havia sido recuperada, depois de anos de procura.
O lançamento trazia o sorvete como a concretização de um sonho de relançar um
produto que representava uma história emocionante.

O produto em si era maravilhoso. Por si só, considerando o conjunto sabor, emba-


lagem e posicionamento, não precisava desse recurso da história para vender. Mas,
a empresa optou por esse caminho.

Quando o produto estava começando a deslanchar, descobriu-se que a história


tinha sido completamente inventada. E isso gerou um desconforto imenso entre os

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UNIDADE A Definição dos Roteiros

consumidores, que se sentiram enganados e, por isso, perderam a confiança no pro-


duto em si. Caso sério, desnecessário, que colocou em risco uma linha de produtos
que tinha tudo para ser sucesso... Péssima escolha.

Isso acontece muito com a construção de celebridades: inventa-se uma história de


apelo emocional para vender personalidades que não entregam o que prometem,
porque simplesmente não são o que parecem ser.

Agora, se a proposta foi embasada em humor, pode-se criar uma história total-
mente nova, apenas para criar um contexto divertido para se apresentar um produto
ou serviço. Usar a estrutura de um conto de fadas para vender, por exemplo, um
aplicativo de encontros amorosos pode dar super certo e fica evidente que se trata
apenas de uma história leve para vender um serviço.

O bom senso ganha sempre. Na dúvida, use a verdade e a franqueza, que sempre
funcionam. Aliás, aqui vem uma estratégia interessante.

Muitas vezes, nos apoiarmos em sucesso nos afasta de consumidores que não
conseguem se identificar com a situação.

Imagine que o público-alvo mal tem dinheiro para pagar o ônibus, quem dirá para
ter a casa própria. Mas, o produto que queremos oferecer para ele é um consórcio
residencial que, com um pouco de esforço e planejamento, ele conseguiria pagar.
Entretanto, se ao anunciar o produto colocamos alguém conhecidamente milionário,
o esforço de vendas não é convincente. Na situação em que o consumidor se en-
contra, ele não consegue se identificar com nenhum milionário. Mas, se colocamos
alguém que veio da mesma condição financeira que ele, que mostrou que conseguiu
superar os obstáculos e chegou a conquistar a casa própria, isso é muito vendedor.
Todos queremos nos sentir compreendidos em nossos limites, e abrir nossas fragi-
lidades não nos deixa mais fracos e sim mais poderosos quanto ao convencimento.

Fazer dinheiro já tendo dinheiro é uma coisa.

Fazer dinheiro sem ter quase nada para começar tem um valor completamente di-
ferente e mostra que a pessoa que conquistou isso merece nossa admiração e atenção.

O mais importante é saber que histórias, bem contadas, vendem.

E uma história não se conta apenas com palavras, mas também com imagens,
escolhidas a dedo.

Lembra da cozinha sofisticada que abordamos no exercício da lava-louças? Cada


elemento naquela cozinha conta uma história. Quem consegue ter uma cozinha
daquelas tem que ter uma história de sucesso por trás. Quem já orçou móveis de
cozinha sabe quanto custam. Uma geladeira de duas portas é um indicador de status.
Uma bancada no centro da cozinha indica as suas dimensões: não dá para ter uma

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cozinha daquele tamanho em um apartamento pequeno. A dona da cozinha não usa
bijuterias e sim joias. Os produtos à vista, como vinhos e temperos, são importados.
Os copos, de cristal; a iluminação, de design. Sem dizermos uma única palavra leva-
mos o pensamento dos clientes potenciais a um universo do qual eles querem fazer
parte e se para que isso aconteça eles tenham que adquirir uma lava-louças, ok, eles
estão dispostos a fazer isso.

Vender um carro com uma foto de estúdio é um recurso interessante. Mas, am-
bientar um carro em uma estrada sinuosa, na costa italiana, mostrando uma imagem
impressionante do mar mediterrâneo é vender um estilo de vida diferenciado. Não
importa que o comprador do carro nunca vá pisar em solo italiano, o que interessa
é que, ao dirigir o mesmo carro pelas ruas esburacadas de São Paulo, vai se sentir
dono de um bem que foi desenhado para paisagens paradisíacas...

Sim, é assim que funcionamos.

O produto é quase secundário, dependendo da história que nos contam.

Durante muitos anos, quando a publicidade de cigarros ainda era permitida, cada
um criava um personagem para ajudar o fumante a se identificar. Homens poderosos,
livres, aventureiros, corajosos... Havia um perfil para cada cigarro, que ajudava a dar
a seus usuários uma justificativa emocional para que pudessem consumir um produto
terrivelmente prejudicial à saúde.

Felizmente, esse tipo de publicidade está proibido, mas o recurso de uma boa
história continua mais válido do que nunca.

No momento de criar para publicidade, apoie-se nessa história e, se conseguir


estruturar uma campanha sólida, os resultados virão. Todo mundo gosta de ser en-
volvido em uma narrativa interessante, que dê muitos argumentos para justificar a
escolha de um produto em detrimento de outro.

Se dois produtos se equivalem, pode apostar que aquele que contar a melhor história vai
ser a escolha do consumidor. Sim, porque não queremos apenas consumir. O consumo em si
vem, muitas vezes, envolvido em culpa. Uma boa história ajuda a aliviarmos a nossa culpa,
nos dando elementos e argumentos para dizermos que o jeito com o qual gastamos o nosso
dinheiro está recheado de “causas nobres”, que vão além dos produtos em si.

Uma empresa que fabrica tênis e é contra trabalho escravo na China ou na Índia
é vista com olhos muito mais aprovadores do que aquela que não toca nesse tipo de
assunto tão polêmico.

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UNIDADE A Definição dos Roteiros

Os produtos podem ser similares, as duas marcas podem até ter o mesmo com-
portamento de irem contra o trabalho escravo, mas aquela que souber contar a me-
lhor história vai conquistar o consumidor no momento em que ele tiver que escolher
entre esta ou a outra marca.

Sim, queremos boas justificativas.

Se você quer ser um(a) bom(boa) criador(a), seja um(a) grande fornecedor(a) de
argumentos positivos.

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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Filme
Jobs
De hippie sem foco nos estudos a líder de uma das maiores empresas de tecnologia
do mundo. Este é Steve Jobs (Ashton Kutcher), um sujeito de personalidade forte e
dedicado, que não se incomoda de passar por cima dos outros para atingir suas metas,
o que faz com que tenha dificuldades em manter relações amorosas e de amizade.
https://youtu.be/pT2Rp7c9Qok

Leituras
Storytelling: o que é e como aplicá-lo no dia a dia da sua agência
Entenda o conceito de storytelling.
https://bit.ly/2Ex2OTJ
Storytelling: o que é, para que serve e exemplos práticos
Veja exemplos de storytelling na prática.
https://bit.ly/2FXJnUK
7 histórias interessantes por trás de marcas famosas
Marcas com histórias interessantes.
https://bit.ly/3hYUFVx

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UNIDADE A Definição dos Roteiros

Referências
BRENSON, R. Ouse: fazer o bem, se divertir, ganhar dinheiro. São Paulo: Saraiva,
2014. (e-book)

MCKEE, R. Story: substância, estrutura, estilo e os princípios da escrita de roteiro.


Curitiba: Arte & Letra, 2010.

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