Você está na página 1de 35

EPIDEMIOLOGIA E PERFIL DOS PROBLEMAS

NUTRICIONAIS

1
SUMÁRIO
1. NOSSA HISTÓRIA ....................................................................................................................... 2
2. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 3
3. (des)nutrição, padrão epidemiológico, desenvolvimento e desigualdades ............................... 7
a. (Des)Nutrição: Aspectos Conceituais, Históricos E Antropológicos .......................................... 8
b. Prevalência, Distribuição E Tendência Secular Da (Des)Nutrição Em Um Contexto De
Desenvolvimento E Desigualdades ................................................................................................10
c. Reflexões sobre (des)nutrição na pós-modernidade ..............................................................13
d. Estado Nutricional .................................................................................................................16
e. Avaliação Do Estado Nutricional ............................................................................................17
4. Os Problemas Nutricionais E A Estratégia De Enriquecimento De Alimentos No Brasil ............19
5. Histórico da Epidemiologia Nutricional ....................................................................................23
a. A Epidemiologia Da Anemia Ferropriva ..................................................................................28
b. Epidemiologia da Hipovitaminose A e Xeroftalmia .................................................................30
c. Epidemiologia da Obesidade .................................................................................................31
1. Referências ...............................................................................................................................33

1
1. NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em


atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com
isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível
superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no
desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de
promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem
patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras
normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e


eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética.
Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de
cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do
serviço oferecido.

2
2. INTRODUÇÃO

O cenário epidemiológico que vem se configurando no mundo e no Brasil,


assim como a organização atual da atenção à saúde, demandam um novo perfil dos
profissionais de saúde em geral, e do nutricionista em particular, para responder aos
desafios decorrentes desse cenário. Refletir sobre o quanto esta formação está
sintonizada com tais desafios é estratégico para aumentar a eficácia da atenção à
saúde. Por outro lado, os conhecimentos e práticas que tradicionalmente se
denominam "nutrição em saúde pública" estão em termos conceituais, técnicos e
práticos cada vez mais presentes em outras áreas que não a de saúde, como, por
exemplo, no campo intersetorial da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) e na área
de educação, por meio das ações da alimentação escolar.

O atual contexto de intensas transformações sociais, econômicas e políticas


tem contribuído para as mudanças no perfil de adoecimento da população e gerado
discussões acerca de seus impactos na reorganização da sociedade. Atualmente, o
aumento de doenças e agravos não transmissíveis impulsiona inquietudes quanto ao
paradoxo da coexistência entre desnutrição e obesidade.

Discute-se os aspectos relacionados à nutrição, contemplando as dimensões


de escassez e excessos, sua evolução ao longo do tempo, além da conexão com o
novo padrão epidemiológico. Iniciando com a caracterização conceitual, a
historicidade e a interface antropológica do tema norteador. Em seguida, descreve-se
a prevalência, a distribuição e a tendência secular da desnutrição e da obesidade,
além das relações temporais com o novo padrão epidemiológico no Brasil em um
contexto de desenvolvimento e desigualdades. Trazendo ainda uma reflexão acerca
da (des)nutrição na pós-modernidade, os interesses e os interessados no processo
saúde doença, assim como experiências internacionais e estratégias de cooperação
solidária. Ainda com alguns avanços e desafios atuais diante da complexidade e
velocidade das mudanças contemporâneas.

Classicamente, a epidemiologia estuda a distribuição e os determinantes das


doenças na população. Nas últimas décadas, esta área tem se especializado cada
vez mais e, com isso, vários adjetivos têm sido sugeridos. Seria a epidemiologia

3
nutricional mais uma mera subdivisão da epidemiologia em função de determinantes
específicos, ou ela teria um campo específico de conhecimento?

Entende-se que o objetivo primeiro da epidemiologia nutricional seja medir


dietas como um fator de exposição na maior ou menor ocorrência de doenças. O
alcance desse objetivo constitui-se em tarefa complexa que requer cada vez mais
especialização. O escopo da epidemiologia nutricional no Brasil passou a incorporar
um conceito ampliado que considera tanto o estudo de outras exposições como o de
alterações nutricionais específicas. Entre as exposições, além da aferição do consumo
alimentar, devem ser incluídos outros indicadores de avaliação nutricional e variáveis
relacionadas ao estilo de vida que exercem influência sobre as condições de saúde e
nutrição, como a prática de atividade física. Entre as alterações nutricionais, incluem-
se desde as deficiências como a desnutrição energético-proteica ou deficiências de
micronutrientes específicos até os problemas relacionados ao excesso de peso, como
a obesidade.

O assunto em questão, apresentam e discutem métodos de avaliação do


estado nutricional em diferentes grupos populacionais (gestantes, crianças,
adolescentes, adultos e idosos), referências antropométricas, análises bioquímicas,
de avaliação do consumo alimentar e da composição corporal. Adicionalmente, há
estudos sobre aferição e validação em estudos de epidemiologia nutricional,
intervenções nutricionais e estratégias de análise de dados com medidas repetidas
para avaliação longitudinal do estado nutricional.

A avaliação nutricional de diversos grupos populacionais tem, aqui, papel de


destaque. O estado nutricional dos indivíduos depende do balanço entre o consumo
e as necessidades fisiológicas, que variam em função da idade, específico para
diferentes fases da vida. Os mais jovens e os mais velhos têm se revelado como os
grupos que apresentam maior probabilidade de desequilíbrio na relação entre
consumo e necessidades fisiológicas, que desencadeia distúrbios nutricionais por falta
de nutrientes. Ao passo que o balanço crônico de energia pode ser captado por meio
da antropometria, um método relativamente simples, a avaliação do consumo de
nutrientes depende de métodos específicos mais complexos. Por esses motivos, a
aferição do consumo ou a avaliação de marcadores de consumo alimentar tornam-se
imprescindíveis, particularmente na compreensão do estado nutricional nos extremos
da vida.

4
Mais recentemente, os estudos de validação e de identificação de um padrão
de consumo alimentar passaram a se constituir em instrumentos de grande
importância nos estudos epidemiológicos que buscam investigar a associação entre
dieta e Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT). Instrumentos de investigação
do consumo alimentar devem ser validados (calibrados) para a população em que se
pretende aplicar o referido método, e para isso estudos de validação são uma
ferramenta essencial na epidemiologia nutricional. Padrões de consumo alimentar que
podem ser considerados saudáveis têm sido explorados em vários estudos, e as
técnicas que permitem defini-los. Análises sobre o padrão de consumo são
interessantes porque podem configurar-se como forma efetiva de prevenção,
diferentemente do que acontece em alguns estudos epidemiológicos que buscam
identificar o efeito de um nutriente específico na determinação da cadeia causal das
DCNT.

Descreve-se a epidemiologia dos principais problemas nutricionais brasileiros,


à luz das transições demográfica, epidemiológica e nutricional. É interessante
observar como um estudo sobre a epidemiologia da desnutrição continua sendo tão
atual e importante, embora a desnutrição não seja mais o principal problema
nutricional em nosso país. Com a transição nutricional experimentada no Brasil,
muitos estudiosos e pesquisadores da desnutrição no passado investigam, hoje, a
epidemiologia das DCNT, com destaque para a epidemia da obesidade. A
sobreposição de padrões nutricionais na população brasileira justifica a necessidade
de uma descrição mais detalhada sobre a desnutrição, em concomitância com
assuntos sobre a obesidade, hipertensão, diabetes, síndrome metabólica e doenças
cardiovasculares, além das doenças carenciais como a hipovitaminose A e a anemia
ferropriva.

