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CRÍTICA

TEXTUAL
Aula 4

MARCELO BERTI
Sejam muito bem-vindos à quarta
aula do curso de crítica textual do
Instituto Schaeffer de Teologia e
Cultura do Dois Dedos de Teologia.
Meu nome é Marcelo Berti, e na aula de hoje, nós vamos
estudar os métodos da crítica textual. Vamos fazer
um breve histórico do texto grego, vamos conhecer o
primeiro instrumento do Novo Testamento impresso,
vamos conhecer o Textus Receptus, o mais importante
texto do NT produzido no período anterior a Reforma
Protestante, e finalmente, vamos conhecer a teoria do
texto majoritário.
Introdução
“Por causa dos milhares de manuscritos, versões e citações patrísticas do Novo
Testamento, temos hoje centenas de milhares de variantes textuais. Essas duas
considerações - o número de manuscritos e o número de variantes - criaram uma
controvérsia sem fim entre os estudiosos: quais prioridades eles deveriam seguir
ao examinar todos esses dados? Quais métodos eles devem usar para determi-
nar exatamente qual é a redação do texto original?”

Daniel B. Wallace, “Textual Criticism of the New Testament,” ed. John D. Barry et al.,
The Lexham Bible Dictionary (Bellingham, WA: Lexham Press, 2016).

Nós estamos estudando crítica textual. Começamos com os moti-


vos, conversamos sobre os materiais e agora, vamos falar sobre os
métodos. Método da crítica textual é método pelo qual aquela evidên-
cia conhecida na tradição manuscrita e na história da transmissão do
texto é avaliada e investigada.
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Aula 4
I. Breve História do Texto Grego
Antes disso, gostaria de fazer uma breve recapitulação dessa história da transmissão que
nós definimos nas primeiras aulas, mas que são muito importantes para o processo que va-
mos trabalhar, que é o método da crítica textual do Novo Testamento.

1 | Cristianismo Perseguido: Produção não Controlada dos Manuscritos: Historicamen-


te, nós vemos que o cristianismo, nos seus momentos mais primitivos, foi perseguido.
Nesse momento de perseguição da igreja nós tivemos uma grande expansão. Pessoas
fugiram tentando escapar da perseguição e chegaram em lugares novos. Assim, o Evan-
gelho se espalhou pelo mundo. Nesse processo de expansão o cristianismo encontra
novas culturas, novos idiomas, novas línguas e as Escrituras começam a ser transmiti-
das, traduzidas e assim por diante. Nesse momento da história da igreja não existe um
movimento controlado de scriptorum, não existe um movimento formal de reprodução,
as produções são muito mais individuais e locais nesse período da história. Até porque
não existia muito espaço e oportunidade para uma produção melhor elaborada no texto
nesse período.

Por exemplo, considere no período apostólico e com a perseguição de Nero. Considere


que naquele momento, de acordo com o relato de Tacitus, falando sobre a condenação
dos cristãos pelo ‘fogo” em Roma ele disse:

“E, em suas mortes, eles foram feitos objetos de esporte, pois foram amarrados nos es-
conderijos de bestas selvagens e feitos em pedaços por cães, ou cravado em cruzes, ou
incendiados, e, ao fim do dia, eram queimados por servirem de luz noturna.”1

Esse é o testemunho que temos do sofrimento e perseguição aos cristãos. Esse era o
momento em que não existia privilégio, festividade ou recursos para produções mais
elaboradas no processo de cópias do texto do Novo Testamento. Considere também a
perseguição de Trajano, que em seu livro História dos Francos disse:

“Sob o imperador Décio, muitas perseguições se levantaram contra o nome de Cristo, e


houve tamanha carnificina de fiéis que eles não podiam ser contados.”2

1 Tacitus, Cornelius. Annales (Latin). Edited by Charles Dennis Fisher. (Medford, MA: Perseus Digital Library, 1906), 15.44.
2 Gregório de Tours, História dos Francos, 1.30.

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Nesse momento da história, estamos falando sobre pessoas que estão sendo persegui-
das, mortas, famílias destruídas pela perseguição consistente do império. Nesse mo-
mento da história da igreja, as cópias não foram feitas de modelo muito formal. Não
havia um scriptorum.3 As cópias foram muito mais informais e individuais. Além disso,
nesse período havia uma perseguição direcionada aos documentos cristãos, como nos
diz Eusébio de Cesareia:

“Todas as coisas na verdade foram cumpridas em nossos dias, quando vimos com nos-
sos próprios olhos as casas de oração lançadas de cima a baixo até seus alicerces, e
as Escrituras sagradas e inspiradas entregues às chamas no meio dos mercados, e os
pastores das igrejas, alguns se escondendo vergonhosamente aqui e ali, enquanto outros
foram ignominiosamente capturados e ridicularizados por seus inimigos.”4

Sobre a perseguição de Diocleciano e a destruição dos textos cristãos testemunhado


por Eusébio, historiador Harry Gamble afirma:

“O edito de Diocleciano de 303 ordenando o confisco e a queima de livros cristãos é em


si uma evidência importante, tanto em suas suposições quanto em seus resultados. No
início do século IV, Diocleciano presumia que toda comunidade cristã, onde quer que
estivesse, tinha uma coleção de livros e sabia que esses livros eram essenciais para sua
viabilidade.”5

2 | Cristianismo torna-se Oficial: Produção Controlada de Manuscritos: No entanto, em


determinado momento, o cristianismo se torna oficial no império. Existe um movimento
de reconhecimento do cristianismo até o momento em que acontece a aceitação, que
passa pelo processo de oficialização, e em um momento, o cristianismo vai se tornar

3 Scriptorium (singular) ou scriptoria (plural) era o lugar designado para a cópia de manuscritos. Uma espécie de escritório preparado
para a cópia de manuscritos. O mais antigo relato de um scriptorium parecem vir da igreja de San Giovanni Evangelista em Rimini, cujo
patrono, Galla Placidia (450dC) continha uma sala na qual se entende, era usada para cópia manuscritos. O desenvolvimento do scrip-
torium como uma ferramenta de manutenção do texto do NT se multiplica com o surgimento e avanço das regras monásticas, das quais
os monges Beneditinos são um excelente exemplo. Contudo, apenas após do séc. IX é que o scriptorium torna-se o centro de produção
e reprodução do texto do NT no Império Bizantino. A relação entre o desenvolvimento do scriptorium e da multiplicação das cópias do
texto Bizantino não é acidental (ver gráfico abaixo). O primeiro manuscrito bizantino a conter informações adicionadas por escribas
com indicação de atividade em scriptorium é o ms GA 461, também conhecido como Uspenskii Gospels. Esse manuscrito contém os
quatro evangelhos e foi escrito pelo escriba Nicholas de Stoudios em 835dC, um monge e posteriormente um superior do mosteiro de
Stoudios. Para mais informações sobre o scriptorium na tradição bizantina, ver: Scritture, libri e testi nelle aree provinciali di Bisanzio:
Atti del seminario di Erice (18–25 settembre 1988), ed. G. Cavallo, G. De Gregorio, and M. Maniaci, 2 vols., Biblioteca del Centro per il
Collegamento degli Studi Medievali e Umanistici nell’Università di Perugia, vol. 5 (Spoleto, 1991); Codici greci dell’Italia meridionale,
ed. P. Canart and S. Lucà (Rome, 2000); A. Cataldi Palau, “The Burdett-Coutts Collection of Greek Manuscripts: Manuscripts from
Epirus,” Codices manuscripti 54–55 (2006): 31–57, esp. 1–23.
4 Eusebius of Caesaria. The Ecclesiastical History. Edited by T. E. Page,et al. Translated by Kirsopp Lake and J. E. L. Oulton.. The Loeb
Classical Library. (London; New York; Cambridge, MA: William Heinemann; G. P. Putnam’s Sons; Harvard University Press, 1932). 2:255.
5 Harry Y. Gamble, Books & Readers in the Early Church – A History of Early Christian Texts (New Haven: Yale University Press, 1995), 1505.

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oficial. É aqui que a produção controlada dos manuscritos começa a acontecer. Temos
claras evidências disso, inclusive, na história da igreja. Eusébio, quando conta a história
do imperador Constantino, em uma carta que ele teria recebido do próprio Constantino,
ele diz:

“Acontece, através da providência favorita de Deus nosso Salvador, que grande núme-
ro de pessoas se uniu à santíssima igreja da cidade que é chamada pelo meu nome
[Constantinopla]. Parece, portanto, altamente necessário, uma vez que essa cidade está
avançando rapidamente na prosperidade em todos os outros aspectos, que o número
de igrejas também deva aumentar. Você, portanto, recebe com prontidão a minha deter-
minação neste nome. Eu pensei que era conveniente instruir sua Prudência a encomen-
dar cinquenta cópias das Sagradas Escrituras, cuja provisão e uso, que você conhece
mais necessárias para a instrução da Igreja, sejam escritas em pergaminho preparado
de forma legível e em uma forma conveniente e portátil, por escribas profissionais mi-
nuciosamente experientes em sua arte.”

“O Procurador da diocese também recebeu instruções por carta de nossa Clemência


para ter o cuidado de fornecer todas as coisas necessárias para a preparação de tais
cópias; e caberá a você ter um cuidado especial para que sejam concluídas com o míni-
mo de atraso possível. Você também tem autoridade, em virtude desta carta, para usar
duas das carruagens públicas para o seu transporte, pelo que as cópias quando razoa-
velmente escrito será mais facilmente encaminhado para minha inspeção pessoal; e um
dos diáconos de sua igreja pode ser encarregado deste serviço, o qual, ao chegar aqui,
experimentará minha liberalidade. Deus te proteja, amado irmão.”6

O pedido de Constantino, certamente, tinha possibilidade de financiar um tipo de pro-


dução e manuscritos que até aqui, não existia na história cristianismo. Esse é um novo
momento, é uma nova situação, e nesse momento, o processo de cópias e manuscritos
passa a tornar-se algo mais profissional.

3 | Cristianismo passa por um processo de latinização: Infelizmente, o prestígio da lín-


gua grega nesse período da história não durou muito tempo. Por volta do final do quarto
século já existia um movimento de latinização da igreja. Cultos já eram feitos em duas
línguas, onde a Escritura grega era lida, traduzida e explicada em latim, como nos expli-
ca Amy Anderson e Wendy Widder:

6 Eusebius of Caesaria, “The Life of the Blessed Emperor Constantine,” in Eusebius: Church History, Life of Constantine the Great, and Ora-
tion in Praise of Constantine, ed. Philip Schaff and Henry Wace, trans. Ernest Cushing Richardson, vol. 1, A Select Library of the Nicene and
Post-Nicene Fathers of the Christian Church, Second Series (New York: Christian Literature Company, 1890), 549.

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“No final do século IV DC, o Papa Dâmaso I (366-384) encarregou seu secretário Jerônimo
(Eusebius Sophronius Hieronymus) de revisar as versões latinas da Bíblia. A Bíblia latina
precisava de revisão e padronização por causa das muitas variações nos manuscritos
agora classificados como o antigo latim. A abundância de traduções latinas variadas cau-
sou problemas em ambientes litúrgicos e dificultou as discussões teológicas. A igreja
precisava de um texto uniforme e confiável.”

“Jerônimo começou seu trabalho em Roma, mas o concluiu em um mosteiro perto de


Belém. Ele não revisou o latim existente usando a Septuaginta, a Bíblia da igreja primitiva,
como o papa esperava que fizesse. Em vez disso, ele aprendeu hebraico e usou manuscri-
tos hebraicos para traduzir o AT. A insistência de Jerônimo em traduzir o AT do hebraico
em vez da Septuaginta, que muitos acreditavam ser o texto inspirado, trouxe uma enxurra-
da de críticas. Até Santo Agostinho se opôs a sua abordagem, temendo que dividisse as
igrejas grega e latina. Além de usar o texto hebraico, Jerônimo também conferenciou com
estudiosos judeus, aderiu de perto ao texto grego e considerou cuidadosamente o texto
latino, resultando em uma tradução que estava muito de acordo com a tradição.”7

Em outras palavras, a igreja passa a escrever em latim, pensar em latim, falar em latim.
A vulgata de Jerônimo é um grande exemplo desse processo de latinização da igreja e
a reflexão da igreja, especialmente, aquela que conhecemos por católica, passa então a
refletir na língua do Império Romano. Esse processo de latinização fez com que o pro-
cesso de cópias dos manuscritos do Novo Testamento fosse privilegiado na linguagem
latina. Por isso, mesmo com o processo de oficialização do cristianismo, as cópias ma-
nuscritas do Novo Testamento, mesmo nesse período, já não são muitas.

Quando nós olhamos para as obras sobreviventes, evidências sobreviventes, nós per-
cebemos que mesmo neste momento da história, a quantidade de cópias não era tão
grande. Por outro lado, quando nós olhamos a quantidade de cópias de manuscritos
latinos sobreviventes desse período em diante, nós vemos isso sendo feito em larga
escala e grande quantidade.

4 | Grande Cisma do Cristianismo – A Igreja Bizantina: O cenário muda de figura quan-


do nós entramos na grande cisma da igreja, a igreja - por razões que não convém se-
rem investidas aqui, mas você pode pesquisar com mais atenção- em 1054 sofre uma
ruptura entre os bispados romanos e os bispados de Constantinopla se excomungam
mutuamente. Nisso, um deixa de reconhecer no outro autoridade, e se entendem então

7 Amy Anderson and Wendy Widder, Textual Criticism of the Bible, ed. Douglas Mangum, Revised Edition., vol. 1, Lexham Methods Series
(Bellingham, WA: Lexham Press, 2018), 87–88.

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agora, uma grande cisma. A igreja ocidental latinizada que reproduza agora os manus-
critos de maneira latina e a igreja que hoje nós conhecemos como igreja ortodoxa, uma
igreja primariamente de língua grega.

Nesse momento, nós vamos perceber com as evidências que nós temos disponíveis,
uma grande produção de manuscritos gregos, como se o texto passasse a ser nova-
mente copiado em grande escala.

Quando nós olhamos para a história da transmissão do texto e nós olharmos para a
quantidade de manuscritos divididas por século, conseguimos explicar o motivo de nós
termos tantas cópias manuscritas em períodos posteriores, e o motivo de nós termos
nos momentos em que nós temos:

“A influência do texto Bizantino foi auxiliada por fatores históricos, esse foi o texto que
se tornou popular em Constantinopla quando foi distribuído por todo o Império Bizantino,
onde a língua grega foi preservada. Não é nenhuma surpresa que tenha sido esse o texto
que veio a dominar a tradição grega a partir do sétimo século, e que hoje, é a maioria das
testemunhas sobreviventes conhecidas desse tipo de texto.”8

Observe, os primeiros quatro séculos neste momento de produção não controlado, de


cristianismo perseguido, nós temos um número muito reduzido de evidências sobrevi-
ventes desse período. Não somente isso, as evidências sobreviventes desse período

8 Bruce Metzger and Bart Ehrman, The Text of the New Testament: Its Transmission Corruption and Restoration. (New Yourk, NY: Oxford,
2005), 280.

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demonstram que embora antigas, elas não têm a mesma qualidade de transmissão que
nós vamos ver nos períodos posteriores onde a produção é controlada.
Além disso, note que a partir do quarto século até o nono século, antes do início de
produção dos minúsculos na igreja, nós temos um pequeno número de manuscritos
sobreviventes. Ainda nesse período, nós não temos, apesar de ter a possibilidade de
manutenção e de transcrição do texto, o que nós vemos nesse período é que a ênfase
da igreja estava muito mais preocupada em reproduzir os textos latinos que gregos. Per-
cebemos que no início do século XI, vemos que a produção de minúsculos e a produção
de uma cidade de manuscritos do Novo Testamento literalmente explode.
Se você perceber esse gráfico dividido por século, você pode notar que o texto que nós
chamamos de Bizantino, os minúsculos, em grande parte, é um texto que acontece no
segundo milênio da era cristã.9

5 | Interesse Renovado no Texto Grego no Ocidente: Quando então que passasse a ter
um renovado interesse no texto grego no ocidente? O que é que acontece para que o
grego volte a ser importante para a igreja ocidental e seja conhecido no mundo ociden-
tal ? Na verdade, o que acontece é uma série de pequenos movimentos que vão combi-
nar com a expulsão e a destruição de Constantinopla.

