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HEMATOLOGIA CLÍNICA E BANCO DE SANGUE


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HEMATOLOGIA CLÍNICA E BANCO DE SANGUE

DÚVIDAS E ORIENTAÇÕES
Segunda a Sexta das 09:00 as 18:00

ATENDIMENTO AO ALUNO
editorafamart@famart.edu.br
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Sumário

Introdução ...............................................................................................................4
FATORES DE CRESCIMENTO ..............................................................................8
SÉRIE ERITROCITÁRIA: ERITROPOESE ...........................................................17
MORFOLOGIA E FUNÇÕES DOS ERITRÓCITOS ..............................................19
HEMOGLOBINA....................................................................................................21
ANEMIAS ..............................................................................................................23
HEMOGLOBINOPATIAS.......................................................................................26
SÉRIE LEUCOCITÁRIA LEUCOPOESE ..............................................................29
MORFOLOGIA E FUNÇÕES DOS LEUCÓCITOS ...............................................30
ALTERAÇÕES QUALITATIVAS E FUNCIONAIS DOS LEUCÓCITOS ................31
LEUCEMIAS: CONCEITO, CLASSIFICAÇÕES E QUADRO HEMATOLÓGICO..33
PLAQUETAS: PLAQUETOPOESE, MORFOLOGIA E FUNÇÕES .......................36
HISTÓRIA, LEGISLAÇÃO DA HEMOTERAPIA E APLICABILIDADE
TERAPÊUTICA DOS HEMOCOMPONENTES .....................................................43
TÉCNICAS LABORATORIAIS E CONTROLE DE QUALIDADE EM
IMUNOHEMATOLOGIA ........................................................................................60
TÉCNICAS LABORATORIAIS PRÉ-TRANSFUSIONAIS E REAÇÕES
TRANSFUSIONAIS ...............................................................................................65
PROCEDIMENTOS E BOAS PRÁTICAS DE COLETA ........................................75
CONDIÇÕES PRÉ-COLETA (USO DE MEDICAMENTOS E PRÁTICA DE
EXERCÍCIOS FÍSICOS) ........................................................................................77
JEJUM E TEMPO DE GARROTEAMENTO ..........................................................78
ANTICOAGULANTES ...........................................................................................79
NOÇÕES SOBRE OS DIFERENTES MATERIAIS UTILIZADOS NA COLETA –
USO, ESCOLHA, DESCARTE, AGULHAS, TUBOS .............................................81
TEMPO DE SANGRAMENTO...............................................................................82
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Introdução

A hematologia é o estudo do tecido sanguíneo. O sangue é um tecido fluido


e muito importante, que desempenha várias funções no organismo, como
transporte de gases e nutrientes; mecanismos de defesa e mecanismos de
coagulação; regulação térmica, hídrica e equilíbrio do ácido-básico. Ele é composto
por células diferenciadas: glóbulos vermelhos (eritrócitos), glóbulos brancos
(linfócito, granulócitos e monócitos) e as plaquetas; e por uma porção líquida
(plasma) que possui diversas substâncias, e, dentre elas, os fatores responsáveis
pela coagulação.
O estudo da hematologia engloba a origem e a formação das células
sanguíneas, a fisiologia de cada uma delas, as alterações morfofuncionais do
sangue, a coleta e o fracionamento dos hemocomponentes utilizados em
hemoterapia, a fisiologia e diagnóstico das coagulopatias, as técnicas empregadas
no diagnóstico laboratorial do hemograma e outras peculiaridades pertinentes às
patologias do sangue.
Com este material, pretende-se abranger de forma clara e direta todos os
aspectos que envolvem a hematologia geral e clínica, hemoterapia e banco de
sangue, procedimentos de coleta, noções sobre as técnicas aplicadas ao
hemograma e perfis de coagulação.
A hemopoese, ou hematopoese, é o processo que explica a origem das
células sanguíneas. O volume total de sangue no indivíduo pode variar de acordo
com o sexo e com a idade. Para um homem adulto, o volume total de sangue
circulante está em torno de 3.500 a 5.800 ml. Para uma mulher adulta, a variação
fica em torno de 3.000 a 4.500ml. O sangue é formado por, aproximadamente, 50%
a 60% de plasma, sendo os outros 40% a 50% elementos figurados. A porção de
plasma tem aproximadamente 90% de água, e 10% dividido entre proteínas,
carboidratos, lipídeos, hormônios, sais minerais e eletrólitos. Dos elementos
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figurados, fazem parte os glóbulos vermelhos (hemácias ou eritrócitos), os glóbulos


brancos (linfócitos, granulócitos e monócitos) e as plaquetas.
Expondo em números, as quantidades de células presentes no tecido
sanguíneo são, aproximadamente, eritrócitos, na quantidade de 4.500.000 a
6.000.000/ mm³; glóbulos brancos, com a quantidade de 4.500 a 10.000/ mm³; e
plaquetas, na quantidade de 140.000 a 400.000/mm³, logicamente variando de
acordo com a idade, altura, peso e sexo.
O processo de formação das células sanguíneas ocorre nos órgãos
hematopoiéticos (medula óssea e sistema linfático), e, portanto, possui duas
linhagens: Mieloide e Linfoide.
A medula óssea é composta de células do estroma e de uma rede
microvascular, que constituem um microambiente adequado para a multiplicação e
a maturação de células-tronco. A medula óssea está presente até
aproximadamente o 3º ano de vida de um indivíduo, em praticamente todos os
ossos do corpo.
Durante a formação intrauterina, a hematopoese, ou hemopoese, passa por
diferentes fases. Sendo que, após o nascimento, outros órgãos e tecidos se tornam
responsáveis pela formação das células sanguíneas.

• Fase Pré-hepática ou embrionária: ocorre até o 2º mês de vida do


embrião no saco vitelino.
• Fase hepática: o fígado assume uma função hematopoiética até o 7º
mês de vida do feto.
• Fase fetal: a partir do 7º mês de vida intrauterina, funcionam o baço,
a medula óssea (M.O.), e os linfonodos até o nascimento.
• Pós natal: M.O. integralmente ativa, sendo altamente vascularizada
(vermelha), havendo, também, intensa atividade de timo e linfonodos. Há um
predomínio linfocítico nesta fase.
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A partir do 3º ano, inicia-se processo involutivo, em que ocorre um aumento


progressivo da porcentagem de gordura na medula, sendo chamada de medula
amarela (M.O. ativa apenas aos ossos do tronco: vértebras, costelas, crânio,
esterno, sacro, pelve e extremidade proximal do fêmur).

• Fase senil: após os 40anos, a produção fica equilibrada nos ossos


do tronco.

Em condições patológicas como na anemia grave, o baço e o fígado podem


voltar a produzir células, sendo este um processo conhecido como metaplasia
Mieloide, ou seja, uma hematopoese extramedular.
O processo da hemopoese tem início na medula, em uma porção reduzida
de células indiferenciadas, que são as células-tronco medulares chamadas stem
cell, ou simplesmente célula hemocitopoiética pluripotente. Estas células,
dependendo do estímulo que receberem pelos chamados fatores estimuladores da
proliferação e diferenciação celular, podem se transformar em células que darão
origem às linhagens Mieloide e Linfoide da hematopoese. Esses fatores de
diferenciação, proliferação e maturação celular são chamados de interleucinas e
fatores estimulantes de colônia, e têm sua função regulada por um mecanismo de
feedback, que faz com que haja maior ou menor produção celular, dependendo da
necessidade.
Ocorre, a partir desta célula-tronco pluripotente, a diferenciação para o setor
Mieloide ou Linfoide. No setor Mieloide, as células amadurecerão e serão
diferenciadas em hemácias, monócitos, granulócitos (basófilos, neutrófilos ou
eosinófilos) e plaquetas. Já a série linfocítica sofrerá diferenciação em linfócitos B
e linfócitos T.
A figura a seguir representa a hematopoese sanguínea em humanos e as
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diferenciações celulares sofridas pela Stem Cell (ST).

Figura - Hematopoese em humanos.


1- Célula tronco 2. Célula indiferenciada Mieloide 2.1. Megacarioblasto 2.2.
Megacariócito basófilo 2.3. Megacariócito acidófilo 2.4. Plaquetas 2.5. Pró-
eritoblasto 2.6. Eritoblasto basófilo 2.7. Eritoblasto policromático 2.8.Eritoblasto
ortocromático 2.9. Reticulócito 2.10. Eritrócito 2.11. Mastócito 2.12. Mieloblasto
2.13. Promielócito 2.14. Mielócito basófilo 2.15. Metamielófito basófilo 2.16.
Bastonete basófilo 2.17. Basófilo 2.18. Promielócito 2.19. Mielócito neutrófilo 2.20.
Metamielócito neutrófilo 2.21. Bastonete neutrófilo 2.22. Neutrófilo 2.23.
Promielócito 2.24. Mielócito eosinófilo 2.25. Metamielócito eosinófilo 2.26.
Bastonete eosinófilo 2.27. Eosinófilo 2.28 Monoblasto 2.29. Promonócito 2.30.
Monócito 2.31. Macrófago 2.32. Célula dendritica 3. Célula indiferenciada linfoide
3.1. Linfoblasto 3.2. Prolinfócito 3.3. Linfócito maduro 3.4. Células exterminadoras
naturais 3.5. Linfócto B 3.6. Linfócito T 3.7. Plasmócito 3.8. Célula dendritica
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Linfoide

FATORES DE CRESCIMENTO

Para regular as funções das células sanguíneas maduras e a diferenciação


e proliferação das células progenitoras hematopoéticas, existem fatores de
crescimento, que são hormônios glicoprotéicos.
Os fatores de crescimento possuem receptores específicos nas células-alvo.
Os linfócitos T, os monócitos (também os macrófagos) e as células do estroma são
as principais fontes dos fatores de crescimento. As exceções são a eritropoitina,
que é principalmente sintetizada pelo rim, e a trombopoitina, que é principalmente
sintetizada pelo fígado. A ação desses fatores de crescimento, também chamados
de interleucinas (IL), podem estimular a produção de outras interleucinas ou
receptores de fatores de crescimento.
Os fatores de crescimento também aumentam a sobrevida celular, evitando
a apoptose, que seria a morte natural da célula, mediada por proteínas
intracelulares. Esse processo é um importante regulador do mecanismo de
produção e maturação celular. Quando a célula cumpriu as funções para as quais
foi designada, Inicia-se, então, o processo de apoptose. Proteínas intracelulares
são ativadas para a digestão do núcleo e a desintegração do esqueleto celular.
A apoptose pode ser ativada por dois tipos de mecanismo. Um deles é a
ativação das proteínas da própria membrana celular, o outro seria a liberação da
substância citocromo c pela mitocôndria.
Sabendo como ocorre a morte celular natural, é possível observar o papel
dos fatores de crescimento, preservando a sobrevida celular. Pela ação dos fatores
de crescimento, ocorre o desenvolvimento, a maturação e a diferenciação celular,
para que as mesmas possam exercer as funções para as quais são designadas.
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Entre as propriedades e características comuns aos fatores de crescimento,


é possível citar:

• Todos ocorrem naturalmente, porém, muitos estão disponíveis na sua


forma purificada;
• a grande maioria deles é uma proteína de baixo peso molecular, que
deve se ligar a um receptor de membrana celular para exercer sua função;
• possuem atividade específica em graus variados.

Cada linhagem celular sofre diferenciação para manter as linhagens


celulares nas porcentagens adequadas às situações vigentes. Em, por exemplo,
um aumento de células da linhagem granulocítica em casos de infecção bacteriana,
ou um aumento da linhagem linfocítica para casos de infecções virais.
Este exemplo é uma forma de demonstrar como a hematopoese se comporta
de acordo com as necessidades do organismo perante situações específicas.
Dessa maneira, é possível compreender que, se há a necessidade de maior
produção de neutrófilos, os fatores de crescimento, ou as interleucinas
responsáveis pela diferenciação celular das Stem Cells, farão com que elas
amadureçam e se diferenciem em unidades formadoras de colônias mieloides, que,
por sua vez, serão estimuladas por outros fatores de crescimento, fazendo com que
a diferenciação e a maturação sejam para linhagem granulocítica e, por fim, lançada
na circulação um neutrófilo.

A formação de cada tipo de célula sanguínea

Uma célula-tronco hematopoiética, ou stem cell, é capaz de produzir até um


milhão de células sanguíneas maduras após sofrer até vinte divisões celulares.
Assim, podem ser produzidas até seis bilhões de células sanguíneas/dia/kg de peso
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de um indivíduo.
A stem cell multipotente, pela interação com os fatores de crescimento, dá
origem a dois tipos de células progenitoras: CFU-GEMM (unidade formadora de
colônia de granulócitos, eritrócitos, monócitos e megacariócitos) e CFU-L (unidade
formadora de colônias de linfócitos).
A CFU-GEMM, que é uma célula precursora Mieloide, estimulada pelos
fatores estimulantes de colônias (CSF), dá origem ao próeritroblasto. Esta célula é
o início da produção dos eritrócitos.
Paralelo a isto, a CFU-GEMM pode ser estimulada por outros CSF’, dando
origem a mieloblastos, que são as células precursoras dos granulócitos, ou aos
monoblastos, que antecedem a maturação do monócito, ou também podem dar
origem ao megacarioblasto, que antecede a maturação das plaquetas.
A CFU-L é a unidade formadora de colônia Linfoide, e, por interação aos
fatores estimulantes de colônias, dará origem aos linfoblastos.

CÉLULAS SANGUÍNEAS E FUNÇÃO

Conforme abordado anteriormente, o sangue é um tecido fluido, formado por


uma porção líquida (plasma) e uma porção “sólida” (elementos figurados ou células
sanguíneas). Essas células estão distribuídas de forma uniforme, e cada uma delas
tem suas próprias características e funções.
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Figura - Representação do sangue e seus componentes no interior do vaso


sanguíneo.

Glóbulos vermelhos são as hemácias ou os eritrócitos. Estão presentes em


cerca de 4,5 a 6 milhões/ mm3 de sangue. Cada hemácia tem uma vida média de
120 dias. Por dia são produzidos aproximadamente 1012 unidades de eritrócitos. A
formação completa, ou eritropoese, de um eritrócito a partir da stem cell é de
aproximadamente 7 dias. Sua principal função é o transporte de gases. Os
eritrócitos são compostos principalmente por hemoglobina, uma proteína que
contém ferro que se liga e transporta o oxigênio (O2) aos órgãos e tecidos. Os
eritrócitos do sangue arterial sistêmico transportam oxigênio (O2) dos pulmões aos
tecidos e voltam no sangue venoso, com o gás carbônico (CO2) aos pulmões.
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Figura - Imagem produzida por computação gráfica dos eritrócitos para


demonstrar a forma esférica e bicôncava das hemácias.
Fonte: 123RF®, ©vectomart, ID da imagem: 20922797

Figura - Imagem obtida por microscopia ótica demonstrando hemácias em


esfregaço realizado em lâmina e corado pelo corante Giemsa, demonstrando
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hemácias normais. A aparência do esfregaço não permite a visualização da


biconcavidade.
Fonte: Wikimedia Commons, ©Keith Chambers
(commons.wikimedia.org/wiki/File:Normal_Adult_Blood_Smear.JPG?uselang=pt-
br)
Glóbulos brancos são os leucócitos ou granulócitos (neutrófilos, basófilos e
eosinófilos). Esses três tipos de células têm em seu citoplasma grânulos
específicos, e suas funções estão ligadas à defesa do organismo. Estão presentes
em cerca de 5 a 10 mil/mm³ de sangue, tendo um curto tempo de vida na circulação,
de aproximadamente cinco a sete dias. A formação dos granulócitos ou
granulopoese dura aproximadamente onze dias. Estas células granulocíticas
maduras atravessam as paredes dos vasos em direção aos tecidos, nos quais
exercem suas funções de fagocitose e de destruição de agentes patogênicos. Após
saírem da corrente sanguínea, os granulócitos não retornam, e sua sobrevida fica
reduzida a apenas alguns dias.
Na formação da linhagem granulocítica existem três tipos de células que as
células progenitoras se diferenciam:

1. Neutrófilos: uma célula com núcleo denso e característico


(polimorfonuclear), apresentando de dois a cinco lobos. Apresentam granulação
secundária às células precursoras que apresentam também uma granulação
primária. O neutrófilo maduro tende a durar, na circulação periférica, de 10 a 12
horas. Uma pequena parte de neutrófilos maduros que foi produzida permanece na
medula óssea como uma população reserva, chamada de pool de reserva medular.
O aumento da contagem de neutrófilos no sangue periférico é característico de
processos infecciosos ou inflamatórios e é denominado neutrofilia. Em condições
normais, é possível observar a neutrofilia em recém-nascidos, mulheres grávidas e
após práticas de exercício físico.
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Figura - Neutrófilo segmentado ou granulócito polimorfonuclear. Observar a


granulação fina e o núcleo denso e multilobular.
Fonte:Wikimedia Commons, ©Ed Uthman
(commons.wikimedia.org/wiki/File:Hyperlobated_Neutrophil_(8612790151).
jpg?uselang=pt-br)

2. Eosinófilos: possuem progenitor Mieloide, porém diferem dos neutrófilos


por possuírem granulação diferenciada. Seus grânulos são compostos por uma
proteína alcalina que tem afinidade por corante ácido. Essa proteína é
particularmente prejudicial aos componentes da parede celular de muitos parasitas
e microrganismos. O núcleo também é segmentado, tendo raramente mais do que
três lobos. Os eosinófilos constituem cerca de 2 a 7% da contagem relativa do
leucograma no sangue periférico, e sua sobrevida na corrente sanguínea é um
pouco maior do que a dos neutrófilos. No esfregaço sanguíneo, apresentam um
citoplasma com grânulos de coloração róseo-alaranjada em virtude da alcalinidade
das proteínas granulares. Os eosinófilos penetram em exudatos inflamatórios, em
que seu principal papel é a remoção da fibrina formada durante a inflamação. Outra
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característica especial dos eosinófilos é a importante participação nas respostas


alérgicas e na defesa contra parasitoses. A figura a seguir representa um esfregaço
sanguíneo corado pela coloração de Leishman, e, em destaque, um eosinófilo com
núcleo segmentado e grânulos característicos apresentando coloração róseo-
alaranjada.

Figura - Eosinófilos com dois lobos e granulação mais grosseira e alaranjada.


Fonte: Wikimedia Commons, ©Ed Uthman (commons.
wikimedia.org/wiki/File:Eosinophils_in_peripheral_blood.jpg?uselang=pt-br)

3. Basófilos: constituem de 0,5 a 1% da celularidade do sangue


periférico, comparados aos outros granulócitos. Sua granulação é ácida, e, por
afinidade ao corante alcalino, têm seus grânulos corados de um azul escuro, quase
preto, ricos em histamina e heparina. Seu núcleo é igualmente segmentado, porém
não costuma apresentar mais de dois lobos. Geralmente estão envolvidos em
respostas alérgicas de hipersensibilidade imediata, causando rinites,
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broncoconstrição, reações anafiláticas a drogas e urticária. A basofilia periférica


pode ocorrer durante a lipemia pós-prandial (participam do metabolismo dos
triglicérides), e também nos casos de Policitemia Vera e leucemia mieloide crônica.
Nos casos de processos infecciosos agudos, esta célula não aparece circulante.
Na figura a seguir, é possível observar a granulação característica de um basófilo
em esfregaço de sangue periférico corado por Leishman.