No conjunto intitulado “Problemas nutricionais brasileiros” procura-se, portanto,


refletir sobre as características peculiares do Brasil. Exemplo dessas peculiaridades é
a coexistência de problemas carenciais endêmicos de grande proporção, como a
anemia, e a epidemia de excesso de peso observada nas últimas décadas do século
XX. Trata-se, portanto, da já reconhecida sobreposição de padrões nutricionais
distintos.

A atividade física consiste em um importante determinante proximal do estado


nutricional e é claramente reconhecida no processo de determinação de várias DCNT.

5
O conceito ampliado da epidemiologia nutricional, inclui temas como a
epidemiologia da amamentação no Brasil, a discussão da medida e do conceito de
segurança alimentar e as políticas nutricionais públicas adotadas no país. Os estudos
que a integram abordam temas da atualidade que de alguma forma retomam as
origens da epidemiologia nutricional, quando as deficiências nutricionais específicas
eram objeto de estudo. Estudos sobre origem fetal das doenças e sobre janelas de
exposição na gênese das doenças apresentam conceitos e teorias que, mais
recentemente, têm demonstrado como a desnutrição e a obesidade convivem nos
mesmos domicílios e nos trajetos de vida, com a desnutrição em momentos
específicos podendo constituir fator de risco para o desenvolvimento de algumas
DCNT.

Espera-se que uma visão ampla e atualizada dos problemas nutricionais de


relevância para a saúde pública possa contribuir na formulação de políticas públicas
voltadas para esses problemas. Com esse conhecimento acumulado pode ser
possível aperfeiçoar e desenvolver protocolos de atendimento mais adequados para
uso no Sistema Único de Saúde (SUS).

6
3. (DES)NUTRIÇÃO, PADRÃO EPIDEMIOLÓGICO, DESENVOLVIMENTO E
DESIGUALDADES

Pretende-se esclarecer aspectos relacionados à nutrição, contemplando as


dimensões de escassez e excessos, e sua evolução ao longo do tempo, além de sua
conexão com o novo padrão epidemiológico do Brasil.

Para delinear a evolução do perfil alimentar e nutricional e tecer as possíveis


redes e relações entre si partiu-se das referências de Josué de Castro e seus
intérpretes, além de publicações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), para caracterizar o período anterior à 1970. De 1970 até 1990 utilizou-se o
Estudo Nacional da Despesa Familiar (Endef), a Pesquisa Nacional sobre Saúde e
Nutrição (PNSN) e a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS), para
caracterizar as três décadas em questão, respectivamente. E finalizou-se a evolução
temporal com os dados referentes ao início do século XXI, utilizando-se como fontes
a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde de mulheres e crianças (PNDSM), além
da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF).

As reflexões acerca da (des)nutrição na pós-modernidade foram desenvolvidas


a partir de uma tríade proposta por Lefevre e Lefevre para a compreensão do processo
saúde/doença dentro de uma lógica de mercado. Segue-se descrevendo alguns
problemas de saúde coletiva provenientes do desequilíbrio dessa tríade, experiências
internacionais e nacionais que tentam priorizar as necessidades individuais e coletivas
em detrimento das exigências mercadológicas, além de iniciativas solidárias entre
países como a Cooperação Sul-Sul (CSS).

7
a. (Des)Nutrição: Aspectos Conceituais, Históricos E Antropológicos

A abordagem da desnutrição no Brasil perpassa a evolução e o


desenvolvimento social, político e econômico do próprio país. Por isso, é inevitável
não retomar a contribuição pioneira e visionária do pernambucano Josué de Castro,
que rompeu com a “conspiração do silêncio” que permeava a temática da “fome” entre
as décadas de 1940 e 1950 e auxiliou na compreensão da problemática em todas as
suas dimensões e naturezas, ao conjugar aspectos biológicos, antropológicos,
socioeconômicos e políticos.

Josué de Castro foi apresentado à fome, segundo o mesmo, nos mangues e


bairros miseráveis do Recife. O autor retrata em seu clássico Geografia da Fome as
características que envolvem essa temática nas diversas regiões do país, as quais
divide em Amazônia, nordeste açucareiro, nordeste seco, centro-oeste e sul. Em
meados de 1940, a fome, endêmica e epidêmica, foi identificada nas três primeiras
regiões e a desnutrição em todas elas.

Para situar o leitor faz-se importante esclarecer a natureza distinta e conceitual


de alguns termos já usados por autores clássicos, como Josué de Castro, mas ainda
polêmicos na literatura. Desnutrição, fome e pobreza costumam ser utilizados como
sinônimos e, na verdade não o são. Descreveu-se em um ensaio, as diferenças
existentes entre esses termos, por isso adota-se essa ótica conceitual para direcionar
as inter-relações.

A pobreza constitui a dimensão mais ampla e corresponde a não satisfação de


necessidades básicas como alimentação, moradia, lazer, vestuário, saúde, educação
e outras. É comumente mensurada através da renda para alcançar as necessidades
elementares citadas e quando abaixo da linha da pobreza, ou seja, nível crítico de
renda, famílias e indivíduos são consideradas pobres. O termo “indigência” pode ser
empregado quando o cálculo da linha da pobreza considera apenas os custos
familiares com a alimentação.

A fome pode se manifestar de forma aguda ou crônica. A fome aguda equivale


a ausência do alimento e, por isso, pode se manifestar na magreza. Enquanto que a
fome crônica, maior interesse desta reflexão, corresponde a oferta insuficiente de

8
energia e nutrientes para desempenho das atividades cotidianas e por isso pode se
manifestar como desnutrição energética ou energético-proteica crônica. A
mensuração direta da fome é de difícil operacionalização e por isso predominam os
métodos indiretos. No Brasil, a pesquisa que mais se aproximou dessa perspectiva foi
o Estudo Nacional da Despesa Familiar (Endef), que avaliou o consumo familiar por
meio de pesagem dos alimentos, da renda, além do estado nutricional.

As diversas modalidades de deficiências nutricionais ou a ausência de


elementos importantes na alimentação podem ser entendidas como desnutrição. Esta
se manifesta na forma de doenças que podem ter origem no aporte alimentar
insuficiente, tanto quanto no desmame precoce, higiene precária, infecções
persistentes que comprometem o aproveitamento biológico dos alimentos, excesso
alimentar com carências específicas e outros. O crescimento das crianças (altura por
idade) é um dos melhores indicadores globais de saúde e também permite inferências
quanto à desigualdade nas populações, uma vez que a própria desnutrição é um dos
produtos da desigualdade social.

A dimensão da pobreza parece ser a que mais se aproxima da perspectiva da


Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) e envolve os demais conceitos. Mas a SAN,
sozinha, não garante a superação da fome e da desnutrição. A fome pode surgir sem
a pobreza em situações momentâneas de guerra e catástrofes naturais. Por outro
lado, uma situação atual e ao mesmo tempo antiga é a permanência da desnutrição
com caráter trans-social, a exemplo da anemia no Brasil e a carência de iodo na
Europa. O aspecto comum a todas estas categorias que comprometem o estado de
saúde e a nutrição é a vulnerabilidade dos grupos ou pessoas acometidas.

Esse novo padrão de adoecimento da população brasileira está fortemente


relacionado com os processos históricos de interferência política nas estruturas de
produção, comercialização e exportação. Estes foram decisivos para o desmonte da
política agrícola e de abastecimento e para o fortalecimento do agronegócio.