A. Renascentismo: Por exemplo, Coluccio Salutati já tinha iniciado entre 1331 e 1406
um movimento de estudo do texto grego das obras clássicas e do latim nas obras
clássicas. Em 1397, ele convida Manuel Crisoloras para ensinar grego clássico em
Florença. Esse é, sob muitos aspectos, aquilo que se define como início da renascen-
ça. Esse processo de voltar os olhos para os textos clássicos como um movimento
que volta a infundir na Europa o desejo por conhecer as grandes obras do passado.
Sobre esse momento, Judith Odor afirma:
“As raízes do movimento para reviver o grego começaram bem antes do Renascentis-
mo na Europa, antes da vitória decisiva do Império Otomano sobre Constantinopla em
1453. Pavimentando o caminho para esse novo interesse pelos valores clássicos e
pela educação, Manuel Crisolaras (1350–1415) foi convidado a Florença de Constan-
tinopla para tutorar a elite intelectual e política no sul da Itália. Crisolaras treinou toda
uma geração de acadêmicos em língua e literatura grega, mudando assim a academia
na Itália e, por extensão, na Europa. Quando Constantinopla caiu, a Europa estava pron-
ta para receber seus estudiosos de braços abertos.”10

B. Queda de Constantinopla: Mas foi no dia 29 de maio de 1453 que Hagia Sofia,

9 N.B. No vídeo da aula o professor usa equivocadamente a expressão “segundo século”. Na verdade, como o gráfico deixa claro, a maioria
dos mss pertence ao segundo milênio da história cristã.
10 Judith Odor, “The Historical-Grammatical Approach,” in Social & Historical Approaches to the Bible, ed. Douglas Mangum and Amy
Balogh, vol. 3, Lexham Methods Series (Bellingham, WA: Lexham Press, 2016), 29.

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maior igreja cristã do mundo, se torna a maior mesquita do mundo. Com a invasão
do Império Otomano, também conhecido como Império turco, essa igreja foi tomada
e transformada em uma grande Mesquita, e Constantinopla, que havia sido o centro
da reprodução dos textos e manuscritos do Novo Testamento, é destruída. Esse dia
ficou conhecido entre os gregos como Terça Negra. Os seus estudiosos, fugindo da
perseguição, levam consigo os seus documentos e invadem a Europa com eles, reno-
vando ainda mais o seu interesse por conhecer as obras gregas. Sobre esse momen-
to, Daniel Wallace diz:
“Após um cerco de sete semanas pelos Otomanos, a grande cidade de Constantinopla
caiu. Três dias depois daquela “terça-feira negra” (como alguns gregos ainda a cha-
mam), a maior igreja do mundo, Hagia Sophia, tornou-se a maior mesquita do mundo.
Constantinopla, anteriormente Bizâncio, foi a cidade que Constantino, o Grande, tornou
a capital do Império Romano em a.d. 330. Nos 1100 anos seguintes, os escribas de
língua grega copiaram fielmente tanto a literatura clássica quanto a bíblica. Quando a
cidade caiu, muitos dos escribas e monges fugiram para a Europa Ocidental, trazendo
com eles seus manuscritos. Naquela época, o grego antigo era virtualmente desconhe-
cido no Ocidente e já era desconhecido há um milênio. Agora, a enxurrada de manus-
critos vindos de Constantinopla impulsionou a Renascença e deu origem à Reforma.”11

O que nós vemos é que, historicamente, o interesse pelo texto grego clássico e o texto
grego do Novo Testamento, começa no momento em que a Renascença está ganhando
formato na Europa Ocidental.

6 | Invenção da Imprensa: É nesse momento que mais um evento acontece e acaba por
mudar completamente o modo da manutenção do texto do Novo Testamento, que foi
a invenção da imprensa em 1954, por Johannes Gutenberg. Sobre ele, F. Oakley afirma:
“Na década de 1440, o alemão Johann Gutenberg começou a experimentar maneiras no-
vas e misteriosas de abordar a impressão. O mesmo fizeram muitos outros europeus,
todos em busca de uma maneira mais rápida e barata de produzir livros. Normalmente,
se os europeus não escrevessem à mão, eles usavam carimbos ou xilogravuras - uma
melhoria, mas ainda dolorosamente lenta. E os métodos de impressão usados ​​no Oriente,
principalmente a impressão em bloco, eram desconhecidos na Europa.”
“Gutenberg tinha uma vantagem: ele era hábil em gravura e trabalho em metal. Enquanto
morava em Estrasburgo, Gutenberg aperfeiçoou várias ideias exclusivas: um molde por-
tátil que se ajustava para moldar qualquer letra com precisão e em grandes quantidades;
uma liga de estanho durável que derreteu e solidificou rapidamente e sem distorção; uma
tinta à base de óleo; e uma impressora modificada. Por volta de 1440, ele reuniu os com-
ponentes necessários para a impressão produzida em massa, mas se ele imprimiu algo
em Estrasburgo, não sobreviveu.”

11 Daniel Wallace, “Erasmo and the Book that Changed the World Five Hundred Years Ago,” Unio Cum Christ, 2:2, 2016. 30.

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“Em 1448, Gutenberg voltou para sua cidade natal de Mainz e pediu dinheiro empresta-
do para sua gráfica. Ele não conseguiu pagar os empréstimos consideráveis ​​e, em 1455,
seu credor e sócio executou a hipoteca, tomando posse das fontes de Gutenberg para
dois projetos em andamento: uma Bíblia impressa em quarenta e duas linhas por página
e um saltério.”12
A soma desses eventos, a saber o renovado interesse pelo texto grego e a invenção da
imprensa, é que acaba por gerar em toda a Europa um desejo de se voltar às fontes, um
Ad Fonts, é o que acontece durante a Renascença. É desse momento em diante que a
manutenção das cópias dos textos já não é mais feita através de um processo manual,
mas ele pode ser feito através de um processo quase que industrial, feito em larga esca-
la, muito melhor controlado do que havia sido feito até aqui.
“Até esta invenção, todos os livros tinham que ser feitos à mão, com os escribas escre-
vendo-os meticulosamente, letra por letra. Os livros foram escritos da mesma maneira por
milhares de anos. Com a invenção de Gutenberg, agora os livros se tornaram acessíveis.
Combinado com o dilúvio de manuscritos gregos na Europa Ocidental, o conhecimento
aumentou dramaticamente.”13

12 F. Oakley, “Gutenberg Produces the First Printed Bible (1456),” Christian History Magazine-Issue 28: The 100 Most Important Events in
Church History (Carol Stream, IL: Christianity Today, 1990).
13 Daniel Wallace, “Erasmo and the Book that Changed the World Five Hundred Years Ago,” Unio Cum Christ, 2:2, 2016. 30.

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II. Novum Instrumentum


É esse o espírito da academia nos dias de Erasmo de Rotterdam, isto é, do Ad Fonts, é que
ele que vai publicar o primeiro texto grego impresso da história da transmissão do texto do
Novo Testamento, o Novum Instrumentum. Erasmo de Rotterdam tinha a intenção de ofere-
cer para a igreja uma nova tradução da vulgata latina. De acordo com os escritos de Erasmo,
ele entendia que a vulgata precisava ser atualizada na sua linguagem, e por isso, ele oferece
não somente uma nova tradução, mas ele oferece um texto grego impresso, para apontar de
onde saiu a sua tradução do grego.

1 | O Primeiro texto Grego Impresso e Publicado: O Novum Instrumentum foi o primeiro


texto grego impresso e publicado da história do cristianismo, mas não foi o primeiro
texto impresso. O primeiro texto impresso foi a Poliglota Complutense, publicada, escri-
ta e idealizada pelo Cardeal Cícero, na Espanha, na Universidade de Alcatá. No entanto,
por problemas internos da própria igreja católica, esse texto só foi publicado em 1520,
quando teve finalmente a sanção papal. Antes disso, em 1516, o Novum Instrumentum
foi publicado por Erasmo de Rotterdam, mais precisamente, no dia 1 de março, de 1516.
Sobre esse dilema, J.Keith Elliot diz:

“O Novum Instrumentum de Desiderius Erasmo de Rotterdam de 1516 (2001a) foi a pri-


meira edição do NT grego impresso e publicado. O NT multivolume da Poliglota Com-
plutense foi a primeira edição do NT grego realmente impressa. O cardeal Francisco
(né Gonzalo) Ximénes de Cisneros (1436–1517), arcebispo de Toledo, inaugurou uma
edição da Poliglota que, para a porção do NT, seria em latim e grego. Este NT estava
pronto dois anos antes da edição de Erasmo - a assinatura em Apocalipse tem a data
de 10 de janeiro de 1514 - mas não foi publicada até que apareceu como o volume V da
Bíblia completa por volta de 1522. Foi impresso na Espanha em Alcalá de Henares, e em
Latim ficou conhecida como Complutum.”14

2 | Publicado por Erasmo de Roterdã: Erasmo de Rotterdam era, sem sombra de dúvi-
das, na ocasião, um dos maiores conhecedores do grego, da sua geração. Ele era im-
pressionante nos seus estudos, o seu trabalho, literalmente, mudou a história do mundo.
Erasmo de Rotterdam faz simplesmente, um dos muitos dominós que estão caindo e

14 J. Keith Elliott, “The Text of New Testament,” in A History of Biblical Interpretation: The Medieval through the Reformation Periods,
ed. Alan J. Hauser, Duane F. Watson, and Schuyler Kaufman, vol. 2 (Grand Rapids, MI; Cambridge, U.K.: William B. Eerdmans Publishing
Company, 2009), 230.

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vão levar a Reforma Protestante. O próprio grito da Reforma Protestante Sola Scriptura,
só foi possível por causa do grito de Ad Fonts, de Erasmo de Rotterdam. Foi essa volta
a fonte que nós vemos em Erasmo de Rotterdam, e a influência que ele tinha inclusive,
em um dos seus “inimigos” Martinho Lutero, faz com que ele seja extremamente impor-
tante para a história da igreja, para a história da Reforma Protestante.

“Um humanista, teólogo, monge agostiniano e sacerdote, Erasmo foi o estudioso mais
proeminente da Europa no século XVI. Ele foi educado e ensinado nas principais universi-
dades européias. Nesses vários locais, ele criou seu amor pela literatura clássica e pelos
pais da igreja, dois ingredientes-chave para suas tentativas ao longo da vida de combinar
humanismo e cristianismo.”15

A. Sua História: Erasmo de Rotterdam tem uma história muito interessante. Nascido
em 1467 em Roterdã na Holanda. Ele é filho ilegítimo de um padre católico e com 20
anos ele decide se tornar monge em Steyn, um mosteiro com uma ampla biblioteca
de literatura clássica. Com 25 anos, ele é ordenado monge agostiniano, mas não
suporta a vida reclusa do mosteiro. Em 1495, com 28 anos, Erasmo se muda-se para
Paris para aproveitar da Universidade, passa por seu período mais pobre, passa fome,
entra em conflito com os acadêmicos escolásticos e muda-se para Inglaterra. Na
Inglaterra é desafiado por John Colet a estudar o Novo Testamento de modo mais
sério. Foi então que resolveu dedicar-se a aprender Grego.

B. Seu Treinamento: Em 1500, quando tinha 32 anos, Erasmo volta para a cidade de
Paris, onde ele pretende começar a iniciar o grego, no ano de 1500. Para você enten-
der o nível de afinco que esse homem tem, em 1516, 16 anos depois da usa decisão
de iniciar a estudar grego, Erasmo vai publicar a primeira versão impressa do Novo
Testamento grego.

C. Sua Dedicação: Em 12 de abril de 1500, ele escreve uma carta para o seu amigo
John Collett, que foi seu professor na área de Novo Testamento enquanto ele estava
na Inglaterra. Para esse amigo ele diz o seguinte:

“Eu dediquei toda a minha atenção aprender grego. A primeira coisa que eu vou fazer
assim que o dinheiro chegar, é comprar alguns autores gregos; E se sobrar algum di-
nheiro, eu vou comprar comida e roupas.”16

15 Anna Marie Johnson, “Erasmo, Desiderio,” ed. David M. Whitford, ed., T&T Clark Companion to Reformation Theology, (London; New
York: T&T Clark, 2012), 402.
16 John W Omalley, Craig Ringwalt Thompson, Collected Works of Erasmus: The Correspondence of Erasmo: Letters 1-141 (Toronto:
Toronto Press, 1974), 252.

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Eu entendo que esse é um homem que prefere ler, do que comprar roupas bonitas. Ele
prefere repetir todas as suas camisas polos nos seus vídeos, do que trocá-las em cada
um deles só porque ele prefere guardar dinheiro para comprar seus próprios livros.
Tentando explicar o seu interesse por estudar grego, em uma carta para um amigo
chamado Antoon van Berger, cunhada no dia 16 de Março de 1501, ele diz o seguinte:

“Mas a meu ver agora, é melhor aprender, mesmo um pouco tarde, as coisas que deve-
mos entender primeiro, do que nunca aprendê-las em absoluto.”

O empenho de Erasmo de Rotterdam é algo notável. O seu estudo é algo notável,


tendo sido motivado esses estudos, pela própria obra de um homem chamado a Lo-
renzo Valla:

“Erasmo recebeu mais estímulos para seus estudos do Novo Testamento das anota-
ções sobre o Novo Testamento pelo humanista italiano Lorenzo Valla, que ele desco-
briu em uma abadia perto de Louvain em 1504 e que ele publicou em 1505. Adnotatio-
nes do próprio Erasmo, que acompanharam seu Novo Testamento edição, superou o
trabalho da Valla em qualidade e abrangência. Considerando que Valla foram breves
notas críticas textuais, as anotações de Erasmo ofereceram não apenas uma crítica
textual mais extensa, mas também exegese literária e teológica.”17

D. Sua Proposta: Ao voltar ao texto grego do Novo Testamento, Eramos percebe o


quanto a Vulgata latina estava equivocada, e o quanto ela precisava ser atualizada.
Em sua carta para a Antoon van Berguer (13 de Março, 1501), ele diz o seguinte:

“A erudição latina, por mais ampla que seja, ela é deficiente e imperfeita sem o grego.
No latim nós temos, na melhor das hipóteses, pequenos riachos e piscinas turvas, en-
quanto o grego tem as fontes mais claras e rios que fluem com ouro.”18

Ele chama o interesse da igreja em estudar as Escrituras em latim de loucura. Não


fazia sentido para ele não voltar para o texto do Novo Testamento. Era necessário
voltar ao texto original:

“Enquanto a erudição escolástica estava preocupada em sintetizar os pontos de vista


que tinham sido mantidos ao longo dos séculos por proeminentes filósofos e teólogos,
os humanistas enfatizavam as obras originais dos autores da antiguidade. O grito hu-
manista era “Ad fontes!” compelindo os eruditos a abandonar as exposições e comen-

17 Donald K. McKim, Historical Handbook of Major Biblical Interpreters (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 1998), 185.
18 John W Omalley, Craig Ringwalt Thompson, Collected Works of Erasmus: The Correspondence of Erasmo: Letters 142-297 (Toronto:
Toronto Press, 1975), 25.