Figura - Basófilo com granulação bem grosseira e escura. Fonte: Wikimedia


Commons, ©CS99

• Monócitos: são células grandes que se originam de células


precursoras da linhagem Mieloide, tendo sua formação denominada de
monocitopoiese. Permanecem pouco tempo na circulação (em torno de 8 horas) e
migram para os tecidos transformando-se em macrófagos, permanecendo nesta
condição por longos meses. Têm um citoplasma abundante e de coloração azul-
acinzentada. Podem apresentar uma fina granulação e, ocasionalmente, vacúolos.
Seu núcleo apresenta cromatina irregular com pontos de condensação.
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• Plaquetas: a formação das plaquetas, ou megacariocitopoiese, ou


simplesmente trombocitopoiese, constitui a fragmentação citoplasmática do
megacariócito maduro. Cada megacariócito é responsável pela formação de
aproximadamente 4 mil plaquetas, cuja sobrevida média normal é de 7 a 10 dias. A
principal função das plaquetas é a formação de um tampão mecânico durante a
resposta hemostática normal à lesão vascular e sua atividade coagulante.
• Linfócitos: são células que derivam de precursores da linhagem
Linfoide. Possuem citoplasma escasso e de coloração azulada, além de cromatina
nuclear condensada. Sua diferenciação celular produz células que sofrerão
maturação em linfócitos B e linfócitos T, sendo que cada um deles sofre essa
maturação em locais distintos. Os linfócitos B sofrem a diferenciação e maturação
na medula óssea, já os linfócitos T têm seus precursores, deixando a medula e
migrando para o timo, no qual sofrerão essa diferenciação. Os linfócitos também
compõem a linhagem de defesa, sendo seu principal papel a produção de
anticorpos (pelos linfócitos B) e a ação citotóxica (pelos linfócitos T). A ação
citotóxica dos linfócitos T pode causar doenças autoimunes.

SÉRIE ERITROCITÁRIA: ERITROPOESE

A eritropoese é regulada pelo hormônio eritropoetina e 90% da produção


desse hormônio renal (células intersticiais peritubulares), sendo os outros 10% de
produção hepática e outros locais.
Por dia, são destruídos e repostos de 0,8 a 1% do total de eritrócitos
circulantes. Este é um fenômeno adaptativo, pois pode ser alterado de acordo com
a necessidade de demanda, como, por exemplo, em casos de perdas hemorrágicas
a eritropoese pode aumentar cerca de 7 a 8 vezes.
O controle da eritropoese é feito por um feedback negativo, ou seja:
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Diminuição da Hemoglobina hipóxia renal


• estímulo da produção de eritropoetina
• eritropoetina estimula a M.O. a produzir eritrócitos
• aumento do número de eritrócitos e, consequentemente,
• aumento da hemoglobina.
Além da baixa de O2, hemorragias e exercício físico intenso também
estimulam a produção de eritrócitos. As células eritróides constituem de 10 a 30%
das células hematopoiéticas da medula óssea, e a sua formação se inicia nas
células-tronco pluripotentes.
A eritropoese pode ser dividida em dois compartimentos principais: o
compartimento de reprodução e o compartimento de maturação.
O compartimento de reprodução é onde ocorre a proliferação celular. O
próeritroblasto sofre uma única divisão, o eritroblasto basófilo se divide duas vezes
e o eritroblasto policromático se divide uma única vez. Já no compartimento de
maturação, não ocorrem mais as divisões celulares, uma vez que ali ocorre a
hemoglobinização e a perda do núcleo. Compreende o eritroblasto ortocromático e
o reticulócitos, que são ativos na síntese de hemoglobina, e o eritrócito maduro,
que não mais sintetiza hemoglobina.
O próeritroblasto é a primeira célula distinguível da série eritrocítica na M.O.
Seu citoplasma é intensamente basófilo (cor azulada) e de núcleo com cromatina
frouxa, apresentando dois ou mais nucléolos. Constitui cerca de 1% das células da
medula.
O eritroblasto basófilo já tem um núcleo de cromatina mais condensada e
não apresenta nucléolos. A basofilia citoplasmática diminui devido à
hemoglobinização. Constitui de 1 a 4% das células da medula.
O eritroblasto policromático tem a relação núcleo-citoplasma diminuída, e a
acidofilia citoplasmática aumenta ainda mais em virtude do aumento da síntese de
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hemoglobina. Constitui de 10 a 20% da celularidade medular.


No eritroblasto ortocromático, o núcleo é picnótico e excêntrico, o citoplasma
apresenta cor alaranjada e constitui em torno de 5 a 10% das células da medula.
Nos reticulócitos, as células já perderam o núcleo e o citoplasma acidófilo
ainda contém resquícios de DNA que se coram em azul. Os reticulócitos lançados
no sangue periférico permanecem nessa condição de 24 a 48 horas, até a
maturação completa em eritrócito.
Para avaliar a presença de reticulócitos que não se coram pelos corantes
utilizados normalmente para a avaliação do hemograma, utiliza-se uma técnica que
submete o sangue total a um corante chamado azul dicresil brilhante, que evidencia
a presença dos resquícios de DNA na hemácia, possibilitando, assim, a contagem
dos reticulócitos.
Por fim, o eritrócito propriamente dito, que é a célula madura, é responsável
pelo transporte dos gases e incapaz de sintetizar hemoglobina. Por esse motivo,
tem seu período ativo na circulação de 120 dias, quando ocorre um esgotamento
metabólico.

MORFOLOGIA E FUNÇÕES DOS ERITRÓCITOS

O eritrócito tem uma forma de disco bicôncavo flexível de aproximadamente


8µm e é capaz de passar repetidas vezes por capilares da microcirculação com
diâmetros de 3,5µm, sem perder seu equilíbrio osmótico.
A membrana da hemácia é uma camada dupla de fosfolipídios que segue o
modelo “mosaico fluido” em que estão ligadas as cadeias de açúcares que dão
origem aos antígenos eritrocitários do grupo ABO.
O interior da hemácia é desprovido de organelas e de núcleo. Durante a
formação, as células precursoras dos eritrócitos possuem núcleo e organelas que
são expulsos durante o processo de maturação.
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Figura - Estrutura da membrana celular da hemácia.

Após 120 dias de vida do eritrócito, o baço realiza a função de tirá-lo da


circulação periférica, que ocorre da seguinte maneira:

• Destroem pelos macrófagos do baço, que digerem a membrana celular;


• separam o grupo heme da hemoglobina;
• hidrolisam a globina (liberando aminoácidos);
• removem o ferro do grupo heme;
• convertem o heme em biliverdina;
• convertem biliverdina em bilirrubina indireta.

Os aminoácidos, então, são reaproveitados. O ferro retorna à circulação


formando reservas ou é reaproveitado, e a bilirrubina indireta é conjugada pelo
fígado, transformando-se em bilirrubina direta, sendo eliminada pelas fezes como
estercobilinogênio e pela urina como urobilinogênio.
As alterações que podem ocorrer com os eritrócitos e que são importantes
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achados no hemograma são:

• TAMANHO (anisocitose):

– microcitose (hemácias pequenas);


– macrocitose (hemácias grandes).

• FORMA (poiquilocitose):

– codócitos (em forma de alvo);


– acantócitos (espículada);
– dacriócitos (em forma de lágrima);
– esferócitos (formas redondas);
– eliptócitos (forma alongada ovoide);
– estomatócitos (forma com halo transparente em formato de boca).

• COR (anisocromia):

– hipocromia (coloração pálida);


– hipercromica (termo empregado nos casos de hcm maior do que o
normal);
– policromasia (quando existe mais de uma população eritrocítica, como,
por exemplo, eritrobastos poli ou ortocromáticos).

HEMOGLOBINA
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A hemoglobina é o principal componente da hemácia, mas em seu interior


também se encontram íons, glicose, enzimas e água. A hemácia, como um todo,
tem o objetivo de manter a hemoglobina funcional e ativa, e, para isso, o eritrócito
possui um sistema metabólico capaz de viabilizar esses componentes.
Se houver alterações no conteúdo proteico da hemácia, estrutural ou
quantitativa, essas alterações podem levar a uma hemólise precoce do eritrócito.
Alguns fatores exógenos são importantes para a eritropoese e,
consequentemente, a síntese de hemoglobina, como: ferro sérico, vitamina B12 e
folatos.

Tabela - Valores normais de eritrócitos (x106/mm³)

Recém-nascidos 4 - 5,6
Crianças (3 meses) 4,5 - 4,7
Crianças (1 ano) 4,0 - 4,7
Crianças (10 – 12 anos) 4,5 – 4,7
Mulheres (grávidas) 3,9 – 5,6
Mulheres (não grávidas) 4,0 – 5,6
Homens 4,5 – 6,5
Adaptado de: Hoffbrand,A.V.; Pettit,J.E.;Moss, P.A.H. Fundamentos em
Hematologia. 4a Ed. Artmed. Porto Alegre.2004.

A molécula de hemoglobina é formada por uma porção heme e a porção


proteica globina. A porção heme é composta por quatro grupos contendo um átomo
de ferro em cada. A porção globina é composta por dois pares de cadeias
polipeptídicas e dois pares de cadeias .porção heme é a responsável por carrear o
oxigênio, pois o mesmo tem afinidade pelos átomos de ferro existentes nessa
porção. Já a porção globina é a que tem afinidade pelo gás carbônico e é onde esse
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gás se liga para poder voltar ao pulmão e ser expelido. Essa ligação do gás
carbônico com a porção globina forma a carboxihemoglobina.
A síntese da porção heme ocorre nas mitocôndrias das células precursoras
dos eritrócitos, sendo que o reticulócito é responsável por cerca de 35% da
produção total da hemoglobina. Para a síntese da porção heme, é necessário um
suprimento adequado de ferro que chega às células precursoras pelo sangue
através da ferritina; e da síntese das protoporfirinas.
Para completar a síntese da hemoglobina, a porção globina deve ser
sintetizada, ocorrendo nos ribossomos através da expressão dos genes herdados.
As cadeias polipeptídicas agrupam-se de 2 em 2, formando diferentes tipos de
hemoglobina. Alterações na síntese da globina podem ocasionar defeitos na
funcionalidade e na atividade do eritrócito.

ANEMIAS

Anemia é o estado em que a concentração de hemoglobina está abaixo dos


valores de normalidade. Acidentes, cirurgias, hemorragias no tubo gastrintestinal e
hemorragias genitais são as causas mais frequentes da hemorragia aguda. O
volume perdido de sangue indica se há a necessidade de intervenção imediata,
através de transfusões, evitando, assim, o choque hipovolêmico. Entretanto, se o
volume perdido for pequeno, o organismo recupera-se espontaneamente por
mecanismos fisiológicos. Muitas anemias são resultados da produção insuficiente
de eritrócitos pela medula óssea.
Embora haja uma pequena variação entre os laboratórios, é possível
considerar quadros de anemia quando os pacientes apresentem valores de
hemoglobina menores que 13,5 g/dl para homens adultos, menores que 11,5 g/dl
para mulheres adultas e menores que 11 g/dl para crianças a partir dos três meses
de idade até a puberdade.
24

A altitude da localidade em que vive o indivíduo também deve ser


considerada, pois a concentração de O² por unidade de volume de ar atmosférico
diminui à medida que a altitude aumenta.
A carência de vitamina B12 ou de ácido fólico resultam em anemias
megaloblásticas. Esta anemia caracteriza-se pela inibição da síntese de DNA,
resultando em um defeito da multiplicação celular e da maturação nuclear, ou seja,
carência nos fatores de reprodução. Porém, o citoplasma continua se
desenvolvendo, o que gera um crescimento celular anormal (macrocitose).
Algumas outras situações podem causar macrocitose sem serem consideradas
anemias megaloblásticas. São elas: alcoolismo, hepatopatias, drogas citotóxicas,
síndromes mielodisplásicas, anemias aplásicas, gravidez, tabagismo, mieloma e
em recém-nascidos.
Nas anemias microcíticas, ocorre uma diminuição da quantidade de
hemoglobina sintetizada pela célula, acarretando na formação de hemácias de
menor volume. Tais anemias podem ser de três tipos: ferropriva, sideroblástica e
talassemia.
Na anemia ferropriva, a deficiência é do fator de maturação (ferro), que é um
importante fator na hemoglobinização de hemácia. A deficiência do ferro pode estar
relacionada à ingestão, à absorção ou ao transporte e ao estoque. A deficiência na
absorção pode estar ligada ao tipo de alimento ingerido. O ferro da carne, por
exemplo, é imediatamente absorvido. Em alguns alimentos, o ferro livre pode formar
complexos insolúveis com determinadas substâncias e ser excretado. Também
pode ocorrer a chamada anemia perniciosa, em que a má absorção está ligada à
lesão autoimune, que leva à atrofia da mucosa gastrointestinal.
A anemia sideroblástica é caracterizada por hipocromia no sangue periférico
e aumento do ferro medular. Também chamada de anemia refratária, é classificada
em diferentes tipos, sendo que o elo comum entre elas é um defeito na síntese do
grupo heme, que pode fazer com que haja no sangue periférico eritroblastos
25

anormais com um anel perinuclear de grânulos de ferro.


As hemácias circulantes possuem uma vida de aproximadamente 120 dias
a partir da saída da medula óssea. Entretanto, se o tempo de sobrevida for menor,
ocorrerá a síndrome hemolítica. Se a medula óssea não for capaz de compensar
essa destruição, consequentemente acontecerá a anemia. Nas anemias
hemolíticas, as hemólises têm a possibilidade de acontecer de modo intravascular,
ou extravascular, em que as células são capturadas e digeridas pelos macrófagos
no baço ou no fígado. As anemias hemolíticas podem ser divididas em dois grupos:
intrínsecas (quando o defeito está no eritrócito) ou extrínsecas (quando a causa da
hemólise é uma agressão externa ao eritrócito).
No caso da anemia hemolítica extraglobular, ou extrínseca, a destruição das
hemácias pode ser por alguma substância tóxica, como picada de serpentes ou
parasitoses, destruição por traumas mecânicos (doenças vasculares como CIVD)
ou por anticorpos (como DHRN e anemias autoimunes e aloimunes).

No grupo das anemias hemolíticas intrínsecas, é possível citar:

• Esferocitose hereditária (EH), que é causada por um defeito nas


proteínas da membrana celular que faz com que o eritrócito maduro perca
gradativamente a biconcavidade e se torne esférico;
• deficiência de G6PD (deficiência metabólica), que é causada por um
defeito genético que faz com que haja hemólise em resposta ao estresse oxidativo.
Este processo é mais comum em homens (herança ligada ao sexo) e negros
orientais ou mediterrâneos, ocasionando deficiência grave em indivíduos brancos;
• hemoglobinúria paroxística noturna (HPN), que é uma anemia
hemolítica adquirida que se caracteriza por hemólise intravascular e
hemoglobinúria, geralmente noturna. Ocorre em virtude de um defeito na
membrana do glóbulo vermelho.
26

Alguns sintomas são característicos causados pela baixa dos níveis de


oxigênio no organismo. São eles: fraqueza muscular, taquicardia, tonturas,
zumbidos no ouvido, hipertensão arterial, amenorréia, sopros cardíacos,
hipodesenvolvimento, sinais de insuficiência cardíaca, palidez cutaneomucosa e
dispneia.

HEMOGLOBINOPATIAS

Hemoglobinopatias são defeitos nas sínteses das porções globina, ou seja,


alterações genéticas que afetam a produção normal das cadeias alfa e beta da
porção polipeptídica da hemoglobina.
Dentre as mais comuns, é possível citar: Hemoglobinopatias S (anemia
falciforme), que apresenta cadeias beta anormais e, ao ser exposta a baixas
concentrações de oxigênio, precipita-se em longos cristais no interior da hemácia.
Esses cristais alongam a hemácia dando-lhe a aparência de foice e não de disco
bicôncavo.
Figura - Hemácias em formato de foice, em esfregaço comum corados por
corante panótico.

Fonte da imagem Fonte: Flickr®, ©Ed Uthman (flickr.com/photos/euthman/)


27

Observa-se Hb de 5-8 g/dl, bilirrubina indireta (BI) 2-6 mg%, reticulócitos (Rt)
> 15%, hipocromia e eliptocitose; drepanócitos (inconstantes); sinais regenerativos,
eritroblastos, leucocitose, plaquetas aumentadas ou normais; corpúscolos de
Howell-Jolly. Confirmação: teste de falcização e eletroforese de hemoglobina.
Síndromes Talassêmicas (Talassemia alfa ou beta): na Talassemia há
diminuição na síntese de cadeia da hemoglobina. Clinicamente aparece como: –
Major: anemia de Cooley. Há alterações ósseas típicas, anemia intensa,
trombocitopenia e leucopenia, além de Hb entre 2-3g/dl;

• Intermédia: anemia hemolítica moderada;


• Minor: anemia microcítica e hipocrômica;
• Mínima: assintomática;
• Talassemia alfa: é mais rara que a . Nela, há redução de síntese de
cadeias , que normalmente é composta de 141 aminoácidos. A expressão gênica é
variável, acarretando, também, variações clínicas;
• Hidropsia Fetal: Hb Barts ( 4), sendo incompatível com a vida.

Doença da Hb H: a Hb H ( 4) apresentam níveis que variam de 5 a 30%.


• Traço Talassêmico alfa: dificilmente diagnosticada em adultos.

Anemia aplásica: estudos correlacionam o desenvolvimento da anemia


aplástica ou aplasia medular com exposição a drogas, agentes químicos, radiação
e uma variedade de doenças (agentes virais, como hepatite e HIV, bem como
doenças imunes). Pode ser adquirida quando não há qualquer fator predisponente
para o seu desenvolvimento ou constitucional; quando há associação a
determinadas doenças congênitas, genéticas ou familiares. Ocorre queda nos
valores dos eritrócitos, neutrófilos e plaquetas. Manifestações hemorrágicas
secundárias à trobocitopenia são as mais alarmantes. Habitualmente, elas se
28

exteriorizam por petéquias na pele, sangramento de gengivas e expistaxe. Na


vigência da infecção, a pancitopenia se agrava. As hemácias são normocrômicas e
moderadamente macrocíticas. Os reticulócitos variam de 0 a 3%. Também pode
apresentar neutropenia e monocitopenia.

POLIGLOBULIAS / POLICITEMIAS

A policitemia, ou poliglobulia, está relacionada ao aumento de todas as


linhagens sanguíneas da circulação periférica. As policitemias podem ser
classificadas em:

• Policitemia relativa (diminuição do volume plasmático);


• policitemia absoluta (aumento da celularidade no sangue),

A policitemia absoluta divide-se em secundária, familial benigna e vera.

Policitemia relativa aguda pode acontecer em casos agudos que resultem


em hemoconcentração, como queimaduras, diarreias, sudorese intensa, choque e
altitudes elevadas.
A policitemia absoluta secundária pode estar relacionada com fatores como
estímulo hipóxico (más-formações cardíacas e vasculares, distúrbios pulmonares,
pressões barométricas baixas), produção inapropriada de eritropoetina e excesso
de esteróides ou adenocorticóides.
A policitemia familial benigna é mais comum em crianças com um aumento
de massa eritrocitária sem leucocitose ou trombocitose.
A policitemia vera é um distúrbio mieloproliferativo (a medula óssea é
hiperplásica), que ocasiona um aumento de eritrócitos, leucócitos e plaquetas
geralmente acompanhados de esplenomegalia. A maioria das manifestações
29

clínicas está relacionada ao aumento do volume e da celularidade sanguínea,


causando sobrecarga cardiovascular com trombose microvascular, provavelmente
pelo aumento da viscosidade sanguínea e consequente diminuição do fluxo, bem
como o aumento do número de plaquetas. Os valores obtidos nos hemogramas de
indivíduos com policitemia vera são impressionantes, havendo uma contagem de
eritrócitos de 6 a 10 milhões/mm³, hematócrito acima de 55%, hemoglobina entre
18 e 24g/dl, leucometria podendo chegar a 25.000/mm³ e plaquetas acima de
500.000/mm³.