Ao recorrer a políticas compensatórias, priorizaram-se grupos organizados e os


recursos públicos começaram a ser direcionados para a iniciativa privada, na
agricultura e em outros setores. Os pequenos agricultores foram diretamente atingidos
e praticamente obrigados a se desvincularem da atividade do campo, fomentando o

9
êxodo rural, enquanto que os grandes empresários mantiveram crescimento
econômico.

Em paralelo ao processo de urbanização, intensificou-se a produção e a oferta


de alimentos industrializados, favorecendo as modificações nos hábitos alimentares,
com a presença cada vez maior destes alimentos nas feiras das famílias. Isto ratificou
a desvalorização do homem do campo, uma vez que o alimento in natura se distancia
cada vez mais do consumidor e passa a seguir outros circuitos que visam sua
modificação pela indústria, aumento do tempo de prateleira, empacotamento e, por
fim, ganho de espaço nos supermercados.

O surgimento de novos espaços como o “supermercado”, por exemplo, com


características muito semelhantes em todo o mundo, com as mesmas marcas, as
mesmas franquias e as mesmas comidas, faz parte desse processo que conduz ao
desaparecimento das características particulares de cada local, região ou país e
expansão generalizada de modos de vida globais.

b. Prevalência, Distribuição E Tendência Secular Da (Des)Nutrição


Em Um Contexto De Desenvolvimento E Desigualdades

Afinal, estaríamos vivenciando há mais de 50 anos “uma transição


alimentar/nutricional ou uma mutação antropológica?”, estaríamos diante de uma
“metamorfose epidemiológica?”. Qual o modelo de (des)nutrição vigente no início do
século XXI em meio às transições demográficas e epidemiológicas?

A melhora nas condições de vida e saúde, saneamento básico, escolaridade,


moradia, acesso a serviços, avanço da tecnologia desde os antibióticos,
anticoncepcionais até a era da genética, além de mudanças socioculturais como a
inserção da mulher no mercado de trabalho, a urbanização e a convivência com outras
doenças, são alguns aspectos que contribuíram para o cenário atual.

Apesar do gasto energético aparentemente superior na transição do século XIX


para o XX, os registros de ingestão calórica variavam de 1.600 a 1.700 calorias ou
menos. A desnutrição estava presente em todas as regiões do país, embora com
causas e manifestações diversas, e que Josué de Castro distribuiu como três “áreas
de fome” e duas “áreas de subnutrição”. Se comparássemos a atual divisão do país

10
seriam duas áreas de fome, regiões Norte e Nordeste, e três de subnutrição, Sul,
Sudeste e Centro-Oeste.

Nesse período, foram encontradas diversas carências nutricionais como


deficiência de sódio, anemia por deficiência de ferro, bócio (deficiência de iodo),
beribéri (deficiência de vitamina B1 na Amazônia) e déficits proteico e calórico, que se
manifestavam nas formas mais graves da desnutrição (marasmo e kwashiorkor), além
das endemias como as verminoses, esquistossomose, doença de Chagas e malária
(na Amazônia). Entretanto, o Sul apresentava o padrão dietético mais equilibrado.

Apesar de uma realidade epidemiológica diferente do contexto atual, Josué de


Castro já fazia referência a diferenças no perfil alimentar vinculado a classes sociais.
Além de também relatar a presença de escassez e excessos, uma vez que enquanto
alguns tinham fome pela ausência do alimento, outros se superalimentavam,
caracterizando ambas as situações como indutoras da má nutrição.

No período que segue, incentivou-se a produção agrícola em massa com a


justificativa de superação da fome, indiretamente verificada por meio do déficit de
peso.

A mortalidade por Doenças Crônicas Não Transmissíveis aumentou em mais


de três vezes. Por outro lado, a anemia permaneceu presente e por outro lado,
reduziu-se o bócio endêmico. A iodação do sal de cozinha foi implementada em todo
território nacional apenas em 1974, quando a agenda de enfrentamento do problema
passou a ser internacional.

No padrão dietético associado a essas mudanças nutricionais, observou-se


aumento no consumo de refrigerantes, biscoitos, embutidos e refeições
industrializadas. Por outro lado, reduziu-se o consumo de ovos, gordura animal,
peixes, raízes e tubérculos. O consumo médio de sal no Brasil (12g/dia) alcançou o
dobro da recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) e se aproxima do
consumo per capita encontrado nos países considerados mais desenvolvidos.

A maior disponibilidade de variedades e quantidade de alimentos, a


implantação de políticas assistenciais que melhoraram o acesso e a distribuição
destes, além da expansão do saneamento, da rede básica de saúde, melhoria da
escolaridade materna e renda familiar, foram alguns avanços que permitiram o

11
alcance de algumas metas do milênio como a erradicação da fome e a superação do
déficit de altura. Ao mesmo tempo o país passou a ocupar a 77ª posição no ranking
da OMS em relação à obesidade.

No início do século XXI, pesquisas reafirmam as intensas desigualdades que


se manifestam de forma injusta em grupos vulneráveis, os mesmos que permanecem
sendo acometidos por desnutrição crônica, anemia e hipovitaminose A.

A contínua convivência com a desnutrição não interferiu no crescimento gradual


e rápido da obesidade no país. A prevalência de excesso de peso entre adolescentes,
enquanto os adultos brasileiros estavam acima do peso e obesos. Alguns aspectos
positivos registrados nos últimos anos foram o aumento da prática de atividade física
e redução no número de pessoas que assistiam televisão três ou mais horas por dia,
além da tendência à estabilização da obesidade nos últimos anos.

Em meio à superação dos agravos decorrentes da fome, desnutrição e pobreza


extrema, o caso do beribéri no Maranhão, deixou a comunidade científica perplexa
por se tratar de uma deficiência primária da Vitamina B1 (tiamina), em pleno século
da tecnologia. Os principais determinantes foram o uso abusivo de álcool e a atividade
física laboral pesada, além da possível exposição a agrotóxicos. Todos esses
aspectos apresentaram relação com as mudanças sociais que aconteceram ao longo
das últimas décadas na região com predomínio da agricultura exploratória e pouca
produção de alimentos básicos, agropecuária extensiva, além do intenso
desmatamento para atender as demandas de madeireiras e mineradoras, o que
resultou em alterações nas relações de trabalho, na economia local e na cultura,
acentuando as iniquidades.

Tais paradoxos são verificados também em países que historicamente têm


superado o problema da fome, desnutrição e pobreza extrema. Segundo estimativas
da OMS, a deficiência de iodo na Europa permanece como problema de saúde
pública, ainda que seja predominante a forma leve da carência.

A manutenção de profundas desigualdades de renda e raça também tem


contribuído para problemas nos padrões dietéticos. Os mais pobres e que vivem em
condição de insegurança alimentar têm maior probabilidade de serem obesos, uma
vez que estão mais expostos a reduzida qualidade dos alimentos a preço acessível.

12
Assim, a análise histórica dos dados nutricionais reafirma que, embora tenha
havido importantes avanços com a redução de déficits nutricionais no panorama
nacional e suas regiões, ainda há a presença de intensas desigualdades no Brasil e
no mundo e estas se manifestam de forma injusta em grupos vulneráveis. Além disso,
os agravos se sobrepõem e somam-se ao longo do tempo, e até mesmo onde
pareciam superados reemergem com características específicas e adaptadas ao novo
meio constantemente modificado pelo homem.