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tários de estudiosos medievais e ir direto a fonte original.”19

Em uma carta a John Colet, seu antigo professor de Grego, escrita em algum momen-
to em 1504, Erasmo diz o seguinte:

“Agora estou ansioso para estudar a literatura sagrada [isso em 1505] a todo o vapor; Eu
tenho completo desafeto por qualquer coisa que me distraia disto, ou que me atrase (...) a
partir daqui, eu pretendo me dedicar as Escrituras e passar o resto da minha vida nela.”20

3 | Uma Versão Bilingue do Novo Testamento (Grego-Latim): A partir desse momento


na vida de Erasmo de Rotterdam, a sua vida era dedicada ao estudo do texto grego do
Novo Testamento, e a partir desse momento, ele visita à Universidade de Cambridge, de
Paris, Turim, Veneza, entre outras, e também a Basileia na Suíça. Visitando todas essas
universidades, ele se dedica a coletar e estudar manuscritos para finalmente, escrever
aquilo que viria a ser a primeira versão impressa do Novo Testamento. Em uma versão
bilíngue, ele publica um Novum Instrumentum, o seu desejo era atualizar o latim da Vul-
gata, a partir das anotações de Lorenzo Valla. O ponto é que essa obra foi muito mais
importante por seus traços e pelo seu texto grego, do que pela sua tentativa de atualiza-
ção do texto latino da vulgata.

“A edição bilíngue de Erasmo era um texto grego com uma nova tradução ou revisão do la-
tim, não uma reprodução da Vulgata latina. Foi plausivelmente argumentado por de Jonge
que a principal intenção de Erasmo ao publicar este Novum Instrumentum era estabelecer
sua própria nova versão latina. A afirmação do longo título em latim do Novum Instrumen-
tum de que esta seria uma versão revisada e melhorada pode dar alguma pista para seu
propósito. Visto que nenhum NT grego impresso existia na época, sua edição não poderia,
portanto, reivindicar ser um texto “revisado” do NT grego, e a alegação de que esta edição
era uma melhoria deve, portanto, ser aplicada ao latim. Assim, ao publicar um NT latino re-
visado, Erasmo estava fornecendo uma edição melhor das Escrituras na língua europeia,
o latim, promovendo assim a elevação espiritual e moral da Europa.”21

19 Joi Christians, “Erasmo and the New Testament,” Trinity 19 NS (1998), 54.
20 John W Omalley, Craig Ringwalt Thompson, Collected Works of Erasmus: The Correspondence of Erasmo: Letters 142-297 (Toronto:
Toronto Press, 1975), 86.
21 J. Keith Elliott, “The Text of New Testament,” in A History of Biblical Interpretation: The Medieval through the Reformation Periods,
ed. Alan J. Hauser, Duane F. Watson, and Schuyler Kaufman, vol. 2 (Grand Rapids, MI; Cambridge, U.K.: William B. Eerdmans Publishing
Company, 2009), 233.

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A. Sua Apresentação: Na imagem acima, temos uma versão sobrevivente do No-


vum Instrumentum de Erasmo de Rotterdam. Nessa imagem, você encontra o final
do livro de Atos escrito em forma de ampulheta. Na página à esquerda, o argumen-
to do texto de Romanos e o início do texto de Romanos com um belo desenho em
tons vermelhos. Na página da direita, você pode perceber as letras latinas e roma-
nas, identificando quais são os textos do Novo Testamento, a sua versão grega, e
a sua tradução latina. No alto da página, onde você encontra uma seta apontada,
você encontra a seguinte inscrição em latim, traduzida do seguinte modo: Epístola
do apóstolo Paulo da verdade grega revisada fiel dos antigos manuscritos latinos,
por Erasmo de Rotterdam, professor de teologia sacra.
Se você prestar atenção na área vermelha no lado esquerdo e direito, você vai en-
contrar duas palavras gregas. A primeira delas, está escrito em grego o nome de
Johann Froben, que é a pessoa que publica esse texto. Ambos, deixando suas mar-
cas. Caso você queira comprar um exemplar como esse, você pode visitar alguns
sites que disponibilizam venda de documentos antigos. Esse aqui, por exemplo,
foi vendido por 15.000 EUR, algo perto de R$100.000. Vale a pena para quem tiver
interessado.22

B. Sua Oposição: No entanto, quando ele publicou esse texto, quando esse texto
chega ao conhecimento da igreja latina, a grande preocupação dos acadêmicos
naquele momento é que as Escrituras estavam sendo violadas e jogadas fora. Ob-
serve o tipo de reclamação que Erasmo de Rotterdam recebeu. Martin Dorp, um dos

22 Novum Instrumentum Omne avaliado entre 8.000 e 12.000 euros, e vendida por 15.000 euros. Ver http://www.sothebys.com/en/auc-
tions/ecatalogue/2013/the-mendham-collection-l13409/lot.16.html.

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grandes opositores do seu trabalho. Ele disse o seguinte:


“Não é razoável que toda a igreja, que sempre usou esta edição [a vulgata] que ainda
aprova e usa, seja considerada errada por todos os séculos.”23
Em outras palavras, o que seus opositores estão dizendo é: “Quem é você Erasmo
de Rotterdam para dizer que essa vulgata está ruim? Essa é a vulgata da antiga igre-
ja, esse é o texto antigo, essa é a versão santa, esse é o texto recebido pela igreja,
essa é a versão limpa das Escrituras.” É basicamente essa a crítica que ouvimos de
basicamente qualquer tradução nova que seja oferecida.24 Erasmo de Rotterdam
teve os seus dias de NVI quando o produziu o texto que daria a origem a versão
King James.

C. Sua Rejeição: Ele também não foi aprovado, o seu trabalho não foi recebido. Na
verdade, reclamando para Noel Beda em 15 de julho, de 1525, ele diz que quando ele
muda, lá ele encontra um carmelita que o opõe veementemente o acusando de ser o
anticristo, por tentar atualizar a linguagem da vulgata. Ele foi chamado de anticristo:
“Após o lançamento da primeira edição [Novum Instrumentum], mudei-me para Lou-
vain, onde os teólogos me acolheram em seu círculo, embora esta fosse a menor
das minhas ambições. Quando a obra apareceu, o carmelita Egmondanus levantou
uma grande confusão, alegando que eu era o anticristo.”25

D. Exagero dos Opositores: A reação da igreja e dos conservadores tradicionalis-


tas, geralmente, é que qualquer coisa nova que seja apresentada, deve ser alguma
coisa ruim, como nós vemos em traduções novas para o português que sofrem
veemente as perseguições que Erasmo de Rotterdam sofreu também. Além disso,
um dos seus opositores disse:
“Se em um ponto, a Vulgata estiver errada, [observe o exagero] toda a autoridade da Es-
critura estaria em colapso, o amor e a fé se extinguiriam, as heresias e os cismas abun-
dariam, a blasfêmia seria cometida contra o Espírito Santo, a autoridade dos teólogos
seria abalada, e de fato, a igreja católica entraria em colapso das suas fundações.”26
Parece blog de defensor do texto tradicional. “Se em algum lugar o texto tradicional
estiver errado, então não existe inspiração.” Parece defensores de algumas versões
específicas, como King James, revista corrigida e fiel. “Se elas estiverem erradas,
então tudo está errado”. O autor do texto grego por trás de todas essas traduções

23 John W Omalley, Craig Ringwalt Thompson, Collected Works of Erasmus: The Correspondence of Erasmo: Letters 298-445 (Toronto:
Toronto Press, 1975), 86.
24 Procure pelo artigo “Expondo os erros da NVI” e você verá o mesmo tipo de reação de fundamentalistas contra uma nova tradução.
25 John W Omalley, Craig Ringwalt Thompson, Collected Works of Erasmus: The Correspondence of Erasmo: Letters 1535-1657 (Toronto:
Toronto Press, 1975), 135.
26 Pierre Cousturrier; in: Richard H. Bainton, Erasmus of Christendom (New York:NY, Crossroad, 1982), 135.

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tão conhecidas e tão defendidas, sofreu do mesmíssimo modo. Ele também teve
os seus dias de novidade, também teve seus dias de oposição; mas observe o que
ele fala sobre o seu próprio trabalho.
“Portanto, se eu cometi um erro ou me coloquei em risco, o erro e o risco são exclu-
sivamente meus. Meu único propósito no Novo Testamento era estabelecer um texto
puro e lançar luz sobre os problemas que claramente causaram o tropeço de muitos.”27
A intenção de Erasmo de Rotterdam era oferecer um texto puro. A intenção, a pro-
posta e a pesquisa do seu trabalho eram nobres. Ele faz aquilo que até aquele mo-
mento, ninguém na história tinha feito. Ele oferece não somente a primeira versão,
mas ele oferece a sugestão de que a Vulgata precisava ser atualizada. Um argu-
mento muito forte contra a suposta autoridade de Roma.

4 | O Texto Grego de Erasmo não era tão bom quanto ele pensava: Entretanto, o texto
grego usado por Erasmo de Rotterdam não era tão bom quanto ele pensava. Ele dizia
ter escrito a partir dos mais antigos manuscritos e dos mais corretos. Entretanto, nós
precisamos interpretar isso considerando o que ele tinha a sua disposição. Sem som-
bra de dúvidas, os mais antigos e os melhores que ele teve acesso.

“Embora Erasmo tenha afirmado que usou ‘as cópias mais antigas e corretas do Novo
Testamento’, o prazo de impressão imposto pelo editor o obrigou a confiar em apenas
sete manuscritos bastante tardios e inferiores disponíveis em Basileia.”28

Quando visitou diferentes universidades ao redor do mundo, ele teve a oportunidade


de verificar manuscritos, mas ele não teve contato com todos eles, nem mesmo com
todos os que eram conhecidos nos seus dias. Sem sombra de dúvidas, era o melhor
e o mais correto baseado naqueles manuscritos que ele viu, mas quais foram esses
manuscritos? Foram basicamente, oito manuscritos. O manuscrito que hoje nós co-
nhecemos como minúsculo 2, o 2815, 2814, 2817, 817, 2816, 69 e 1. Se você observar,
ele tem a sua disposição manuscritos para quase todo o Novo Testamento, exceto um
manuscrito fragmentado em Apocalipse, como nos lembra Scrivener:

“Todos esses manuscritos não eram nem antigos nem particularmente valiosos. O Có-
dice de Apocalipse foi mutilado nos últimos seis versos, então Erasmo os retraduziu em
grego do latim; e algumas partes de sua versão feita por ele mesmo, que são encontra-
das (no entanto, alguns editores podem falar vagamente) em nenhum manuscrito grego
conhecido, traduções ainda se encontram no nosso texto recebido”29

27 John W Omalley, Craig Ringwalt Thompson, Collected Works of Erasmus: The Correspondence of Erasmo: Letters 1535-1657 (Toronto:
Toronto Press, 1975), 135.
28 Edwin Yamauchi, “Erasmo’ Contribution to New Testament Scholarship,” Fides et historia 19 (Oct. 1987): 10.
29 Frederick Henry Ambrose Scrivener, A Plain Introduction to the Criticism of the New Testament, ed. Edward Miller, Fourth Edition.,
vol. 2 (London; New York; Cambridge: George Bell & Sons; Deighton Bell & Co., 1894), 183–184.

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De acordo com os estudiosos Erasmo de Rotterdam30, os três primeiros documentos


descrevem textos que ele usou como base do seu texto. O segundo foi manuscrito
que ele usa para emendar o seu texto ou que tinha a sua aprovação, e os manuscritos
de terceira categoria foram manuscritos quev ele consultou.

Observe a localidade de cada um deles. Eles estavam ou em Basileia, ou em Leices-


ter, ou em Augsburg. Todas as regiões por onde ele passou e por onde ele acaba por
publicar o seu primeiro texto. Em outras palavras, o texto de Erasmo de Rotterdam,
sem sombra de dúvidas, tem uma importância significativa incomensurável por texto,
mas a verdade é que ele se baseou em manuscritos do século XII e XIII. Ele não teve a
chance de conhecer o que hoje nós conhecemos. Ele não teve acesso a essa grande
riqueza de manuscritos que nós conhecemos, ele fez o melhor que ele podia fazer,
considerando aquilo que ele tinha a sua disposição.

5 | Texto Grego de Erasmo era Problemático: Mas, o texto dele, além de tardio, ele
também era problemático. Existem quatro problemas fundamentais na primeira publi-
cação de Erasmo de Rotterdam, as duas primeiras graves.
A. Sugestões feitas por Erasmo não usadas por seus editores: A primeira delas
é que sugestões feitas por Erasmo para os seus editores elas não foram usadas.
Erasmo sugeriu alterações ou propostas de textos que os seus editores rejeitaram.

30 Daniel Wallace, “Erasmus and the book that Changed the World Five Hundred Yeras Ago”, Unio Cum Christ, 2:2, 2016. 30.

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Isso pode ser visto na comparação entre as anotações de Eramos no Códice 2 (isso
mesmo, ele deixou suas notas no próprio manuscrito!) com o texto do Novum Ins-
trumentum.

B. Sugestões não feitas por Erasmo e usadas por seus editores: Em alguns mo-
mentos, os seus editores adicionaram alterações no seu texto que não teriam sido
aprovadas por Erasmo. Embora tenha sido publicado por Erasmo, essa interação
com seus editores fez com que sugestões não tenham sido recebidas e sugestões
não feitas terem sido usadas.31

C. Muitos erros tipográficos: Além disso, o texto continha muitos erros tipográfi-
cos, apesar de ser produzido pela imprensa às pressas da produção, Erasmo de
Rotterdam na sua publicação, permitiu que muitos erros tipográficos fizessem par-
te desse seu trabalho, e foi uma obra muito mal produzida. O próprio Erasmo de
Rotterdam, em uma carta do dia 1 de julho, de 1515, diz o seguinte:

“Pelo menos eu escapei do escritório de Basiléia [onde ele estudou os manuscritos


que teve a disposição para publicar o seu texto como nós vemos na tabela anterior]
eu realizei o trabalho de seis anos em oito meses.”32

Erasmo sabia que ele tinha feito muito trabalho, mas tinha feito muito rápido. Ele
mesmo descreve a sua primeira edição mais como uma precipitação, do que uma
publicação eventualmente chamada de catadão.33 Frederick Henry Scrivener, um
dos maiores críticos, quando olha para o texto primeiro texto de Erasmo diz o se-
guinte: “A primeira edição de Erasmo no que se refere aos erros tipográficos, é o livro
mais deficiente que eu conheço.”34

31 Esses dois problemas foram apresentados em detalhes no artigo: Kenneth Willis Clark, “Observations on the Erasmian Notes in Codex
2” in J.L. Sharpe III, The Gentile Bias and other Essays, Novum Testamentum Suplement, Vol. 54 (Brill, 1980), 752-55.
32 John W Omalley, Craig Ringwalt Thompson, Collected Works of Erasmus: The Correspondence of Erasmo: Letters 298-445 (Toronto:
Toronto Press, 1975), 186.
33 Uma brincadeira do professor relembrando o termo latino usado pelo próprio Erasmo para descrever o seu trabalho: “praecipitatum ve-
rius quam editum”. Para uma apresentação mais detalhada do Novum Instrumentum, ver “O Texto das Escrituras e a Reforma Protestante”.
Para uma conversa sobre o assunto, procure pelo BTCast 214 A influência de Erasmo na Reforma Protestante.
34 Frederick Henry Ambrose Scrivener, A Plain Introduction to the Criticism of the New Testament, ed. Edward Miller, Fourth Edition.,
vol. 2 (London; New York; Cambridge: George Bell & Sons; Deighton Bell & Co., 1894), 184–185.