SÉRIE LEUCOCITÁRIA LEUCOPOESE

Como já foi observado, a granulopoese provém da linhagem Mieloide, que,


dependendo dos fatores de crescimento, maturação e diferenciação, formarão os
neutrófilos, basófilos e eosinófilos. A granulopoese dura de 10 a 11 dias e ocorre
nos compartimentos a seguir:

• Compartimento de reprodução, em que ocorre as divisões celulares


dos Mieloblastos, promielócitos e mielócitos;
• compartimento de maturação, em que ocorre o aparecimento das
granulações específicas e o processo de lobulação do núcleo. Nesse
compartimento, estão presentes metamielócitos, bastonetes e segmentados.
• compartimento marginal, que abriga na monocamada endotelial dos
vasos sanguíneos uma considerável reserva de neutrófilos. Dependendo do
estímulo aplicado (como exercícios físicos, ansiedade, ou alimentação), podem
resultar em uma leucocitose transitória.

Existem as seguintes células granulocíticas:


30

• Mi= Mieloblasto. Apresenta escassas granulações primárias, núcleo


grande, cromatina frouxa e pode ser visualizado um ou mais nucléolos.

• PM= Promielócito. Apresenta nucléolos pouco evidentes, sendo que a


cromatina se torna mais condensada.

• M = Mielócito. Apresenta o início da granulação específica (secundárias).


O núcleo é geralmente oval e excêntrico, e os nucléolos não são mais evidentes.
Corresponde de 2 a 10% da celularidade medular.

• MM, MMb e MMe = Metamielócito neutrófilo, metamielócito basófilo e


metamielócito eosinófilo. Inicia a envaginação nuclear, sendo que este não é mais
capaz de dividir-se. As granulações específicas são mais abundantes.

• BT, BTb e BTe = Bastonete neutrófilo, bastonete basófilo e bastonete


eosinófilo. Apresentam chanfradura nuclear intensa, deixando-o na forma de
bastão. Constituem de 1 a 5% da celularidade da circulação periférica, e de 10 a
40% da celularidade medular.

• SG, SGb e SGe = Segmentado neutrófilo, segmentado basófilo e


segmentado eosinófilo. O núcleo é separado em lobos (de 2 a 5) interligados por
filamentos finos de cromatina. A granulação do neutrófilo é fina e rósea, do basófilo
é densa e escura, e do eosinófilo é alaranjada e grosseira.

MORFOLOGIA E FUNÇÕES DOS LEUCÓCITOS

Os neutrófilos têm sua vida média na circulação de 7 a 8 horas, distribuindo-


se pelos tecidos de forma aleatória. Atuam na defesa do organismo em virtude de
31

suas propriedades de mobilidade, quimiotaxia, fagocitose e digestão de


microrganismos. Quando na vigência de um processo inflamatório, podem
apresentar, em seu citoplasma, vacúolos, granulações toxicas ou inclusões
citoplasmáticas. A neutropenia, quando não genética, pode ocorrer em
determinadas infecções, como rubéola, gripe, mononucleose, malária, entre outras.
A principal característica dos eosinófilos é a coloração grosseira e alaranjada
do seu citoplasma. Essa granulação é formada por um cristal tóxico para alguns
parasitas e algumas células tumorais. Normalmente, deixam a circulação periférica
dentro de 8 horas e migram para os tecidos, nos quais permanecem por mais 12
horas. Embora seja uma célula capaz de realizar fagocitose, acredita-se que esta
não seja sua função principal, pois participa modulando os processos imunológicos
de sensibilidade. A eosinofilia está presente em processos alérgicos e em algumas
infestações parasitárias.
Os basófilos possuem grânulos ricos em histamina e heparina, e seu
mecanismo de ação está particularmente envolvido nas reações alérgicas de
hipersensibilidade imediatas. Os basófilos aparecem, também, na policitemia vera
e na leucemia Mieloide crônica.

ALTERAÇÕES QUALITATIVAS E FUNCIONAIS DOS LEUCÓCITOS

Os granulócitos segmentados estão presentes na circulação periférica, mas,


quando aumentados nas contagens absolutas, estão geralmente associadas a
processos infecciosos e inflamatórios. Se aparecer na circulação, além dos
segmentados, bastonetes e metamielócitos, trata-se de um desvio à esquerda.
Os quadros de leucocitose podem apresentar neutrofilia, eosinofilia ou
basofilia. Como citado anteriormente, o aumento da celularidade da circulação
periférica pode estar relacionado a diversos fatores, como:
A neutrofilia acontece nos quadros de leucocitose relacionadas,
32

principalmente, às infecções bacterianas. A eosinofilia é o aumento da população


de eosinófilos na vigência de processos alérgicos ou em infestações parasitárias.
Já a basofilia está associada às reações anafiláticas ou processos mais severos,
como na policitemia vera ou na leucemia Mieloide crônica.

Figura - Eosinofilia absoluta. Fonte: Wikimedia Commons, ©Ed Uthman


(commons.wikimedia.org/wiki/File:Eosinophils_in_
peripheral_blood.jpg?uselang=pt-br)
Quanto mais grave o processo infeccioso, maior será o desvio à esquerda,
pois a medula terá um tempo insuficiente para realizar a maturação das células que
estão sendo lançadas na circulação.
Outra condição que gera leucocitose é a reação Leucemoide, que
caracteriza-se pelo aumento exagerado dos glóbulos brancos, podendo ser
confundida com LMC. Ela é reacional e consequente a um processo infeccioso.
Anormalidade corrigida com erradicação da infecção.

Tabela - Tabela comparativa de uma reação Leucemoide em


comparação a uma condição leucêmica.

Reação Leucemoide Reação Leucêmica


33

Nº de GB 30 a 60.000/mm³ 20 a 50.000/mm³
Eosinófilos e basófilos Diminuídos Elevados
Série vermelha Normo/normo Normo/normo
Plaquetas Morfologia normal Plaquetas gigantes
Fosfatase alcalina dos Aumentada Reduzida ou ausente
neutrófilos
Neutrófilos Desvio escalonado Desvio não escalonado
Adaptado de: Oliveira, M.R.A de A. Hematologia Básica – Fundamentos e
Estudo Laboratorial. 2a Ed. American Med. São Paulo. 1998.

LEUCEMIAS: CONCEITO, CLASSIFICAÇÕES E QUADRO


HEMATOLÓGICO

O termo leucemia refere-se a um grupo de doenças complexas e diferentes


entre si que afetam a produção dos glóbulos brancos, também chamados de
leucócitos, que são células responsáveis pela defesa do organismo.

Existem os seguintes tipos de leucemia:

• Leucemia Mieloide aguda (LMA);


• leucemia Mieloide crônica (LMC);
• leucemia Linfoide aguda (LLA);
• leucemia Linfoide crônica (LLC).

A causa exata ainda não é conhecida, mas a doença tem sua probabilidade
influenciada por fatores genéticos e ambientais que resultam de mutações
somáticas no DNA, as quais podem ocorrer espontaneamente ou em função de
exposição à radiação ou a substâncias cancerígenas.
A leucemia aguda é caracterizada pelo crescimento rápido de células
34

imaturas do sangue. Ocorre o acumulo de células malignas, que invadem a


circulação periférica e outros órgãos. Em geral, acomete crianças, adultos e jovens.
A leucemia crônica é caracterizada pelo aumento de células maduras, porém
anormais. Sua progressão pode demorar de meses a anos. Geralmente, acomete
pessoas mais velhas.
As leucemias são classificadas entre linfoblásticas ou leucemias Linfoides,
que indicam que uma mudança cancerosa ocorreu em um tipo de célula da medula
óssea. Essa célula geralmente toma forma de linfócitos e leucemias Mieloides, que
podem ter vários subtipos: mieloblástica, promielocítica, mielomonocítica,
monocítica, eritrocítica e megacariocítica.
As células leucêmicas ocupam cada vez mais a medula óssea, não deixando
mais as células normais (hemácias, leucócitos e plaquetas) se reproduzirem
normalmente e saírem da medula óssea, causando os seguintes sintomas:
Síndrome anêmica: aparecem pela redução da produção dos eritrócitos pela
medula óssea. Outros sintomas que também são associados à leucemia são:
sonolência, cansaço, irritabilidade, fraqueza, redução de apetite e consequente
emagrecimento, palpitações, dores de cabeça, tonturas e desmaios.
Hematomas (manchas roxas) que aparecem e reaparecem,
sucessivamente, após pequeno trauma ou grandes manchas que aparecem e
reaparecem sem trauma algum. Ocorre o aparecimento de Petéquias na pele
(pequenos pontinhos vermelhos de sangue que aparecem na pele) e dentro da
boca, além de sangramento gengival, menstruação excessiva (no caso das
mulheres) e, algumas vezes, sangue nas fezes.
Ocorre a presença de células imaturas ou uma proliferação excessiva de
células aparentemente maduras. O hemograma não serve para classificar a
leucemia, mas geralmente é o primeiro exame em que se nota alguma alteração.
Nele, também se verifica se há presença de anemia e trombocitopenia.
35

• Leucemia Linfoide aguda (LLA): os linfoblastos são células da


linhagem Linfoide que possuem a capacidade de multiplicação, mas não a de
diferenciação. Essas células estão presentes em grande número na medula óssea,
no timo e nos gânglios linfáticos. A incidência da LLA é maior em crianças do que
em adultos. Seu diagnóstico pode ser feito por meio de estudos imunofenotípicos
por citometria de fluxo e biologia molecular. O hemograma pode revelar anemias
normocítica e normocrômica e trombocitopenia. A medula óssea encontra-se
hipercelular com substituição dos espaços adiposos e elementos medulares
normais por células leucêmicas.

• Leucemia Mieloide aguda (LMA): é uma doença maligna, resultante


de uma alteração genética adquirida (não herdada) no DNA de células em
desenvolvimento na medula óssea. Pode ocorrer em vários passos da
diferenciação celular. Os mieloblastos são células que perderam a capacidade de
diferenciação, mas mantêm a capacidade de multiplicação. Os exames realizados
para estabelecer o diagnóstico nos mieloblastos leucêmicos são citoquímica,
imunofenotipagem e biologia molecular.

• Leucemia Linfoide crônica (LLC): resulta de lesão adquirida (não


hereditária) no DNA de uma única célula, e de um linfócito da medula óssea. Essa
lesão confere à célula maior capacidade de crescimento e sobrevivência, tornando-
a anormal e maligna (leucêmica). Há um grande aumento das células leucêmicas
na medula óssea e, consequentemente, no sangue, porém, isso não impossibilita
a produção de células saudáveis. A LLC é incomum em indivíduos com menos de
45 anos de idade. Através de exames, é possível observar o aumento de linfócitos
no sangue e na medula óssea.

• Leucemia Mieloide crônica (LMC): é uma doença clonal maligna


36

caracterizada pelas seguintes linhagens:

– Fase Crônica (FC): excessiva proliferação da linhagem Mieloide;


– Fase Acelerada (FA): perda progressiva da diferenciação celular;
– Fase Blástica (FB): leucemia aguda.

Na LMC, ocorre a formação de um novo gene leucemia-específico, o BCR-


ABL, detectável por polymerase-chain-reaction assay (PCR). O transplante de
medula óssea é a única modalidade curativa.

PLAQUETAS: PLAQUETOPOESE, MORFOLOGIA E FUNÇÕES

A plaqueta sanguínea, ou trombócito, é um fragmento citoplasmático


anucleado, que é formado na medula óssea a partir do megacariócito. Ela participa
do processo de coagulação sanguínea. Uma pessoa normal tem de 150.000 e
400.000 plaquetas por milímetro cúbico de sangue. Sua diminuição ou disfunção
pode levar a sangramentos, assim como seu aumento pode aumentar o risco de
trombose.
Algumas condições podem levar a uma alteração nas contagens
plaquetárias, como, por exemplo: aumento do sequestro esplênico, aumento da
destruição plaquetária, indução por fármacos e dengue. As plaquetas apresentam
cerca de 2 a 4µ de diâmetro, e uma vida média de 9 dias na circulação periférica.
Um indivíduo normal possui 2/3 da produção plaquetária circulante e 1/3 no baço.
A trombocitopoese ocorre da linhagem mielocítica medular e sua
diferenciação é seguida por megacarioblasto, promegacariócito, megacariócito
granular e megacariócito liberador de plaquetas. O precursor do megacariócito é o
megacarioblasto, que surge por intermédio de diferenciação da célula- tronco
37

hematopoiética. A principal responsável pela regulação da trombopoiese é a


trombopoitina, a qual aumenta o número e o ritmo de maturação dos
megacariócitos.
As glicoproteínas de revestimento da superfície plaquetária são
extremamente importantes nas reações de adesão e agregação que levam à
formação do tampão plaquetário.

ALTERAÇÕES: PÚRPURAS E TROMBOCITOPENIAS – CONCEITO,


CLASSIFICAÇÃO, QUADRO HEMATOLÓGICO E LABORATORIAL

As trombocitopenias são a diminuição das plaquetas no sangue periférico.


Elas ocorrem por produção insuficiente, destruição, utilização ou sequestração
excessiva das plaquetas pelo baço. A deficiência de produção ocorre nas aplasias
medulares ou infiltrações leucêmicas, que geram um número deficiente de
megacariócitos. Nos casos de carência de vitamina B12 e ácido fólico também pode
haver uma trombocitopoese ineficaz.
Por destruição ou utilização excessivas, quando associadas a mecanismos
autoimunes, em que a presença de anticorpos pode provocar destruição
plaquetária (DHRN, transfusão) ou por auto anticorpos de origem idiopática. O
aumento do consumo, como no caso da CIVD, por alteração na superfície vascular
também constitui causa de trombocitopenia.
A púrpura trombocitopênica idiopática (PTI) pode ser dividia em forma
crônica e aguda. A forma crônica é relativamente comum e tem uma alta incidência
em mulheres de 15 e 50 anos. A forma mais comum da PTI crônica é idiopática,
porém, pode ocorrer associada a outras doenças, como lúpus eritematoso
sistêmico, infecções por HIV e HCV, leucemia linfocítica crônica, doença de
Hodgkin e anemia hemolítica autoimune.
Quando as plaquetas são sensibilizadas por anticorpos, resulta na remoção
38

prematura da circulação pelos macrófagos do sistema reticulo-endotelial,


especialmente do baço. A sobrevida média das plaquetas na circulação é de
aproximadamente 7 dias, mas nos casos de PTI essa sobrevida é reduzida para
poucas horas.
A PTI aguda é mais comum em crianças, sendo que a maioria dos casos se
deve à ligação a imuno complexos inespecíficos, por processos de vacinação e
infecção por varicela ou mononucleose infecciosa. Felizmente, a morbidade e a
mortalidade na PTI são muito baixas.
A trombocitopenia pode ser induzida por drogas, sendo a quinina e a
heparina as drogas mais comumente associadas à trombocitopenias.
No diagnóstico laboratorial são avaliadas as contagens plaquetárias. Os
valores de referência normais para plaquetas estão em torno de 150.000 a
400.000/ml de sangue. Nos casos de trombocitopenias, essa contagem chega a
ficar abaixo dos 100.000/ml. O esfregaço sanguíneo demonstra um número
reduzido de plaquetas, sendo que as mesmas estão em tamanho aumentado
(macroplaquetas). A medula óssea pode apresentar numero normal ou aumentado
de megacariócitos. Dosagens de anticorpos associados às contagens plaquetárias
costumam ser inespecíficas.

Figura - Petéquias. Pequenos pontos avermelhados pela pele que podem


39

estar ou não acompanhados de hematomas.


Demonstram a fragilidade capilar e a diminuição nas contagens plaquetárias
(trombocitopenia).
Fonte: Flickr®, ©Care_SMC (flickr. com/photos/75491103@N00/)

HEMOSTASIA E COAGULAÇÃO

A hemostasia é baseada na finalização fisiológica de um sangramento,


impedindo perdas de sangue de uma lesão vascular, além de conservar a fluidez
do sangue, evitando, com isso, a formação de trombos. Assim, conclui-se que em
um indivíduo saudável acontece um equilíbrio entre a manutenção do sangue em
sua forma líquida e sua capacidade de consolidar-se em um ponto de lesão da
árvore circulatória. Um desequilíbrio nos elementos da hemostasia apresenta a
possibilidade de causar doenças trombofílicas ou hemorrágicas. Os fatores que
participam da hemostasia são:

• vasos sanguíneos: participam da hemostasia por sua centralidade no


local da lesão vascular e pela propriedade de resistência a variações da pressão
intravascular. Ademais, a parede vascular participa da hemostasia por meio da
secreção de substâncias anticoagulantes e substâncias coagulantes;

• plaquetas: contribuem para a hemostasia pela capacidade de se juntar


e aderir às lesões vasculares. Ajudam a aumentar a Vasoconstrição, iniciam a
reconstituição da parede vascular, além de fornecerem fosfolipídios para as
reações da coagulação.

As plaquetas e os vasos sanguíneos são os elementos que motivam a fase


inicial da interrupção de um sangramento, na qual tal fase pode ser chamada de
40

hemostasia primária (processo em que se produzem um tampão plaquetário no


local do traumatismo vascular). Tal processo depende de uma aderência
plaquetária e de uma Vasoconstrição rápidas. A superfície da árvore circulatória é
envolvida por uma monocamada de células endoteliais. Tais células mostram
propriedades anticoagulantes, que ajudam na fluidez do sangue em condições
normais. Entretanto, nos lugares de lesão vascular, as células endoteliais vão de
um estado de antitrombótico para pré-trombótico, em que obtêm a perda de
substâncias antiplaquetárias. Apesar de a hemostasia primária interromper o
sangramento, a força de cisalhamento do fluxo sanguíneo é considerável para diluir
esse tampão. A partir disso, nota-se a importância da hemostasia secundária, uma
vez que ela aumenta a “rolha” plaquetária diante da formação de um coágulo
estável de fibrina, chamado de tampão hemostático.
Coagulação fundamenta-se na ativação sucessiva em cascata de diversas
proteínas plasmáticas, na qual terminam com a formação de fibrina, aumentando,
em relação ao seu começo, o tampão plaquetário. Tal processo também é chamado
de tampão secundário, sendo este dividido em três vias: extrínseca, intrínseca e
comum. Todavia, para a interpretação das provas de triagem “in vitro” da
coagulação, é conveniente separar as vias. Apesar das atividades fisiológicas da
via intrínseca não serem totalmente definidas, é muito provável que essa via seja
ativada após a interação do fator XII.
A ativação do fator XII em fator XIIa gera a ativação do fator XI. O fator XIa
ativa o fator IX, que ativa o fator X, em que essa última reação da via intrínseca
necessita do fator VIIIa como co-fator. A via extrínseca caracteriza-se pela ativação
direta do fator X por um complexo formado entre fator VIIa e fator Tecidual
(tromboplastina tecidual). A via final comum corresponde à convergência das vias
intrínseca e extrínseca. Nesta via, o fator Xa forma complexo com o Va e ativa a
Protrombina para formar trombina, que cliva fibrinogênio para formar monômeros
de fibrina, sendo vinculados por ligações cruzadas ao fator XIIIa, formando o
41

coágulo estável de fibrina.