Os paradoxos entre escassez e excessos, o global e o local, o desenvolvimento


e a desigualdade, são constantes contradições da sociedade pós-moderna e têm
interferido na forma de se comportar, comer, se relacionar e adoecer das pessoas. O
que parecia duas faces opostas da mesma moeda aparenta ser tão homogêneo
quanto o movimento capitalista de uniformizar a sociedade a partir do consumo. À
medida em que a obesidade, a anemia e outras carências nutricionais convivem no
mesmo corpo e em todas as classes sociais, se diferenciam pelo contexto
sociocultural em que estas pessoas estão inseridas e podem interferir nos
desdobramentos em virtude do acesso, conhecimento e outras condições, ou a falta
delas, de enfrentamento do problema.

c. Reflexões sobre (des)nutrição na pós-modernidade

Para além dos determinantes sociais da saúde, os princípios de uma sociedade


capitalista podem ter relação direta com o processo de adoecimento e, por isso, a
discussão da macro-política deve estar intrinsecamente ligada às mudanças
nutricionais e epidemiológicas aqui discutidas. O subdesenvolvimento como um
subproduto do desenvolvimento e na modernidade o processo de exploração parece
ser camuflado nos diversos prazeres vendidos/proporcionados.

Foi elaborado um modelo triangular para explicar o processo saúde e doença


baseado na lógica mercadológica, e apresentam como protagonistas o indivíduo, o
sistema produtivo e o corpo técnico (profissionais de saúde). Para os indivíduos a
saúde é vista como uma “sensação”, portanto é sentida; para o sistema produtivo
como uma “mercadoria”, neste caso é vendida; e do ponto de vista técnico como um
tipo de “poder ou autoridade”, deste modo é o exercício de proporcionar saúde. Dessa
forma, todos os atores deveriam exercer papel de vigilantes entre si para equilibrar as

13
forças e garantir que todos os âmbitos fossem contemplados dentro de seus limites,
em prol da saúde. Porém, no contexto atual, a alimentação e a nutrição tornam-se
mercadoria e entram na agenda de interesses contemporâneos, modificando desde
os meios de produção até a forma como se compra e se prepara os alimentos. Nessa
lógica de consumo, a nutrientificação dos alimentos, a quimificação dos remédios e
os estilos de vida saudáveis servem ao sistema produtivo, muitas vezes articulado
com o poder técnico dos profissionais de saúde, e exercem forte influência sobre o
indivíduo.

A título de ilustração, a medicina da beleza é uma das que mais cresce no


mundo, e o componente dietético está largamente disseminado nos diversos
mecanismos de comunicação, sendo também um dos fatores relacionados às novas
formas de apresentação da desnutrição como transtornos alimentares (anorexia,
bulimia), intolerâncias e alergias alimentares, cânceres e outras.

Ademais, vários problemas de saúde são subprodutos de demandas


capitalistas locais como a utilização indiscriminada de defensivos agrícolas nas
grandes produções voltadas para o agronegócio levando à contaminação de
alimentos e até mesmo do leite materno; marketing e propaganda infantil, contribuindo
para a obesidade e desnutrição nessa fase da vida; ultra processamento de alimentos
para atender demandas de tempo e espaço, resultando na modificação da
composição nutricional e adição de estruturas artificiais desconhecidas pelo
metabolismo humano e capazes de gerar graves problemas metabólicos. Os impactos
ambientais e coletivos decorrentes dessas demandas permanecem pouco divulgados
ou ainda no anonimato para garantir os interesses do mercado.

Em nível nacional e internacional, podemos identificar tímidas iniciativas que


vão de encontro à lógica de mercado. No Brasil encontra-se em tramitação um Projeto
de Lei (1.755/2007) para proibição da venda de refrigerantes em escolas de educação
básica. Essas medidas também são criticadas, e no discurso dos que se sentem
vítimas destas, esse processo penaliza o consumidor e suprime sua autonomia.

Outras iniciativas, como a regulação do marketing e propaganda de alimentos,


continuam sendo um desafio tanto em países desenvolvidos como em
desenvolvimento. No Brasil, a Norma Brasileira de Comercialização de Alimentos para
Lactentes e Crianças de Primeira Infância, Bicos, Chupetas e Mamadeiras, que

14
representa um conjunto de normas para regular a promoção comercial e a rotulagem
de alimentos e produtos destinados a recém-nascidos e crianças de até três anos de
idade, foi regulamentada quase 10 anos depois de sua criação, por meio do Decreto
nº 8.552, de 3 de novembro de 2015.

O Brasil adotou também medidas de proporções mais amplas como incentivo


à produção local e familiar com garantia de compra, a exemplo do Programa de
Aquisição de Alimentos (PAA) e a inclusão da agricultura familiar no Programa
Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Nessa perspectiva é possível garantir renda
para famílias, possibilitar a permanência destas no seu território de origem em vez de
migrarem para os grandes centros urbanos, incentivar uma produção sustentável,
resgatar a cultura local e os padrões alimentares tradicionais, além de incluir alimentos
saudáveis nas escolas. Nessa perspectiva, por meio da Cooperação Sul-Sul (CSS),
foi firmada parceria com Moçambique com o objetivo de promover transferência de
conhecimentos e oferecer suporte técnico para viabilizar a elaboração e a
implementação do “Programa Nacional de Alimentação Escolar de Moçambique”,
pautada na experiência brasileira e considerando a realidade e a cultura local. Alguns
resultados já podem ser observados como o aumento da adesão e frequência escolar
em Changara e a presença de hortas em 80% das escolas com produção de alimentos
como milho, couve, tomates, cebolas, em Cahora-Bassa.

O enfrentamento das doenças agudas e crônicas perpassa o desafio de se


impor aos interesses econômicos, ao poder de fortes indústrias como a alimentícia,
da beleza e farmacêutica, além de firmar parcerias solidárias. A Segunda Conferência
Internacional sobre Nutrição (ICN2) trouxe um conjunto de ações políticas que os
governos se comprometeram em implementar para enfrentar a má nutrição em todas
as suas formas (sobrepeso e obesidade, retardo do crescimento, deficiências de
micronutrientes). Entre as ações propostas destacam-se o fortalecimento de locais
para produção e processamento de alimentos, especialmente por pequenos
agricultores; incentivo à redução de gordura saturada, açúcares e sal de alimentos e
bebidas; formação de recursos humanos; regulamentação do marketing e propaganda
de alimentos, especialmente quanto à comercialização de substitutos do leite materno;
criação de ambientes propícios para a promoção da atividade física desde as fases
iniciais da vida, e outros.

15
São muitos os interesses que permeiam as questões relacionadas à saúde e
nutrição na sociedade contemporânea, mas deve-se destacar o respeito às escolhas
individuais, em prol da autonomia dos sujeitos. No entanto, isso se entende
empoderando o indivíduo para corretas escolhas, e por isso o Estado deve atuar em
prol da proteção da coletividade, por meio de políticas públicas com ênfase na
educação, promoção da saúde e esforços regulatórios, para que os direitos coletivos
não sejam cerceados em benefício de uma minoria e o indivíduo não seja
constantemente culpado por não conseguir enquadrar-se em padrões
comportamentais.

d. Estado Nutricional

As desordens nutricionais são mais prevalentes entre idosos e relacionam-se


com alto risco de morbimortalidade. O estado nutricional expressa o grau pelo qual as
necessidades fisiológicas e o equilíbrio entre ingestão e necessidades de nutrientes
são atendidos, o que é influenciado por diversos fatores (Figura 1).