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Quando nós olhamos para essas alterações baseadas, inclusive dos manuscritos
que ele usou, nós percebemos que embora tenha sido a primeira edição, ela era
uma edição claramente deficiente. Um exemplo para ilustrar isso pode ser visto na
imagem acima, na qual vemos a primeira página do lado interno do livro. Perceba
que no alto da imagem lemos Novum Instrumentum. O que segue essa expressão é
o título da obra escrito em formato de ampulheta. Nesse título, ele descreve quais
são as fontes que ele usa, incluindo os pais da igreja.
Na imagem, adiciono um pequeno traço vermelho, e é ali que eu gostaria que você
concentrasse sua atenção. O termo que vem antes da palavra sublinhada, é um
nome muito conhecido: Cyrilli que em português conhecemos como Cirilo. O termo
posterior lemos Hieronymi, que em nosso idioma seria Jerônimo. Depois nós temos
Cipriano, nós temos Ambrosio, Hilário, e assim por diante. Mas o termo sublinhado
é alguém chamado Vulgarii. Mas, quem é Vulgarii?
Na verdade, não é ninguém. Não existe nenhum pai da igreja com o nome de Vulga-
rii. A expressão Vulgarii é o termo genitivo que seria traduzido por ‘da Bulgária’ uma
referência a Teofilacto de Ocrida. Olha só que pequeno deslize de atenção. O que
acontece é que Teofilacto era da Bulgária, e ao invés de inserir o nome de Teofilac-
to e dizer Teofilacto da Bulgária, ele só escreveu da Bulgária, omitindo o nome do
autor. Agora, se esse erro que estava na capa do trabalho, imagina o que tinha no

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resto do livro. Esses erros tipográficos e esquecimentos, certamente, precisavam


ser editados. Certamente precisavam ser melhorados e corrigidos, e foi o que aca-
bou acontecendo nas próximas edições.

D. Obra Mal Produzida: Tem uma série de problemas no livro. Considere essa visão
panorâmica de suas primeiras quatro edições:

I. Primeira Edição (1516): “De acordo com Erasmo, ele teve acesso a apenas seis
manuscritos, nenhum deles completo. Seu melhor e mais antigo manuscrito (Código
1) era do século X, mas ele não o usava muito porque, por algum motivo, não confiava
nele. Nos Evangelhos havia quatro dos manuscritos, o mais antigo do século XV. Em
Atos e Epístolas Gerais eram em três os mss usados, o mais antigo do século 13. Nos
livros paulinos eram apenas quatro manuscritos todos tardios. Em Apocalipse ele
tinha apenas um manuscrito (do século XII), e faltava a última página, então Erasmo
teve que retraduzir os últimos seis versos de Apocalipse do Latim para o grego. Onde
seus manuscritos não eram claros ou eram defeituosos, Erasmo consultou a Vulgata,
resultando em pelo menos uma dúzia de lugares onde a leitura não era apoiada por
nenhum manuscrito grego. Devido à pressa para publicá-lo, ocorreram muitos erros
de impressão na primeira edição. O próprio Erasmo disse que esta obra foi “preci-
pitada em vez de editada”35 John Hausschein (Basileia) encontrou nada menos do
que 501 itacismos no texto impresso de Erasmo. Além disso, ele manteve o uso do
ν-móvel em verbos colocados antes de termos iniciados em consoantes.
II. Segunda Edição (1519): A segunda edição, tem anotações ampliadas muito ver-
dadeiras, e traz na sua declaração dizendo que ela foi ainda mais cuidadosa, que a
versão anterior e erros da primeira edição são corrigidos, principalmente sobre as
autoridades de um novo códice, o novo códice que ele teve acesso. Baseado nesse
novo manuscrito, a segunda edição é produzida. Na segunda edição de Mills em
1707, identifica 400 novas alterações no texto, entre a primeira e a segunda edição.
400 alterações, de acordo com Mills, foram para melhor, e 70 para pior, ou seja, ele
conseguiu piorar, ainda assim, o seu texto. Quando nós olhamos para esse trabalho,
observamos o cuidado que ele teve por fazer, nós percebemos que ele ficaria insa-
tisfeito com isso, e claro, ele faria uma nova edição.
“A segunda edição tem anotações ampliadas e muito verdadeiramente traz em seu
título a declaração, ‘multo quam antehac diligentius ab Er. Rot. recognitum’, pois uma
grande parte dos erros de impressão, e não poucas leituras da primeira edição, são
então corrigidas, sendo as correções feitas principalmente sob a autoridade de um
novo códice.”36

35 Charles W. Draper, “Textus Receptus,” ed. Chad Brand et al., Holman Illustrated Bible Dictionary (Nashville, TN: Holman Bible Pu-
blishers, 2003), 1577.
36 Frederick Henry Ambrose Scrivener, A Plain Introduction to the Criticism of the New Testament, ed. Edward Miller, Fourth Edition.,
vol. 2 (London; New York; Cambridge: George Bell & Sons; Deighton Bell & Co., 1894), 185.

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III. Terceira Edição (1522): A terceira edição seria ainda mais cuidadosa, com ainda
mais ajuda de outras pessoas. Ele produz então, a terceira edição, que vai se tor-
nar a versão mais usada no processo da reforma protestante. A terceira edição de
Erasmo de Rotterdam é aquela que vai ser usada especialmente, na reforma de fala
inglesa, e nós vamos perceber o impacto desse texto na reforma protestante de
uma maneira muito interessante. No entanto, Scrivener, quando olha para a segun-
da e terceira edição, ele encontra ainda 118 alterações. Nestas 118 alterações, ele
diz que a mais importante alteração foi o texto de 1João 5:78, também conhecido
como o parêntese joanino, aquela expressão que descreve a mais explícita expres-
são da Trindade no texto de Erasmo de Rotterdam, do qual Scrivener diz o seguinte:
“A terceira edição (1522) é principalmente notável por sua inserção de 1João 5: 7, 8
no texto grego em consequência da controvérsia de Erasmo com Stunica e H. Stan-
dish, Bispo de Santo Asafe (falecido em 1534), e com um antagonista muito mais
fraco, Edward Lee, depois arcebispo de York, que se opôs à sua omissão de uma
passagem que nenhum códice grego conhecido continha até a ocasião.”37
O códice Monteforteanos, da perspectiva de Scrivener, era um manuscrito que con-
tinha um texto desconhecido em toda a tradição manuscrita conhecida por ele.
Até aquele momento, ela não tinha aparecido em nenhum outro lugar, embora se
encontrasse esse texto nas versões latinas dos dias de Erasmo. No que se refere a
Erasmo, ele não teria incluído essa passagem porque os manuscritos gregos que
dispunha não continha esses versos. Diga-se de passagem que nas duas primeiras
edições do seu texto, Erasmo não o incluiu. Isso fez com que teólogos criticassem
veementemente as edições de Erasmo, especialmente Stunica. A tradição diz que
enquanto preparava sua terceira edição, Erasmo teria dito que se encontrasse um
manuscrito grego com o Comma Johanneum ele o incluiria, mas tal afirmação não
foi encontrada.
Por excesso de conflitos com os seus opositores, Erasmo em determinado mo-
mento, teria dito que se encontrasse um manuscrito que tivesse, ele colocaria, e
foi mais ou menos o que aconteceu. Nós conhecemos um pouco melhor essas
histórias nos livros, e ao que parece, forjou-se um manuscrito em Cambridge onde
adicionou-se esse texto ao texto de João, que foi colocado na mão de Erasmo de
Rotterdam, e baseado nisso, ele incluiu a contragosto o texto na sua terceira edição.
Sobre o Códice Montifortianus, Scrivener diz o seguinte: “Este manuscrito foi ouvido
pela primeira vez entre a publicação da segunda (1519) e terceira (1522) edição de Eras-
mo de seu N. T., e depois que ele declarou publicamente, em resposta aos objetores, que
se algum manuscrito grego pudesse ser encontrado contendo a passagem, ele iria inse-
ri-lo em sua revisão do texto; uma promessa que ele cumpriu em 1522.” 38 Ehrman-Metz-

37 Idem, p.186.
38 Idem, ibid.

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ger completam: “Foi baseada no testemunho exclusivo e tardio [do Códice Montfortia-
nus, MS.61] que Erasmo foi convencido a incluir essa passagem certamente espúria no
texto de 1João. O manuscrito, que é notavelmente novo e limpo por toda parte (…) dá
toda a aparência de ter sido produzido expressamente com a finalidade de confundir
Erasmo”39
“Tendo em vista a escassez de evidências externas e a probabilidade transcricional de
que o Comma tenha surgido por motivos teológicos, essa leitura teria sido relegada a
uma nota de rodapé histórica se não fosse por certos eventos do século XVI. Obser-
vando que o Comma ocorreu apenas em manuscritos latinos mas era desconhecido
em qualquer manuscrito grego conhecido por ele, Erasmo a omitiu de suas edições
do Testamento grego em 1516 e 1519. Stunica, editor do Poliglota Complutense (im-
presso em 1514; publicado em 1522), atacou a Erasmo por omitir o Comma e o in-
cluiu em seu próprio texto, traduzido do latim. Em resposta a um clamor mais amplo,
Erasmo sustentou que ele havia procurado muitos manuscritos gregos, mas não havia
encontrado nem mesmo um que contivesse o Comma. O mss 61, contendo o Comma
e aparentemente produzido na época para esse fim, foi trazido à atenção de Erasmo e,
temendo uma resposta negativa à sua edição, ele incluiu a vírgula na terceira edição de
1522, mas não sem suspeita de que o mss 61 tivesse sido revisado do latim. A leitura
foi aceita na terceira edição Stephanus de 1550 e no texto de Elzevir de 1633, mais
tarde conhecido como Textus Receptus. Em seguida, alcançou grande aceitação na
Vulgata Clementina de 1592, que se tornou a Bíblia oficial da Igreja Católica Romana,
e na edição de Rheims. Não originalmente na Bíblia de Lutero, editores posteriores
adicionaram-no ao seu texto começando em 1582. Embora anteriormente colocado
entre colchetes por Tyndale como questionável, a leitura foi adotada em russo. Assim,
o Comma ganhou ampla aceitação nos séculos XVI e XVII”40

“Como parece claro nos nossos dias, o manuscrito grego foi provavelmente produzi-
do em Oxford por volta de 1520 por um frade franciscano chamado Froy, que pegou
as palavras disputadas da Vulgata Latina”41

IV. Quarta Edição (1522): Na quarta edição, Erasmo usou indiscriminadamente a


Poligota Complutense especialmente em Apocalipse; poucas diferenças foram in-
troduzidas, e a mais significativa é que Erasmo não incluiu o Comma Johanennum.

6 | Influência na Reforma: Percebemos a diferença da influência dessa mudança no


texto de Erasmo de Rotterdã quando olhamos para a tradição alemã e a tradição ingle-

39 Bart Ehrman and Bruce Manning Metzger. The Text of the New Testament: Its Transmission Corruption and Restoration (New Yourk,
NY: Oxford, 2005), 88.
40 Carroll D. Osburn, “Johannine Comma,” ed. David Noel Freedman, The Anchor Yale Bible Dictionary (New York: Doubleday, 1992), 883.
41 Bart Ehrman and Bruce Manning Metzger. The Text of the New Testament: Its Transmission Corruption and Restoration (New Yourk, NY:
Oxford, 2005), 146.

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sa. Lutero usou a segunda edição do texto de Erasmo para sua tradução do Novo Tes-
tamento para o Alemão (sem comma Johanennum). William Tyndale usou a terceira
edição como base para sua tradução do Novo Testamento para o Inglês. Também foi
o texto base da tradução de Genebra, da King James Bible, e de basicamente toda tra-
dução protestante até 1881 (com Comma Johanennum). O texto do Novo Testamento
de Erasmo, tal como editado por Stephanus e Ezelvier, tornou-se o mais importante
texto base para traduções e estudos acadêmicos por quase 300 anos (com Comma
Johanennum)!
Em outras palavras, o texto de Erasmo de Rotterdam é extremamente importante para
a história da crítica textual e a história da transmissão do texto, assim, ele se torna
de acordo com os historiadores, a mais importante contribuição para a reforma pro-
testante. De acordo com o Roger Olson, a influência dessa obra sobre a reforma é
incalculável:
“Talvez a mais importante de todas as contribuições de Erasmo tenha sido a produção
do texto crítico do Novo Testamento Grego em 1516. A influência dessa obra sobre a
Reforma é incalculável. Tornou-se a base da tradução de Lutero para o alemão e for-
neceu aos estudiosos de toda cristandade o modelo para trabalhos de interpretação e
tradução (…) O texto de Erasmo revelou que a Vulgata era uma tradução relativamente
inferior e esse fato estimulou e preparou o crescente movimento para traduzir a Bíblia
nos idiomas do povo da Europa.”42

42 Roger Olson, História da Teologia Cristã: 2000 anos de Tradição e Roforma, (São Paulo: SP, Vida Nova, 2001), 372-3.

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III. Textus Receptus


Erasmo de Rotterdam faz algo simplesmente excepcional quando produz esse texto, mas é
baseado nesse texto e suas posteriores edições, que nós vamos conhecer o Textus Receptus:

“A terceira edição [de Erasmo] foi novamente modificada, mas não o suficiente para corrigir
suas deficiências massivas. Esta terceira edição foi a base para o ‘Textus Receptus’ e foi publi-
cada por várias pessoas com poucas mudanças nos quatro séculos seguintes. Reconhecendo
a superioridade do texto de Ximenes, Erasmo baseou-se nele para fazer centenas de mudanças
em sua quarta (1527) e quinta (1535) edições, mas estas não foram reproduzidas com frequ-
ência. Assim, principalmente porque teria sido distribuído primeiro, custou menos e era menor
em tamanho, o trabalho de Erasmo se tornou o texto padrão por centenas de anos.”43

1 | Historicamente Editado: O Textus Receptus é um texto historicamente editado. A


terceira edição de Erasmo se torna a referência para o processo de cópia, tradução e
transmissão do texto.

“O texto grego de Erasmo era a base do Novo Testamento grego de Robert Estienne
(1550) e das edições do Novo Testamento de Teodoro Beza, cujos textos, por sua vez,
formariam a base da Versão King James (1611) e do Testamento grego Elzevir (1633)
que veio a ser conhecido como Textus Receptus (“o texto recebido”).”44

A. Robert Estienne (Stephanus – 1550): Publica em Paris a Editio Regia (Edição


Real). Essa edição foi primeiramente baseada na terceira edição de Erasmo, mas
usou a Poliglota Complutense como paralelo de comparação. Na Editio Regia, Ste-
phanus usa 14mss incluindo o recém descoberto Códice Beza (V) e em função disso
adiciona um breve aparato crítico, mas não publica centenas de variantes encontra-
das. Entretanto, o trabalho de Stephanus ofereceu os primeiros passos na direção da
crítica textual moderna.

Observe nesta tabela45, os documentos usados por Stephanus na produção deste


texto. Sabemos que ele usa a Poliglota Complutense, ele usa o Códice Bezae e uma
série de minúsculos, inclusive, dois que nós não sabemos quais são, e dois que nós
temos dúvidas de quais são. De todos esses documentos, observem novamente que

43 Charles W. Draper, “Textus Receptus,” ed. Chad Brand et al., Holman Illustrated Bible Dictionary (Nashville, TN: Holman Bible Publishers,
2003), 1577.
44 Donald K. McKim, Historical Handbook of Major Biblical Interpreters (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 1998), 190.
45 ADAPTADA DE: Frederick Henry Ambrose Scrivener, A Plain Introduction to the Criticism of the New Testament, ed. Edward Miller,
Fourth Edition., vol. 2 (London; New York; Cambridge: George Bell & Sons; Deighton Bell & Co., 1894), 189-90.

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a grande maioria dos manuscritos aqui consultados, pertencem a um ambiente onde


ele estava na França. Tirando a Poliglota Complutense, o Códice Bezae, que estava
em Cambridge, e o minúsculo 398, quase todos os outros manuscritos são prove-
nientes da França, onde ele estava, o que significa que a partir da terceira edição de
Erasmo, Stephanus teve a chance de trabalhar com esse texto, considerando os ma-
nuscritos que tinha a sua disposição.