O sistema coagulante contrapõe-se ao sistema anticoagulante, em que se
tem como objetivo evitar a coagulação excessiva intravascular e a formação de
trombos. Assim, como o endotélio intacto e normal promove a fluidez do sangue,
ele também é fundamental na anticoagulação natural do sangue, uma vez que
impede o acúmulo de fibrina.
O sistema fibrinolítico é um mecanismo que tem como objetivo destruir o
excesso de fibrina construída e recanalizar os vasos, em que a hemostasia já está
completa. Algumas coagulopatias estão relacionadas à herança genética. São as
chamadas hemofilias.
A deficiência do fator VIII (hemofilia clássica ou hemofilia A) é herdada como
caráter recessivo ligado ao sexo. O gene do fator VIII, assim como o fator IX
(hemofilia B), localiza-se no braço longo do cromossomo X. Os homens com alelo
defeituoso no único cromossomo X não transmitem esse gene aos filhos, porém
todas as suas filhas são portadoras obrigatórias. Já as portadoras só transmitem o
distúrbio da coagulação à metade de seus filhos, enquanto a metade das filhas é
portadora. As portadoras podem manifestar sintomas semelhantes à hemofilia,
quando o alelo defeituoso é expresso preferencialmente ao alelo normal
(lionização).
Pode ocorrer a hemofilia em mulheres, por consequência do casamento de
um homem hemofílico com uma mulher portadora. Em geral, os pacientes com
deficiência de fator VIII ou IX são identificados pouco depois do nascimento, durante
a circuncisão ou quando a criança se torna ativa e se observam hematomas e
sangramentos frequentes. Nos casos leves (nível de fator VIII > 5%), a doença pode
não ser reconhecida, até que o paciente participe ativamente de esportes, seja
submetido a procedimento cirúrgico ou sofra traumatismo. O diagnóstico é
estabelecido no laboratório após avaliação dos sintomas clínicos e obtenção de um
histórico familiar. Dentre as provas de triagem, apenas o TTPA está prolongado. Os
42

testes subsequentes incluem pesquisa do fator VIII, do fator de Von Willebrand,


sendo também importante excluir a possibilidade de inibidor do fator VIII (auto-
anticorpo). O tratamento das hemofilias envolve a reposição do fator deficiente
durante os episódios de sangramento, bem como uma abordagem global do
paciente e sua família, com educação, assistência psicossocial e cuidados
dentários e ortopédicos periódicos.

Doença de Von Willebrand

Em 1926, Erik Von Willebrand descreveu uma doença hemorrágica de


herança autossômica dominante que afeta ambos os sexos, conhecida,
atualmente, como deficiência do fator Von Willebrand (DfvW). Essa doença é o
distúrbio hemorrágico mais comum, com prevalência de 2% da população, sem
predomínio étnico. Os pacientes com essa doença apresentam, em sua maioria,
uma doença leve que pode não ser diagnosticada até a ocorrência de traumatismo
ou de cirurgia. Os indivíduos sintomáticos exibem equimoses e sangramento das
mucosas. A menorragia afeta 65% das mulheres. O FVW desempenha três papéis
importantes na hemostasia: promove a adesão das plaquetas à parede do vaso
lesado, aumenta a interação entre as plaquetas, e estabiliza o fator VIII. Dentre os
testes de triagem para a coagulação, o TTPA e o tempo de sangramento estarão
alterados. O TTPA, de acordo com a necessidade do FVW como cofator do FVIII
da via intrínseca, e o tempo de sangramento estará prolongado, devido à deficiência
de agregação plaquetária. O ensaio de agregação plaquetária induzida pela
ristocetina é utilizado para confirmar e detectar os tipos variantes dessa doença. O
tratamento da doença de Von Willebrand é controvertido, porém, o crioprecipitado
constitui a forma preferida de reposição para sangramento ativo ou profilaxia, tendo
como objetivo aumentar a atividade do fator VIII.
43

HISTÓRIA, LEGISLAÇÃO DA HEMOTERAPIA E APLICABILIDADE


TERAPÊUTICA DOS HEMOCOMPONENTES

Hemoterapia é a terapia com hemocomponentes, ou seja, um tratamento


que utiliza partes do sangue para reverter um quadro patológico do mesmo.
As tentativas de usar sangue para curar doenças provêm de antes do
período que compreende o início da historia antiga da medicina. A história da
hemoterapia pode ser dividida em três períodos:

• Pré-histórico: da antiguidade (Grécia/Egito antigos) até a descrição da


circulação sanguínea pelo médico Willian Harvey (início do século XVII);

• pré-científico: período que se inicia em 1616 (século XVII), até a época


em que o pesquisador austríaco Landsteiner descobre o grupo sanguíneo ABO (por
volta de 1900), no início do século XX;

• período científico: desde a descoberta de Lansteiner até os dias atuais.


Em 1921, ocorre a fundação, em Londres, do primeiro banco de sangue. O segundo
banco fundado foi em Moscou, em 1926, no período da segunda guerra mundial.

No Brasil, é possível dividir a história da hemoterapia em:

• empírica, que vai até 1900 (com a descoberta de Landsteiner);

• científica: de 1900 adiante.

Na década de 40, já existiam, no Brasil, vários serviços de hemoterapia,


destacando o STS (Serviço de Transfusão de Sangue), que tinha como sede o Rio
44

de Janeiro, mas com filiais em Salvador, Minas Gerais e Recife. Nesta época,
destacava-se o cuidado com a seleção de doadores, que eram pagos pelos
serviços de hemoterapia para tal.
A década de 50 foi marcada pela fundação da Sociedade Brasileira de
Hematologia e Hemoterapia (SBHH), e a promulgação da lei federal que dispunha
sobre a doação voluntária de sangue.
A partir de 1961, a França iniciou um programa de cooperação com o Brasil,
durante a presidência de Jânio da Silva Quadros, que tentou “comprar” dois bancos
de sangue franceses para instalá-los no Brasil. Entretanto, com sua renúncia isto
não ocorreu. Em 1962, a França concedeu quatro bolsas de estudos para
especialização em hemoterapia e transfusão de sangue. Em 1977, com a
intensificação do programa Brasil-França, foi criado o primeiro banco de sangue em
Pernambuco, concebido de acordo com o modelo dos centros franceses de
hemoterapia.
Bem como ocorreu no mundo todo, as principais mudanças no sistema
hemoterápico não ocorreram essencialmente por causa dos especialistas, nem por
grandes feitos governamentais, mas sim por conta da necessidade de adequação
a eventos aleatórios, como no advento da AIDS. Em 1980, no Brasil, cerca de 2%
dos casos de AIDS eram transmitidos por transfusão e 50% dos hemofílicos
apresentavam infecção por HIV.
Com isso, novos procedimentos passaram a ser introduzidos, como a
substituição da doação anônima pela personalizada, o incremento dos métodos de
Autotransfusão e a disciplina no uso do sangue e de seus componentes por meio
de criteriosa avaliação do trinômio risco/benefício/custo. Toda transfusão traz em si
um risco, seja imediato ou tardio, devendo ser criteriosamente indicada.
“Será tempo de apreciarmos nossas conquistas e nossos defeitos, nestes 50
anos, e tentar prever o radioso futuro do século XXI” (Pedro Clóvis Junqueira, XXIV
Congresso Brasileiro de Hematologia, maio de 2000)
45

Em 16 de dezembro de 2010, o Ministério da saúde e a Agência Nacional de


Vigilância Sanitária determinam o regulamento sanitário (RDC - Resolução da
Diretoria Colegiada nº 57) para serviços que desenvolvem atividades relacionadas
ao ciclo do sangue humano, componentes e procedimentos transfusionais. Dentre
eles, estão:

• captação de doadores;
• coleta;
• processamento;
• testagem;
• armazenamento;
• distribuição;
• transporte;
• transfusão;
• controle de qualidade;
• proteção ao doador e receptor.

Os itens e procedimentos relacionados abaixo ocorrem dentro do laboratório


de um serviço de hemoterapia:

• registros informatizados;
• sistema de codificação desde a coleta até a liberação, que garanta
rastreabilidade do produto e do pessoal técnico responsável pelas atividades;

• procedimentos de contingências;
• documentação arquivada;
• área física adequada;
46

• planta arquitetônica aprovada pelo órgão competente;


• salas e setores identificados e sinalizados de acordo com normas de
biossegurança;
• bom estado de conservação, manutenção e limpeza;
• equipamentos e dispositivos de segurança dentro do prazo de validade;
• sistema emergencial de energia elétrica;
• planos de contingência;
• equipamentos de combate a incêndio;
• manutenção preventiva de equipamentos;
• biossegurança;
• medidas registradas em POPs;
• treinamento periódico de equipe;
• manuseio de resíduos de serviço de saúde.

Essas normas e diretrizes contribuem para a garantia de um serviço de


excelência e qualidade, visando o fornecimento de um hemocomponente de
qualidade que minimize ao máximo os riscos ao receptor.

DOAÇÕES DE SANGUE E PROCESSAMENTO DE


HEMOCOMPONENTES E OU HEMODERIVADOS

O princípio básico para um doador de sangue e hemocomponentes é saber


que sua doação será voluntária, anônima, altruísta e não remunerada. Existem
algumas formas de doação:

• doação de reposição: quando a doação possui um fator motivacional,


um paciente específico e pode ser efetuada antes ou após o uso do sangue ou
47

hemocomponente pelo paciente;


• doação vinculada, dirigida ou personalizada: subgrupo da doação
de reposição que tem como fator motivacional um paciente específico;
• doação espontânea: totalmente altruísta e voluntária, do indivíduo
que procura o serviço de hemoterapia espontaneamente, independente de paciente
específico;
• doação autóloga: sangue coletado e destinado a ser utilizado pelo
próprio doador, como no caso de uma cirurgia eletiva.

Triagem clínica

A triagem clínica é realizada por meio de entrevista individual feita por um


profissional da saúde com nível superior, garantindo privacidade e sigilo do doador.
Nesta entrevista, é dada ao doador a possibilidade de auto-exclusão, que se trata
de um recurso utilizado para garantir a qualidade do sangue, permitindo que
doadores em situação de risco declarem que seu sangue não é seguro. Assim, é
garantido ao doador sigilo absoluto das informações, uma vez que o mesmo assina
um termo de consentimento livre e esclarecido.
Por outro lado, o serviço de hemoterapia estabelece seus próprios critérios
de triagem, pré-triagem e seleção de doadores, que visam a proteção do receptor,
bem como manter a integridade do doador, sendo os principais:

• idade limite para aceitar doações que não coloquem em risco o


doador (normalmente acima dos 16 anos e abaixo dos 67);
• peso acima dos 50 quilos;
• frequência e intervalo de doações, para que não sejam menores do
que 90 dias para mulheres e 60 dias para homens, objetivando que o volume e as
perdas celulares sejam completamente repostas;
48

• informação sobre as doenças atuais ou anteriores, para manter um


histórico do doador, mesmo com os testes sorológicos de triagem sendo
obrigatórios;
• medicamentos que o doador tome e que possam causar alterações
no sangue e no hemocomponente doado, ou causar alguma reação adversa no
receptor.
• demais itens que podem levar a uma exclusão da doação, como
anemia, pulso, pressão arterial, gravidez, menstruação, aborto, peso, volume a ser
coletado, jejum, alimentação, alcoolismo, doador sem aspecto saudável,
temperatura, vacinações, local da punção venosa, transfusões, doenças
infecciosas e cirurgias.

As causas de inaptidão para doação de sangue podem ser definitivas ou


temporárias.

Definitivas:

• alcoolismo crônico;
• bronquite e asma;
• câncer (inclusive leucemia);
• cardiopatias graves;
• diabetes tipo I;
• doença de Chagas;
• doença renal crônica;
• doenças hemorrágicas;
• hanseníase;
• uso de hormônio de crescimento.
49

Temporárias:

• diabetes tipo II não controlada (normalizando após o controle);


• abortamento ou parto, por um período de 3 meses após a ocorrência;
• acupuntura ou piercing realizados com material descartável, por um
período de 3 dias após a realização;
• sem material descartável, por um período de 6 meses;
• diarréia, por um período de 1 semana após a cura;
• labirintite, por um período de 30 dias após a crise e sem uso de
medicamentos;
• lesões de pele no local da punção, até que sejam curadas.

Principais medicamentos que excluem temporariamente a doação:

• antibióticos e quimioterápicos antibacterianos: inaptidão temporária


de acordo com a vida média da droga;
• anticoagulantes: 10 dias após interrupção;
• anticonvulsivantes: enquanto estiver usando o medicamento.

Doenças infecciosas e o tempo que elas excluem a possibilidade de


doação:

• Gripes ou resfriados: 1 semana após cessarem os sintomas;


• Tuberculose: 5 anos após a cura;
• Dengue: 4 semanas após a cura;
• Dengue hemorrágica: 6 meses após a cura.
50

Cirurgias e o tempo que elas excluem a possibilidade de doação:

• cirurgia cardíaca: definitivo;


• gastrectomia total: definitivo;
• esplenectomia: definitivo, exceto se for pós trauma;
• hemorroidectomia: 3 meses;
• histerectomia: 6 meses;
• politrauma: 1 ano;
• tratamento de cana: 1 semana;
• extração dentária: 7 dias;
• remoção de tártaro e outros procedimentos com anestesia local:
3 dias.

Principais vacinas e o tempo que elas excluem a possibilidade de


doação:

• febre amarela: 3 semanas;


• rubéola: 4 semanas;
• tétano: 48 horas;
• hepatite b: 1 ano.

Candidatos inaptos na triagem clínica necessitam apenas de orientação. A


doação é feita com supervisão médica ou de um profissional da saúde de nível
superior, qualificado, capacitado e conhecedor de normas. O profissional deverá
observar, durante e após a coleta do sangue, possíveis reações adversas,
registrando o ocorrido na ficha de triagem e mantendo o doador nas dependências
51

do serviço até sua total recuperação.


Durante a triagem clínica em caso de rejeição, é necessário informar o
motivo ao doador. Na triagem laboratorial, o responsável técnico deverá informar
anormalidades observadas nos exames e a necessidade de realizar a repetição
deles.
A coleta de sangue deve ser realizada em condições assépticas, por meio
de uma única punção venosa e em sistema de coleta fechado e estéril, estando o
ambiente limpo e confortável. O tempo de coleta não deve ser maior do que 15
minutos e as amostras devem ser encaminhadas para provas de laboratório
coletadas da veia do doador ao final da doação.
Após a coleta, o sangue deve ser armazenado de 2 a 8ºC, exceto como fonte
de plaquetas. Neste caso, o armazenado deverá ser de 20 a 24ºC por 8 horas, até
a separação de plaquetas. No caso de extrações terapêuticas de sangue (sangrias
terapêuticas), o paciente deverá apresentar solicitação médica por escrito e a
sangria deverá ser realizada com a supervisão de hemoterapeuta, não podendo
utilizar o sangue coletado para transfusão alogênica.
A avaliação da amostra do doador é realizada por meio de testes
laboratoriais em todas as doações, sejam de repetição ou de primeira vez.

Os testes obrigatórios são:

• doença de Chagas;
• sífilis;
• hepatite B/C;
• HTLV I/II;
• HIV 1/2.

Esses são testes de alta sensibilidade que visam à proteção do receptor


52

contra conhecidos agentes passíveis de transmissão pelo sangue, porém, não


servem como teste diagnóstico, havendo grandes possibilidades de resultado “falso
negativo”.
Existe, também, a janela imunológica, que é o período entre o contato com
o agente infeccioso e a produção de anticorpos pelo organismo em quantidade
suficiente para serem detectados nos testes laboratoriais. Essas janelas variam de
acordo com o tipo de infecção.

No caso do vírus HIV, a janela imunológica para a infecção é de


aproximadamente 22 dias. Isto significa que se uma pessoa que foi infectada doar
sangue nos 22 dias subsequentes da data da infecção, seu sangue será aceito para
doação, já que os testes convencionais de triagem não vão detectar anticorpos anti-
HIV.
No caso da hepatite C, a janela sorológica é ainda maior, de dois a três
meses. Dessa forma, o risco de um portador do vírus HCV ser “falso negativo” na
triagem é ainda maior. Em virtude disso, a triagem clínica procura identificar e
excluir candidatos que possuam comportamento de risco para agentes infecciosos,
e que ainda não tenham anticorpos detectáveis nos testes.
Se, por ventura, os testes da triagem sorológica derem resultados positivos,
os doadores são convocados e orientados. Os exames são repetidos e, se houver
necessidade, o doador é encaminhado para acompanhamento.

• Convocação: quando o resultado da triagem sorológica é positivo


para qualquer um dos agentes pesquisados, o mesmo é repetido. Se o resultado
for novamente positivo, a bolsa é descartada e o doador é convocado, de forma
sigilosa, para tomar ciência do resultado;
• Orientação: o paciente é orientado a respeito dos procedimentos
formais do serviço de hemoterapia, bem como da realização de nova coleta para
53

confirmação dos resultados.


• Repetição de exames: a nova coleta é realizada para a confirmação
do teste em outra amostra, e o resultado é encaminhado para o doador
• Liberação ou encaminhamento para serviços de referência: se o
resultado for positivo na nova amostra, o doador é encaminhado para o serviço de
saúde especializado, a fim de que se inicie o tratamento.

A bolsa de sangue “não reativa” para as doenças investigadas é distribuída


aos hospitais para uso. Nesse caso, o doador receberá uma “carteirinha”, atestando
a sua condição de doador de sangue para a amostra colhida naquela data.
Estima-se que apenas 2% da população brasileira doem sangue. Segundo
a Organização Mundial de Saúde (OMS), esse percentual está bem abaixo do
necessário, já que o número de doações anuais deve representar de 3% a 5% da
população de um país.

Processamento do sangue

As bolsas de sangue coletadas são processadas para a obtenção de um ou


mais dos seguintes componentes:

• eritrocitários;
• plasmáticos;
• plaquetários.

As bolsas em que o material é coletado devem ser de PVC, material que


possui as características necessárias para melhorar o fracionamento e o
armazenamento dos hemocomponentes.
54

Figura - Representação de um sistema de captação de sangue. Fonte:


Flickr®, ©Wellcome Images (flickr.com/photos/wellcomeimages/)

O armazenamento proporciona a perda gradativa da funcionalidade das


células e a viabilidade tende a diminuir com o tempo de estocagem. Os
anticoagulantes utilizados são CPDA1, que promove uma vida média de
aproximadamente 35 dias para os hemocomponentes, e SAGM, que possui tempo
de estocagem de até 42 dias.
De acordo com o volume coletado, o tipo de bolsa utilizada e o tempo de
duração da coleta, serão definidos quais hemocomponentes serão utilizados.

• Abaixo de 300ml de sangue total: desprezar ST;


• de 300 a 404 ml: preparar CH de baixo volume e desprezar plasma;
• de 405 a 495 ml: prepara CH, CP, PFC e Criopreservado;
• acima de 521 ml: desprezar ST.
55

Até o início do processamento, a bolsa deve ser mantida em temperatura de


2 a 6 ºC por um período máximo de 8 horas, exceto se entre os produtos a serem
produzidos estiverem incluídos concentrados de plaquetas. Nesse caso, a
temperatura deverá ser de 20 a 24 ºC.