Figura 1 - Estado nutricional ótimo como resultado entre o equilíbrio da ingestao e as


necessidades nutricionais

Fonte: Campos, et al., 2007.

16
e. Avaliação Do Estado Nutricional

A avaliação nutricional constitui rotina do exame clínico por intermédio das


seguintes técnicas: anamnese alimentar, incluindo a ingestão; medidas bioquímicas;
exame e história clínicos; medidas antropométricas; estado psicossocial. Outros
métodos que podem ser utilizados são: análise de impedância bioelétrica; peso
submerso em água; ultrassonografia; tomografia computadorizada; ressonância
nuclear magnética, entre outros. Na Figura 2 estão ressaltadas as etapas em que
pode haver variações do estado nutricional, deficiência ou sobrecarga e como intervir
de modo a evitar a má-nutrição antes que ela se desenvolva.

Figura 2 - Etapas que levam ao desenvolvimento de deficiência ou sobrecarga alimentar e os


pontos nos quais os componentes da avaliação nutricional podem intervir para antecipar
problemas, suprindo as defi ciências nutricionais e evitando a má-nutrição, antes que ela se
desenvolva.

17
Fonte: Campos, et al., 2007.

 SAIBA MAIS:

Acesse o link: http://eaulas.usp.br/portal/video.action?idItem=19999 Para


saber mais sobre: O uso da epidemiologia nutricional nas
políticas/programas de alimentação e nutrição

18
4. OS PROBLEMAS NUTRICIONAIS E A ESTRATÉGIA DE
ENRIQUECIMENTO DE ALIMENTOS NO BRASIL

Desde a década de 1980, e mais marcadamente de 90, o Brasil passa por


profundas modificações em seu perfil demográfico, epidemiológico e nutricional. A
mortalidade em geral, que tinha nas doenças infecciosas e parasitárias sua principal
causa, assemelha-se a de países desenvolvidos, sendo liderada por doenças crônicas
não transmissíveis, em especial, pelas doenças cardiovasculares.

O pano de fundo no aspecto nutricional, que explica as duas faces desta


transição epidemiológica, é a redução da desnutrição energético-proteica e o aumento
substancial das prevalências de sobrepeso e obesidade na população, em todas as
fases da vida.

Segundo dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008-2009,


realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em parceria com
o Ministério da Saúde, o déficit de estatura diminuiu de 29,3% (1974-75) para 7,2%
(2008-09) nas crianças do sexo masculino e de 26,7% para 6,3% nas do feminino. No
entanto, mantêm-se disparidades regionais importantes, uma vez que, no meio rural
da Região Nordeste, a baixa estatura atinge 16 e 13,5% das crianças do sexo
masculino e feminino, respectivamente. A mesma pesquisa identificou que cerca de
33,3% das crianças brasileiras de 5 a 9 anos encontrava-se com excesso de peso. O
sobrepeso/obesidade atingia na época 50,1% dos homens e 48,0% mulheres de 20 a
60 anos.

Ao tempo em que não se pode minimizar a importância epidemiológica do


sobrepeso/obesidade como fator de risco para doenças crônicas não transmissíveis,
não se pode negar o perfil nutricional de fome, desnutrição e deficiências de
micronutrientes que afeta parcela significativa da população brasileira, equiparando a
6ª economia mundial, aos países mais pobres do mundo no que tange à qualidade de
vida e de saúde de seu povo.

Método baseado na percepção de insegurança alimentar, que considera a fome


um fenômeno social e biológico, a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar e
Nutricional (EBIA), aplicada em 2004 e, posteriormente, em 2009, pelo IBGE,
demonstra que, em 2004, 34,9% dos domicílios brasileiros apresentavam algum grau

19
de insegurança alimentar, sendo de 18,0% insegurança leve, 9,9% moderada e 7,0%
grave. Em cinco anos, a percentagem de famílias que se encontrava em situação de
insegurança alimentar e nutricional reduziu para 30,2%, ou seja, 4,7%, apenas.

Tem-se chamado de “Fome Oculta” a deficiência de micronutrientes de


importância epidemiológica, algumas de alta magnitude e importantes efeitos
deletérios à saúde. Inadequações nas dietas de grupos populacionais específicos
foram encontradas em estudos pontuais realizados em diferentes regiões do País e,
até mesmo, deficiências nutricionais de ferro, vitamina A, vitamina D, zinco, ácido
fólico e cálcio, sendo as duas primeiras as de maior prevalência, foram diagnosticadas
por meio de exames bioquímicos.

A Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS),


em 2006, analisou amostras sanguíneas de 3.499 crianças menores de 5 anos e de
5.698 mulheres de 15 a 49 anos, em todas as regiões do País. Encontrou-se
prevalência de anemia em 20,9 % das crianças e em 29,4% das mulheres. A
prevalência de anemia foi maior na Região Nordeste, atingindo 25,5% das crianças e
39,1% das mulheres. A mesma pesquisa, avaliando os níveis de retinol sérico,
encontrou que 17,4% das crianças e 12,3% das mulheres em idade reprodutiva
apresentavam níveis inadequados de vitamina A, sendo as Regiões Nordeste, Centro-
oeste e Sudeste as de maior prevalência, de 12,1% a 14,0%.

Dentre as medidas de intervenção para enfrentar os problemas nutricionais


específicos de maior gravidade no País, destacam-se ações de educação nutricional
com promoção de hábitos alimentares adequados. Outras, como a profilaxia com ferro
e outros micronutrientes aos grupos de maior vulnerabilidade devem ser
consideradas, e algumas ações já têm sido implementadas no País, com vantagens e
desvantagens.

A fortificação de alimentos é medida adotada em diversos países do mundo, e


o Brasil começa a evoluir nesta área como política pública em alimentação e nutrição.
Em dezembro de 2002, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), por meio
da Resolução 344, tornou obrigatória a adição de ferro e ácido fólico nas farinhas de
milho e trigo, na quantidade mínima de 4,2 mg de ferro e 150 mcg de ácido fólico/ 100
g do produto. Acredita-se que esta medida venha melhorar o perfil nutricional de ferro
da população a longo prazo, uma vez que o pão é um alimento que compõe o hábito

20
alimentar da população brasileira. Entretanto, o grupo de maior vulnerabilidade, que
são as crianças menores de dois anos, não será beneficiado. Também a população
de mais baixa renda nem sempre tem acesso ao produto.

Assim, os maiores desafios para fortificação de alimentos no País dizem


respeito à escolha do alimento (veículo), que deve ser um amplamente utilizado pela
população em geral, como é o caso do arroz, do feijão e do açúcar. É imperativo
também que o processo de enriquecimento e de preparo garanta a biodisponibilidade
do nutriente, seja ele micro, seja macro e que também não adicione custo ao produto.
O preço do produto enriquecido precisa ser viável para aquisição pela parcela da
população mais dependente e necessitada deste benefício.

A tendência mundial da população é reduzir o consumo diário de energia na


alimentação, talvez para 1.500-1.600 kcal (mulheres) e 2.300 a 2.400 kcal (homens).
Esse fenômeno é decorrente das profundas transformações nos hábitos de vida, ou
seja, fatores como meios de transporte, sedentarismo, conveniências e condições de
moradia, facilidades no ambiente de trabalho, que vêm ocorrendo nas últimas
décadas, levam os indivíduos a realizarem menos atividades físicas.