“O editor parisiense Robert Estienne (latim “Stephanus”; 1503–1559) imprimiu quatro


edições do texto grego de Erasmo em 1546, 1549, 1550 e 1551. A edição de 1550 foi
republicada muitas vezes e tornou-se a forma aceita do TR, especialmente na Ingla-
terra. A edição de 1551 foi a primeira a incluir a numeração dos versículos no Novo
Testamento.”46

“A quarta edição de Stephanus (Genebra, 1551), que contém duas versões latinas (a
Vulgata e a de Erasmo), é digna de nota porque nela, pela primeira vez, o texto do Novo
Testamento foi dividido em versos numerados.”47

B. Teodoro Beza (1556): O mesmo vai acontecer com Teodore Beza. “Teodoro Beza,
o amigo e sucessor de Calvino em Genebra e um eminente erudito clássico e bíblico,

46 Elliot Ritzema and S. Michael Kraeger, “Textus Receptus,” ed. John D. Barry et al., The Lexham Bible Dictionary (Bellingham, WA: Lexham
Press, 2016).
47 Bruce Manning Metzger, United Bible Societies, A Textual Commentary on the Greek New Testament, Second Edition a Companion Volu-
me to the United Bible Societies’ Greek New Testament (4th Rev. Ed.) (London; New York: United Bible Societies, 1994), XXIII.

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publicou nada mesmo que nove edições do Novo Testamento Grego entre 1565 e 1604,
e uma edição póstuma em 1611 (…) Acompanhado por anotações e sua própria versão
do Latim, bem como a Vulgata Latina, essas edições contem uma boa dose de infor-
mações textuais retiradas de vários manuscritos que Beza teria pessoalmente colado,
bem como manuscritos colados por Henry Stephanus, filho de Robert Stephanus.”48

“Em 1556, Beza publicou uma tradução em latim anotada do Novo Testamento grego,
que apareceu em várias impressões. Em suas Annotationes, Beza implementou as su-
gestões de Desiderius Erasmo sobre as abordagens críticas e comparativas de leituras
textuais variantes. Embora tenha sido atacado por emendar o texto em apoio à sua
própria agenda dogmática, seus instintos textuais eram bastante conservadores. (As
ênfases teológicas reformadas aparecem em suas Annotationes e em suas traduções
latinas, como uma doutrina reformada da eleição nas notas de Beza sobre tous sōzō-
menous em Atos 2:47.) Em 1565 Henri Estienne publicou a célebre edição de Beza do
Novo Testamento grego (incluindo a tradução anotada da Vulgata e do latim de Beza),
que estabeleceu sua reputação como o principal crítico bíblico de sua geração.”49

C. Irmãos Elzevir: (1633): Aqui, nós encontramos a origem do texto recebido, o texto
recebido que é tão aclamado entre aqueles que defendem a Almeida Corrigida e Fiel,
tem a origem no trabalho de Erasmo de Rotterdam, Stephanus e Beza, particularmente.
Elzevir eles publicam, eles adicionam, mas fazem poucas alterações no texto. O que
chama atenção é que todos esses acadêmicos e eruditos que trabalham com esse
texto, eles não têm condições de ter acesso aos documentos do Novo Testamento
como nós temos. Disse que Erasmo de Rotterdam, por exemplo, teria conhecido va-
ticanos, mas a verdade é que as suas cartas atestam o fato de que ele tinha conheci-
mento de algumas variações textuais presentes neste códice que lhe foi apresentado
pelo bispo curador do Vaticano. Desse texto que ele recebe, ele usa apenas uma des-
sas como indicações no texto de Atos, e não faz nenhuma outra menção.

Os grandes unciais não haviam sido descobertos, os papiros não haviam sido desco-
bertos, a teoria não havia sido desenvolvida. O que nós temos é o início do processo
de crítica textual baseada nos estudos dos manuscritos, feito por homens compe-
tentes que observaram os manuscritos que tinham a sua disposição e produziram o
melhor texto que eles tinham. Era essencialmente um texto tardio. Apesar do Códice
Bezae ser do quinto século, grande parte do material usado ele era do século XII e XIII.

48 Bart Ehrman and Bruce Manning Metzger, The Text of the New Testament: Its Transmission Corruption and Restoration (New Yourk, NY:
Oxford, 2005), 151.
49 Donald K. McKim, Historical Handbook of Major Biblical Interpreters (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 1998), 153–154.

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Sem dúvida, o melhor texto possível diante das evidências disponíveis, mas longe de
ser uma versão inspirada, como sugerem alguns dos seus defensores.

D. Textus Receptus: “Numerosas edições sucederam a essas duas primeiras [edições


de Erasmo], incluindo as notáveis de Robert Estienne, também conhecido como Ste-
phanus (quatro edições, 1546-1551); Theodore Beza (nove edições, 1565–1604); e os
irmãos Elzevir (sete edições, 1624-78), cuja segunda edição de 1633 contém a famosa
frase Textus Receptus em sua declaração no prefácio.”50 “Foram sete edições publicadas
pelos irmãos Elzevier em Leyden e Amsterdam entre 1624 e 1678. Elas são baseadas na
obra de Beza e de Stephanus e têm pouco valor crítico, pois são muito semelhantes. Mas
a segunda edição do ano de 1633 contém no prefácio as palavras “Textum ergo habes
nunc ab omnibus receptum”, e assim obtemos a frase Textus Receptus.”51

2 | Texto Essencialmente Tardio: “Embora o texto grego do Novo Testamento de Eras-


mo tenha sido uma contribuição marcante para o estudo do texto grego do Novo Testa-
mento, seu trabalho teve valor limitado para estabelecer a forma mais antiga do texto,
uma vez que ele teve acesso a apenas alguns manuscritos recentes. Muitos manuscri-
tos anteriores do NT vieram à luz nos séculos após a publicação do Textus Receptus.
A era moderna tem sido uma época de coleta e estudo de milhares de manuscritos,
observando suas semelhanças e variações.”52

“O Textus Receptus não é o texto recebido no sentido de que foi recebido de Deus em
oposição a outros manuscritos gregos. Em vez disso, é o texto recebido no sentido de que
era o padrão na época dos irmãos Elzevir. No entanto, a base textual do TR é um peque-
no número de manuscritos minúsculos coletados aleatoriamente e relativamente tardios.
Em cerca de uma dúzia de lugares sua leitura é atestada por nenhuma testemunha de
manuscrito grego conhecido.”53

“O texto que ele editou não era, no entanto, igual em qualidade aos seus métodos, em
grande parte por causa dos recursos manuscritos severamente limitados com os quais
ele teve que trabalhar. Consequentemente, seu texto acabou representando na forma im-
pressa de uma forma tardia e corrompida do tipo-texto Bizantino.”54

50 Eldon Jay Epp, “Textual Criticism: New Testament,” ed. David Noel Freedman, The Anchor Yale Bible Dictionary (New York: Doubleday,
1992), 427–428.
51 A. T. Robertson, An Introduction to the Textual Criticism of the New Testament (Nashville, TN: Broadman Press, 1925), 20.
52 Amy Anderson and Wendy Widder, Textual Criticism of the Bible, ed. Douglas Mangum, Revised Edition., vol. 1, Lexham Methods Series
(Bellingham, WA: Lexham Press, 2018), 119.
53 D. A. Carson, The King James Version Debate: A Plea for Realism (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1979), 36.
54 Michael Holmes, “Textual Criticism” in David Alan Black and David S. Dockery, Interpreting the New Testament: Essays on Methods and
Issues (Nashville, TN: Broadman & Holman Publishers, 2001), 52.

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3 | Melhor Texto Possível: “Deve-se afirmar desde já que o Textus Receptus não é um texto
ruim. Não é um texto herético. É substancialmente correto. Hort expôs bem a questão: ‘Com
relação à grande maioria das palavras do Novo Testamento, como da maioria dos outros
escritos antigos, não há variação ou outro fundamento de dúvida e, portanto, não há espaço
para crítica textual’. Hort continua: ‘A proporção de palavras virtualmente aceitas por todas
as mãos como levantadas acima de qualquer dúvida é muito grande; não menos, em um
cálculo aproximado, do que sete oitavos do total. O oitavo restante, portanto, formado em
grande parte por mudanças de ordem e outras trivialidades comparativas, constitui toda
a área de crítica.’ É claro, portanto, que o Textus Receptus preservou para nós um texto
substancialmente preciso, apesar dos longos séculos que antecederam a era da impressão,
quando copiar à mão era o único método de reproduzir o Novo Testamento.”

“Mas o caso é ainda melhor do que esta apresentação, pois Hort conclui: ‘Reconhecendo
plenamente o dever de abstinência de decisão peremptória nos casos em que a prova deixa
o julgamento em suspenso entre duas ou mais leituras, descobrimos que, pondo de lado as
diferenças de ortografia, as palavras em nossa opinião ainda sujeitas a dúvida constituem
apenas cerca de um sexagésimo de todo o Novo Testamento. Na segunda estimativa, a pro-
porção de variações comparativamente triviais é além da medida maior do que na primeira;
de modo que a quantidade do que pode em qualquer sentido ser chamado de variação
substancial é apenas uma pequena fração de toda a variação residual, e dificilmente pode
formar mais do que uma milésima parte de todo o texto.’ O verdadeiro conflito na crítica
textual do Novo Testamento diz respeito a esta milésima parte de todo o texto.”55

4 | Texto sem Inspiração: Para algumas pessoas, o texto original é o texto recebido pela
igreja, e não o texto escrito pelos apóstolos. O texto recebido pela igreja torna-se, então,
a mais importante fonte para o testemunho do texto dos apóstolos.

A. Suposição de Exclusividade: “Deus não escreveu uma centena de Bíblias; existe


apenas uma Bíblia; as outras, na melhor das hipóteses, são apenas aproximações
dela. Em outras palavras, o Novo Testamento grego de Erasmo, conhecido como o
Texto Recebido, não é nenhum outro senão o Novo Testamento grego que suportou
e venceu a ira dos seus inimigos pagãos e papais”56

“Através do seu estudo dos escritos e Jerônimo e dos Pais da Igreja, Erasmo tornou-se
muito bem informado sobre as leituras variantes do texto do Novo Testamento. De fato,

55 A. T. Robertson, An Introduction to the Textual Criticism of the New Testament (Nashville, TN: Broadman Press, 1925), 21–22.
56 Benjamin G. Wilkson, “Our Authorized Bible Vindicated” in David Ottis Fuller, Which Bible? (Grand Rapids: MI, International Publi-
cations).

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todas as leituras variantes mais importantes hoje conhecidas pelos eruditos já eram co-
nhecidas de Erasmo, há mais de 460 anos atrás, e discutidas nas notas (previamente
preparadas) que ele colocou em suas edições do Texto Grego do Novo Testamento.”57

“Chame este texto como de Erasmo, ou Complutense, ou de Estienne, ou de Beza, ou de


Elzevir; chame-o de Texto Recebido, ou Texto Tradicional, ou de qualquer outro nome que
você queira – o fato permanece que o texto tem chegado até nós e que ele é atestado
pelo consenso geral das antigas cópias, dos antigos pais, e das antigas versões”58

B. Importante mas não inspirado: “O TR foi a base de todas as principais traduções


protestantes europeias anteriores a 1881, incluindo especialmente a King James de
1611, e injustificadamente dominou o cenário acadêmico por mais de trezentos anos.
Na verdade, tão supersticiosa tem sido a reverência concedida ao Textus Receptus
que, em alguns casos, as tentativas de criticá-lo ou emendá-lo foram consideradas se-
melhantes a um sacrilégio e aqueles que ousaram mudar o TR foram veementemente
atacados como hereges. Como resultado, os estudiosos tendiam a relegar as novas
descobertas de manuscritos ou avanços na metodologia nas margens, no aparato crí-
tico ou em longos apêndices de suas edições do TR, e é aqui que devemos procurar
sinais de progresso além de Erasmo.”59

“Essa teoria está sendo apresentada na literatura popular a pastores e leigos em todos
os lugares, muitos dos quais nunca leram uma refutação no mesmo nível e que não
estão equipados para fazer o trabalho mais avançado que demonstra que a teoria é
falsa. Além disso, porque os defensores da TR associam esta teoria com uma visão
elevada das Escrituras, companheiros evangélicos com uma visão igualmente elevada
das Escrituras freqüentemente ficam um pouco nervosos em falar abertamente, por
medo de serem suspeitos por seus pares.”60

57 Edward F. Hills, The King James Version Defended (The Christian Research Press, 1997), 198-99.
58 John William Burgon, The Revision Revised (New York:NY, Dover Publication, 1971), 269.
59 Michael Holmes, “Textual Criticism” in David Alan Black and David S. Dockery, Interpreting the New Testament: Essays on Methods
and Issues (Nashville, TN: Broadman & Holman Publishers, 2001), 53.
60 D. A. Carson, The King James Version Debate: A Plea for Realism (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1979), 42.

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IV. Texto Majoritário


“O texto do Novo Testamento grego foi transmitido, preservado e mantido pelo fiel trabalho
dos escribas desde o tempo dos autógrafos até os dias atuais. Embora a maior parte do texto
encontrado em todos os manuscritos reflita um alto grau de uniformidade textual, essa unifor-
midade aumenta significativamente quando um texto de consenso é estabelecido a partir de
manuscritos que abrangem todo o período de transmissão manual. Este texto de consenso
reflete um domínio unificado que permeia a grande maioria dos manuscritos. Os editores desig-
naram essa linha dominante de transmissão de ‘forma de texto Bizantino’.”

“Embora o cuidado geral do copista e a preocupação com a exatidão tenham prevalecido du-
rante o processo de cópia, nenhum manuscrito ou exemplar intermediário pode ser reivindicado
com certeza para refletir o autógrafo preciso. Várias falhas humanas ocorreram naturalmente
durante a era da cópia manuscrita de documentos; essas falhas aparecem entre os manuscri-
tos em vários graus, assumindo a forma de erro do escriba ou alteração intencional. A tradição
do manuscrito deve ser considerada em sua totalidade, levando-se em consideração os fatores
de transmissão que permitiram o surgimento de tal variação.”

“O texto dominante dessa tradição dos escribas é considerado pelos editores como o que re-
flete mais de perto o que foi originalmente revelado por Deus por meio dos autores humanos
do Novo Testamento. A presente edição, portanto, exibe esse texto consensual dominante con-
forme aparece em todo o Novo Testamento grego. Este volume de forma de texto Bizantino é
oferecido como uma representação precisa do texto canônico do Novo Testamento, a palavra
escrita de Deus de acordo com o grego original”61

Texto majoritário não é derivado do textus receptus, mas é uma teoria muito próximo. O texto
é muito próximo e a fonte por trás do texto é muito parecida. No entanto, o método é comple-
tamente diferente, e cabe aqui, essa divisão. Boa parte dos críticos textuais não conseguem
identificar a diferença entre defensores do texto recebido e do texto majoritário. Até mesmo
bons acadêmicos da área da crítica textual e teólogos, não conseguem entender as diferen-
tes nuances entre aqueles que defendem o texto recebido pela igreja no texto dos irmãos
Elzevier de 1633, e a teoria do texto Bizantino, que é uma coisa completamente diferente.

1 | Teoria Recente: Teoria do texto majoritário ou o texto Bizantino, é uma teoria ex-
tremamente recente. Quando Westcott-Hort publicam em 1881 o Novo Testamento
no idioma original, eles levantam um incômodo em uma série de pessoas que tem no
texto tradicional, o texto recebido, a referência do texto histórico.

61 William Pierpont and Maurice Robinson, The New Testament in the Original Greek: Byzantine Textform 2005, with Morphology.
(Bellingham, WA: Logos Bible Software, 2006), I.