Rotulagem

No rótulo, deve haver:

• nome e endereço do serviço de hemoterapia;


• grupo sanguíneo ABO/Rh. Nas bolsas Rh negativas; pesquisa CDE;
• data da coleta e validade da bolsa;
• tipo de anticoagulante;
• tipo e volume do hemocomponente;
• temperatura de armazenamento;
• resultado dos testes sorológicos realizados;
• pesquisa de anticorpos irregulares (quando for positiva);
• fenótipo eritrocitário (quando forem fenotipadas);
• caso o produto seja irradiado ou deslecoutizado, deve-se identificar a
bolsa como tal;
• doação autóloga (quando for o caso);

No rótulo do fabricante da bolsa, devem conter as informações técnicas:

• não adicionar medicamentos;


• identificar corretamente o receptor;
56

• realizar obrigatoriamente as provas pré-transfusionais;


• não realizar transfusão sem prescrição médica;
• destruir a bolsa após o uso; Hemocomponentes Sangue total

O volume médio é de 450 ml de sangue somadas a 63 ml de solução


preservante e anticoagulante. Em geral, não se encontra disponível nos serviços
de hemoterapia e há raras indicações. Não traz vantagens na correção de anemias
em virtude da sobrecarga de volume. Quando estocado por mais de 24 horas,
contém poucas plaquetas, leucócitos e fatores de coagulação viáveis. O
armazenamento é realizado em geladeira, com temperatura de 2 a 6ºC

Dose:

• Adulto: 1 unidade de ST aumenta o nível de hemoglobina em cerca de


1 g/dl;
• crianças: 8 ml/kg resulta numa elevação no nível de hemoglobina em
cerca de 1 g/dl.

Tempo de infusão é de até 4 horas e a compatibilidade é com ABO/RH, PAI,


TAD e prova cruzada.

Concentrado de hemácias

O concentrado é preparado a partir de uma unidade de sangue total por meio


da remoção de aproximadamente 130 a 230 ml de plasma. O volume final é de
aproximadamente 220 a 320 ml, com hematócrito de 65 a 80%.
É indicado no tratamento de anemia em pacientes com necessidade de
aumento do transporte de oxigênio. Possui níveis de hemoglobina discutíveis e
57

anemia crônica abaixo de 8g/dl. Geralmente, caso haja de 8 a 10 g/dl, a


possibilidade de o médico solicitar transfusão é pequena, dependendo de sintomas
clínicos e na presença de sangramento ou perda maior que 10-15% da volemia.
O armazenamento é realizado em geladeira na temperatura de 2 a 6ºC, com
validade de 35 dias caso seja colhido com CPDA1. Os valores de dose, tempo de
infusão e compatibilidade são iguais ao ST.

• Leucorredução: uso de filtro de remoção de leucócitos;


• Indicações: Prevenção de reações transfusionais não hemolíticas e
profilaxia em pacientes politransfundidos. Também como prevenção de infecção
pelo CMV;

• Irradiação: dose de 2.500 rads (irradiador);


• Indicação: prevenir doença do enxerto versus hospedeiro. Os grupos de
risco que necessitam de radiação nas bolsas são: imunodeficiências congênitas,
TMO, exanguíneo transfusão, transfusão intra-utero, neoplasias hematológicas e
pacientes em quimioterapia.

Hemácias lavadas com solução salina estéril, através de centrifugação, para


remoção de restos celulares, potássio, leucócitos, plasma e plaquetas.

• Indicação: redução da reação alérgica às proteínas do plasma;


• armazenamento, validade, dose e compatibilidade iguais ao CH.

Concentrado de plaquetas

Esse concentrado é preparado a partir de uma unidade de sangue total por


58

centrifugação. Seu volume final é de 50 a 70 ml, devendo conter 5,5x10 plaquetas.

• Indicação: Se a contagem plaquetária for inferior a 20.000/mm3,


associada a situações de temperatura maior que 38,5ºC, CIVD, sepse ou contagem
inferior a 10.000/mm3;

• Dose: 1 unidade /10kg de peso corpóreo;


• armazenamento: 20-24ºC sob agitação constante;
• validade: 5 dias;
• tempo de infusão: rápido;

Aférese plaquetária

É obtido por meio da coleta em máquina de aférese, a partir de doador único.

• Volume final: 200ml;


• Deve conter: 3,0x10 11 plaquetas;

Vantagens em relação ao concentrado de plaquetas.

Plasma fresco congelado

Obtido a partir de ST, pela separação e congelamento, após 8 horas da


coleta.

• Volume final: 170ml;


• indicação: Reposição de fatores de coagulação, deficiência de
proteínas C, S e ATIII;
59

• armazenamento: temperatura -20ºC ou menor;


• descongelamento: 30 a 37ºC-validade a 1 a 6 horas após
descongelado e depois de descongelado, pode ser armazenado em geladeira por
até 24 horas;

• validade: 1 ano;
• dose: 10-15 ml/kg;
• tempo de infusão: rápido.

Crioprecipitado

Obtido por meio do descongelamento em temperatura de até 4ºC de uma


unidade de PFC, retirando plasma sobrenadante e deixando de 10 a 15 ml de
plasma, sendo recongelado a -20ºC.

• Volume final: 10 a 30 ml;


• Composição: fibrinogênio, fatorVIII, fatorXIII, fator Von Willebrand;
• Armazenamento: -20ºC;
• Descongelamento: 30 a 37ºC;
• Depois de descongelado: armazenar na geladeira por até 6 horas;
• Validade: 1 ano;
• Dose: de uma a duas unidades por quilo de peso;
• Tempo de infusão: rápido.

Transporte e acondicionamento de hemocomponentes

• concentrado de hemácias: acondicionamento em recipiente térmico


60

para transporte de 1 a 10ºC;


• concentrado de plaquetas: acondicionamento em recipiente térmico
para transporte de 20 a 24ºC;
• plasma fresco congelado: acondicionado em recipiente térmico para
manter a -18ºC;
• criopreservado: acondicionamento em recipiente térmico para manter a
-18ºC.

TÉCNICAS LABORATORIAIS E CONTROLE DE QUALIDADE EM


IMUNOHEMATOLOGIA

Em um laboratório de imunohematologia, alguns testes obrigatórios devem


ser realizados. Para uma triagem laboratorial, realizam-se alguns testes pré-
transfusionais, que compreendem tipagem sanguínea, pesquisa de anticorpos
irregulares, teste de antiglobulina direta e prova cruzada.
Em doadores de sangue, é necessário realizar tipagem sanguínea e
pesquisa de anticorpos irregulares; em gestantes, tipagem sanguínea e pesquisa
de anticorpos irregulares até 72 horas após o parto; em recém-nascidos, tipagem
sanguínea e teste de antiglobulina direta.
Anticorpos incompletos, não aglutinantes se ligam a hemácias que possuem
antígeno específico, mas não as aglutinam em meio salino, necessitando de um
mecanismo artificial. Anticorpos IgM completos são capazes de aglutinar hemácias
nessas condições.
Em 1945, Coombs, Mourant e Race demonstraram que, sensibilizando
animais (cabras ou coelhos) com injeções de imunoglobulinas humanas, haveria
produção de anticorpos contra frações Fc dessas imunoglobulinas. Foi criado,
então, o soro de Coombs, que contém anticorpos humanos (antiglobulina humana).
Anticorpos IgM podem atingir potencial zeta crítico em meio salino.
61

Anticorpos IgG não diminuem as forças de repulsão a ponto de atingir o potencial


zeta crítico, e necessitam do soro de antiglobulina humana (ou soro de Coombs).
O soro de Coombs pode ser poliespecífico, que contêm anticorpos contra IgG
humana e contra frações de complemento ou monoespecífico, o qual contêm
apenas anticorpos contra um tipo de imunoglobulina.

O teste pode ser realizado de duas maneiras:

• teste de antiglobulina indireto (PAI ou Coombs indireto);


• teste de antiglobulina direto (TAD ou Coombs direto).

PAI (Pesquisa de anticorpos irregulares)

Esse tipo de pesquisa investiga a presença de anticorpos no soro/plasma,


sendo realizada com o objetivo de identificar anticorpos irregulares e testes de
compatibilidade pré-transfusionais. A sensibilidade do teste pode ser aumentada
por substâncias que modificam a primeira etapa da reação, que é a fixação de
anticorpos, sendo que os epítopos dos anticorpos são carregados positivamente,
neutralizando as cargas negativas das hemácias.
O tratamento enzimático: bromelina, papaína ou ficina removem fragmentos
de proteínas das hemácias. Enzimas expõem alguns antígenos membranários,
como ABO, Rh, Lewis e Kidd, e destroem outros, como MNS e Duffy.
A adição de substâncias macromoleculares, como a albumina e o PEG
(polietilenoglicol), alteram a constante dielétrica do meio Liss, que modifica a força
iônica do meio. Outros fatores, como Ph entre 6,5 a 7,5, temperatura para IgG:
37ºC, IgM: 4ºC e concentração de anticorpos, também podem alterar a
sensibilidade do teste. Com isso, é necessário sempre seguir bulas e POP’s.
Anticorpos irregulares ocorrem em aproximadamente 0,3% a 2,0% da
62

população e o risco de aloimunização é de 1% por unidade transfundida. Para


pacientes politransfundidos, essa porcentagem aumenta para 9%; para pacientes
falciformes, 36%; e em pacientes talassêmicos, em torno de 10%.
Esse teste verifica a presença ou a ausência de anticorpos irregulares no
soro ou no plasma. O teste é obrigatório e utiliza células de pelo menos dois
doadores do tipo O. Colocam-se essas hemácias com soro/plasma do paciente,
realizando uma leitura em diversas fases, dependendo da metodologia escolhida.
Em tubo: Fase TA, 37ºC, fase da antiglobulina humana. Dependendo do
potencializador, é possível eliminar uma fase.
Interpretação dos resultados: positivo em qualquer uma das fases indica a
presença de anticorpos irregulares que podem ser identificados por meio de um
painel de hemácias.

TAD (teste de antiglobulina direta)

Esse tipo de teste pesquisa a presença de hemácias sensibilizadas por


anticorpos ou frações de complemento. É utilizado para estudo de doença
hemolítica do recém-nascido, anemia hemolítica autoimune, hemólise induzida por
drogas, reações hemolíticas pós-transfusionais.
O teste é realizado adicionando reagente antiglobulina humana à suspensão
de hemácias teste lavadas. Ele detecta anticorpos não aglutinantes da classe IgG,
ligados às hemácias. O teste em coluna é mais sensível que em tubo. Um resultado
positivo indica a presença de autoanticorpos, como na anemia hemolítica
autoimune ou induzida por drogas, como também aloanticorpos do paciente fixados
nas hemácias da bolsa transfundida, ou anticorpo materno transferido ao feto.
Falsos resultados ocorrem em virtude da lavagem incorreta dos glóbulos
vermelhos, de uma execução rápida do teste, da ausência de controle de qualidade
dos reagentes, de teste positivo em gel e negativo em tubo, de hemácias provindas
63

de amostras contendo microcoágulos e sub ou ultracentrifugação. A administração


de concentrado de hemácias nessas condições pode ser responsável pela
aloimunização após transfusão. O indivíduo é exposto a substâncias reconhecidas
como “não próprias”, ocorrendo ativação do sistema imune.
Classe dos anticorpos IgM são naturais e regulares no sistema ABO e Rh, e
naturais e irregulares nos sistemas Lewis, P, MNS. Os da classe IgG são imunes e
irregulares nos sistemas Rh, Kell, Kidd, Duffy e MNS. Os anticorpos da classe IgA
incluem pequeno percentual dos anticorpos ABO.

Prova cruzada maior

Essa prova consiste em um teste pré-transfusional que verifica in vitro a


reação entre antígeno e anticorpo. Anticorpos reativos em antiglobulina humana
possuem importância clínica. Uma prova positiva indica presença de anticorpo no
receptor, reagindo contra hemácias do doador. É realizada fenotipagem ABO, e,
caso o resultado seja incompatível, é necessário realizar o teste confirmatório da
prova direta da fenotipagem ABO. A prova é realizada adicionando plasma/soro do
indivíduo a ser testado, com suspensão de hemácias A1 e B.

Discrepâncias ABO

Anticorpos fracos ou ausentes, anticorpos irregulares, antígenos extras,


antígenos ABO fracos ou ausentes podem causar discrepância na tipagem ABO.

Autocontrole

Adiciona-se suspensão de hemácias de um indivíduo com seu próprio soro.


Se positivo, indica presença de auto-anticorpos frios ou quentes, e pode causar
64

reações transfusionais hemolíticas.

Controle Rh

Esse teste serve para validar a tipagem Rh(D), possuindo apenas meio
diluente. Um resultado positivo indica provável presença de anticorpos ligados à
hemácia.

Painel de hemácias

Quando é detectada a presença de anticorpos irregulares, o painel de


hemácias é realizado, utilizando de 8 a 30 hemácias teste do grupo O, com
fenótipos conhecidos dos sistemas imunogênicos. As hemácias são testadas contra
soro/plasma do paciente na mesma técnica que apresentou PAI positivo. É
necessário confirmar a especificidade do anticorpo com pelo menos três hemácias
negativas e positivas para o antígeno correspondente. Além disso, é necessário
acrescentar autocontrole para detecção de possíveis autoanticorpos. Vem
acompanhado de um diagrama com o fenótipo dos antígenos mais importantes em
bancos de sangue. Identificado o anticorpo, é possível determinar sua relevância
clínica.
Anticorpos irregulares são clinicamente significantes, geralmente reativos a
37ºC ou em fase de antiglobulina humana, IgG ou IgM, causando reações
transfusionais hemolíticas.
É necessário realizar uma contra prova para o antígeno correspondente.
Essa contra prova consiste em fenotipar a hemácia do paciente para o antígeno
correspondente ao anticorpo identificado. Por exemplo: se o aloanticorpo de
especificidade anti-K(K1) for detectado, a hemácia do indivíduo deve ser K
negativo. Deve-se fenotipar a bolsa que apresentou prova cruzada negativa e
65

observar informações como sexo, raça, diagnóstico, histórico transfusional e


registros anteriores em outros bancos de sangue

TÉCNICAS LABORATORIAIS PRÉ-TRANSFUSIONAIS E REAÇÕES


TRANSFUSIONAIS

Nos serviços de hemoterapia ou bancos de sangue humanos, a primordial


intenção é a utilização de hemocomponentes seguros para o paciente a ser
transfundido. Para que uma transfusão ocorra, muitas etapas anteriores à
transfusão devem ser realizadas. Como observado anteriormente, as regras que
envolvem a legislação dos serviços de hemoterapia, bem como a triagem do
doador, o processamento e a armazenagem dos hemocomponentes são rigorosas.
O não cumprimento de tais regras pode acarretar risco de morte ao paciente
receptor e consequências legais ao serviço de hemoterapia envolvido.
Porém, mesmo cumprindo com todas as exigências protocolares do serviço,
os casos de aloimunização em pacientes multitransfundidos são grandes, bem
como a quantidade de reações que elas podem causar. Essas reações recebem o
nome de reações transfusionais, que são agravos durante ou após a transfusão
sanguínea, e que, na maioria das vezes, não colocam em risco a vida do paciente.
Podem ser classificadas em:

• Incidentes transfusionais imediatos: ocorrem no início da


instalação do hemocomponente ou até 24 horas após;
• incidentes transfusionais tardios: ocorrem após 24 horas depois
da transfusão realizada.

Os principais sinais ou sintomas associados a uma reação transfusional


aguda são febre com ou sem tremores, com aumento de 1ºC de temperatura;
66

tremores ou calafrios com ou sem febre; dor no sítio de infusão, tórax e abdome;
alteração na pressão sanguínea com hipertensão ou hipotensão; aparecimento de
rubor, eritema, urticária ou edema generalizado ou localizado; náuseas com ou sem
vômitos; choque; mudança na coloração da urina (sinal mais precoce de uma
reação hemolítica aguda em pacientes anestesiados).
O profissional de enfermagem é geralmente o primeiro a suspeitar e dar
atenção adequada.
É necessário interromper a transfusão de imediato e checar o rótulo da bolsa,
a identificação e os registros do paciente, Além disso, é necessário avisar o médico
e manter acesso com SF 0,9%. Bolsa, equipo, soluções conectadas e rótulos
devem ser enviadas ao banco de sangue. É necessário colher urina pós reação.
O médico deverá avaliar o tipo de reação e solicitar exames. O laboratório
deve, após notificação e recebimento do material, checar possíveis erros de
identificação, hemólise e incompatibilidade sanguínea. Deve, também, checar as
amostras e hemocomponente, e avisar o médico de alguma discrepância para não
colocar em risco outro paciente.
É necessário fazer a checagem de hemólise, inspecionar soro ou plasma das
amostras pós reação e comparar com amostra pré. Hemólise intravascular produz
coloração rósea ou vermelha. Amostras colhidas após 5 a 7 horas da hemólise >
coloração amarela ou marrom. É importante repetir os testes pré e pós
transfusionais.
Nas reações transfusionais imediatas, geralmente é observada hemólise
imuno mediada, a qual é a reação hemolítica mais grave, e ocorrem se hemácias
transfundidas reagem com anticorpos do paciente.
A reação antígeno X anticorpo ocasiona uma sequência de respostas
neuroendócrinas, ocorrendo ativação do complemento e da cascata da coagulação,
além de liberação de citocinas, causando manifestações clínicas secundárias à
transfusão de hemácias ABO incompatíveis.
67

Tratamento: corrigir a hipotensão e a promoção de fluxo renal adequado,


prevenindo o choque e a insuficiência renal. Diuréticos melhoram o fluxo renal e
aumentam o débito urinário.

No caso de CIVD, é necessário realizar transfusão de plasma fresco


congelado, plaquetas e crioprecipitado, sendo indicados de acordo com resultados
de TP, TTPA e contagem de plaquetas.
A causa mais comum de transfusão ABO incompatível é a identificação
incorreta da amostra ou do receptor. A estimativa de mortalidade: de 1 para 100.000
a 1 para 600.000 nos EUA.
Para prevenir uma reação transfusional, é necessário observar a
identificação correta das amostras, e realizar a checagem do rótulo do receptor e
doador à beira do leito
Hemólise não imuno-mediada pode ocorrer se hemácias submetidas à
transfusão são expostas a temperaturas impróprias durante transporte, estocagem
ou manuseio. Hemólise mecânica pode ocorrer em virtude do uso de bombas de
roletes, bombas de infusão e agulhas de pequeno diâmetro. Adição de drogas ou
solução hipotônica também pode ocasionar hemólise.
Para prevenir, é necessário realizar um treinamento adequado de todo o
pessoal envolvido com a transfusão, respeitando o uso dos equipamentos
envolvidos e dos procedimentos transfusionais em si.

Reações febris não hemolíticas (RFNH)

Essas reações ocorrem se houver aumento de temperatura de 1ºC


associada com a transfusão sem qualquer outra explicação. Sua incidência é de
0,5 a 1,5% a cada transfusão de concentrado de hemácias. Podem estar
68

associadas a tremores ou calafrios. Em pacientes politransfundidos, a reação pode


ser mais acentuada. Geralmente são benignas, podendo causar desconforto ou
alterações hemodinâmicas, além de aumento de temperatura imediato ou tardio
(início após várias horas da transfusão). As situações que levam a RFNH são
gravidez e múltiplas transfusões.
As RFNH resultam da interação entre anticorpos no plasma do receptor e
antígenos presentes nos linfócitos, granulócitos ou plaquetas do doador, ou infusão
de substâncias bioativas, incluindo citocinas e os chamados modificadores das
respostas biológicas, acumuladas nas bolsas de sangue.
Para tratamento, é necessário interromper a transfusão, e, caso ocorra febre,
deve-se administrar antipiréticos e meperidina em caso de calafrios e tremores.
Para prevenção de reações febris, é necessária a administração de antitérmicos
antes da transfusão. Se o paciente apresentar novo episódio, mesmo com pré-
medicação, deve-se utilizar hemocomponentes filtrados.
O concentrado de hemácias desleucotizado ou leucorreduzido retira mais de
99,9% dos leucócitos dos componentes e é obtido através de filtros de leucócitos,
devendo conter menos que 5X106 leucócitos por componente. Possui validade de
24 horas em sistema aberto, e validade original em sistema fechado.

