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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA - UFBA

ESCOLA DE NUTRIÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ALIMENTOS, NUTRIÇÃO E
SAÚDE

LISANE DA SILVA OLIVEIRA

INSTRUMENTOS E ESTRATÉGIAS DE RASTREIO DE TRANSTORNOS


ALIMENTARES ENTRE USUÁRIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA DE SAÚDE E
SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL: UM ENSAIO ACADÊMICO

Salvador
2023
LISANE DA SILVA OLIVEIRA

INSTRUMENTOS E ESTRATÉGIAS DE RASTREIO DE TRANSTORNOS


ALIMENTARES ENTRE USUÁRIOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA DE SAÚDE E
SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL: UM ENSAIO ACADÊMICO

Ensaio acadêmico apresentado à


disciplina NUT A87 - Segurança
Alimentar e Nutricional, como requisito
para aprovação na disciplina.
Área de Concentração: Segurança
Alimentar e Nutricional
Linha de pesquisa: Bases Experimentais
e Clínicas da Nutrição.
Orientadora: Mônica Leila Portela de
Santana
Docentes da disciplina: Sandra Maria
Chaves e Ryzia Cardoso

Salvador
2023
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 4
2. RELAÇÃO ENTRE O OBJETO DE ESTUDO E A SEGURANÇA ALIMENTAR
E NUTRICIONAL ........................................................................................................... 4
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 6
REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 6
4

1. INTRODUÇÃO

Os transtornos alimentares (TA’s) são condições psiquiátricas marcadas por uma


perturbação persistente na alimentação ou no comportamento alimentar que leva A uma
alteração no consumo ou na absorção de alimentos e que prejudicam o funcionamento
psicossocial e físico (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2013). Ainda que
subnotificados, principalmente em países subdesenvolvidos, os TA atingem mais de 55,5
milhões de pessoas no mundo e ocupam a 33ª posição nas doenças com maior número de
anos perdidos por incapacitação (SANTOMAURO et al., 2021), sendo a anorexia nervosa
(AN), bulimia nervosa (BN) e transtorno de compulsão alimentar periódica (TCAP) os
mais conhecidos. Apesar da prevalência relativamente baixa, os TA’s apresentam altas
taxas de mortalidade, particularmente para anorexia nervosa, e incapacidade, exigindo
ações para prevenção e tratamento dessas condições (TREASURE; DUARTE;
SCHMIDT, 2020; WARD et al., 2015).

A detecção precoce dos TA’s pode ajudar na redução do tempo entre o


aparecimento dos sintomas e o início do tratamento adequado e, consequentemente,
diminuir os desfechos desfavoráveis (mortalidade e risco de suicídio), bem como o
impacto social e econômico (KALINDJIAN et al., 2021). Assim, é crucial que
profissionais da atenção primária tenham capacidade de reconhecer e iniciar o tratamento
desses pacientes, considerando que a maioria dos casos é apresentada neste contexto
(ROWE, 2017).

Os TA’s estão associados comumente, na literatura médica, a meninas e mulheres


ocidentais, brancas e de classe social elevada (ALABRESE; BOSI; SCHETTINI, 2022).
No entanto, alguns estudos recentes demonstraram que existe uma relação entre a
insegurança alimentar e TA’s, onde indivíduos de baixa renda de comunidades
marginalizadas podem sofrer destes distúrbios, desafiando os estereótipos generalizados
(BECKER et al., 2017). Este trabalho tem como objetivo investigar as possíveis
associações entre os TA’s e a Segurança Alimentar e Nutricional (SAN).

2. RELAÇÃO ENTRE O OBJETO DE ESTUDO E A SEGURANÇA


ALIMENTAR E NUTRICIONAL
A Insegurança Alimentar e Nutricional (ISAN) tem um impacto direto na
quantidade, qualidade e frequência da ingestão de alimentos. Indivíduos que vivem nesse
contexto enfrentam dificuldades em ter refeições equilibradas, têm medo de que a comida
acabe, deixam de comer quando estão com fome, reduzem o tamanho das refeições ou
passam dias inteiros sem se alimentar (ALABRESE; BOSI; SCHETTINI, 2022). Como
resultado, essas circunstâncias podem levar a uma relação disfuncional com a comida e
ter efeitos adversos na saúde mental, incluindo depressão e ansiedade (ARENAS et al.,
2019). Além disso, a gravidade da insegurança alimentar pode estar associada à gravidade
do transtorno alimentar (BECKER et al., 2017).

Segundo Rasmusson e Colaboradores (2020), indivíduos que vivenciaram de


forma regular e significativa a privação alimentar têm maior risco de desenvolver TA’s,
especialmente a TCAP e a BN. No estudo conduzido por Becker e colaboradores (2017),
os participantes com insegurança alimentar relataram episódios mais frequentes de
compulsão alimentar em comparação com os que estavam em segurança alimentar
(16,4% versus 7,9%). Este estudo também demonstrou maior prevalência de alimentação
noturna, purgação e outros comportamentos alimentares compensatórios em indivíduos
que viviam em ISAN. Hooper e Colaboradores (2020) também encontrou associação
entre ISAN e comportamentos compensatórios para controle de peso, como o uso de
laxantes, diuréticos e restrição/jejum.