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A. John Burgon: Da mesma maneira que Erasmo recebeu oposição dos tradiciona-
listas, Westcott-Hort vão receber também dos tradicionalistas dos seus dias, John
Burgon, em especial. Ele publica um livro A Revisão Revisada, fazendo uma crítica da
versão revisada em inglês, que usava agora o texto de Westcott-Hort, não mais o tex-
to recebido como texto para o inglês. Ele publica um livro que se torna uma referência
nos ataques ao texto de Westcott-Hort. Depois de sua morte, apesar de não se ouvir
mais defesas desse texto, nós só vamos encontrar defensores do texto majoritário
muitos anos depois.

1881: Westcott and Hort publicam The New Testament in the Original Greek e de-
fendem a inferioridade e a natureza tardia do texto Sírio (Bizantino). Provocam uma
reação entre os defensores do texto tradicional, dos quais John Burgon torna-se um
dos principais opositores.

1883: John Burgon publica o livro Revision Revised a partir de 3 artigos anteriormente
publicados no Quarterly Review e torna-se uma obra referência para adeptos do Texto
Tradicional. Argumento Baseado na inspiração verbal e plenária e na preservação
providência, Burgon defendia que o texto original havia sido preservado por Deus em
todas as eras e que hereges são responsáveis pela corrupção do texto. desse modo,
a única fonte confiável da verdade divina seria o texto encontrado na maioria dos
manuscritos. Burgon também defendeu que os manuscritos Bizantinos anteriores ao
4o. Sec se desgastaram e, portanto, não podem ser encontrados. Também defendeu
que argumentos baseados em evidência interna não são aceitáveis, pois o texto é
definido pela “evidência objetiva” da quantidade de manuscritos.

1888: Após a morte de Burgon, ninguém defendeu a causa do texto tradicional até
1961. Frederic Scrivener (1831-1891) e Herman Hoskier (1864-1938) podem ser in-
cluídos como opositores da proposta de Westcott-Hort, mas nenhum deles poderia
ser contato entre os defensores da teoria de Burgon.

B. Zane Hodges: É na década de 60, no século passado, que nós vamos encontrar uma
organização de uma teoria, que embora não tenha sido definida por John Burgon, foi a
uma teoria que tinha em comum com Burgon a sua insatisfação com o texto publicado
por Westcott-Hort e com o texto crítico de edições que o sucederam. Na década de 60,
Hodges começa a escrever em larga escala em defesa do texto majoritário.

1961: Publica o artigo “The Ecclesiastical Text of Revelation” e inicia a fase mais re-
cente da defesa do texto Bizantino.

1962: Publica o artigo “The Critical Text and the Alexandrian Family of Revelation”,
uma crítica à família Alexandrina no texto de apocalipse.

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1969: Publica o artigo “The Greek Text of the King James Version “ e inicia um vívido
debate com Gordon Fee sobre a metodologia da crítica textual.

1982: Com Arthur Farstad e Zane Hodges publica o Greek New Testament according
to the Majority Text, a primeira edição impressa do TM. Essa edição era fundamen-
talmente norteada pelo trabalho de von Soden e baseada em edições impressas ape-
nas. Apesar de representar o texto Bizantino, do qual o TR é derivado, essa edição do
GNT tem 1838 diferenças textuais com o TR.

“O Texto Majoritário é um texto que adota a evidência disponível de todo o espectro


de manuscritos sobreviventes, ao invés de se apoiar principalmente na evidência de
alguns deles. Nós acreditamos que não é científico ignorar praticamente oitenta a no-
venta porcento da evidência em qualquer disciplina.”62

“Os editores desse texto não imaginam que o texto dessa edição representa em todos
os particulares a exata forma dos originais. Ainda que certeza textual seja desejável,
muito mais trabalho é necessário antes que o mesmo seja alcançado. Deve-se manter
em mente que a presente obra, The Greek New Testament According to the Majority
Text, é ao mesmo tempo preliminar e provisório. Ela representa o primeiro passo na
direção do reconhecimento do valor e da autoridade da grande massa de documentos
gregos sobreviventes. O uso desses documentos nessa edição deve ser objeto de es-
crutínio e investigação por acadêmicos competentes. Tal escrutínio, se devidamente
empregado, pode resultar no desenvolvimento do progresso em direção a um Novo
Testamento Grego que mais adequadamente reflete o autógrafo inspirado”63

C. Jacob van Bruggen: Em 1976 van Bruggen publica o The Ancient Text of the New
Testament,64 e defende veementemente a teoria do texto majoritário. Esse livro é pro-
vavelmente a melhor defesa da teoria até a publicação da defesa do mesmo método
publicada por Maurice Robinson.

D. Wilburn Pickering:65 Em 1977, Wilbum Pickering vai escrever A Identidade do Tex-


to do Novo Testamento, que é o texto que nós encontramos em português, e o texto
mais lido sobre crítica textual em português. Qualquer pessoa que tenha feito qual-
quer estudo sobre crítica textual passou por esse livro. Esse foi o segundo livro sobre

62 Arthur Farstad and Zane Hodges, Greek New Testament according to the Majority Text. (Nashville,TN: Thomas Nelson, 1982), V.
63 Idem, p.x.
64 Jakob van Bruggen, The Ancient Text of the New Testament (Premier Printing, 1976).
65 Addendum: Atualmente, Pickering não defende mais o TM, antes uma forma minoritária do mesmo, chamada f35. Novos livros e artigos
foram escritos e publicados pelo autor que os mantém no seu próprio site.

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crítica textual que eu li na minha vida. Eu li basicamente de capa a capa. Esse foi um
livro que foi muito influente no Brasil, embora não tenha conseguido grandes defen-
sores fora daqui.

Com boas críticas à teoria de WH, ele interage pouco com a evidência primária e basica-
mente reproduz os argumentos de John Burgon. Seus próprios testes da verdade que
ele oferece, são basicamente, a ressurreição dos argumentos oferecidos por Burgon,
que foi em larga escala, a grande influência por trás dos escritos do Wilbum Pickering.66

E. Harry A. Sturz: Em 1984 Sturz publica o livro The Byzantine Text-Type and New
Testament Textual Criticism, no qual defendeu a antiguidade do texto Bizantino a
partir de comparações do mesmo com os papiros.

Pontos Positivos: Rejeitou a pressuposição de que a providência Divina favoreça a


preservação do texto do NT na maioria dos manuscritos. Sugeriu que os tipos-textos
Ocidental, Alexandrino e Bizantino eram todos frutos de recessão no segundo século.

Pontos Questionáveis: Defendeu a antiguidade da tradição Bizantina por demonstrar


150 leituras Bizantinas nos papiros. Essa defensa, entretanto, tinha três problemas:
(1) Vários dos exemplos usados não eram bizantinos e tinham suporte em outros
tipos textos; (2) Sturz falhou em diferenciar uma leitura tipicamente bizantina com o
tipo texto Bizantino; (3) Sturz também falhou em demonstrar se a concordância entre
das leituras eram acidentais ou genealógicas. Como resultado disso, apenas 8 das
150 leituras apresentadas eram significativas para a genealogia do texto. Dessas 8,
apenas duas eram exclusivamente bizantinas.

Diferença Importante: Harry Sturz não era um adepto da Teoria do Texto Majoritário,
mas era defensor de um tipo de maioria de tipos-textos. Ou seja, uma leitura tem a
maior probabilidade de representar o texto original se tiver suporte na maioria dos
tipos-textos (e não na maioria dos manuscritos).

F. William Pierpont e Maurice Robinson: Em 1981 publicam a primeira edição The


New Testament in the Original Greek according to the Byzantine/Majority Textform.
Essa publicação foi uma reação ao texto de Hodges-Farstad. Esse texto já foi revisa-
do outras duas vezes (2005 e 2018). A edição de 2005 discorda do texto de Hodges-
-Farstad 2492x em questões ortográficas e apresenta 330 leituras distintas. Nesta
edição, os editores fizeram amplo uso de evidência manuscrita:

66 Considere o título de sua dissertação de mestrado: “An evaluation of the contribution of John William Burgon to New Testament Textual
Criticism” (Th.M. thesis, Dallas Theological Seminary, 1968).

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“O texto grego bizantino recém-editado apresentado nesta edição difere ligeiramente das
versões anteriores. Todas as leituras foram cuidadosamente reexaminadas, com algu-
mas alterações feitas no texto principal após nova reavaliação. Vários erros tipográficos
foram corrigidos e a ortografia foi padronizada por toda parte. A teoria subjacente foi re-
visada à luz de novos conhecimentos baseados em extensa pesquisa de comparação.”67

G. Perfil dos Defensores do Texto Majoritário: A teoria do Texto Majoritário é uma te-
oria recente que em grande parte é produzida nos Estados Unidos. Tem alguns defen-
sores, como von Bruggen na Europa,68 mas não encontrou tantos defensores assim
na sua história. Quando consideramos os principais defensores da teoria do Texto
Majoritário, nota-se que todos os seus adeptos são conservadores, seja em sua teo-
logia ou método. No que se refere à teologia, todos subscrevem a alguma variação do
fundamentalismo. Já na metodologia, pouco desenvolvimento desde Burgon é per-
cebido (com a possível exceção do desenvolvimento recente com Maurice Robinson).

Além disso, o principal elo entre os defensores do TM é alguma variação da doutrina


da inspiração associada à preservação providencial do texto por Deus, embora exis-
tam diferenças nos modelos de preservação (e.g. na maioria dos manuscritos; vs. na
investigação da maioria dos manuscritos). Por fim, nota-se que a grande maioria dos
defensores dessa teoria não são críticos textuais.

“Apenas uma pequena parte de críticos textuais autênticos estão dentro do campo tradi-
cional. Burgon merece esse prêmio. Hodges, Wisselink, van Bruggen, Robinson e Paul An-
derson também pertencem a este lugar. Hills é o único defensor da TR que se qualifica.
Assim, o movimento TM não é um movimento entre críticos textuais, mas um movimento
popular dentro de círculos conservadores apoiado por um estudioso ocasional.”69

2 | Texto Majoritário não é o Texto Recebido: A teoria do texto majoritário não pode ser
confundida com o texto recebido, e isso fica muito claro William Pierpont and Maurice
Robinson escrevem a sua abertura do texto Bizantino da sua edição. Eles descrevem
que esse texto tem mais de 1800 diferenças com o texto recebido. Esse é um texto mui-
to similar, 1.2% de variação, se você contar a diferença entre o Bizantino e o Receptus,
mas é uma teoria completamente diferente.

67 William Pierpont and Maurice Robinson, The New Testament in the Original Greek: Byzantine Textform 2005, with Morphology.
(Bellingham, WA: Logos Bible Software, 2006), II.
68 Para defensores Brasileiros, considere, Paulo Anglada, Manuscritologia do Novo Testamento. Knox, 2014.
69 Daniel Wallace, “The Majority Text Theory: History, Methods, and Critique” in Bart D. Ehrman and Michael Holmes, The Text of the
New Testament in Contemporary Research - Essays on the Status Quaestionis. 2nd Edition (Leiden: Brill, 2013), 723.

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CRÍTICA TEXTUAL

“As primeiras edições do Textus Receptus assemelham-se diretamente com o tipo texto
Bizantino, mas frequentemente diverge dele em ocasiões significativas. Nessas edições
o texto deriva primeiramente de uma pequena e limitada seleção de manuscritos tardios,
como os utilizados por Erasmo, Ximenes ou seus sucessores imediatos. O texto dessas
edições impressas difere do texto Bizantino em mais de 1800 ocasiões, geralmente em
função da inclusão de leituras não bizantinas mal atestadas.”70

3 | Três Diferentes Teorias: A teoria por trás do texto majoritário é defendida por três
diferentes grupos.

A. Teoria Mista: O primeiro grupo, nós vamos chamar de um grupo que defende uma
interação mista no processo de avaliação de manuscritos. Eles vão usar a leitura que
consiste na maioria dos manuscritos, mas vão defender que a decisão final da valida-
de daquela leitura variante precisa ser reconstruída a partir da história da transmissão
do texto. De uma maneira muito interessante, a maioria desses autores defendem a
leitura, mas que ela não pode ser o único critério usado para isso. O conhecimento da
história da transmissão do texto precisa ser considerado também.

Defensores: Arthur Farstad e Zane Hodges

Proposta:
1. Uma leitura atestada na maioria dosmanuscrito é mais provavelmente original do
que as outras;
2. Decisão final depende da reconstrução da história do texto;
3. O resultado é um método no qual as duas premissas centrais estão em conflito.

“Qualquer leitura atestada de forma esmagadora pela tradição do manuscrito tem mais
probabilidade de ser original do que seu (s) rival (is). Esta observação surge da própria
natureza da transmissão do manuscrito. Em qualquer tradição em que não haja gran-
des rupturas na história de transmissão, a leitura individual que tem o início mais antigo
é a que tem mais probabilidade de sobreviver na maioria dos documentos. E a primeira
leitura de todas é a original. (...) A decisão final sobre as leituras deve ser feita com
base na reconstrução de sua história na tradição manuscrita. Isso significa que para
cada livro do Novo Testamento, um genealogia de manuscritos deve ser construído”

70 William Pierpont and Maurice Robinson, The New Testament in the Original Greek: Byzantine Textform 2005, with Morphology.
(Bellingham, WA: Logos Bible Software, 2006), I.

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B. Exclusividade: Existe um segundo grupo que pode ser é definido como os exclu-
sivistas. Os exclusivistas seriam defendem a exclusividade do texto Bizantino como
descrição do texto original. Para eles, somente a maioria pode ser considerada como
descrição do texto majoritário.

Defensores: Wilburn Pickering, William Pierpont e Maurice Robinson

Proposta:
1. Defendem a exclusividade do texto Bizantino e seguem a maioria a todo custo
2. Divergem, entretanto no ponto de partida
• Pierpont-Robinson seguem a maioria (Kx de von Soden)
• Pickering favorece o grupo Kr de von Soden (que ele chama f35)
• Resultado são 1186 diferenças entre os textos

“A forma de texto Bizantina preserva com uma consistência geral o tipo de texto do
Novo Testamento que dominou o mundo de língua grega. Esse domínio existiu pelo
menos desde o século IV até a invenção da imprensa no século XVI. De acordo com
a teoria atual, presume-se que este texto nos séculos anteriores ao quarto tenha do-
minado a principal região de língua grega do Império Romano (sul da Itália, Grécia e
Ásia Menor) - uma região grande e diversa dentro da qual manuscrito, versional , e a
evidência patrística está faltando durante a era pré-quarto século, embora seja a região
primária do domínio da forma de texto bizantina nos séculos subsequentes. Do ponto
de vista da transmissão, espera-se que um único formato de texto predomine entre a
vasta maioria dos manuscritos na ausência de mudanças radicais e bem documenta-
das na tradição do manuscrito” 71

C. Prioridade: Existem aqueles que são mais cautelosos seguindo a linha de van
Bruggen, vão defender a prioridade do texto Bizantino. O texto Bizantino era o pri-
meiro, e existem explicações do porquê ele não é mais, mas eles aceitam a ideia de
conflações no texto Bizantino, harmonizações, e entendem que existem processos
de edição no texto Bizantino, e eles lidam melhor com a evidência.

Defensor: Jakob van Bruggen

Proposta:
1. Defendem a Prioridade do texto Bizantino, não sua exclusividade

71 William Pierpont and Maurice Robinson, The New Testament in the Original Greek: Byzantine Textform 2005, with Morphology.
(Bellingham, WA: Logos Bible Software, 2006), V.