Reação urticariforme

Reação urticariforme se define como hipersensibilidade desencadeada pela


exposição a substâncias presentes no plasma do doador, que o receptor já estava
sensibilizado. É caracterizada por rash ou urticária e prurido, usualmente não
acompanhados de febre ou outros achados. Possui uma frequência de 1-3% de
transfusões. Se ocorrer apenas urticária, a transfusão deverá ser interrompida
temporariamente e administrar anti-histamínico oral ou parietal.
Para prevenir, é necessário administrar anti-histamínicos antes das
69

transfusões. Caso ocorram reações recorrentes severas, deve-se administrar


hemocomponentes lavados. O concentrado de hemácias lavado é obtido após
lavagens com solução isotônica de cloreto de sódio eliminar maior quantidade
possível de plasma. Contém leucócitos e plaquetas, e sua validade é de 24 horas.

Reações anafiláticas

Reações anafiláticas possuem incidência baixa nos Estados Unidos da


América (1/20.000 a 1/50.000), causando mortalidade de 1 caso ao ano, que
geralmente ocorrem no início da transfusão. Os sintomas mais graves são perda
de consciência, choque e, em casos raros, morte. Essas reações envolvem sistema
respiratório (tosse, broncoespasmo, dispnéia), trato gastrointestinal (náuseas,
vômitos e diarréia), sistema circulatório, arritmias, hipotensão e pele (rash
generalizado e urticária).
A principal causa é a deficiência de IgA, na qual pacientes apresentam
anticorpos IgA em pessoas deficientes desta imunoglobulina. Ocorre a cada 700-
800 pessoas de descendência européia, em que 30% têm anticorpos anti-IgA
circulantes.
Para tratamento, é necessário parar a transfusão, manter acesso com salina,
tratar hipotensão, bem como possuir hemocomponentes sem IgA.

TRALI: (Lesão pulmonar aguda relacionada à transfusão ou edema


pulmonar agudo não cardiogênico)

Uma lesão é considerada TRALI quando receptores apresentam


insuficiência respiratória ou achados radiológicos com edema bilateral, sem
insuficiência cardíaca. Ocorre em 1/5.000 a 1/190.000 transfusões. Sua severidade
não tem relação com volume transfundido. Podem ocorrer tremores, febre,
70

calafrios, cianose e hipotensão.


A TRALI pode resultar de transfusões de anticorpos anti-HLA classe I ou II.
Anticorpos neutrofílicos podem reagir com leucócitos do receptor, causando uma
sequência de eventos que aumentam a permeabilidade da microcirculação
pulmonar e a entrada de fluídos nos espaços alveolares. Raramente anticorpos no
receptor podem interagir com granulócitos transfundidos e iniciar os mesmos
eventos. A ativação do complemento pode gerar anafilotoxinas C3a e C5a. A
agregação de granulócitos aloja-se na microvasculatura pulmonar.
Para tratamento, é necessário ocorrer reversão da hipoxemia com
oxigenoterapia e assistência ventilatória, corticosteroides. A maioria dos pacientes
recupera a função pulmonar em 2 a 4 dias.

Sobrecarga circulatória

Sobrecarga circulatória é uma terapia transfusional que pode causar Edema


Pulmonar Agudo e sobrecarga de volume. Crianças e idosos são a população de
maior risco. Ocorre um rápido aumento de volume pouco tolerado, comprometendo,
assim, funções cardíacas ou pulmonares.
No quadro clínico, observa-se hipervolemia, dispnéia, cianose, cefaléia,
hipertensão ou insuficiência cardíaca congestiva, durante ou após transfusão. Para
o tratamento, deve-se suspender a transfusão, colocar o paciente sentado, aplicar
diuréticos e oxigênio.
Transfundir lentamente na dose de 1ml/kg/hora. Se a quantidade desejada
ultrapassar 4 horas, transfundir alíquotas e administrar diuréticos antes e durante a
transfusão.

TÉCNICAS DE COLETA DE SANGUE


71

Dependendo do tipo de análise que será realizado, a coleta do sangue


poderá ser feita no sangue total (hemograma contendo anticoagulante, por
exemplo), no plasma (glicose e provas de coagulação, por exemplo), no soro
(bioquímicos e sorológicos, por exemplo). Quando a análise for realizada no soro,
este será obtido por meio da coleta em tubo sem anticoagulante (tubo seco), para
que ocorra o processo de coagulação. Quando se pretende fazer a análise no
plasma, a amostra deverá ser colhida em tubo de ensaio contendo anticoagulante
específico. Neste caso, não ocorre a coagulação, pois o anticoagulante irá inibir um
dos fatores da coagulação (geralmente cálcio), impedindo, assim, a formação do
coágulo. No mercado atual, os tipos de anticoagulantes e/ou aditivos disponíveis
obedecem a uma regra de cores para as tampas dos seus tubos, como será
observado a seguir:

Tabela - Relacionando as cores das tampas dos tubos ao


anticoagulante e ao setor que o utiliza para a realização do exame.

Rolhas Anticoagulante Setor


Roxa EDTA Hematologia
Amarelo Gel separador com ativador Sorologia e Bioquímica
de coágulo
Azul Citrato de Sódio Hematologia
(Coagulação)
Vermelho Siliconizado sem anti- Sorologia e bioquímica
coagulante
Verde Heparina Sódica Bioquímica e
imunologia
Branco Fluoreto de sódio + EDTA Bioquímica
72

A sequência de coleta recomendada para minimizar erros pré-analíticos é:

• tubos para amostras estéreis;


• tubos para provas de coagulação (exemplo: Citrato);
• tubos sem aditivos;
• tubos com outros aditivos (exemplo: EDTA, fluoreto e gel).

Os serviços de laboratório, bem como os hospitais, possuem instalações


adequadas para serem realizadas as coletas de sangue. As salas de coleta devem
apresentar:

• sala bem iluminada e ventilada;


• lavatório;
• cadeira reta com braçadeira regulável ou maca;
• garrote;
• algodão hidrófilo;
• álcool etílico a 70% ou substância equivalente para antissepsia;
• agulha descartável;
• seringa descartável;
• sistema a vácuo: suporte, tubo e agulha descartável;
• tubos com e sem anticoagulante;
• etiquetas para identificação de amostras;
• recipiente rígido e próprio para desprezar material pérfurocortante;
• avental e máscara;
• luvas descartáveis;
• estantes para os tubos.
73

Em um ambiente adequado que segue as normas de biossegurança para


garantir um bom trabalho do profissional da saúde e a satisfação do cliente que irá
realizar os exames, a coleta de sangue deve ser realizada da seguinte forma:
Com as mãos higienizadas, calçar luvas apropriadas a fim de que não haja
sobras no caso de uma luva grande demais, e nem uma luva apertada demais que
possa garrotear os dedos do colaborador.
A coleta infantil constitui uma frequente problemática para o colaborador,
bem como para o acompanhante, que em geral é um dos pais ou parentes bem
próximos. A conversa é sempre um bom caminho a seguir, pois as crianças
entendem e tendem a criar confiança em quem as respeita. Essa confiança pode
ser obtida utilizando as próprias atitudes da criança, como, por exemplo, utilizar um
brinquedo que esteja em posse da mesma ou falar de personagens e heróis que a
façam parte de filmes ou programas do momento.
O momento da coleta é crucial e não é aconselhável que o acompanhante
participe da coleta, pois pode gerar insegurança e toda a confiança criada
anteriormente pode ser perdida. Em casos de crianças muito rebeldes ou com vias
de acesso muito difíceis, talvez seja necessário fazer mais de uma punção. Se isso
ocorrer, seria melhor que outra pessoa o fizesse, pois a criança vai achar que se
for o mesmo colaborador, pode dar errado de novo. Isso é mais frequente em casos
de crianças internadas. A maioria delas chora muito, mas há algumas vezes em
que elas se debatem demais, podendo haver a necessidade da criança se contida.
Quando a coleta é realizada em postos, geralmente a criança fica sentada
no colo do acompanhante, ficando de lado para o coletor. De preferência, deve-se
evitar que ela veja o procedimento da coleta, pedindo para que a mesma feche os
olhos no momento da punção para minimizar o medo.
Para neonatos e bebês, é comum a utilização de microcoleta. A amostra é
obtida através de perfuração com lanceta da região digital ou do calcanhar. Os
sistemas para microcoleta apresentam alguns recursos, como: microtubos com
74

funil, microtubos e tubo capilar, e escalpes de calibre bem finos.

Coleta venosa ou venopunção

Para este tipo de coleta, é necessário abrir a embalagem da seringa estéril,


mas deixá-la envolta na própria embalagem até o momento do uso. Caso a agulha
não esteja acoplada à seringa na própria embalagem, deve-se abrir a embalagem
da agulha e encaixá-la na seringa. Nos sistemas de coleta a vácuo, utilizam-se
agulhas apropriadas ao canhão (nome dado ao adaptador em que a agulha é fixada
e acoplam-se os tubos). Já nos sistemas de coleta fechados, os scalps são
fabricados com um adaptador que realiza a coleta em um tubo tanto a vácuo como
por aspiração.
Avaliar os braços e as mãos do paciente para eleger a via de punção. Muitas
vezes, as veias são mais profundas e difíceis de visualizar. Nestes casos a
colocação do garrote auxilia na escolha da via de punção. As principais veias que
são utilizadas na punção são: cefálica, basílica e mediana do cotovelo.
Colocar o garrote a 5 cm do local da punção de maneira firme, mas de modo
a não impedir a circulação sanguínea do paciente; pedir ao paciente que abra e
feche a mão várias vezes, a fim de aumentar a circulação venosa; escolher a veia
a ser puncionada, que deve ser calibrosa e firme à palpação. Fazer a antissepsia
do local, deixando a área secar antes de puncionar. Uma vez limpa, não colocar a
mão sobre a área. Caso seja necessário, proceder a antissepsia novamente; pedir
ao paciente que mantenha a mão fechada; pegar a seringa e colocar o dedo
indicador sobre o mandril da agulha para guiá-la durante a introdução na veia;
esticar a pele com o polegar da outra mão, a 5 cm abaixo do local da punção, mas
sem tocá-lo. Inserir rápida e firmemente a agulha com o bisel para cima; o sangue
fluirá para a seringa espontaneamente. Se o êmbolo estiver muito preso, como
acontece com a maioria das seringas de plástico, puxe lentamente o êmbolo para
75

verificar se a agulha está na veia; retirar a quantidade de sangue necessária e soltar


o garrote; retirar a agulha e colocar um pedaço de algodão seco no local,
pressionando por um tempo (a pressão irá ativar o mecanismo de coagulação local
e impedirá que o sangue extravase sob o tecido epitelial).
Desprezar a agulha em recipiente adequado ao descarte de perfuro-
cortantes sem encapá-la e com todo o cuidado transferir o sangue colhido para os
tubos. Escorrer lentamente o sangue pelas paredes dos tubos sem provocar a
formação de espuma. Desprezar a seringa em local apropriado; deixar o braço do
paciente esticado e orientar para que não faça esforço ou carregue peso com o
braço onde foi realizada a coleta. Colocar um curativo no local.

Coleta arterial

Este tipo de coleta deve ser realizado por médicos, enfermeiros ou


biomédicos em virtude da responsabilidade técnica envolvida no procedimento.
As principais artérias que são utilizadas para coleta são: radial, braquial ou
femoral.
A amostra de sangue arterial é indicada apenas para a avaliação de
gasometria arterial. Os demais exames são realizados com amostras de sangue
venoso.

PROCEDIMENTOS E BOAS PRÁTICAS DE COLETA

De acordo com a RDC nº63 de 25 de novembro de 2011, que dispõe sobre


as boas práticas de funcionamento para os serviços de saúde e que se aplica a
todos os serviços de saúde no país, sejam eles públicos, privados, filantrópicos,
civis ou militares, incluindo aqueles que exercem ações de ensino e pesquisa,
existem as seguintes definições pertinentes às boas práticas para o setor de coleta,
76

dentre outras:

• garantia de qualidade;
• gerenciamento de tecnologias;
• humanização da atenção e gestão da saúde;
• licença atualizada;
• Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde (PGRSS);
• política de qualidade;
• profissional legalmente habilitado;
• segurança do paciente.

Além das definições acima, estabelecidas pela resolução da ANVISA, é


necessário enfatizar a educação em segurança aos colaboradores e profissionais
da saúde.
Durante a execução das funções diárias, por inúmeras vezes os profissionais
da saúde entram em contato com uma infinidade de situações que os expõe a uma
série de microrganismos e agentes patogênicos. Isto não significa que os mesmos
irão desenvolver alguma patologia, mas em algumas situações o cuidado no
manuseio de equipamentos e substâncias deve ser redobrado.
A biossegurança é um conjunto de procedimentos, ações, técnicas,
metodologias, equipamentos e dispositivos capazes de eliminar ou minimizar riscos
inerentes às atividades de pesquisa, produção, ensino, desenvolvimento
tecnológico e prestação de serviços, que podem comprometer a saúde do homem,
animais ou meio ambiente, ou somente a qualidade dos trabalhos desenvolvidos.
A higienização das mãos é a maneira mais eficiente e menos dispendiosa
para a prevenção de infecções hospitalares ou transmissão cruzada de agentes
potencialmente infectantes. A importância dessa prática é reconhecida pelo
Ministério da Saúde e regulamentada pela ANVISA, que elaborou um manual de
77

higienização das mãos.


Além da higienização das mãos, a higienização do local de trabalho
associada às práticas de descontaminação e desinfecção promove o bom
atendimento e a qualidade nos serviços de saúde prestados. Outra importante
prática no atendimento a pacientes é a atenção à identificação de amostras.
Trabalhos como estes requerem muitos cuidados e dedicação, pois a vida do
paciente pode depender do resultado do exame que será realizado e a condição
em que a coleta será realizada, depende exclusivamente do profissional que a fará.

Os fatores abaixo podem interferir na qualidade do sangue coletado:

• coleta inadequada;
• tempo prolongado entre a coleta e a realização do exame;
• stress do paciente;
• volume inadequado;
• conservantes (físicos e químicos) inadequados;
• medicação;
• contaminação da amostra;
• alimentação antes da coleta, provocando lipemia;
• garroteamento prolongado, provocando hemólise;
• temperatura inadequada de armazenamento da amostra.

CONDIÇÕES PRÉ-COLETA (USO DE MEDICAMENTOS E PRÁTICA DE


EXERCÍCIOS FÍSICOS)

Algumas condições físicas do paciente, anteriores à punção venosa, podem


interferir em certas dosagens. Para que não ocorra tal prejuízo, é necessário ter em
78

mente a correta orientação ao paciente de acordo com todos os tipos de exames


solicitados pelo médico.
O uso de certos medicamentos pode alterar significativamente dosagens
séricas ou contagens celulares, como, por exemplo, o uso de antibióticos. O uso de
antibióticos pode causar diminuição temporária no estímulo medular para a
produção dos leucócitos, podendo o paciente apresentar uma leucopenia no seu
hemograma, ou causar o não crescimento bacteriano, se o exame em questão for
uma hemocultura.
Medicamentos anti-coagulantes, amplamente utilizados para evitar
tromboses ou cardiopatias, alteram os testes referentes à avaliação da coagulação
sanguínea. Contudo, sabe-se da necessidade dos pacientes que fazem uso
contínuo de medicações, como no caso de anticonvulsivantes. Nessas condições,
a coleta é realizada, porém o setor técnico deve ser avisado e o médico responsável
pela solicitação também deve estar ciente e solicitar ou não a interrupção do uso
da droga.
Exercícios físicos ou esforços realizados antes de alguns exames também
causam alterações, como é o caso da neutrofilia temporária, que pode ocorrer no
hemograma, ou de alterações nas dosagens do hormônio prolactina, em que se
deve obrigatoriamente realizar um repouso de pelo menos 30 minutos antes da
realização da coleta do sangue.

JEJUM E TEMPO DE GARROTEAMENTO

O jejum é necessário para as dosagens bioquímicas que são alteradas após


a alimentação, como glicose, colesterol, triglicérides.
Para os demais exames, é suficiente que seja realizado antes das principais
refeições ou pelo menos três horas depois.
É sabido que para cada tipo de dosagem existe uma orientação específica.
79

Portanto, deve-se orientar o paciente de acordo com a preconização do serviço de


saúde no qual ele está realizando os exames, pois os mesmos determinam as
orientações de acordo com os instrumentos, equipamentos e reagentes que utiliza.
Em relação ao tempo de garroteamento utilizado para realizar a punção
venosa, sabe-se que a vasoconstrição ativa os mecanismos de coagulação, e,
portanto, deve ser o mais breve possível (em torno de um minuto), a fim de não
causar alterações quantitativas por consumo prévio de algum substrato ou cofator
precursor de uma reação de coagulação, bem como a hemoconcentração causada
pelo represamento do sangue.

ANTICOAGULANTES

As substâncias anticoagulantes, como o próprio nome já diz, agem


impedindo ou retardando a coagulação do sangue. Na utilização in vitro, os
anticoagulantes favorecem as determinações laboratoriais, porém, a escolha ou a
quantidade errada de um anticoagulante pode causar um erro no resultado do teste.
Um exemplo é o EDTA potássico, que não pode ser utilizado no setor da
bioquímica por interferir nas dosagens de potássio, ou um excesso de
anticoagulante líquido que poderia interferir nas determinações quantitativas por
diluição da amostra.
Alguns anticoagulantes conservam melhor a morfologia celular da amostra,
e, por esse motivo, são utilizados na hematologia; outros conservam as
propriedades plasmáticas e são mais úteis nas avaliações da coagulação.
Abaixo serão apresentados os principais anticoagulantes e suas utilizações.

Ácido etilenodiaminotetracético potássico (EDTA)

É utilizado para contagens celulares por preservar sua morfologia. É


80

semelhante aos oxalatos para a determinação de hematócrito, porém, é superior


para os estudos das formas celulares. É ideal para a confecção do esfregaço, ou
distensão celular, que podem ser preparados de duas a três horas após a coleta,
se mantido refrigerado o sangue. Além de conservar a morfologia celular, impede
a agregação das plaquetas, mas não pode ser utilizado para os testes de
protrombina ou função plaquetária, pois impede o mecanismo de coagulação ao
quelar o cálcio.

Heparina

A heparina não afeta o volume corpuscular nem o hematócrito, porém não é


satisfatório para contagens de leucócitos ou plaquetas, devido à aglutinação
celular. Não altera a morfologia nem o tamanho celular e é o melhor anticoagulante
para evitar a hemólise, bem como para os testes de fragilidade osmótica. É muito
utilizado para a realização de gasometrias.

Citrato de sódio

Quando combinado a outros anticoagulantes, pode ser utilizado para as


transfusões sanguíneas, formando o ACD (ácido cítrico, cloreto de sódio, dextrose
e fosfato monossódico). Para a utilização em diagnósticos, é utilizado em solução
a 3% para a realização dos testes de coagulação, como atividade de protrombina,
tomboplastina parcial ativada, fibrinogênio, entre outros.

Oxalato de potássio e oxalato de amônio

São utilizados para determinações hematológicas, mas sua utilização para a


confecção de esfregaços está limitada aos dois primeiros minutos, devido às
81

alterações dos leucócitos e a agregação plaquetária que também é favorecida.

Fluoreto de sódio

Este tubo de tampa cinza é especialmente utilizado para as dosagens de


glicemia, pois impede a glicólise que continua ocorrendo mesmo após a coleta. As
hemácias são excelentes consumidoras de glicose, e o fluoreto de sódio impede
esse mecanismo.