No que tange a associação entre os TA’s e as dimensões da SAN, sabe-se que a


baixa disponibilidade e acesso aos alimentos pode resultar em uma relação conturbada
com a comida, onde a incerteza pode levar à adoção de dietas restritivas (ALABRESE;
BOSI; SCHETTINI, 2022). Já no que diz respeito à estabilidade, é sabido que a oscilação
na disponibilidade de alimentos aumenta o risco de TA’s, onde a ausência de acesso
consistente dificulta a manutenção de padrões alimentares regulares (HAZZARD et al.,
2020). Em relação a adequação, sabe-se que quando a qualidade, variabilidade e
aceitabilidade cultural dos alimentos acessados são reduzidos, os indivíduos podem
perder o interesse pela comida e desenvolver comportamentos disfuncionais
(ALABRESE; BOSI; SCHETTINI, 2022).

Existe na literatura a hipótese do “ciclo do vale-refeição” ou ciclo de “feast or


famine” onde nota-se que comportamentos de compulsão alimentar tendem a ocorrer no
início do mês, quando o acesso à comida aumenta, como uma estratégia de enfrentamento
emocional e/ou na expectativa de privação futura. Já os comportamentos de restrição
involuntária ocorrem no final do mês, quando os recursos financeiros e alimentares
diminuem, ou seja, a restrição é induzida pela pobreza (DINOUR; BERGEN; YEH, 2007;
RASMUSSON et al., 2020).

Segundo Rasmusson e colaboradores (2020), os sistemas existentes de


distribuição de benefícios nutricionais financiados pelo governo federal poderiam ser
ajustados para melhor se adequar à realidade da insegurança alimentar. Por exemplo, a
implementação de uma distribuição gradual de benefícios alimentares ou a
disponibilização de recursos educacionais direcionados ao planejamento orçamentário
familiar poderiam ter o potencial de aliviar a tensão causada pela escassez e a alternância
cíclica entre períodos de falta e abundância de alimentos à insegurança alimentar.

É importante ressaltar que os profissionais de saúde que atuam na atenção primária


devem estar atentos aos comportamentos alimentares transtornados entre indivíduos com
insegurança alimentar, através da aplicação de instrumentos de triagem, a fim de realizar
encaminhamentos em tempo oportuno para atendimento especializado (MARQUES et al.
2011; RASMUSSON et al., 2020)

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A insegurança alimentar é um problema de saúde pública que pode levar danos à
saúde física e psiquiátrica em indivíduos de baixa renda. Assim, os profissionais de saúde
e os formuladores de políticas públicas devem estar atentos à ocorrência de TA’s
relacionados à insegurança alimentar. Dessa forma, o objeto de pesquisa “Instrumentos e
estratégias de rastreio de transtornos alimentares na atenção primária” dialoga com a
SAN, destacando a relevância e contribuição desta pesquisa para a promoção do Direito
Humano à Alimentação Adequada e Saudável.

REFERÊNCIAS
ALABRESE, M.; BOSI, G.; SCHETTINI, C. Food Insecurity and Insurgency of Eating
Disorders: A Legal and Policy Appraisal. Global Jurist, v. 22, n. 3, p. 465-491, 2022.
Disponível em: https://doi.org/10.1515/gj-2021-0095. Acesso em: 13 jul. 2023.

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (APA). Diagnostic and Statistical


Manual of Mental Disorders. 5th ed. American Psychiatric Association, 2013.

ARENAS, D. J. et al. A Systematic Review and Meta-analysis of Depression, Anxiety,


and Sleep Disorders in US Adults with Food Insecurity. Journal of General Internal
Medicine, v. 34, p. 2874, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s11606-019-
05202-4. Acesso em: 13 jul. 2023.

BECKER, C. B. et al. Food Insecurity and Eating Disorder Pathology. International


Journal of Eating Disorders, v. 50, p. 1031, 2017. Disponível em:
https://doi.org/10.1002/comer.22735. Acesso em: 13 jul. 2023.

DINOUR, L. M.; BERGEN, D.; YEH, M. C. The food insecurity-obesity paradox: a


review of the literature and the role food stamps may play. J Am Diet Assoc, v. 107, n.
11, p. 1952-1961, nov. 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.jada.2007.08.006.
PMID: 17964316.

HAZZARD, V. M. et al. Food Insecurity and Eating Disorders: a Review of Emerging


Evidence. Curr Psychiatry Rep, v. 22, n. 12, p. 74, 2020. Disponível em:
https://doi.org/10.1007/s11920-020-01200-0. PMID: 33125614; PMCID:
PMC7596309.

HOOPER, L. et al. Household Food Insecurity: Associations with Disordered Eating


Behaviors and Overweight in a Population-based Sample of Adolescents. Public Health
Nutrition, v. 23, p. 3126, 2020. Disponível em:
https://doi.org/10.1017/S1368980020000464. Acesso em: 13 jul. 2023.

KALINDJIAN, N. et al. Early detection of eating disorders: a scoping review. Eating


and weight disorders: EWD, v. 27, n. 1, p. 21–68, fev. 2022.

ROWE, E. Early detection of eating disorders in general practice. Australian family


physician, v. 46, n. 11, p. 833–838, nov. 2017.

SANTOMAURO, DF et al. The hidden burden of eating disorders: an extension of


estimates from the Global Burden of Disease Study 2019. The lancet. Psychiatry, v. 8,
n. 4, p. 320–328, abr. 2021.

TREASURE, J.; DUARTE, T. A.; SCHMIDT, U. Eating disorders. Lancet (London,


England), v. 395, n. 10227, p. 899–911, mar. 2020.

WARD, Z. J. et al. Estimation of disease-related costs of eating disorders in the United


States. JAMA network open, v. 2, n. 9, p. e1910319–e1910319, set. 2019.

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