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2. Não argumenta contra a Tradição Bizantina


3. Aceita harmonizações e corrupções na tradição Bizantina

“O fato de o texto Bizantino já ser usado no século 4 como um texto normal prova
que ele deve ser de uma data anterior e não foi considerado ‘novo’. Se este texto não
for seguido distintamente pelos Pais Egípcios e, ao mesmo tempo, for encontrado
nos primeiros escritos sobreviventes de Antioquia e arredores, então temos todas
as razões para supor que nossa visão sobre a história textual mais antiga mudaria
consideravelmente se soubéssemos mais sobre o espaço em branco que sobrou no
mapa histórico: Antioquia antes do século IV. Isso não é tão estranho. Antioquia foi
a primeira igreja a enviar missionários aos pagãos e foi a base a partir da qual Paulo
e Barnabé trabalharam. Como tal, é uma das primeiras igrejas a respeito da qual po-
demos supor que possuía arquivos antigos com as primeiras cópias de Evangelhos
e para as Epístolas.”72

4 | Fundamento Teológico: Esses três grupos têm opiniões diferentes sobre como o
método funciona, mas eles defendem basicamente, aquilo que nós chamaríamos de
texto majoritário. São duas as premissas fundamentais da Teoria do Texto Majoritário:

A. Argumento Teológico à Priori: O fundamento do texto majoritário da teoria do tex-


to majoritário, é completamente teológico. Não existe nenhum outro ponto de partida
se não a inspiração e preservação do texto. O raciocínio é mais ou menos assim: a
Escritura, o texto inspirado por Deus é o texto preservado na tradição bizantina. Esse
é o argumento muitas vezes apresentado. Essa é em alguns casos a exata descrição
daquilo que se acredita. Teodore Letis diz o seguinte:

“Ao revisar as propostas de defesa do Texto Majoritário, uma consideração dominante


emerge: um compromisso prévio com o que a Bíblia tem a dizer mesma com respeito
à inspiração e a preservação. Para os defensores do Texto Majoritário, essa é uma
consideração exaustiva à qual tudo o mais deve estar subordinado.”73

Ou como diz Wilburn Pickering, em sua tese de mestrado, An Evaluation of the Contri-
buition of John William Burgon to New Testament Textual Cristicism

“A doutrina da Preservação Divina do texto do Novo Testamento depende da

72 Jakob van Bruggen, The Ancient Text of the New Testament. (Premier Printing, 1976), 14-15.
73 Theodore Letis, The Majority Text: Essays and Reviews in the Continuing Debate. (Fort Wayne: Institute for Biblical Textual Studies,
1987), 192.

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interpretação da evidência que reconhece o Texto Tradicional como continuação do


texto autógrafo.”74

A preservação divina mantém o texto inspirado na tradição tradicional no texto Bizan-


tino, e essa associação entre inspiração e o texto Bizantino, é o fundamento dessa
teoria. É muito interessante que eles não defendem isso baseado naquilo que se
sabe, ou naquilo que as evidências dizem, eles defendem isso baseado naquilo que
eles gostariam que Deus tivesse feito e fazem essa associação entre o texto Bizan-
tino e a inspiração, de um modo que é impossível de se verificar de maneira objetiva,
empírica ou lógica.

Não existe qualquer evidência no texto da Escritura de que a maioria dos manuscritos
seria um modo como Deus preservaria esse texto. Sim, o texto é inspirado, sim ele
dura para sempre, mas o modo como isso seria feito não é descrito no texto apos-
tólico. Não tem nenhum lugar. Seja na exegese, seja na teologia das Escrituras, que
tenha de qualquer maneira uma relação entre essas duas coisas. Esse é o principal
calcanhar de Aquiles dessa teoria. Ela parte de um pressuposto inverificável que pre-
cisa ser presumido para que a análise das evidências seja, então, realizada.

B. Texto Original está na Maioria: Quando você estabelece que o texto inspirado foi
preservado na tradição bizantina, a resposta está basicamente dada. Todo o trabalho
a da crítica textual, de toda a investigação, na verdade vai ser uma mera confirmação
do pressuposto já definido. Mesmo van Bruggen, comete essa falácia metodológica:

“Há, portanto, todos os motivos para reabilitar o texto da Igreja novamente. Já foi acei-
to por séculos e séculos pela Igreja Grega como o texto antigo e correto. Seu direito
não precisa ser comprovado. A pessoa que pensa que sabe mais do que aqueles que
preservaram e transmitiram o texto no passado deve vir com a prova. As igrejas da
grande Reforma adotaram deliberadamente esse texto antigo quando tomaram o texto
grego novamente como ponto de partida87. Este texto merece ser reconhecido como
confiável, a menos que uma contraprova real possa ser dada a partir de um texto me-
lhor recuperado. No entanto, não existem textos melhores”75

C. Breves Objeções:
Sobre a Objetividade: Enquanto a preferência pela maioria é definida pela busca da
‘objetividade’ o fundamento da teoria é colocado sobre aquilo que se acredita que

74 Wilburn Pickering,“An Evaluation of the Contribution of John William Burgon to New Testament Textual Criticism” (Th.M. thesis,
Dallas Theological Seminary, 1968), 91.
75 Jakob van Bruggen, The Ancient Text of the New Testament. (Premier Printing, 1976), 24.

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Deus fez: isto é, que Deus preservou o texto na tradição Bizantina. Essa ‘suposição’
nada objetiva é que coordena toda a análise textual. Essa suposição tem três proble-
mas: (1) Não é possível verificar objetivamente se Deus preservou o texto na tradi-
ção Bizantina; (2) Não é possível verificar empiricamente se Deus preservou o texto
na tradição Bizantina; (3) Não é possível verificar logicamente se Deus preservou o
texto na tradição Bizantina. Esse argumento não demonstrável é apenas assumido
como verdadeiro, sem qualquer necessidade ou possibilidade de verificação (como
van Bruggen claramente sugere na citação acima).

Sobre a Definição da Maioria: A definição de maioria não é bem qualificada, afinal, o


texto Bizantino torna-se maioria apenas a partir do 9o. Sec. Além disso, existem mais
de 10.000 mss latinos, mas nenhum deles representa o texto grego Bizantino.

Sobre a Inspiração e Preservação: Falta de fundamento exegético para sua doutrina


da inspiração. Se a doutrina da Inspiração e Preservação é o fundamento da teoria,
como a escritura atesta a preferência divina pela maioria ou pela tradição Bizantina
ou pela preservação feita desse modo? Como a doutrina da Inspiração e Preservação
apresentada na escritura, desfavorece o testemunho antigo do texto? As principais
lacunas teológicas da teoria do Texto Majoritário são: (1) Fundamento exegético para
suas convicções teológicas sobre Inspiração e Preservação. Muita afirmação teológica
é oferecida, mas nenhum substrato exegético é apresentado. A doutrina da preserva-
ção é mais presumida que apresentada. A pressuposição do elo entre inspiração e
maioria dos manuscritos é o ponto mais frágil da teoria; (2) Aplicação desse mesmo
conceito teológico para o AT. Se a doutrina da preservação defendida pelo TM, como
evidência da inspiração, for assumida como verdadeira, então o Antigo Testamento
não poderá ser considerado inspirado; (3) Crítica Textual, como investigação histórica,
procura não por aquilo que é possível, mas por aquilo que é provável (ou demonstrável).

5 | A práxis do método é estatística: Diferente do que se pensa, a busca pelo texto majo-
ritário não é uma busca pelo texto original, mas por uma construção estatística do texto
possível e melhor preservado, naquilo que se entende ser na maioria das evidências.
Observe o que Arthur Farstad e Zane Hodges dizem no seu texto grego.

“Qualquer leitura atestada de modo inequivocamente majoritário pela tradição manuscri-


ta é mais provavelmente original do que as variantes rivais.”76

76 Jakob van Bruggen, Arthur Farstad and Zane Hodges, The Greek New Testament According to the Majority Text (Nashville: Thomas
Nelson, 1982), XI.

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Ou seja, qualquer vez que você encontrar um texto defendido pela maioria esmagadora
das evidências, ali você encontra ou tem maior probabilidade de encontrar o texto origi-
nal. Do mesmo livro, um pouco à frente, eles dizem:

“Qualquer tradição onde não existem grandes interrupções na história da transmissão, a


leitura individual que pertence ao mais antigo início [ou seja, a leitura mais antiga, mais ori-
ginal] é aquela que mais tem maior potencial de sobreviver na maioria dos manuscritos.”77

A Transmissão ou a teoria de Transmissão do texto, é que, o texto original sempre está


com a maioria. Zane Hodges, vai dizer o seguinte:

“A tradição do manuscrito de um livro antigo irá, sob qualquer condição, exceto as mais
excelentes, se multiplicar de tal forma regular em razoável com o resultado de que as có-
pias mais próximas do autógrafo normalmente terão o maior número de descendentes.”

Esse cenário hipotético desenhado pelos defensores do texto majoritário, é que quanto
mais se copia um texto, mais correto ele fica. Quanto mais cópias nós fazemos de um
determinado texto, mais parecido com o original ele fica. Nós não precisamos ter cópias
qualificadas, nós precisamos ter quantidades de cópias, porque quanto mais copiada,
mais parecido com o original ela vai ficar. O que é exatamente o oposto do que nós ve-
mos na história da transmissão do texto, tal como demonstrado pelas evidências.

Para defender sua teoria, eles vão defender isso a partir de probabilidades matemáti-
cas. Zane Hodges vai construir com seu irmão David Hodges, o modelo estatístico para
avaliação de leituras para o qual eles vão demonstrar que essas probabilidades, que a
sua teoria ela é defensável a partir de probabilidades matemáticas. Invés de estudar a
evidência do texto tal como a tradição a tradição de Transmissão do texto acontece, Ho-
dges prefere produzir um cenário hipotético, e a partir dele, propor um estudo de proba-
bilidade matemática para dar suporte a esse cenário hipotético, que é distinto daquele
que nós encontramos na tradição manuscrita:

“Este argumento não é simplesmente tirado do nada. O que está envolvido pode ser dito
de variadas formas em termos de probabilidades matemáticas”78

De acordo com os defensores do Texto Majoritário79 esse tipo de análise torna a Crítica
Textual mais objetiva. Baseado nisso, Russel Hills afirma:

77 Idem, p.XXVII.
78 Zane Hodges and David M. Hodges, “The Implications of Statistical Probability for Text History” (Material não publicado).
79 Russell Hills, “A Defense of the Majority Text.” Ph.D. diss., (California Graduate School of Theology, 1985), 113.

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“O TM requer muito menos decisões textuais por parte do crítico individual e, portanto,
menos subjetividade e menos dependência da razão humana”

Esse é um ponto muito importante para os defensores do texto majoritário. De acordo


com seus defensores, nós precisamos evitar critérios subjetivos para se definir o texto
verdadeiro. Nós precisamos de critérios objetivos, e a matemática funciona como crité-
rio mais objetivo de todos. É a maioria dos manuscritos associadas ao modelo probabi-
lístico estatísticos, que define que a maioria dos manuscritos é onde nós temos a maior
probabilidade de encontrar o texto original. Wilbum Pickering vai dizer que

“A deficiência básica, tanto fundamental como séria, de qualquer caracterização baseada


em critérios subjetivos, é que o resultado é minha opinião: não pode ser verificado objeti-
vamente. Será que não existe nenhuma maneira melhor para identificar [o texto] a redação
original do Novo Testamento?”80

Será que nós não temos nenhum jeito mais objetivo de fazer isso? A resposta é: conte
os manuscritos, estabeleça um modelo estatístico de análise de evidência, e você vai
chegar lá. Por outro lado, Timothy Ralston, por outro lado, tomou o modelo probabilístico
de Zane Hodges e aplicou de fato. Ele disse o seguinte:

“O modelo estatístico de Hodges, que está no cerne da teoria do texto majoritário, exige
que um tipo de texto [e aqui é uma pressuposição que está por trás do processo estatís-
tico] se torne menos homogêneo ao longo do tempo à medida que o efeito cumulativo de
erros de escribas e emendas são transmitidas em gerações subsequentes de manuscri-
tos. Esse efeito é observado entre os manuscritos alexandrinos nesse estudo. No entanto,
o caso é o oposto com os manuscritos bizantinos, que se tornam mais homogêneos ao
longo do tempo, negando a pressuposição estatística de Hodges.”81

Em outras palavras, o próprio pressuposto da estatística é negado pelo estudo das evi-
dências. Esse é o problema da crítica textual defendida pelo texto majoritário. Ela não
lida com as evidências na sua história, nem com o seu contexto histórico, muito menos
com sua transmissão. Prefere-se ler números em uma página a frio e estabelecer uma
maneira de se contar qual é o texto que melhor se encaixa ao Novo Testamento.

80 Wilburn Pickering, Qual o Texto do Novo Testamento? (Material não publicado).


81 Timothy J. Ralston, “The ‘Majority Text’ and Byzantine Origins.” New Testament Studies 38 (Jan 1992): 133-34.

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Os trabalhos subsequentes no trabalho de doutorado de Timothy Ralston, nós vamos en-


contrar que o modelo Bizantino do texto majoritário, ele sequer defende de fato, um texto
Bizantino. Como vemos na imagem acima, a grande maioria dos manuscritos pertence
ao séc. XI em diante, e os manuscritos anteriores ao séc. XI que não fazem parte da maio-
ria, não são representados nesses textos. Então, quando nós vemos diferenças no texto
Bizantino dentro da própria tradição bizantina, e nós favorecemos a maioria das leituras
dentro dessa própria tradição, Ralston disse o seguinte: quando esses eventos aconte-
cem, textos posteriores ao séc. XI XII são usados em maior frequência que o contrário. Em
outras palavras, Ralston disse que o texto majoritário, tal como o impresso por Hodges,
descreve um texto do segundo milênio do cristianismo. Historicamente, edita-se um texto
que é posterior ao séc XI, muito embora, use evidências a partir do séc. V.

“A forma eclesiástica final do Texto Majoritário foi concretizada somente após o século VIII.
A trajetória resultante da tradição textual contradiz a hipótese do Texto Majoritário produzi-
da a partir do modelo estatístico teórico de produção de manuscritos [i.e. o modelo de Zane
Hodges]. Mais estudos de comparação são agora necessários para verificar essas observa-
ções iniciais. Também é hora de os proponentes sérios do Texto Majoritário reexaminar seu
modelo à luz das realidades impostas por tais agrupamentos de manuscritos”82

6 | Baseada na Suposição: Essa observação é muito importante porque se nós qui-


sermos chegar a forma mais antiga do texto, um texto original, certamente a forma

82 Timothy J. Ralston, “The ‘Majority Text’ and Byzantine Origins.” New Testament Studies 38 (Jan 1992): 136.

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mais tardia desse texto, provavelmente, não é o melhor caminho, exceto, se você supõe
que a maioria preserva o original, algo que a evidência não parece suportar. A defesa
do método, então, tem que ser baseada em suposição. Como é que nós vamos de-
fender que essa maioria de manuscrito que nós encontramos aqui na evidência não
seja encontrada na sua forma anterior antes do quarto século? Porque essa é a grande
pergunta. Se esse é um texto apostólico, porque antes do quarto século nós não encon-
tramos nesse texto apostólico, e é aqui que as suposições começam a ser mais impor-
tantes que as evidências.

Aqui nós encontramos o segundo calcanhar de Aquiles da teoria do peso majoritário.


Por um lado, eles dizem que a evidência manuscrita é extremamente importante na hora
de ser contabilizada, mas quando a ausência da evidência atesta contra a teoria, eles
abandonam a evidência conhecida, e supõem aquilo que não existe. Eles defendem e
argumentam a partir de um silêncio e de suposições que não podem ser comprovadas.
Por exemplo, qual é a mais conhecida resposta para a pergunta “Por que nós não temos
textos bizantinos anteriores ao quarto século?”