Mais recentemente, cresce em todo o mundo o fenômeno da obesidade,


principalmente nos países desenvolvidos e em desenvolvimento, resultando em
consequências danosas à saúde das pessoas. Para a população em geral, a ingestão
convencional de alimentos não possibilita atingir as necessidades humanas diárias
dos diversos nutrientes por razões diversas, por exemplo, falta de conhecimento,
hábitos alimentares inadequados e, ainda, em muitas regiões o baixo poder aquisitivo
de parcela expressiva da população. Pode-se considerar que as tendências atuais
são:

a) melhoria do balanço nutricional dos alimentos, tornando-os mais saudáveis,


com consequente melhoria da qualidade de vida; e

b) suprimentos de produtos alimentícios com maior conveniência de preparo,


produção sustentável ambiental e socialmente, saborosos e, consequentemente, de
maior aceitação pelo consumidor.

Dessa forma, o enriquecimento nutricional de alimentos, outrora abordado


como complemento de dieta deficiente, em virtude do baixo poder aquisitivo de parte

21
da população, com consequente alimentação qualitativamente inadequada, toma
novo aspecto em tempos atuais. Este enriquecimento de alimentos no Brasil obedece
à Resoluções específicas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), uma
vez que o País é signatário do Codex Alimentarius e segue, portanto, às
recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS).

A metodologia para incorporação de nutrientes no enriquecimento de


alimentos, seja micro, seja macronutrientes é variada. Alguns alimentos são mais
apropriados para receber adição de minerais, outros para receberem vitaminas e
ainda outros alimentos que são adequados para receber adição de proteínas, cálcio e
fosfatos.

Os grãos como o arroz e o feijão podem ser enriquecidos nutricionalmente por


técnicas de difusão do nutriente no grão, utilizando mais frequentemente água como
meio de transporte. As farinhas de cereais e de leguminosas podem ser adicionadas
de misturas de nutrientes e homogeneizadas em misturadores sólido-sólido. Os
produtos das misturas de farinhas são apropriados ao processo de cocção por
extrusão. Assim, esta técnica se revela como excelente opção para o processo de
enriquecimento desses alimentos. Pela sua versatilidade, uma diversidade muito
grande de produtos alimentícios pode ser proveniente de processamento por
extrusão. Assim, alimentos com conteúdo adequado, quantitativa e qualitativamente
de proteínas, enriquecidos com fibras, vitaminas e minerais de diferentes formas,
formatos, sabores e aromas podem ser obtidos.

Os limites da técnica de extrusão são flexíveis, uma vez que o processo permite
o trabalho em diferentes condições que envolvem temperatura, pressão e tempo de
residência em faixas relativamente amplas de variações.

22
5. HISTÓRICO DA EPIDEMIOLOGIA NUTRICIONAL

Estudos clássicos da relação entre a deficiência de certos nutrientes na dieta e


o surgimento de doenças carenciais constituem a história da epidemiologia nutricional.

Diferentes países, inclusive o Brasil, vêm utilizando o conhecimento da


epidemiologia nutricional para orientar o setor Saúde e tentar influenciar o consumo
alimentar da população. Mesmo com a grande produção científica que serve de base
para a elaboração de políticas públicas na área de alimentação e nutrição, críticas são
divulgadas, tanto no meio acadêmico como pela população em geral. As restrições ao
consumo de ovo tornaram-se emblemáticas nesse sentido.

Interdições e escolhas alimentares aparecem em diferentes culturas e religiões,


e não se trata de uma questão atual. Todavia, propostas de políticas públicas na área
de alimentação e nutrição com o objetivo de influenciar as escolhas alimentares
sempre se fundamentaram em conhecimentos científicos correntes. Os recentes
avanços da ciência da nutrição fazem com que mudanças na escolha alimentar
ocorridas nos últimos anos e outras, ainda desconhecidas pela ciência, possam vir a
acontecer, em futuro próximo.

Mais recentemente, as guias alimentares têm enfatizado uma abordagem em


alimentos e padrões de consumo e, dessa forma, aproximam-se das reais
necessidades da população. Contudo, na medida em que o conhecimento gerado pela
epidemiologia nutricional transforma-se em regra social, ou norma, evidencia-se o seu
caráter temporal, ou seja, as normas podem morrer, e essa possibilidade deve ser
vista como um passo importante para a incorporação de novos conhecimentos pelos
profissionais da saúde e pela população em geral.

O desenvolvimento de métodos práticos, válidos e viáveis para mensurar a


dieta individual tem sido descrito como um dos principais desafios da pesquisa em
epidemiologia nutricional. Informações válidas de consumo de energia e nutrientes
são fundamentais para estudos epidemiológicos sobre dieta e Doenças Crônicas Não
Transmissíveis (DCNT). Existem vários métodos de avaliação de ingestão alimentar,
mas todos apresentam limitações.

23
Inquéritos Recordatórios de 24 horas (IR24h), registros alimentares ou história
alimentar podem fornecer uma avaliação acurada da dieta habitual de um indivíduo.
Entre os métodos citados, o IR24h permite ao entrevistador colher um grande número
de informações e detalhes sobre o modo de preparo e os ingredientes utilizados em
receitas caseiras. Tem como vantagens a alta adesão entre os entrevistados, o baixo
custo, além do fato de o entrevistado não precisar ser alfabetizado e de o hábito
alimentar não se alterar quando realizado sem prévio agendamento.

Em contrapartida, um único IR24h não estima a dieta habitual, pois não


considera a variabilidade do consumo alimentar de um dia para outro (intra-indivíduo).
A variação intra-indivíduo e entre indivíduos pode também diferir muito entre
nutrientes. Para macronutrientes da dieta que apresentam pequena variação no
consumo intra-indivíduo, alguns dias de avaliação do consumo alimentar são
suficientes para estimar sua ingestão habitual. Já para os micronutrientes da dieta, a
variação do consumo intra-indivíduos é muito maior que a variabilidade entre
indivíduos, exigindo múltiplos IR24h para se alcançar uma estimativa acurada de seu
consumo habitual.

Questionários de Frequência Alimentar (QFA) têm sido utilizados em estudos


epidemiológicos para verificar a associação entre dieta e DCNT. Entre as vantagens
deste método, estão a aplicabilidade em um grande número de indivíduos, o baixo
custo e a possibilidade de estimar a ingestão alimentar referente a um longo período
– geralmente no último ano ou até mesmo por tempo maior. No entanto, apesar de
sua menor exatidão em relação a outros métodos de avaliação do consumo alimentar,
o QFA classifica os indivíduos de risco segundo grau de exposição e diferenças entre
concentrações extremas de ingestão. Neste aspecto em particular, por ser capaz de
medir variação de consumo entre indivíduos, o QFA tem sido considerado mais
adequado à estimativa de riscos. No entanto, há necessidade de avaliação de
acurácia e precisão do QFA na população específica.

Mais recentemente, marcadores bioquímicos têm sido utilizados em estudos de


validação de métodos de avaliação de consumo alimentar. A principal vantagem é que
os erros medidos pelos marcadores bioquímicos não têm relação com os erros
medidos nos questionários alimentares. Portanto, correlação entre a ingestão
alimentar e marcador bioquímico oferece inquestionável evidência de validação.