Tubos com gel e siliconizados

Quando se pretende fazer uma análise bioquímica ou sorológica, deve ser


utilizada uma amostra de soro, que é obtida através de uma amostra sem
anticoagulante, ou seja, uma amostra de soro. Para tanto, pode-se utilizar tubos de
tampa vermelha, com ou sem silicatos, que auxiliam na formação do coágulo, ou
tubos de tampa amarela que possuem gel separador.

NOÇÕES SOBRE OS DIFERENTES MATERIAIS UTILIZADOS NA


COLETA – USO, ESCOLHA, DESCARTE, AGULHAS, TUBOS

As técnicas de coleta não envolvem apenas a anatomia humana e as


metodologias empregadas na punção. O conhecimento dos diferentes materiais
disponíveis no mercado de suprimentos hospitalares também é um diferencial para
o profissional da saúde.
Sabe-se que agulhas siliconadas facilitam a punção e diminuem o
desconforto do paciente no momento da picada. Um esquema de cores
padronizado facilita a identificação do calibre da agulha.
Em sistemas de coleta múltipla, ou sistema a vácuo, há a possibilidade de
82

obtenção de um maior volume de amostra em variados tubos, porém, este tipo de


sistema não é recomendado para os casos de veias difíceis.
Existem também os chamados “sistemas fechados” de coleta, em que
somente tubos-seringa, scalpes e adaptadores que são da mesma marca se
conectam entre si.
No setor de coleta, o colaborador é o responsável pelo descarte do material
utilizado. De acordo com as orientações em relação ao gerenciamento de resíduos,
sabe-se que agulhas e seringas contendo sangue ou outros fluidos devem ser
desprezadas em recipiente apropriado para descarte de perfuro cortante. Já os
materiais que são livres de agulhas, escalpes ou lancetas podem ser desprezados
em sacos brancos, leitosos, resistentes e impermeáveis que possuam o símbolo
indicando material potencialmente infectante.
Atualmente, os serviços de saúde, em sua corrida diária na busca da
excelência do serviço prestado, utilizam cada vez mais materiais descartáveis, e,
com isso, além de aumentar a segurança do paciente, promovem a segurança do
colaborador e do ambiente de trabalho.

TEMPO DE SANGRAMENTO

O tempo de sangramento, a contagem plaquetária e a avaliação da função


plaquetária são os principais testes realizados para diagnosticar alterações da
hemostasia primária.
O TS de Duke, ou simplesmente tempo de sangramento, é o teste que mede
a função plaquetária in vivo. Consiste na realização de uma perfuração com não
mais de 1 mm de profundidade, de modo a lesar apenas pequenos vasos e avaliar,
então, a hemostasia primária. O sangue deve ser absorvido com um papel filtro a
intervalos de tempo regulares, evitando tocar no “plug” plaquetário em formação. O
TS de Duke é preferencialmente realizado no lóbulo da orelha, pois a polpa digital
83

é mais sujeita a variações determinadas por vasoconstrição ou vasodilatação.


Possui valor de referência normal, sendo de 1 a 3 minutos.
O teste de retração do coágulo mede a qualidade das plaquetas e a atividade
de sua proteína tromboastenina. É uma forma de se avaliar in vitro a atividade
plaquetária. O exame consiste em transferir cerca de 5,0 ml de sangue total sem
anticoagulante para um tubo cônico graduado, introduzir um pedaço de arame em
forma de anzol dentro do tubo, tampá-lo e colocar em banho-maria a 37º por uma
hora. Após esse tempo, é necessário realizar a leitura, removendo o coágulo
formado, medindo o volume final de soro restante e realizar a interpretação
qualitativa (método de McFarlane modificado). Em média, o coágulo reduz
aproximadamente a metade do volume original de sangue, separando 40% a 60%
do soro.

TEMPO DE COAGULAÇÃO

Pelo método do tubo capilar (Sabrazés), essa prova consiste no tempo


decorrido entre a coleta do sangue (preencher um tubo capilar) e a formação do
cilindro de fibrina. Normalmente, o tempo de coagulação por tal método varia de 2
a 8 minutos. Essa prova representa um estudo global da coagulação, não
discriminando qual fator está comprometido. É um método de baixa sensibilidade,
com a possibilidade de ser normal, mesmo em presença de coagulopatias, como,
por exemplo, hemofilia leve.

TEMPO DE PROTROMBINA (TAP OU TP), TEMPO DE


TROMBOPLASTINA PARCIAL ATIVADA (PTT OU TTPA) E TEMPO DE
TROMBINA (TT)

Tempo de Protrombina (TP)


84

O Tempo de Protrombina (TP) é utilizado para detectar deficiências dos


fatores pertencentes ao sistema extrínseco e comum da coagulação, incluindo os
fatores VII, X, V e II. O teste consiste na adição de tromboplastina ao plasma (fator
III tecidual) e posterior mensuração do tempo de formação do coágulo. Um TP
prolongado pode indicar deficiências hereditárias, principalmente do fator VII ou
adquiridas, como deficiência de vitamina K, doenças hepáticas, coagulação
intravascular disseminada (CIVD) ou uso de medicamentos. Esse teste é mais
sensível à deficiência de fator VII. Como as medidas do TP variam de acordo com
a potência dos reagentes de tromboplastina utilizados no teste, a Organização
Mundial da Saúde (OMS) recomenda uma padronização, utilizando-se uma
tromboplastina padrão que estabelece uma curva de referência mundial. Os testes
com essa tromboplastina padrão são realizados pelas empresas fabricantes da
tromboplastina nacional. A cada lote produzido, o fabricante realiza um novo teste
com a tomboplastina padrão e obtém um Índice de Sensibilidade Internacional (ISI)
que é fornecido a cada kit. Com o valor do ISI e o resultado obtido com a amostra
do paciente, é possível calcular o RNI (Razão Normatizada Internacional) do
paciente, que possui um resultado interpretado da mesma maneira em qualquer
lugar do mundo. O valor de normalidade considera resultados entre 10 e 14
segundos.

TTPA (Tempo de Tromboplastina Parcial Ativada)

Constitui a melhor prova para investigar as deficiências dos fatores que


participam da via intrínseca e comum (cininogênio de alto peso molecular,
precalicreína, fatores XII, XI, IX e VIII). O plasma citratado normal contém todos os
fatores necessários para promover a coagulação intrínseca, exceto o cálcio
(removido pelo citrato de sódio) e as plaquetas (removidas pela centrifugação).
85

Essa prova consiste em adicionar, ao plasma, cálcio e cefalina ativada. A cefalina


ativada é um extrato do cérebro de coelho, que contém a cefalina, o substituto
fosfolipídico das plaquetas (tromboplastina parcial).
Os resultados são relatados em tempo (em segundos) e relação TTPA
paciente/ TTPA média do valor de referência. Valor de normalidade varia de
laboratório para laboratório, dependendo do padrão de pacientes que ocorrem,
porém, em média são considerados normais valores até 30 segundos. Além disso,
o TTPA é um teste muito sensível à presença de heparina, sendo o mais indicado
para seu monitoramento.

TT (Tempo de Trombina)

A determinação do tempo de trombina é feita para investigar alterações na


última fase da coagulação, quando ocorre a transformação do fibrinogênio em
fibrina pela ação da trombina,
que é adicionada ao plasma-teste para determinar o tempo de formação do
coágulo. O tempo de coagulação, após a adição de trombina do plasma, é
inversamente proporcional à concentração de fibrinogênio plasmática. O tempo
prolongado revela deficiência de fibrinogênio. O TT é usualmente solicitado em
casos de pacientes infartados, logo após a administração de streptoquinases.
Valores considerados normais estão entre 12 e 18 segundos.

PROVA DO LAÇO

A prova do laço consiste em medir a fragilidade dos capilares. Ele consiste


em um teste que procura avaliar a capacidade dos vasos sanguíneos de resistir a
uma determinada pressão. O teste é realizado com o auxilio de um
esfigmomanômetro para aferição da pressão arterial do paciente. Feito isso,
86

calcula-se a média entre a mínima e a máxima, ou seja, a média entre a pressão


sistólica e a diastólica (Exemplo: se a pressão do paciente for 12 X 8, a média de
12+8 é 10mm/Hg). É possível efetuar a leitura do teste utilizando esse valor médio
da pressão no antebraço do paciente, fazendo um quadrado de aproximadamente
2,5 cm com caneta e aguardando 5 minutos. Resultado negativo para até 5
petéquias na área demarcada, de 5 a 10 petéquias, indica positividade de 1+; de
10 a 20 petéquias, indica 2+; de 20 a 50 petéquias, indica 3+; e acima de 50
petéquias, 4+, ou seja, altíssima fragilidade capilar e risco de hemorragia iminente.
Os resultados positivos para prova do laço podem indicar coagulação
intravascular disseminada, diminuição do fibrinogênio, diminuição da protrombina,
deficiência de fator VII, trombocitopenia, tromboastenina, doença de Von
Willebrand, bem como deficiência de vitamina K. Pode estar associado a doenças
não relacionadas com as patologias da coagulação, como escarlatina, hipertensão,
diabetes, gripe, sarampo, escorbuto e principalmente dengue.

CONFECÇÃO DA EXTENSÃO DE SANGUE EM LÂMINA PARA


CONTAGEM DE CÉLULAS SANGUÍNEAS

A contagem e a descrição morfológica dos glóbulos vermelhos, brancos e


plaquetas são obtidas através da observação da distenção do sangue em lâmina
ou do esfregaço sanguíneo. Para uma boa descrição da lâmina, é necessário que
o esfregaço seja fino e regular, e que apresente margens livres. Assim, possibilita
uma adequada distribuição das células. Os esfregaços podem ser feitos a mão,
mas atualmente existem equipamentos automatizados que realizam a confecção
dos esfregaços. É necessário utilizar uma lâmina, que deve estar limpa e
desengordurada, e um distensor ou extensor de vidro transparente (geralmente
uma lâmina lapidada, ou pode-se montar um extensor com uma lamínula grudada
a uma lâmina com esparadrapo). O esfregaço ideal não deve ser muito espesso
87

nem muito fino e deve estar livre de falhas na região da cauda. Na observação ao
microscópio, a região da cauda deve apresentar os eritrócitos mais separados e os
leucócitos e monócitos bem distribuídos, a fim de que a leitura da lâmina, que será
realizada desde a borda superior até a inferior da cauda da lâmina, possa condizer
com o quadro clínico do paciente.

Figura - Esfregaço sanguíneo. Vista lateral (a), vista superior (b).

Existem diversos corantes utilizados para diferenciar os vários componentes


celulares, permitindo, ao microscópio, reconhecer diversos tipos morfológicos.
Entre eles, é possível destacar os corantes Geena, Wright, Mas Rünwald,
May Grünwald-Giensa, Write-Giensa e Leishman. O corante Leishman é um
derivado do corante primitivo de Romanosky, em que os elementos do sangue têm
afinidade para as cores de anilina ácida, básica ou neutra. Os núcleos apresentam
uma coloração azulada, devido ao azul de metileno, que é um corante básico. Os
citoplasmas coram-se de casina, que é um corante ácido. A coloração mais utilizada
em uma rotina de laboratório é o Panótico Rápido, estabelecida por Romanowsky.
88

Tal coloração é submetida à ação de fixador, em que, ao final da última imersão, o


esfregaço encontra-se pronto para leitura. As demais colorações são utilizadas em
pesquisas, por aproveitarem um maior tempo para coloração. O esfregaço deve ser
preferencialmente de sangue, sem contato com anticoagulante (punção digital ou
da agulha). Para obter resultados adequados, o pH da água é fundamental.

FRACIONAMENTO CELULAR (SORO, PLASMA, SANGUE TOTAL)

Noções sobre técnicas aplicadas ao eritrograma e leucograma

Através do exame hematológico, é possível obter informações do estado de


saúde ou da presença de algumas doenças do organismo. O hemograma deve
conter o eritrograma, o leucograma, a contagem de plaquetas e uma descrição da
observação da lâmina ou do esfregaço sanguíneo.
O eritrograma caracteriza-se pela contagem de eritrócitos (CE) (106/mm3),
dosagem da hemoglobina (HB= g/dl), volume globular ou hematócrito (HT= %),
volume corpuscular médio (VCM= mm3 ou fm3), hemoglobina corpuscular média
(HC= pg) e concentração da hemoglobina corpuscular média (CHCM= g/dl). O
índice RDW avalia a amplitude da superfície dos eritrócitos.
O leucograma inclui a contagem global e a diferencial ou específica dos
glóbulos brancos. Os índices avaliados são: contagem total de leucócitos (CTL)
(103/mm3) e contagem diferencial de leucócitos (CDL) que incluem neutrófilos
(bastonetes e segmentados), eosinófilos, basófilos, linfócitos e monócitos. A
contagem de cada leucócito é expressa em porcentagem (%), ou valor relativo, e
em 103/mm3 (valor absoluto).
Para as plaquetas, os contadores automatizados fornecem o índice PDW
(%), que demonstra a amplitude das superfícies das plaquetas quantificadas, e o
índice MPV (fm3), que indica o volume médio plaquetário. Para a contagem
89

absoluta de plaquetas, os valores são expressos em 103/mm3.


Essas são as análises quantitativas de um hemograma. As análises
qualitativas são fundamentais para auxiliar no diagnóstico clínico, pois através dele
é possível observar o tamanho e a forma celular, a coloração e as inclusões
citoplasmáticas e nucleares, a presença de vacúolos, as atipías celulares etc.

DETERMINAÇÃO DA HEMOGLOBINA

A dosagem de hemoglobina é realizada através da leitura de uma solução


de hemácias lisadas em um espectrofotômetro. Os equipamentos automatizados e
semi-automatizados da hematologia realizam essas dosagens. Contudo, o princípio
do método manual é o seguinte: Utilizar padrões de hemoglobina com
concentrações conhecidas, geralmente utilizando as concentrações de 5, 10 e/ou
15g/dl. Em um tubo de ensaio, pipetar 5,0 ml de reativo de Drabkin (substância
hemolisante fabricada industrialmente) e colocar 20µl de sangue total
(homogeneizado e colhido em tubo com EDTA). Incubar 10 minutos em
temperatura ambiente, e fazer a leitura em espectrofotômetro em 540 nm zerando
o aparelho com o reativo de Drabkin.

Cálculo:

Determina-se a densidade ótica (DO) do padrão e posteriormente calcula-se


um fator que fornecerá a concentração de cada amostra quando medida com
mesmo reagente.

Portanto:
[ ]P =F
DO P
90

Assim:

Fator: concentração do fato leitura do padrão


Então: [ ] da Hb da amostra = DO amostra x Fator.

Assim: Leitura x fator = Hb g /dl

DETERMINAÇÃO DO HEMATÓCRITO

Hematócrito (Ht) é o índice determinado pelo volume das hemácias sobre o


volume total dessa amostra (que compõe, além das hemácias, as plaquetas, os
leucócitos e o plasma, sendo que este representa mais da metade do volume total
da amostra). Os valores diferenciam conforme a idade e o sexo, sendo a mulher de
36 – 45% e o homem de 40 – 50%. Os recém-nascidos apresentam valores
elevados que diminuem até atingirem a idade adulta.

Procedimentos:

• preencher ¾ do volume do tubo capilar e vedar uma das extremidades


(com massa de modelar ou queimando);

• colocar em seguida o tubo na micro centrífuga (colocando a parte


vedada para fora);

• centrifugar a 10.000 RPM por 5 minutos;

• realizar a leitura em tabela apropriada.


91

CÁLCULO DOS ÍNDICES HEMANTIMÉTRICOS (VCM, HCM E CHCM E


RDW)

VCM (Volume Corpuscular Médio): 80-98 fl (fentolitros): índice que auxilia no


diagnóstico da anemia e na observação do tamanho das hemácias. Se forem
pequenas, são denominadas microcíticas; se forem grandes, macrocíticas; se
forem normais, normocíticas. O calculo do VCM = (HT/HE) x 10.

HCM (Hemoglobina Corpuscular Média): 27 a 32 pg (picogramas). Peso


da hemoglobina na hemácia, que é obtido em picogramas. HCM = (Hb/HE) x 10.

CHCM (Concentração de Hemoglobina Corpuscular Média), em


peso/volume - pg/fl ou %: 31 a 35%. Concentração da hemoglobina dentro da
hemácia, sendo o intervalo normal de 32 – 36g/ dl. Pelo fato da hemácia depender
da quantidade de hemoglobina, elas são denominadas hipocrômicas (<32),
hipercrômicas (>36) e normocrômicas (em seu normal). É essencial notar que na
esferocitose, o CHCM normalmente é alto. – CHCM = (Hb / Ht) x 100 (%). Os
valores considerados acima de 36% (hipercromia) não ocorrem, pois há a perda de
porções de membrana e desidratação do eritrócito, exceto na esferocitose.

RDW (Red Cell Distribution Width): índice que aponta a variação de


tamanho – anisocitose, na qual o seu valor normal varia de 11 a 14%.

CONTAGEM ABSOLUTA E RELATIVA DE LEUCÓCITOS

Para realizar a técnica manual de contagem de leucócitos, ou leucograma


manual, deve-se proceder da seguinte forma:
92

• pipetar 0,4 ml do líquido de Turk (reagente comercializado) no tubo;

• com pipeta automática, pipetar 0.02 ml de sangue. Limpar a ponteira com


papel de filtro;

• transferir os 0,02 ml (20µl) de sangue para o tubo com o líquido diluidor,


lavando com ele o interior da pipeta por aspiração e expulsão do líquido. A diluição
é de 1:20;

• agitar suavemente por dois minutos;

• encher os dois retículos da câmara de contagem, evitando excesso de


líquido e bolhas de ar sob a lamínula;

• deixar repousar de um a dois minutos para sedimentação dos glóbulos;

• focalizar a preparação com pequeno aumento no microscópio para


localizar o retículo e observar a distribuição uniforme dos leucócitos. Em seguida,
observar com aumento de 100 ou 400 x, a desejar;

• fazer a contagem de todos os leucócitos encontrados nos quatro


quadrantes somados, multiplicar por 20 (diluição), multiplicar o resultado obtido por
10 (profundidade) e dividir o valor por 4. O resultado é em mm³.

Para a determinação relativa e absoluta dos leucócitos, a leitura do


esfregaço corado é essencial, realizando uma contagem de até 100 leucócitos e
anotando as quantidades encontradas de bastonetes, segmentados neutrófilos,
eosinófilos, basófilos, linfócitos e monócitos. Portanto, essa será a contagem
93

relativa, ou seja, a porcentagem de tipos celulares em 100 leucócitos contados. O


valor absoluto vem da relação entre o valor obtido (relativo %) e o total de leucócitos
contados em câmara. Desse modo, se forem contados 65 neutrófilos segmentados,
haverá um total de 8.000 leucócitos / mm³, calculando como valor absoluto de
neutrófilos = 65 * 8.000 / 100. Ou seja, o valor absoluto para neutrófilos é de
5.200/mm³. Realiza-se, então, o mesmo cálculo para a obtenção dos valores
absolutos dos outros tipos celulares.
Além do hemograma, algumas outras metodologias são aplicadas em
hematologia laboratorial.
Dentre elas, é possível citar a VHS (Velocidade de Hemo Sedimentação).
O VHS é um exame simples, de baixo custo e de fácil realização. É
frequentemente utilizado para auxiliar no diagnóstico de afecções inflamatórias,
infecciosas e neoplásicas. O exame consiste na medida da altura da camada de
hemácias de uma amostra de sangue venoso anticoagulado que se sedimenta em
um tubo graduado num determinado período de tempo. O tubo é preenchido até a
marca zero e deixado na posição vertical por uma hora. A VHS, expressa em mm/h,
será a distância do menisco até o topo da coluna de eritrócitos. O exame deve ser
feito até duas horas após a coleta e a uma temperatura deve estar entre 20ºC e
25ºC.
Os valores de referência da VHS variam de acordo com o sexo e a idade,
sendo os valores mais altos no sexo feminino. Quanto à idade, há um aumento de
0,85mm/h a cada cinco anos. Esse aumento pode estar relacionado com o aumento
de doenças ocultas em pacientes idosos. Alguns fatores podem influenciar em
resultados falso-positivos, como, por exemplo, a inclinação do tubo, a concentração
de anticoagulante, o uso de medicamentos (heparina) e contraceptivos orais.
A VHS é uma prova com baixa especificidade, pois é aumentada por
diferentes causas, como doenças malignas, infecções, doenças inflamatórias,
anemias, aumento do esforço físico, menstruação etc. Além dos erros analíticos,
94

outros fatores interferem na diminuição da VHS, como temperatura em ambientes


menores que 20°C, atraso na realização do teste, uso de medicamentos (anti-
inflamatórios não hormonais e corticóides), aumento do hematócrito, hemácias
falciformes, hipofibrinogenemia hereditária e coagulação intravascular. Assim,
conclui-se que VHS é um teste sensível, porém não específico.