A. Afirmação: A resposta é, porque eles se desgastaram em função de tanto uso. Nós


não encontramos nenhum. A resposta é que todos eles foram desgastados, em outras
palavras, nenhum manuscrito não foi desgastado. Só não foi desgastado textos de
outros tipos. Nenhum manuscrito, em nenhum lugar do mundo, em nenhum momento
da história, sobreviveu a esse período de desgaste. Todos, 100%, foram perdidos. Algo
um pouco difícil de provar, mas até mesmo Jakob van Bruggen, um dos melhores de-
fensores do texto majoritário, responde essa pergunta do seguinte modo:

“Por que os antigos manuscritos sobreviventes mostram um outro tipo de texto? Por-
que são os únicos sobreviventes da sua geração, e porque sobreviveram devido ao
fato que eram de um tipo diferente. [em outras palavras, se fosse bizantino, teria sido
destruído. Eles sobreviveram por que eram de um outro tipo texto] (...) Certamente
existiam maiúsculos exatamente tão veneráveis quanto os sobreviventes Vaticanus
e Sinaiticus, e que, como seções do Alexandrinus, apresentavam um texto Bizantino.
Mas eles foram renovados na sua forma de escrita minúscula e sua aparência maiús-
cula desapareceu.”83

A explicação é essa. Os textos anteriores eles simplesmente desapareceram. Por


uso, eles foram colocados de lado. Jakob van Bruggem sabe que não existem evi-
dências do texto Bizantino anterior ao quarto século, e ele não precisa lutar por isso.
Ele entendeu esse ponto, a evidência está lá, exceto em alguns sites, em algumas

83 Jakob van Bruggem, The Ancient Text of the New Testament (Premier Printing, 1976), 26-27.

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discussões feitas por pessoas que aqui, não são versadas no assunto, sugerem que
esse texto estava lá de outras formas e tentam demonstrar, mas a verdade é conhe-
cida, inclusive dos defensores do método. Não existem as versões anteriores, não
existe texto Bizantino na sua forma formal anterior no quarto século. A explicação é
que eles desapareceram. Wilburn Pickering diz:

“Aparentemente houve um movimento organizado para “transliterar” MSS unciais para


a forma ou caligrafia minúscula. Note que Dain concorda com Lake que os exemplares
“desgastados” foram então destruídos (alguns podem ter sido “reciclados”, tornando-
-se palimpsestos). Que tal se aqueles exemplares foram antigos Unciais “Bizantinos”?
(…) Se exemplares “Bizantinos”, desgastados pelo uso, foram descartados desta ma-
neira (como parece provável), eles certamente pereceriam. Tudo isso reduz nossas
chances de encontrar MSS “Bizantinos” realmente antigos”84

É uma boa suposição, mas é uma suposição, até o momento não substanciada pela
evidência. É nada mais do que uma suposição. “Os exemplares bizantinos desgasta-
dos pelo uso foram descartados dessa maneira como parece provável.” Não, não pa-
rece provável, parece suposto. Em outras palavras, crê-se de forma tão intensa, que
eles foram desgastados e destruídos, que Pickering, não tem sequer a esperança de
se encontrar uma evidência manuscrita que ofereça suporte a sua suposição. Mauri-
ce Robinson, que é, na minha opinião, o crítico textual mais importante do movimento
majoritário ele disse o seguinte:

“O texto Bizantino preserva com uma consciência geral tipo de texto do Novo Tes-
tamento que dominou o mundo de língua grega. Esse domínio existiu pelo menos
desde o século IV até a invenção da imprensa no século XVI. De acordo com a teo-
ria atual, este texto também é presumido nos séculos anteriores ao quarto [século]
como tendo dominado a principal de língua grega do Império Romano.”85

Olhando para as evidências espalhadas, e ele sabe que o texto que dominou o mun-
do de língua grega, é o texto Bizantino, é esse texto posterior ao 11º século como já
demonstramos. Ele é presumido, ele não é demonstrado, esse é o ponto, esse é outro
calcanhar de Aquiles desta teoria. Por isso, é tão difícil explicar a completa ausência
de um tipo texto em manuscritos gregos, em versões anteriores ao quarto século em
citações do pai da igreja. Essa, sem sombra de dúvida, é uma grande dificuldade em
todo o texto majoritário.

84 Wilburn Pickering, Qual o Texto do Novo Testamento? (Material não publicado).


85 Maurice Robinson and William Pierpont, The New Testament in the Original Greek: Byzantine Textform 2005, with Morphology.
(Bellingham, WA: Logos Bible Software, 2006), V.

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B. Problemas: Os principais problemas da Teoria do Texto Majoritário, em especial


emreferência ao ‘desgaste’ de documentos de tipo texto bizantino antes do séc. IV,
são três:

Manuscritos Gregos: Nenhum manuscrito anterior ao quarto século contém um texto


Bizantino. Existem leituras distintamente Bizantinas entre os papiros e antigos un-
ciais; Existe uma conformidade geral entre os textos chamados Alexandrinos e Bizan-
tinos; Mas, até o momento não existe suporte material para a suposição de que exis-
tem manuscritos Bizantinos anteriores ao quarto século tenham sido produzidos.

Versões: Nenhuma versão anterior ao quarto século reflete a tradição Bizantina. Isso
é visto em traduções do texto grego realizadas ao redor do mundo antes do séc.IV,
como por exemplo, nas versões Copta (Egito), Latinas (Europa) e Síria (Turquia), além
diferentes regiões do mediterrâneo, como as versões Armênias, Georgianas, e etc.
Todas essas versões têm exemplares anteriores ao séc. IV, mas nenhuma é classi-
ficada como refletindo um texto Bizantina. Ou seja, não é razoável supor que o texto
Bizantino era Majoritário nos primeiros séculos. As evidências sugerem o oposto.

Pais da Igreja: Todo estudo crítico do texto dos pais da igreja apontam para o fato
de que nenhum deles usou o texto da tradição Bizantina nos três primeiros séculos.
O mais antigo uso de leituras distintamente Bizantino foi o Asterius, o herege de An-
tioquia (341dC). Os Pais da Igreja não apenas usam o texto, eles oferecem comentá-
rios para variantes textuais. Em alguns casos, variantes conhecidas em vários luga-
res no passado são desconhecidas nas variantes sobreviventes, ou mal atestadas.
Eventualmente o oposto aconteceu. Isso significa que não sabemos qual era o texto
majoritário nos três primeiros séculos. A suposição dos defensores do TM de que
o texto bizantino existia antes do séc. IV é necessária para o argumento, e por essa
razão não o podem abandonar. Infelizmente também, não conseguem demonstrar de
modo objetivo, ou ao menos de modo plausível a sua validade.

7 | Rejeição Histórica: Por fim, a terceira grande fraqueza desse método é a sua rejeição
histórica. As evidências são completamente ignoradas. Os escribas, suas escritas, o
seu texto, a sua história de Transmissão, tudo isso, é secundário ao contar manuscritos.
O que importa é que eles sejam maioria.

“O problema com a visão do texto majoritário, de acordo com a maioria dos críticos tex-
tuais, é que ela também parece desconsiderar a história. Embora noventa por cento de
todos os manuscritos pertençam ao tipo de texto bizantino, essa forma de texto não se
tornou o padrão até final do processo de transmissão. Os dados existentes revelam que a

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maioria dos manuscritos por volta de 800 D.C pertenciam ao texto alexandrino. Portanto,
a maioria não é uma entidade fixa - ela muda a cada século.”86

O texto Bizantino só se torna maioria no nono século, este é um elemento importante,


antes do nono século ele não é maioria. Aqui entra a pergunta, nós queremos encontrar
a maioria dos textos ou nós queremos encontrar o texto mais antigo? Se nós queremos
encontrar o texto eclesiástico e o texto recebido pela igreja, a teoria do texto majoritário
nos oferece um bom caminho, mas se nós queremos encontrar o texto apostólico nós
precisamos encontrar uma outra forma de avaliar as evidências.

8 | Fracasso: Em função desses tendões de Aquiles, que tem essa teoria, esses três gran-
des pontos fracos (i.e. estatística como práxis, suposição como fundamento, rejeição his-
tórica), a teoria do TM fracassou em encontrar defensores recentes. Nós não encontra-
mos artigos novos publicados em jornais acadêmicos que sejam revisados e criticados
por outros acadêmicos. Aí, nós percebemos que até mesmo o próprio desenvolvimento
da teoria perdeu o seu momento de ímpeto. Em 2008, com a morte de Hodges, percebe-
mos que até a própria sociedade do texto majoritário, cujo Pickering foi o primeiro a presi-
dente, deixa de existir as publicações, deixam de ser feitas até mesmo o centro de estudo
e preservação do texto majoritário de Paul Anderson. Parou de funcionar, e até onde
eu tenho notícias, parou de exercer suas funções. Com exceção de alguns defensores
no Brasil, ela não tem encontrado adeptos na academia. Pickering talvez seja o melhor
representante no Brasil. Tem outros defensores desse texto no Brasil, mas dificilmente,
eles encontram eco além dos leigos a quem eles ensinam. Sobre o TM, Carson diz que:

“Essa teoria está sendo apresentada na literatura popular a pastores e leigos em todos os
lugares, muitos dos quais nunca leram uma refutação no nível e que não estão equipados
para fazer o trabalho mais avançado que demonstra que a teoria é falsa.”87

A rejeição do texto crítico não é uma questão de liberalismo, não é uma questão de re-
jeição da inspiração, mas é na verdade, uma rejeição do princípio teológico fundamental
que define que a inspiração e o texto Bizantino de mãos dadas. Na verdade, homens
como Carson, que defende profundamente a autoridade das Escrituras e a inspiração,88
tem severas resistências a essa teoria. Em um de seus livros, ele vai apresentar uma de-
fesa moderna do texto bizantino e com as próprias respostas para eles.

86 Daniel B. Wallace, “Textual Criticism of the New Testament,” ed. John D. Barry et al., The Lexham Bible Dictionary (Bellingham, WA:
Lexham Press, 2016).
87 D. A. Carson, The King James Version Debate: A Plea for Realism (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1979), 42.
88 Considere os livros: The Enduring Authority of Christian Scritures e Scripture and Truth dos quais D.A. Carson é editor.

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CRÍTICA TEXTUAL

Gordon Fee é outro defensor da autoridade das Escrituras e da inspiração dos textos
das Escrituras. Considerando a proposta de Hodges, Fee afirma

“Meu ponto é que até mesmo o chamado texto majoritário é um texto que evoluiu. Como a
evidência sobrevivente claramente indica, não existe nenhum exemplo completo desse tex-
to senão depois do século VIII, um ponto que Hodges cuidadosamente evita comentar (…)
Por fim, é importante dizer novamente que se a crítica textual moderna tem dificuldades em
explicar de modo preciso a origem do texto Bizantino, os problemas da explicação de Hod-
ges é ainda maior. Alguns de nós insistiríamos que ele parasse de falar em teorias e genera-
lidades e demonstrasse em números e exemplos substanciais a partir da própria evidência
disponível que sua teoria é também histórica. Nesse quesito nós também o convidamos a
parar de tratar a evidência de modo gentil e comece a tomá-la com a devida seriedade (…)
Eu estou apenas propondo que, se Hodges deseja derrubar Hort, ele precisa fazê-lo com
evidência de verdade, não com manuscritos hipotéticos que até o momento não existem”89

Em resposta ao livro de Pickering, Fee amplia:

“O livro de Pickering falha em todos os quesitos: no seu entendimento do cenário atual,


na sua argumentação, no seu entendimento e uso das evidências, e na sua própria meto-
dologia (...) Seu ‘novo’ método para identificar o texto do NT é uma completa adoção dos
sete critérios da verdade de Burgon, das quais todas são sete modos diferentes de dizer
que a maioria está sempre correta.”90

Quando você usa critérios que definem esse modo, você sempre tem a resposta que
você procura e é isso que nós encontramos no livro A Identidade do Novo Testamento,
de Pickering. Carson diz que:

“No final das contas, Pickering tenta forjar uma conexão necessária entre sua compreen-
são da crítica textual e uma visão elevada das Escrituras. Pickering é mais cuidadoso do
que a maioria nesse aspecto; mas as observações finais para seu segundo apêndice (no
7Q5) e todo o seu primeiro apêndice (“Inspiração e Preservação”), entregam esta perspec-
tiva no final. Mas, como em outros escritores, também em Pickering: a conexão é baseada
em afirmações sem evidências, em afirmações sem reflexão teológica séria.”91

89 Gordon Fee, “Modern Textual Criticism and the Majority Text - A Rejoinder” Journal of Evangelical Theological Society 21/2 (June,
1978), 159-60.
90 Gordon Fee, “The Majority Text and The Original Text of the NT” in Jay Eldon Epp and Gordon Fee, Studies in the Theory and Method
of New Testament Textual Criticism. (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1993), 207.
91 D. A. Carson, The King James Version Debate: A Plea for Realism (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1979), 122.

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Em outras palavras, Pickering está querendo dizer que até mesmo a reflexão teológica
que defende a associação entre inspiração e maioria, carece de reflexão teológica. Mas,
ainda assim, Carson continua:

“Devo apenas acrescentar que, mesmo que o tipo de texto bizantino fosse um dia de-
monstrado estar mais próximo dos autógrafos do que as outras tradições textuais (uma
eventualidade da qual, neste ponto, eu mal posso conceber), a crença em formulações tra-
dicionais da inspiração bíblica não seria afetada em nada. Concedido isso, os defensores
da tradição bizantina devem desistir de todas as declarações que sugiram ou impliquem
que os defensores de qualquer outra visão necessariamente arriscam uma visão hetero-
doxa da Escritura”92

Esse é o argumento principal usado pelos defensores do texto majoritário e que ganha
tamanha apelo com leigos, pastores e estudantes por aí. Se você tem uma visão eleva-
da das Escrituras, você deveria defender esse texto, que é o que nós encontramos em
todos esses livros citados entre os defensores, com a exceção de Maurice Robinson.
Seus textos realmente evitam isso. De uma maneira geral, esse é o grande problema da
teoria do texto majoritário. D.C Parker vai dizer o seguinte:

“Em suma, o problema fundamental com a teoria do Texto Majoritário não é que ela seja
historicamente errada, mas que é uma teoria pré-crítica que tenta usar ferramentas críti-
cas. Sempre será uma anomalia, uma teoria do passado para a qual seus adeptos estão
tentando encontrar um novo suporte.”93

Críticos textuais renomados como D.C Parker vão dizer que esse é um modelo suficien-
te e historicamente equivocado, embora muito conhecido, especialmente no Brasil.

Talvez, a melhor maneira de terminar essa aula seria relembrando as palavras de Benja-
min Warfield, um dos maiores e mais importantes defensores da inspiração, e um antigo
adepto da metodologia crítica na crítica textual:

“A questão toda é, no entanto, simplesmente uma questão de fato, e deve ser determinada
apenas pelas evidências, investigadas sob a orientação de bom senso reverente e since-
ro. A natureza do Novo Testamento como um livro divino, cada palavra do qual é preciosa,
nos pede que sejamos peculiarmente e até dolorosamente cuidadosos aqui: cuidadosos
para não intrometer nossas suposições grosseiras no texto, e cuidados para não deixar
nenhuma das suposições ou deslizes dos escribas nele”94

92 Idem, p.123.
93 D.C. Parker, An Introduction to the New Testament Manuscripts and Their Texts. (Cambridge: Cambridge University Press, 2008), 175.
94 Benjamin B. Warfield, An Introduction to the Textual Criticism of the New Testament (London: Hodder and Stoughton, 1890), 208.

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Conclusão
Essa foi a nossa primeira aula sobre metodologia de crítica textual,
nessa aula nós estudamos um pouquinho sobre a história do texto
grego, nós vimos o Novum Instrumentum, o primeiro texto publicado,
nós vimos um pouquinho sobre o texto recebido e a teoria do texto
majoritário, e nós começamos então, nosso processo de investiga-
ção de como aquelas variantes textuais precisam ser processadas.
Aqui, tivemos uma aula grande e comprida, mas que mais uma vez,
cheia de informação para você. Até mais!

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