24
Alguns indicadores bioquímicos podem ser utilizados para a validação de um
QFA, oferecendo boa correlação com a real ingestão alimentar, com medidas
objetivas e sem viés por parte do entrevistado ou do entrevistador. Entretanto, estão
também sujeitos a três fontes de erro: 1) Diferença entre a avaliação da dieta e a real
ingestão; 2) Efeito da digestão, absorção, captação, utilização, metabolismo, excreção
e mecanismos homeostáticos, influenciando a relação entre quantidade ingerida e a
medida bioquímica; 3) Erro associado ao próprio ensaio bioquímico. Portanto,
biomarcadores e avaliação da dieta não medem exatamente a mesma coisa. Os erros
para medidas bioquímicas são independentes dos erros associados ao QFA.

Existem várias abordagens para medidas de indicadores bioquímicos: a)


medida direta da concentração do nutriente ou seu produto metabólico em um tecido
ou fluido; b) análise funcional de atividade de enzimas específicas ou produtos
derivados do nutriente relacionado com a ingestão alimentar. Neste caso, deve-se
verificar se a medida encontrada é referente às reservas orgânicas do nutriente
analisado que estão sendo utilizadas para manter constantes suas concentrações
sanguíneas ou se reflete o consumo alimentar habitual e/ou recente. Esta abordagem
mede preferencialmente a adequação da ingestão, já que a enzima ou o produto final
derivado do nutriente em questão pode sofrer influência de diversos fatores; c)
concentração de nutrientes no sangue ou urina pouco antes e em intervalos após
administração de uma dose conhecida do nutriente a ser validado. Pessoas com
deficiência do nutriente a ser testado retêm maior quantidade. O uso desta última
abordagem em estudos epidemiológicos é limitado.

Concentrações plasmáticas de retinol, betacaroteno e alfa-tocoferol são


sensíveis à ingestão alimentar atual e têm sido sugeridos como marcadores
bioquímicos de exposição a nutrientes antioxidantes, apresentando boa correlação
com consumo alimentar de frutas e vegetais. O alfa-tocoferol é transportado no
sangue como parte do complexo de lipoproteína, principalmente em associação com
LDL-colesterol (lipoproteína de baixa densidade). A concentração sérica de vitamina
E apresenta boa correlação com colesterol sérico e lipídeos totais. Aparentemente,
uma única medida de alfa-tocoferol no plasma, ajustado para lipídeos sanguíneos, é
capaz de representar a ingestão habitual de vitamina E.

Muitos biomarcadores têm sido utilizados em pesquisa clínica e epidemiológica


para avaliar a adequação dietética ou o estado nutricional de um nutriente em

25
indivíduos e populações. Exemplos típicos incluem a albumina sérica para avaliação
de proteínas viscerais e ferritina sérica como indicador de reservas orgânicas de ferro.
A utilidade de um biomarcador baseia-se nos determinantes fisiológicos da medida. A
concentração de muitos nutrientes e biomarcadores no pool circulante é
homeostaticamente regulada (cálcio sérico, por exemplo) ou pode ser fracamente
relacionada ao consumo alimentar devido a produção endógena (colesterol sérico, por
exemplo).

Apesar da crescente importância na ocorrência de problemas nutricionais


relacionados ao excesso de peso, a desnutrição ainda é prevalente em determinados
grupos populacionais, atingindo principalmente crianças que vivem em regiões menos
desenvolvidas. Cabe destacar que, embora o termo desnutrição possa também ser
usado para se referir ao excesso de peso, usa-se como sinônimo para déficit
nutricional, no caso da magreza extrema.

Desnutrição ou baixo peso tem sido considerado como o principal fator de risco
relacionado ao número de pessoas com incapacidade e o quarto fator relacionado ao
número de mortes na população mundial, de acordo com dados da Organização
Mundial da Saúde (OMS). Ao passo que o baixo peso atinge apenas países em
desenvolvimento, nos países desenvolvidos os fatores de risco para incapacidades e
mortalidade em geral estão relacionados ao excesso de peso, incluindo pressão
arterial, colesterol e Índice de Massa Corporal (IMC) elevados e baixo consumo de
frutas, legumes e verduras.

A ocorrência de desnutrição tem sido explicada em função de alguns


mecanismos fisiológicos que são apresentados no Quadro 1.

Quadro 1 – Mecanismos fisiológicos relacionados com a desnutrição

Fonte: Kac, et al. 2007.

26
No sentido fisiológico, esses cinco mecanismos explicam como o balanço
energético pode se tornar negativo. Entretanto, o que pode também ser constatado é
que os principais fatores envolvidos nesse balanço energético negativo estão
relacionados a fatores socioeconômicos, culturais, ambientais ou biológicos, que, por
sua vez, determinam o consumo energético inadequado ou a presença de doenças
que são consideradas as causas proximais da ocorrência da fome/desnutrição.

A complexidade e a natureza dos fatores envolvidos na determinação do déficit


nutricional requerem que se leve em conta na análise a cadeia causal dos
determinantes do estado nutricional e o tempo decorrido entre a exposição a cada
fator e a desnutrição. Assim, estimadores estatísticos que explicitem a hierarquia das
causas e organizem a precedência da exposição a cada fator passam a ser
ferramentas importantes nas análises da determinação do estado nutricional e nas
recomendações de políticas públicas que se façam a partir delas.

Desnutrição é, frequentemente, parte de um ciclo vicioso que inclui pobreza e


doença, sendo cada um destes três componentes inter-relacionados e contribuintes
da ocorrência e persistência do outro. Para romper esse ciclo, são necessárias, além
das intervenções específicas na área de nutrição e saúde, mudanças sociais, políticas
e econômicas que atuem sobre os determinantes mais distais da desnutrição.

Os determinantes distais não agem diretamente sobre os déficits


antropométricos, e sim por meio de fatores intermediários ou proximais, que podem
estar agindo por diferentes cadeias de determinação da desnutrição. Por exemplo, a
pobreza e o desemprego são considerados como causas distais que, por sua vez,
agem sobre a disponibilidade de alimentos no domicílio ou o acesso a serviços de
saúde, considerados determinantes intermediários e com atuação sobre as causas
proximais, como o consumo inadequado de nutrientes e a ocorrência de doenças
infecciosas.

Em relação às causas proximais, deve-se ressaltar que pode haver consumo


deficiente de energia, proteína ou de micronutrientes e que as doenças infecciosas,
por sua vez, podem levar à desnutrição por meio dos distintos mecanismos fisiológicos
supracitados, seja por redução do apetite e diminuição no consumo alimentar, seja
por aumento das necessidades energéticas ocasionado pelo catabolismo de
nutrientes durante um processo infeccioso.

27
Assim como as consequências das doenças infecciosas sobre a desnutrição
estão bem estabelecidas, a influência dos déficits nutricionais sobre a ocorrência
dessas doenças também tem sido descrita, demonstrando o ciclo vicioso entre
desnutrição e infecção.

O início da desnutrição geralmente ocorre em torno do sexto mês de vida da


criança, quando a transição de alimentos complementares pode ser inadequada em
qualidade e quantidade e também quando ocorre maior frequência de exposição a
doenças infecciosas. Entretanto, a população idosa, principalmente em regiões menos
desenvolvidas, também pode ser considerada um grupo de risco para a desnutrição.
Sendo assim, em qualquer grupo etário, a ocorrência da desnutrição pode estar
relacionada a fatores biológicos, sociais, econômicos e culturais que, por sua vez,
podem estar envolvidos em qualquer um dos mecanismos de determinação.

a. A Epidemiologia Da Anemia Ferropriva

A epidemiologia da anemia ferropriva, por definição, deve tratar dos


determinantes da distribuição deste agravo nutricional causado pela deficiência de
ferro no organismo humano, que afeta, sobretudo, o desempenho de uma das funções
mais nobres do sangue, o transporte de oxigênio. Conhecer os determinantes da
distribuição da anemia ferropriva significa descrever e explicar o que é anemia
ferropriva, quantos e quem são os atingidos pelo agravo nutricional, assim como saber
onde, quando, como e por que grupos populacionais são afetados pela doença, com
a finalidade de contribuir para o enfrentamento do problema.