TIPAGEM SANGUÍNEA

Os tipos sanguíneos foram descobertos no início do século XX (1900 - 1901)


pelo cientista austríaco Karl Landsteiner, que observou diferenças no sangue de
diversos indivíduos. Landsteiner fez diferentes combinações entre plasma e
hemácias, observou a presença de aglutinação dos glóbulos em alguns casos e a
ausência em outros. O cientista explicou por que algumas pessoas morriam depois
de transfusões de sangue e outras não. Em 1930, ele ganhou o Prêmio Nobel por
esse trabalho.
Os sistemas sanguíneos incluem antígenos produzidos a partir de genes
alelos de mesmo locus gênico, ou por um complexo de dois ou mais genes
homólogos ligados. Os antígenos produzidos por alelos são antitéticos. Os termos
homozigose e heterozigose aplicam-se a genes e não a antígenos.

Sistemas de grupos sanguíneos

Atualmente, a ISBT (International Society of Blood Transfusion) reconhece


32 sistemas sanguíneos com mais de 250 antígenos eritrocitários.

Tabela - representado os sistemas sanguíneos e o numero de anticorpos


associados a cada um.
95

Número Nome do Sistema Símbolo Nº de antígenos


001 ABO ABO 4
002 MNS MNS 43
003 P P1 1
004 Rh RH 48
96

Número Nome do Sistema Símbolo Nº de antígenos


005 Lutheran LU 19
006 Kell KEL 24
007 Lewis LE 6
008 Duffy FY 6
009 Kidd JK 3
010 Diego DI 21
011 Yt YT 2
012 Xg XG 2
013 Scianna SC 4
014 Dombrock DO 5
015 Colton CO 3
016 Landsteiner-Wiener LW 3
017 Chido Rodgers CH RG 9
018 Hh H 1
019 Kx XK 1
020 Gerbich GE 7
021 Cromer CROM 10
022 Knops KN 8
023 Indian IN 2
024 Ok OK 1
025 Raph RAPH 1
026 John Malton Hagen JMH 1
027 I I 1
028 Globoside GLOB 1
029 GIL GIL 1
Adaptado de: Oliveira, M.R.A de A. Hematologia Básica – Fundamentos e
Estudo Laboratorial. 2a Ed. American Med. São Paulo. 1998.
97

Sistema de grupo sanguíneo ABO

O sistema ABO foi o primeiro dos grupos sanguíneos descobertos (1900 a


1901) no início do século XX, em 1900, pelo cientista austríaco Karl Landsteiner. É
considerado, do ponto de vista transfusional, o de maior importância.
Os mais graves incidentes transfusionais são decorrentes de transfusões
ABO-incompatíveis, tendo como evolução, em alguns casos, o óbito. O locus ABO
está localizado no braço longo do cromossomo 9. Deve ser estudado com seus
associados Hh(H) e Lewis(LE), uma vez que seus antígenos têm a mesma origem
bioquímica, pois são moléculas complexas presentes em glicolípídeos e
glicoproteínas membranares de diversos tecidos, além das hemácias.
Os genes H (dominante) e h (recessivo) condicionam a presença de uma
substância precursora, denominada antígeno H. Os indivíduos de composição
genética HH ou Hh produzem essa substância, que serve de base para a
manifestação de todos os antígenos do sistema ABO. Seu grupo será determinado
pela presença ou não dos genes A e B. Indivíduos de composição genética hh
(genótipo muito raro) não produzem o antígeno H, sendo sempre do grupo
denominado fenótipo O Bombay. Os indivíduos Bombay possuem os anticorpos
anti-H. A frequência desses indivíduos é de 1 para 10.000 na Índia, e 1 para
1.000.000 na Europa.
A classificação dos fenótipos ABO eritrocitários correspondem à presença
ou ausência dos antígenos A / B na membrana da hemácia. Os indivíduos
naturalmente formam anticorpos contra antígenos que não possuem. Estes podem
ser detectados no soro ou plasma.
Para determinação do fenótipo ABO, recomenda-se pesquisar os antígenos
(prova direta) e os anticorpos (prova reversa). Cada indivíduo herda um gene ABO
de cada progenitor, sendo esses genes determinantes sobre quais antígenos ABO
estarão presentes na membrana do eritrócito.
98

No Brasil, determinou-se, pela legislação, que as provas de aglutinação não


sejam feitas em lâminas, mas sim por métodos mais precisos. Podem ser utilizados
os métodos em microplacas e/ou em tubos de ensaio, ou o mais recente método
da gel-centrifugação. Na prova direta, faz-se reagir uma porção das hemácias (de
tipagem desconhecida) com soros anti-A, anti-B e anti-AB. O procedimento oposto
é feito na prova reversa, em que se faz reagir o soro (de tipagem desconhecida)
com hemácias conhecidas dos grupos A e B.

Sistema de grupo sanguíneo Rh

Descoberto em 1939 por Levine e Steltson através da eritroblastose fetal em


um recém-nascido, o sistema sanguíneo Rh é o maior e mais complexo sistema de
grupo sanguíneo, compreendendo atualmente 52 antígenos, sendo que 5 destes
são os mais importantes: D, E, e, C, c.
Dois genes estruturais controlam a produção de proteínas não-glicosiladas:
Rh:gene RHD e o gene RHCE
O fator Rh é um dos grupos de antígenos eritrocitários de maior importância
clínica, estando envolvido nas reações transfusionais hemolíticas e na Doença
Hemolítica do Recém-Nascido (DHRN ou Eritroblastose fetal).
Os antígenos dos sistemas Rh são altamente imunogênicos. Na
administração de uma quantidade de 1 a 10 ml de glóbulos vermelhos D positivo
em indivíduos D negativos há uma chance de desenvolvimento de 80% de anti-D.
Gravidez subsequente com feto D positivo induz a imunização secundária da
mãe, na qual o anticorpo IgG atravessará a barreira placentária, produzindo icterícia
neonatal ou DHPN. Os antígenos são exclusivamente eritrocitários, surgindo em
torno da 10º semana de vida intrauterina.
Sua determinação, juntamente com a dos antígenos pertencentes ao
sistema ABO, no procedimento laboratorial denominado tipagem sanguínea (ABO
99

e Rh) é obrigatória antes de qualquer transfusão sanguínea.


O antígeno D é o mais importante devido a sua alta imunogenicidade,
possuindo variantes fenotípicas:

• D normal: possui todos os epítopos(9);


• D fraco: variação quantitativa produzida, ocorrendo menor expressão da
proteína RhD;
• D parciais: são caracterizados pela ausência de um ou mais epítopos do
antígeno D. Transfusionalmente, a conduta é controversa, mas geralmente:
• Doadores D fraco ou D parcial: devem ser considerados Rh positivos;

• Receptores D fraco: deve-se, preferencialmente, transfundir sangue D


negativo em indivíduo D fraco, e fazer prevenção de imunização de mãe D fraco
com imunoglobulina anti-Rh (RhoGam).

Sistema sanguíneo Kell

Este foi o primeiro anticorpo descrito em 1946 por Coombs e seus


colaboradores. Detectou-se sensibilização de hemácias de um recém-nascido por
anticorpos maternos (anti-Kell).
O sistema Kell é um dos maiores sistemas sanguíneos, sendo complexo e
polimórfico. A descoberta do gene Kell contribuiu muito para a ampliação deste
sistema. A total expressão dos antígenos depende de duas proteínas: Kell e XK.
Seus antígenos são muito imunogênicos, frequentemente induzindo a produção de
anticorpos. Pode ser responsável por reações transfusionais hemolíticas severas
ou DHPN.
A Síndrome Mc LEOD ocorre em virtude da ausência da proteína Kx na
100

membrana do eritrócito, levando a fraca expressão dos antígenos Kell, o que


acarretará em uma anemia hemolítica leve. Recomenda-se que indivíduos
politransfundidos recebam unidades negativas para K, evitando, assim, a
sensibilização. Os anticorpos do sistema Kell geralmente são IgG, podendo causar
DHPN grave, sendo que 20% ativam o sistema complemento.

Sistema sanguíneo Duffy

Esse é o símbolo do sistema FY, que possui o nome do gene FY. Possui seis
antígenos: Fya, Fyb, Fy3, Fy4, Fy5 e Fy6. O primeiro caso anti-Fya foi descoberto
em 1950 por Cutbush e colaboradores. Os antígenos estão envolvidos em
incompatibilidades transfusionais, DHRN e na invasão das hemácias pelo parasita
da malária (P. vivax).
Em caucasianos, encontram-se 3 fenótipos: Fy(a+b-), Fy(a-b+) e Fy(a+b+).
O alelo que não produz Fya e nem Fyb é o principal alelo em negros. O fenótipo
Fy(a-b-) é uma vantagem evolutiva da raça negra. Os antígenos Fya e Fyb estão
presentes em fetos de 6 a 7 semanas. Os polimorfismos entre Fya e Fyb resultam
em uma troca de aminoácidos (Gly44>Asp). Os antígenos expressam-se em
células eritróides e não-eritróides (cérebro, rins, baço, coração, pulmão). São
moderadamente imunogênicos: Fya 40x menos imunogênico que K. Podem causar
DHPN.

Sistema sanguíneo Kidd

Representado pelo símbolo JK e localizado no gene SLC14A1, o sistema


Kidd possui três antígenos: Jka, Jkb, Jkc, descobertos em 1951. Possui função de
transporte de uréia. Seus antígenos estão bem desenvolvidos ao nascimento
(detectados em torno da 7a a 11a semana de gestação). São encontrados além
101

dos eritrócitos em células endoteliais do rim. Possuem moderada imunogenicidade


e estão envolvidos em severas reações hemolíticas imediatas e tardias. Podem
causar DHRN não severas.

Sistema Lewis

Representado pelo símbolo Le e localizado no gene FUT3, o sistema Lewis


possui seis antígenos: Lea, Leb, Leab, LebH, Aleb, Bleb.
Os sistemas ABO, H e LE são considerados associados, uma vez que seus
antígenos são partes de moléculas complexas. Estão presentes em glicolipídeos e
glicoproteínas membranares de vários tecidos.

Sistema MNS

Representado pelo símbolo MNS, esse sistema, depois do Rh, é o que tem
mais antígenos, possuindo 43 deles, sendo que o M e N foram descobertos por
Landsteiner em 1927. Em 1947, foi descrito o antígeno S; em 1951, seu antitético
s; em 1953, o antígeno U de alta frequência.
Estão associados à sialoglicoproteínas da membrana, Glicoforina A (GPA) e
Glicoforina B (GPB). São importantes na manutenção do Potencial Zeta, estando
bem desenvolvidos ao nascimento. Estão envolvidos em DHPN.
Anticorpos MNS, geralmente naturais e irregulares, reagem melhor a 4ºC,
podendo reagir fracamente a 37ºC. São quase sempre IgM, e podem apresentar
associação com IgG. Normalmente se fixam no complemento e raramente causam
DHPN.

Sistema Diego
102

Representado pelo símbolo DI e localizado no gene SLC4A1, o sistema


Diego possui 21 antígenos, sendo os mais conhecidos: Dia, Dib, Wra e Wrb. Em
1955, Layrisse e seus companheiros descreveram o primeiro caso de DHPN. Seus
antígenos estão localizados na proteína banda 3 na membrana.

ANTICORPOS INESPECÍFICOS

Antígenos são substâncias reconhecidas pelo organismo como não próprias


(non-self). Antígenos eritrocitários podem ser reconhecidos como não próprios pelo
sistema imune do receptor do concentrado de hemácias, que podem estimular a
formação de anticorpos.
Epítopo é a menor parte de um antígeno capaz de estimular resposta
imunológica se ligando ao anticorpo. Cada antígeno pode ter um ou mais epítopos,
sendo que cada um deles pode se ligar a determinado anticorpo específico. Um
anticorpo liga-se somente a uma porção específica da molécula de antígeno.

Figura - Mostra a posição dos epítopos de um antígeno causando resposta


imunológica do anticorpo específico.

Os antígenos eritrocitários estão presentes na membrana das hemácias, são


103

inofensivos ao próprio indivíduo e estimulam a produção de resposta imune


específica em outro organismo. Podem ser adquiridos através de transfusões ou
gestações. São formados por carboidratos ou proteínas e determinados
geneticamente. Uma mesma hemácia apresenta vários antígenos de vários
sistemas sanguíneos diferentes. São estruturas que possuem funções biológicas
nas células

Propriedades:

• Imunogenicidade: capacidade de estimular a produção de anticorpos;


• Antigenicidade: capacidade de interagir especificadamente com o
produto da resposta imune.

Anticorpos ou imunoglobulinas são substâncias produzidas a partir da


ativação dos glóbulos brancos (linfócitos B). Sua função é desencadeada com a
ligação deste com o antígeno. Os anticorpos contra antígenos eritrocitários podem
ser classificados como:

• imunes: após ativação do sistema imune. Exemplo: após transfusão ou


gravidez, contra algum antígeno reconhecido como não próprio;
• naturais: no sistema ABO, por exemplo, anticorpos formam-se contra
antígenos não presentes no indivíduo, sem necessidade de contato prévio com
antígenos;
• regulares: ocorrência é esperada, como, por exemplo, no caso dos
anticorpos ABO;
• Irregulares: ocorrência não é esperada, como, por exemplo, anticorpos
formados após aloimunização por transfusão.
104

Classe dos anticorpos em imunohematologia:

• IgM: molécula pentamérica, geralemente fria, que não atravessa a


barreira placentária. Em geral, ativa o complemento. São naturais e regulares no
sistema ABO, e naturais e irregulares nos sistemas Lewis, P, MNS;
• IgG: principal imunoglobulina sérica (75% de todas as Ig), molécula
monomérica que tem a capacidade de atravessar a barreira placentária.
Normalmente não possui capacidade de ativar o sistema complemento. São imunes
e irregulares nos sistemas Rh, Kell, kidd, Duffy, MNS.

Classificação dos anticorpos:

• Heteroanticorpos: produzidos contra antígenos de indivíduos de


espécies diferentes. Exemplo: produção de soro anti-globulina humana (Coombs)
>imunização de coelhos por anticorpos humanos;
• aloanticorpos: contra antígenos reconhecidos como não próprios ao
indivíduo, mas provenientes da mesma espécie. Exemplo: imunização por
transfusão;
• auto-anticorpos: age contra antígenos do próprio indivíduo.
Exemplo: doenças autoimunes.

A hemólise é o resultado da reação AgXAc. O sangue que corre dentro dos


vasos, ou ainda uma suspensão de hemácias em solução fisiológica (NaCl a 0,9%)
constitui um sistema estável, ou seja, os glóbulos mantêm certa distância uns dos
outros. Existe uma força de repulsão entre os glóbulos quando eles se aproximam.
Grupos carboxílicos COOH- possuem sialoglicoproteínas das hemácias. Para que
haja hemaglutinação, esta força precisa ser alterada.
Potencial Zeta é a diferença de potencial elétrico criado entre a nuvem de
105

cátions, atraídos pelas cargas elétricas negativas da membrana eritrocitária,


promovendo, assim, repulsão entre as hemácias.
As hemácias podem ser agregadas quando a carga elétrica entre elas é
alterada, o meio de suspensão é modificado, a superfície celular é modificada, bem
como a aglutinabilidade de um sistema é tanto maior quanto mais baixo for o valor
do potencial zeta.

A redução da carga elétrica das hemácias é favorecida por alguns fatores:

• fixação de anticorpos específicos > neutralizam cargas elétricas,


diminuindo a força de repulsão entre elas;
• quando um anticorpo se liga à membrana das hemácias, a distância
entre elas diminui.

Há uma variedade de métodos para investigar as reações imunológicas in


vitro, como precipitação, aglutinação, fixação do complemento, enzima imuno-
ensaio.

Hematologia Clínica e Banco de Sangue

Em um banco de sangue, o método mais utilizado é denominado


aglutinação, que se trata da reação que leva a formação de grumos de células,
como hemácias, bactérias e partículas virais. Aglutinação de eritrócitos é
denominada hemaglutinação.
A resposta imunológica em aloimunização eritrocitária compreende
basicamente a aloimunização a antígenos eritrocitários. Os sistemas Rh, Kell, Duffy
e Kidd são os mais imunogênicos. Em imunohematologia, é possível pesquisar in
vitro a interação entre antígenos e anticorpos.
106

Para promover a pesquisa de anticorpos irregulares in vitro, utilizam-se


substâncias potencializadoras, as quais são substâncias ou meios capazes de
promover alterações no equilíbrio elétrico cinético existente entre hemácias
suspensas em meio isotônico. Permitem a detecção de anticorpos ligados em sua
membrana, aceleram a reação, melhoram o acesso aos anticorpos. Exemplos: soro
antiglobulina humana (soro Coombs), albumina bovina, enzimas proteolíticas
(ficina, papaína, bromelina) e soluções de baixa força iônica (LISS).
O teste de antiglobulina humana, ou teste de Coombs, é a forma mais
importante de aglutinação artificial em imunohematologia. É utilizado para pesquisa
e identificação de anticorpos irregulares e teste de compatibilidade pré-
transfusional. A leitura pode ser feita em diversas fases. Em tubo, realizam- se
geralmente três fases, utilizando-se sempre o potencializador:

• T° C ambiente;
• 37°C;
• fase de antiglobulina humana.

Resultados positivos em qualquer uma das fases indica a presença de


anticorpos irregulares, que podem ser identificados através de um painel de
hemácias.
A sensibilidade do teste pode ser aumentada por substâncias que modificam
a primeira etapa da reação, como adição de albumina, meios de baixa força iônica
(LISS) e tratamento enzimático.
Os anticorpos irregulares ocorrem em aproximadamente 0,3% a 2,0% da
população em geral. O risco de aloimunização é de aproximadamente 1% por
unidade transfundida.
Prova cruzada maior: teste pré-transfusional que verifica reação in vitro entre
soro/plasma do receptor e as hemácias do doador.
107

Prova reversa da fenotipagem ABO: teste confirmatório da prova direta da


fenotipagem ABO, realizada adicionando-se soro/plasma do indivíduo a ser
testado, em suspensão de hemácias comerciais de tipos sanguíneos A e B.
TAD (Teste de Antiglobulina Direta) ou Coombs direto: teste realizado
utilizando reagente antiglobulina humana e suspensão de hemácias-teste lavadas.
108

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