Em 1990, por iniciativa das Nações Unidas, à frente o Fundo das Nações
Unidas para a Infância (Unicef) e a Organização Mundial da Saúde (OMS), reuniram-
se em Nova York representantes de oitenta países durante o Encontro Mundial de
Cúpula pela Criança com a finalidade de elaborar um plano de ação para ser
implementado durante a última década do século XX, visando a melhorar a saúde de
crianças e mães, combater a desnutrição, o analfabetismo e erradicar as doenças que
matavam milhões de crianças a cada ano. “A redução de um terço nos níveis de
anemia das mulheres com relação a 1990” (Unicef, 1990) foi uma das metas
estabelecidas naquele encontro, demonstrando a gravidade da situação

28
epidemiológica da deficiência e o compromisso inadiável dos governos e organismos
internacionais com o enfrentamento do problema.

Portanto, o entendimento da anemia ferropriva, abordando suas causas,


consequências e o modo de enfrentar o problema mediante o olhar epidemiológico,
como um instrumento básico da saúde coletiva, enfocando primordialmente o cenário
brasileiro, é de suma importância.

A suplementação com sais de ferro é a estratégia mais amplamente utilizada


para controlar a anemia em países em desenvolvimento, principalmente naqueles
onde as duas estratégias descritas anteriormente ainda não foram plenamente
alcançadas.

A suplementação é mais largamente usada para tratar do que para prevenir a


deficiência de ferro e a anemia, embora venha sendo utilizada como medida
preventiva em grupos de alto risco, como pré-escolares e gestantes – entre estas
últimas, inclusive em países desenvolvidos.

O Quadro 2 apresenta um roteiro para enfrentamento da anemia por deficiência


de ferro em aplicações diárias, segundo sugestão do Unicef e da OMS.

Quadro 2 – Esquema posológico em diferentes grupos biológicos para a prevenção da anemia


por deficiência de ferro em escala populacional

Fonte: Kac, et al. 2007.

29
b. Epidemiologia da Hipovitaminose A e Xeroftalmia

Uma variedade de termos tem sido usada para caracterizar o estado nutricional
de vitamina A e os seus efeitos sobre a saúde. Deficiência de Vitamina A (DVA) é o
termo recomendado para expressar o status inadequado de vitamina A, que começa
quando as reservas hepáticas caem abaixo de 20 µg/g (0,07µMol/g). Distúrbios da
Deficiência de Vitamina A (DDVA) deve ser a expressão empregada para expressar
as alterações fisiológicas secundárias à DVA. Essas alterações podem ser
subclínicas, a exemplo dos distúrbios da diferenciação celular, da depressão da
resposta imune, da redução da mobilização do ferro; ou clínicas, traduzidas pelo
aumento da morbidade por doenças infecciosas e da mortalidade, retardo do
crescimento, anemia e, principalmente, xeroftalmia. Xeroftalmia representa o
epifenômeno da DDVA, sendo o termo utilizado para descrever todas as
manifestações clínico-oculares da DVA, que compreendem um amplo espectro de
sinais e sintomas que vão desde a cegueira noturna até a ulceração corneal e a
ceratomalacia.

A hipovitaminose A constitui um dos principais problemas nutricionais que


afligem a população dos países do Terceiro Mundo, acometendo, sobretudo, crianças
na idade pré-escolar e gestantes. Esse quadro de deficiência está intrinsecamente
associado ao subdesenvolvimento, concentrando-se nas camadas mais pobres e
menos educadas da população.

As recomendações para os grupos etários, esquemas posológicos e período


de administração a serem utilizadas na suplementação massiva com megadoses de
vitamina A estão descritas na Tabela 1.

30
Tabela 1 – Esquema de suplementação com megadoses de vitamina A em populações
vulneráveis

Fonte: Kac, et al. 2007.

c. Epidemiologia da Obesidade

No Brasil, esse fenômeno é marcante, com aumento da prevalência em


adolescentes, adultos e idosos. Nenhuma faixa etária ou grupo social está protegido
da obesidade e identifica a atualidade da questão, visto que o tema está em todos os
lugares: revistas, livros populares, textos científicos e agenda política dos governos.
Infelizmente, respostas claras e precisas para a questão fundamental – como manter
o controle do peso ao longo da vida adulta? – não estão disponíveis.

Os estudos sobre os fatores da dieta associados à obesidade realizados nas


últimas décadas do século XX priorizaram isolar componentes específicos da dieta,
como, por exemplo, as gorduras, fibras ou tipo de carboidrato. Essas estratégias não
se mostraram efetivas para a prevenção da obesidade, e a tônica das decisões mais
recentes, que tem sido abraçada pelos organismos internacionais e agências de
saúde, é abordar, concomitantemente, tanto o consumo quanto o gasto de energia.

Combinar estratégias que visem a alterações, ao mesmo tempo, dos hábitos


dietéticos e dos níveis de atividade física parece ser fundamental, na medida em que
ambos são resultados da crescente industrialização e movimentação para os centros
urbanos de grandes parcelas da população. Essas mudanças permitem e estimulam
o acesso a um mercado crescente de produtos com distribuição globalizada e de
produtos em geral, muitos deles poupadores de energia. Muitas atividades físicas
foram substituídas, na sociedade moderna, pelo uso de aparelhos como os
eletrodomésticos, os sistemas automatizados de controle remoto, o carro e os

31
sistemas de controle da temperatura ambiental. A Organização Mundial da Saúde
(OMS), reconhecendo que manter o equilíbrio energético é a questão fundamental no
controle da obesidade, destaca o equilíbrio energético como a primeira recomendação
do documento internacional conhecido como Estratégia Global. No Brasil, essa
recomendação foi incorporada no guia alimentar do Ministério da Saúde.

32
1. REFERÊNCIAS

Elisabetta RECINE, et. al. A formação em saúde pública nos cursos de


graduação de nutrição no Brasil. Rev. Nutr., Campinas, 25(1):21-33, jan./fev.,
2012.
Sylvia do Carmo Castro Franceschini, DNS José Benicio Paes Chaves, DTA. Os
Problemas Nutricionais E A Estratégia De Enriquecimento De Alimentos No
Brasil. Disponível em: http://www.novoscursos.ufv.br/projetos2/ufv/ipaf/www/wp-
content/uploads/Os-Problemas-Nutricionais-e-a-Estrat%C3%A9gia-de-
Enriquecimento-de-Alimentos-no-Brasil.pdf. Acesso em 19 out 2020. Universidade
Federal de Viçosa.
Marta Alice Gomes Campos, et al. Estado Nutricional E Antropometria Em
Idosos: Revisão Da Literatura. Revista Médica de Minas Gerais 2007; 17(3/4):
111-120.
Nathália Paula de Souza, et. al. A (des)nutrição e o novo padrão epidemiológico
em um contexto de desenvolvimento e desigualdades. Ciência & Saúde Coletiva,
22(7):2257-2266, 2017.
Gilberto Kac, et. al. Epidemiologia nutricional. Rio de Janeiro: Editora
FIOCRUZ/Atheneu, 2007. 580 p. ISBN 978-85-7541-320-3.

33
34

Você também pode gostar